n
...w*r.. j-r ■. 'itÇi^í^^
OFAZENDEIRO
D O B R A Z I L,
CULTIVAÍ)0R,
IWtlhorado na economia rural dos géneros já culti*
vados , e de ou tios , que se podem introduzir j
e ftas fabricas , que lhe são próprias > se-
gundo o melhor , que se tem escri-
to a este assumpto :
DEBAIXO DOiS AUSPICIO S,
E DE ORDEM
DE SUA ALTEZA REAt
PRINCIPE^^REGE^ÍTE^
NOSSO SENHOR.
Colligido de Memorias Estrangeiras
^ POR
f R. JOSÉ MARIANO DA CONCEIÇÃO VELLOSO,
TOMO III.
BEBIDAS ALiMENTOSAS.
PARTE I.
.... mérito hac una Satis arvore feíix
Vicenãa est regia -, Sparsãs nam hinc omniius Ofis
Oreis cpes trahit ad sese.
KnoWl. •$. 1^47*
Ka OFfICiNA í>£ ^UiÂQ TiiAD£>SQ
Le Bresil suffiroit seul par ses productions na-
Curelles por porter le commerce du Portugal au plui
haut dcgré de richesses
Journel de Commerc* Octohrc 1 7 $ 9 p. } 6.
Mais les Portugais peuvent en conserver une
f artie considerable par la amelioration de Ia cultu-
re de leur Colonies
Idem Dcccinbre 1 7 5 9 />. j 9.
SENHOR.
s
Obe d Augusta presença de V. A. Ré
a primeira 'Parte do Terceiro Tomo do
Fazendeiro do Brazil y que tem por ti-
tulo Bebidas Alimcntosas, e por objecto
melhorar a cultura da preciosa planta do
Café , do seu perfeito preparativo para
passar d Europa ^ e igualar ^ se não ex*
ceder , ao cultivado nas possessões Africa*
nas , e Americanas estrangeiras , e ain*
da y como se julga possivel , ao que se
transporta de Moca y ou Betelphagi da
Arábia , de cuja perfeição parece estar
distante o nosso.
a
As
As medidas tomadas ^ para se conse-
guir este per tendido fim , for ao as de ex*
por nesta CoIJecção aos granjeiros desta
planta tudo , o que se tem escrito a este
respeito , pelos Sábios das mesmas Na*
foes possuidoras das mencionadas Colo»
mas y que procurarão indagar a causa do
hastardeamento do Café de suas Colo-
nias , e apontar aos seus cultivadores os
meios mais opportunos , que a sua rcfie •
xão descobrio , para o legitimar , t reS'
tituir ã sua belleza primitiva , assim no
cheiro , como no sabor. Taesforao os Au'
thores , de quem trasladei , e copiei tw
do 5 quanto ajuntei nesta Collecção , a sã"
her : MM. Eloy , Monereau , Fuset ÍAh-
hlet , Alleon Dulac , o Abbade Bosier
(Francezes). O Collector do Museum Rus«
ticum & Commerciale, Miller ^ Ed*
ward , e os contidos no Tratado , que es*
creveo sobre o Café John Ellis j isto hc
Schehaheddin Beuy la Roque y Nibeburs y
Brown ,
Broivn , FothergiU ^ MeMUe 5 e Scott , Go»
vernadores ^ e a de hum Mercador de
Londres.
Bem que esta primeira Parte fosse
principiada antes da segunda , em que se
traduziu o Fazendeiro do Café de S, Do-
mingos de M. de Lahourie , sabe ao de-
pois delia pela demora , que houve na ac-
quisição dos Authores mencionados acima ;
por se terem mandado vir de fora ; e ^ por
não engrossar mais o volume , Jica para
huma terceira Farte ^ o que escreveo o Doti'^
tor Benjamin Mosseley , o Juthor do Com-
mercê de l' Amerique par Marscille j a
continuação £ Analyse de M. Eloy , e J.
C Rieger , Frussiano , e outros.
A importância deste objecto para &
commercio he tanta , quanta talvez nao
acertarei a dizer , por me faltarem da-
dos próprios para a poder calcular i^ mas
seguramente posso affirmar ^ fun dando- m^
fios mesmos Authores ^ que copio e tras^
la'-
lado ^ que ^ apenas descuherto na Ásia na
época ^ em que prefixão o seu descobri-
n:ent0 y foi tão grande a sua acceita-
ção , que deo occasiao a todas as Lides
jã politicas , jd Religiosas que se exci-
tarão entre os mesmos Asiáticos sobre o
seu uso 5 que apenas se passou pelos Ve-
ficzianos o seu conhecimento d Europa , es-
ta o abraçou com tanta ânsia , que pa-
recia confiuirem para a Arábia todas as
9 iquezas y o que obrigou a dizer a João
Rayj d pouco mais de cem annos ^ que a
Arábia não só era feliz , mas felicissi^
ma\ pois com o seu Café attrahia im^
mensas riquezas de todo o mimdo : inde
immensx opes, ut fere totius orbes di-
vitix in eo confluant ; que se faz incri^
zel o número das casas de Cajé ^ nãofaU
lando em Constantinopla , Londres , e Pa-
rts y pois SÓ em Berlim , por hum edicto Ré*
gio y anda O seu gasto por 700 para 800 mil
cócudos } e na pequena Cidade de Mons
im
I*
em frança passa de cem mil arráteis ,
o que se vende cio povo annualmente ^ se-
gundo Eloy ; que as três NafÕes Euro-
peas, que mais se empenharão na mltU"
ra desta planta , forão oslnglezes , Fran-
cezes , e Hollandezes ; os primeiros entre
estes esperavão em 1797 ^ colheita de 16
milhões d' arráteis , e tinhão 20 mil es-
cravos applicados á este trahalho , que he
18 vezes mais do que a colheita de 178^ y
e 7 vezes mais que a do ultimo anno ^
e nos segundos andava a colheita em 70
milhões^ antes darehellião dos escravos '^
qite tendo estado na ultima década deste
século todas estas Colónias j cultivadoras
do Café , perturbadas com a desastrada
guerra y e ainda os mesmos Árabes^ não
pode deixar de ser immenso o vão , que
ha na Europa a encher deste género ;
que , sendo V. A R. Senhor do immenso
paiZy entre trópicos^ proauctor do Café
pele cultura j e de toda a Costa Orien-
tal
tal á' Jfrica , onde nasce espontaneamen-
te ^ nenhuma Na^ao o pode encher me^
Ihor que a Portugucza ^ sendo animada
por F. A. R,
Deixo a outros^ que tenhao maior
ócio , averiguar , se hc verdadeira a da-
ta da origem do Café , que assignalao os
Authores que copiei ; ou se elle era aquelh
remédio , tão dec amado por Homero , cha^
mado Nepenthes , de que Helena usava ,
para se alegrar , como refere Pedro Petit j
ou o sueco preto , que bebido os Lacede-*
fiwnios , como rejere Miiralto ; ou o vi^
nho que Abigail apresentou ao enfadadty
David , como pensa Olau Celsio ; ou as
favas torradas , com que mimoseârão os-
Amonitas ao mesmo Rei fugindo ao filho , e
passagem do Jordão , como diz Scheuchzer..
Também deixo aos Botânicos o exa*
minar , se os novos Cafés OccidentaeSy
descobertos por jaquin nas Antilhas ^ e
Aublet em Cayenna , e os que julgo ter
encontrado nas matas do Rio de Janeiro
gozão das mesmas propriedades do Café
Oriental.
Do mesmo modo por agora não apre-
sento o pro e contra ^ que se tem escri-
to sobre as suas propriedades , o que pro»
curarei fazer na terceira Parte desta
Obray onde além das analyses chymicas ,
que se tem feito a seu respeito ^ darei a
Flora y e a Bibliotheca Cabovetica de to»
dos os Authores em prosa ^ e verso que o
acharão digno objecto dos aparos de suas
jennas,
Prosigo y SENHOR , dizendo que plan-
ta alguma vence , e sobrepuja em Louça-
nia a este Arábigo Jasmim aos olhos da
espectador j quer este o contemple nosver^
des alf obres dos dilatados vergéis , repar-
tidos pelas avenidas ou aléas , que se en-
trusão ; quer , ao depois de colhido , e
preparado , quando se apresenta em ai*
gum dos seus ordinários vehiculos aos in^
di-
dividuos da natureza humana , sequiosos
do seu restaurante gozo.
Em quanto ao primeiro : apenas tem
recebido do seu criador hum tricnnio de
cuidados , pois a mais senão estende a sua
mimosa infância^ cresce em elegante py-
ramide , adornado sempre da verdura de
suas folhas , e mais de duas vezes no an-
no da alvura de suas aromáticas Jlores ,
€ do encarnado , e purpúreo dos seus fru*
et os j que nascem rentes , apí7ihadcs , pe*
los nós em torno dos mesmos troncos e
ramos. Os que gostão ajuntar o útil e o
agradável , ou o enlace de Flora com Fo-
mona , bordão as aléas e avenidas , qu^
repartem os alinhados , e symetriacos ai"
f obres , com os cândidos J as mine ir os de
Itália , e com as Roseiras de Festo , e ,
accrescentando ao seu nativo aroma o per*
fume destas , fazem o todo do seu ar am--
biente o mais suave possível.
Quanto ao segundo: não he menor o
apparato , e fausto com que se osten*
ta nas envernisadas mezas ^ e com que
éipparece entre os homens esta Alimentosa
Bebida. O illustre Linné , não com os en^
feites oratórios , mas com o seu rigor dia-
léctico os descreve. Fasos dejerroy aço ^
cobre , para se preparar , cafeteiras , lei-
teiras , tenazes , colheres de prata ; ta^
fas de porcelana de Macáo , mezas enver*
msadas , toalhas para se apresentar , e con-
clue dizendo , que apenas bastarão mil cru-
zados para se oferecer dignamente esta
bebida. E se este liquor em razão de st
mesmo pede , e demanda todo este faus-
toso luxo , certamente he muito maior , o
que requer em razão do lugar , em que
deve ser offerecido aos seus concurrentcs.
Espaçosas salas j ornadas elegantemente
de tapeçarias , de grandes espelhos , ri*
cos quadros , magnificos lustres , custosas
haixéllas e serviços , em companhia do Chdy
do Chocolate^ e de muitos otUros refile t^
cos
€os e bebidas , são condições que se requeb-
rem. Ainda isto não he tudo. Julgarão
necessário bancas de jogo , Cantores ^ Ins-
trumentistas , bailadores. Para esta casa
corria toda a qualidade de homens de to-
das as jerarquias ^ de Lei ^ de Letras^ de
Religião,
• lendo tido contra si todas as cias-
ses £ homens piíblicos , de Religião de
Policia , e de Letras ; tendo-se procurado
substituir muitõs outros i;egetaes , grãos
nozes , amêndoas , favas , milho , cevada^
trigo 5 pão torrado , de todas tem esta Be-
bida Alimentos a triunfado não sopeio seu
valor intrínseco , mas ainda pelo favor dos
seus apaixonados das mesmas classes , que o
tem defendido pro aris & focis.
Tal he, SENHOR, em resume, a
presente situação deste precioso vegetal -
de que eu tenho a honra de apresentar a
V, A.R, neste tosco esboço , o que se tem
escrito a seu respeito , fazendo única-
tnen-
mente pontaria ao hera , que póãe resul^
tar da sua boa cultura aos vassalos d^en--
tretropkos , a quem V, A. R. anbela fa-
zer jelices j e por consequência aos Rei-
nicolas , mediante o seu commercio»
Com a mais profunda inclinação hei--
ja o suppedaneo do Augusto Throno
Der.AR.
o mâi$ humilde Vassal®
Fr. José Marlanno da Concéfão Velloso,
rapsodIíí: cahovetiCtí:
tlGATO ET SOLUTO SERMONE
EX AUCTORIBUS DECERPT^.
Ex Scrlpíura Sancta,
Jt^ Estinavit igitur Abigail , & tulit ducentos panes ,
& duos UTROS VIM & quinque aríetes coctos , ôcc,
1.° Reg. Cap. XXV. f. iS. versionis Vulgata.
Cumque venisset David in Castra , Sobi filius Naas
de Rabbath filioriim Amon , & Maehir filius Ammi-
hel deLodabar & Eerzellai Gallaadites de Rogelim.
Obtulerunt ei stratoria , 6c tapetia & vasa fictilia,
frumentum & hordeum & farinam & polentam , &
fabam & lentem & frixum Cicer.
Et mel & butyrum oves &c. a.** Reg. Cap. XVII.
5^. 27 , 2S , 29.
Ex Homero,
Protbus ergo in vinum misit medicamen , unde bibe-
bant ,
Luctui irasque adversum, malorum oblivionem inducês
Çui illud biberit postquam crater i omnium rnixtumesC
Non utique tota die profuderit lacrymas per genas ,
Neque si ei mortui fuerint materque paterque*
Neque si ei coram fratrcm , aut carum filium
Ferro trucidarent , ipse vero oculis videret.
Talia Jovis filia habebafe medicamina utilia
Bona , quje illi Polydamna prsebuerat Thonis uxor
Egyptia , qu* plurima producit feitilis tsrra
Medicamina * * *
Eae
Ex Knovies 5^. 1497.
Arabum felicibus oris
Nascitiir arbos okns 5 iUam coluere minori
Indigenaí haud cura , cjtiam quondam credita maU
Hesperidum referunt vigilem observasse droconcm ;
Et ne forte aliis veniant satã semina terris ,
>íon priíis hasc ad nos mittunt, quam flamma feracci
Abstulerit vires, faccundae orbarit & omni
■Spe prolis ; róerito hac una satis arbore fcJix
Dicenda est Régio ; Sparsas nam hinc omnibus oris
Orbis opcs trabit ad sese ....
Ex Doctore Hahernach. p. 59,
Viscida Solvit Caflfee , pigra lotia pellit .
Suscitat & vigiles ab.cue labore facit.
Hinc Ceplialalgiae viscosas, coma, Catarjbi,
Ebrietas , colicus pellitur hocce dolor.
Digerit & crudam Stomachis Languentibus escam ,
Pius juvat a pastu , quam juvat ante cibos.
FIus quoque Phlegmaticis , et laxo corpore obesis ,
\c Quam calidis , macris , mobilibusque quadrat.
Ex Vtinerií Prjcdlo Rústico 2\6.
Vt medeare malum non est prxsentius ulluin
Auxilium , quam si terris faba mi^sa sabxij
Inrumuit nitidos sartagine tosta per i^^nes
Tritaque mox validis intra mortana pilis
Diluitur lympha , facilisque parabilis arte
Vulcano coquitur j donec vas pulvis ad imum
Venerit , & posito mansueverit olluia motu.
Fictilibus rufos pateris diffunde liquorcs.
Ad-
3cvtií
Àdde peregrina dukes ab arundiíic suecos ;
Ore sapofe Cálix ne tristia Loedat amaro.
Divinos aliura latice^ adhibebis in usum ;
Seu longas opus est studiis traducere ríoctes ;
Sive graves Capiti tenebras induxeric Auster ;
Seu noeuere dapes ; iJlò medicamine vates
Ingenium emendet , laetusque infecta resumaft
Carmina j nec font^ís alios , quibus ora Poetas
l^í-oluer int , fluxisse solo male credat Achivo;
(Cujusdam Poeta Persas ,
Ex Musaeo Valentini.)
Te Cafc , atra fácies !
Quid est cur dekctemur f*
iV Venere , quo venies j
Faeis ut feriemur.
Ex Rúj^ In Hist, pimh
, ArborArabí» felicis, dumtaxat intra trópicos. Jirã*
'hts vim s^minum veg€t<indi destruunt , inée immens^
^pes , tit fefs oibis divitiae , in fo confluant , unde
llla pars Arabum felkissima. Fidem Superat quod
3iaill€na modiolorum millia divendant Turcis Barba*
lis , Europaeis. Mirum ^ inquit , tantum thesaurum es-
•se unius gentis peculium esse , & intra unius Prô*
yínciae angustiai coerceri. IVlirum vicinas Nationes ex-
timulante invidia , s» , avaritia eas jam pridem norij,
\ú vi depopuhtas esse , seu semina , vel vivas rar
ih
Xvifl
dices dolo non surripuisse. Merum quam vigilem Dra-
conem Coavetis suis tuendispracficiant indi^eni.':. Mi-*
rum unius Regionis messes , lotius orbis sufficerc
expensjs.
Ex Amcnii, Acad. Lln*
Sartago férrea — pro ustuhtione Semi-
num.
•—pro tostorum Seminum
comminutione.
- — operculatiun prococtione
—pro aheno coquente.
— pro cantharo cálido ta-
nendo.
Cantharus argenteus — ad propinandum d«coc-
tuiii.
—pro lacte infundendo.
— Saccharum subministrans
— pro Saccharo cxcipiendo.
— Chinensia, caque gemina.
Mola chalybea
Ahenum aeneum
Tripus ferrciis
Carbonarium ^nevm
Cantharus argenteus
Vasculum argenteum
Fórceps argêntea
Vascula murhina
Cochlearia argêntea parva — pro Saccharo miscendo,
JWensa rotunda picta — Vernice obducta.
JWappa mensalis
Kepositorium
Vas argenteum maius
— protegumento mensac,
— quod excipiat supra men«
sam vascuJa.
-^pro lavandis vasculis,
' Cxtera , ut taceam , qux maxime necessária jiidi-*
cant , Ôc vix mille thalerorum redimantur pretio.
Hl Si
XI 3Í
HISTORIA DO CAFÉ.
Copiada , da que escreveo em Inglez John.'
EUis.
A
ÇTbeHistory vf C^fe.)
Anttga relâçio do Café , que dou 5 foi ti»
tada d' hum manuscrip^^o Arábe , que se conser-
va na Livraria do Rei de França em o n.° ^443,
c he da maneira seguinte.
Shehabeddin Ben , hum escriptôr Árabe da
nona centúria da Hegyra 5 ou decima quinta dog
Christáos , attribue a Gemaleddin , Mufti d^Aden,
cerra Cidade d* Arábia Félix, que éra qussi seu
conremporaneo , a primeira introducçáo dâ bebi-i
da do Café neste paiz. Elle diz deste theor : que
Gemaleddin , tendo tido occasiáo de passar i
Pérsia , no tempo da sua detença , vira algunt
dos seus paisanos beber Café , ao que então não
íinha dado attenção, mas , tendo voltólf a AdcUj,
c achando-se indisposto, e lembriido-èê de te^
visto aos paisanos da Pérsia bebererrt'"Café ; e
esperando de tirar â-gum proveito desta bebida j
se resolvera d experimentaila per si iríesmo , e^
tÇndQ feito A sua experiência, não só recobrát
XX
n a sâude , mâs que também percebera outras
«qualidades proveitosas dcsic liquor , como sáo as
de alliviar as dores de cabeça , avivando , e ani-
mando os cspiritos , e sem prejudicar a consti-
tuição , precaver a somnoíencia , ou peso da ca-
beça. Resolvco-se então a voltar em proveito da
sua profissão Religiosa esta ultima qualidade. El-
le o tomou, e rccommendou aos seus Dervisey,
ou Religiosos Mahometanos a dispôrem-se para
passar as noutcs cm oração , e n' outros exerci-
dos da sua Religião , com fer\-or c devoção. O
exemplo , c authoridade do Mufti deo grande
peso á reputação do Café. Sem perda de tempo
os homens de Letras , e da Religião adoptarão
o seu uso. Os Negociantes , e Artistas lhes fo-
rão no encalço pela necessidade , em que se acha-
vão , de trabalharem de noute , e muitas vezes
de viajarem até ao depois de sahir o Sol. Pelo
decurso do tempo se fez hum costume geral em
Aden 5 e não só se bebia de noure poraquellcs,
que as qUgri|o passar dispertos , ou em insom-
nio , msr?-. ta;píi'^bem de dia por amor das suas ou-
tras qualidades agradáveis.
O Author Árabe accrescenta : que elle mes^
mo se achara tão bom com a bebida do Café ,
f{m totalmente $c abstivera do uso da infusão
a*
Xxt
d' outfâ herva , chamâdíi na suá linguagem Cãt^-
que talvez seria o Chá , ainda que , ao meu ver,
o Auíhor Árabe não nos dá fundamento algum
para assim o julgarmos.
Ames deste tempo o Café era muito pouco
eonhecido na Pérsia , e também muito pouco
usado na Arábia , onde espontaneamente nasec
este arbusto. Mas , conforme o Shehabeddin , ja:
de tempo immemoriâl se bebia na Ethiopia.
Tendo sido o Café recebido desta maneira.
cm Aderi , se continuou o seu uso , sem aígu-:
ma inierrupçáo desde esta época , € pouco a pou-».
CO se foi introduzindo em todos os povos dos
seus arredores , e muito pouco lempo depois che-
gou a Meca , onde , assim como em Aden , foi
introduzido pelos Dervises com o me&mo pretex-
to de Religião.
Os visinhos de Meca , tendo sido os últi-
mos 5 for ao , os que usarão sem relação alguma
a objectos Religiosos , ou Litterarios ; e os que
poseráo em prática bebello publicamente nas ca-
sas de Café, onde se ajuntavão sem ordem" a
passar agradavelmente o seu tempo, fazendo dis-
to o seu pretexto : jogaváo as tabolâs , e outras
espécies de jogos , e também a dinheiro. Nestas
casas se divcrtiáo a si próprios ^ tocando , dan.-».
çan^
ç^ndo , e Cantando , tudo pe'o contrário dos cos-
tumes dos rijos A^ahomeranos , aos quaes occa-
Sionáráo alguns distúrbios. Daqui esre mesmo
costume se estenJco a outros muicos lu£ares d'
Arábia , c parricu.armente a Medina , e 20 Grá3
Cairo no Egypro^ onde os Dervnses da Provin-
cia de Yemen , que viviáo juntes cm hum dis-
tricro , beb:£o Café ás noutes , que devido passar
em craçár. Eli-s o conservaváo cm huma ta-
lha de barro vermelho , e o reccb:áo com ter-
nura, e devoção da mão do seu su}^rior, o qual
lhes administrava em copos per si mesmos. Em
pouco tempo foráo imitaJos por muitas pe.soas
devotas do povo do Cairo , e o seu exemplo se-
guido pelos estudiosos : e ao depois pelo resto
do povo, de maneira que o Café se fez huma
bebida muito commum, assim nesta grande Ci*
áade , como em Adea , Meca , Medina , e nas
outras d' Arábia.
Mas peio decurso do tempo os rijos Ma-
hometanos principiarão a deçapprovar o uso do
Café , como occasionador de frequentes desor-
dens , e por produzir effeitos quasi semelhantes
ao viiho , cuja bebida he contraria aos precei*
tos de sua Religião j e o Governo se vio por con-
«Ç^ueaúa obrigado a interpôr-se , e a limitar por
^Xllf
vezes o seu uso. Sem embargo disto , ella se fez
-ralmente táo approvada que ao depois se jal«
g,ou necessário prohibillo inteiramente para o fu-
turo.
O Café continuou o seu progresso na Sy*.
ria , e foi recebido sem alguma opposição cnt
Damasco , e Alepo , e no anno de 1 554 reinan-
do o grande Solimáo , hum Século ^o depois
da sua introducção pelo Mufti cm Aden , foi
conhecido pelos Turcos em Constantinopla : nes-
te tempo duas pessoas particulares , cujos nomes
eráo Schems , e Hekin , hum vindo de Damas-
co, e o outro d' Alepo ^ estabeleceo cada hum
delles a sui casa de Café em Constantinopla ,
e o vendiào publicamente em lugares prepara-
dos elegantemente 5 que foráo neste tempo fre-
quentados por homens de Letras, e particular-
mente Poetas 5 e outras pessoas ^ que procuravaa
divertir-se com jogos de tabulas , e damas ; ou
travar amizade , e conhecimento , e a passar o
seu tempo agradavelmente com módica des-
peza.
As casas , e assembléas tiverao tanta voga
Jnsensivwlmente , que f©ráo frequentadas por pes-
soas de todas as profissões , e também pelos of-
íiciaes do Serralho, Bsxás, e Pessoas da pri-
mei-
fileira Ordem desta Corte. Apezâr detudo^quân^
do parecia que estava firmemente estabelecida ,
os^ Imans , ou Officiaes das mesquitas se quei-
xarão estrondocamente de se verem es^as aban-
donadas ^ e as casas de Café atacadas de cem-
panhia. Os Derviches , e as Ordens Re igiosas
murmuraváo , e os Pregadores declamaváo con-
tra ellâs , affirmando que era menor peccado if
a taberna que ir á casa de Café.
Ao depois de muitas altercações e porfias ,
os devotos, unindo os seus interesses, conse-
guirão huma condemnaçáo auihentica do Café ,
e^ determinarão apresentar ao Mufti huma peti-
ção a este fim : na qual avançaváo que o Café
torrado era huma espécie de carvão , e que ti-
ilha tal qual relação com o carvão prohibido
pelâ Lei; e que por tanto lhe pcdiào houvesse
de decidir este pomo, conforme o direito do seu
Oiííclo.
O Chefe da Lei sem se entranhar nâ ques-
tão, decidio, como ehes desejaváo , e declarou,
que a bebida do Café era contrario á Lei de
IVIahomet.
He tão respeitável a authoridade do Mufti,
que ninguém se atreve a jugar errada a sua sen-
tença. De pancada se destruirão todas as casat
de
xx^
'de Café; e se encarregou aos officiaes da Po-
licia o vigiar 5 se alguém bebia Café. Nâo obs-
tante isto estâváo tão habituados , e o seu uso
estava geralmente tão recebido , que o povo con-
tinuou a pezar de todas as prohibições a bebel^
lo nas suas próprias casas. Os oíEciaes da Po-
licia 5 vendo que não podião supprimir o seu
uso 5 se acordarão de pemiitiirem , pagando hu-.
ma taxa, que o bebessem , com a condição qu©
o não íÍ7essem publicamente. E assim se prin-
cipiou a beber nos lugares particulares com as
portas fechadas, ou nos lugares do interior das
casas de tabernas.
Cem este pretexto forão-se estas casas pou-
cos pouco reestabelecendo 5 e, vindo hum no-
vo Mufti 5 menos escrupuloso , e mais illumi-
nado que o seu predecessor , rendo declarado pu-
blicamente que o Café não tinha relação algu-
ma com o carvão 5 e que a sua infusão em na*
da era contraria ú Lei do Mahomet, as casas
de Café crescerão em huma quantidade igual á;
que tinha sido antes. Feita esta declaração , as.
Ordens Religiosas , os Pregadores , Legistas , e o
próprio Mufti bebião Café , e o seu exempla
foi universalmente seguido por toda a Corte, a
Cidade.
O
XXVI
o Gráo-Visir , estando do mesmo modo
munido d'huma especial authoridade scbre as
casas em que se permittia a bebida pública do
Café , valeo-se desta occasião , para impor hum
considerável tributo pelas licenças que concedia
á este assumpto , obrigando aos seus proprietá-
rios , ou donos das casas de Café a pagar hum
seíjimii por dia , e limitando juntamente o preço
d' hum asper por huma chicra ?
Isto era o que se continha no manuscripto
Árabe da Livraria de ElRei de França confor-
me a traducçáo de M. Galand , o qual prosegue
ft informar-nos da causa , que tivera outra sup-
pressão total no tempo da guerra de Cândia , es-
tando nella os interesses Ottomanos em huma
figura triste , e crítica.
A liberdade , tomada pelos políticos , que
frequenttvâo estas casas , fallando livremente dos
negócios públicos , foi tão grande , que o Gráo-
Visir Krupuli 5 Pai de outros dous célebres áo
mesmo nome , que lhe succedêráo no emprego
successivamente , as supprimio totalmente no tem-
po da menoridade de Mahomet IV com hum
disenteresse , que char âcterisavi a sua família sem
respeito á perda de huma tão grande renda , de
que elle próprio colhia o proveito. Antes que
ia-
XXVlf
lavrasse esrâ determinação per si mesmo em in-
cógnito visitou diíFerentes casas de Café, cnde
mancado cbscrvou , que varias pessoas graves dis-
corriáo sér.jimsnte sobre os negócios do Império,
ceisurando a administração , e decidindo confia-
damente negócios de muita importância. Tam-
bém antes tinha visitado as tabernas , onde en-
controu muitos moços alegres, muitos soldados,
CS quaes se divertião entre si cantando , e con-
tando seus amores , e factos da guerra. Nada mais
ouvio.
Todavia 5 ainda que fizesse frechar as casas
de Café , com tudo nem por isso se bebia me-;
nos 5 porque se trazia em grandes vasos com
fogo por baixo ás estradas reaes, e aos merca-
dos. Esta prohibiçáo só abrangeo as casas de
Café de Constantinopla , e não as outras Cida-
des e Viilâs do ímpsrio , onde se continuarão
as casas de Café do mesmo modo que antes.
Apezar desta precaução de se supprimir as
ca';as públicas de Café , o seu consummo se au»
gmentou mais e mais; j>orque não havia casa
alguma ou família rica , ou pobre Turca , ou Ju-
dia, Grega, ou Arménia, que nesta Cidade sáo
mui numerosas , a qual pelo menos não beba
duas vezes ao dia ^ e ir*ijita parte o ^bebe mu^
tftS
XXVIII
us outras vezes , porque passou a ser hum cos-
tume o oíFerecello â todos , que vem de visita «
suas ctsas, e se reputa como huma incivilida-
de o náo acceitallo : e assim muita parte da
gente toma vinte eh leras no dia , e sem algum
inconveniente , o que este Author suppôem ser
humâ grande excellencia. Além desta o mesmo
Author lhe contempla outra no maior uso do
Câfe , e vem a ser , conforme o seu parecer ,
apertar os homens mais estreitamente cm os vin-
culos da sociedade , e da amizade , e muito mais
que outro tlgum liquor , e observa que estes
protestos da amizade , feitos neste tempo , são mui-
to melhores que aquelles que se fazem , quan-
do a cabeça se acha envenenada pelos liquores
embriagadores. Elle avalia que se gasta nas fa-
milias particulares de Constantinopla no artigo
do Gafe , quanto se gasta em vinho em Paris ;
c refere que estão tão avezadas a pedir dinhei-
ro pelo Café , como se pede em Paris pelo vU
nho , ou cerveja.
Ainda encontro mencionado hum câso ga-
lante , e vem a ser , que recusando-se dar Café a
huma mulher casada , fora este recuso huma das
causas le^^aes do divorcio.
Os Turcos tomão o seu Café muito quen-
te.
XXIX
te, e muito forte, e sem âssucar. Antigametite ,'
e agora, quando ferve, lhe lançao hum dente de
cravo , ou dous pisados , conforme a quantidade,
e também huma pequena porção da semente
hadiar , chamada ervadoce estrellada , ou alguns
gráos do cardamomo menor , ou huma gotta da
essência d' âmbar.
Não he fácil sàber-se assim o tempo em
que, como a causa porque o uso do Café pas-
sou de Constantinopla ás partes do Oeste da Eu-
ropa. Todavia he provável que os Veriesianos^
pela vizinhança dos seus dominios, e peio seu
grande commcrcio com Levante , fossem os pri-
meiros que o trouxessem. Isto se prova de par-
te d' huma cana escripta por Pedro delaValle,
certo Venesiano em 1615 de Constantinopla , na
qual diz a hum seu amigo , que elle levaria com-
sigo algum Café , o qual julgava que até en-
tão era desconhecido no seu paiz.
M. Galand diz : que elle fora informado por
M. la Croix , Interprete do ítlei , que M. The-
venot , tendo viajado pelo Oriente , e voltando a
França em 1657, trouxera comsigo a Paris al-
gum Café para seu próprio gasto , e que pot
muitas vezes regalara com elle a seus amigos,
'« que M, ia Croix fora hum destes j e que des- '
5 " a^
XXX
de esse tempo nunca elle o deixará de beber,
provemio-se por meio de cerros Armanios , esta-
belecidos em Paris, e pouco a pou::o ad^uirie
reputação nesra Cidade.
Alguns annos antes já era conhecidí em
Marselha j porque hum certo Cavalheiro , que ti-
nha acon^psnhado a M. de la Haye a Constan-
tincp'a , trouxe ccmsigo no seu regresso , náo
so o Café , mas rambem os vasos , eappareihos
próprios para o fazer, e pa-a o beber, que ti-
nháo huma particular magnificência , e m.ii dif-
ferentes dos que actjaimente usamos. Todavia
até o anno de 1660 somente , 03 que tinháo es-
tado em Levante eráo ,. es que o bebiáo , porque
o costume os tinha feito amidos. Mas tendo
vindo neste anno algumas saccas do Egypto,
deo a muitas pessoas occasiáo de o experimen-
tarem, e contribuirão muito, e muito para que
elle entrasse no uso geral ; e em 1671 certas
pessoas particulares em Marselha determinarão
estabelecer a primeira casa pública de Café nos
arrebaldes da Cidade , que tiveráo hum su-
cesso muito bom j o povo se punha a zombar ,
fallar sobre os negócios , e a diVertir-se com o
jogo : em pouco tempo teve hum grande coiy
curso-, principalmente pelos Turcos negociantes.
XXXI
e pelos Mercadores de Levanre. Jlilgárão-se es*
tes lugares muito convenientes para se discorrer,
c tratar as matérias relativas ao commercio , e
em huma palavra , ao depois o número destas
casas cresceo pasmosamente. E não obstante que,
senão bebesse menos pelas casas particulares em
huma maior quantidade, logo que se fez o seu
uso universal em Marselha , e Cidades visi-
nhãs.
Antes do anno de ié6ç senão conhecia o
Café em Paris , á excepção da Casa de M. The^
venot , e n' alguma mais de seus amigos , e de
terem ouvido das relações dos viajadores. Este
anno adquirio alguma celebridade pela chegada.-
de Solimão Aga , Embaixador de Mahomet IV,
Deste anno se deve datar a entrada do Café em.
Paris. Este Ministro , e a sua companha tinháoi
trazido huma grande quantidade comsigo, com
a qual mimoseárão a muitas pessoas da Corte ,
c Cidade , que se acostumarão a tomallo com
hum pouco d* assucar. E os que o acharão prO'-
veitoso , procurarão não estar sem elle. O Embai-
xador , permanecendo em Paris desde Julho de
M669 até Maio de 1670, teve tempo sufficiea-
te de deixar estabelecido cstç costume que élim
introduzira.
Dous
XXXtl
Dous annos ao depois hum Arménio por
nome Pascoal cscabrleceo huma casa de Café,
mas tendo sido pouco animada , dei.ícu Paris ,
e foi para Londres: a elle se seguirão Arménios
e Persas , mas também com pouco lucro por
falta de aprestos , c lugares próprios em que os
pozessem. O povo polido , c garboso quer ser
alojado em bons lugares , quando pagáo. Com tu-
do, pouco tempo depois , alguns Francezes as pre-
pararão com propriedade ao intento de salas es-
paçosas com adornos elegantes, de tapessarias,
espelhos , quadros pintados , magníficos lustres ,
e dando juntamente Chá , Café , Chocolate , o
outros refrescos , de sorte que dentro em pouco
tempo forão frequentadas por pessoas de ceremo-
nia , pessoas de Letras , e em breve chegou o
numero destas casas cm Paris a trezentas.
Nós somos devedores á Fiagem de /T/. /j
Jio^Ke 4 Arnhia felis desta exposição , que fi-
zemos , da introducção do Café em Paris. Ago-
ra passaremos a mostrar também a sua entrada ,
ou primeiro apparecimemo em Londres.
Pelo que diz a Historia Cronológica do Comn
wercio , se mostra, que o uso do Café entrara
em Londres alguns annos antes que em Paris.
Em i6sz M. Edovard , certo cgmmercianre di
Tur-
XXXIII
Turquia trouxe comsigo íium criado Grego , que
se chamava Pasqua , que sabia torrar , e fazer o
Café até então desconhecido em Inglaterra. Es-
te criado foi o primeiro 5 que vendeo o Café „
e que o tinha em sua casa , para este fim em
George Stãà , Lomhard Street,
A primeira vez- que se fez menção delle
nos Livros dos Estatutos , foi em 1660 ( iz
car. II. cap. 24) tendo-se-lhe imposto sobre ca-
da gallon de Café feito , e vendido o direito
de 4 psnces , pagos pelo vendedor.
O Estatuto de 15 Car. 11 cap. XI. §. 15
ann. 1665 manda que todas as casas de Caie
Kajão de ser licenciados em o Quartel General
Sessões da Paz na Commarca ^ em que os hou-
verem.
Em i6y^ o Rei Carlos mandou fecharas
casas de Café, mas em poucos dias revogou a
Grdem por outra. Forâo accusadas de serem se-
minários de sediçõcâ.
O primeiro Author Europeo , que fez men-
ção do Café 5 foi Rawolíio , que se achou em
Levante no anno de 1573 J ^^^ ^"^"^ ® ^^^*
creveo circumstanciadamente foi Prospera Al-
pino na sua Historia dâs Plantas do Egypto ,
publicada em Veneza em 1591^ cuja descrip-
***
çaoj,
XXXU'
çáo , SC p6de lèr no Tiicâtro das plantas de
Parkinson a pag, 1622 cap. -jv, , que he do
theor se;^i]inte.
„ Arbar Bon , cm\ fructtí suo buna ; baga
que os Turcos bebem j Alpino no seu Livro das
pJanras do Egypto , dá a descripção desa plan-
ta 5 da qual diz : Que se mostra em huma hor-
ta de cerco Capitão de Genizaros , que a trouxe
da Arábia Feb's , e a plantara , e que se via co-
mo huma cousa rara, porque antes se não ti-
nha visto alguma. A arvore, diz Alpinio , he de
algum modo semelh?.nre ao Evonymo ; mas as
suas folhas são mais densas , mais rijas , e mais
verdes , e não são cahidiças. O fructo se cha-
ma Btmá 5 e algum tanto mais amargo que a
avellá , mais cotuprido , redondo , e pontudo em
Luma das suas extremidades , e do mesmo mo-
do regoado em ambos os lados , e a pezar disso
mais visivel em hum que no outro : Que se pô-
de dividir em dous , e em cada lado do qual se
contém hum caroço pequeno alongado , branco,
raso , ou plano pelo lado , em que ambos se ajun-
ião, cobertos de huma pélle a maré liada , d'hum^
gosto ácido , e algumas vezes com maior amar-
go , forrados , ou vestidos de huma pellicula
.delgada de huma c6r cinzenta escura. Na Ará-
bia,
XXXV
bia 5 Egypro , e ontros Ingâres dôs dominios Tu?-
cos fazem destas bagas geralmente hum cozi-
mento, ou bebida , que lhes serve em lu-gar de
vinho, e de ordinário se vende nas suas taber-
nas 5 á qual dáo o nome de Caova, Paludamm
chama Choãvd ^ e Rawolíio Cbmke, Esta bebi-
da tem propriedades physicas muito boas : for-
talece o estômago débil , remedèa a digestão,
e o tumor, ou obstrucçóes do fígado, e baço,
sendo tomado em jejum por algum tempo. Go-
za de grande estimação entre os Egypcios , e
Árabes em muitos casos femininos , nos quaes
pensão que lhes tem sido muito proveitosa.
O Senhor Chanceller Baccon se lembra
delia deste mesmo modo no anno de 1624. El-
le diz: que os Turcos tem huma bebida, cha-
mada Café , feita de agua fervendo , e de huma
certa baga feita em pó , que faz a agua preta ,
como a de ferrugem , ou foligem de chaminé,
dando-lhe hum aromático c pungente cheiro , e
he tomada quente.
O célebre João Ray , na sua Historia das
Plantas , publicada em 1^90 , fallando delia co-
mo de huma bebida , que estava muito em usa,
diz : que esta arvore cresce unicamente entre os
Trópicos , e suppõem que os Árabes destroem
*** ii a
XXXVI
a qualidade vegetativa das sementes , em ordem
a iimiiar sómen:e entre elles a grande fonte de
riquezas, que elles attrahera de todo o mundo
por esre género : donde reflecti : e que esta parte
da Arábia pode realmente ser chamada muiro fe-
liz j mas que he incrível que se possão daqui
só exportar tantos milhões de saccos para a
Turquia , Barbaria , ç Europa. Elle se admira ,
que náo tenha havido al2;uma Nação particular,
que haja de querer possuir hum tão grande the-
souro i e que , estando encerrado dentro dos es-
treitos limites d' huma só Província, náo tenha
havido entre as Nações , que as avizinhao em ro-
da , alguma, que penenda roubar-lhes algumas
sementes ,ou mudas vivas , para participarem com
ellas de hum negocio tão lucrativo. „
Agora passaremos a mostrar , porque meios
esta preciosa planta passou á Europa , e desta
emigrou para a America.
Boerhave foi o primeiro cscripror da rela-
ção do modo , com que elia veio á Europa , no
seu Index do Jardim de Lcyde , Parte II. pag.
217, quehe, como se segue; Nicoláo Witsen >
Burg Mestre d'Amsterdam, e Governador da
Companhia da índia Oriental nas suas cartas^
por ve^es repetidas, admoestava j c pedia a Vau
Hoom »
XXXVl]
Heom 5 Governador de Batâvia a mandar vir ,
de^Moca , na Arábia Fel is , algumas bagas da ar-
vore do Café 5 para as haver de plantar em Ba-
tâvia ; o qual , tendo assentido , as mandou vir,
e no anno de i6po nascerão das sementes, que
lhe tinhão vindo , muitas arvores , das quaes man-
dou huma ao Governador Witsen , que logo mi-
moseou com ella ao Jardim d' Amsterdam , de
que era o fundador , e conservador , onde em
pouco tempo produzio , e das suas sementes
houveráo multas plantas novas. Donde conclue
Bocrhave : que o merecimento d' introduzir esta
rara planta na Europa he totalmente devido ao
cuidado, e liberalidade de Witsen.
Pelos annos de 1714 os Magistrados d* Ams-
terdam , querendo satisfazer a Luiz XIV. Rei de
França com hum particular comprimento , se acor-
darão > de lhe mandarem huma elegante planta
desta rara arvore , arranjada com todo o cuida-
do , e por agua , abrigada do tempo com hu;-
ma máquina curiosa , coberta por ♦cima com vi-
dros. A planta tinha 5 para 6 pés de altura, e
hum dedo de grossura no seu tronco , com mui-
ta folhagem , e com fructos verdes , e maduros»
Logo que chegou foi visitada e vista , ainda es-
tando no Rio a por muitos membros da Acade-
mia
XXXVIII
mia das Sciencias , e foi ao depois conduzida ao
Jardim de Marly , e entregue ao cuidado de M.
de Jussieu , Régio Professor de Botânica , que
havia hum anno , que tinha escripto huma Me-
moria 5 impressa ha Historia da Academia das
S^ciencias de Paris , no anno de 171 3 , descre-
vendo os characteres deste género; e ajuntando
á esta huma elegante figura , tirada d' huma plan-
ta menor , que tinha neste mesmo anno recebi-
do deM. Panchras, Burg Mestre d'Amsterdam,
e Director do seu Jardim.
Em 17 18 principiou a Colónia HoUandezâ
de Surinam , primeira de todas , a plantar o Ca-
fé; e em 1722 M. de la Mote Aigron , Gover^
nador de Cayenna , tendo negociado cm Suri*-
nam , conseguio por hum artiíicio apanhar hu-
ma planta , que , no anno de 1725 , produzio mui-
tos milhares.
Em 1727 o Francez , percebendo que estt
aquisição seria d' huma grande vantagem para as
outras Colónias , enviarão á Martinica algumas
plantas ; e he muito provável que destas se hou-
vessem de espalhar por todas as Ilhas circum-
vizinhas; pois no anno de 1752 já se cultiva-
váo na Jamaica , e se diz que hâ huma postura
feita , para se animar esta cultura. Desta sorte se
di>
XXX fX
dispôs hum commercio tão grâtide , e tão provei-
toso para os estabelecimentos Europeos nas ín-
dias Occidentaes.
BE-
BEBIDAS ALIMENTOSAS.
CULTURA
D O
C A í È,
Historia da sua introducção na Europa , tirada do
Discurso preliminar da obra Franceza.
(^Examen de la cjuestion Medico Politique : sur U Kse
habituei do Café , Çí^c.)
POR
o
N. F. J. £/,^,
Cafeseiro veio originariamente da Ethiopia
alta , onde era conliecido de tempo immemorial »
e ainda hoje se cultiva com proveito. Seu fructo
he maior , hum pouco mais comprido , menos ver-
de , e quasi com o mesmo perfume , do que se prin-
cipiou a colher na Arábia feliz , junto ao decimo
quinto Século, e que hoje he tao estimado com
o nome de Café de Moca. A arvore , que o pro-
duz , nasce no território de Beul/agui , huma Cida-
de do Reino d' Yemen , situado a déz léguas do Mar
Vermelho , em hum areal sscco. O terreno da sua
cultura he da extensão de cincoenta léguas de com-
prido , quinze até vinte de largo. O seu fruçto não
A íena
CO
tem o mesmo ponto de perfeição em toda a par-
te. O que cresce sobre lucjares elevados , he mui-
to mais pequeno , mais verde , mais pezado j e o^e- ^
ralmente mais estimado.
O Cafeseiro , conhecido pelo irome de Josmi'
num Arabicum Laurifolio , dos antigos Uocanicos , so-
be á altura de quarenta pcs ; mas o seu tionco não
excede no seu diâmetro a quatro para cinco polle-
gadas , se^fundo refere Mr. de i^omare no seu Dlc
tioiiárc de Histoire y aturei: os ramos desta arvore,
são brandos , cobertos de huma casca esbranquiça-
da , muito fina. As folhas oppostas de duas a duas,
e situadas de modo , que hum par encruza com o
outro. Asseme{hão-se de alguma sorte com as áo
loureiro ordinário. São continuamente verdes , lus-
trosas , lisas por cima , pállidas por baixo : n3o tem
cheiro , e o seu sabor he de herva. As florei sabem
das axillas das folhas em número de quatro , ou
cinco: são brancas , algumas vezes vermelhas , pálli-
das , cheirosas , de huma peça , como hum funil »
divididas as mais das vezes em cinco partes , como
o Jasmin de Hespanha. O pistillo passa para hum
írUcto , ou ba'<a molle , ao principio verde , ao de-
pois vermelha , e finalmente de hum vermelh.o de-
negrido > quando está madura perfeitamente , d.t gios-
sura de huma cereja tendo na sua extremidade huma
«specio de embigo. A sua carne he mucila^^^inosa ,
pallida » de huin máo gosto , serve de coberta com-
n;ua
II
Cs)
mua a dous caroços ddgados , Ovaes estreitamente
unidos , pelo lugar > porque se unem j e que con-
tem cada hum huma meia fava , ou semente de
hum verde páliido , ou amarellado , oval , abaula-
do pelas costas , chato do lado opposto j cavado des-
te com hum rego assaz profundo. Colhem-se duas
ou trez vezes no antio fructos maduros , que se fa-
zem seccar. Em todas as estações se vem nos Ca-=
feseiros quasi sempre flores , e fructos maduros.
Este he o grão tão conhecido com o nome de
Câfc , e do qual somente os habitantes de Yemen ,
que o mandão a Moca , vendem todos os annos oi-
to milhões, e 785 mil arráteis. A sua feira geral
he em Betelfagiti , onde se compra todo o Café ,
que ha de sahir do Paiz por terra. O resto se le^-
va a Moca , que iHe fica em distancia de 35 lé-
guas , ou para os Poitos mais vizinhos de Lochia ,
e de Hoílecda, Póde-se avaliar o total da sua expor-
tação em doze milhões , quinhentos e cincoenta mil
arráteis todos os annos.
1
O Cafc Moca , ou de Levante , tem as favas
mais pequenas que as outras espécies conhecidas.
Sendo passadas pelo moinho , que as descasca da to-
na subtil , que as cobre , ficão de huma cor ama-
rellada , e tem hum bom cheiro. Convém advertir
que se dão Cafés de Moca de trez qualidades. A
melhor, chamada Sí?//<?«n , se reserva para q Grão
Senhor ; ás outras duas j que são o Sí^f^i í e o Sn"
A n In-
CO
hlfi , se vendem na Arménia , Pérsia , em Arabiít ,
nas Costas d' Africa , no Indostan , ]\Ialdivas , Eu-
ropa.
Os Hollandezes procur:Hão cultivailo em Bata-
via , e se saiiirão bem. A sua semente cire he mais
grossa , mais esbranquiçada que o de Moca , se co-
nhece pelo nome de Café de Java , ou do Ori-
ente.
. O Café de Surinam , Colónia Holiandeza na Ame-
rica em terra firme , he de huma còr esverdeada ,
.c de difFerente tamanho.
A Ilha de Bourbon em Africa , produz hum Ca-
fé esbranquiçado, allongado , sem cheiro , e muito
inferior ao da Arábia. O Café da Martinica , ou das
Ilhas , he ainda de menor bondade. He esverdeado,
c tem hum cheiro , e gosto hervaccos.
Chama-se Café mareado , ou avariado o çwc
foi molhado pela agua do mar , no seu transporte*
Quando vem assim , se não faz caso pela acrimo-
nia salina , que a torrefacção nunca chega a tirar-
O uso do Café , a pezar de estar tão espallia-
Ihado em toda a Europa , era desconliecido a esta
parte do globo antes do ló. Século. Os mercado-
res Venezianos , forão os que o introduzirão na Itá-
lia. Este uso passou logo para Allemanha ; poií
ahi já era muito conhecido no meiado desse Sé-
culo. Franca porém tardou em aproveitar- se do Ca-
fé , assim no conmercio , como no augmento do
lu-
i
Ç! 5
Iiixo das tnezas. Foi Marselha a primeira Cidade
deste Reino , onde forão vistas estas sementes es-
trangeiras em 1664» mas só no anno de 1669,
forâo conhecidas em Paris. Inglaterra se empenhou
em procurar estas favas ; e como ao mesmo tempo
aprenderão o methodo de as empregar em decoc-
çáo , o gosto , que o público formou desta bebida j
obrigou a alguns habitantes de Londres , a tello sem-
pre prompto nos seus botequins , aos quaes hoje
dão o nome de casas de Café. O estabelecimento
da mais antiga nesta Capital data he de 165 2 , aonde^
o seu nvimero chega a 3 mil.
Os primeiros Europeos , que escreverão acerca
do seu uso, forão os Médicos. Leonardo Rawolf,
natural de Msburg , fallou a seu respeito na Re-
kção da sua viagem a Levante , que appareceo im-
pressa em Ailemão em Francfort em 15^2 ; mas
Prospero Alpino de Marostica do Estado Venesia-
no se estendeo mais acerca delJe no seu Livro de.
píantas do Egypto , Paiz pelo qual tinha viajado
trez annos , principalmente a parte , que confina com
o Estreito de Suez , também vizinho á Arábia. Vol-
tou a Itália em i $ S4.
De todas as bebidas , qu€ tiverão acceitação » nao
ha huma , que tenha sido mais universalmente es-
palhada que o Café. Não ha Nação alguma que a
não tenha achado do seu gosto : e no entretanto
ss, prepara em quasi todos os Paizes do Mundo ha-
bi-
CO
bitado , ou pelo cozimento em acii.i , ou pela in-
fusão das favas torradas . e pulverisadas. Todavia o
methodo de o f)reparar não tem sido os mesmos
nos lugares , em que o seu uso aliiciativo está
mais. acreditado. Os Árabes começarão pilando os
grãos de Café em vasos de terra , immediatamente
ao depois de o haverem torrado : Jançavão-Jhe ao
depois a.?ua cuente em cima ; e nesta a fazião fer-
v€r por alguns instantes , e bebião este cozimento,
sem dar tempo , a quó o seu pc se sentasse. Aias
em pouco tempo se desagradarão do Café turvo , e
procurarão precipitar-lh- as partes mais grosseiras ,
por meio de hum panno de liíiho molhado , com
o qual cobríão o vaso, lo-o que o tiravão do fo-
go. Ajuntarão a esta primeira a> precaução de dei-
xar o li^uor em hum perfeito repouso, e conse-
guirão fazelJo bem claro : então o derramavão nas
taças , e o adoçavão com mais ou menos assucar ,
conforme o gosto de cada hum.
A maior parte dos Árabes tinhao o seu regalo
nesta bebida j mas a regalia de o tomar em natu-
reza , era só dos Cidadãos ricos. A plebe se reduzia
ás coberta«> próprias . e commuas das favas. Estes
restos desprezados formão luima bebida , que tem
o gosto do Cafc sem o amargo , nem a força. Cha-
JTia-seCafc n Sultana. Andry , Doutor da Faculdade
JVledica de Paris , deo o mesmo nome ao Café não
torrado, ferve- se em agua por meio quarto de hora ,
qu an-
(7 )
f^uando muito . e dá luim líquido de. còr de limSo
que se bebe com as-^ucar.
He tão grande o uso do Café nò Império Ot-
tomano , que he iinpossivel imaginar-se o consum-
mo, que fazem delle a gente vadia, que pâssao a
vida a bebello , e a cachimbar nos Cafés públicos.
Não he menor o consummo nos Estados dos Prín-
cipes da Europa ; seria impossível hum justo cál-
culo da quantidade , que entra nella , e se conso-
me. Do edito Régio , público em Berlin a respeito
do Café , se vê que o Rei de Prússia fixa a somma
da despeza annual em 700 para 800 mil escudos i>
que a importação destas sementes estrangeiras cau-
sa ao seu povo. Eu não poderia contar as saccas»
que passão todos os annos pelos Paizes- Baixos Aus-
tríacos ; e que se consomem nelle. Este número
deve ser muito grande 5 pois que os Mercadores
Especieiros de Mons , vendem diariamente acima da
trezentas livras de Café torrado , para o uso dos
moradores , que não tem em sua casa provisão des-
tas favas : e deste padrão vem a ser mais de c^m
mil livras o Café , que se vende ao povo anmial-
mente em pezos pequenos. Mas accrescentandô-sè a
esta quantidade , a que resulta do consummo út
sujeitos ricos , que tem provim.entos de Café ;, pa-
ra as precisões domesticas , qxie número prcdigio^
so de livras não entra cada armo nesta Cidade*
que he soífiivel mente povoada , e mcdiocremente
eran-
grande ? Nío receio a censura de exagerado em hum
cálculo , t]ue seguramente he muito inferior a sua
realidade ; ainda quando nelle não calculo o gasto
destas casas abertas , que tem o seu nome , ^'por-
que o vendem. Quantas mil livras se não gasta-
rão?
O modo mais commum de se preparar esta be-
bida , he de torrar , e preparar o Cafc , de moer as
favas , para llie tirar perfeitamente a tintura , ou
por cozimento na agua , ou por huma infusão mo-
mentânea atravéz de hum funil , cheio de buracos,
e forrado interiormente de hum papel pardo , ou
de hum sacco de lã. Chama-se a este ultimo mo-
do café a la minuta, Correge-se o amargor com as-
sacar , e outros Jhe ajuntão leite , ou nata.
Quando se principiou a espalhar o uso do Cafc ,
«selasses inferiores do povo se empenharão da mes-
ma sorte em o gastar, como as pessoas de huma
ordem superior ; porém não podendo costear a des-
peza, a que o uso habitual desta bebida os obri-
j:ava , recorrerão a diversas experiências de legumes,
grãos para haverem de achar hum meio, que lhe
substituísse o uso das favas estrangeiras : emprega-
rão os feijões brancos , torrados , e pulverizados , e
chegarão a lisonjear-sc , de teiem encontrado huma
descoberta , cujo cozimento se approximava ao do
Café , assim no gosto , como no cheiro : mas estas
qualidades apparentes não os enganarão muito tem-
C9:í
po ; porque perceberão logo que o seu uso offen-
dia ao estômago , e causava moJestias na cabeça. •
Na continuação do tempo acharão que a ceva-
da torrada com huma quantidade de amêndoas , e
fervida por hum espaço de tempo maior , que o
Café ordinário , davão á agua algum gosto , cheiro ,
e outras qualidades do ultimo. Este he o Cafc , a
que derão o nome de Cafc h paisana de Gaspar
Keuman , rdedico de Berlim , que mo;reo em 17 ??•
Friedel , outro Medico AUemão propòz hum Cafc ^
ffcito de partes iguaes de amêndoas doces , e amar-r
gas , que elle torrava , ao depois de ilie ter tirado
a pelle. Mas o liquor , que resultava do cozimento
desta mistura em agua^ , se approximava tão pouco
ás qualidades do Café , que , muito longe de lizonjear
o gosto de seus partidistas , parece ter sido inven-
tado só para correger o habito de o tomar pela aver-
são , que causa, aquém o toma.
Ainda se imaginarão outros meios diíFerentes , pa«>
ra os substituírem ao Café , que nos vem do Estran-
geiro. O que sortio hum melhor effeito , foi o da
raiz da Chicória amargosa , feita em pequenos pe-
daços, secca brandamente ao fogo , torrada , e moí-
da ao depois , pava se empregar em feição de Ca-
fé , mistufando-o com elle em partes iguaes.
05^ Mercadores , que vendem em miúdos o Ca-
fé torrado , lhe passão per cima huma pouca de
manteiga , quando está no forno , ou panella , pa-
ra
C IO ;
ra \ht dar as sementes velhas huma parte do gos-
to , que a sua antiguidade parece ter feito perder.
Esta practica he criminosa por todos os principies.
í»Ias os Mercadores , que torrão bons Cafts , com
hm-na addicção decaída, lhe não alterão a sua bon-
dade , antes , peio contrario , o carameilo , que se
Jhe forma em cima na superfície dos grãos , os
Teste de huma costra delgada , que serve de tapu-
me ás partes mais voláteis, que escapão em mui-
ta abundância , quando se queima o Café sem es-
fe expediente útil. Eu o chamo de útil ; por que
fambem o lie para os Mercadores , por quanto a
calda augmenta seu pezo na venda em miúdos , e
esta não custa tanto , como o Café , que por ou-
tra parte não sofTre tanta perda na sua torradura.
Ao depois desta succinta exposição da Histo-
ria óo Cafc , e da sua preparação , lie necessário
íjue passemos á Analyse dos seus princípios ; pois
se não pode dar o verdadeiro valor «os seus eíTei-
tos no corpo do homem , sem se conhecer antes
a? propriedades descendentes da sua natureza. As
cònsequíiKiaç , que resultarem deste detalhe , apoia-
rão a opinião , que se deve formar acerca do seu
uso. (*)
EX-
( * ) í7 processo lia Jnoluse,
< II )
EXTRACTO
D O
CAFÉ,
( Jllstoiy of the West Indles. )
V o R
BY BRIAN EDWARDS.
JL Em-se já escrito ir.uito acerca da Historia clõ
Cifé; a sua intioducção em as Índias Occidentaes,
foi elegantemente exposta por alguns Escriptoies , e
as suas propriedades sabiamente examinadas por ou-
tros , mas scbre todos pelo meu douto am.igo o
Doutor Benjamim Moseley , ( * ) de maneira que
ape-
( *) Trentlse on the hlsloiy property and ejects
cf Cofee—Bij Benjamin Mostkij M. D, Tratado so-
bre a historia , qualidades , e efeitos do Café,
Talvez vão se tenha coníribuido ao augmtnío do
moderno uso desta fragrante baga , tanto , í^uanla o
fez esta ohra '. cujo Auihor nos seus covhecimenios Me-
dicos , estimáveis inslrucçèes assim singularmente ins*
tractivas , como detectáveis , mw tem igual Verãc-ss
5 cdiç6es em Inglaterra pi l. em 17^5-) Foi trasy
ladadít , e publicada na Lingua Franceta em Paris ^
J.eão , e Strahurí^o, Tcjvbem em italiano cm Berna ^
e Milão. Foi publicada em Leide j Sruxelias , elVi--
( Í2 )
?-pena. me deixarão poder oflferccer alguma cou.a
"ova a este respeito. Por onde as poucas observa-
, ções. que tenho de apresentar aos meus Leitores,
vmarão pnncipalniente sobre a cultura da sua ba-
ga, que, sendo fundadas em actuaes expenencias ,
talvez darão alguma informação proveitosa.
Os apaixonados do Cafc se tem queixado mui-
to da inferioridade , do que produzem as índias Oc-
cidentaes , ao de Moca. Não ha dúvida alguma . que
a maior parte das queixas , formadas contra elle ,
com que o público se diverte , são nascidas da af-
fectação. Ao mesmo tempo que esta imputação não
he inteiramente destituida de fundamento ,' visto
ser o Café das índias Occidentaes , pela maior
pr.rte, bebido dentro dos 14 mezes , depois de co-
lhido da' arvore ; e que o delicado do seu sabor .
se rcralça com a idade , o que não deixa de confes-
sar sinceramente o Lavrador de Cafc , mais jactan-
cioso sobre o que recolhe de suas possessões.
iVIas a objecção , de que o Café^he inferior ao
da índia Oriental , por ser huma prodviccão mais
grosseira de huma casta de arvore de menos valor .
-— não
cnna-e circula hu,dar,icla em AUanua nu Allemanha,
€ 00 Norte dn Europa, Os Granjeiros (ia Cafc de-
ven, maior a^jn^a^ão ao Doutor Mosclo, , \lo que
talvcj, hna^uulo, Vor.}ue ellc au^mentou a cansam-
ij^nçaa do Cufe universalmente , e introduzia esta de-
luu^sa , c ntU hcblda cm Iw^arjs , onde antes rara
vcí^ SC ouvia seu noin.\
I
I
CO
não merece outra refutação mais do cue a circum-
stancia referida pelo célebre Jardineiro Mr. aiilier,
„ que as plantas trazidas das índias Occidenraes ,
e creadas em Inglaterra nas estufas ,. produ/iráa mui-
to bem as suas bagas , as quaes em tempo propor-
cionado forão julgadas exceder ao melhor de IVloca,
que se pode descobrir na Grã-Bretanha „ he pois
evidente que toda a differença provém do teirenc,
clima , modo de o preparar , idade.
Mostra-se pela authoridade de Roque , e de cii-
tros Escriptores : que a arvore do Café produz em
hum Clima muito secco j e florece primorosamen-
te em hum terreno areisco , ou em encostas , e
declives de montanhas , que dão escoo ás aguas das
chuvas. Está no poder de cada hum dos Lavrado-
res de Café comprovar pela sua experiência nas
índias Occidentaes a propriedade de hum seme-
lhante terreno , se as pequenas bagas houverem de
ter maior acceitacão nos mercados Ingiezes.
Hum terreno bom , melhorado pelas chuvas ,
produzirão sim huma arvore vistosa , e dará huraa
grande colheita : mas as sementes , que são grandes,
e de hum verde carregado , mostrão por muitos an-
nos fedor , e enrijamento. He cousa singular que
os Americanos do Norte prefirão esta sorte de Ca-
fé a todas as outras ; e , porque elles até aqui tem
sido os melhores freguezes em os mercados das Iq-
dias Occidentaes , os Lavradores se tem naturalmen-
C ^4)
te appjicado bastante ao trabalho desta ci-ltura , c
o tem feito.
Foi prudente a concessão do governo em 178,,
dando felizmente por livre nos mercados de InHa-
terra o CafJ das Jlhas Occide.itaes aos seus Lavra-
dores. Antes desta cpoca , os direitos , e alcavalas na
importação , e consumação das plantações Inglezas
do Cafc na Grã Bretanha , não erão menos do que
480 por cento , em o seu valor mercantil derse tem-
po. Debaixo de taes exacções a sua cultura nas
nossas Ilhas do assucar deveria experimentar a mes-
ma sorte , que soffrêrao as do índigo. Mas isto se
não deve entender a respeito dos mercados Ame-
ricanos. A grande, e importante reducção de hi-m
xeilim por livra de pezo dos direitos de alcavala ,
fez immediatamente huma repentina , e pasmosa
mudança ; e quando se promove o interesse do La-
vrador , então he que se augmenta a renda do Es-
tado: tendo-se trazido no anno de 1784 huma maior
quantidade de Café que a do dobro do cue até
então se importava , se augmentou a somma total
dos direitos ( reduzido a 2 terços ) de L. 2,869-101-
IO; d. a L. 7,200 15 9 d.; prova certamente 3
mais importante , entre outras , de que as pezaclas
taxas desfazem aquillo mesmo , que intentão fa-
zer.
Cotno quer cHie as encomendas Inglezas se tenhão
fiuameiuado desta nwncira , e ta;uo , o American»
pas-
(15)
passou a outras muos , tendo-se , como jujgo . trans-
ferido em grande quantidade para ss libas forastei-
ras. Este motivo obrigou ao Lavrador a mudar d«
systema , por se accommodar ao gosto dos seu5 no-
vos freguezcs.
Na verdade emendar-se isto nío está nas mãos
de qualquer homem , que tenha já estabelecido a
sua plantação •, mas seguramente he hum objecto
muito importante a semelhantes pessoas , o terem em
vista para o tempo vindoiío iieste género de cultu-
ra (em hum Paiz no qual se dão espécies singula-
res de terreno , e escolha de situação) conhecer
d* antemão aquillo , em que deve empregar o seu
diniieiro , e a sua industria , para a sua maior con-
veniência.
Na verdade o Café pôde ser cultivado era qual-
quer terreno das índias Occidentaes ; á excepção de
huma greda , ou barro frio , rijo ; e de huma terra
baixa sobre greda quente. Em cada huma destas
duas castas , as folhas amarellecem , e as arvores ou
murchão , ou nada produzem ; mas inquestionavel-
mente o melhor , e mais saboroso fructo he , o que
provém da terra misturada de huma saibro quente ,
e de huin lodo areisco , ou dos outeiros verme-
lhos , e seccos , que se encontrão em quasi todas as
Ilhas das índias Occidentaes , e particularmente »a
Jamaica. Ainda que as frequentes pancadas de chu-
vas sejão favoráveis ao seu ereseimcnto , com tudo,
de-
C i6 )
demorando-ss a agua por al-.nn teirpo j\rnto á sua
raiz , a arvore inuichará , e acabar. í.
Sendo a terra nova , e natiiralmente boa , se pô-
de em todas as esutcóes do anno plantar o Cate ,
certamente no tempo secco , e pôde ser cultivado
em qualquer situação . com tanto que esta seja abri-
gada dos ventos Nortes , os cuaes pela maior par-
te lhe destroem as flores , e muitas vezes do meia-
do do anno por diante , quando reinão muito , to-
talmente as despojão , assim das folhas , como dos
fnictos . desvanecendo em hum instante todas as
esperanças do Lavrador.
O modo ordinário, com que se planta, he ali-
nhando a terra em quadrados de 8 pés ; em outros
trabalhos se semeão as sementes , ou plantão as
n.udas em 8 pés de distancia de huns a outros ppr
todos os lado., os quues dao 608 arvores a cada
acre . e quando se podem ter estas mudas com 'a-
cil.dade , devem ellas ser preferidas ás ba^ns- As
plantas destinadas d plantação devem ser escolhidas
de quasi 2 pés de altura. Co.tem-se de déz polle-
gadas acima do livel da terra , e cuidem cuanto
for po.sr.el em as enter.ar com todas as suas raí-
zes. As covas , em que liouverem de ser postas ,
•e alarguem , quanto bastem . para recolher a par-
te mferior do seu talo, e todas as suas raizcs ; e
semertão as fibras superiores debaixo da terra, ar-
« duas pollegadas da sua supeiíide. J\las ainda que
pe.
i
C 17 )
pela maior parte se julgue que a ordinária distari-*
cia. de 8 pés basta, para se plantar em qlialquer
terreno , cem tudo nas terras férteis , quando as
arvores chegão á sua perfeição , pela sua vicosida-
de se atupem , ou fechão tanto hUmas com as ou-
tras, que embaração à fiança passagem doar. Con-
vém neste caso derribar cada segunda rua alterna^
tivamente , isto he , huma sim, outra não, lo ,
ou 4 2 pollegadas acima da terra ; e para a boa co-
bertura dos cepos darão estes successivamente arvo-
res novas , e rijas , logo que as raízes deixadas as
produzirem muito melhores , do qUe aquellas dadas
antecedentemente. As antigas plantações (chamão-se
Avenidas ) derribadas desta maneira , não cavadas »
e replantadas darão huma colheita soífrível no segun-
do anno ; e a operação será muitas vezes repetida*
O systema geral , e approvado , quando se cul-
tiva huma Avenida nova , he a escolha de arvores per-
feitamente 4impas de gomeleiras ; e que Unicamen-
te hajão de ter hum só tronco em cada rak. A pe-
zar disto > se huma rija gomeíeira rebenta junto á
terra , a planta primitiva se embaraça ; por cujo
motivo , quando se enterra a planta , se lhe cubra
bem a raiz. Em altura de i ou 6 péâ , â que a
planta no terceiro annõ geralmente chega , se copa.
Nesta altura cada tronco tem 36 para 42 , ra-
mos , e na poda , cue requer Ènnualmente , não se
lhe deixa mais do que estes ramos.
B
í.
C is )
Do que fica dito relativamente ao effeito da
differença de estações, segue se ser muito dificul-
toso fíxar-se a avaliação do producto de Imma pLm-
tacão de Café por acre. Sabe-se que cadn aivore ,
era hum terreno fértil , e esponjoso , produz de 6
a 8 arráteis de Café , quero dizer com polpa e sec-
co ; em differente situação hum arrátel , e hum
quarto por cada arvore se avalia huma grande pro-
ducção ; mas então o Café he infinitamente me-
lhor em sabor. Creio que o seguinte he hum mé-
dium , quanto hum cálculo e)^acto pode admittir a
este respeito. Se os cafeseiros forem levantados de
arvores antigas em terras , nem muito pobres , nem
muito ricí;s , produzem o segundo anno do seu no-
vo crescimento 500 arráteis por acre, 500 no 2.°
anno , e de 600 a 700 no 4."= Se o Cafesal for
Jevantado de plantas novas , senão deve contar so-
bre o seu producto até o j.° anno da sua planta-
ção, nesse tempo produzirá mui pouco, e no 4.°
perto de 700 atrateis. O quinhão annual produzido
por acre depois deste periodo , se a Avenida for
tratada com cuidado, se poderá avaliar em 750 ar-
tateis ; e qualquer preto deve cuidar de acre , e
meio.
Passamos agora á occupaçao mais im.portante do
Lavrador de Café , a saber , a colheita da sua no-
vidade , e o modo de o preparar , para o fazer ven-
da\ej nos mercados. A seguinte, conforme Mr. Ro-
que
C 19}
que he a practica da Arábia. Quando os Lavrado-
res percebem que os fructos tem chegado á sua
madureza , estendem lençóes por baixo das arvo-
res , que sacodem de tempos em tempos , e o fruc-
to maduro cahe. Estas bagas, ao depois de juntas,
são postas em esteiras , e expostas ao Sol ainda com
a polpa , até que fiquem perfeitamente seccas , o
que precisa de muito tempo ; e depois deste se ti-
rão os caroços da capa , que os cobre , pela espre-
medura de hum grande , e pezado rollo , ou cylin-
dro de pedra ; e são então pela segunda vez sec-
eos ao Sol 3 porque os Lavradores desconfia© , que
quanto menos o Café for perfeitamente secco , tan-
to mais correrá o risco de se aquecer. Neste esta-
do se aventa com huma grande joeira, e se em-
barrica para a venda.
Não se pode negar que este simples methodo
he muito superior a outio qualquer, para lhe con-
servar o sabor ào seu grão •, mas póde-se questio-
nar com razão : se o lucro addicional , que o La-
vrador ha de conseguir em os mercados de Ingla^
terra por hum Café assim recolhido , e preparado,
correspondera ao valor do tempo , e do trabalho ^
que requer hum methodo tão aborrecido necessa-
riamente 5 O seguinte he da practica usada em as
índias Occidentaes.
Logo que a baga tenha adquirido huma còr ver-
melha denegrida na arvore , se suppóem estar em
B ii o
o ponto de madureza , ou de vez suflficiente a ser
colhida. Cada lium dos pretos destinados a esta oc-
cupação se prove de hum talei^o , ou sacco de
panno grosso com hum arco em a boca para o
conservar aberto. Este >e suspende em o pescoço
do apanhador , que o vai despejando em huma al-
cofa , e , sendo cui<iadoso , pôde apanhar trez alquei-
res no dia , mas a não ser , bom será que o náo
obrigue ; porque , neste caso , mi=;turará huma «rân-
de quantidade de fructo verde com o maduro, A
practica usada lie colhello na arvore cm trez esta-
ções de madureza. Cem alqueires , ainda com polpa,
tirado.» de fresco da arvore , rendem mil arráteis de
Café vendavel.
Aqui se usa de doils methodos de preparar , e
seccar o grão , ou caroço. O i.° he estender o
Café novo ao Sol em taboleiros com cinco polle-
gadas quasi de altura , ou em huma terraca bati-
da , ou plataforma de madeira , com a polpa em
a baga , a qual em poucos dias fermenta , e se des-
carrega a si mesma de huma humidade muito aze-
da , e se deixa o Café neste estado , até que este-
ja perfeitamente secco , o que , correndo o tempo
bem , se conseguirá em j semanas. Sepárão-se ao
depois as cascas dos gyC^os , ou por hum engenho
de descascar , que daqui a pouco se descreverá , ou
irt:iis frequentemente pizando-o em piKIes grandes
de madeir* com mãoo. O Café , assim preparado ,
pe-
( ^I )
peia 4 por cento menos , do que o preparado com
polpa.
O 2." modo he apartar-lhe a -polpa iminedia-
tamente , que se tira da arvore. Executa- se isto por
meio de hum engenho de descarnar , que consta
de hum rollo encanado, e horizontal, comprido
de 18 pollegadas , e 8 de largo. Volta se este rol-
lo por huma manivella , e trabalha contra huma
taboa lar«ga movediça , 3 qual , conchegando- se mui-
to as cracas , ou encanos dos rollos , embaraça que
as bagas passem inteiras. O Engenho se entretém
por huma vasilha de madeira inclinada , por cuja
abertura as bagas cahem , ou resvallão no Engenho,
e he regulada pelo pendor , ou declividadé de hu-
ma taboa vertical inclinada^ Por esta simples má-
quina hum preto descarna hum alqueire de Café
em hum minuto. A polpa , e o grão , envolto ain-
da na sua aralha , ou pellicula interior , cahem juri-
tamente. Passa-se então tudo por peneiras de arame,
onde se lhe separa a polpa das sementes , e estas
se vão immediatamente estender ao Sol , para se sec-
carem.
Dividem-se as opini6es acerca destes dous me-
thodos de preparar o Café entre os Lavradores. O
ultimo he tão proveitoso , como expedito ; mas
não duvido que o primeiro haja de dar hum Café
de melhor sabor , attendendo-se que a fermentação
occupa sempre algum lugar , quando o frucío crii
se
1
( 22 )
se p5em amontoado , ou nas plataformas , poupan.
do-se mnis a despeza de huina casa. O Cafc azul
esverdeado , que na America se reputa peio me-
lhor , he olhado por causa da sua còr , pelos Ne-
gociantes de Londres , como tendo hum sienal de
não ter sido suficientemente preparado. De ambos
os methodos se pôde ter hum Cafc muito bom .
com tanto que se Jhe permitta o socccrro da ida-
de, que o faz muito melhor.
Até aqui expuz somente o Engenho de descar-
nar : resta-nos ainda a operação de o estonar , ou
de lhe tirar a aralha , tona que veste immediata-
mente o grão , e existe ainda ao depois de se lhe
despojar da polpa. Isto se executa por huma má-
quma , que pôde ao mesmo tempo esbulhallo da
polpa secca , no caso de se ter admittido na sua
preparação o primeiro methodo , o que seria mui-
to mais expedito , do que pelo pilão , e suas
jnãos.
O Engenho de estonar consta de hum eixo per-
pendicular , rodeado em alguma distancia por hum
vaso de madeira redondo , em que se põem o Ca-
fé ; e quasi hum pé acima do livel da superfície
do vaso commummente estão quatro braços hori-
zontaes , ou vassoiras encaixados no eixo , e que se
alargão fora do vaso hum pé , e neste estão 4
rollos appropriados a correr pelo vaso , andando-se
em roda com os braços, e com o eixo, o que st
faz
f{i? com miis jungidas iia extremidade. Os rollos que
são de hum pezo considerável , movendo-se a roda
no vaso , estonão , e amolgão as aralhas do Café , o
que he bastante para serem aventadas pela joeira,
ainda que lhe haja de ficar alguma porção por aven-
tar. Quando se vê suíficientemcnte estonado , se ti-
ra fora do vaso , e se põem na joeira > na qual lhe
tira toda a granca da aralha , e as que , não forão
estonadas , se escolhem nas joeiras , e se tornão a
lançar no Engenho , o qual pode alimpar mil e
500 arráteis de Café por dia.
Aqui se dá outro modo de preparar o Café
com a polpa , e sem ella por meio de estufas. Es-
te he practicado por mui poucos Lavradores; por-
que em primeiro lugar requer hum grande , e cus-
toso apparelho : em segundo ; porque a fumaça dá
hum cheiro , e gosto desagradável ao grão. Não sei
que esta asserção seja verdadeira , mas sim que não
ha cousa alguma , como o Café , que tenha a pro-
priedade de apanhar mais o gosto , e cheiro de tu-
do , quanto se lhe poser ao pé.
E por esta mesma razão he de grande conse-
quência este ponto , em que se deve cuidar , quan-
do se embarcar Café para Europa , não o pondo
em parte alguma do navio , em que possa receber
eflúvios de qualquer outra carga , que trouxerem a
frete. As sementes do Café ( diz Mr. Moseley) são
notavelmente arriscadas a embeber-se das exbalaçces
de
' llV'
,1 '
Cm)
de outros corpos ; e por este motivo su-eitas apa-
nhar hum tal gosto, que lhe he inteiramente es-
tranho , e desagradável. A agua ardente de cana ,
(Rum) posta junto ao Café , dentro em pou.o tem-
po lhe communica tanto aos seus grãos , que sum-
inamente arruina o seu gosto. Qualquer carga de
pimentas da índia (diz Miller) embarcada com o
Café , em poucos dias o despoja do seu gosto.
Estas poucas observações he tudo, quanto me
occorre a respeito do modo de cultivar , e prepa-
rar este famosíssimo grão , as quaes concluirei com
huma breve relação das despejas , e lucros relativos
á sua cultura , com o que pertendo que se anime mais
a sua industria , em ordem ao augmento da popu-
lação branca do Paiz das Ilhas Occidentaes , do que
com algum dos outros seus géneros commerciaveis ,
por ser o rendimento do Café muito mais i^ual , e
certo do que o de alguma das outras plantas T que se
çultivão ; e o seu lucro muito maior em propor-
ção do capital empregado.
Talvez não faltará, quem argumente contra , di-
lendo. Se o f:icto fosse verdadeiro , a sua cultura
teria sido maior em as Ilhas das índias Occiden-
taes ? Esta objecção foi anticipadamente respondi-
da , quando se fallou dos pezados tributos , e di-
reitos . que pngavão na Grã Bretanha até o anno
de 1785. O que ordinariamente se diz : que os di-
rçitQs impostos nos géneros importados cahem so-
bre
i
C^5)
bre o consumador , e não sobre o lavrador , (nSo
ha cousa inais falsa) nada prova; porque, se em
consequência dos direitos , o preço do género sobe
a hum ponto tal , que o Negociante o deixa de
comprar, o género do Lavrador fica por isso mes-
mo sem sahida ; e abatendo se elle em si mesmo,'
como pôde deixar de ser iguahnente ruinoso ao Ne-
oociante, e immediatainente ao Lavrador ? Não pô-
de liaver cousa alguma mais clara, e evidente do
que ; que a cultura deste artigo estava grandemen-
te opprimida pelos impostos da Grã-Bretanha, Is-
to claramente se conhece , quando se compárão as
differentes quantidades, que se levavão a França,
e a Inglaterra. O total do importe annual , que se
exportou a Inglaterra dentro em 5 annos(i7 8j
e 17S7) não excedeo 5 milhões e €00 mil arrá-
teis , quando somente a Hespanhola , ou S Domin-
gos produzio hum provimento de anno , acima de
70 milhões de arráteis.
2." Claramente apparece que , desde a reduc-
ção dos impostos de 1783 , a cultura do Café nas
Ilhas Occidentaes ínglezas tem tido hum rápido
adiantamento , (em Jamaica particularmente) o qual
não tinha tido ^c annos antes. A pezar porém de
não se ter por esta reducção (como observa o Dou-
tor Moseley) abatido , quanto deveria ser ; porque os
direitos de 6 penicos por arrátel ainda estropeão es-
te género j porque estorvão que o uso desta be-
bi-
I
(26)
bida tão fragrante se faça mai. geral a todas as cias-
ses dop3vo. A de.lucção deste direito deve vir desde
oprnneiro te;npo , e.n que foi posto , e o da sua
contnmaçáo. cjue não excede o de 50 annos. Náo
Ii^ tao grande a Sciencia do Commercio das Coló-
nias . q.e não possa ser eníeadida , ou reflectida
por qualquer 1
Calculo das dcspezas , e lucros da Cultura do Café
nos montes de Jamaica , distantes domar 14 m;-
lhas em o papel moeda desta Ilha , com o
abatimento de 40 por 100 menos que
as esterlinas,
Pe:o i/- dinheiro de terras de montes , Cjoo
geiraO re^ervadu hu.na terceira parte pa-
ra pa«ae: . e logradouros. L. j. por acre. 0^900
P. .00 escr. a 701. por cabeça. - . 7^000
P. 20 mus 1. aS. - - « L
1-. lidi.icioí , trastes , maquinas , feiramen^
tas do? pretos. -• - - « « ^
i> c . - - - 2<ioco
í'. i>ustento dos escravos no i.° anno , an-
tes de colherem mantimentos, fora ou-
tras d«spezas annuaes, carregadas adian-
te. ---..,. ^ ,
To 'ai. loç^ 9 60
Os
C 27 )
Os juros deste dinheiro em 5 annos , em
quanto se não tem algum lucro - a 6
por 100 --------- 2^091
Total L. Má^osj
Vcspezfis annuacs,
P. Hum feitor branco, e seu sustento. ^200
P. Outro branco Subalterno. — - - ^i^oyo
P. Botica , provimentos de boca , vestiaria ,
ferramentas , peixes , e carnes salgadas , e
outras provisões além das da fazenda. ^^^225
P. Tributos Coloniaes. ----- ^loo
(í)595
Total de 3 annps antes de algum rendimen-
to. ---------- i<Í)78$
Juros.- --------- ^221
Total da despeza L. 1 5^^059
( 54:21 2 çj) 400)
X^ucros àc 4 annos « L. 4 yor quintal, (^Es-
te foi o preço do Café 5 annos antes
de 1792.)
P. 45 mil arr. de Café novo (he o que se pô-
de esperar em 4 annos de 1 50 geiras plan-
tadas.) -- -------^ i(^Soo
De-
C ^s )
Deduzidas as despezas de 4 annos. 595
Suecas , &:c. - - - - «
40
èí^JJ
Liquido - - L. i^i6>
Sao iguaes a L. 7 14.8 por cento no Ca«
pitai'.
Recompensas do ^P anno , c seguintes.
P. 1 5 O geiras que produzem 7 50 L. por gei-
r^. - ii2á)Soo, em L. 4. . T. 4^500
Dedu2iado-se os encargos annuaes , como
,''''''' - 595
^^'^^^^' ^ - - 80
Rí'paros das fabricas, ou máquinas. 100
Lucro liquido (igual a 241 por 100 no
Capital )----.-.«»L
(í 3:410^000)
Nota.
Observar-se-hia na primeira edição desta obra , que
cu estava obrigado pelos cálculos dados nesta , c
nas duas paginas antecedentes ao meu bom amigo
Samuel Vaughan Esq. da Freguezia de S. Jaimes em
Jamaica , e Membro da Assembica desta Ilha , que
se tinha applicado á cultura do Café com grande as-
siduidade, ebom successo. Elle me fez o mimo das
seguintes Observações interessantes , que com mui-
to grande gosto publico.
OB-
'TÈÍ.
(29)
OBSERVAÇÕES
PERTENCENTES A CULTURA
DO
CAFÉ,
EM A ILHA DE S. DOMINGOS,
E do seu augmento provável em Jamaica , no caso
ds não ser abolido o negocio dos Escravos pe-
lo acto do Parlamento »
POR
SAMUEL VAUGHAN e.?.
J\. Parte Franceza da Ilha de S. t)omingos ex-
portou em 1770 cinco milhões de arráteis de Ca-
fé ; em 1784 por causa de hum premio de 40 L.
por tonnelada , que se concedeo aos navios , que
lhe levassem escravos; e em 1786 por outro pre-
mio de 200 L. por cabeça de escravo , que se trans-
portasse a esta Ilha. Chegou a somma destes a au-
gmentar-se annualmente de 12 a i? a 25 a jo mil,
e por eífeito desta augmentação de Africanos tra-
balhadores , a Colónia fez hum progresso mui rá-
pido em todas as suas culturas , mas creio que a
do Café a tudo excedeo -, porque a exportação des-
■• " te '
C ío)
le artigo cm I789 se augmentoii acima de 7Ó mi-
Jiiões de arráteis , c;iie avaliadas pelo preço actual
(90 xel. por quintal) chegou L. 3:420<iooo. Des-
ta tão ampla exportação não menos que 2j mi-
IhÓes de arráteis (valor L. 1:250^000 esteil.) fo-
râo produzidas entie os annos de 1786 , e 1789-
e se presumia que , a não ser embaraçado pelas per-
turbações actuaes da guerra , deveria che.crar a 80
milhões , tão pouco o abatimento , tido no preço
da quantidade trazida a vender-se nos mercados ,
affectou a cultura. Parece provável que o excessivo
valor do Café de Moca , e o do Oriente deo oc-
casião á antiga prohibição do uso desta bebida ,
entre a media , e Ínfima classe do povo na Euro-
pa ; por quanto a quantidade colhida unicamente
na Ilha de S. Domingos era tão grande , o aug-
iTiento da sua cultura tão rápido , e o preço d^o
Café das índias Occidentaes , (de 2 xel. e 2 d. por
anatei menos cue o de JVloca) tem até agora con-
tinuado , no tempo da maior exportação , cm tão
rendo>o estado para o Lavrador , que he difficil
cxpollo. Mas por estes factos se deve suppõr que
seaugmentou hum povo novo, e numeroso de con-
summadores. Isto supposto he embaraço.o antever
até que ponto a cultura deste artigo pude chegar
nas índias Occidentaes. Não bastaria dizer que se-
ria igual a doassucar: pois não e>tá p'0\avelmen-
te no caso do assucar , de poder ser diminuído pe-
la
m
C jO
Ia importação da índia Oriental , visto que a pe^
2ar disso presenlementç a sua pasmosa iiupoitaijcia
nas índias Occidentaes , riv alisa assim as índias Ori-
entaes , como a Levante. A diminuição da cu:!rti-
dade do Café produzido em S, Pcmingos (acima
de mil fazendas de Café destruidas) não pede dei-
xar de ser sentida notavelm.ente nos annos futuics;
porque muitas pessoas desta Ilha são de opinião
que a exportação será reduzida a menos da ame-
tade , (vem a ser 4 milhões de arráteis) suppondo real-
mente que a presente rebellião se terminara sem
ulteriores devastações. A exportação de tcdas as
Colónias Inglezas em 17 H7 não chegou a 4 mi-
lhões de arráteis , e por consequência (exceptuando
as novas culturas) não pode supprir a falta oc-
casionada pelas perturbações de S. Domingos ; nem
o resto das índias Occidentaes está na possibilida-
de de o fazer ; porque desde estas afflicçoes em S.
Domingos se augmentou o preço de tal soite , quê
chegou a hum quarto ir.ais , isto he de 70 a 90. Es-
te avanço de preço virá ( se não for Lopeado pe-
lo accrescentamento de rovos Direitos , como an-
tigamente) a ser hum premio para tcdas as Ilhas
das índias Occidentaes , onde ainda se achão mon-
tes incultos ; e , como se não poderá continuar a
cultura em S. Domingos por algum tempo, confor-
me a sua antiga extensão , he provável por varias
razoes que este premio ccnseguirá íixar a sua pri-
i mei-
C Jí )
mejra consistência. Concedido isto a Jamaica ; a ex-
portação antecedente 31785 não excedia a 850,000
arráteis , sem embargo das medidas tomadas pela
Assemblca pa-a animar a sua cultuia. A reducção
da alcavala a ó^ d. por arrátel , principiou em 178^,
e parece que immediatamente influio ; porque , no
quarto anno depois deste succevso , quando apenas
naturalmente se deveria esperar algum signal deste
cffeito , se conheceo hum grande augmento de ex-
portação , e em trez annos mais ; o producto qua-
si treídobrou , chegando ao excesso de 2 milhões,
e hum quarto. Estavão nesta situação , quando prin-
cipiarão os distúrbios de S. Domingos. São passa-
dos 16 mezes do principio desta rebellião , e pe-
las respostas dadas de muitas Freguezias , se mos-
tra que 2 1(^011 escravos se achão empregados na
cultura do Café em Jamaica. Eu quero suppor con-
sequentemente que hum quarto destes podem ser
occupados em outros objectos, que tenhão conne-
xão com o Café; e que hajão de ficar 15^759 es-
cravos applicados somente em sustentar esre artigo,
o qual , segundo o calculo commum , quando as
plantas estiverem no seu perfeito crescimento (em
1797) poderão dar o rendimento de quasi 16 mi-
lhões de arráteis , que he dezoito vezes mais do
que rendia em 178 j , e sere ve7es mais do qiie
110 ultimo anno Póde-se ainda accrcscentar a isto ;
Que as terras baixas de Jamaica tem ja cstabele- .
ci-
Cu )
ciitientos ; e que as terras altas , fallando geral-
mente , são impróprias para o assucar , porém boas
p:ira o Café. Elias são novas , e [azem quasi duas
terças partes de Jamaica : toda a Ilha esta nova-
mente atravessada de estradas , Sic. &c. Em poucas
palavras ; tudo está piompto 3 e o tempo he o mais
próprio a esta empreza.
Por todas estas circumstancias , tomadas collec-
ti vãmente , he razoável concluir , que , se os traba-
lhadores houverem vir de Africa por preços mode-
rados , e cómmodos ; e , querendo-se aproveitar as cir-
cumstancias do tempo presente , poderíamos estabe-
lecer huma muito extensiva plantação de Café etn
Jamaica , a qual , como hum género de exportação^
seria de hum grandíssimo proveito para a Grã-Bre-
tanha ; e que talvez excederia em vaior ao género
do Assucar. Mas este novo , e importante Commer-
cio depende absolutamente da importação dos es-
cravos. O augmento da Cultura do Café , ao ponto
que aqui se aconselha , he na occasião presente de
huma particular consequência por outros dous mo-
tivos , ou pontos de vista 1.° ; porque augmentará
o número da classe mediana de brancos , os quces ,
ainda que não sejão ricos demasiadamente , para vi-
verem em hum Paiz distante, com tudo tem ri-
queza sufficiente para viverem com independência ,
e abastança, e tratarem suas famílias com fartura
competentemente , residindo nas suas próprias fa-
G zen-
( 34 ;
zendas . ou granjas. 2.^ As fazendas , ou sítios dos
montes , sendo iiiais saudáveis , geralmente augmen-
13 mais a população dos pretos , do que as terras
baixas. A primeira circumstancia augmenta a nossa
segurança , tão necessária presentemente ; e que , em
todos os outros periodos , debalde se esperaria con-
seguir por outros meios. 2.° porque manifesta hum
plano da abolição do Commercio de escravos , o
<]ue em breve tempo por causai naturaes , pouco a
pouco , se conseguiria , sem dar motivos de justa quei-
xa a qualquer corporação humana.
EX-
C)55
TRATADO
SOBRE A CULTURA
D O
CAFÉ,
1» o R
Mr. m o n e r e a u.
J)c!cripção desta arvore , e de seu preparativo,
O E escrevesse em Historiador convir-me-hia co-
meçar pela origem do Café , mas isto seria que-
rer ir muito longe , sahir fora da minha esfera »
e repetir cousas , que d mais de 20 annos escre-
vem huns sobre o testemunho de outros ; e nas
quaes a verdade , e o falso fazem huma agradável
mistura. Julgo que importa muito pouco 1 aos que
lerem esta Memoria , què o Café nascesse no fundo
da Arábia , ou na extremidade do pólo árctico ; «
que as cabras fabulosas do bom P. Labat fossem ,
as que o descobrissem. Isto não he , o que in-
teressa o meu projecto , mas unicamente o que he
iitil ; e por isso me cingirei só a dizer o coiiio ,
e quando nos veio,
C i3 Se-
'.ir'
C !6)
Segundo a vóz mais comnnim , somos respon-
sáveis aos HoUandezes das primeiras arvores do Ca-
fé ; porque elles forão os primeiros que se lem-
brarão de o cultivar em Batavia , e de, ois em Su-
rinam , e passados alguns annos , os vizinhos de
Caiena o cultivarão com hum successo maior que
as suas esperanças. Em 1722, por occasião de hu-
ma viagem que Mr. De la Mote Aigron , Tenente
«le Rei em Caiena , fez a Siirinam , Colónia Hollan-
deza , a 24 léguas de Caienna , para negócios do ser-
viço, que não são do meu assumpto , vio as arvo-
res do Café , e soube o modo de as cultivar , e
só lhe faltava ter plantas ; porém era prohibido de-
baixo de pena de morte vender , ou dar hum só
grão aos Estrangeiros , que não fosse secco. Elle
porém o conseguio por meio de hum Francez re*
fugiado em Surinam ; e foi também succedido na
sua empreza , que já em 1724, e 1725 havião em
Caiena mais de 60 mil pcs de Cafés , que produ-
2Íão : em 1726 começarão a dar em xMartinica ; mas
estes devem a sua origem a dous pés de Cafés que
vierão do Jardim do Rei de Paris , de cujos os
Senhores HoUandezes tinhao feito hum mimo ao
Bei Luiz XiV. de gloriosa memoria. Pouco tem-
po depois os teve S. Domingos ; porcue me lembro
de os ter lá visto em 172S , mas então só tinhão
alguns pés nas hortas dos curiosos. Ora aqui tem
multiplicado por tal modo, que se tem feito gran-
jas.
\
jxs. Os vizinhos de Dondon , 7 P^ra S léguas do
Cabo , forão os primeiros , que o cultivarão j e que
se enriquecerão com elle. Hum certo Gascao O
homem jovial , como são todos os de sua Nação ,
chamado Dupaits , fez huma fortuna das líiais bri-
lhantes dentro em muito pouco tempo , bem que
só principiasse com 5 para 6 pretos. Passou para
França , quasi 10 annos depois , deixando a sua fa-
zenda com o número de 100 pretos. Hoje não ha
fazenda alguma nos montes , em que não hajão
plantações de Café, á proporção dos pretos de ca-
da-hum ; e teiião lugar de esperar alguma fortu-
na, se os commerciantes presentemente tivessem a
felicidade, que tiverão os primeiros, a saber, os
avances dos pretos , que lhes fizerão , a medida que
os Cafés fa7Íão progressos , tendo-Ihes o longo cré-
dito facilitado pagar os pretos com o seu próprio
trabalho. Hoje isto está mudado , e bem differente
do
(*) Cito a este por preferencia , per ser hum dos
primeiros que o plantarão, e por se fazer huma for-
tuna tão rápida que foi admirada de todos', mas os
pretos , que lhe fiarão , não contribuirão pouco ; porque
com hum pequeno número destes , pòde-se os dons pri-
meiros annos plantar , e entreter seis véus tantos
Cafeselros , quantos se poderlão colher. Ora , ^^^"^"'
do elles são rendosos se afianção escravos suficien-
tes para os colher , nÕo será dificultoso de se enri'
(juecer : eom este avanço se emprehende o dobro , e
successivamente S6 vm m estado defaur huma for-
tuna rápida*
( íS )
do anno de 1753 ; porque sem dinlieiro de conta-
do nada de escravos ; e ainda por preços bem ex-
orbitantes , a 15C0 para i6co Jivras cada hnm , pa-
ra isto he preciso dar hum terço á vista , e o mais
fiado , dahi a } mezes debaixo de boa , e suíficien-
te caução , de modo que se faz preciso que o prm-
cipiante tenha huma grande economia , para p'oder
adiantar-se ; e por pouca familia , que tenha , pôde
contar o trabalhar até a velhice.
Com tudo os progressos de huns causão emu-
lação aos outros : qualquer prepáta a sua terra com
tanto ardor que he provável que dentro em pou-
co tempo todos os montes habitáveis estaráõ co^
feertos de cafesaes de Café ; pois que diariamente
se rossão novas porções. Será ao depois a sua abun-
dância tão grande , que , justamente se pode recear,
haja e\\G de descer a hum preço mui baixo. Fal-
samente se pensa que, ainda não valendo mais de
8 para 10 soldos ao arrátel , não deixaria de fazer
conta. Eu aconselharia a sua cultura a hum peque-
no número de vizinhos , que o fizessem grandemen-
te , por estarem ao pé da Cidade , aos quaes as
conducçdes , ou carretas custão muito pouco ; por
lhes serem mais fáceis , tendo carros ccSmmodos ,
e a facilidade de carretas ; mas os que morão em
distancia de 1 5 a 20 léguas do Porto ; e que tem
de passar 5 para 6 léguas de montes, quanta des-
peza não devem fazer , para terem o número de
( 59)
animaes competente para as cargas , que ,á tem su-
bido a hum grande preço , e c^ue cada dia se fa-
z-m caras de mais n mais 5 Quando se calcula a
carcra de cada cavallo , se acha que só leva ijo
arráteis de pezo , ainda que a viagem seja curta : a
déz soldos por arrátel são 7 5 livras pelo carreto da
car<^a : accrescente-se a despeza da passage , a com-
mirsão a ^ e 4 por cento : attenda-se a estas de-
diiccoes , augmentem-se com a perda dosanimaes,
e facihnente se desabusarão do erro , em que estão .
de que basta , para se ser rico promptamerlte , pos-
suir hum cafesal ; e disto, ainda não lembrando por
hum instante as avarias , a que os Cafeseiros são su-
jeitos , facilmente ficaráô convencidos.
Mas íisonjeão-se seinpre , e o Francez he mais
en<^enhoso cue Nação alguma em engrossar os ob-
j^aos 5 pois nenhuma goza de huma imaginação
mais rica que elies. Apenas calculao o rendimen-
to de hum certo número de pés de Cafés , culti-
vados por huma certa quantia de escravos , quando
já se contemplão senhores de huma renda fixa , co-
piosamente proporcionada as suas faculdades ; por-
que tudo iulgão proveito , e nada perda. E no fim
da conta o que acontece ? O mesmo que ao Mer-
cador de vidros , que se refeie no livro Mil c huma
noite.
?or tanto he preciso convir que a cultura do
Café tem cevos bem attractivos : seus princípios to-
dos
(40)
dos parecem de ouro ; a facilidade , com que se cul-
tiva , he encantadora : o seu proíjres^o não menos :
a quantidade , c)uc se pôde manter com hum pe-
queno número de pessoas , o faz respeitar como
a renda mais sólida , cue custa menos , e que apro-
veita mais; e nisio he mui singular que muitas ve-
zes assim he ate o momento da sua colheita : e
então se vem a conhecer seu erro ; muitas vezes es-
tas ricís pioducçóes se eclipsao , e estes bellos pés
de Cafés , que promettiao tantos , e quantos , amea-
Çáo ruina desde o seu primeiro producto.
Tenho visto muitas vezes acontecer esta sorte
de accidemes a muitos fazendeiros , e mui com-
mummente ; e eu mesmo não fui exceptuado des-
ta regra absolutamente. Nao ha cousa alí;uma . que
não precise da experiência , para obviar as conse-
quências. Este fatal accidente provém da pojição
dos Cafés muitas vezes , e outras do terreno . que
Jhe não he próprio. Não sou da opinião de alguns,
que dizem : que toda a terra lhe he própria ; e com
especialidade a mais magra, conforme os sentimen-
tos ào V. Labat. 'Sempre vi os mais bellos cafesei-
ros em as melho.es terras, o que he assas visível.
Acontece também que hum certo insecto chamado
iVlahocat ( insecto que faz morrer o Café ) ( * )
in-
(*) Ao Jim se dúVii a hl
stovui
■sle insecto.
(40
imensivelmente os mata. Para esta scite de acci-
dentes não ha remédio; porque, quando se perce-
be , já não he tempo , a raiz mestra , ou por ou-
tro nomç., o espigão , está damnificada , e isto só se
pôde conhecer , quando o tronco começa a resen-
tir-se. ou a murchar; e que já não he tempo de
remediar. Outros morrem , sem se poder conhecer
a causa. Eu todavia tenho salvado a muitos, fa-
zendo cortar a duas poliegadas abaixo do lugar ,
em que a arvore começava a seccar , o que ord ina
riamente começa na extiemidade do tronco ; e quan-
do se lhe separa a parte accommettida , o pé tor-
na a tomar a sua força com vi^^or , lança novos
garjos pelo nó , em que foi cortado ; mas he pie-
ciso ter cuidado de parar estes renovos na altura , |
em que se peitendem , que hajão de ficar. í
Á pouco se descobrio outra espécie de insec-
tos , ch?iwàáGS Haneíons , que tem o focinho com-
prido, e pontudo , guarnecido por cada lado de ser-
ras , que tinhão feito estragos formidáveis nos Ca-
íeseiros. Foi huma felicidade que isto não teve con-
sequências ; e elles desapparecêrão quasi no mesmo
tempo , em que forão presentidos ; este insecto fa-
zia a mesma manobra, que os bichos de tubos,
furava o tronco da arvore debaixo para cima , e
o fazia tão òco , como pôde ser o cano de huma
espingarda , sem que a arvore parecesse , que se re-
sentia em parte alguma deste successo ; mas ao me-
nor
nor embah;nento do vento se quebrava j e esta foi
ã causa de se descobrir o insecto. Muitas vezes se
achavão em cada tronco 12 ate ij, e cada hum
com seu alojamento particular , e cavavão até sa-
hirem pelo picoroto da arvore , para ao depois se
hirem alojar em outro pé , ou planta mais vizinha.
Elíes somente accommettião os cafeseiros novos de
hum até dous annos , cujo lenho ainda estava ten-
ro, e a medulla ou miolo fácil de se penetrar ; e
jr.mais procuiavão as arvores mais velhas. Não hou-
ve outro remédio para fazer parar o progresso des-
te mal , senão cortar o pé do Café duas pollega-
das acima do livel da terra , e destruillos pelo fo-
;^o , fazendo queimar os ramos : por este meio se
IhQs embaraçou a propagação, com o atraso de iS
mezes do rendimento dos Cafés cortados.
Também se não dtvem figurar que os Cafeseiros
sejão nos morros de huma longa duração ; porque
a trez annos de huma abundante colheita se se-
gue a esterilidade ; e aouelles , que tem escapado
aos accidentes , a que são expostos , e sujeitos , só
produzem mui fracamente , e nas franças , ou pon-
tas dos ramos.
€s
( 40
§ II. Os terrenos dos morros sÕo de pouca
1» duração.
A evidencia he clara í a queda das aguas da
chuva arrastra comsigo a superfície da terra , a de-
grada , e faz alvares , ou fossas que a fazem n agra,
e estéril : para substituir esta perda , nos vemos obri-
gados de plantar hum certo número todos osan-
nos ; e por esta sábia previdência , e cautela sus-
tentamos cm proporção os nossos rendimenios em
iiespeito das perdas inevitáveis , que padecemos.
§ lU, Meios de conservar o terreno,
He fácil de se conhecer , pelo que se acabou de
direr, que o terreno dos morros não são de lon-
ga duração ; e por isso para se lhe prolongar o go-
20, se faz indispensável prohibir aos escravos barbe-
char , ou arrancar as raizes das arvores , que lastrão
sobre a terra , e totalmente se entrelação ao depois
das derribadas. Esta precaução he de huma grande uti-
lidade , para a conseívação da terra. Fm quanto as
raizes subsistirem , as aguas não farão preza na ter-
ra ; e por este meio os pcs de Cafés tem tempo
de crescer , e de cobrir a seu turno as raizes ; e a
terra , que as rodea , antes da inteira consumação
das outras , o que lhe dá lugar de icsistir alguns
annos mais.
For
§ IV. Porgite senão devét mondar e enxada.
Não se deve jamais mondar a enxada; porque
em cahindo a menor gota de chuva , e achando a
terra cavada , a arrasta comsigo , e se acha gasta ,
antes que a arvore tenha tempo de fructificar.
Os que nos dizem que o Café não he dtlica-
«2o , só o terão visto passada a sua primeira , c
segunda colheita. (O He verdade que , antes da sua
producção , vem com huma pressa , e com huma
belleza admirável , ainda em má terra ; mas a quan-
tidade de fructos , que produz , o acanha , senão he
soccorrido por huma boa terra , que lhe possa dar
Jii.m sueco proporcionado , ou sufficiente , para o
poder nutrir sem alterar o pé.
§ V. Segredo do P. Lahat,
O P. Labat nos ensina hum segredo admirável,
para prevenir este accidente ; mais cuido que não
achará muitos partidistas. Aconselha de fazer cahir J
ametade das flores , para aliiviar o pc de Cafc. Qual 1
C ) Mtutas vex,es a segunda colheita decide da
sua serie , quando o Cafeseiro lhe restste , e^ta salvo,
lambem começa a dcscahir na terceira ; o excesso do
yrodncto da precedente colheita , tendo enfronnecldo o
pe dará nuu pouco o anno sc^ainíc , c lhe da luzar
úc ttniar novas for^^as.
C 45 >
seiá o granjeiro de Cafés , sempre ambicioso de aii-
gmentar as suas rendas , c^ue queira diminuir hu-
Tna ametade 5 e ficar em dúvida da outra. Seriam
realidade iium imprudente em fazer antes , o que
ao depois farão os furacões , e vendavaes , que sem-
pre lanção em terra , ainda antes de sazonados , hu-
ma quarta parte dos fructos.
5 VI. Meios de conservar os Cafcseiros,
Eu creio que o remédio mais efficaz contra es-
te m^l , he de manter o pé de Café em huma cul-
tura proporcionada á qualidade do terreno , que oc-
cupa : em hum terreno medíocre somente j pés >
(e talvez seria melhor dous e 1) em huma terra
profunda a 4 ; em huma boa a 5. Quero ddr a
razão disto ^ e me lizonjeo que entrarão nas mi-
nhas vistas com approvação. Embaraçado o cresci-
mento do cafeseiro , todo o corpo da arvore de-
ve necessariamente receber huma maior nutrição ;
a seiba , tendo muito pouco que subir , os ra-
mos não podendo multiplicar-se mais , se conver-
terão em huma espécie de madeira tão sólida , co-
mo o seu tronco ; a arvore dará menos fructos , e
os ramos , achando-se sem meduila , estão em estado
de poderem resistir ao pouco , que produzem , o
que deve incontestavelmente conservailos. (*)
( * ) ^í) depois de escrever esta Memoria , fi% a
experiência com todo ç accccsso que esperava»
(46)
5 VII. Modo de aparar os Cnfesciros,
Cada hum faz esta obra , como quer . ou com-
ino lhe parece. Al^^uns pertendem que se deve den
xar dar a sua primeira colheita , o que he hum
abuso. Em quanto a mim , Jo^2o que o Cafeseiro
houver de chegar á altura , que acabo de dizer ,
se lhe quebra a extremidade do tronco , que he
niuiro tenra , o que o impede de subir , e dá lu-
gar ao<? ramos de se estenderem em cumprimento,
e largura , e de muhiplicarem os seus garfos. Esta
operação transforma a arvore em huma bella rosa ,
despegada de hum supérfluo incómmodo , não fica
sobrecarregada , consequentemente seus fructos saa
muito melhor nutridos , e menos sujeitos a cahir.
Ainda lhe resulta outra avantajem , que he a com-
niorlidade da colheita , que se poderá fazer , itm
quebrar os ramos , como acontece , quando se dei-
xão crescer livremente j e que tem o tronco tão
fraco por falta de substancia ; pois o pezo dos seus
fructos baífa , para fazer pender , ou inclinar to-
da a arvore , e achando-se opprimida da sua pro-
pria carga, morre no tempo, em qut prometti*
mais.
D«-
(47 )
§ Vni. Declinação da arvore.
A medida que a arvore envelhece , cessa a abun-
dância , e o seu fructo se faz melhor , e mais esti-
mado. Comprehender-se-ha talvez que vem mais
grosso ; porque produz pouco : mas pelo contra-
rio , he totalmente pequenino , e nisto consiste
a sua bella qualidade; ^ tal pé, que na sua se-
gunda colheita dera dous arráteis de Café , na sua
quinta colheita dará com dificuldade apenas hu-
ma quarta parte. Passado este tempo , só dará de
dous em dous annos , revezando hum anno menos,
e no outro mais : Sobre este fundamento he fácil
de conceber que nós devemos ter muito interes-
se de lhe multiplicar o número todos os annos , pa-
ra prevenir o detrimento , ou descahimento delles.
5 IX. O Cafc pede terra nova.
Requer também ser plantado em terra virgem,
ou como nos explicamos nas Ilhas em matos no-
vos. Perdcr-se-ha tempo , plantando-se em terrenos,
que já tenhão servido. Náo ha algum, que r,o de-
pois não produza; mas he certo que morrerá des-
de a sua primeira novidade ; ou , quando tarde , em
a segunda. Isto parece contradictorio aos princípios
do P. Labat ; mas por isto se não julgue que elle
não
C48 )
não he exacto ; por quanto o teinpo , em que ellc
escrevia , era aquelle , em que se principiava esta
cultura j e ainda senão tinha tido iu:;ar de se jul-
gar pela experiência : e se estava expono a ser en-
ganado por ellas ; pois que , plantando se em qual-
<]uer terreno , nasce ; e , em quanto não produzir , o
Cafeseiro se apresentará bello ; mas ficara cansado
desde a sua primeira produccão.
§ X. Diferença dos terras entre Martinica ,
e S. Domingos.
O P. Labat falia das terras de Martinica , e eu
das de S. Domingos , e pôde muito bem ser , quan-
do muito , que aquellas hajão de ser melhores do
que estas ; e parece provável que isto assim seja , se
cá nos morros fossem derribados em o mesmo tem-
po que nos de Martinica , he notório que haverião
já muitos annos , que elles para nada servirião , e
isto está comprovado por huma experiência formal.
Porque , se quizessemos reformar hum Cafcsaí no
mesmo lugar , em que elle está plantado , certamen-
te perderiamo»? o trabalho, e o tempo j e quando
muito , o que nelle se pí^de plantar , he mandio-
ca ; ou ainda reduzillo a máo pasto , ou logradou-
10 ; porqu? nos morros não ha algum , que pr'c's^te.
( 49 ;
§ XI. Café de Martinica preferido ao de S. Dú"
mingo s.
O terreno de Martinica ^ sendo melhor sem
comparação que o de S. Domingos, (*) não lie
admirável que o seu Café seja mais estimado : e sem
dúvida ; porque recebe huma substancia , que lhe
he própria ; e que o põem a par do de Moca ; e
quando não houvesse outra causa , maisdoque a
antioruidade das arvores , lhe concederia de boa von-
táde a preferencia sobre os nossos : em quanto pre-
sentemente lhe pertence o direito ; mas talvez que
os cuidados, que os vizinhos de Martinica empre-
oão neste grangeo , cultivando e seccando-o , haja
de contribuir muito. Neste, ponto tenho de censu-
rar a muitos dos nossos acerca da sua negligen-
cia a este respeito : porque o que só quetem , he
D ven-
(*) Temos certos bairros em os nossos montes que
são de pedra calcaria : estes íerrevossSo seme-
lhantes aos de Martinica: aterra he profunda ^ tão
boa em baixo como na siiperficã : o que ,a faz. ser
multo durável ; m^as esta qualidade de terras mio he
commum , e sò se encontra nas encostas dos montes
que olhão para o mar ; porque , subindo- se ao cume das
montanhas , não se encontra pedra calcaria , e por
acaso em algumas baixas , se bem , falíando propria-
mente , são de hum tártaro , formado pela corrente das
a fruas*
( 5o)
vendello , e de nada mais cuidão. Conheço que com
isto não os obsecjueio , menos merecerei os seus
suffragios , mas a cue fim o fa7em desse modo ?
Só quero a approvação , dos que pensão bem , e
não me embaraço com a censura do resto Só se
poderão dar por ofFendidos , os qi:e se acha: em nes-
te caso. Oxalá que esta pecuena liberdade houves-
se de fazer alguma impressão sobre os seus espíri-
tos ; e que , por huma louvável vingança , houves-
sem de despregar os olhos acerca da sua indolên-
cia : eu me daria a mim mesmo os parabéns. Ha
espíritos que requerem que se lhes falle a vei-
dade.
S -^í^» Qualidades notavas dvs seus ha»
h'ttant€S,
Consequentemente devemos concordar que to-
dos os nossos vizinhos, geralmente fallando , são
muito laboriosos emprendedores , generosos , e ma-
gnificos ; elles se apaixonarão no caSo de se verem
excedidos pelas outras Ilhas sobre este assumpto,
(Não responderei , se acaso alguma vaidade se mistu-
ra nisto.) Al^urmas vezes , o que parece negligencia,
he hum puro effeito da impotência. A falta de
iTieios , e de forças necessárias , para o arranjamen-
to das suas grangearias , obrigão a hum grande nú-
mero de habitantes a pararem nas suas primeiras
rendas. Estou Spersuadido que , daqui a alguns an-
nos
(51)
nos , esta grangearia haja de estar em hum ponto
de perfeição agradável ; e agora mesmo já vemos
a muitos desafiarem-se entre si : Qual terá melhores
edifícios, mais esplendidos, melhores máquinas,
ou moinhos de descascar , e escarpas de nova in-
venção , não poupando cousa alguma daquellas ,
que podem servir de augmentar a perfeição e ma-
gnificência desta Grangearia.
Em todo o tempo se deo a preferencia ao Ca-
fé de Moca j e isto era bem natural , por ter sido
este o primeiro , que nos veio ; e aquelle , a quem
o nosso deve a sua origem , e que haverão jo an-
nos, que não , conheciamos outro. Succedeo-lhe o
de Martinica , ao qual os conhecedores julgão me-
lhor. Isto não deve admirar ; porque este não tem
tanto tempo de se arruinar na passagem do mar ,
como o de Moca, que precisa quasi hum anno ,
para haver de chegar á Europa , e outro anrío mais
para sahir fora dos armazéns da Companhia , em
que se guarda. Este grão , ao depois de secco , não
pode deixar de perder o seu sabor , e de diminuir
consideravelmente a sua qualidade 5 ainda que se
possa dizer , que deve ser velho , para haver de ser
bom. Mas advertirei neste momento : que he pre-
ciso que adquira esta velhice em hum lugar sec-
co , livre de toda a humidade , e não sobre este
elemento salgado , que enche de mofo a tudo , quan-
to sobre elle se transporta , e penetra ainda até as
D ii mes-
C 52 )
^Jiesmas caixas, as inais bem fechadas, aonde eíle
tem a força de „,arear galJóes de ouro , e de pra-
ta , ainda estando beni embrulhados en, algodão .
para os defender. Se.a o C.fc por ventura menos
capaz de receber esta impressão ? Tenho presencia-
do que ba.tou o orvalho de huma noite só , para
o fazer tão branco , como a mesma neve , o que
basta para o privar da sua qualidade unctuosa , ou
oleosa , que Jiie dá todo o sabor , e todo o mere-
cimento.
Despreza se o Café de Caienna , e o de S. Do-
min?os ainda não ganhou fama. He cousa galan-
te ? De huma para outra Grangearia se faz diffe-
rença. Isto só provará hum maior cuidado , huma
parte mais que o resto ? Dão-se muitos . que ape-
nas tem onde o possão pôr abrigados das injurias
ào ar , sem que até agora tenhão meios de o ar-
ranjarem , ou vontade de os ter ? O seu Café ,
sendo o da primeira colheita, de ordinário he hum'
Café summamente grosso , forte , sujeito a em-
branquecer-se , quando se descuidao de o seccar
bem , e de o defenderem da humidade. Não pro-
curão embaraçar que se não molhe no tempo , que
são obrigados a pollo ao Sol ; por que qualquer
humidade . que apanhem , se voltão encorreado. , e
esponjosos , como cortiça : e desta maneira , pre-
venindo todos estes i.Konvenientes , se pôde com
nunto fundamento esperar , que se chegará, o mes..
TOO
(5?)
mo ponto de perfeição , em que se acha o de Mar-
tinica.
Não ha razão alguma , que nos obrigue a du-
vidar , do que se acabou de dizer a respeito do
Café. Os nossos primeiros assucaies , os nossos pri-
meiros Indigos erão muito defeituosos, mas, a pí-
2ar disco , achamos meos , e modos de os aperfei-
çoarmos. Estas granjearias sãõ , sem comparação al-
guma , mais delicadas que as do Café , nas quaes
somente se devem observar os seguintes pontos
principaes , que lhe formão a base , e que o mai*
icrnorante os pôde executar tão bem , como o mais
sábio.
vj^ XIII. Pontos principaes para se ter hom Café.
Primeiro. Colher, quando estiver bem madUrO ,
4.° fazello seccar muito bem ,5.° evitar que se-
não mOÍhe , 4.*^ que não apanhe alguma humida-
de ao depois, que for secco. Nestes quatro pontos
consiste todo o mysterio. Se postas estas precau-
ções , se acha hum Café inferior , conclui animosa-
mente : que forão abortados , ou por huma gran-
de seccura , ou por huma producção excessiva ,
que a planta não pode nutrir. A privação da sub-
stancia he a única causa; porque o grão fica pe-
co. Por esta mesma ra/ão acontece outro tanto ,
<jUahdo as hervas suífocão os pés do Café , e lhe'
ab.
C 54)
absorvem a sua nutrição. A vista destas razões se-
rá fácil a convicção, de que chegaremos a aperfei-
çoar , menos çue o clima , e qualidade do terre-
110 se náo opponhão, o que não suspeito. Ajgu^
ma experiência , c muito cuidado farão o resto.
5 XIV. A causa do desprezo do Cofc de S, Do-
A causa principal do disciedito do Cafc de S.
Domingos foi, (no tempo da guerra de 1744 até
174ÍÍ) que cada habitante se empenhava em apro-
veitar da partida dos combois , para os poder ven-
àtr , o que occasionou huma confusão em todas as
grangearias , e particularmente na do Cafc. Cada
hum se empenhava em fazer seccar promptamen-
te o seu , para se poder aproveitar da sahida dos
navios. Muitos se servirão também de estufas , pa-
ra adiantar a desecação mais depressa ; e ainda que
esta só tivesse hum fogo muito moderado , este
não deixava de lhe dar huma maior expedição ;
porque seccava de noite , e de dia . houvesse ,' ou
não bom tempo. A sahida da estufa se pihva , e
totalmente se entregava de repente ; de sorte que
algumas vezes, não erao passados qunize dias ao
depois de colhido , c já se achava posto em ven-
da. Não se deve admirar por tanto que o Cafc
assim verde , e tão mal condicionado , cir.branque-
C55)
ça na passagem do mar ; porque não pcSde dei-
xar de ser assim: mas hoje não milita o mesmo ;
porque se passão seis mezes , antes de se come-
çar a descascar , ou pilar ; tem todo o tempo dè
enrijar , e ainda de deteriorar , se elle o tiver de
ser. Achão se alguns grãos, que se tem cuidado
de tirar. Não ha a menor dúvida que as experiên-
cias repelidas hão de acabar de aperfeiçoallo.
5 XV. Politica dos HolUndezcs,
Os Hollanderes de Surinam , por hum refina-
mento da sua politica , espalharão que elles passa-
vão o seu Café pelo fogo , antes de o porem eni
vetida ; para impedir com esta manobra , que hou-
vesse de pioduzir em outra parte fora delles. Es-
tava-se de tal sorte prevenido deste erro popular,
'que ninguém tomava o partido de o plantar. Mas
JVlr. de la Motte Aigron (como já disse) achou
meios para o ter fresco , nO que sobrepujou todas
35 dificuldades , que parecião oppor-sc *, porque fal-
samente se cuidava qúe o Café , posto ao Sol ,
cahia nó mesmo inconveniente, o que não deixa-
va de ser hum segundo erro. Eu mesmo tenho
^ semeado Café , que já tinha seis m.ezes de colhi-
do , e nasceo perfeitamente. A única precaução ,
que tomei , foi pollo de infusão em agua , e de-
pois de 5 ou 6 dias já tinha desábi olhado o sèii
ger-
(!6)
germe do co,rp,i,„e„,o d. duas linha, , dentro d,
-s..a agua , e,„ cue o tinha infundido. Ja ho,e
-o te,.o, o trabalho de o se.ear ; ,,or i ,„
-os,,e„,uitip„cácdetal„,odo.<;uehep,ec:<,
anancallos debaixo do. pcs dos outros Cafesei.os
para cjue a sua vizinl,ança muito copada não offen-
la aqu^lles . (jue os rodeáo.
$ XVI. AUJo de plantar o Café.
O modo de plantar o Café he muito simple, .
."«sue todaua recju.r attençáo. Procura-se alij
Par'bem o terreno , em oue se ,uer planta, ; e
■\ ^"'■^*P^'i--"te todas as covas. Esta p.epara-
çao he „ecess.„ia , p.„ ,ue . caI,indo a chuva .
Pene.e faalmente a terra. Deve , »]<;„, disto, ter
outros buracos , ou covas , onde a agua se haa
de demorar 5 porcjue faz hum effei.o maravilhoso
de nnreter a frescura a esta planta nova , e lhe
da tempo de formar novas rai,es, ames qae o íoJ
Jl.e faça impre.s.;o, P.a.íco , a evte mesmo fi,n de
contr.buir a con.ervação de- ta frescura , a composi-
ção de hu.n pe,;ue,-,o cimento de lama clara . que
.>.a.>do fa,er , e com c;ue faço cobrir o barbalho
de cada pé de Café. Por este meio to.na a pe-
gar com nnrita facilidade; e a planta, e as folhas,
se.do de hun.a consi.tencia naturalmente fo.tc
nao só resisten, murto ten.po ao calor, msts tam^
bem
C 57 )
bem , favorecidos desta precaução , mui poucos , OM
nenhum perecem. Deveis accrescentar , ao que fica di-
to , que , arrancando os pés de Café , para os plan-
tar , faço cavar a enxada a terra , em que elles se
achão ; por cujo meio se conserva o seu barba-
Iho inteiramente , retendo o em o seu estado na-
tural. Porque he certo que o Cafeseiro , ^rançado
á mão , se acha torcido , ou abalado ) e que a
maior parte do seu barbai ho fica na terra , sen-
do aquelle, de que elle tem maior necessidade.
§ XVII. A que distancia se planta o Café , e varias
opiniões sobre isto.
Tem-se multiplicado as opiniões acerca da dis-
tancia , em que se devem plantar os Cafeseiros. Al-
guns julgão que os devem plantar quasi juntos. Eíi
nâo pei tendo dictar-lhes a lei. Só quero expor o
pro , e o contra , deixando a cada hum huma com^
pleta liberdade para a escolha. Os que plantão mui
chegados (a meu ver) querem conservar-lhes esta
frescura , que lhes he ião saudável; pois que no
.fim do anno tem hum peciieno bosquete , q"e
conserva a mesma frescura ; e embaraça que crés-
çâo hervas tão abundantemente: e que em conse-
quência he menos custosa a sua mantença. Tam-
bém accreàcentão : que tem dobvada colheita de
Café 3 mas talvez , que não podessem contestar es^
te
C ss )
te ultimo facto. Mas toibvia o resultado futuro níà
Jhes Jie favorável ; porcuc tudo hirá ,nuito bem ate
á primeira colheita ; mas ao depois , feclundo-se oj
Cacseiros huns com os outros . seus ramos se en-
trelaçarão por hum modo tal . ^-ue não achando
meios para se estenderem . se verSo constrangidos
a produzir huma bem módica quantidade àc fru-
ctos: e muitas vezes só o tronco os produzira de
sorte , que 4 Cafesciros com dificuldade cheirarão a
dar o producto de hum só pé . que esteja bem
ventilado. Desta maneira hum Cafesal de mil pés ,
sendo ventilados , dará tanto . como hum de 4
mil pés . que não he. Ajuntemos mais a incom-
modidade do orvalho. Seria preciso aie os pre-
tos fossem molhados desde os pés ate i cabeça.
Ora isto he inevitável ; e não he huma consequên-
cia .'
Concluo , á vista disto, que o melhor modo de
os plantar he fazendo avenidas , e fileiras , humas
distantes das outras de 6 pés , e plantando as ar-
vores de 5 a > em huma terra medíocre : he ver-
dade que a sua mantença he custosa ; mas esta per-
da he balanceada por muitas xantagens. 1,° Po-
dem-sc tirar muitas sortes de viveres nos irez pri-
meiros annòs 2.° a arvore se forma mais formosa,
e produz em razão quadruplicada : estendendo-se
©s ramos com liberdade : e finalmente as fileiras
dos Cafeseiros , tendo hum espaço conveniente ,
foi-
( 59 )
formarão huma avenida , ou alea pela qual anda-
fáó os pretos , sem o risco de serem molhados ,
quando os colhem , o que he muito estimável.
§ XVIII. Profundeza das covas,
A altura das covas não deve exceder de 6 a 7
poUegadas, e a do plano 18. As que são mais pe-
quenas , muitas vezes causao hum retardamento de
hum anno ; e as que são maiores , tem hum máo
successo. Antes de se metterem nas covas , se te-
nha o cuidado de lhes cortar a extremidade do pé>
que ordinariamente procura sempre profundar-se
de sorte que , se houver perto alguma rocha , ou
casc.lho , ella a encontrará , e então o CateseirO
morrerá no tempo, em que se julga estar escapo.
§ XIX. Segundo modo de fazer covas.
Alguns Grangeiros costumáo fazer as covas com
cavadeiras 3 e não lhe faltáo boas , ou más razoes ^
para apoiarem a sua opinião , e practica. Também
ácuellas me não faltarião para os combater ; po-
rém gosto de deixar a cada hum a liberdade de
trabalhar , segundo, a sua fantasia , sem querer es-
tranhar-lhes cousa alguiiia ; e por isso só lhes direi
que me acho muito bem , plantando a enxada. Os
que SC servem de çavadeiras , instarão sem dúvida :
que
C 6o)
íjue elles se achão muito mellior. Seja assim. Eu
de boa vontade Jhes concedo , se este he o seu gos-
to , a pczar de Jhes poder formar huma pequena
objecção , sem querer por isso , que elles hajao
de preterir o meu sentimento : lembrarei somen-
te , o que penso a este respeito, sal\o o seu me-
lhor pa ecer. Sabe-se que a boa terra do nosso mor-
ro não excede na profundeza a dez pollegadas , e
muitas vezes muito menos : ora abrindo-se as co-
vas de 18 pollegadas , he certo que se ha de en-
contrar rocha , ou terra ped.egulhosa. Ora sendo
assim, se seguirá, que, quando a raiz penetiar até
e^ta terra , o Cafeseiro morrerá , não encontrando
mais a boa terra , em que foi plantado. Ouço res-
ponder-me : que por amor disso , quando os plan-
tarão , encherão estas covas de boa terra ; e que em.
consequência se acharão sempre com 6 ou 8 pol-
legadas de mais , que em seu estado natural. Mas
não se poderia provar isto arrazoadamente ; por-
que, aluindo se esta cova , se cahe sem pensar em
outro inconveniente , que he , o de fazer huma espécie
de canari . ou vaso de terra , no qual pararão rs
aguas da chuva , quando forem repetidas . o que.
não deixaria de incommodar os pés dos Cafeseiros.
Accres.entaremos ; que as raizes de todas as arvo-
res em g-ral deste Paiz tem huma natural Índo-
le em se arrai^aar á flor da terra; lofro me devem-
conceder que , plantando as a 7 ou S pollegadas.
de
Ç 6i )
iát profundeza , as raízes não deixarião de seguir a
hoa terra ; e de receber tanta agua , quanta lhe
convenha , e as sobras se filtrarião pela terra den-
tro com muita commodidade ; por quanto , nem
dè hum lado nem de outro , se achava limitada.
§ XX. A estação de se plantar o Café.
He do interesse do Grangeiro escolher hum
tempo chuvoso para o bom successo da sua plan-
tação , sendo esta bem regada. Por todos os San-
tos a estação he a mais húmida , os nortes mais
frequentes; e por isso convém aproveitalla por ser
necessário , que , plantados os Cafés , alguns dias
depois recebão agua. Mas , como os trabalhos de
qualquer fazenda se fazem por intervallos , isto he ,
secundo o que se vai oíferecendo , para se fazer >
dão-se também outros raezes no anno , que são
próprios para este trabalho , quândo se está no
tempo das chuvas : e assim se pode continuar a
sua plantação desde Todos os Santos até p mez
de Maio i proporção do terreno , que tiver prepa-
rado ,. e prompto ; porque não pode ser tudo de
huma vez : estas plantas ultimas crescem muito
mais depressa que as outras ; porque as plantão no
meio da primavera , quando a terra trabalha mais
do que em alguma das outras estações ; e no in-
verno está como estéril , pela abundância das chu-
vas,
C ^2 )
vas , que as resfriãô para a vegetação das plantas ;
mas , ainda que se passem j ou 4 mezes sem ve!
getar , quando se plantão pelo inverno , se prSde
estar na certeza , cue fica a plantação feita com maior
segurança do seu bom successo que no estio . no
qual se vem obrigados a repetilJa muitas veze, ,
ao que chamamos recouvrage , o que he a causa ,
de que não produzão todas ao mesmo tempo.
5 XXI. Viveres , (jue se podem plantar nos avenidai
<ntre as fileiras do Café , em quanto crtscem.
No tempo do crescimento dos Cafeseiros , %
terra não deve ficar inculta, antes pelo contrario
oGrangeiro, ou fazendeiro pôde tirar grande pro-
veito , tendo tido o cuidado antes de a encher de
grãos, de milho, de arroz , cujas colheitas são abun-
dantes nos dous primeiros annos . principalmente ,
tendo-se plantado os Cafés em boa distancia. Mas
he preciso observar , que senão deve plantar cou-
sa alguma , que trepe , ou plantalla mui apartada
dos pés do Cafc , aos quaes poderia arruinar: do
mesmo modo , plantando-se arroz , só se deve fazer
hum renque , ou fileira entre os Cafeseiros. Estes
são os viveres únicos , que arrasoadamente se po-
dem plantar nestas aleas : os que plantão outros,
não conhecem os seus interesses. Muitos plantão
huma carreira de mandiocas entre duas. Dou de
ba-
C 63 >
barato que hiima serie, ou carreira de mandiocas
possa não offender : mas não ha dúvida alguma ,
que , quando se quizerem cavar as mandiocas , ten-
do-se as suas raizes conciíegado de perto com as
do Café , não se poderáó , sem prejuizo deste , ar-
lancar aquellas. Além disto , ainda se dá outro pre-
juizo peior que o primeiro , a saber : que esta ter-
ra , assim cavada , tendo sido levada para fora pela
xpenor pancada de chuva, faz covas , e se acha de
menos , ou nenhuma , quando o Cafeseiro quer fru-
çtificar. Nada fallarei , dos que plantão batatas ,
porque absolutamente julgo que , sem se ser tolo ,
ou faltar toda a experiência , não se poderá tal
fazer.
Arranjo esta classe de Grangeiros entre os que
se chamão em bom direito Fazendeiros das dúzias^
e cujas occupaçoes no curso do anno he segar pra-
dos , á excepção com tudo que elles o passem á
enxada alguns dias antes da colheita , para que 'co-
mo dizem) possão ajuntar os Cafés , que as chuvas *
e os ratos fizerão cabir em a terra 5 e que , não
Havendo anticipadamente esta cautela , se perderião.
Quão admirável não he esta prudência , e sábia es*
ta previdência da parte delles? Ainda estes taes se
at,re verão a dizer mais do que isto; porque dirão:
que tem razoes muito sólidas , que os obrigão a
obrar assim , ( he preciso não as esquecer ) as quaes
são estas que , estando a terra coberta de hervas ,
cl-
C 64 )■
elles aproveitão todos os grãos , que resvallarão , ou
cahirão. Contra isto não ha replica I O bom P.
Labat sem dúvida consultou a al^jum destes Gran-
geiros , quando affirmoii ; que os Cafcs vinhão em
toda a parte ; e que não arruinavâo os prados. Nes-
te ultimo ponto concordo tacitamente com elle :
mas de sorte alguma concordarei que os prados não
hajão de arruinar os Cafés. Serião estes tão baixos
que a segadeira nada teria que fazer nelles ? Como
receberião os Cafeseircs ( pergunto ) os soccorros ,
tão saudáveis , que as chuvas lhe prestão , estando
elles rodeados de hum torrão , em que as a<nia$
nada mais fazem do que cahir ; e que , ainda que
chovesse 8 dias continuados , penetraria com diffi-
culdade a altura de 4 dedos : e nestes termos cue
substancia receberião ? A final não temos necessi-
dade alguma de o provar. A couia he vifivel per
si mesma. Em despeito destas palavradas volto á
cultura dos nossos Cafeseiros.
Esta arvore cresce mui depressa , plantando se
em boa terra , e tendo cuidado de a defender das
hervas bravias , no que cumpre muito ter-se toda a
exactidão possivel em hum clima tão quente , co-
mo este , onde as hervas crescem abundantemente
só pelo effeito do orvalho ainda nas terras virçens.
Vcs-
C ^^5 )
§ XXII. Bcscripção da arvore,
O aspecto ou caris de hum Cafeseiro de iX
mezes, ou de 2 annos tem alguma cousa de en-
cantador. Neste tempo he que o vedes em toda a
sua força , e vigor. As folhas são de huma verdura
viva , e carregada , muito nédias , alguma cousa re-
torcidas , e como dentilddas em roda. A arvore he
copada, parecendo na figura á do loureiro. Natu-
ralmente cresce mui redonda , e lança em regra ge-
ral desde baixo até ao tope os seus ramos , os
quaes á proporção que o tronco principal sobe , el-
les se diminuem até á extremidade das suas fran-
ças , o que forma huma pyramide muito bella. Os
ramos sahem do tronco dous a dous , huns op-
postos aos outros. Os primeiros começão a sahir a
hum pé de altura acima da flor da terra , ( deve se
entender quando z arvore está feira) a estes succe-
dem outros de trez em trez pollegadas ; mas que
se con-chegão , logo que a arvore vai envelhecendo ;
porque os ramos , pela mesma proporção , se vão
engrossando. A sua figura regular se perde logo,
que elles se chapotão , ou decotão , que então os
ramOs do alto se alongão para os lados , como os
debaixo 3 e se guarnecem de prumagens , ou pim-
polhos , (que na frase do Paiz chamão pés ds pa-
tos) os quaes todos produzem successivamente , e
E que
( 66)
cue no seu começo só tem hum pc cie comprido;
(no primeiro anno do seu crescimento) mas que
auginentão todos os anr.os outro tanto , para sup-
prirem a esterilidade dos primeiros ramos; porque
se deve advertir que o Cafeseiro não produz dout
annos successivos no mesmo Jugar , mas fiuctifica
immediatamente iunto áqueiles , que se acabão de
colher , e a^sim prosegue até ás pontas dos ramos ,
e nos novedios , que a arvore costuma lançar to-
dos os annos , no que he singular acerca da parti-
cularidade da sua relação.
As loihas sahem de duas a duas em cada hum
dos ramos ; e nestes lie que se formão os fructos ,
que se apegão a elles por hum pezinho muio cur-
to , da mesma sorte , que as uvas se apegão ao
cacho ; e ainda que os nós estejâo muito conche-
s^ados , com tudo algumas vezes se tem contado
de 1 5 para 20 fructos , e quasi outros tantos nós
em cada raminho ; e por isso , quando o Cafeseiro
esta em flor , estas estão tão conchegadas humas
ás outras , que cada ramo poderia fazer huma gri-
nalda , ou capella bem guarnecida. A meu ver não
ha cou<;a alguma , que regozije mais aíjradavelmen-
te a vista do que a perspectiva de hum Cafesal ,
que conte ço mil Cafeseiros floridos a hum tem-
po , vendo-se reinar entre elles huma verdura mui
carregada, hinna alvura de neve , e hum cheiro
suave , e agradável , que titilla tão docemente o ol^
fa-
C 67 )
fato. Não se dá n' America outra estacSo que mais
se pareça com a da primavera na Europa ; que a
faça lembrar , e que a imite , como quando es as
arvoretas estão em flor. As suas encantadoras , 6
lindas avenidas , quando se passeia por ellas , repre-
sentão o terreal paraíso das delicias.
Assim florece nesta amorosa estação, a saber ,
de Março e Abril ; mas os Cafeseiros novos de dous
annos florecem Ás vezes seis vezes em o anno : Á
medida que crescem , e que o tempo lhe corra bem.
repetem as flores todos os mezes.
§ XXIII. Flor do Café.
A flor do Café he huma pequena estrella bran-
ca , recortada em cinco partes , das quaes cada ser
paracão he guarnecida de hum estamc da mesma
côr , com outro no meio , que remata em forqui-
lha ; e que permanece por muito tempo pegadp
no fructo : a flor só dura 48 horas , ao depois co-
meça a definar, e alguns dias ao depois vem si
terra. A esta flor succede o fructo.
E ii
Fí-
»«
(62 )
§ XXIV. Figuro do seu fruef,
A figura do seu fructo se parece muito com a
da Oliveira ( huma azeitona ) até conseguir o seu
tamanho natural : á medida que se avizinha a sua
madureza , o seu verdor se commuta em hum ama-
rello prilido : este a seu turno se reve7a em hum
bellissimo vermelho encarnado , a quem cede o lu-
?ar , que occupava : e neste passo imita a huma
cereja oblonga : a sua carne he huma espécie de
polpa de hum gos^o maravilhoso , assaz enxagui-
do , cuias qualidades adstringentes , e aquecentes
impedem fazer delíes algum uso.
A esta polpa succedem duas pequenas favas ge-
meãs. apegadas huma á outra, cobertas de hum
aralho, ou película summamente delicada, fina . e
adherentc , que o cobre inteiramente. Nisto des-
cobrimos visivelmente os admiráveis segredos dana-
tureza , que por huma sábia providencia as defen-
deo contra todos os ataques do ar , dos quaes ti-
nhao necessidade de se^em defendidos ; pois oue
somente o orvalho de huma única noite seria bas-
tante , para lhe fazer evaporar todo o seu o'eo .
que he aquelle , que dá ao seu gosto , e qualidade
todo o esmero , e perfeição . de que goza.
Somente quasi hum mez , ou dous . antes da
op^dureza do seu fructo, he , que se vem roço-
nhe-
nliecimento da quantidade da sua producçao. Se es-
tá , ou não carregado de fructos ! O seu bel!o ver-
dor muda de colorido : as folhas amarelecem , e
parece que anniincião seu languor Representa-se >
como acabrunhado pela sua própria carga , e nos
admoesta que elle tem precisão de ser descarrega-
do , e com , effeito he preciso cuidar , logo que
seu fructo sazona , ou se põem de vez , isto he
avermelha , de lhe decolar , ou chapotar os ra-
mos gommeteiros , ou ladroes , que repuMulão vi-
vamente , ao depois de se ter chapotado o tronco.
Rebentão~lhe hupi grande número destes , de que
se faz preciso livrallo. Todas as vezes , que for
mondado , se deve livrar , dos que se encontrarem ,
deixando-lhes unicamente o tronco principal , por
este meio se consegue ficar o pé vigoíoso , e se
sustem infinitamente mais.
Logo que se lhe tirar o fructo de vez , o que
renasce , torna a tomar hum novo vigor. Ora nes-
te tempo verdadeiramente he cue elle tem neces-
sidade que os orvalhos , as chuvas os soccorrão mui-
tas vezes; porque o Café requer muita hunr idade ,
e hum terreno que sempre haja de estar fresco ,
( * ) o que vem a ser a causa 5 porque não vem em
as
(*]) Se faltarem chuvas vos dons últimos fvezcs,
que pncedem á colheita » eiles Jicão sujeitos a ss-
IIW
>i
C70)
39 várzeas , ou planícies ; porcue r. estas as chuvas
são suiniTidinente raras » e porcue tair.bem somen-
te o^ morros , e montes llies são próprios, e princi-
palmente os terrenos , CjUe se rossão de novo , no»
íjuacs chove abundantemente ; mas estas mesmas
chuvas , que lhe são tão benéficas , e saudáveis ,
causão dous eíTeitos mui contrários , e diametral-
mente oppostos hum ao outro ; porque , em lhes
procurando o soccorro , de que os morros tem tan-
ta necessidade , passão estes a serem destruidores
destas mesmas terras , que elles fecundão ; levando-
as após dtí si , e arrastrando-as pouco a pouco em
virtude da sua própria pancada , de sorte que (ao
meu ver) daqui a 30 annos , os que nos sobrevive-
rem , ou os nossos vindouros com difíiculdade acha-
rão terra para cultivar ; porque os morros nesse
tempo já se acharáó esterilizados furiosamente. Fi-
nalmente para que nos cueremios inquietar com fu-
turos , que ainda estão tão apartados ? A providen-
cia , que se emprega com tanto cuidado nos meno-
res insectos , se não ha de esquecer da sua obia
principal.
rent pecos , e a orvorc cm perigo de morrer, A ^ran*
íle abu idíincla de fritctos ohsorve hiima ç^rmule par-
le Hit $uh$:ancio (ííi arvore t e a selha nÔo se distri-
buindo % se não com mcdrocrU.ide , Jax. (iliortnr , ou
mangrnr os fructos Ctnuo foi e>n 1753 em qne e^cre-
*ua estas memorias » no tjual se pcrdeo 50 por cem.
C7I )
§ XXV. o Cíifé não <tmadurcce 4io mesmo tempo.
Nós não fôramos felices , se este fructo ama-
tJurecesse á pancada ; porque . se assim acontecesse ,
perderíamos todos huma boa parte dos nossos ren-
dimentos ; pois gastamos huma quarta parte do an-
no em o colher. Este defeito (se he , que se lhe
pôde dar este nome) lhe vem , de florecer o Ca-
feseiro por diíTerentes vezes ; e de serem seus fru-
ctos summamente cochados huns com os outros :
ba huma quarta parte , que aperta de tal sorte o
resto , que os obriga a esperar , a que se tirem ,
ou colhão estes , para que os opprimidos possao a
seu turno ter o mesmo desafogo. Por este motivo
fazemos 5 até 6 colheitas , as quaes todas junfca-
inente só devem reputar por huma 5 pois que se
seguem immediatamente humas a outras , sem re-
vezamento , ou alternativa alguma , e por mais di-
ligencia , que se faça, nao he possi/el deixar de
passar pela semsaboria de huma mui grande perda;
porque , passando-se 5 ou 6 dias ao depois de co-
IhMos , parece que ainda se não tem tocado algum
pé de Café ; porque apenas se lhe acaba de tirar
hum cesto do seu fructo , já elle oíferece outro
tanto.
Qual
C 70
5 XXVI. ^ual seja a estação de o colher,
O sazonatnento deste fructo se conhece pela
côr veriTielha denegridí». De ordinário isto aconte-
ce nos fins de Setembro , no tempo das vindimas ;
e no qual também nós o vendimamos , e conti-
nuamos sem parar até o fim do anno : mas se o
Cafeseiro está em a .^ua i. e 2. novidade : pela
niez ; já dc<j de Julho se pôde começar. Neste
tempo se dá hum intervallo de algumas semanas,
no qual se applicão em alimpar o lugar ; porque ,
quando se está na maior força da colheita , nío
se p6de deixar esta hum só instante, sem experi-
mentar huma grande perda. Os pretos , applicados a
este trabalho , se provém cada hum de seu cabaz ,
quasi como os nossos de vimes usados nas vendi-
mas , em o qual fazem cahir o Café no mesmo
tempo que o vão apanhando. Apenas se enche o
ce.to , se vai despejar em outro maior , de que ca-
da negro tetn hum , que ha de fazer a sua car-
ga. Nestes levão elle^ o Café ao moinho , ou en^ce-
nho. Recomende-se aos escravos de tirarem o fru-
cto sómen'e j e de deixarem o seu pcsinho pegado
3»o ramo , pelo nao descascar , o que faria mal á
arvoíe.
Tre%
(7J )
5 XXVn. Trez espécies de Café Inferior*
Dão-se trez espécies de Café inferior, dos quaes
se precisa acauteilar , para senão haveiem de mis-
turar juntamente ; e sem es^a cautella , se confun-
di riao , e seria preciso gastar-se muito tempo , pa-
ra separar o máo áo bom. i.° o que se escaldou ;
òu amaduieceo antes de tempo por falta de aguas ,
e que se seccou na arvore , ainda antes de ficar
vermelho , que se vem obrigados a colhelJo , quan*
do entra a amarelecer , e a manchar-se ; porque
he sujeito a embranquecer , por estar privado do
seu sueco oleoso. Cumpre não o misturar com o
bom. 2.^ Ha outra espécie de escaldado peior que
o 1.° pois o faz seccar na arvore , antes de ter
chegado a ametade da sua madureza \ por huma pro-
ducção excessiva , que a arvore não pode susten-
tar ; e que a enfraquece de tal feitio , que mui-
tas vezes se vê no risco de acabar. Isto acontece
ordinariamente aos Cafeseiros , deixados crescer li-
vremente , cujos ramos , cheios de miollo j não tem
o vigor necessário para sustentar o pezo de seus
fructos ; e menos a seiba precisa , para o forneci-
mento de suas necessidades. A esta sorte chama-
mos crocos, A final se da huma 3.° chamada es-
Clima , que só se descobre , quando se lava o Café ,
ao depois de se ter tirado do engenho. São huns
tan-
(74)
tantos firãos chochos , pecos , oii mangrados cxst so-
brenadáo , e os escumamos , donde Jhe vem o no-
jTie. C orno todas estas espécies são inferiores , os
seccamos á parte , para se escolherem ao depois ,
cjnando se não tem que fazer > e se quer aprovei-
tar algum , que se achar bom ; mas repetirei a seii
respeito o antigo rifão. Le jeu n en vaut pas U
chandcUe , não vai o cebo a mecha,
§ XXVIII. Disposição na casa do Engenho,
Estando os cestos cheios , cada negro carrega
o seu , e o despeja em e=:pecies de separações em
forma de cofres practicados em os lados da casa ,
c qualquer destes pode conter maior quantidade
de Café , do que os pretos podem apanhar diaria-
mente. A noite fechada , ao depois da reza , se dis-
põem o número de pretos necessários para o pas-
sarem pelo Engenho. Bastão 7 , e todas as noites,
ou seióes , devem ser revezados ou substituídos por
outros tantc; , e no entretanto aquelles vão ás suas
senzallas , dispor a comida , para os que ficão no
trabalho , de maneira , c^uq , estando este acabado ,
a achem feita toalmente. As mulheres são ordi-
narianiíínte as incumbidas desta segunda parte. Des-
ta SOI te nenhum poderia cueixar se ; e o trabalho
se reparte redondamente de modo , cue , em menos
de hora c meia , toda a colheita do dia he passa-
da
da pelo Engenho : e nisto consiste o trabalho peior
de toda esta granjearia.
§ XXIX. Como se passa o Café pelo Engínho.
Peterrainão-se dous pretos , para voltarem o
Engenho da parte do rolo grande , e o terceiro ,
somente da parte do pequeno. O i.° , ccmo o mais
grosseiro , tem duas manivellas , e o pequeno só
tem huma. Ha hum quarto escravo , posto no al-
to da tremonha, para dar de comer ao Engenho ,
e lhe vai botando o Café á medida , que elle o
vai enguUindo. Ainda se dá outro de mais , e he
o 5.^ , o qual se põem por diante do Engenho , e
recebe as cerejas cabidas em terra , as quaes elle
tem cuidado de apartar com hum pequeno rodo ,
por ser preciso repassailas ainda outra vez, para as
purgar dos restos dos Cafés escapados aos cylindros
ou rolos. O resto dos dous negios , hum se occu-
pa em levar o Café á tremonha , e o outro a en-
cher o cesto , que o i.^ ha de levar. Esres dous
revezão de tempos em tempos os que estão no rô- -
lo grande , para descançarem , tomando alternativa-
mente o lugar . dos que entrao em seu lugar nos
rolos , enchendo , e descarregando na tremonha.
O Café naturalmente se cobve de hum sueco
siimmamente glutinoso de maneira tal , cue , ain-
da espremendo-se muito pouco , deixa a sua pol-
pa
C70
pi com precipitação. Este eífeito fazem os rôlos;
junto dos quaes confusamente cahem polpa , e ca-
roço sobre a peneira . espécie de crivo feito de
malhas de arame , em feição de gaiolas, propor-
cionadas á grossura do Café . o c;ual , regulado pelo
movimento da peneira, e do seu próprio grude , ca-
he atravez da. malhas , em quanto o mesmo mo-
vimento favorecido por alguma inclinação , que se
da á peneira , arremessa diante de si as cerejas ,
cuc sendo muito grossas para poder passar atravez
das malhas , cahem successivamente sobre o peque-
no rôlo , e estas cerejas passadas por hum , e por
cu^ro , cahem ao pé do Engenho pelo movimen-
to da pequena peneira , da qual o pequeno róio
também he provido.
5 XXX. Advertências que se devem faxer.
Ao depois de algumas voltas do Engenho , cum-
pre examinar , se o Café está no seu ponto. Se o
Engenho estiver muito apertado, o Café se esma-
ga, percebendo-se logo pelo seu pergaminho , que
se levantara em escamas. Este he hum signal cer-
tissimo de que o ròlo está muito junto das gen-
givas da peça movediça: neste caso se haja de" pa-
rar hum pouco , para lhe dar abertura por meio de
cunhas de p.-ío , que estão nas extremidades da pe-
ça movediça , e que servem de apertar , e dealar-
£:ar
Ç 77 >
gar o Engenho f conforme for necessário. Deve-se
observar isto todas as vezes , que se pozer no En-
genho ; porque o Café não he sempre da mesma
grossura.
Quando se tem achado hum pento fixo , se con-
tinua o trabalho , até que a caix3 do Engenho es-
teja cheia , então se pára , e se vasa nas bacias ,
coches , ou barricas , de que se usa. Assim se pro-
segue até o fim. Feito isto se repassão os mesmos
fructos segunda vez , para acabar de os purgar do
resto do Café , que ficou pegado, então se abre^
huma pequena porta , practicada defronte do Enge-
nho, por onde as cerejas passão , quando cahem ,
c que os negros arremessão quatro passos de dis-
tancia , pelos não incommodar.
Deixasse deste modo o Café toda a noite em
a bacia , mediante a qual se despega com facilida-
de da sua gomma , o cue o dispõem muito me-
lhor para a lavagem. Esta se faz á claridade da Lua,
ou á luz de hum facho , huma hora antes de ama-
nhecer. O edificio do Engenho deve ser construí-
do junto de algum ribeiro , para evitar a multi-
plicação de trabalhos ; e se sirva então de hum tan-
que de cantaria , podendo ser , no qual com hum
Todo , ou pá , se mexa para lhe despegar a parte
visguenta. Alguns usão de huma espécie de cocho ,
ou canoa ; e aquelles , que não tem alguma das duas ,
se servem de cestos grandes , que fazem o mes-
mo
C7S )
mo effeito t só com o incóinmodo de se estar a
mudar muitas vezes.
§ XXXI. Meios para acautellar os escravas de mui"
tas moles tias.
Como todos somos interessados na conservação
dos nossos escravos , e de que elles gozem de hu-
ma saúde vigorosa , tanto quanto está, em nosso
poder , he preciso ser cuidadoso de os defender das
lijurias do ar. As estações das colheitas são mui-
t^ chuvosas , e mui cheias de orvalhos : e por isso
não ha Cafeseiro algum , que não esteja ensopado
até ás 8 e ás 9 horas do dia. Ora , sendo notório
que os escravos principião este trabalho ás 5 horas
da manhã 9 serão todos os dias molhados , como
os patos , o que não pode deixar de gerar diversas
moléstias perigosas , ou arriscadas , cujas consequên-
cias podem vir a ser muito serias. Para remediar
estas sortes de inconvenientes , temos cuidado de
os prover a todos (assim negros como negras) de
boas casacas" de panno grosso feitas a Eavara , isÇo
he dobrando-as nos peitos , e sobre as quaes p6de
a agua correr , mas não penetrar, O que lhes ser-
ve de preservativo contra os catharros , defluxos ,
e frialdades , a que elles são muito sujeitos sem
esta precaução. Os Engenhos dão hum trabalho , que
lhes iaz correr o suor em bicas 3 e se , estando
qucn-
Ç 19 >
quentes , sahirem fora , não escriipulizziráõ beber
hum copo de agua , logo que a encontrem. Mada
iTiais precisão para hum defluxo de peito. Para acau-
ttllar este accidente , dai-lhe hum bom copo de
ã<rua-ardente da terra, de que elles são muito ami-
x>
<ros : com isto elles se vão contentes , e pelo maior
interesse não beberião agua depois ; pelo receio
de não diminuir o ardor do iicuor , que os satis-
faz ; e que neste caso lhe he hum remédio so-
berano.
No tempo da ccllieita se necessita de toda a
^ent-e. Então não ha hum que seja de mais. Hum
escravo de menos no espaço de 15 dias somente,
faz hum objecto de 12 barris de Café em fructos,
(que podem dar 200 anateis de Café limpo) da
menos pela ausência de hum só escravo. Que se-
rá quando faltarem muitos? O Café não espera pe-
la nossa commodidade para amadurecer : segue sem-
pre seu trilho. As chuvas o derribão , as corren-
tezas as arrastão , e levão a pos de si : e tudo isto
he perda. Precisa-se consequentemente aproveitar
estes momentos preciosos. E por isso desprezar os
escravos em taes apertos ; desviallos tão desacerta-
damente , não pôde fazer conta alguma ao Gran-
jeiro : seria fazer muito mal o <;erviço. Ora, longe
de os desviar , deve diminuir ametade dos domés-
ticos. Logo , que o Café estiver recolhido no ar-
mazém , estará seguro : cm quanto porém estiver
na
na arvore , estará sempre arriscado. Assim todo o
Grangeiro sábio e avisado , que conhece os seu»
interesses , evita quanto pôde tudo , o que se op-
pôem ao adiantamento da sua colheita.
§ XXXII. Descripçuo da explanada.
As explanadas se fazem de alvenaria levanta-
das da terra quasi 6 pollegadas com seus rebor-
des em roda de huma certa altura , nas quaes se
fazem boeiros para escorrerem as aguas ; a sua gran-
deza iie illimitada , mas proporcionada á quantida-
de de Café , que o Granjeiro deve recolher. Por
esta razão os ha de differentes tamanhos , huns de
cem pés quadrados , outros de menos. Estando bem
calçado no seu fundo se lhe põem por cima hum
bom reboque , de modo que represente ser elle to-
do huma peça , sem as divisões que se verão obri->
gados afazer, para se acautcllarem de huma chuva
grande , que podia trazer alguns accidentes , carre-;
tando comsigo em hum instante todo o Café,
que se tivesse posto nelle. As correntezas da agua
ficão atalhadas por meio dos repartimentos , que
se oppõem á sua rapidez , e velocidade , e ellas
tem tempo de se escoarem pelos boieiros de cada
repartição , á medida que nella entra , sem se lhe
dar tempo a fonnar alguma corrente. E para ac-
celerar a sua evacuação se dá a esta explanada hum
pe-
I
C Si )
pequeno declive , ou pendor que guia as aguas para
os boieiros sem violência alguma.
Sobre estas explanadas se póem o Café , para
se seccar , e se tem cuidado ,de o mover muitas
vezes , para se adiantar a secoUra. Trez ou quatro
dias de bom Sol será sufficiei^te , tendo-se cuidado
de o abrigar todas as noites , e de acautellar que
elle se não molhe. Isto feito se recolhe ao arma-
zém , e se guarda até sahir para se pilar , e a es-
te chamamos Café secco cm pergaminho , ou com
a sua aralha.
Ha outro modo de o seccar , que parece mui-
to mais expeditivo ; porém he sujeito a muitos in-
convenientes , os quaes hirei notando á medida ,
que se forem offerecendo occasiõcs. Este he fazei-
lo seccar em a sua cereja. Ainda que eu não seja
partidista dos que abração este methodo , com tu-
do não os condemnarei ; pois cada hum tem suas
razões , que os compellem a obrar , conforme enten-
dem , e a usar da sua liberdade , trabalhando a seu
geito. Muitas vezes a necessidade he , a que deci-
de do facto. Eu não decidirei , mas direi com tu-
do o meu parecer , sem pertender que o sigão j
porque não sou mais Filosofo que elles. Mas , co-
mo os Grangeiros de Café gostão de discorrer , en-
tremos no campo, e sigamos a torrente : daremos
nosso suffragio , que será vencido pela pluralidade,
mas não negarão que eu o dei. Se bom , ou máo ,
C S2 )
nada importa , seguindo sempre o seguro de nã<^
arruinar cousa alguma. Que se arriscará?
Este modo de fazer seccar he muito mais com-
modo , c os que o reputão mais prompto , e ex-
peditivo inteiramente se enganão. He certo que se
não precisão Engenhos , nem os que nelles traba-
lhão. No mesmo instante , em que se colhe , se
põem na explanada , onde se deixa ficar , até que
perfeitamente fique secco , de noite e de dia , sem
se inquietar ainda com a chuva. Póde-se julgar que
deste modo consumirá muito tempo em seccar , e
correrá risco de se avariar. Bstar sem cessar expos-
to ás injúrias do tempo faz indispensável que nes-
ta grande quantidade hajão alguns , que se sequem
languidamente ; porque se vem cobertos por outros,
ainda que se tome a precaução de os mexer. Sc
de dia se não molharem , molhar-se-hao de noite,
A força de os mexer muitos se despojarão das suas
cerejas , e por tanto não dcixarião de se voltar bran-
cos , e outros de se ennegrecerem : tantos inferio-
res que augmentão os rebotalhos . diminuem a ren-
da , e occupão hum tempo infinito na sua escolha,
que se poderia empregar muito mais utilmente em
algum dos outros trabalhos, que nunca faltão em
huma fazenda,
He ainda preciso observar que este Café pre-
cisa ser mais secco ao dobro do outro ; porque a
cereja conserva sempie hum certo sal , que o faz
bo.
( 80
bolorento » por pouca humidade que apanhe ; e da
qual he mui difficil defendella em hum Paiz , co-
mo o dos nossos moiros , que abunda de tanto ni-
tro ; e os temporaes são tão frequentes , faltando-
se a este ponto , o Café corre perigo de se aque-
cer , e vir-se a apodrentar. Para prevenir este acci-
dente convém de o examinar muitas vezes , e as-
sim que se persentir o menor calor , sem hesitar»
e sem a menor perda de tempo , se ponha ao Sol.
Que turbação não será a sua se neste comenos a
explanada estiver cheia de Café verde ? Será neces-
sário que prepare hum lugar para o outro. A is-
to se expõem algumas vezes os que fizerem seccar
o seu Café em cereja. Ao passo que o que o sec-
ca com o seu pergaminho , tendo-o lavado , o con-
serva annos inteiros em o seu mesmo estado ; por
que o purga do seu sueco glutinoso , e não fica
sujeito a mudar-se de sorte alçjuma , tendo cuida-
do de o defender de toda a humidade , por elle
ser summamente capaz desta impressão.
Em quanto a avantagem , que muitos se figu-
rão tirar , de o fazer seccar em cereja debaixo do
pretexto , de que só basta plantar , e colher , ro-
go que queirão attender ao tempo , que se gasta
em o pilar ? aquelle que se peide em limpallo , e
escolhello. Estou certo que hão de concordar co-
mido que , longe de ser hum adiantamento , he hum
atrazamento ', ou hum summo prolongamento <h
F ii sua^
C S4 )
sua obra ; pois se expedira muito mais depressa
trez carretas de Café em pergaminho , do ^uc hii-
ma em cereja.
J XXXIII. Em que tempo se pila o Café,
Como no tempo da colheita se esteja muito oc-
cupado , ordinariamente se espera que ella acabe
para pilar o Café. Os trabalhos se seguem hun$
aos outros successivamente ; e deixar hum , he ar-
luinar o outro necessariamente ; e por amor disto
precisa -se saber repartir o seu tempo. Cada dia de-
ve ser empregado muito a propósito. Regulando-
^e assim , por huma sábia conducta , tudo se porá'
em ordem ; pois esta faz que muitos Grangeiros
trabalhem mais com poucas pessoas , do que outros
com muitas j porque estes são emprenteiros de mui-
tas cousas ás vezes. Devem seguir pé por pé este
principio. Não se deve pilar o Café , senão quan-
do todo elle estiver guardado e fechado , menos
cue alguma necessidade nos obrigue , ( esta carece
de Lei) ou que tenhamos algum intervallo na colhei-
ta : neste caso será bom aproveitallo : porque os
primeiros Cafés são muitas vezes os melhores ; (ao
menos na apparencia ) pois que elles não tiverão
tempo de se avariarem ; mas he preciso não per-
doar cousa alguma , para qiie fiquem bem seccos,
e reduplicar o cuidado , quando sé quer pilar ; por-
que
i
C85)
que o Café novo he mui sujeito a inuilsr . não
tendo tido tempo de se firmar : lie então de hum
verde de corno encantador , transparente , e absolu-
tamente próprio a enganar ao mais destro conhe-
cedor. Assim , ainda que pareça estar secco , acon-
selho , aos que o comprarem , a que o exponhão ao
Sol , antes d' o embarcarem , para que por est®
meio lhe conservem a sua qualidade.
§ XXXIV. Como se pila o Café,
Convém que , antes de pilar o Café , se assoa-
lhe por dous dias successivos , e não começar , sc^
não ao 3.'' dia, e isto ao depois de se ter aque-
cido ao Sol. Deve-se observar isto , porque o mais
bello Café embranquecerá debaixo do pilão , senão-
tiver o ponto de seccura conveniente; e além dis-
/so se achatará. Em huma palavra : o Café deve ser
o mais secco , que se poder , e quanto mais o for,
tanto melhor , e mais facilmente se hade pilar.
Cada Grangeiro o pila a seu modo , ou con-
forme as suas posses , huns por meio de hum En-
genho , outros em hum cocho, outros em pilões:
de madeira. Não saberei resolver , qual deites trez
seja o melhor. Se o quizesse fazer, desagradaria in-
fallivel mente aos outros dous , e eu julgo , que me
não devo embrulhar com alguém por huma cousa
de tão pouca monta. He assas indifferente que se
pi-
(86)
pife deste, ou dacuelie modo, coin tanto que se
pile ; mas acho que o ultimo methodo seja mais
vantajoso , e o sigo por preferencia. Com effeito
as pancadas de hum pilão são muito mais seguras »
e mais regulares. O Café fica menos sujeito a ser
machucado , escapando muito menos ao pilão , e se
julga que se adian'"a muito mais , mas deve-se en-
tender isto pelo Café secco em pergaminho j por
quanto , aquelle que ainda se acha em cereja , jul-
go que convém mais aos cochos , e aos Engenhos ;
porque sendo mais duros ao pilar , he preciso que
as pancadas do pilão sejão dudas com maior força.
A penas o Sol entrar a aquecer , devem os pre-
tos , dous a dous a enda pilão , principiar o seu
trabalho , cada hum tem a sua mão , ou soquete ,
c lhe dá huma pancada iríedida , e revezada com
o outro , e por este modo se descasca o Café da
sua aralha , ou pergaminiio , que se despega sem
grande trabalho; pois ?ue 15 escravos em hum dia
podem muito bem pilar ou esbuiliar dous milhei-
ros. Esta facilidade , tida em pilar , mosfra eviden-
temente que a de^.peza de hum Ensrenho he su-
pérflua. Todavia, os que o possuem , podem entre-
tanto o;:cupar os seus escravos cm outro serviço ,
vantagem sobre que não conto n.uito a meti ver.
Kos Enge4ihos a ostenracão tem miiior parte que
a ;economii , e esta não merece a despeza do seu
custo ceifAiiiente 5 mas , em se:]do ricos , cueiem ter
hu-
C87)
fiuma Grangearia completa. Se elles tem meios í,
para o poderem ter , não sentem nisso detrimetitò
alo-um. Os artífices também lhe acharião grande
proveito , senão houvessem opiniões contrarias i
este respeito.
§ XXXV. Coma se aventa o Café.
Em quanto huns pilão , outros se occupão enl
no aventar. Também para isto se dá hum tercei-
ro En<íenhO , que faz esta funcção , e que he mui-
to útil , especialmente , quando não ha vento , o
que com tudo não he ordinário , mas algumas ve-
zes acontece ser muito fraco , então o Engenho hi
de hum grande soccorro , e alimpa o Café infini-
tamente melhor que o vento ordinário; porque Ihé
tira inteiramente o pó e a muinha da ara lha pul-
verizada. Também o pviva das pequenas pedras , a
que he sujeito , arremessando a parte o Café ,
que escapou aos pilões , e do mesmo modo o que
os pilões esmigalharão. Achou-se também hoje ô
segredo de ajuntar os trez Engenhos em hum só
empregando-se em trez differentes trabalhos poif
meio de hum cavallo , ou de huma mulla. Tanto»
he verdade que se aperfeiçoa este Grangeo câdl
dia.
Ao depois do Café estar aventado , e escolhido
de tudo , quanto tem de defeituoso , se assoalha de
no-
C8S)
novo zté o ineio dia , quando o Sol fere mais com
os seus raios. Enchem-se as barricas delle assim mes-
mo quente, e se cobrem muito bem. Esta pre-
caução he necessária : fortifica o seu grão , fecha-
Jhe os poros , e o faz menos disposto , ou capaz
das impressões do ar , e Jhe torna a dar a sua côr
piimitiva , e originaria , que o Sol tinha mancha-
do ; e se deixa por 5 ou 6 horas neste dia , e ao
depois ainda se lhe torna a dar hum dia de Sol
por ultima mão.
Ao depois de tantas preparações , e de se ter
apphcado tudo para a sua perfeição , enganar-se-hia
quem imaginasse que estava livre de toda a im-
pressão : elle conserva sempre hum certo sal , que
a menor humidade o dilata , e o faz flexível , e
depois disto , vindo a manchar primeiramente , o
embranquece ao depois todo inteiro. Apanhando es-
ta humidade todo o seu óleo se evapora ; e por
consequência he muito conveniente escolher-lhe dos
Jirgares o mais secco. Esta delicadeza he a causa ;
porque os Grangeiros não o mandáo pilar , senão
sobre seguro ; e quando ja estão para o vender .
f muitas vezes , quando ja estão para o transpor-
tar , só por llie não correrem o risco. Também se
ol serva não o pilar , estando o tempo húmido.
Rcn-
C 89)
§ XXXVI. Rendimento do Café,
Calculamos as prodiicções dos nossos rendimen-
tos pelos Cafeseiros , que julgamos , que podem dar
hum arrátel cada hum de Café. Dão-se alguns , que
produzem iriuito maior quantidade ; e outros me-
nor 5 mas para se poder fazer hum justo equiva-
lente , não se poderia , sem se afFastar da verdade
dar-lhe huma maior estimação, ou valor : bem en-
tendido que não he preciso metter em linha de
conta , os que excedem á sua quarta colheita ; e
«quando com cem escravos se faz cem milheiros de
Café , se mantém bem o lugar , o Grangeiro não
tem razão de se queixar. lYlas antes de ter adqui-
rido este número de escravos » e os animaes ne-
cessários para o serviço de sua fazenda e Granja ,
pode contar o conseguir ao retorno da idade. Se
clle não tem tido ganhos racionáveis para come-
çar , então também não os começará a gozar. Quan-
tos negros , novamente chegados ao Paiz , morrem ,
sem terem dado algum serviço a seus senhores ; e
que algumas vezes , sahindo do navio > onde se
comprão , cahem de repente mortos , pondo os pés
em terra ? Que grosseiras perdas senão fazem , quan-
do acontece que algumas moléstias epidemicas ata*
cão huma fazenda! As bexigas , os catharios , os
defluxos de peito , as boubas , e outros males vené-
reos %
( 9^ )
reos , que são tão ordinários na vida libertina , que
cJles passáo. Não ha dia , nem anno , que em hu-
ma fazenda não haja na Enfermaria 8 a lo ne-
gros doentes. E quando os catharros são frequentes,
não se poderia fixar hum número certo.
Todavia não se poderia negar que os nossos
rendimentos não sejáo grandes , Jogo que checa-
mos a hum certo ponto ; mas se combinarmos as
perdas com os ganhos, será preciso rehaixallos. Ha
revezes que a sagacidade humana não poderia , nem
saberia evitar ; e era necessário que os nossos ren-
dimentos fossem grandes para os reparar. Quero ci-^
tar hum exemplo acontecido de fresco em hum Fa-
zendeiro de Dondon , do qual não he preciso dizer
o nome. Começou , estabelecendo huma Granja d^
Café com 16 escravos. No fim de 18 mezes , quan-
do já se via com hum formoso número de Cafe^
seiros , que já produzião , se vio reduzido a hum
sò escravo , tendo-lhe morrido os 15 dentio eiii
muito breve tempo. Se eJle tivesse por este tem-
po rendimentos , não lhe faJtarião soccorros ; mas ,
não os tendo tido ate então , lhe foi necessário to-
mar outro partido galantemente , e este foi , o dé
vender a sua fazenda já em estado de lhe render;
e de ir para outro Jugar dos mais distantes a es-
tabelecer outra. Isto foi , o que elle fez. Contento-
me com este exemplo só , mas àtyç se pensar que
este não he o único. Os MaUandali>tas o fizeraô
ver
I
C 9» )
vêf ao. depois, e desprendêrãa os olhos aos incre-.
dnlos. Pasxo em filtncio as revoluções frequentes,;
e os i;u:endics , que são tão cçmir>uns em hum
Paiz , em que a maior parte das ca^as são de/ma-
deiras ordinariamente , e a maior parte cobertas de
paliias de canas j e que muitas vezes atrazão os
nossos rendimentos mais de trez annos.
Eis aqui , meus senhores, huma idéa geral de^ta
Granjearia. Se acaso me escaparão algumas ciicum-
stancia^; , serão de si talvez tão insignificantes , que
não vale- ião a pena de serem attendidas, ííe verda-
de que a repetição das experiências nos federão,
procurar alguns novos descobrimentos 5 e se alguns
vierem ao meu conhecimento , terei hum verda-
deiro gosto de vos participar , ainda que o seu in-
teresse não haja de ser grande. O favor , que me
íizerão , de receber favoravehiiente os meus primei-
ros Ensaios sobre o índigo , me excitou a offere-
cer acrora também este sobre o Caíé. Eu não du-
y/do que a minha qualidade de vizinho não ha-
ja tido muita parte tamibem ; e que senão teria
tido tanta indulgência , se eu fosse hum Author
que professasse Sciencias, Se me escaparão alguns
defeitos, são, pelo menos , supportaveis a hum ho-
mem , que carece de estudos. Se a simplicidade do
meu e-ítilo lhe diminue alguma cousa o preço ,
será certamente indemnizado pela verdade , que tej-
na em todo elle. Nada escrevo sobre jnformâacoes
aU]eias.
(90
alheias. A moradia de 38 annos nestes lugares me
tem dado huma tal experiência . que senão pode.
rá duvidar de nada , do que digo , ou escrevo.
1
ME-
( 9i )
MEMORIA
SOBRE A CULTURA
D O
GAFE
POR
M>. FUSEE AUBLET.
O
Descobrimento do Cafeseiro , o uso do Ca-
fé em bebida , e os progressos deste uso epi as
diversas Nações do mundo não são os assumptos
que me piopuz tratar. Muitos AA. communicárão
tudo , quanto lhes foi possivel descobrir , sobre es-
tes objectos de curiosidade. Desde Silvestre Du-
four > que escreveo em 1686 até Mr. Elles que es-
crevia em 1774 í e que , sendo o ultimo , deve ser
consultado com preferencia a todos , por ter ex-
trahido tudo , quanto havia de interessante , e me-
lhor a este respeito. Todavia , como cada Nação co-
nhece melhor , o que lhe he particular , que as ou-
tras , refirirei alguns factos, que procurei , quanto
jne foi possivel verifícallos. O uso do Café , que se
faz recuar para os Turcos até o fim do 16.° Sé-
culo , parece que senão fez tão grande no resto
da
fel'
(94)
dã Europa, senão no meio do Século i?..° Mos-
tra se que reinando Luiz XlII. se vendia no Petit
Chatelet em Paris a decocção do Cafc com o no-
me de Cahove ou Cahovet. Parece que o primei-
ro pé de Café , que se cultivou no Jardim Real ,
foi trazido por Air. de Ressons Oficial d'Artilhe-
ria. Mas tendo morrido este pé , Mr. Erancaz Bur-
gmestre de Amsterdão enviou em 1714 a Luiz
XIV. hum Cafeseiro , cuja historia he interessante,
por ter sido o Pai das primeiras plantações de Ca-
fé em as nossas Ilhas da America.
Em 1716 as novas mudas de Cafesciros , cria-
dos dos grãos deste pé , fórão confiadas a Mr. Isem-
berg Medico para as transportar ás nossas Colónias
das Antilhas , porém , morrendo este Medico , pou-
co tempo depois da sua chegada , esta tentativa não
teve o succes^o , que se desejava. As Ilhas sãò
obrigadas a Mr. de Clieux por ter concebido erii
1720 o projecto de enriquecer a Martinica desta
cultura ; e aos seus cuidados se deve o bom êxito
deste segundo Ensaio. Este bom Cidadão , nesse tem-
po Capitão de Infanteria , e Tenente do Mar , ten-
do diligenciado pelo respeito de Mr. Chirac Medi-
co huma muda , tirada dos grãos do Cafeseiro do
Jardim Real , o embarcou para a Martinica. Mas
«u cuido que devo deixar a Mr. Clieux dar conta
do successo da sua empreza no Extracto de huma
carta , que me fez a honra de escrever a este respeito.
.. De-
C9! )
.- ,, Depositário de huma planta , tão preciosa pa-
ra mim , me embarquei com a maior satisFaçãa,
O navio , a cujo bordo vinha , era mercante , de
cujo nome , e o do seu Capitão me não lembro ,
pelo tempo que tem decorrido ; e só sim que a
nossa viagem foi dilatada ; e que , faltando-nos a
agua por ir.als de hum mez , me vi na precisão
de repartir a pequena ração que me cabia, com o
pé de Café , em quem tinha as mais felices espe-
ranças ; e que era as minhas delicias. Tinha tanta
necessidade deste soccorro , quanta era a sua fra-
queza summa ; pois não era maior que hunia mer-
gulhia de cravos. Chegado, que fui a minha ca-,
sa , foi o meu primeiro cuidado plantallo com at-
tenção em o meu jardim no Jugar , que melhor
ajudasse o seu crescimento. Ainda que eu o ti^„
vesse á vista, e em guarda, muitas vezes cuidei
que mo tinhão tirado , de sorte , que me vi obri-
gado a mandallo rodear de mourões 5 e de lhe pôr
huma sentinelia , que o espreitasse até á sua ma-
dureza. „
„ O successo preencheo as minhas esperanças;
porque recolhendo quasi duas livras de grãos , as
reparti por todas aquellas pessoas, que julguei ca-
pares de cuidar convenientemente na prosperidade
desta planta. A primeira coIheita\ foi abundantíssi-
ma , mas na segunda , se achou no estado de se
estender prodigiosamente a sua cultura. Mas o que
deo
C9«)
deo lu^ar á singularidade da sua multiplicação, foi
que dous annos ao depois , todos os cacoeiros , que
fazião a occupação de mais de dous mil vizinhos
desta Ilha , e o seu único soccorro , foráo desrai-
gados , arrancados, e radicalmente destiuidos pela
mais horrorosa tempestade , acompanhada de huma
inundação , que suhmergio todo o terreno , em
que estas arvores tinhão sido plantadas ; terreno >
que immediatamente foi logo empregado com tan-
ta vigilância , como sabedoria em huma plantação
de Cafeseiros , os quaes maravilhosamente produ-
zirão ; e pozerão os cultivadores em estado de o$
espalhar , enviando-os a S. Domingos , a Guada-
lupe , e ás outras Ilhas adjacentes , nas quaes ao
depois foi cultivado com o mais feliz successo »
&c. &c. &c. „
Poí este mesmo tempo quasi , ou pouco de-
pois foi o Café trazido a Caienna. Em 1719 hum
fugitivo de Caienna , sentindo-se de ter deixado o
seu Paiz , para se retirar aos estabelejimentos Hol-
landezes de Guiana , e desejando voltar aos seus
compatriotas , escreveo de Suiinam , que , se o qui-
zessem receber , e perdoar o seu delicto , traria
grãos de Café em estado de germinar , a pezar das
penas rigorosas , promulgadas contra os que sahis-
sem da Colónia com os taes grãos. Sobre a pala-
vra , que se lhe deo , chegou a Caienna com grãos
novos , c os entregou a Mr. dAlbon , Commissa-
rio
C97 )
rio Ordenador da. Marinha , que se encarregou de
os criar. A seus cuidados correspondeo o melhor
successo ; os fructos , que as arvores logo produzi-
rão , fotão repartidos pelos vizinhos , que , dentro
de pouco tempo , multiplicarão os Cafeseiros ao
ponto de se fazer delles huma cultura lucrativa.
A companhia das índias , estabelecida em Paris ,
enviou em 17 17 á Ilha de Bourbon por Mr. Du-
fougeiet Gienier , Capitão do navio de S Maló al-
gumas mudas do Cafc Moca , que forão entregues
a Mr. Desforges Boucher, Tenente de B.ei desta
Ilha. Parece que em 1720 só havia hum pé, do
qual o producto foi tal esse anno , que , pelo me-
nos , se plantarão 1 $ mil grãos de Café,
Em todas as partes , em cue encortrei o Café
cultivado, como hum objecto de Commeicio piin-
cipal , fiz algumas observações relativas ris avanta-
ges , e desavantages das diíferentes culturas desta
planta. Creio que devo communicar aqui huma des»
tas observações , que pode ser utii ás Colónias ,
ou , ao menos , que deve obrigar a fazer ensaios.
Vem a ser ; tenho notado que a arvore do Café ,
que está abrigada dos ventos , defendida do gran-
de ardor do Sol , e plantada em hum terreno ,
entretido de alguma humidade pela natuieza dp
mesmo , ou frequentemente regado por rigolas ,
cresce mais promptamente , fica mais vigorosa , dá
Hiais frueto , he menos sujeita a ser .accommetti-
G d4 .
(9S )
da dos pulgões , e dura mais do que , quando se
acha batida dos ventos , exposta ao ardor do Sol ,
plantada em hum terreno árido , e que só he re-
gado pelas chuvas.
Observa-se assas geralmente que as plantas de
huma mesma família se agradão de huma terra , e d«
huma exposição do mesmo género. A maior parte
da familia das Rubiaceas , á qual o '"afeseiro parece
pertencer : gostão dos terrenos frescos , dos abrigos
das grandes arvores , e dos arbustos : aproveitao pou-
co expostas ao foi te Sol , não soffrem o chapota-
mento , a não serem rebaixadas , ou cortadas junto a
terra. He raro que se achem estas plantas solitárias,
ou expostas aos raios do Sol ; e da mesma sorte
nos terrenos baixos sujeitos a serem inundados de
agua.
Mas isto não he sobre simples razões de ana-
logia , que eu aconsellio o e^abelecer hum Cafe-
sal. Eu vou dar observações mais decisivas para os
cultivadores , expostas pela mesma ordem das mi-
nhas viagens.
Quando aportei a S. Tiago , huma das Ilhas de
Cabo Verde em Março de 1754 vi Cafcseiros , plan-
tados ao abrigo de grandes arvores , e regados nos
tempos seccos por regos feitos por este motivo.
Estas arvores , levantadas quasi sete pés , tinhão hu-
ma bella verdura , e estavão carregadas de fructos :
seus ramos , e raminhos se estendião por todos os la-
áos. Che-
C 99 )
Chegando á Ilha de Franca no mez de Agosto,
vi junto á casa de Mr* Marsác em hum terreno
mal cultivado , e cheio de hidens chamada no Paiz
herbe ajornct Cafeseiros de hum bello aspecto , car-
regados de flores , e fructos ) mas estavão rodeados ,
e separados por bananeiras , guaiaveiras , e pesseguei-
ros. Os Cafeseiros não erão menos vistosos nas fa-
zendas , Bip:aillon Vendome , Genies e Grainville ,
que são tenenos hum pouco mais frescos, e mais
ret^ados pelas chuvas. Em geral este distticto he
pouco descuberto ; e os seus roçados são pequenos ,
.bordados de grandes arvores * entre cortados de cór-
regos 5 e os Cafeseiíos estavão abrigados por mui-
tas bananeiras , guaiaveiras , pessegueiros , e outras
aryores plantadas de,huma, e outra parte, e no
meio delies. Em fim as mais bellas arvores , que vi ,
eráo , as que estavão plantadas nos districtos frescos
da Ilha á borda dos matos , nas encostas dos oi-
teiíos , e principalmente nos baixos destes mesmos.
Os vizinhos desta Ilha infelizmente não fazião do
Café o objecto principal do seu grangeo , e cul-
tura.
Em 1761 passei na Ilha de Bourbon alguns
dias , e discorri pelas freguezias de S. Luiz , Santa
Suzana , S. Deniz , e S. Paulo , e observe i Cafesei-
ros plantados em quinconce , expostos aos grandes
ventos e decotados , que na verdade produz ião mui-
to Café 5 mas as arvores tinhão hum caris , ou as-
G ii pe-
Kilr
C 100 )
pecto triste. Vião-se muitos ramos superiores des-
folhados , e outros muitos seccos , ou mortos. Os
carregados de fructos estavao sem folhas. Os nove-
dios lançados ptálo chapotamento erão fortes : le-
vantavão-se direitos , e não apresentavão nem flo-
res nem fructos. Os ramos erão por causa do cha-
potamento , os que se alongavão . e davSo o fructo.
Parece que a ra2ao ; porque adoptavão e<te corte
dos Cafeseiros , era , porque percebiao a necessida-
de ) que tinhão as arvores , de terem os pcs tres-
cos e húmidos ; e que a extensão dos ramos infe-
riores defendia o pé da seccura , e entretinha mais
fresca a terra i occupada pelas suas raizes.
Mas este mesmo expediente tem grandes in-
convenientes. As feridas multiplicadas por enes cor-
tes , praticadas de anno a anno , ou de dous em
dous annos , dáo entrada á agua , e ao ar em os
ramos , facilitão o seu deseccamento pelo Sol ! o
que occasiona a carie , e a atrophia , principalmeií-
te dos ramos , ao depois do tronco ; as folh;;s se fa-
zem amarellas ; e os seus fructos de má qualidade ;
porque não chegão nem á sua grossura , nem á
sua madureza. O cultivador não conhece remédio
algum para tirar a arvore do estado deste languor >
senão conar lhe o pé , o que se faz , quando er>-
tra na seiba. Depressa rebenta com força ; mas lo-
go que cliega a j ou 4 pés de altura , começa o
decotamento > que tem as mesmas consequências
fu-
fimcstas. Como os Caieseiros não morrem todos de
huma vez > se lephntão todos os annos. Os Co-
lonos não se empenhao em remediar com maior
efficacia as perdas que experimentão. Todavia elles
tem todos os dias debaixo dos olhos , o que eu vi
na I!ha de Bourbon , em quanto lá m.e demorei ,
isto he , que os Cafeseiros , plantados junto ás fa-
zendas e casas , á borda dos grandes córregos nas
encostas , entre guaiaveiras e outras arvores ; que
estes Cafeseiros plantados , e não tratados , sobem
mais de 8 pés de altura , tem hum bello verdor ,
produzem muito fructo ; e não tem ramos nos seus
baixos : vantagem que estas arvores parecem dever,
a que não soffrem nem soes ardentes , nem gran-
des ventos , nem decotamentos.
Voltando á França no anno de 1762 > recebi no
mez de Maio ordem , para partir para Caienna ,
aonde cheguei a 21 de Julho. Estas são as obser-
vações que então fiz nesta Ilha nos Cafeseiros de
muitos dos seus viiinhos. Fizerão-me vêr na fa-
zenda chamada de S. Luiz, que pertence aos Mis-
sionários , hum vasto terreno , que tinha sido iium
Cafesal , plantado em quinconce. Este Cafesal , sen-
do muito productivo , só durou dez annos fructi-
ficando : ao depois começou a seccar ; e ultima-
xrente veio a acabar de todo pelos rigores do Sol.
Nelle se seguio o usa do chapote. Restava ainda
yiesta fazenda hum grande uúmero de Cafeseiros
-> abri-
Wi
( IC)2 )
abrigados pelas casas dos pretos ; e pelas arvores ;
^ue se deixavão em liberdade , sem cortar : estes
Cafeseiros erão de hum bom rendimento. Acha-
vão-se Cafeseiros no mesmo estado nas fazendas de
Mr. Mucay : também erão de muita producção.
Mr. de Monty tinha em Caienna no districto de
Arouva hum excellente roçado plantado de Cafe-
seiros em quinconce. As suas aivores crescião mui-
to bem , mas elle se queixava que todos os dia»
lhe murchaváo algumas , como se as folhas hou-
vessem sido escaldadas em vapor da agua quente.
A abundância das chuvas de aguaceiros deste Paiz ,
a acção viva do Sol , que as reveza immediatamen-
tc , aquecem de tal sorte a terra a trez , ou qua-
tro pollegadas de profundidade abaixo da superfície
da terra , que o vapor , que delia sobe , he tão
espesso , como o próprio da agua quente. He ad-
mirável que huma arvore , que ama o fresco , e cu-
ja folha deve conservar sua firmeza , haja de mor-
rer com tanta promptidão por estas impressces fre-
cuentemente repetidas.
k medida pois que os Cafeseiros se misturão
confusamente com outras arvores , que favoreção o
seu cre-cimento , abrigando os em sua mocidade ;
á medida , digo eu , que os Cafeseiros fícão gran-
des , se cortem estes tutores, que os abrigão ; C
ao depois «^e arranquem : os Cafeseiros se esten-
dem , e alargão j e a sua copa faz huma sombra ,
( lOJ )
c hum fresco suficiente á terra : os troncos adqui-
rem a grossura de hum braço , e dão hum* Café
superior ao das outras Colónias , redondo , e pe-
queno , como o de Moca , ao qual se approxima
como os Gafes das Ilhas ; porque a sua madureza
não he accelerada e forçada pela seccura.
Da Guienna Franceza passei a S. Domingos em
1764, onde repeti as mesmas observações sobre os
Cafesaes dos districtos de Porto do Principe , Gran-
de e Pequena Goave , do Fundo dos Negros , ào
Mirabalacs até ao Cabo do Forte Delfim , e do Mo-
le S. Nicoláo. Os Cafeseiros , abrigados pelas fazen-
das , e casas , ou plantados em lugares baixos » go-
zavão de huma verdura viva , e não crão jamais
atacados pelos insectos pulgões : ao passo que os
Cafeseiros dos terrenos seccos , descobertos , expos-
tos aos ventos , e raios do Sol , estavão no risco de
amarelecer e morrer , durar pouco > e serem muitas
vezes arruinados pelos pulgões.
Assim , quando se destinar hum terreno inculto 9
para se estabelecer hum Cafesal , se nelle houve-
rem arvores , he preciso conservallas interpoladas »
aqui , e alli , para darem sombra sufficiente ao abri-
go dos novos Cafeseiros ; e especialmente , para
que as novas arvores possão estender seus ramos ,
e conservar a sua folhagem guarnecida , e sempre
verde. Devem-se antepor , as que tiverem as raizes
curtas sobre a superfície da terra , e com especia-
C 104 )
1 idade as que podem ser de hum maior proveito ,
como Jaqueiras , Mangueiras, Abacateiras , C^apo-
taseiros , Pessegueiros. Se o teneno destinado aos
Cafeseiíos não contiver outras arvores, convém en-
tão que se plantem algumas em distancias arrazoa-
das , dous ou trez annos antes de se estabelecer o
Cafesal , ou , ao menos , no mesmo acto de o esta-
belecer. Mas nesta occasião será preciso que se vá
diminuindo o número cada anno , á medida que ci-
las houverem de dar sombra. A terra não tem pre-
cisão alguma de ser cavada proíundamente : o mais
importante he que ella não seja calcada , ou rija.
Quasi todos os terrenos , ou terras convém ao
Cafeseiro , ainda os que são pedregosos ; com tanto
porem que consintão que as raizes as hajão de pe-
netrar facilmente ; e que ellas -ozem de huma ligei-
ra humidade. Mas não sahirião bem em hum terre-
no , em que a agua se haja de demorar ; nem em hum
.de fundo lodoso 3 por exemplo , não se deverá plan-
tar nas enseiadas , donde o mar se retirou , e onde
deixou hurna terra tenaz , e arenosa , que o Sol sec-
ca facilmente , e faz gretar ; e donde a superí:cie ,
cstofando-se , quando está humedecida , fecha to-
das as passages á agua.
Não he preciso lavrar frequentemente os Café-
sa€s pelo perigo , em que se porião de levantar , ar-
rebentar , e ventilar os barbalhos , ou as pequenas
rajzes dos Cafeseiros , que os raios do Sol ossec-'
ca-
carião , faria retirar a humidade da terra para hu-
mà grande profundidade com pressa , e a reduzi-
ria em pó : basta que não seja calcada , dura , e
de tal sorte batida , que as chuvas , e orvalhos não
a possáo penetrap , e humedecer j mas deve-se ter
grande cuidado de os mondar das hervas bravias ,
que , recebendo e chupando os orvalhos , e humida-
des , impedirião a terra de as aproveitar , ou os des-
pojaria© promptamente deste beneficio.
Não conviria também himna semeadura a este
fim , senão quando se intentasse emprehender hum
Cafesal ; e ainda para este mesmo talvez , que nos
Cafesaes vizinhos se acharião mudas sobejas ás suas
necessidades. Todavia , se os amantes desta gran-
gearia entretivessem viveiros desta planta , e que
ahi conservassem boas plantas em reserva , terião
a vantagem de escolher boas mudas , isto he , as
mais vigorosas e mais adiantadas. A final , quando
hum Cafesal está bem pegado , e que se dá aos
Cafeseiros huma boa cultura , que lhes seja própria,
he baldado seguramente o ter-se hum viveiro.
li
RAP.
mf^
C '07 )
RAPSÓDIA
D À
MJISON RUSTigUE DE CJYENNE
POR
Mr. de prefontaine.
o
Café he hum objecto de grande commercio
entre America , e Europa , e he hum dos melho-
res géneros , a que hum fazendeiro Americano se
pôde apegar.
O Café se planta de grãos ; a terra , que se
Ifee destinar , deve ser igual na profundeza á de hum
cacaoeiro , bem mondada de hervas bravias na sua
superfície , e , quanto se podesse , livre de cepos,
è barbalhos,
Alinhe-se a cordel o terreno , e se lhe ponhão
estacas de 7 a 7 pcs. Escolha se para plantar Café
o tempo de maiores chuvas. Os dias sombrios , e
de nevoeiros são preferíveis : tirão-se mudas de Ca-
fé para plantas , que hajão de ter de altura 7 pa-'
ia 8 pollegadas. Aliiiipão-se ; e se cavão profunda-
mente as covas , e se mettão nellas.
O vento do Norte não he favorável aos Cafe-
seiros. A planta nova he muito delicada , e amiga
da sombra 5 antes de fazer a sua plantação de Ga-
fe-
im
( 108 )
feseiros conviria que o terreno , destinado a ser o
Cafesci] , fosse coberto com mandiocas , ou bana-
neiras para lhe fazer sombra.
Não se devem fiar sempre na bclla apparcncia
dp Çaleseiro Este ar de prosperidade, que nelle
se encontra , muitas vezes só he na superfície da
terra, ííe a sua raiz na sua direcção encontrar hum
tufo ' difFerente , se fará amareilo , e se definaiá :
mas também acontece muitas vezes que , estando de-
^nado no principio , depois ,. á vista dos olhos , se
ayiventa , encontrando melhor terra , e própria.
Como os Cafés chegão a huma altura muito
grande por amor da facilidade da colheita dos grãos
se limitão a 6 , ou 7 pcs de altura , cortando lhe
a extremidade , com que se obriga a coroar-se , e
a guarnecer-se. Hum lavrador de canas , ou de ou-
tra qualquer grangearia deve ter hum parque de
Cafeseiros para o uso domestico. As Cabossas do
Urucú , e do algodão dão hum bom estrume para
est^ arvore.
O Café cresce assas depressa , quando he bem
tratado , vem naturalmente muito roliço no pc.
Seus ramos sahem do tronco com huma regulari-
dade » que produz hum effeito agradável, òó dão
fructo no fim de trez annos : florece em Outubro ,
e Novembro. Colhe-se em Junho. Fazem dpas co-
lheitas no anno ; a do Inverno he mais abundante.
Suas flories se assemelhão ás do Pessegueiro * e os
fru-
( 10^ )
fructos que produz a buma pequena cereja. Pri-
meiramente são verdes ; avermelhão-se ao pas^o
que vão chegando ao ponto da sua madureza. "Hti*
ma côr de couro curtido he hum indicio certbi
Então se colhem : esta colheita se faz estanda de
vez , ou maduros. Os pretos para esta acção só
necessitão de cestos , e de seus dedos ; e elies c^rí
regão para a casa destinada a esta manufactura.
Servem se para separar o Café da sua coberta
de huma máquina , ou Engenho , chamado moinho
de Café, Acoberta cahe para hum lado, e o Ca-
fé par9 outro com o seu pergaminho. Os poucos
habitantes , que se empregão unicamente neste gé-
nero de grangearia em Caienna , fazem uso deste moi-
nho raras vezes. Mas póde-se julgar do tempo , que
devem perder aquelles , que são obrigados a fazer
esta separação pelo único meio de seus dedos.
Alguns fazem seccar ao Sol o seu Café com a
casca : outros só com o pergaminho. Estando bem
secco ; se pilão em pilões grandes de madeira , para
lhe separar o pergaminho , e ficar o grão vendavel. Es^
colhem-se , e se tirão os grãos defeituosos , dos que
são bons. Aventão-se, estando os rebotalhos separa*
dos. Para este serviço ha também em Caienna certa
máquina , que ainda he mais rara que as primeiras.
Para que o Café se repute de primeira quali-
dade deve ser pequeno , e côr de xifre , tão duro
que ranja entre os dedos , quando se mexer.
C "O)
o ar humedecido pelas chuvas , como aconte-
ce cm Caienna, o embranquece. Julgo '.;ue se po-
deria remediar este inconveniente no Inverno por
meio de huma estufa , fazendo-o seccar a fogo bran-
do * e não pondo nos recipientes muita quantidade.
Algumas vezes se fica surprendido de ver acabar
hum Cafesal dentro em pouco tempo. Isto muitas
vezes he causado pela mosca , chamada mosca de Ca-
J'é t comprida de seis poUegadas , que traz na cabeça
duas serras , com as quaes corta estas arvores até
ao cerne. Encontrando-se estas moscas, não se he-
site em as matar.
Acontece também que os pulgões , pequenos
insectos brancos , accommettem os Cafeseiros , e n^o
50 embaracão a sua producção, mas também os fa-
zem acabar. Neste caso he impossível preservar os
Cafeseiros do estrago por outro meio , que não se-
ja pelo de plantar ananazcs em as avenidas. Os in-
sectos deixão os Cafeseiros por este fructo , que pre-
ferem j e com que se engurgitão. O ácido deste
fructo > ou os mata 1 ou embaraça o seu salto-
Estando os Cafeseiros em producção , e assas guar-
necido de ramos , não requer quasi trabalho algum.
A sombra que dá , impede as más hervas de nasce-
fem. Tenho examinado que a humidade dos Cafe-
seiros he nociva aos pretos na colheita : Devem 05
senhores obrigallos, a que se cubrão neste traballi^.
ME-
MEMORIA
SOBRE
CAFÉ,
C Díctlonaire des Jardiniers, )
POR
G
FILIPPE MILLER i.^.
Caracteres.
Cal IS he pequeno , dividido em quatro partes,
e posto sobre o germe : a corolla monopetala , em
íorma de salva , provida de hum tubo estreito , cy-
lindrico , e muito mais comprido que o calis, alar-
gada no seu remate , e recortada em cinco pontas.
A flor tem cinco estames , adherentes ao tubo , e
terminados com remates compridos , e delgados. O
germe redondo, sustendo hum estilo simples , co-
roado por dous estigmas espessos » e revirados : o
germe ao depois passa para huma baga oval , de duas
sementes hemisféricas , chatas de hum lado , e con-
vexas de outro,
Mr. Linne arranjou este género de plantas na
primeira secção da quinta classe , intitulada Pcntau'
dria
("O
dria Monogynia ; porque as suas flores tem cinco cs-
Umes , ehum pistillo , mas como as floies do ja$-
min só tem dous estames , Linne no seu systema
as separou das outras.
Esta arvore he original da Arábia Fel is , onde
se cultiva para o uso , e donde , ainda hoje se ti-
ra o melhor Café para Europa. Ainda que os Ca-
feseiros tenhão sido trazidos de lá para se transplaií-
larem nas índias , e na America , onde prodÍ£;iosa-
mente se tem multiplicado , todav'ia o fructo , que
produzem nestas novas regiões , he muito somenos ao
da primeira : o que o fez cahir em despre70 em
Inglaterra a hum ponto tal , que não vale a pena
de se exportar das Colónias. Com tudo , julgando
cu ser possível remediar-se este inconveniente pela
practica de algumas experiências , que hei de pro-
por daqui a pouco , e que se approvárão nos Cafe-
seiros , que se plantão nas estufas, daiei principio
d' anterHão ao que esta arvore requer no nosso Cli«
ma.
Esta arvore , que no seu Paiz natal não cresce
a maior altura que 16 ou 18 pés, em Inglaterra só
chega a 10 até 12. O seu tronco principal he di-
reito , e coberto de huma casca parda clara , seus
ramos se estendem horisontalmente oppostos , e S3
crusão huns com os outros em cada nó , de sor-
te que , a arvore se guarnece delles em todos os
lados. Seus ramos inferiores são os mais compri-
dos ,
dos , e os qutios á proporção , que a arvore vai sOtf
bindo, se v5o pouco apouco diminuindo, de ma-
neira que formão huma espécie de pyramide. Suas
folhas, que também são oppostas , tem quatro ou
cirico pollegadas de comprido , huma e meia de
largo no meio , quando estão inteiramente desco-
bertas , e se estreitão para ambas as extremidades :
suas bordas são ondeadas , sua superfície de hum
verde lustroso , suas flores sentadas , tubulosas ,
alargadas no cimo , quando inteiramente estão aber-
tas : nascem amontoadas na base das folhas ; a par-
te superior da sua corolla se divide em cinco par-
tes : estas flores são de hum lindo branco , espa-
Ihâo hum agradável perfume, e de huma curtíssi-
ma duração. São substituídas por bagas ovaes , pri-
meiramente verdes , vermelhas ao depois , e negras,
quando estão totalmente maduras. Estas bagas se
cobrem de huma capa delgada , e carnuda , que con-
tém duas sementes unidas , convexas de hum la-
do , chatas e arregoadas de outro por huma ranhu-
fa longitudinal na face, em que ellas se unem.
Esta arvoreta , conservando constantemente o seu
verdor , he mui vistosa , e linda em todas as qua-
dras ; mas muito principalmente , quando está flo-
fida , pela alvura , de suas flores > e quando está fru-
ctuosa ; pelo encarnado dos seus fructos no inverno.
Raras plantas haverão , que hajão de ter o seu me-
recimento para huma estufa.
H IVlui-
( n4 3
Multiplicão-se pelas suas bagas ; que precisão ,
Jogo, que se colhem , serem plantadas; pois que,
4endo-as fora da terra , ainda por muito pouco tem-
po , não abrclharião. Eu as tei.ho remettido a ou-
tros Paizcs pela posta, e se acaso passavão 15 dias
sem serem plantada», nâo nascião ; o que geral-
mente acontece cm toda a parte. As baj^as , que de
Hollanda se enviarão a Paris , não brotarão, succes-
50 , que também se experimentou , nas que vieião
de Hollanda para Inglaterra , de sorte que , havendo
ijualquer distancia considerável , será melhor man-
dar algumas mudas.
Plantão-se estas bagas em pequenos vjsos de
barro , cheios de terra solta das hortas , c se en-
terrão em taboleiros cobertos de casca de cortume ,
regão-se levemente huma , ou duas vezes na sema-
na , acauteliando totalirente que a terra se não en-
sope pelo medo , de que as bagas ven4ião a apo-
drecer;
Se o taboleiro tiver o gráo de calor necessário,
appareceráõ as plantas no fim de hum mez , ou
de cinco semanas ; e tendo dous Hiezes se acharão
cm termos de haverem de ser plantadas. Como
muitas bagas algumas vezes produzem duas plan-
tas , não demorem a sua separação, para que as
suas raízes melhor se formem; porque, deixando-
as unidas até que ellas se engrossem » estas se
entrelaçarão, e engalfinharão de maneira que será
mui-
C iM )
muito ditficultoso sepaiaJJas sem arruinar as suas fi-
bras, o que as estiagaria. (*)
As plantas dos Cafeseiros trouxerão os Hollan-
deies priíneiraniente da Arábia a Batavia , e des.ta
á Hollanda , onde se criou huma grande quantida^-
de por meio das bagas , que ao depois se espa-
Jháráo peio maior parte dos Jardins de Europa , e
também se levarão muitos de Amsterdão para Su-
rinam , onde eJLs se multiplicarão em grande abun-
dância , e destas se repartirão pela maior parte das
índias Occidentaes. As arvores , nascidas da semente,
fructiiicão ao fim de dous annos , e nas visinhan-
cas do equador ainda mais cedo , e he fácil nos
Paizes quentes fazerem-se delias grandes grangea-
rias , ou Caíesaes ; mas fora dos trópicos , e eii\
todos os Paizes , em cue ha invernos , não crescem
ao ar livre.
Os Francezes fizerão grandes Cafesaes em tor
das as suas pos^^essòes Americanas , e do mesmo
modo em Bourbon , donde exportão para França
huma grande quantidade, cuja venda he segura, a
pezar de ser a sua qualidade muito inferior ao da
Arábia. Também havião nas Colónias Inglezas gran*
des Cafesaes , e á poucos annos se propoz ao Par-
H ii la-
Ç * ) SapprimtrãO'se os § que tratão da sua Cul-
tura €in estitfas , por serem alheios do vosso asiifri'
pto. Recorra ao Author quem earecer delíes.
<n6 5
lamento Inglcz prémios necessários á auginentação
da sua cultura para facilitar aos Plantadores a sua
venda por preço mais cómmodo que aquelle , por-
que compramos, o que se nos traz da Arábia: em
consequência se diminuirão os direitos sobre todo
o- Café que viesse da America , na idéa que bas-
taria isto para os obric^ar a darein huma consistên-
cia mais sólida a este ramo de commercio ; mas,
sendo as produccões destes Paizes muito somenos
ás do da. Arábia , gorou o seu succcsso : e em ^^uan-
to os Plantadores pela sua própria industria não
aperfeiçoarem o s«u Café , nos não fica esperan-
ça alguma que este commercio haja de ser uni.
Arriscarei a- minha opinião mui sinceramente acer-
ca deste objecto , pelo desejo ardente , que tenho ,
•que elle haja de ser útil aos seus Grangeiros. O
que eu houver de dizer, se não fundará em suppo-
«içóes , menos em huma theoria vaga , mas sim
em, huma serie continuada de experiências , e fa-
ctos/
O grande defeito do Café da America , e do
meámo modo do da Ilha de Bourbon , he de não ter
perfume , e também de ter muitas vezes hum gos-
to desagradável , como as suas bagas sejao maiores,
não se pôde conhecer a causa , pela qual não se-
ja o seu gosto tão exaltado , e a sua seiba tão
elaborada como no Café da Arábia , que pode pro-
vir de muitas causas. A i. talvez será; porque os
Ca-
C n? )
Ca Pese
iros crescem
na America em hum terreno |
inuito
húmido ,
que
, administrando a
, este fructo hum
sueco
crú , e
mai
preparado , lhe
dá na verdade
maior
volume
, mas lhe diminue
necessariamente
a sua
bondade.
, A
2. he ; porque
estas bagas são
colhidas antes
da
sua perfeita madureza ; porque 1
estou
bem informado que os seus
cultivadores es-
tão no cotume de despegar os fructos , estando
estes ainda vermelhos , porque então ião maiores,
e mais pezados do que » os que se deixão amadu-
recer totahnente , o que só deve ser , quando esti-
verem negros. Então a sua carne exterior está sec-
ca ; c se descasca mais facilmente jdo que , quando
se apanhão antes de chegarem ao seu ultimo gráo
de perfeição. E daqui nasce a diíF.culdade , de que
se queixão os Plantadores acerca de o descascarem.
5, Também imagino outra , que he do modo , com
que o secção , e o pouco cuidado que empregão
nesta preparação essencial. As bagas hajão de ser
muito expostas ao Sol , e ao ar de dia ; mas de
noite se devem recolher, e livrallas do sereno , das
chuvas , e de toda a sorte de humidades , de que
ellas são muito ambiciosas , e lhes imprime hum gos-
to muito desagradável , e as faz engrossar , tiran*
do-lhes o sabor , como posso certificar era virtude
de muitas experiências, Tendo-se posto huma bo-
, telha de Rum em hum gabinete, onde havião ba-
gas de Café .em huma caixa de folha de Flandes
bem
bem fecriada , c posta sobre huina meza em par-
te assas distante communicou a este Café em pou-
cos dias hum cheiro de Rum que o fez muito des-
agradável. O mesmo aconteceo coin outra de at^ua-
èidente depositado no mesmo gabinete com o Ca-
fé , e Chá , que ambos ficarão arruinados em pou-
cos dias. Ao depois de muitas experiências desta
natureza , parece que se não deve jamais transpor-
tar o Café em navios carregados de Rum , e cue
ss não deverão secca.r suas bagas em casas , onde
se coze e assucar , e se distilla o Rum. Hum sujei-
to instruido , e digno de fé , me certificou que na
Jamaica , onde assistira por muitos annos pelas
propiiedades , que nella possuía, os Fazendeiros U-
2 ião ferver as bagas do Café antes de estarem sec-
cas : e isto só , sendo o facto verdadeiro , como
não duvido , basta para arruinar todos os Cafés do
mundo. Não posso adevinhar a razão porque in-
troduzirão <ite uso , a não ser , pela de lhe aug-
mentarem o pezo , e tirarem por este meio hum
maior proveito em damno essencial do bem pú-
blico.
Derão-se á pouco tempo á luz , nos papeis pú-
blicos , detalhes imperfeitos acerca das causas , que
fazião o Café da America inferior ao da Arábia :
pretendia-se nelles que a bondade do ultimo pro-
vinha de se guardar por hum tempo dilatado 5 e
por esta razão seu Author discorria que também
C»'9)
se deveria fazer o mesmo ao Cafc da America ,
para vir a ser igualmente bom. Esta opinião po-
rém he contraria ás minhas experiendas , e a pra-
ctica da Arábia. Dous sujeites , que assistirão por
alguns ânuos neste Paiz > me certificarão que as
bagas , frescamente colhidas » ião muito melhores do
que , as que se guardão por algum tempo ; e hum
homem curioso , que residio dous annos em Barba-
das , me -affirmou que nunca tomara Café melhor
ein parte alguma do mundo , do que aquellc , que
se preparava com as bagas , que elle mesmo acaba-:
va de colher , e que o fazia torrar conforme a
necessidade Confirmou- £e este testemunho também»
por ensaios feitos nos Cafeseiros cultivados nas es-
tufas de Inglaterra , e vieráo estes a dar hum li-
quor mais agradável que o dos Cafés da Arábia , tra-
zidos á Europa. Convido consequentemente a to-
dos os Grangeiros do Café na America > a que ha-
jão de encolher terreno para os seus Cafesaes , an-
tes secco do que húmido * no qual os Cafeseiros^
não aproveitarão tanto , como no outro j e o seu
fructo , ainda que .menor , e menos abundante será
de huma bondade maior que a do» outros , e lhes
dará em proporção muito maior interesse.
Necessita observar-se também que he preciso
deixar ag bagas muito tempo nos Cafeseiros, para
que as suas cascas , ou capas se cngelliem , e se
facão absolutamente denegridas. Na realidade o seu
C 120 )
pezo se diminuirá muito , mas a mercadoria do-
brará de valor.
Tendo as bagas chegado ao ponto da sua to-
tal madureza , he preciso escolher hum tempo sec-
co para as colher , e estendellas ao ar no Sol , re-
colhendo-as todas as noites por amo- do sereno , e
das chuvas. Quando estiverem perfeitainente seccas ,
se ensaquem com cuidado em saccos de trez for-
ros , e se guardem em lugares seccos. Ora haven-
do-se de embarcar , para o exportar , se deve fuírir
de navios que hajão de levar agua-ardente , pelo me-
do de não communicarem o seu cheiro ao Café,
o que facilmente se não evitará , se ambos os gé-
neros forem postos no mesmo lugar. Hum navio,
vindo das índias á muitos annos , carregado de Ca-
fé , tendo tomado a bordo muitos saccos de pi-
menta , perdeo toda a carga de Café , qu« trazia ,
absolutamente.
Como a consummação do Café se vai fazendo
cada vez maior em Inglaterra, deve o público in-
teressar-se em animar , o mais , que lhe for pos-
sível , os seus cultivadores das Colónias fcritanni-
cas. Este objecto he digno de ser attendido pe-
Jos vizinhos de nossas Ilhas , aos quaes seria da
maior utilidade a applicação no melhoramento por
todos os modos deste ramo de commercio , e prin-
cipalmente de se applicarem antes á sua qualida-
de , do que á sua quantidade , por que só a ap-
pli-
plicação por aquella parte não deixará de lhe fa-
zer este granjeo muiio mais lucrativo , e a sua
venda muito mais certa , e nluito mais segura.
CUL-
INSTRUCÇAO
SOBRE A CULTURA
D O
CAFÉ,
TRADUZIDO DO HOLLANDE:;^.!
( Melange de Hhtoire NaturelU, )
POR
Mr, alleon dulac.
§ Cultura do Café.
XJl Um HoIIandez , retido por seus negocies por
alguns annos em a Ilha de Mascarenhas , ou dé
Bourbon, se applicou no tempo da sua cssísten-
cia a examinar a maneira, com que os vizinhos;
ou moradores desta Ilha cultivavão o Café. De vol-
ta a Amsterdam escreveo estas observações , ás quaes
ajuntou novas vistas , animado dá justa confiança ,
de que ellas poderião ser úteis a seus compatrio-
tas , que se applicão á cultura átj Café nos domí-
nios Hollanfíezes , e principalmente aos da Ilha de
Java. Este mesmo amor da nossa Nação foi , quem
nos persuadio á traducção desta ihstructiva Memp-
lia.
C 124 )
rU. Acha-se tão espalhado o uso do Café em li-
quor por toda a Europa , que não pode haver su-
jeito algum , que não tenha a curiosidade de co-
nhecer este arbusto , o modo de o plantar ; de
colher , e de preparar a agradável , e saudável fa-
va , que elle produz. Além disto este assumpto he
próprio da Historia Natutal ; porém o que mais noí
iiiteressa , vem a ser, que a Colónia da Ilha de
Bourbon pôde tirar deste escrito hum particular
proveito , aperfeiçoando este importante ramo do
,nosso commercio. O Author não deo a descripção
do Cafeseiro. Suppõem com razão que seus com-
patriotas o conhecem pelo haver em os Jardins
de Amsterdam. Basta saber que , como o grão tem
a forma de nossas favas , a haste não deixa de sec
tão bem o mesmo , menos as folhas , que se pa-
recem mais ás da cerejeira Daqui em diante falla-
rá, p Author Hollandez.
O Arbusto denominado Cafeseiro requer mui-
tos cuidados , querendo-se que elle seja vistoso , a
rendoso. Não basta mondar hum Cafesal huma ,
ou duas vezes por anno , como vi a muitos mo-
radores da Ilha de Bourbon fidarem satisfeitos de o
terem feito. He necessário que o Cafesal seja vis-
to , e revisto muitas vezes , alimpallo dos páos pe-
tisecos , arrancar-lhe as gommelleiras , ou ladrões
que lhe roubão a substancia , embaraçar (jue o tron-
co não chegue a huma maior aituia. O fructo re-
quer
C 125 )
quer também tanta , au maior sujeição que n af-
toreta , que o produz. Se o Café for mal fabrica-
do , debalde o procurarão fazer bom', de lhe dar
o cheiro , a sequidão , a côr. Nunca poderá conse-
guir a bondade , do que foi preparado com o cui-
dado conveniént«e. A minha exposição minuciosa
daiá a prova do que digo. Para me não esquecer
cousa alguma , principio pelo momento , em que se
planta esta arvoreta , e a hirei acompanhando até ú
sua producção. O Leitor queira advertir que eu não
fallo do Café Mascar ino , nem do de Martinica ,
nem do de Moca , de cujas fabricas não tenho no-
ticia alguma. Mas o que houver dizer do primeiro,
se haja de applicar todas ás outras trez espécies ,
a pezar de algun^as diflFerenças , que será fácil aos
cultivadores de as conhecerem.
Quando na Ilha de Bourbon se quer formar
hum Cafesal , se começa por derribar, e rossar a
terra , que se determina para este fim. Observei
cm quantos Cafesaes vi , que os moradores deixa-
vão nelles hum matto de arvores , e especialmen-
te das mais corpulentas. Aquelles , aos quaes per-
guntei a causa desta conducta , me responderão :
Que elles obravão assim pela necessidade que os
Cafeseiros tinhão de sombra. Mas a verdadeira ra-
2ão era querer possuir hum grande Cafesal sem
maior despeza ; porque eu vi muitos Cafesaes que
não tinhão huma só arvore , pelo tempo as haver
des-
destruido , mas nem por isso erão de menor ren-
dimento , que aquelles^ que as conservavão. Eu for-
mei hum Cafesal , que tinha 207 s pts de compri-
mento , 450 para 600 de largo com muito bom
successo , e çom tudo não deixei em pc porção
alguma de mato.
Eu seguramente prefereiia este ultimo modo de
derribar. Conheço quanto he natural julgar que o
Colono , desde que o successo for igual por hum ,
ou outro procedimento , tem toda a razão de seguir
o mais entre elles. Deve-lhe parecer mais provei-
toso o não gaíStar mais que hum mez em huma
plantação , que aliás lhe gastaria seis ; porque de-
veria , segundo elle , cortar e queimar todas as ar-
vores. Aliás estou obrigado a confessar que o Ca-
fesseiro que vier á sombra , gozará maior frescu-
ra t será de hum melhor verdor , que o que esti-
ver exposto ao Sol. Eis dous grandes proveitos :
mas estes não podem contrabalancear os accidentes
que resultão de huma tal plantação. Todas as ar-
vores , quaes quer que çllas sejão y acabão na Ilha
de Bourbon , logo que ellas não hajão de ser de-
cotadas , menos acaso huma , ou duas espécies. Ora ,
para fazer hum Cafesal he preciso derribar a ter-
ra : reina todos os annos humas brisas , e ventanei-
las tão furiosas , que voltão com as raizcs para
cima, morta pela falde . . . de que as privou o...
Como estas arvores são monstruosas os seus ramos
chç-
C Ȓ7 )
chegão a partes distantes. Ha taes que , quando ca-
hem , levão debaixo de si huma vintena de Café*
seiros í e muito mais. Ora se 9 número destas ar*
vores , que cahem , for grande , facilmente se con^
ceberá , qual será o destroço da depopulação. A
este accidente , bastante per si mesmo para fazer
preferivel o modo de derribar > que aconselho , se
deve ajuntar hum segundo. Ha ás vezes nesta Ilha
seccas que occasionão incêndios muitas vezes pela
malícia dos escravos. As arvores, que tivcrão for^-
ças , para resistirem á impetuosidade dos furacões ,
são obrigadas então a ceder. As lavaredas , que o
vento arremessa contra ellas , as abrazão , seus ra-
mos cahem aqui , e ^colá , levando comsigo o in-
cêndio , e ^ destruição cm tudo, quanto as rodea.
Pôde se julgar entretanto, se he a utilidade a ra-
zão , ou se a preguiça he o motivo , que obriga
aos Colonos a plantarem no meio dos matos.
He consequentemente necessário não só derri-
bar , &c, mas também desarraigar as arvores , e
queimallas. Isto feito , pôde- se plantar , observando
com tudo de não se occupar neste trabalho > se
não em tempo de aguas , que de ordinário he pe-
los mezes de Dezembro e Janeiro. Também he
Importante que se deixe primeiro humedecer h«-
ma terra , da qual o fogo tem deseccado a super-
íicie.
Tendo ckovido abundantemente^ e julgando-sç
' que
( I2g )
que continuará ainda a chover por alguns dias , se
podem plantar os Cafcseiros. Precisa-se escolher , oj
que estiverem mais expostos ao Sol j porque sof-
frem melhor a transplantação do que as mudas , que
nascem á sombra. Requer-se que estas mudas não
sejâo nem muito pequenas , nem muito grandes ,
ou nem muito velhas , nem muito novas. Se foren^
muito novas , não resistirão á mudança do terreno ,
ainda menos por trez dias aos raios do Sol , os
quaes pode acontecer , que apanhem ao depois de
plantadas. Além de que estas novas mudas não tem
ainda bastantes raizes nem forças para tomarem terra
promptamente. E pelo outro lado , se forem muito
velhas não as lançarão , e morrerão lançando folhas.
Tem acontecido algumas vezes cue as mudas ve-
lhas pegarão ; mas isto he tão raro que de vinte
Cafeseiros desta espécie , que se transplantarem ,^
muitas vezes hum só não escapará. Se o terreno
for limpo , como eu disse, se gozará da avanta-
gem de poder plant;ir o Cafesal a cordel Este mo-
do de pôr as mudas faz primeiramente mui agra-
dável , e vistosa a perspectiva da fazenda : e alem
disto dá outra utilidade , por meio das avenidas ,
óu alleas que formão esta dispo ição de poder o
Senhor ver com facilidade o trabalho de todos os
seus escravos : utilidade que se não encontra em
hum terreno cheio de arvores em pc , ou deita-
das. He impossível de se plantar nellas a cordel ,
c se perde o agradável , e o útil. De-
( 129 )
Deve-se também reflectir sobre os dístrjctos , em
que se faz o Cafesal. Os que forem sujeitos a chuvas ,
requerem huma maior distancia de hum arbusto a
outro ào que em aquelles , que forem mais seccos ,
ou menos frequentes. Nos primeiros os Cafeseíros
se fazem muito copados , e por consequência oc-
cupão maior circumferencia , quando nos segundos
exigem menor. Huns os plantão aseis pés , outros
a sete , alguns a oito > muitos a dez. O meu pare-
cer he que oito pés de distancia bastará. O Cafe-
sal , que se houver de plantar a seis pés ficará
muito apertado , e as arvoretas mutuamente se op'»
primírão. Ora também dez pés de distancia he
muito grande , e quem assim o planta , he porque
faz tenção de lhe intrometter outras plantas nos
intervallos. O que , passados trez annos , se não
devera fazer mais , como se ha de vtr daqui a
pouco.
Huns o plantão com o caracod (*) outros á
enxada. Approvo este ultimo modo. O pé fica mui-
to mais bem enterrado ; as raizes mais bem cober-
tas, e se deve esperar que o Cafesal haja de ter
todo o seu bom successo. O caracoâ , pelo contra-
rio tem seus inconvenientes. O escravo , ou não faz
I o
( * ) Termo Brasílico (jue (jiter dizer hum páo aca-
bado em ponta , com que se fura a terra , para íaes
plantações em lagar de enxada , ou melhor f/c saxo.
C mo)
o buraco tão profundo, como deveria ser, ou o faz
mais do que devia. Se o não faz tão profundo, as
raizes não achão lugar em que se accommOdem ,
e neste caso dobra-se , e curva-se de modo « Cjue fi-
cão opprimidas para haverem de receber o seu sue-
co nutritivo , o que infallivelmente fará morrer a
muda. Pelo contrario , se o buraco for mui pro-
fundo , o fim da raiz não ciiegando a tocar no
fundo impossibilita também , como no primeiro ca-
so , que possa nutrir- se. Este modo de plantar he
ainda sujeito a outro inconveniente. Quando o pre-
to faz o seu buraco com o seu earacoâ , ou páo
apontado , mette dentro a muda , e satisfeito com
amontoar-lhe em torno da hsste fracamente á ter-
ra , julga ter plantado hum Cafeseiro , quando a
muda não se sustem em cousa alguma > e vem
por esta razão a faltar. Pelo contrario plarvtando á
enxada «e evitão todos estes inconvenientes ; e o
preto , ainda que hum preguiçoso , ou descuidado
no seu trabalho , planta a pezar disto muito bem >
obrigado a tapar , ou entupir a cova , que acabou
de fazer , com a mesma terra , a raiz mestra com
todas as outras pequenas , que delia pendem , se
achão cobertas de huma terra bem molhada ; e
também a muda recebe a sua nutrição necessária
á sua substancia , e ao seu crescimento , ou au-
O sinal , porque se conhece , que huma muda
tem
C 'i> )
tem pegado > he quando entra a grelar. Ora ha
muitas , que níío grelão , mas , nem per isso , se
devem reputar por mortas. Examinai , passado al-
gum tempo , a sua haste , e lhe descobrireis al-
gum verdor , seja no topo , seja no pé , ou em
baixo. Não se lhe descobrindo se tem hum sinal
infallivel que a muda não pegou , ou porque fos-
se mal transplantada , ou porque teve toda a for-
ça precisa para resistir á transplantação. Então se
faz substituir no mesmo anno , e sendo possivel ,
na mesma estação. Esta prevenção ultima seria mui-
to excellente.
Entretanto que nós suppomos o Cafesal plan-
tado á corda , e as mudas, que não tiverem pe-
gado , substituidas , vamos acompanhar a nova ar-
voreta até ao instante da sua producção.
He preciso que no primeiro anno se hajão de
plantar grãos neste Cafesal , para haverem de dar
sombra , e fresco á nova planta. Por meio deste
soccorro ella se nutrirá melhor , padecerá menos ,
&c. e se aproveitará mais depressa, que he hum.a
das consequências necessárias.
O arroz , o milho , os feijões são os grãos ,
que de ordinário se semeão com muit^ indifferen-
ça sobre a escolha. Eu com tudo julgo que se
deveria preferir o milho. Tira menos sal da terra
do que o arroz , os legumes ; e deixa ao Cafeseiro
a porção de sustento, que lhe he necessária. A no-
I ii va
va planta, ou inuda he menos afifogada, e entre-
tanto se regozija com a sua sombra.
Colhendo se o milho , se terá a advertência de
deixar liie ficar a palha sobre a terra. Porque , sen-
do cuberta com ella , lhe dará maior frescura j e
este haja de ser hum dos cuidados , que se devem
ter sempre , conservar frescos os pés aos Cafe-
seiros.
Dentro do espaço de trez annos se poderá con-
tinuar em semear milho , sem que por isso se de-
va recear detrimento algum no Cafesal , e antes
pelo contrario lhe será muito proveitoso. Passados
os trez annos porem , se lhe devem estancar as se-
meaduras ; porque , a este tempo , já os Cafeseiros
€5.taráõ fortes , e deveráõ dar fructos sem necessi-
dade de huma maior substancia nutritiva.
Ainda que este arbusto seja provido de ramos
do alto até os baixos , e que estes ramos estejão
■providos de folhas verdes , dá pouco fructo este
terceiro anno, que he o primeiro da sua produc-
ção. He com tudo necessário ter cuidado de os
colher exactamente , e este he o modo , com que se
deve proceder.
Em quanto o grão estiver verde , ou só esti-
ver amarello , ou ainda de hum vermelho pállido,
não he tempo de o colher. O momento , de poder
ser colhido , he quando estiver de huma cór ver-
melha denegrida. Colheio então. Se esperardes mais
tem-
Cu? )
tfmpo » o Café muito maduro cahirá , e o seu
gião se perderia , ou tomaria cahido em terra hum
máo gosto.
Para se colher com mais geito , só se deve ser-
vir dos dous dedos : tomai o grão entre elles , e
o fareis trocer ; desta maneira o grão se desprende
facilmente , e não damnifica a arvore de modo al-
gum. Arrancando o grão grosseiramente , ou pon-
do , como vi fazer a muitos , a mão no alto do
ramo , e desgranando-o de hum só jacto , se o ra-
mo senão estragar , o que muitas vezes deve acon-
tecer, ficará ao menos tão arruinado-, que não pro-
duzirá cousa alguma o anno seguinte. Este ultimo
modo de o colher tem ainda outro inconvenien-
te de se misturar o Café , que não está maduro,"
com o que está , e de ficar este arruinado pela
mistura.
Consequentemente he preciso , como disse apa-
nhar só os grãos , que estão vermelhos denegridos.
Dez , ou doze dias ao depois , os que estiverem de
hum vermelho pállido , ou descahido estaráó bons^
para se haverem de colher. Finalmente no fim de
trez semanas, os que só estiverem amarellos es-
tarão perfeitamente de vez. Esta terceira colheita
de ordinário costuma ser amais abundante: aten-
do o Cafesal quatro ou cinco annos he cominum
vêr hum escravo encher dous grandes saccos por
tarefa de hum dia.
C M4)
A iTWneira de seccar o Cafc não requer ineno-
res cuidados cue os do colher. A proporção, que^
os escravos chegão carregados , o devem conduzir
a plataforma constiuida para seccar , e enxugar.
Fazei c]ue despejem os seus saccos em hum só
monte , sem o estender. Ao outro dia , pela ma-
nhã , tenha ou não chovido de noite , fazei-o es-
palhar , observando com tudo que a superfície , a
cjue o reduzis , tenha algumas pollegadas de gros-
sura. Havendo se de deixar o Café por mais tem-
po amontoado , elle se azedará. Não ficando em
monte mais que hum dia , e huma noite reçumbra-
rá a sua agua, e se disporá a seccar mais prompta-
mente Todos os dias se haja de repetir esta ope-
ração até o íim da colheita. Neste tempo se te-
nha a advertência de o mexer todos os dias o Ca-
fé , posto a enxugar com hum , rodo quer .chova ,
quer faça í?ol , para que o grão , que ficar por bai-
xo, se reveze a ficar por cima cm seu turno.
No fim de alguiis dias , estando o tempo bom,
o grão terá perdido a sua còr vermelha , e se vol-
tará inteiramente negra. Neste tempo se lhe dimi-
nuirá a giossura da superfície , que elie occupa
estendido , fiizendoo estender sunimamente rsro na
plataforma , onde o deixareis passar duas noites »
com a advertência de o mexerdes huma vez por
dia.
Tendo o grão passado duas noites , se apalpa-
' rã ,
C li! )
rá , e se achará duro. Chegado a este ponto elle
não quer , nem mais agua , nem sereno ; e se íi'
cará obrigado , ao pôr do Sol , de o ajuntar , de
o recolher debaixo d' algum rancho , náo se haven-
do de ter algum meio de o ter bem coberto na
mesma plataforma.
Todas as manhãs , depois que o Sol tiver bem
enxuto a plataforma , se estenderá este Café bem
íaro , e se terá o cuidado de o ir mexendo com
rodos trez vezes cada manha , e outras tantas ao
depois do meio dia. Ao pôt do Sol se guardará de
novo debaixo do rancho , o mais quente que se
poder , em hum só monte , sendo possii'el. Se o
tempo permittir , coníimiar-se-ha esta obra todos os
dias ; mas se o tempo estiver anuviado , se deverá
abster delia pelo risco , a que se expõem de ser
molhado ; porque a chuva , quando elle chega ao
ponto de que falíamos , já lhe he contraria.
Quebrando-se o grão ao dente , e a pellicula »
em cue ambos os grãos do Café estão incluídos ,
se desprendem per si mesmos , servem de signaes de
que elle está secco j e ao depois disto, bastará ex-
poUo ainda huma , ou duas vezes. Quando porém
este grão quebrar limpo por si mesmo ao dente ,
he tempo de o guardar , o que se deve fazer trez
ou quatro horas depois do meio dia , estando ainda
O Café bem cmcni^.
O Café da segunda , terceira , e quarta colhei-
ta
( m6 ;
ta se preparará do mesmo moHo , observando : ciie
senáo houver tempo de pôr o da primeira colhei-
ta em estado de ser guardado , he preciso a caiítel-
]a de não misturar com eJle o da segunda colheita ,
e o mesmo se haja de entender a respeito das ou-
tras subsequentes. A sua mistura só deve ser fei-
ta no instante da sua perfeita seccura. Misturan-
do se em outro qualquer tempo , a ultima empeio-
raria a primeira. Todas as colheitas feitas por este
inodo , e os grãos que ellas produzirem absoluta-
mente seccos , e postos no armazém , se lhe não
corre risco algum , e o Café se aonservará , pelo
dizer assim , eternamente.
Antes de discorrer sobre o modo de o fazer
vendavel , creio cue devo voltar atraz a fallar so-
bre os arbustos , a saber , sobre o modo de os tra-
tar ao depois da colheita.
O Cafesal deve ser mondado. Para isto não he
preciso esperar que elle se çuje. Mondando-se mui-
tas vezes , isto se leduz a hum trabalho de cinco,
ou seis dias , ao me«;mo tempo que , deixando-se en-
cher de hervas , seião precisas trez ou quatro sema-
nas. A-; hervas fazem amarelecer os Cafeseiros no-
vos , e lhes causaria muito damno , se o fizessem,
estando em flor , o que acontece quatro vezes no
anno. Airanquem-se por tanto as más hervas, aga-
tanhaiido as que principião a apparecer.
Logo que o preto , encarregado deste trabalho ,
( "17 )
tiver limpo os arredores de hum Cafeseiro , este
mesmo deve passar a ser o alvo dos seus cuida-
dos , e terá para fazer o seguinte. Começando pri-
meiramente do pé , examinará a quantidade de la-
drões ou gomeleiras , que elle lança , e também as
que estão avançadas. He preciso que as tire todas ,
menos hum que ha de deixar com a haste do Ca-
feseiro. Dará huma voltai em torno da arvore , e a
Jivrará de todos os ramos petisecos , ou mortos.
Olhará para o alto da arvore, e lhe tirará todas
aquellas franças , ou ramos que excederem na ul-
tura ao seu copado. Privando deste modo ao ar-
busto de poder crescer pela cabeça , se verá elle
na precisão deformar maior çópa , alargando a sua
roda , ou circumferencia ; e nesta direcção lançará
quantidade de ramos , que darão fructo no anno se-
guinte. O Cafesal , que se entretém desta sorte , fi-
ca sendo muito bello , e vistoso ; e se facilita a sua
colheita ; porque os seus ramos mais altos ficão ao
porte dos escravos.
Conheci Colonos , que tinhão por máxima dei-
xallos crescer livremente , de sorte que erão neces-
sários escadas para se haverem de colher. A razão ,
que davão , era da precisão , que havia de abando-
nar as arvores a conducta da Natureza. Mas ainda
que sou da opinião dos que querem que se ajude a
•natureza , observei que a colheita destes não era
mais abundante do que a da^uelles , q"^ embara,
■ ■:■. ^ cão
Cm?)
çao aos seus Cafeseiros o não se estenderem pela
cabeça. A única diíferença , que se encontra entre
liuns , e. outros , lie o embaraço das escadas , e mui-
tos ramos damnificados. O que eu adianto se fun-
da sobre a experiência.
Os Cafeseiros dão menos em hum anno > do
que em o outro. Esta differença de colheita nas-
ce da differença no objecto da sua vegetação. Em
hum anno lancão madeira , ou lenho novo , e nes-
te anno rendem menos fructos. No seguinte po-
rém dão muitos fructos , porque este novo lenho
também o produz.
Cuidando-se dos arbustos pelo modo , que te-
nho recommendado , qualquer Cafesal poderá du-
rar quinze para vinte annos produzindo : no fim
deste tempo porém , se deverá cuidar em o ir re-
plantando.
Quanto mais o ?.rbu5;to for velho , tanto mais
o Café será melhor. Não he por tanto que a vis-
ta da maior , ou menor excellencia do Café , que
se colhe , que se haja de julgar da velhice de hum
Cafeseiro. O sinal , para se julgar , que elle está en-
velhecido , he rendendo menos, cuando devia ren-
der mais. O seguinte he o meio de o remoçar.
Ao depois da ultima colheita , fazei cortar to-
dos os vasos Cafeseiros a pé e meio de terra.
JVlanda.i ao depois conduzir para íóra tudo , quanto
se cortou , e ^ue íique o Cafesal bem limpo. Plan-
tai-
C M9 5
tai-lhe dentrjO inilho. Quando colherdes o vosso mi-
Iharal , visitai todas as vossas arvores , e então já as
achareis prov/das de lançamentos. Escolhei em ca-
da huma dos vossos arbustos os dous , que forem
mais grossos ; e que julgardes , que tem tomado
maior nutrição , e fazei arrancar os outros. Cuidai
nestes dous , pelo modo que acima disse , sem con-
sentir que hajão outros , e continuai a repetir a
plantação do vosso milho dous ou trez annos mais.
No fim deste tempo começareis a colher Café ,
como se fosse de hum Cafesal novo , e isto pelo
tempo de outros quinze , ou vinte annos.
Eu creio que fiz conhecer sufficientemente tu-
do , quanto era bastante , ou necessário para plan-
tar , mapter , fazer produzir , e renovar hum Ca-
fesal. Passemos presentemente a vêr ., que casta de
operação requer o Café , que se guardou no arma-
zém.
Para dar a ultima perfeição ao Café , quero di-
zer , para o fazer commerciavel , se fará tirar do
armazém huma ceita porção em casca ; e se esten-
da o mais ralo , que for possível em cima da pla-
taforma , que deve estar secca,
Precisa-se que haja debaixo do rancho hum pi-
lão próprio a pilar este grão ^ a palavra próprio
quer dizer que deve ser feita á sua concavidade,
como hum funil. A boca deve ter em circumfe-
r€ncia quasi.dous pés e meio ^ e es.ta largura hirá
di-
C mo)
diminuindo pouco a pouco até a não ter mais no
seu fundo. Se os pilões não forem feitos deste mo-
do , o Café se esmagaria em pedaços. O pilão , fei-
to de hum pao grosseiro , terá trez pés a trez e
meio de comprido , e terá a mesma figura , que cos-
tuma ter o dos Boticários.
Cada pilão será entregue a dous escravos , pos-
tos hum em frente do outro , que farão cahir re-
vesadamente as mãos , com que pilão. Não se deverá
começar a pilar , senão estando o Café , que estiver
na plataforma , aquecido pelo Sol. Então hum des-
tes escravos enche hum sacco , traz ao rancho , e
prove o pilão , advertindo de não o encher mais da
ametade do seu vão.
- Passado algum tempo, o pilão está cheio de
cascas quebradas , e os grãos de Café taes , como
quando se comprão , e a moinha , que resulta da pel-
licula quebrada , debaixo do pilão. Tanto que senão
divisar mais Café em casca , se haja de cessar de o
pilar , para que continuando-se , senão venhão a que-
brar os próprios grãos de Café. Os dous escravos de-
vem por tanto ajuntar tudo , moinha , pedaços de
casca , e grãos de Café. P6em-se outro Café com
casca novamente , e se continua do mesmo modo
o descascamento.
Tendo se pilado todo absolutamente , arma-se
hum cadafalso (girau no Brazil) de sete para oito
pés de altura , exposto ao veiito , sobre' o qual so-
bem
C ui )
bem dous ou trez escravos , aos auaes outros en-
tregão os saccos cheios de Café pilado. Por baixo
destes cadafalsos se estendem grandes pannos sobre
os quaes os negros , que estão no alto , despejão len-
tamente os seus saccos, pondo a boca destes para
a parte do vento. A isto chamão aventar. O ven-
to leva a aralha , a moinha , e os grãos de Café
cahem isolados nos pannos.
Outros escravos , postos debaixo do cadafalso , ajun-
.tão com rodos o Café aventado , e enchem os sac-
cos com elle. Depois se torna a levar acima do ca-
dafalso , c se aventa novamente. Tendo sido aven-
tado duas vezes , se traz para o rancho , para ahi se
joeirar a peneira. Esta he huma caixa de trez , ou
.quatro pés de comprida , e outro tanto de larga ,
com huma borda da altura de seis pollegadas , que
tem o fundo furado , como huma grade. Esta ma-
quina está posta sobre duas barras , trazidas sobre
• cavaletes. Cada barra tem sua regra , que contém
o crivo , e dous pretos fazem hum vai e vem , con-
tinuamente balouçando de huma a outra extremi-
dade. As impurezas , que lhe ponerião restar por
esta acção , cahem pelos buracos , e nada mais fi-
ca , que tirar , senão os grãos de Café partidos pe-
la piladura.
As pretas são obrigadas ao trabalho de os es-
colher , e o fazem grão por grão. Esta operação
he a ultima 3 e , se o Café requer ainda algum cui-
da-
dado , lie de o nao deixarem por muito tempo em
saccos ; e de o cmbarricarem promptamente ; pelo
receio , que se tem , de que elle haja de embran-
quecer.
Isto he , quanto respeita á cultura , e prepara-
ção do Café. Só me resta a dizer huma palavra
sobre as plataformas , de que fallei no decurso des-
te pequeno tratado.
As plataformas são absolutamente necessárias á
fabrica do Café. Sem ellas não se podem enxugar,
nem seccar , nem por consequência levai lo á sua
perfeição.
Não ha cousa tão fácil , como a construcção de
liuma "plataforma. Primeiramente se precisa escolher
hum terreno , que tenha huma inclinação natural ,
c se não a tiver , he necessário que se lhe faça.
Hum terreno de duzentos pés de comprido , e cou-
sa de cem de largo formará huma lindissima pla-
taforma , e quanta seja bastante para seccar sinco-
enta a oitenta milheiros de Café. A inclinação que
será preciso dar-Ihe para o excòo das águas , deve
ser pelo menos de sinco pés. He muito essencial
que se haja de alimpar bem o terreno , arrancar-
Ihe as hervas , os cepos , as pedras. Applainar-se-
hii ao depoiíí ao livel da inclinação , que se lhe hou-
ver de dar j feito isto se humedeça , e se lhe lan-
cem cinzas. Então os escravos , armados de varas , ba-
terão todo o terreno igualmente. Estando bem ba-
Chj 3
tido , se remolha , e se lhe torna novamente a lan-
çar cinza segunda vez. Estas differentes acções se
repetem até sinco vezes. Estando a terra firme , e
voltando-se em hum corpo duro por meio da cin-
za , e da agua misturada juntamente , se faz pre*
ciso rodear as plataformas de hum muro que te-
nha cousa de hum pé de grossura , e alto pé e
meio , acima do livel da plataforma. Do lado em
que acaba a inclinação se abriráõ pequenos esgo-
tos , ou boieiros engradados , pelos quaes a agua
possa correr , seguindo a mesma inclinação. As gra-
des ou ralos são necessários para embaraçar que o
Café , que pôde correr com as aguas , pare no ra-
lo. Construida a plataforma desta maneira nada mais
falta , senão conservallo limpo j fazendo-o varrer mui-
tas vêjes. He mister principalmente que se haja
de varrer , quando se ajuntar o Café para o re-
colher para debaixo do rancho , e antes que se ti-
re do rancho , para o pôr ao Sol.
As plataformas , feitas de ladrilhos , são muito me-
lhores do que, as que se fazem de terra. Durão
muito mais tempo , e não requerem trabalho de
as conservar , não ficando sujeitas a desmanchos ,
e se varrem com maior facilidade , do mesmo mo-
do se secção , e fazem o Café muito mais limpo.
Também custão muito mais pela carestia da cal ,
e do tijollo. Poupa-se huma parte da despeza , ser-
vindo-se , para o ladrilhar , de huma pedra muito
I com-
( '44 )
commiia na Tlha , chamada Gaíet, He lium calháo ,
cuja figura apresenta hum oval applaiiiado. As suas
bordas são redondas , que Jhe não pei mittem huma
juncção ejíâcta , deixando entre estes calháos inter-
vallos , que são precisos enchei los de cal , para que
a superfície da plataforma po<;sa ser igual. O la-
drilhado de pedra chata não he sujeito a este in-
conveniente , e se liga com muito maior exacção.
Mas também, importa muito mais como já o disse-
mos. Seja qualquer destes dous pavimentos i de
que se servem para esta construcção , he sem.pre
preciso ter- se cuidado de escolher hum bom terre*
no , para que estas plataformas não se abatão em al-
gum lugar. A agua , que se entancaria nos lugares
abatidos , faria o seu uso impraticável. Esta precau-
ção he absolutamente necessária.
Ainda ha para estas plataformas outra sorte de
construcção , chamada no Paiz argamassa. Para se
construir desta maneira , se começa , formando o lei-
to da plataforma , conforme a grandeza que se lhe
quer dar , o que se faz , tirando-lhe a terra , e
proporcionando-se o que se lhe tira á inclinação «
que lhe he necessária estabelecer. Cobre-se ao de-
pois esta superfície de huma ordem de pedras sec-
cas , que se cobrem de hum pc de terra. Esta no-
va camada he coberta a seu turno de huma segun-
da camada de pedias , e o pé de terra , de que
se cobre de novo , puxa por outra camada de pe-
dras j
C 145 )
dras , recoberta finalmente a seu turno de douí
pés de terra , que formão a superfície. Estando a
obra neste estado se deixa por trez ou quatro me-
zes sem se lhe tocar.
As chuvas que cahem de cima , e a acção do
Sol , durante este tempo , fazem trabalhar as terras
que se abatem igualmente : ao depois disto se ba-
te esta plataforma á força de pilões. A plataform?
assim batida os alvineos construem a terrassa , ou
a argamassa com pedra , cal e área , e cobrem es-
ta alvenaria com hum cimento, que elles hume-
decem sem cessar para ligar. Compõem-se ao de-
pois huma coberta , ou verniz , em que entra agua
de cal > ovos e jagra, (*) Estende se isto sobre o
cimento i e sé esfrega sem cessar com trolhas de
madeira. Esta coberta fica táo polida , como hum
espelho.
Com tudo prefíriria sempre ás plataformas de
terra ; não somente por serem de huma muito me-
nor despeza ; mas também ; porque a argamassa he
sujeita a fender- se , e os seus pedaços , escamando a
coberta , ou verniz , deslocão pouco a pouco a al-
venaria.
Nada direi das plataformas de madeira : ellas
■K cus-
( * )' Js sacar Jeito do vinho de palmeiras Jcivi-
dê por muito tempo.
C U6 )
ciistão muito , e nr.ria valem : visto que a made! a
desta Ilha trabalha consideravelmente.
He importante observar que a<; plataformas , de
qualquer modo que se facão , devem situar *c de
maneira que o Sol lhe possa chegar touo o dia.
CAR-
i
C U7 )
CARTA
E S C R I P T A
A Mk. ELIAS MONEREAU,
Sobre o seu Tratado de Café ,
POR
Mr^^gr mm p r e
VWINHO DE MOCA.
De Moca aos 26 de Janeiro de I75S,
M<
# Li o vosso manuscripto acerca da cultura
do Café : a experiência , que tendes adquirido pe-
lo trabalho de trinta annos (*) não deixa dúvi-
da alguma a respeito da exacção das vossas adver-
tências ; mas, ^ão tendo sido a totalidade destas,
a que basta , iiáo levareis a mal que eu vos haja
K n de
( * ) Como o pequeno Tratado , (jtiç çpmpuz do
Café , appareceo destacado do outro , que tinha com"
posto antes i do Perfeito Indigoeiro ; e que no fim
deste menciono , que trinta annos de experiências na-
da deixavão i que duvidar a respeitç das observa-
ções , que faziét na seu conteúdo , ou contexto , aue
comprehende ambos os Tratados , nasceo daqui a con'
fusão y que agora declaro , de se pensar que as oh'^
servaçoes feitas sobre o Café tlnhão tido o mcsm»
tempo que , as que fiz sobre o Indico , o que nã
he assim ; pois apenas Uria trez, annos dnsta cuias
ra , quandê a escrevi.
IP
C U8 )
de participar , as jqiie também tenho feito sobre o
mesmo assumpto. Julgo que eu vos não deverei
contar no número dos ^.uthores , que tem o pre-
juízo , de reputar por crítica ás observações do5
Leitores.
A utilidade , que se deve colher da vossa obra,
obrigará a muitos a copiai la , para haverem deter
sempre comsigo huma guia de tanta experiência ;
e ainda a poderão diminuir , ou au^iientar ; e tal-
vez ambas as cousas ; porém , em qualquer destes
acontecimentos , não diminuirão a gloria , que con-
seguistes pelas primeiras noções , que espalhastes
sobre a ciiltura do Café. A pezar da ingratidão ,
que practicou Américo Vespucio com Christovâo
Cólon , a posteridade , a mais distante , reconhece-
rá sempre ao ultimo pelo primeiro descobridor da
America. Poderia apresentar-vos outros muitos ex-
emplos , se não receasse offender com elles a vossa
inodestia ; o que supposto , entremos na matéria.
O Café foi descoberto pelo Prior de certos Mon-
ges , segundo refere o IMaronita Fausta Kiarone ,
citado em o Diccionario de Trevoux , tendo sido
advertido por hum cabreiro , o qual lhe contou
que o seu rebanho estava desperto toda a noi:e ,
e a dar saltos. O testemunho deste cabreiro obri-
gou ao Prior a ensaiar a virtude , que este gt5o
tinha para impedir o somno, PiimeiraiTiente o ap-
plicou para einbaraçar o dos seus Monges ( natu-
ral-
C 149 )
ralmente preguiçosos) a que não dormissem a Ma-
tinas.
Julgais vós que a abundância do Café o fará
reduzir a hum preço muito limitado. A experiea'
cia mostra que isto acontecerá pelo contrario. Ha-
verão trinta annos , que erão mui raras as Assu-
c árias (Engenhos de Assucar): o assucar est va
em muito bom -preço. Augmentárão-se aqueJlas , e
este também cresceo á proporção- do seu augmen-
to. Qual por tanto seria a causa deste augmento,
ou desta revolução ? Qual ? o interesse do Com-
mereço. Naquelles primeiros tempos bastavão í^inte
navios para abastecerem a esta Colónia , e exportar-
lhe os seus retornos : agora porém somente para a
Cidade do Cabo ( Cíip, ) e suas dependências , ou
districtos não bastão cem. Segue-se que se preci-
sará de maior quantidade de navios logo que hou-
ver hiima maior quantidade de Café 5 que, se haja
de exportar. Ah ! não deveis desconfiar da industria
dos Commerciantes ; porque, se elles o não podes-
sem vender muito bem , certamente não o virião
procurar Receaes que não hajao de vir navios a
procurallo ! Esta idéa de medo seguramente se vos
ha de dissipar , se vos quizerdes lembrar do pro-
veito , que o commercio raaritímo traz ao Estado
em commum.
Não se pôde comprebender como o Café , qtii-
tee livre, só haja de produzir úqz soldos, vós dais
( '50)
OS dons çuintos para as de«;pe2as , estafs não che-
gão a tanto : por exeinplo , duzentos ai rateis de Cd-
fc , a dez soldos ao arrátel , reridem cem livras em
dinheiro , e aoui ico livras.
Precisa-se deduzir as despezas.
Fretes. ---.---.-- 15 soldos.
Coininissão a 2 e i por cento. - L. 2-10 soldos.
Duas jornadas de cavallo a j livras, j-
Dous saccos a 3 5 soldos , ao to-
do : fazem ordinariamente 6 via-
gens. - - - - - - " -j-io soldos.
A despeza dos trastes , a que se não
sabe dar o valor. ■
12 L. 15 soldos.
Faga a despeza , sobrao 100 1. ul-
timamente aqui. - - - 87 L. 5 soldos.
Fste calculo prova claramente que não gasfa o
scptJmo nas despezas. Eu não pertendo com isto
iTiOstrar ,cite se faça huma fortuna brilhante ; mas
pcSde se com el!a viver em CidaJão honrado , e
abastecido , criar hone^Ntameníe a sua família , e
deixar a seus herdeiros os fundamentos de alguma
fo tuna.
Ainda cue a rsiz prTncipal , ou mestra de
cuaKuer arvore seJA arruinada , ella não deve
aca-
acabar, ou morrer, se, ao tempo, em que pela
sua amarellidão , ou palJidez se conhecer o seu de-
feito , a houverem de cortar quatro dedos acima
da superfície da terra 3 porque a sua seiba , não
lançando mais para fora , formará novHs folhas , as
quaes se estendei ão pelo primeiro tronco. Ora is-
to com tudo tem suas excepções ; porque se a ar-
vore náo tiver barbalhos , para lhe attrahir a nu-
trirão : acabará antes que a seiba a tenha formado.
Ao depois de ter o Café dado quatro colhei-
tas , o que se conhece pelo descahimento das fo-
lhas , e que a seiba não seja abundante , se faz
preciso cortallo do modo , que acima expu7.
E que com isto se arrisca ? Se elle nada hade
render , ou produzir mais, não he mal al?um , ti-
rar-Ihe ainda nesta figura , talvez , duas boas co-
Iheita^;.
Em vez de se lhe fazer cahir as flores , setia me-
liior cortar alguns nos da arvore , logo que se re-
colhesse o Cafc ; a seiba se espalhará com maior
abundância pelos ramos , que lhe r estão , ou so-
brão , fazendo nascer outros , que no mesmo anno
'fructificão.
Não he geral que o pequeno grão haja de vir
somente das arvores velhas. Muitas vezes a quali-
dade da terra contribue para este successo. Assim
se observou no districto da Ribeira grande , onde
a teira he muito solta.
Jui-
( mO
Julgais que a agua demorada nos buracos , ou
covas haja de fazer hum bom eífeito. Não posso
comprehender , como entendeis is:o , se he antes ou
depois., de se ter plantado o Cafc ? Quem o plan-
tar a trez , ou quatro pés de distancia huns dos
outros , seguramente não tem huma boa terra : e
reste caio devem eljes fazer parar os seus Cafe-
seiros na altura de cinco pis , para que evitem os
inconvenientes , que apontaes com muito juizo.
O modo de abrir as covas á enxada he bom
nas terras pedregulhosas 5 porque facilita tirar as
pci^ras , que embaraçariâo a raiz mestra penetrar a
terra. Finalmente a ferramenta náo he , a que deter-
mina a pro-undeza da cova.
Parece que estaes persuadido , por prefereiícia , ã
favor dos que plantão a exposição dos Nortes , e
isto sobre o fundamento de serem as chuvas mais
f equ ntes neste lado. As nossas opiniões sobre es-
te pon^o se apartão Eu preferiria antes plantar de-
pois de Abril ate Agosto pela razão seguinte. Os
Cafeseiros , plantados em Abril , &c. , tendo sãmen-
te no Agosto do anno seguinte (este he o ultimo
1] ez em que florecem ) quatorze mezes , não podem
floiecer muito , e só floreceráõ bem hum anno ao
depois , e quando já tiverem decorrido dous annos ,
e.sta áo assá> fortes , para poderem chegar os seus
fruc*^os ao poiUo do a-jazonamento necessário : e pe-
lo contraiio , plantando se os Cafeseiros no fim do
an-
anno , tendo 20 mezes a florecencia do segundo
anno , ílorecem muito melhor , e em muito maior
abundância : e não tendo ainda ganiiado o vigor ,
oue só a idade lhe pôde dar , não podendo che-
gar os Seus fructos a hum ponto de madureza , a
que costumão chegar ordinariamente , a seiba he
cjuad absorvida , a arvore se faz estéril dentro em
dous annos , e algumas vezes no terceiro anno aca-
ba. Finahuente ainda que eu houvesse de plantar
em os Nortes , nem por isso me hiria melhor. Ad-
initis que se hajão de plantar grãos , arroz , mi-
lho i entre os Cafeseiros : a experiência me tem
mostrado , que quando senão planta cousa alguma,
então he , que se obra bem. As nossas terras não
tem tanta bondade , que possão ao mesmo tempo
sustentar tantas cousas. Entre tanto he certo que
os Cafeseiros ficão privados do alimento , ou nu-
trição, que as terras se vem obrigadas a dar ao ar-
roz , ao milho , &c. Além do que , não havendo
estes viveres , plantados entre os Cafeseiros , terião
etes todos os avanços, que lhe deverião resu^ar
das mondas , sachas , &e. e aqueiles , ou se havião
de plantar em hum terreno particular , ou se plan-
tirião mais juntos , de sorte que , unidos , não da-
rião lugar , a que as hervas bravias houvessem de
nascer entre ellas.
Kum vizinho , possuindo sessenta quadrados de
terra, sabendo-se conduzir, tem onde trabalhar por
cin-
C M4)
cincoenta annos. Quero suppôr cue elle come-
ça o seu tiabalho com viiue escravos : cue dle
nos dous piisreiros annos derriba dez quadrados .
e planta ametade destes de Café , terá plantado
hum Cafesal de 40 mil pcs , o resto , cue sobra,
SQrá empregado nas roças dos e5cra\o^, na planta-
ção de outros viveies , e ein pastes p ra os seus
animaes. Supponho mais : c^ue passados dons annos
der.iba outro pedaço , para plantar hum Cafesal de
dez mil pés , e viveres , je c^uizer observar esta
economia escrúpulo amente , terá , com roda a segu-
rança , terra para cincoen*a annos. Scuj netos ainda
gOiaráo dos effeitos da sua bondade.
Quando se tem Café escaldado , he convenien-
te sacodir-se , ou abalar-se a arvore , antes de se
começar a colheita : sem esta precaução se teria
inuito cue escolher. Todavia, achando-se bom Ca-
fé entre o escaldado , e que a colheita não fosse
abundante , seria preciso collitlo primeiro , mas a
expe iencia me tem ensinado c,ue o tempo , que
se consome nisto , sempre he muito mal pago.
O Café não amadurece de pancada absoluta-
mente ; porque não florece iodo ao mesmo tem-
po.
Julco ser muito melhor que os pretos alter-
nem por divisão o trabalho do que exceptuar hu-
jna parte no entre tanto que a outra repousa , ou
dcbcança. Was isto he muito aibitrario.
Se
C»S5)
Se o Café se houver de lavar facilmente , ao
depois de ter fermentado toda a noite , se lavará
com muito maior facilidade , fazendo o fermentar
até o outro dia á tarde. Huma fermentação mais
dilatada , e comprida concorrerá e contribuirá para
que a gomma se despegue melhor ; e por este meio
se occorreia ao embaraço de obrigar aos escravos ,
a que se levantem de madrugada , o que he di-
gno de toda a attenção.
Ao depois de se ter aventado , ou exposto ao
Sol , accrescentaria , visto não se despegar da sua
pellicula interior , inteiramente muito adherente , ou
pegada , que seria preciso guardallo assim mesmo
quente , e no fim de trez ou quatro dias tornallo
a expor ao Sol , e ao depois repassallo ao pilão.
Então esta película , ou atalha se despegaria ex-
actamente , e o Café ficaria infinitamente melhor.
Entre a quantidade de Cafeseiros , que tenho
cortado , muita pa;te delles lançarão cepas guar-
necidas de trez ramos em cada nó ; e em os mes-
mos pés outras copas só tem dous. Gostaria de
que me instruisseis acerca deste phenomeno.
Estas são as reflexões , que me occorrêrão , e
que eu tenho o gosto de vos participar. Eu me
daria o parabém , se podesse » pela proximidade de
lugar , aproveitar-me do vos^o modo de cultjvar o
Cat^é : certamente necessitaria de hum tão grande
jnestre , mas a distancia , em que me acho i não
me
■:"i'í
me privará de tomar a liberdade de vos procurar
(concedendo-me vós a licença) para pedir as vos-
sas instruccóes.
Tenho a honra de ser com a maior* satisfac
ao
Vosso , &c.
Craimpre»
(157)
RESPOSTA
DE Mr. Monerau, a Mr. Graimfre,
Sobre o conteúclo da Carta acima , na qual sa-
tisfaz as objecções.
OEnhor. Tendo-se a minha vista fortificado al-
guma cou^a , ao depois de huma moléstia de quasi
dezoito mezes , me resolvi a examinar muitas car-
tas , que guardava na minha papelleira , recebidas
no tempo da minha moléstia e entre ellas en-
contrei huma , de que me fizestes mercê , sobre a
qual , ao depois de lida , vendo-me em estado de
•%os responder , fiz as reflexões seguintes.
Como todos tem o seu modo particular de pen-
52T , h« indubitável que o meu não haja de agra-
dar a todos sem excepção ; e por isso jamais me
lisorijeei disto , o que he bem fácil de se conhe-
cer em todo o decurso da minha pequena obra ,
e , principalmente , sobre a cultura do Café, on--
de, quando proponho as minhas idéas , sempre re-
salvo o melhor parecer dos meus Leitores , e sem
pertenção alguma de que sigão o meu por pre-
ferencia. Eu não tinha trez annos de experiência,
como tive a honra de vos dizer na minha primei-
ra resposta , quando me veio á cabeça escrever
as
as minhas observações. E , ou seja porque truncas-
sem o meu original ; ou porcue o priíneiiO não
fosse conforiTifi ao posterior , acho nelie cou<:as ou
sentidas que não concordao absolutamente com o
meu. Seja porem o que for , me esí"o'çarei era
responder exactamente ás vossas observações ; e
ainda que eu não haja de concordar em tudo com-
vosco , nem por isso devereis crer , cue isto faço ;
porque as vossas idéas sejáo difFerentes das minhas i
e que eu pertenda censurallas.
Vós principiaes por me instruir na historia fa-
bulosa dç certas cabras , citadas em o Diccionario de
Trevoux , e ainda que eu soubesse esta historeta ,
talvez prim.eiro que vós , eu me acautellaria da fa-
zer delia a menor applicacâo. Póde-se conceder por
tanto cue as cabras , pelo pasto de hum fructo de
que ellas gostavão , fossem a primeira caUsa do seu
descobrimenro ^ pois que estes animaes , desejosos
de hum fructo, que lhes regalava o paladar, não
deixarido todos os dias de o procurar naquelles lu-
gares das mattas , para onde o seu appetite os con-
duzia , o qu« daria occasião , a que a curiós idude aj
houvesse de observar , (e isto he verosimil ) vendo
que ellas voltavão saltando , e alegres , visto que
não podia deixar de ser assim ; pois tinhão consegui-
do , o que tanto desejavao , e que esta viagem era
para ellas huma alegria. Mas que o Prior do Con-
vento quizesse experimentar nos seus JVlonjes (que
vós
(159)
VÓS suppondes preguiçosos) a virtude que o Caf4
tinha de impedir o somno ; na veidade , meu Se^
rhor , cousa alguma cheira tanto a huma fabula.
Ensinai me , fcu vos rogo , o modo , com que elle
se promp'ificou para conhecer o eiíeito no ponto»
em que o dizeis , em hiun tempo , em que era
provável que elle o ignoraria í
Achais o meu receio mal fundado , quando af-
firmo que a abundância do Café lhe poderia dimi-
nuir o preço» A experiência já mostiou o formal
desta resposta. Quando vós tornareis a vêr o pre-
ço do Café a 20 e 30 soldos ao arrátel , como
«ra até aqui ? Estou certo que nunca. Dizei , o
•que quizeres , sobre o objecto do commercio. Es^
ta manufactura só he hura supplemento ás outras:
por tanto vos concedereis que os mais considerá-
veis acharão sempre nelle sua conta.
Dizeis mais que não he crivei : que o Café por
dez soldos não haja de produzir mais que seis qui-
te e livre I Em que fundaes este cálculo , que me
faz cahir em hyperbole ? Dai huma pouca de at-
-tençáo mais , se quizerdes , e vereis que o vosso
erro he maior que o meu.
Assentaes , como despeza da passagem, 15 sol-
dos por 200 arráteis de Café. Eníie tanto\ sabeis
que as nossas saccas , não excedem o pezo <^e cem
arráteis 5 e que muitas vezes se paga 20 solclos por
sacca , mas os nossos commissarios só o pagt^o por
is:
C >6o)
15: duas jornadas de cavallo , que avaJiues por trez
livras , e seis soldos. í^iíiguem o acarretará por me-
nos de 12 livras por carga; ainda cue só segas-
te hum dia.
Sabeis que todos temos interpostos em as pla-
nícies junto ás fraldas , ou sobpás das montanhas ,
donde se acarreta aos embarcadouros a hum sol-
do por arrátel , o que segundo a minha opinião ,
e a de Bareme , importa 50 livras por hum mi-
lheiro. Tenho a certeza , de que os vizinhos de Don-
don pagarão pelo Café , levado ao cabo , a 3 soldos
por livra , ainda antes de terem pago a commissão :
e assim , sendo o Café por 10 soldos , não podem
ter , de que vivão abonados , e com que criem as
suas famílias , e deixem a seus hetdeiros os funda-
mentos de huma fortuna , como he a vossa ex-
pressão.
Se a raiz mestra de hum Cafeseiro for arruina-
da , quanto trabalho não haveis de ter para o fa-
zer escapar ? e ainda que procureis decotallo , se
lançarem alguns ramos , se enfraquecerão á propor-
ção do seu crescimento ; e haverão dez contra hum
a apostar , que elles morrerão ao depois da sua pri-
meira producção.
Tendes a opinião que se devem decotar , passa-
da a sua quarta colheita ; a minha he pelo con-
trario > e vem a ser , que 'vós a cansareis , a me-
lhor ^parte faltará , e a que prometter muito , fará
( 1«1 )
o tnesiTio na primeira colheita , sô vós haõ àcaii-'
trilardes deixando-lhe só a madeira, qi:e convém
para que possa fructificar moderadamente. O meid
mais sólido , ao meti parecer , iie át O deixar so-
bre pé taes , quaes sãò nò íémpo da sua esterili-
dade : tirai-ihe Unicamente a iDadeira qlie vos pa-
recer supérflua , cuidai eiti c.tie a sua mantença sô-
j^ bem limpa 5 e tirareis delle hum bom partido;
Em lugar de lhe fazer caliir as flores , &c. na^
da tenho , que vos dizer : consulta as minhas Me-
morias , e nellas encontrareis , o que eu penso a es-
te respeito : se os vossos não fazem iiiéncão disto >
recorrei âo original.
Tendes razão naquellâ partsí , em què dizeis que
ráo são òs Cafeseifos velhos , os que produzem O
grão pequeno.' Eti o tenlio experimentado poste*
rTormente ás minhas observações , e vi que excC'-
dião muito ao dos nòvbs. Isto poderia ser attribui*
do antes ás desordens das estações , do qUe aõS
terrenos ; porque isto íó acontece em certos tem-
pos , ou annos.
Ainda que a a^ua te demore antes , óu depois
do Cafeseiro plantcdo , a planta não deixará de re-
ceber à fi escura , que eu sustento ser-lhe saudá-
vel , pois que esta mesma frescura lhe impede o
de finar.
A respeito do que eu dissfc , que se davão ví-
íiniios , que os plantão a j e a 4 pés de distancia,
L COLl-
È
!K
concluis dízencío : que a terra lhe hc ingrata , e ,
para o que aconselhaes que se hajão de cortar na
altura de cinco pjs , com bem repugnância minha
sou obrigado a dizer vos que nisto fareis huma gran-
de .. . Estou certo que hum Cafe.-.eiío desta al-
tura (senão estiver em huma teria profunda) não
renderá dous guinés successivamente. Querendo con-
sultar o original acima apontado , achareis hum pa-
recer contrario ao vosso , apoiado por fundamentos
mui plausiveis.
A razão , que allegaes , de abrir as covas a enxa-
da em terrenos pedregulhosos , he muito justa. Fal-
tar-me-hia o bom senso , se eu a ccndemnasse. Eu
só fiz esta advertência para aquelles , que indiffe-
rcntemente o plantão do raesmQ modo em toda a
sorte de terrenos , tendo em vista o riefinar.
Ora este he o artigo , no qual , se me não en-
gano, tendes nnais prevenção que solidez. Admirai-
vos de me v<2r inclinado a plantallo na estação dos
Nortes ? Além de dar a isto huma solução accei-
tavel , eu poderia destruir a vossa opinião em hum
momento, e, (por certo modo de me exprimir)
offender-vos com as vossas próprias armas. Pondes
por principio , que os Cafeseiros ; plantados no fim
do anno , tendo vinre niezes ao tempo , que flore-
cem no segundo anno , vem a ílorecer mais abun-
dantemente , e que , não tendo conseguido ainda
toda a força , que só a idade lhe pód« dar , os
seus
C 163 )
seus friictos não podem chegar aO ponto de má*
duros. Por ventura jíí vistes qlie a primeira eolhci-
ta houvesse de causar o menor damno á arvore ?
A planta tem tanto vigor nesta idade , e produz
tão pouco , que ella he como o loujeiro na sua
verdura ; mas isto já lhe não acontece na segunda
colheita , em que já o pé está em toda a sua for-
ça , e de tal sorte se carrega de frUctOs , que se do-
bra pelo seu próprio pezo , c se vé em grande
perigo de acabar. Por este motivo he , que eu aconr
selho de o fazer parar á altura de dous pés e meio ,
ou de trex , quando muito ; e dou para isSo huma
razão , a qual se me não engano, deve ser rece-
bida , e quando a vossa cópia não a tenha , oií
não appareça nella, recorrereis ao original.
Achaes qiie eij não penso justamente , quandíj
admitto que se plante ârroi , e milho > entre ós ren-
ques dos Cafeseiros , ou avenidas , entretanto que
^lles crescem : mas , coiii vosSa licença , não se to-
jTja O sentido litteral de meus principios , quando
se confunde tudo juntamente. Eu não creio que
haja hum só vizinho , qué seja de Opinião contra-
ria á minha , quando digo : Que hum renque , ou
fileira de milho , ou arroz * entre hum renque de
Cafeseiros de seis pés de distancia , não poderia preju-^
dicar em cousa alguma aos Cafeseiros 3 e qtíe tam-
bém não seja do meu parecer , para tirar proveito
«le huina terra inculta , que lhe custa muito máís
Lu ft
C l<4 ) •
a mantençâ , quando ella se acha descoberta total-
mente , em razão das más hervas , que necessita
mondar, do que est:ndo ella plantada de viveres,
que produzem a abundincia de n antimentos por
toda a parte , em que se planta.
Dizeis que hum habitante , que possuir 6o qua-
drados de terra , tem onde trabalhar cincoenta an-
nos. Recorrei ao vosso desiricto , no qual julgo»
que não passão de quinze aquelles , em que ahi se
cultiva o Café ( cxceptuando-se os seus trez pri-
meiros habitadores) e onde ha muitos, que possuem
cem quiídrados ; e vendo as enormes derribadas , (]ue
á pouco tempo fizerão, me persuado que vos con-
vencereis do vosso erro. Todo o bairro de San-
ta Susanna , habitado alguns annos antes , cuasi es-
tá sem terra , para se cultivar ; e por isso ,^bem lon-
ge de as poderem deixar a seus Netos , não as pos-
suem , para deixar seus próprios filhos , a não sei em
ou cultivados , ou pastos infecundos.
Tendo feito paiar os meus Cafeseiros n'altura ,
que acima disse , jamais colhi algum , que fosse re-
sequido , ou escaldado , o que prova ser bom este
methodo , e que o pc não produz maior quanti-
dade de fructo , do que aquelle , cue a seiba pode
alimentar. logo que se percebe que o Café se quer
escaldar , cortando-se hum terço de cada ramo
atacado , n'hum momento se evita com este remédio
que elle se seque,
Jul-
C '65 )
Julgaes que seria noelhor empregar todos os pre-
tos absolucamente cada noite , sem exceptuar huma
parte , que iiaja de descançar ; porque não reflec-
tis sobre o.iunneio limitado , que se emprega nisto.
Também tendes outra contradicção , que eu não
posso deixar de vos advertif , quando diieis que
íjuaato. o Café melhor fermenta , tanto melhor se
despega da sua goinma. Nisto convenho comvosco.
Mas se esperardes para putro dia, para fazerdes es-
ta obra , interrompereis a colheita , e soffrereis a
perda deste retardamento , e se esperardes até á
noite seguinte , vos poreis no risco de vêr o vosso.
Café escaldado , o que o ennegrecerá , ou averme-
lhará excessivamente,
O m.odo , que praticaes , de repassar o Café ao pi-
lão , ao depois de ter este adquirido o seu gráo de
perfeição , he bom , e não pôde deixar de livrar o
Café da sua pellicula muito adherente , ou tenaz,
^supponhamos .o caso) e de lhe embellezar a sua qua-
lidade.
Não he fácil de se enteruJefí— A natureza se re-
gozija , nas suas producçÔes j das nessas observações
exactas. He tão extraordinário vêr hum Cafeseiro
lançar muitos ramos , como huma videira multi-
plicar os seus sarmentos , ao depois ds ser po^
dada.
Isto tudo , quanto julgo , he huma resposta ex-
acta ás vobsas observações , e pôde ser que vos ha-
jaes
1:1
I
(166)
jaes de queixar da liberdade , com que a dou. Nis-
to nos pagamos mutuamente. E quando assim o
queiraes , lançarei a boa parte todas as objecções ,
que me po? estes. Isto he tão verdade , que já d'ago-
ra me resolvo a convidar-vos , e a vossos amigos ,
c á outros quaesquer do vosso conhecimento , que
fizerem descobrimentos , que me queirão honrar com
» sua correspondência , c que me bajão de avisar , com
o protesto que eu os porei em as minhas IWemoria$i
citando o nome de cada hum em particular , o que
poderá perpetuar os seus nomes , e lembrança sem
iftúita despeza
T^nho a, honra di sôr com muita estimação
Vosso , êcc.
29 de a.; tiib.ro dv lyój.
Assir;nadt>.
£. M.
( «67)
MEMORIA
SOBRE
C A°F É,
POR M, ABBADE ROSIER.
( Díçcj,iinalrs univend d' Agricultura» Tom. 2,
pag. 515.)
N
§ I. Jntrodacção,
Unca aíltivei esta preciosa arvore ; tenho-a
visto no Jardim Real , mas não de sorte que a
possa descrever por minliâs próprias observações j
por cujo motivo tomarei de diversos ^âiUthores t o
que iiouver de dizer , dando a cada iium o que
lhe pertencer , conforme a Lei , que me tenho im-
posto , a qual já mais quebrantarei.
o
CAPITULO I.
Historia do Café»
Cáfeseiro , segundo escreve M. o Abbade
Reynal na sua Historia Filosophica , e Politica dos
estabelecimentos dos Europeos nas duas índias , tem
a sua origem na Ethiopia Alta , onde de tempo
immemorial he conhecido , e onde ainda proveito-
samente se cultiva. O Senhor La^venee de Mezie-
\- re ,
C i6S )
rc , o Agente mais sábio que França mandou á$
índias , possuio o seu fructo , de cue usou muitas
vezes. Elle o achou muito mais grosso , ak^um tan-
to mais comprido , menos verde , quasi com tanto
perfiims , como o que se principiou a colher na
Arábia no fim do decimo quinto Século.
• Commummente se crê que hum Mo/Z^ci /cha-
mado Cltaddy , fora o primeiro Árabe , e)ue fizera
uso do Café , em razão de se livrar de hum ador-
meci r.en to continuo , que o embaraçava applicar-
se , como convinha , as suas orações nocturnas. Os
seus Dert^iches o imitarão. O seu exemp'o artiahio as
outras pessoas de profissão Religiosa. Não se passou
muito tempo , que senão conhecesse que esta bebida
purificava o sangue por huma doce agitação, cu3
dissipava os pdzos do estômago ; alegrava o espiri-
to-j e a adoptarão ainda aqueíles , que não tinli^ó
precisão alguma de estarem despertos. Das bordas
do Mar Veiinelho passou para Medina , e Meca ,
ç desta 'para todos os Paize< Mahometanos.
Nestes , onde os costumes não sío tão livres ,
eomo entre nós , se pensou estabelecer casas pú.-
blicas , em que se distribuísse o Café. As esta-
belecidas na Pérsia , passarão em pouco tempo a
serem reputadas por infames j e tendo o Governo
cohibido as dissoliiçõci revoltadoras , voltarão estas
casas a ser hum asyllo, honesto para as pessoas
iJJiosas , e hum lugar de descanso para os homens
oc-
(169)
occupados. Elias erão o lugar ,»íPM .ponto dç uní^^
CíTi que os poii^Jcos se ajuntavão, para se divertir
reiíj com as novidades. Nelias reçitavão os Poetas
os seus versos ; e os Mí^llac/is os. :,mW: ^^rmôftftiiÍL
Estes acontecimentos não.forão tão pacíficos
em Constantinopla. Apenas se abrirão nesta Çida*
.de , estas casas públicas. Ioga se^çoncorreo.a-elJas
com furor. 0.'G.overnQ , p^las representações do -IVlur
phti , ou Supremo Ministro da Religião , as m^nr
dou fechar , e passou a vedar o uso desta bebida
até no interior das casas particulares. Mas hum^ i^-
içiinação decidida poç .esta bebida, a fej triumphar
,dç todas, estas severidsdes ; poryqu^ntp se continuou
a bebsr,, e os próprios lugares i em que, antes se
4istribuia, dentro em [pouco tempo ? se aphárão ciom
putfo jfaip^o numera de conctirrentfi; ^ ■çom^ f^ pW*^T
fipi0.'.*;í c?, '; ■ . - -.-j :..'-. ^^^ l^ndoA
, No iTxeip do Seçulo passado , o Grão Visif
Koproli foi disfarçado a's principaes casas, do Café
des Constantinopla , onde encontrou hum sem nú-
mero dc; :pes.^ajs queixosas ,e pouco s*tisfeit^lná%
governo , pe.la, persuasão , em que estãp , dç. gUA
os negociou . de cada hum e n^ . t^^ íiçu Ur , , são ' .o.5
ç[ue.o deyem interessar ,je pôr is-so se queixavap eoiil
cftor ,, e cens.uraylo com hum excessivo ati;0,y|m«n-
to a conducta dos Generaes , e dos Ministros. Des»
t^s botequins .se passou para as bodegas , e taber-
nas, eii^.qa^,. :se, vendia o vinho , e^s encpntrãU; ata^v
-t>- ca-
( 170)
odâs de {Tesíoas áJmples , e pela maior parte solda»
dós , os quaes acostumados a respeitar os interesses
do Estado i como próprios do Príncipe , que elles
adorãb em silencio , os encontrou cantando aieare-
iftehtfe ; fàllando dor seus amores , e das suas expe-
dições militares. Ficou altamente persuadido que es-
tás ultimai sociedades merecião ser toleradas pelo
go^eftto 5 poVs hão tinhao inconveniente algum ; c
que as primeií^à^ erão muito perigosas em hum Es-
tado dispotico ; e por isso as Supprimio , e ninguwn
afo depois se aniiiiou a reestabeleceilas.
1-" iPréeísariíeiíte neste mesmo tempo , que em
Gò^i^stânt inópia sé formarão os botequins do Ckfé ,
èé abrirão òs dé Lòndrôs. Introduz io- se esCâ nòvi'
dádè^m íóji > por hum Mercador , apouco che-
cado de huma viagem de Levante , chamado Eduard.
Achou-se que erão conformes ao gosto Inglei , e
lt>dà^ íft NàçÔes da Europa o imitarão , ou adopta-
rão aó depois.
'-i M-. AlibJet i á quem devemos â Historia das
jvfantas da Guiana Franceza em 4 vol. em 4.° não
Stíticoiúd neste liltimò ponto com o A'hbade Rày-
tíàl "Affirma have/em provas v que , -no Reinado de
Liiií XIIÍ. , se vefidia debaixo do Chatfeièt de Sares,
a bebida do Café com o noitie deCá/iovt', ou C*a-
-^- ' Paffece'*; diz 'iVT; Ai)bTet";~^íjQe'b "primeiro pc
dteC^fé j tíultivaJo em a Horta > ou Jardim Re;il ,
■'' fo-
Cl70
fora trazido por M. Rèssons i Qffitkl da Artilheri»,
mas tendo morrido , M. Pànchras. , Eurgmestre é'
Amsierdaiii , enviou liuma planta a Luiz XiV., a
qual foi entregue , e tratada no Jardim Real -das
plantas de Paris. He intere sísanté a sua Historia ,
por ter sido o Pai das primeiras plailtaçõesíde GaV
fc nas nossas Ilhas da : America. . r .-
Em 1716, as íioi/as^plantas , crioulas dós grábs
deste pé, forão confiadas a M. Isembejg : Medico 1
para as haver de condiizir , e levar ás nossas Coló-
nias d'America ; mas , mortendo este Médico i pouco
tempo ao depoi-s da sua chegada > se malogrou esr
ta tentativa. Deve-se a M. Declieux formalla no-
vamente em 1720 , concebendo o projecto de en-
riquecer com esta. cultura a Martinica. Aos seus cui-
dados se est^, responsável do exitO; feliz , que te^t
esta segunda cuiprezai Este atil Cidadão , sendo n&s^-
te tempo Capirao.de Infanteria ,e Alferes do Na-
vio j tendo tonseguldo , por iTiediaÇ'ã0 de M- Gihiraç^
Medico i hUma nova muda de Gafe , laascido do grão
do Cafeséiro j, manda;do por M. Parieras 5 e, conser-'
vado no Jardim R.eHl * a embarcou comsigo para
a Martinica* ' No decurso da viagem pelo mar j a
provisão da agua' veio a sér escassa no seu navio,
mas elle geherxjáammtè xepártia; com o seu; peque-
no arbusto a mesquinha ração , que recebia , para
apagar a sua sede , e , mediante este generoso sacri-
fício , cons&guio salvar o precioso depósito ,<de que
( «72 )
estava encarregado. Esta muda estava excessivairwn-
te enfraquecida , e não tinha maior íírossura que
huma mergulhia de cravo. Tendo chegado á minl>a
casa . (diz M. Declieux) a primeira lembrança , que
tive , foi de plantalla com todo o cuidado em
>hum lugar do meu Jardim , que fosse tnajy^favo-»
rave! ao seu crescimento.. Sem embargo de a tet^
plantado em parte , que .a,podesse vêr , e vigiar con-
tinuamente ,íTiuitàs vezes desconfiei que ma furta-
váo , de maneira -que fui obrigado a cercalja de es-r
>pin-hos , e de l-he pôr huma sentinella , que a es-
preitasse ate á m.idureza das sementes. (*) O êxito
coroou as minhas- esperanças : colhi quasi dous ar*
rateis de: grãos , que' reparti com todas as pessoas j
ds que fiz conceito , que serião capazes de appli-
car os cuidados necessários para se pro<;peT3r a pro-»
p^nração desta.. planta..; A primeira-^colíisita foi <ibim-
ctantissimiii'à^ segunda pôz no estado de se poJer
«steiider prodigiosamente esta cultura. Mas a acci-
derjte , ^ue concorreo para a favorecer singularmen-
. tí^^fi^Toi" o arraigamento de todos . os Cacaoseiros
do Paiz peia maTs- horrorosa das tempestades , (^u«
os .destiuio radicalmente. As ciitraS' Ilhas , como a
d-; S\ Domingos , de Guadalupe , e adjacentes , são res-
poírt?avei^ , e devedoras á de Maitinica: das soas; plan^
• • ^^^ ^^ " Í2ÍL,
(*) O A:tthor falia das senuntes pvtjmiihs pela
plaaía.
Pouco depois desta época (1719) se introduziò
«sta planta em Cayenna. Hum desertor desta Coló-
nia , doendo- se de ter trocado a sua existência, pe-
la dos estabelecimentos Hollandezes de Guièna ,
desejando voltar aos seus compatriotas , e^creveo de^
Surinam que se o quizessem acceitar , e perdoar a
sua deserção, traria comsigo grãos de Café , capa-
les de germinarem ,^^ezar das rigorosas: penas ful-
minadas , contra os que houvessem de as levar pa-
ra fora daquella Colónia, Tendo-se annuido á sua
proposição , aportou a Cayenna com sementes fres-
cas , que entregou a M. -Albon , Commissario In-
tendente da Marinha , que se encarregou de as plan-;
tar. Os seus disvéljos forão premiados por hum bom
successo. Os fructos , qvq estes arbustos produzirão i
se espalharão pelos fazendeiros , e moradores , e , den-
tro em pouco tempo , houve huma multiplicacãsf
grandiosa.
A companhia das índias , estabelecida em Paris ,
mandou em 1717 á Ilha de Bourbon por M. Fou-
geret Gremer , Capitão do Navio de S. Maló , al-
gumas plantas de Café Moka^ que forão remetti-
das a M. des Forges Boucher , Tenente Rei des-
ta Ilha. Julga-se que destas mudas só existia hu-
ma em 1720 , cujo prcducto foi neste anno tão
grande , que , neste mesmo anno , se semearão 1 5
mil. Em hum dos volumes da Academia das Scien-
cias de Paris j se lê o facto seguinte. Os moradoreís
da
Ci74)
da Ilha de Bourbon , tendo visto em hum navÍD
Francez , que voltava de Moka , ramos dos Cafesei-
ros carregados de folhas , e de fructos , se lembra-
rão logo que tjnhao nas suas montanhas arvores se-
melhantes , e tendo hido buscar os seus ramos , para
os conferirem , á vista de huns , e outros fez ex-
acta a comparação. A differença , cue encontrárã<*
unicamente, foi, ser o Café da Ilha de Bourbon
mais comprido , mais niiudo , e mais verde que a
da Arábia. Isto prova o damno , que causa a falta
de luzes , que vai buscar mais longe , e com gran-
des despezas o que está ao redor de nós , e que
pizamos aos pcs.
Quanto não seria estimável que , os que nos
precederão , tivessem conservado os nomes de todos
aquelles , que enriquecerão a sua pátria com plantas
úteis. Estes nomes serião muito mais respeitados, pe-
los que sabem dar o verdadeiro valor ás cousas , que
os dos Conquistadores , que ar;yinão , devastjío , e
açsolão o mundo.
CAJ
E
C >7Í )
CAPITULO II.
Descripção do Café pelo Senhor
Jiissieu.
Sta arvore , que justamente se pode chamar
Jasmin d' Arábia com folhas coino as do loureiro,
a cuja semente damos o nome de Café , he deno-
minada por Von Linne (ÇofFea Arábiga) Cafeseira
da Arábia , arranjando-a na classe quinta ( Pentan*-
dria) ordem primeira (.monogtfnld), EJIa produz os
seus ramos de espaços em espaços por todo o com-
primento do seu trohço , sempre oppostos , e de dons
em dous , dispostos de maneira que hum par eri>>
cruza o outro. São simples , arredondados , nodosos
por intervallos , cobertos , do mesmo modo que o
tronco , de huma casca esbranquiçada , mui fina , que
abre, quando se secça. O lenho he hum tanto ri -f
jo , e adocicado ao paladar. Os ramos inferiores de
ordinário são simples , e se estendem mais horisonr
talmente que os superiores , que terminão o tron^-
CO , os quaes se dividem em outros m.enores , ou
mais miúdos , que sahem das axillas das folhas ,e
guardão a mesma ordem , que os do tronco. Huns
€ outros são abasteeido? , e vestidos de folhas intei^
ras , sem dentaduras , nem chanfros nos seus con-
tornos , agudas nas duas extremidades , oppostas duas
a duas , e se asseraelhãg á^ folhas do loureiro or*
di-
m
Cl76)
dinarío I com a difFerença de serem menos seccas ,
menos espessas , ordinariamente mais largas , mais
pontudas na sua extremidade j são de hum verde
gaio , lustrosas por cima , verde pállido por baixo.
Da axilla , ou encontro da maior parte das
folhas nascem as flores , ate o número de cinco ,
sostidas cada huma por hum pedúnculo curto. Sío
totalmente brancas , de hum só petnio , quasi do
mesmo tamanho , e fii;Ura das do Jasirrn a Kespa-
nha , menos em ter o seu tubo mais curto , as
suas divisões , cu cortaduras mais estreitas , e acom-
panhadas de cinco eUames brancos , com as su^
midades , ou antheras amarelJadas , em vez , que
os Jasmins só tem dous. Estes estames sobrepojãa
o tubo da sua flor , e rodeão hum estilo esgalha-
do I ou aforquiihado , que nasce em C''ma de liuiw
embrião , ou pistiljo , posto no fundo do Calis ver-
de , que tem quatro pontas , duas grandes , duas pe-
quenas , dispostaá alternativamente. Estas flores du-
rão muit» pouco tempo , e tem hum cheiro bran-
do ) e agradável. O embrião , ou novo fructo , que
se faz quasi do tamanho, e figura de huma cereja,
se termina com hum embigo , no principio he
de hum verde claro , ao depois avermelhado , na
continuação de hum bello vermelho , e ultimamen-
te na sua u?tima madureza de hum roxo denegri-
do. A polpa he barrosa , de hum sabor desagra-
dável , que SC muda paia o dos abrunlios negros
sec-
C 177 )
*cccos , qnari(^o se secca , e a grandeza deste fruc*
to então pode ser regiilada pelo tamanho das ba*
«^as dos Icurtiios. Esta polpa serve de coberta a duas
dcjgadas , ovaes estreitamente unidas , abauladas pe-
las, costas, planas pelo lado , que se ajuntáo , de hu-
ma còr branca amaiellada, e que cada huma con-
tém huma semente dura , e, por assim dizer , oval
abobada pelas costas , chata do lado opposto , ca-
vada no meio , e , por todo o comprimento deste
mesmo lado com hum rego assas profundo.
Em Eatavia , e n' Arábia esta arvore cresce mui-
to , e o seu tronco he sempre delgado , guardada
á proporção com a sua cultura. Em todo o decur-
so do anno se conserva ornado de flores j e de fru*
çtos.
CAPITULO III.
Da sua cuharct*
i Ublícou-se em 1775 huma carta sobre a cuí*
tura do Cafeseiro , dirigida a M. Le Monier , mas
sem nome de Auíhor. Desta obra tíasladaremos o
resumo , que agora himos a dar.
Na ilha de Bourbon por muito teiripó se usois
aproveitarem-sè para plantas das novas mudas , nas-
cidas das sementes , que eahião na terra , em torno
dos Gafeseiros. Ora isto , he hum abuso 5 por quan»
to ã experiência Um mostrado que estas mudas se
M d«.
( T78 -"^
defínão por multo tempo r.o depois de transplani
tadoâ-.
Devem-se fazer as sementeiras em campo li-
vre , tendo-re dado á terra , que se lhe destina ,
toda a Javoura , e adubado não com estrume ,
mas com o húmus vegetal. E.te campo deve ser
repartido em taboieiros , ou cantei. os em que se
tenhão aberto re-os de meia pollegada de pioiun.
deza, e espacejados de scre a oito.
Lance-se nestes regos o fructo cstonado da sua
casca , de fora, cr não ca inte:icr couriacea. Apai-
te-se cada grão dos qife ihe ficarem visJnhos trej
pciiegadas de distancia , e se cubrão de terra. Hr
k:;i:>o importante cue se escoihão grãos bem ma-
duros , e novos. Desde çue ficarem seccos , não i>as*
ceráo mais.
Pí«a se lhe tirar a polpa os negros convales-
centes , ou enfermos, passão hum c/lindro de pão
per cima da cereja quando está vermelha. Este es-
Jnaga a polpa, e liie separa o grão. Os cue se qui-
zerem planfar , não devem ficar amontoados por
muito tempo : a polpa fermentaria , c a fermenta-
ção arruinaria o gérmen. Em quanto o grão se des-
poja da sua polpa , se póem em « cinza , que se
ape^a á cobeua da fava pelo intermédio do sueca
vhco^o , fornecido pela polpa , e esta cinza imp«.
de . çue os grãos se peguem huns aos outros , o
^iUC laciijta as se;neaduras, ..
AI-
Alguns cultivadores pensarão que era iTelhOT
j^hintar os grãos inteiros, quero dizer, com a siiíí
polpa. A polpa , seccandio-se na terra , embaraça ó
desenvolvimento do gérmen. Ordinariamente aconte-»
ce , qut huma das duas sementes contidas na cober-
ta , ou casca commum brota antes da outra. As suas
folhas seminaes estão inclusas na segunda coberta ^
ou couriacea , que he particular a cada grão. O troq-
eosinho , que acaba de nascer , ou grelo traz com-
si^i;,o esta casca interior com as folhas , e lança é
mesmo grão fora da terra. Mas como a casca com-
mum particular a cada grãd, se contém na cober-
ta commum aos dous grãos , de três cousas neces-
sariamente resulta huma , ou que o tronco tenro
da planta não tenha bastante força para levantar o
pezo do segundo grão , e da polpa independente dá
terra que os cobre , e neste caso morre a planta 5
ou ainda se hum vento forte agita esta massa sem
abrigo , quebra também a haste ainda tenra ; final-
mente , se o segundo grão , cuja germinação oii
desembrulhamento foi serôdio , for lançado sobre
sí terra , se dessecara' , e morrerá pela acção do vee-
to , e do Soí. '
A melhor , e mais proveitosa estação pára fa^
2er as semeaduras , he a dos mezes de Março , Abrif,
Maio , e Junho 5 porque as plantas , que neile? nas-
cerem , não tem que sofFrer , senão o calor do Sol
de inverno destes Paizcs : e são por consequência
C i2o )
]ú iriii fortes. Guando entrarem a sentir os calores
do Estio. Entretanto as plantas , que nascem cm De-
zembro , e Janeiro , estão expostas aos calores mais
fortes dcí^de o momento , cm que nascem , o qus
causa a morte a muitos.
Ke muito essencial haver cuidado em os mon-
dar de toda a herva bravia. Convún arrancalJcs coin
hum picão , e não a enxada , porque a pouca dis-
tancia entre os raios, n^:© peimitte este género de
trabalho.
As semeaduras de Cafc devem ser rerada? ,
não só para as defender â:j.s seccas , mas tambent
para Jhe apressar a vegetação. As rer^as da tarde são
melhores , que as da manhã , e das cuq se fazem
no crescimento do dia. Estando se perto de al.-um
rio , se lhe pôde fazer corrsr junto as platabandas,
que neste caso se devem fazer muito estreitas pa-
ra que possão seV humedecidas inteiramente pela
agua corrente. Para se poderem regar por irrigação,
se dispóe os caminhos mais altos que ella , e se lhes
faz correr a agua dentro , ou também se Icvantad
as bordas aos quadrados , e se inunda tudo abso-
lutamente , acautellando em arnbos os casos que a$
plantas não fiquem submergidas. O terceiro modo
de as regar consiste eiíi dispor os canteiros de ma-
neira que fiquem mais elevados que os caminiios ,
que os dividem. Guia-se a agua corrente pelo pri-
meiro caminho , em cuja extieaiidude se pòem ai-
c isi :>
jwnna terrn para fazer preza da agua. Os rapazes en-
trão neste caminho , e com cuias a espalháo sobra
os canteiros para ambos os lados á direita , e á es-
querda , ate que fiquem bem humedecidas. Os dous
primeivos meios sSo os mais promptos , e os mais
fáceis , mas não tão vantajosos como o terceiro.
Se o terreno do Cafesal for mui húmido , a plan-
ta se fará amarella , a sua vegetação vagarosa, e se
jnhab ilibará para a transplantação.
Qisasi sempre acontece que os cultivadores tem
precisão de mudas para acabarem de encher as suas
tiansplantaçoes. Esta falta retarda os seus trabalhosj
e recua a sua colheita. Conhecem-se os inconve-
nientes de as hirem buscar longe , e da mudança
da terra. He por tanto muito melhor ter milhares
ÀQ plantas de mais em os viveiros , do que passar pe-,
la falta de não as ter»
Convém que todos os annos se facão semea-
duras para que possão supprir , os que houverem de
morrer , ou pelos raios ardentes do Sol , ou pelas
seccas , ou pelos bichos , os cupis assas conhecido?
e-n as nossas Ilhas , e as aranhas , que bastantes ve-
zes destroem as arvores mais vigorosas , e robiístas
nos Cafesaes , mas sobretudo nos primeiros annòs
em que se mudão.
As semeaduras produzem algumas vezes varie-
dades , e destas podem resultar algumas descobertas.
Os dous pequenos Cafés , confandidos em Eourboii
de-
f T?0
debaixo dos nomes d'JJo,i , dVilcn , ou d' Oadsn ,
cuja qualidade he tão superior , nada mais são cuo
variedades , produzidas pela cultura verosimilmente.
Qjerendo-se multiplicar as variedad.^s , que se po-
dem conseguir por este meio , he preciso enxer-
tallos.
A alguns annos tem. apuarecido hutn escarave»
lho negro , que róe as folhas dos Cafeseiros. Deve*
se temer tsít insecto mais nos viveiros que nos Ga^
fesaes formados. Temos fundamento para crer, cue
elle veio trazido ào Cabo da Eoa Esperança. Os
Hcllandezes póem de tarde por baixo das arvores
cartuxos de papej , ou de folhas , nos quaes estes
insectos em montões se vão aninhar de noite. Ti-
rão se €s cartuxos de manhã cedo, e se destroem
toJos os escaravelhos que elles contém. Póde-se
ajuntar 3 este methodo o de sacudir as arvores ;
çom esta successão cahem por terra , e se matão.
Ainda ha outro insecto branco , que . nomeião
piolho em a Ilha de Franca , e accommette aos ra-
mos das folhas , e ainda as raízes dos Ca''eseiros ;
e os faz adoecer , c só ;»ão vistos em os viveiros ,
ou semeaduras, que são feitos em terrenos seccos
e áridos. Mas regando-se estes continuadamente des-
apparecein.
Tem se procurado estabelecer Cafesaes , plan**
' tando os grãos nos campos. Este meio não pôde
ser proveitoso sç não ncs paizes chuvosos. Todavia
como os Cafcs , que não íorao mucíacíos , ccn^ervno a
rãh principal , ou mestra , ellss resistem melhor aos
furacvões , e tempestades.
Ou se plante o Cafc em grío para permane-
cer no lugar em c;ue se planta , ou para se mu-
dar somente , convém culíivar-se o milho no mesmo
Juwar , e os pequenos legumes , apartando a hum
das plantas, e derramando outros para não trepa-
rem por elles. Isto mesmo só se deverá fazer nos
primeiros dous annos , e depois destes senão deve
culiivar cousa alguma totalmente entre os Cafesei-
ros. As ervilhas do Cabo, sáo sujeitas aos piolhos ,
e os communicáo ás arvores. A mesma amhravada ,
certo arbusto leguminoso, que se estima muito em
Bourbon , he também sujeito ao piolho , e esta se-
rá a razão porque nesta Ilha abrii>;ando-se os novos
Cafeseiros com esta planta , tenhão 03. seus culti-
vadores perdido os seus Gafesaes por causa destes
insectos.
A estação , ou tempo melhor , e mais vantajo-
so pára. se mudarem os Cafeseiros , he o-, meies de
Junho , Julho , Agosto , porque^ neste tempo tem
menos seiba , e he c tempo mais fiio do ar.no ,
cue se tem nestes climas. Havendo nos viveiros hu-
ma quantidade superabundante de mudas , se pode-
ria tentar a sua transplantação nos m^e-zes chuvosos ,
quero dizer , em Janeiro , Fevereiro, e Março.
Pão-se dous modos geraes de se transplantar
©3
os Cafefjeiros ; In7m que he o mais seçrijro , e mais
proveito«;o , mas o mais lon-o , e trabalhoso he o
de transplanfallo com o torrão. He o mais se?uro
porque todas as plantas pegão geralmente , e he
mais proveitoso por duas razoes. Primeiro precisa
hiima muito menor quintidade de plantas; porque
são menos sujeitas a morrer. Segiwóo não soffrein
transplantações , e por consequência a sua vegeta-
ção não se aíTròxa. Para este methodo se servem
de hum desplantador , que arranca facihnente a pían-
ta com o seu torrão , ou céspedes , e se corra a
ponta da raiz principal , qunndo e^ta sobrepoja.
r>Iistura-se-Ii,e húmus, ou a melhor terra dos arre-
dores , de que se tiiou , na cova , em que se ha de
plantar , e se enche. Se a terra do inear , em cue
ss semea , for muito secca , se re-a algum tempo
antes do momento da transplantação.
O se?;undo methodo consiste em arrancar as
plantas a nú , isto he , sem ter o cuidado de con-
servar a terra da raiz , ou o torrão ; mas antes de
tratar esta transplantação , convém fallar do terre-
no p-op io pa^a hum Gafe^^al.
A<5 terras fortes pantanosas , marno^ns , ari^ilo-
sas , devem ser rejeitadas. Os Cafeseiíos -ostão das
terras soltas , pedregosas , pedras , e grande calor.
Se são vistos mais vigorosos , e prosperão melhor
nos destri:tOí chuvosos, i:ão proGJ7em cem a van-
tagem da quantidade, nem da cuul:dade sobretudo,
As
c 1?? :)
A? terras vermelhas em a II lia de França , mistura-
das de pedras , e de grossas pedras são em geral as
iTiais pmprias para a plantação dos Cafesaes. Nos
destrictos estes não vegecão também nas terras que
são vermelhas , francas , e profundas : seccão-se prom-
ptamente Nos destrictos porém chuvosos , vem mui-
to bem nesta mesma qualidade de terras. As terras
negras que cob em a argilla a três ou quatro pol-
legadas de profundeza , não convém aos Cafeseiros,
Alguns particulares formão os seus Cafesaes em
pequenas porções nomeio das florestas ,• ou matas ;
e se tem reflectido Gue os Cafeseiros postos ao
lon2;o das arvores , abrigados do Sol nascente , e dos
ventos geraes , nascião mais promptamente , e erao
inelhores que os outros. Esta belleza he iliusoria :
produzem menos , e seus fructos são de huma qua-
lidade muito mais inferior. Os Cafeseiros querem
Sol e ar , e sem estes não dao colheitas abundan-
tes , e os seus fructos não são perfumados. í?eria
muito melhor dar aos campos dos Cafés , nos des-
trictos seccos , a figura de hum parallalegramo es-
treito alongado , encerrado em a mata , de manei-
ra que podesse apresentar os grandes lados a lestei
e que a sua correnteza fosse de Norte a Sul. Se-
ria necessário que se fizessem de cento em cento
e sincoenta varas , alleas , ou avenida? , direitas ,
]ar$^3s , que partissem o parallelogramo em outros
niuitos , e que atíavessasseiu as duas extremas, ou
ou-
C iS6 )
ourelas dns matas opposras , e ainda a mesma plan-
tação. Para evitar em parte os eífeitos do Norte,
c do Sul , c.i:e enfiarião tod« a plantação , seria cx-
ceJlente plantar arvores ou alinhadas , ou em e«:ta-
cadas em todas estas allcas , que hcariio com i:to
ellas mesmas fazendo hum belio ponto de visM ,
« hun) objecto de formosura , e de u: ilicijde , co-
mo a man.^iueira , o páo preto , o margoz^iro , o
Iila da China o badoneiro , e sobre tudo nos des-
tficios chuvosos , a canneiieira de CoMchinchma ^;ue
cncrarião a dar abrigo desde o quinto , sexto , e
sétimo anno. As allcas procurão huma correnteza
de ar livre , favorável á vegetação ; os movinjentos
deste ar são moderados nos tem.pos tempestivos ;
em fim ellas facilirão a exportação dos i>uctos nos
tempos de cclheira.
Nos destfictos chuvosos se faria melhor dar
maior largura ao parallelog«-amo , e apartar a alieai
entre si. Ordinariamente se vem os Cafeseiros ve-
getarem com muito vicio , e vi^^or , e de repente
morrerem como aííV^ados pela nimia abundância
da seiba. As sangrias feitas ao Sol se fizem mais
ou menos indispensáveis.
He opinião s^cr.d nas Ilhas de Bourbon , cue
se devem plantar os Cafeeiros cm 7 pcs e meio
de diitancia para todos os lados, mas todavia es-
ta di-r;.,KÍa deve estar s;íbordinaJa á nati-rez-i do
terreno , e á força , que- dl^ dá á vci;etação.
A
c 1^7 :)
A trat5sp]antação , ou muJa requer quasi as
niesma:? cautellas em todos os destrictos , e são
mais necessárias nos destrictos seccos , que nos hú-
midos , ou chuvosos.
Podem principiar , se for possivel , pela pre-
paração antecedente das covas destinadas a recebe-
rem as mudas. A influencia do ar melhorará mui-
to as terras dos fundos das covas. Nos destrictos
seccos requerem que se aproveitem os dias^ chu-
vosos para as abrirem ; e devem ser mais estreiras
que nos húmidos , pois que nestes as arvores se
fazem mais vigorosas. Nas terras novamente derri-
badas as covas devem ser muito m.aiores ; porcus
se achão cheias de grossas , de miúdas raizes de ar-
vores , que se precisão tirar. Estas servem de pas-
to aos bchos brancos, que ao depois passão a des-
truir os Cafeseiros , e principahnente a raiz mes-
tra , ou perpendicular totalmente , e fazem.-nos mor^
rer.
Advertio-se , que estes bichos brancos accom-
mettião por preferencia os Tacamakeiros , e as Pal-
meiras. Deve-se por tanto ter grande cuidado em
queimar as hastes destas duas arvores , e também
03 seus troncos. Quando se alimpar a derribada
{goivarar a rossa no BrazU) se lembrem de arri-
mar a lenha , ou fazer a fogueira junto a duas aos
troncos destas arvores para as queimirr.
He muito necessária , e importante à escolha
das
ié^^^tH^^^^^I^^
\
d^' P.anu, F,ra se f„er a tran,plantac3o. AI^,,n,
juigao, ^„e a.çue tiverem cinco ou .ei, polle.a-
das de grandeza . devem ser preferidas, flla, a ex-
rer.encia ,em ..estrado , <;ue as n.ais fortes são
'"a.s bem succed.das. As mudas de dois para tre,
'"■'^os S.O muito meiiiores para a transplantação
n>as esta seria lcn« . e dispendiosa. '
iJáo-se tre, precauções , que se fa,em preci-o
tomar quando se transplantJo por serem essenciaes
A I. he arrancar as pl.ntas con, a maior porção
de raízes, que for possivel. A II. de cortar arai.
•neutra embico de flauta (bumcó.te obliquo)
no lugar em que se bouver de pinntar . e icual-
n^ente o topo . ou cabeça de planta. Esta ukima
operação náo be adoptada em todas as Colónias,
e ellas padecem o pre;uizo. A 111. ao deoois de
se haverem cortado as duas extremidades da pliri-
«a se .ntrodurirá na cova . e se lhe lançará a ter-
ra pouco a pouco . „áo a que se tiver tirado
quando se abrio a cova , mas a que se acha pela
v.smhança da, covas na sua superfície por ser esta
^ H^elbor , e se calcar.í' brandamente com a mão
na cova, e apertará as nizes á. proporção , que lhe
ior lançando dentro a terra , tendo cuiJ,,do , qr^
elh, fiquem bem estendidas . e acautellar-se de cue
na-o fiquem enfeixadas, cu em n.oibos , nem aper-
tadas com a raiz p:inc:pal. Farão mni.o. bem , s-
.^.st»r.re,n esta terra com aj.u;» bu:nus ve-^etal .
OU cinza. > " .,
Se
C iS9 )
Se immediataineiue ao depois da transplanta-
ção sobrevem hum Sol ardente , que dure por
ir.uitos dias , se deve , ao menos huma vez , fazeir
fegar as plantas.
Os cuidados , que requerem os Cafeseiros ao
depois de plantados até o tempo da sua colheita r
consistem principalmente em manter o terreno bem
mondado , sobre tudo , ao redor das plantas , ou
pés de Cafés. Fazem se amarejlos > e adoentados ,
Jogo que são opprimidos pelas hetvas bravias/ Or-
dinariamente praticão queimar as hervas , ao depois:
de arrancadas , porque se tem conhecido , que el-
las brotavão qtiasi todas no terreno , em que se
deixão espalhadas , quando chove. He mais vantajo-
so aproveitallas estendendo- as pelos pés de Cafés ,
para adubar lhe a terra *, por este meio não nasce-
rão outrss por muito tempo debaixo das que ahí
estiverem amontoadas , mas será preciso que formem
huma camada bas-antcmente grossa. Além deste
proveito se dará outro , que he ter menos que fa-
yer na segunda íavra , ou arrendadura , que nesse
tempo não he tão urgente , nem tão essência! ,
como era a primeira. Com tanto, que os Cafesei-
ros novos se não opprimão , ou aífoguem , uaá
deve desassocegar-se com as hervas bravias , que
houverem de nascer pelos intervallos deixados en-
tre huns , e outros. Haja de se espalhar pelos pés
dos Cafeseiros todas as produccóes , que se houve*
rem
C 190 )
fem de cultivar nos Cafesaes do mesmo modo,
que as bravias.
Sempre qi,e ,q alimpar , o» mondar o terre-
no , se Iiajão de airancar as hervas bravias án.aoj
o que he melhor do que coin a enxada , que cor-
taria as raizes capiiiares, ou barbalhos , que brotáo
da-aarganta da planta , ao menos em quanto as
plantas não estiverem bem pegadas , e bem enraU
gaJas.
As argijlas, os depósitos, cu nateiros, que
os rios deixão, são os melhores adubos para os .
destrictos seccos. Nestes mesmos destrictos se de-
vem destriiir todas as ramns gommeleiras , e la-
droes ; porque deilnío , e esfajmão os bons ramos.
Nos terrenos húmidos porem estes d.^mnos não de*
vem causar tanto iv.cáo.
Quando se encontrarem peias arvores ramoí
paras itos , mortos , ou verdes meio quebrados , se
cortarão pela parte sã , ou viva , e se \hQ poiá
cm cima da chaga barro humedecido.
Logo que as foJhas de qualquer Cafe^eiro en-
trarem a fazerem-se amarellas , será isto hum si-
nal , de que está doente. Prccisa-se neste caso ca-
var a terra em roda ao pc da arvore , e indagar ;
se as raizes , e sobretudo , se a principal . que se
crava pela terra , e que se lhe deixou . se acaso
está accommettjda por algum bicho. Algumas veze»
as raizes são devoradas pelos piolhos brancos (ca-
C Í9I )
fis no Briix.il) , os t]uaes se matao esfregando S
patte tocada , ou oílendida. Assim neste easo , co-
mo no primeiro ccnvcm mudar a maior parte da
tena , c]ue rodeia o Cafeseiro , e de se lhe subs:i-
luir terra nova , misturada com cinza , e com o
httmtis , ou terra vegetal : e finalmente regar imme-
diatamente o terrena, estando seeco.
Se esíe meio , cii remédio não aproveitar a
planta adoentada, será mister, que se decote, ou
pôde. Fazendo-se isto rebentará em novos ramos 9
e aa depois que elles estiverem íirm.es , se corta»
ráo todos , deixando somente o que for ír-ais vi-
goroso , ou forte ; todavia não se precisa todos no
ínesmo dia , mas progressivamente interpollando mui-
tos dias entre o corte d® huns , e de cutrcs. Se es-
íe decote , ou poda não for bem succedido , entáoí
se está na figura de arrancalio , de fa^er huma no-
va cova maior, e mais psofunda , que a primeira *
e tirar fora toda a terra 5 de deixar fínaímenfe a
cova exposta ao Sol , e á chuva por muitos me2es.
Vendo'Se cupis peios ramos , folhas , e fruc»
tos dos Cafeseiros , se deve suspeitar que as suss
folhas estaráõ também accommettidas por elles ; e
por isso se deve cavar os pés , e !ançar-se nelles
ínuita cinza , e terra vegetal , ou húmus, e se es-
fregarão com lodo, como se disse acimav
Algumas vezes são os Cafeseiros investidos por
iiuma moléstia singular. As foiisas , ramos , e aígcí,-
( 190
mas veíss os irennos fructos ?e cobrem de huíri
matéria negra, que se coallia , c dessecca. A cnq-
poração da sciba se intercepta por esta causa. As
arvores idosas são mais sujeitas a esta moléstia cu^
as novas , mas nsm per isso elJa he muito preju-
dicial.
Na Ilha de Bourbon , e também na de Franca,
costumão não levantarem as arvores r^ue os furacões
revirão : contentío se em calçar precipitadamente as
raizes , c]ue ficarão descobertas , ou desenterradas.
Estas arvores levantão gommelleiras ou rebentões ,
<5ue se leva a prumo. Peixão-se prosperar hum ou
dous destes ramos , e se cortão os outros, A maior
parte destas arvores , ainda que sejão bem calca-,
das as suas raizes. Sobrevindo hum novo furacão ,
o Cafesal se perderá inteiramente. Sempre será o
melhor methodo levantar as que estiverem revira-
das , e de as calcar escrupulosamente as que esti\e-
lem ainda fixas sobre o seu pé , e não de todo
arrancadas tanto que passar o furacão de vento, ou
o temporal.
Tem prevalecido o u<^o de a? chapotar , oa
aparar as francas , passados três annos da sua trans-
plantação , para cue os seus ramos lo; ge de cres-
cerem para o alto , hajão de fa2er maior copa pa-
ra os lados , ficando deste modo a colheita das se-
mentes muito mais fácil. Mas não ba«;ta fazer-re
esta operação huma só vez. Tendo-se cortado a
»um-
C m )
sumidailc do tronco , ou lança que sobe perpenáí-
Gularmente , rebentão sem demora dous garfos , ou
lançamentos direitos por cima dos dous ultimoi
ramos lateraes que se deixarão. Estes dous novos
lançamentos formão duas hasteas , ou dous no-
vos troncos , e estes pela continuação do tempo
sobem , e chegão a huma grande altura 3 de sor-
te que impossibilitão poder-se apanhar á mão Oí
fructos , que nascem nos ramos do topo » ou su-
midade. Também seria preciso tornar a decotar es-
tes dous lançamentos, ou garfos » e por que elles,
devem ser annualmente substituidos por outros , que
igualmente rebentarão todos os annos , se deveráó
cortar , para que se haja de ter a arvore sempre
na mesma altura , como se pratica nas seves , ou
cercas vivas , que se vêm obrigados z dcootalías «
c chapotallas , para se conservarem no mesmo nivel,
O melhor tempo , para esta poda , ou decotamento
he pelo mez de Maio , ou Junho ; parque neste
tempo geralmente tem os Gafeseiros menos seiba*
Não se duvida, que a arvore, que se deixas*
se cresceç á sua vontad® , daria fructos de melhor
qualidade , que a arvore podada , ou chapotada 5
mas estas ficão menos expostas , a serem aballadas,
c desarraigadas pelos furacões , e tempestades , e st
sua colheita se facilita muito mais. As arvores
abandonadas a si mesmas são mais lampas.
Voltando a si os Gafeseiros , se trouxerem rs*^
N mn
m
C '94 )
mos petísccros , ou mortos , e derem poocos frwr
ctos , será então preciso decotaHos totalmente o
mais rente da terra , que se poder , pelos mezes de
Junho. Julho, e Agosto, e ao mesmo tempo la-
vrar-Ihe os pcs , e chegar-lfres algum estrume. Es-
tas arvores podem dar boas colheitas por quasi qua-
renta annos.
A colheira indemnisa o cultivador de todas as
suas despezas; e trabalhos, e os cuidados , que el-
Ia requer , se redui unicamente a colher o grão em
o estado de perfeita madureza , o que se conhe-
ce pela côr acerejada. Estando este de hum ver-
melho saturado , e que começa a denecrrir-se ,
então he o tempo de o colherem. Todavia nãc
seguem esta marcha ; porque colhem-no muito mal,
misturando o grão maduro , com o que não o está.
O methodo de dessecar as cerejas não he me-
nos importante. Nas nossas Colónias se contentão
com as seccarem ao ar , e ao Sol ; em alguma»
se bate , ou calca a terra com manguacs , e nesta
superfície , ou área se espalhão todas as cerejas do
Café; outros poíém Jhe ianção alguma cinza; c
também as estendem sobre a relva. Muitas vezes
a terra communica ao grão hum cheiro desagradá-
vel. Os Colonos , que tem po»ses , ladrilhuo o seu
pavimento , dando-lhe algum declive , ou inclina-
ção' para o escoo das aguas. Deve-se preferir a to-
dos este methodo.
Es-
( '95 5
Estcnde-se o Cafc na área , oU terreiro tocíaí
ns maníiãs , e se se amontoa, cobre-se com estei-
ras feitas de folhas de palmeira para o abrigar ,
durante a noite das chuvas , que lhe retardão a
dessecação. Este uso tem hum graUde incOnveniert-
tc. O Café cm monte fermenta , a sua dessecação
he mais morosa , e deteriora a qualidade , o« bon-
dade do grão. Seria muito melhor i sobretudo nds
destrictos seccos , deixar úi ^rlos espaíbadoj na área.
Cobiillos de esteiras de noite ; e de dia , se sobre-
vier a chuva. Cuide-sê em lhe passar o rodo pelo
Café amontoado , para que os grãos fiquem expos-
tos revésadamente , ou a Seu turno ao SoL Mas
de todos Os methodos t o que parece nnerecef a
preferencia , he o de dessecar a cereja em «stufa.
Este dessecamento he mais seguro , mais pfdtnpto 0
e mais completo. A estufa não dévír ser tso vas-
ta , como se pensará ; pjoi-que O' Café dé fiirhtiâ plaií»
tacão não se recolhe todo de humá vêz*
Estando o grão seeco , precisa estonalío , ou
descascallo. Dãò-sé muitos meios pára isto. Kuns ó
pilão á força de braços em hum pilão de madei-
ra*: a mãò d' ottra hé comprida, e custosa, e 6
Café fica sujeito á ser ésihagado : outras se sèrvétn
de engenhos de vento , ou de agua. Estes ultimof
são os mdhôreí , e que sé devem preferir por cau-
sa da sua continuidade , è dá igualdade do moví-
Rtenta. Ten4o-se-lhe tirado a polpa , se levãõ af
N il #f^
( 190
íenientes , e se põe a seccar ao Sol : despojão-je
da sua coberta membranosa interior , soccando se , e
finalmente se joeirão.
Feita esta operação , ainda he mister seccar-se
o Café , para o ensaccar. Para isto he a estufa ex-
cellente. Seccando-se a ar livre , a operação he maii
dilatada , e mais casual. Dão-se Grangeiros , ou culti-
vadores, que não applicão tantos cuidados , e cau-
tellas , e por isso contrahe hum cheiro , que lhe
diminue a qualidade. Deve-se expor ao ar ao sahir
da estufa , e ao depois ensaccallo.
CAPITULO IV.
A
I>as suas proprleiadet»
S sementes são sem cheiro , de hum sabor
ligeiramente amargo , e aae ; estando ustuladas , ad-
quirem hum leve cheiro empyreumatico , hum sa-
bor amargo , e mediocremente acre. O Café favo-
rece a digestão , aquece , augmenta o curso das ou-
finas , aparta o somno , pacifica a embriaguez pe-
los espíritos , excita algumas vezes o fluxo mens-
trual , suspendido pela impressão dos corpos frios »
tende a diminuir o excesso da gordura : he preju-
dicial aos temperamentos sanguincos biliosos , as
crianças , e as mulheres , se são propensas a mo-
léstias convulsivas. O Café convém nas mojcstias de
ffi-
C «»7 ■)
fraqaeia aos temperamentos pitiiitojos » ^s pessoa*
sedentárias phlenmaticas , cujo estômago conserva
os alimentos por muito tempo com sentimento de
pezo em a região epigastrica : allivia sensivelmen-
te na hcmierania 5 e nas moléstias de cabeça , cau-
isadas pelas más digestões. O Café com creme he
prejudicial ás mulheres , por lhes oceasionar perdas
-brancas. Louva-se muito as lawg-ens , ou cristeis de
Café nas apoplexias.
Diíferentes Authores declamarão vivamente con-
tra o uso do Café , outros pelo contrario se esfor-
çarão com a m-esma vivacidade na sua defeza. Re-
sultou desta grande discussão ter cada partido ra-
zão , o que se poderia muito bem evitar » se an-
tes tivessem concordado no modo de o fazer » na
quantidade de Café prejudicial , ou útil , e final-
mente na natureza dos temperamentos, a <|ue po-
dia convir. O gosto ^eral se decidio actualmente
íi favor por esta bebida. Beve-se recear , que do
mesmo modo se venha fixar pela do chá , muito
mais periííosa ainda pelas suas consequências.
O Café mtiJto ustulado esquenta muito , e se
faz alkalino : o liquor he acre , e não tem perfu-
me ; quando está no ponto conveniente , o seu
óleo essencial fica conservado , e o seu cozimento
goza do perfume , e he menos calefaciente^
Os apaixonados pelo Cs fé tem a seu turno
excitado esta questão , se deve ser ustulado em hum
moi-
( 198 )
moinho , ou ein hiima panella de harro vidraáà.
He sabido , que o moinho ataca o óleo essencial,
wnica parte aromática do Café ao ponto de pare-
cer , que o moinho se cobre de huma substancia ,
que se assemelha por seu polido , e por seu lustre
á huma camada de verniz negro da Ch)na Ka pa-
nella , peio contrario , o ar da atmosphera , achan-
do-se frio , impede a evaporação deste oleo essen-
cial. Hum moinho novo dá por alguns dias hum
gosto desagradável! ao Cafc , o que não acontece
ao depois. Cada hum tem seu methodo particular
na preparação desta bebida. Este he , o que sigo , ao
depois de ter executado todas as experiências pos-
síveis.
Eu parti deste principio universalmente reco-
nhecido : quanto mais o Cafc he secco , tanto se
conserva por mais tempo , e tanto melhor se faz.
A razão he simples. A dessicação lhe faz evapo-
rar a agua da vegetação contida em a seiba Quan-
to mais novo chega o Cafc na Europa , tanto he elle
mais verde , e tanto mais abundante o grão d'a?ua
da vegetação. Por tanto , ustujlando-o , he preciso
imitar o procedimento da natureza. Eu prefiro o
moinho para o ustular j poique o executa mais
igualmente , e a operação he menos trabalhosa que
na panella. O moinho interiormente e<nÁ bem en-
costiado de verniz, de que acima falíamos, e ao
depois serve por muito tempo. Lança-se no forno
C 199 )
cp-iatro ou cinco brazas , quando muito, põe se o
inoinho , e o domestico o volta sem cessar. He
preciso conservar o fogo , sem augmentallo , e esta
operação deve gastar , pelo menos , huma boa hora.
O primeiro cheiro, que se evapora pelas juntas da
ma pequena porta , ainda que fechada he , singiílar.
Eu o não poderia definir : parece ao das violetas.
Seri talvez próprio tão somente da casca , que
sofFre a primeira acção do calor ? He constante que
clle não pôde ser do óleo essencial , do oleo aro-
mático do grão; porque he preciso hum gráo de
calor mais forte , para o desenvolver. Pouco depois
lhe succede hum cheiro desagradável , a este , outro
fastidioso , finalmente a este ultimo cheiro succede
o do Café queimado. Assim que se percebe este p
se tira o moinho do forno , e depois de lhe haver
aberto a porta , se examina , se a côr do Café sç
approxima á do Tabaco , chamada dos Capuchi-
nhos. Do principio da operação até este momento
requer que , sem cessar , se volte a manive'la , e se
conserve hum fogo igual , e brando. Se o grão se
não tiver ustulado » se repete o pôr o moinho no
fogo , e , huma vez por outra , se examina pela por-
ta , se acaso tem chegado ao ponto , que se quer.
Tendo-se chegado a clle , convém trazer o
moinho a huma meza de mármore , ou de pedra •
c abrir~lhe a porta , despejai Io , e fazer isto de
ir-odo I que os grãos se não toquem. Funda-se es-
ta
C 2C0 )
ta prática , em que o toque do corpo frio , coma
o mármore , a pedra , &c. esbulha o Café de hu-
ma parte do seu calor ; e por outro lado o ar frio
da atmoiphera trabalha sobre o Cafc , e o frio do
^r , e da pedra , em cujo meio o [;rão se acha , im-
pede a evaporar?© do oleo essencial. Rstando per-
feitamente frio , he necessário guardalio em hum
vaso í que se feche exactamente pela sua tampa.
Muita»; pessoas tem o máo costume de o aflfo-
gar com hum guardanapo , ou com papel , d^c. Não he
possível recorrer-se a expedientes mais defeituosos.
Dever-se-hia attender que este guardanapo , e este pa-
pe! , ao depois de terem privado o Cafc da sua subs-
tancia oleosa , que verdadeiramente he o seu oleo es-
sencial , fica elle de nenhum valor , e , por conse-
<?uencia , o mesmo acontecerá d sua bebida. Scpuin-
do-se porém o procedimento , que eu indico , se
verá , que cada crão pnrece estar , por assim dizer .
envernísado, E este vern/s he o oleo essencial , que lhe
íica pegado por eima. Os que gostão de Cafc , o de-
vem ustullâr todos os dias.
A maneira de preparar a bebida existe também
algumas advertências. Fazer o Cafc á Gre^a lie o
Jrjelhor de todos os methodos , a saber , pôr em
huma manga hum pouco cbra 2 cunntidade de Ca-
fé , que se julgar necessária , redu7Ída em pó , e
lançar lhe por cima a porção de anua quente ne-
cessária, deixar repousar tudo, e servir-se delle bem
quen-
( 201 V
quente. NSÍo se tènd® manga ou coador » quando a
agua ferver na cafeteira , se Ili£ lança o pó , inexe-
se com huma colher , e se deixa assentar junto ao
fogo , e se tira , o que esta claro.
Seguindo-se exactamente , o que acato de di-
zer , se verá soKr' aguar pela superfície do liquor
o óleo , e o Café ficará aromatisado. Quando se
faz ferver o Café , o óleo essencial se evapora , e
que será consequentemente , quando se ustullar o
grão a hum fogo quente ? O Café muito queima-
do tem hum gosto amargoso forte , e esquenta ex-
traordinariamente.
Nas casas grandes , onde costumão clarificallo
com colla de peixe , o Hquor na verdade fica mais
agradável avista, mas esta colla , unindo-se ao óleo
essencial, o appropria a si, e despoja delle o Ca-
fé. Entre tanto he a única parte aromática , e agra-
dável.
O Café em grão he capaz , ou susceptível de
se embeber do cheiro de todos os corpos , cue o ro-~
deão , e a humidade também lhe he perniciosíssi-
ma , e o melhor modo de o conservar he guardai lo,
pendurado em hum sacco , n' algum celleiro , ou
em outro qualquer lugar , onde haja buma boa cor-
renteza de ar.
Fiz muitíssimas experiências , para tirar do Ca-
fé I)um certo gosto , vulgarmente chamado maru-
jsiáo , ou marulho. De tedos somente hum me sor-
tjo
sortio bem. Este foi de o lançar cm agoa ferven-
do por alguns minutos , despejailo , e expor este
grão a hum Sol forte , ou em huma estufa , o
que he ainda muito melhor: finalmente o deve con-
servar , ou guardar , como disse. Este mesmo proce^
dimento he útil para os Cafés verdes.
ME-
( *oj )
Mcthodo de se tirar o máo cheiro , c des«
agradável sabor do Café, importado
da Jamaica.
m
Ttluseum Rusticum , fS>'c, -f, 3. Número 18.
V^ AvALHÈiRos , são iTiuítas , e justas as queixas ,
que se tem feito do ináo cheiro , e desagradável
sabor do Café importado da Jamaica , e das outras
nossas Colónias. Tem-se geralmente attribuido isto
á demasiada gordura do terreno ; e se imaginou ,
que cessaria , e desappareceria , assim que o terreno
tivesse menos disposição a tornar vicejantes as plan-
tas de Café. Mas eu me inclino a assignar-lhe ou-
tra cousa.
He bem sabido , que o Café trazido da Tur-
<iuia , e o das índias Orientaes , são ambos com-
prados no mesmo mercado x^ e producto do mesmo
i*âjz , posto que o primeiro seja hum fructo pe-
qn»
( ao4 )
•qiieno , e duro » e o outro muito maior , e mais molle,
A differença nasce disto. O que nos vem da
Turquia , he conduzido em barcas sem cubertas , ou
embarcações , por huma navegação alguma cousa enfa-
<3onha pelo Mar Vermelho , exposto em todo esse
tempo ao intenso calor do Sol , que lhe faz exha-
lar as partkul::? aquosas; e de novo soffre , <lepo»
de poito em terra , outro proc«<;so da mesma cas-
ta, pois he tra?ido ás costas de camellos toda a
compridíssima jornada até Alexandria, por esse cli-
ma intensamente quente : e deste modo fica cura-
do , e da forma , que o recebemos.
PeJo contrario , o que he tra2ido pela Compa-
nhia das índias Orientaes , vem immediatamente do
mercado , e he mettido no apertado porão d* hum
navio , e por isso o recebemos cru , e com os sue-
cos indigestos.
O mesmo succede ao Café trazido das Coló-
nias : por isso , attendendo-se como convém , a es-
ta observação , e , expondo-se o Café ao Sol por tem-
po competente antes de eiiibarcar-se , he summa-
inente provav«I , que se fizesse tão bom , como o
da Turquia , c que fosse hum considerável artigo de
exportação , talvez para este Empo- io.
Inclino-me mais a crer , que isto produzirá ef-
jfeito , por se me ter certificado, que o Café da Ja.
maica , seccando-se ?o Sol , nos eirados das casas
de Londres , melhorara muito de qualidade,
C 206 )
RELAÇÃO
D A
CULTURA DO CAFESEIRO
Na Arábia Felis , extrahida das Viagens de M. de
la Roque.
(By Joh Eli is» An historie ai Account ofCaféc
pag. 18.)
R
Efere que o Cafeseiro neste Paiz nasce da se-
mente , que se planta , em viveiros, e que se mudão
as plantas , havendo occasião. Para isto escolhem
alguma paragem húmida , e sombria nas pequena»
collinas , ou encostas d' outeiros , ou nos sobpés , ou
fraldas dos montes , procurando conduzir cuidadosa-
mente dos montes alguns regatos de aguas por ca-
lhas , ou canaes até ás raízes das arvores , por ser
absolutamente necessário que hajão de ser conti-
nuamente regadas para produzirem fructo , e pari
que este amadureça. Por este motivo , mudando ,
ou transplantando-je as arvores , fazem huma cova da
largura de três pés , c cinco de profundidade , a
qual enchem , ou cobrem de pedras , para que a agua
mais facilmente penetre pela terra , de que he cheia
a cora , e se evite que possa evaporar a humida-
de. Quando vem que a arvore está carregada de fru-
ctóST e que estes entrão a ficar de vez , ou a avel-
lar , desyião-lhe a agua das raizcs , para lhe dimi-
nui-
( 207 )
nuirem o sobejo sueco do fructo , que a demasia*
da humidade lhe poderia causar.
Nas paragens muito expostas ao Sul , plantão
os seus Cafeseitos em linhas regulares , abrigados
por huma espécie d* Alemos , que forma a sua co-
pa alargando os seus ramos , e pernadas por todos
os lados a huma grande distancia , c que produz hu-
ma sombra mui espessa. Elles imaginão que , não
havendo esta cautella , e deixando se á torreira do
Sol > o calor queimaria , e lhes seccaria as flores «
vindo assim a não dar fructo algum.
Nos sitios porém , que não são. muito expôs*
tos ao Sol , não necessitão d' algum abrigo. Quan-
do percebem que o fructo vai avellando , estendem
pannos por baixo das arvores , que elles sacodem »
c o fructo sazonado promptamente cahe (i) ; ao8
quaes , ao depois disto , espalhão sobre pânnos , oU
cs-
(l) Esta clrcmfistancia merece particular attençSo
Í0S nossos fazendeiros das índias Oeeidentaes , </«<?
(jne dizem) colhem o s^u Café assim que clle se fax,
'vermelho , antes de mudar esta còr em hum verme»
Jho escurecido , e começar a engelhai^se '. pelo contra'
rio os Árabes a^u<ardão aqueíles indieioí que mos-^
troo huma perfeita madureza do fructo, M, Miller
no seu Dlccionario menciona que ê Café n algumas
estufas d Inglaterra Se fa-x, d' huma melhor qualida-
de que o melhar Café , que se pôde produzir no paiz
de Moca , o qual da mesma maneira deve ser colhi»
do , tendo chegado o seu fructo íeíalmente à sua per'
feita madureza.
:m
C 20S )
esteira? de Junco , e as põem ao Sol , ate ficarom
perfeitamente seccos. Feito isto , lhe quebráo a cas-
ca com grandes , e pesados rolos , feitos ou de ma-
deira , ou de pedra. Então se estona o Ca^é da sua
casca , e immediatamente se póem ao Sol a seccar,
porque , quanto menos for secco , tanto mais ficará
arriscado a arder a bordo dos navios. Aventa- se com
abanicos , ou grandes peneiras ; pois , se náo for
bem limpo , e bem secco , descahirá de seu valor*
e preço.
Modo de preparúr , e de se tomar • Cqfe entre os Arw
hes , extrahido do mesmo Author,
Quando os Árabes tirão o seu Café do fogo ^
immediatamente embrulhão a Cafeteira em hum pan-
no molhado , o qual clarifica o liquor instantanea-
mente , faz a sua flor huma nata , e causa hum va-
por , ou fumo mui penetrante , que elles se delei-
tão em o cheirar , quando o deitão nas taças. Tam-
bém , á imitação das outras Nações Orientaes , be-
bem o seu Café yem Assucar.
O povo nunca usa delle do primeiro modo;
mas sim do Café á Sultana, que se prepira peU
maneir« seguinte. Moem a cajca de f(Sra , ou pol-i
pa secca , e a deitão dentro d* hum certam de fer-
ro , ou barro , que se põem sobre fogo de brazas ,
c obssrváo entãe mexello , ate fazer-se d* huma côr
meia
C 209 )
niela atrigueirada , mas não tão profunda , ou carí
regada como no Café ordinário : então lhe deitão
dentro agua fervendo , accrescentando-lhe , pelo me-
nos , a quarta parte da pellicula membranosa inte-,
rior : que então se ferve tudo juntamente da manei*
ra do outro Café. A cor deste liquor tem alguma
semelhança com a cerveja Ingleza. As cascas preci-
são ser guardadas em hum lugar muito sccco , e
em caixa fechada ; porque a menor humidade as
privaria do seu sabor. Julgão que o liquor , prepara-
do desta forma , he preferível ao outro. O Francês
diz que , estando na Corte do Rei de Yemen , não
bebera outro Café , e que achara que o gosto des-
te era mui delicado , e agradável , e que não ti-
vera occasião de usar de assucar , por não ter am.ar-
go algum a correger. Com toda a probabilidade este
Café á Sultana pôde unicamente ser tomado nos
lugares , em que estas plantas nascem ; porque , sec-
cando se muito as cascas , para que possão ser trans-
portadas para outros Paizes , como tem pouca sub-
stancia , o seu sabor agradável , que tem quando fres-
cas , ou novas , sobejamente se arruinão.
Pôde talvez merecer que 0$ granjeiros de Ca-
fé nas nossas índias Occidentacs experimentem o
seccar ambas as cascas , a de fóta , e a de dentro
separadamente , á imitação do que fazem os Chins
a respeito do seu chá, sobre huma lamina de ferro
larga , e rasa , com a borda levantada 9 ou voltada
m
C 210 )
para cima , e posta em huma estufa. Podem-se con<;er-
var ahi , voltando-se de continuo debaixo para ci-
ma , para que se não CjUcimem , e cuando se fizerem
tão quentes , que se não possío niecher com a mão »
se tomão então com huma espécie de pá de ferro
espalmada na ponta, e alteada nos lados, e sedei-
tão sobre huma esteira , ou meza baixa, mudando-as
de lugar , até ficar quasi frio , e abanando-as ao me?-
mo tempo, para lhe espalhar a humidade. Precisa-
se enxugar a lamina amiudadas vezes, e guardalla
limpa de qualquer matéria viscosa , que se lhe ti-
ver apegado , e repetir se-lhe este processo, ou ope-
ração todas as vezes que se lhe persentir alguma
humidade. Ao depois cnfardellallas , ou cTibrulhal-
1::S muito bem , mettellas cm boioens seccos , ca-
nastreos , ou caixas forradas de chumbo , do mes-
mo modo , que se pratica com o chá. Convém vol-
tar a estas cascas , passados alguns dias , para se ex-
aminar , se de facto estão inteiramente seccas , e se se
sentem , e , sentindo-se a menor humidade se preci-
sa resequillas ainda mais, d* outra maneira se farãa
bolorentas , e perderáõ o seu gosto, Quanto a isto
consta pela Relação Árabe que elies não estavão
informados d* hum methodo de enseccar estas cas-
cas , e de as enfardellar de modo que podessem ser
transportadas a alguma distancia considerável , sem
prejudicar o seu sabor.
Os Chins são mui cuidadosos em não deixar ai
fo.
(21» >
folhas do seu chá nos montões , antes de estarciit
scccas , o que as faz aquecer , e arruinar. Tambeni
não as colhem senão o que elles podem seccar
em menos de 24 horas ; e assim julgão , quando
tem sido guardadas por muito tempo , que se fa-
zem negras. Estas observações podem muito bem
ser d' algum uso, ou proveito á todos os que qui-
zerem esperar a seccura da polpa da baga do Ca-
fé , que se preparar para se tomar á Sultana.
E X T R A T O
D A
VIAGEM DE NIEBURH A ARÁBIA
Ultimamente publicada em Dinamarca.
\Bi/ M. JoL Ellis The Histor, of Cofée, pa-
gina 2a.)
O
S Árabes bebem , mas pouco , quando comem
se bem muito pouco tempo depois tomão hum bom
gole d* agua , e por conseguinte hum copo de Ca-
fé , sem leite , ou assucar , mas preparado em ou»
tros respeitos da mesma sorte que os nossos. Com
tudo isso , rara vez le bebe este liquor em Yemen ;
porque crem que esquenta o sangue. Porém os vi-
sinhos desta provincia compõem huma bebida das
cascas do Café , a qual na sua côr , e gosto se pa-
rece muito com a do chá , e que. a julgão saudável,
) Q ú e re-
( 212 )
e refrigerante. Elles a prepárão quasi do mcf;mo mo-
^o que a das sementes , ou favas do Café , e he a
mesma a que os Francezes chamão Cn/c á Sultana,
Nichurh na sua partida para Arábia levou com-
si£0 hum moinho de Café , mas presto abandonou
p seu uso , porque achou que o Café moido era
xiiuito inferior ao Café pizado , ou csiragado , co-
n.o o preparavão os Árabes.
Cultivão se particularmente as arvores do Ca-
fé a Oeste dos grandes monte» que atravessão Ye-
rren. A exportação desta planta he prohibida de-
baixo de penas rigorosas , e sem embarg^o disso ,
os Holiandezes , Francezes , e Inglczes descobrirão
meios de transportarem algumas para as suas Co-
Icnias I com tudo o Café de Yemen conserva ate
aqui a preferencia , provavelmente porque os Euro-
pt^cs ainda se não deliberarão a cultivar os seus da
iT.esma maneira, e sobre a altura das montanhas,
Gnde gozão regularmente da mesma temperatura do
ar que goza em Yemen.
A Companhia Oriental Inglcza destina em ca-
c^a dous annos hum navio unicamente ao golfo Ára-
be a carreí^ar de Café.
m
OBr
OBSERVAÇÕES
SOBRE O CAFÉ.
(^Bi/ Dr. Brown, — Nat tirai Hi/siorij qf Jamaica pag.
lói.)
E
Ste arbusto foi á muito tempo introduzido «
e cultivado na Ilha de Jamaica onde medra com
muito viço , e sobe até á altura de oito ou noyd
pés , alargando seus flexíveis ramos a huma consi-
derável distancia por todos os lados. EUe vcget*
melhor em huma terra fértil , de situação fresca ,
e sombria , onde propriamente possa ser refrescada
com hum moderado quinhão d' humidade; e n'hurtt
terreno tal , e situação geralmente se produz huma
cópia tão grande de fructos , que os seus ramos
podem difficulto^amente sustentar o peso , sem se
curvarem para a terra , e frequentemente se obscE-
ra que muitos troncos se rendem , ou cedem a for-
ça da sua carga. Com tudo se observa também que
a arvore cresce , e vegeta quasi em todas as terras
que ficão no sob pé , ou fraldas dos montes , e com-
muramente produz grande quantidade de fructos em
os campos mais seccos ; ainda que na Arábia , don-
de esta planta he natural , ou nativa ; e onde pri-
meiro SC propagou , e se começou a usar , se ob-
serva cultivalia entre outeiros , e com tudo a sec-
cu-
C »14)
cura do lugar he tal que continuamente se vem
©brigados a refrescarem as suas raízes com agua ;
a qual , como muitas vezes falha neste Pair ; por
isso geralmente a trazem cncannada a cada hum
dos Cafesaes.
De ordinário se no'a em Inglaterra , e na ver-
dsde he cousa certa , que o Café importado d'Ame-
rica não corresponde também na sua qualidade , ou
fcondade » ao que se cria n* Arábia ; nem isto he
devido , como alguns imaginão , a algum fumo , ou
vjpor estranho , que pôde ter contrahido no seu
embarque , ainda que se haja de ter tomado sem-
pre hum grande cuidado em embaraçar alguma aqui-
sição desta natureza ; porque verdadeiramen'e , o
í^uc aqui se usa de ordinário torrado, ou mistura-
do , não se assemelha ao da Turquia : porém isto
até agora foi causado por falta d' observação , ou
de conhecimento da natureza do grão : por quanto
o povo attende muito mais a quantidade , que a
íua qualidade , quando esta pela mór parte merece
inaior consideração.
Eu assisti por muitos annos nestas Colónias ,
e tendo sido sempre hum dos apaixonados do Café,
fui muitas vezes obrigado a ter presente o producto
do paiz em seus differentes estados. Isto me deo
hum lugar espaçoso de fazer muitas observações
sobre este grão , e a ousar de dizer que he verda-
de que clles são taes , com© constantemente os re-
pu-
(íl5 )
putão , e , a olhar-se rectamente , presto os hahi*
tantes das nossas Colónias Americanas se podem
pôr em via de abastecer a pátria mãi com hum Ca-
fé tão bom , como o que lhe vem da Turquia ,
ou d' outro qualquer paiz do mundo. Para que se
possa entender esta proposição com toda a clare-
za , dou abaixo as notas , que fiz , conao me occor-
rem.
I. O Café novo nunca se torra bem , uso que a
nossa arte requer. Isto procede da natural viscosi-
dade dos suecos , o grão , piecisa hum espaço de tem*
po proporcionado á sua quantidade para ser aquella
totalmente destiuida.
II. Quanto mais pequeno for o graS , e menos
polpa tiver a sua baga, tanto melhor he o Cate,
€ tanto mais depressa pode ser torrado , moido , e
adquirir o sabor.
III. Quanto o terreno for mais secco , c a si-
tuação mais cálida , tanto melhor o produzirá , e
conseguirá o sabor.
IV. Quanto maior for o grão , e mais succulen-
to I fanto será peior , e mais viscoso , e gastará mais
tempo para obter o sabor.
' V. O peior Café produzido n* America pode ,
pelo decurso do tempo , que não excede ao de lo,
ou 14 annos , ser , como hum bom , torrado , e moi-
do muito bem , e ter hum sabor delicado , como o
melhor , que nos vem da Turquia , mss se reque-
reiu
t'i
rem duas circumstancias , primeira , guardallo em hum
lugar secco , segunda , conservallo com aceio.
VI. O Café de grão pequeno , ou o produzido
em hum lugar secco , e sitio quente , pôde no ca-
bo de três annos estar prompto para ser torrado
elicar tão bom , como aquelle que actualmente se gas-
ta nas casas de Café de Londres.
Fundão-se estes factos em repetidas experiên-
cias, que tenho feito em diversos tempos, residin-
do na Jamaica ; ainda que seja cousa rara que al-
guém possa chamar bom Café , estando na Ilha ;
porque geralmente o toraão á Sultana (i) e nunca
se conserva maior porção que a sufficiente para o
seu provimento de hum anno para outro.
Desde qwe cheguei a Inglaterra , me tenho oc-
cupado no exame do Café , chamado da Turquia ,
com hum cuidado escrupuloso ; e concJMo , pelo ta-
manho do grão , o frequente aborto de huma das
suas duas sementes , c peJa estreiteza da sua pelle
Ç l') Àa meu ver jidgo avites ser huma infusãa
nas meias laminas da novo Café queimado ( porque
vão se pôde torrar , ou moer propriamente , em quan-
to nove) semelhante ao que se gasta pelos fazendeim
TOS de Jamaica commummcnte que he huma dececção
coberta , como de ordinário se faz, Parece ter-se en^
canado o Doutor Brown , quando considera a exp»»
sição dada pelos Francer.es , que viajarão pela Ura-
hta y e que descreverão yUnamtnU çmçd^ de Jax,cr ^
Cnfé à Sultana,
C ^T7 )
que contém a polpa , que o arbusto precisa ser
iHuito acanhado , ou falto de medra no seu cresci-
mento ; c disto julgo , que qualquer esforço , ou di-
iigencia fará produzir hum bom Café , e amadu-
recendo tão cedo , como «a Arábia , ou , esperando
que as sementes tenhão o mesmo gosto , pôde ex-
perimentar plantando pequenas collinas , e fralcas
da serra da parte do Sul desta Ilha ; e , pelo con-
trario , experimentar também o que podem produ-
zir as várzeas ; pois estou persuadido que junto a
Kin^ston ao longo das encostas , ou fraldas dos mon-
tes em muitas partes corresponderá muito bem :
podem-se em qualquer destes lugares escolher hum,
ou dous acres , e experimentará o mais digno do
trabalho ; mas na reaíiJade , para se teiem grandes
colheitas, precisa aguardar entre os montes, onde as
arvores crescem , medrão , e vicejáo muito mais.
Cultiva-se esta planta em qualquer lugar , e se
dispõem em distancias proporcionadas ao seu cresci-
mento ; por quanto em hum lugar secco , areento ,
ou de terra misturada raras vezes cresce mais de cin-
co pés , e se lhe pôde dar convenientemente esta
mesma distancia entre huns , e outros. Mas entre
os montes de Jamaica , onde de ordinário sobe a
S , 9 , e IO pés , e ainda mais , requer hum espa-
ço mais largo , e em hum terreno semelhante po-
de ser prudentemente plantado mais perto de 8 , ou
IO pés de distancia entre si: eu, com tudo,
fre-
C2lS )
frequentemente tenho visto alguns nestas paragens
plantados bastos, que, a pezar disso, produziáo lui-
ma grande cópia de fructos.
O Gentilhomem da Jamaica imaçina que o
grande fundo de riqueza , e sabor do Cafc de Tur-
quia provém do methodo porque o dessecâo , mas
isto he huma noção mal fundada , as^im pelo que
toca ás bagas , como também pelo que pertence ii
arvores , sendo naturalmente acanhadas, e de má
medrança em muitas partes da Arábia no seu cresci-
mento , vem ejlas a ter pequena polpa , e se sec-
ção com muita facilidade em hum clima quente ,
onde em poucos dias de Sol geralmente se com-
pleta a obra, sem se ter o trabalho de as esbulhar
de alguma parte do seu vestido mais succoso an-
tes a mão 5 mas ainda que eu conceda , que o Ca-
fé da Turquia não recebe a addicão d' alj^um mo-
do particular de o seccar , e que eu igualmente
esteja convencido , que huma grande parte , do que
se produz em as partes dos matos de Jamaica , on-
de as suas bagas são grandes, e succulentas, e as
sementes fròxas , e viscosas , são sobejamente arrui-
nadas pelos methodos , que nestes lugares se pra-
tjcão. Taes bagas podem ser , sem dúvida alguma,
esbulhadas de huma grande parte da polpa , e as
sementes trazidas ás terras baixas , para se seccareinj
e não as deixar ensopar no seu sueco viscoso , c sec-
calUs ao depois devagar em hum ar húmido , como
( 219 )
5C pratica em muitos lugares desta Ilha geralmen-
te , o que não prejudica a sua remessa aos commer-
ciantes do Norte , que de ordinário procurão o maior,
e mais gordo grão , como o melhor , e não usão
de outros sinaes , para o escolherem , que a gros-
sura das sementes , e a sua côr recente , que em
commum he d* huma còr ds chumbo azulada , ou
lívida nos Cafés , que são novos.
Oá que formão alamedas , ou avenidas de Ca^
feseiros , se podem prover d huma conveniente bar-
baçam , ou plataforma para seccar as sementes mais
commodamente , pondo-as em cima , e eu penso ser
esta obra muito boa , para se vêr , se o suor , que
reçumão , destróe alguma porção da viscosidade pe-
culiar ás sementes das bagas maiores , n?as estas
devem ser descascadas , e seccas com toda a pres-
teza possível 3 nem imagino que o fácil , e appressado,
com que se pode seccar nas terras baixas , possa
ser huma suíFiciente recompensa ao trabalho de as
carreo-ar , quando são tiradas das arvores.
Estando o ffucFD bem secco , precisa descascar-
$e , e limpar-se de toda a cobertura exterior , para se
habilitarem , e prepararem para a vendagem. Na Jamai-
ca se executa isto geralmente , pizando as bagas sec-
cas ligeiramente em grandes morteiros feitos de
madeiras Qulèes) , até que , ao depois d' hum Ion-
izo » e continuado trabalho , assim a polpa secca ,
€omo a cobertura membranosa interior são moidas^
e ca-
"THilil
( 220 )
e cahidas entre as sementes em pedacinhos. Avcn-
ta-se . ou peneira-se então o todo , alimpa-se , c se
põem novamente ao Sol por alguns dias , e depois
se embarrica para se enviar aos mercados, Was oj
Árabes , ao depois de terem seccado o seu Cafá
sutíicientemente em esteiras , o espaihão ainda cm
Jium assoalhado ; o descascão , passando-lhe por cima
da coberta hum grande , c pesado rolo de madeira
rija , ou de pedra para diante e para traz , e , es-
tando as cascas deste modo bem quebradas , o avcn-
tão t <i o pòem ao Sol de novo até que fique bem
secGO ^ porque, fazendo se de outra maneira, fict
exposto ao calor a bordo dos navios , que lhe fará
perder todo o seu sabor.
A bebida preparada da semente desta planta
foi moderna , e geralmente introduzida em toda a
Europa , e em muitas partes d* Ásia , e da Ame-
rica , e commummente se julga ser como hum ex-
eellente estomachico , e corroborante dos nervos , e
com muita particularidade adaptada para os estudio-
sos , e os de vida sedentária.
Propagão-se as plantas pelas sementes , e , para
nascerem proveitosamente, se devem plantar as ba-
gas , pouco depois de serem colhidas das arvores ,
porque se forem conservadas algum tempo fora da
terra, se arri<;cão a falharem , ou a não nascerem:
mas , quando as plantas se levantão qua^i cinco , ou
seis policiadas acima da terra , se forem dobradas
CO-
C 221 )
como geralmente são , se faz preciso separallas , o
que se faz descobrindo » e dividindo as raízes , e
plantando-as segunda vez em tabuleiros separados.
Quando se tirão do viveiro as novas plantas , e ain-
da as que nascem por baixo das arvores , que se
çhamão arvores Máes , onde de ordinário nasce em
muita abundância , se deve ter muito cuidado em
se não offenderem as suas raizes , e em conservar-
ihes a terra ao redor até que hajâo de ser replanta-
das j por quanto , se as suas fibras se expozerem ao
ar , e SC se deixarem seccar , ficaráó sujeitas a mor-
rerem. Julgo ser esta a razão porque se não vem
nas hortas dos planos de Jamaica esta louçam ar-
vore , onde mui poucas mudas desta casta vegetão,
mi vicejão , onde , sendo arrancadas sem terra , os
plantadores a deixão de plantar por 30 ou 40 ho-
ras , c as levão a huma grande distancia pela tor-
reira do Sol ; mas , quando se quer que prosperem
bem , ha mister ter-se cuidado em procurar plan-
ta» , que tenhão as suas raizes abastecidas com a
terra âo seu canteiro ; ou levantallas immediatamcn-
te da sua scmçnte.
EX-
( ^^* )
EXTRACTO
De huma Carta do Doutor Fothcrgill a JoK Elis
_ Escudeiro.
Agente de Dominica que contém observações sohrc a
Cultura , e uso do Café,
V^ Uanto ao que julgo , hc huma acção mui-
to utiJ , e singularmente agradável ao públi-'
CO serviço , infomisllo de qualc^ucr inelhoramento
por pequeno que seja , a respeito do Cafc , que pre-
sentemente constitue huma parte tão considerável
do nosso regalo , se não he da nos^a sustentação.
Eu me lisongeei assas com a gravura desta elegan-
tíssima planta , que foi destramente executada pelo
seu Sábio Artista , e exactamente a recebeo logo
que foi acabado o debuxo,
Falta-me o tempo para colligir , ou referir com
exacção sufficiente a historia desta baga com a pro-
luxidade , com que se pode traçar pelas historias
Asiáticas.
Pela exposição junta a's reflexões , que perten-
do fazer sobre esta substancia , se mostra que se
introduzira na Martinica nas Índias Occidentaes pou-
co antes do anno de 1727 ; que desde este tem-
po se propagara muito bem em cuasi todas as ín-
dias Occidentaes Inglezas , Francezas , e HolUnde-
-: li "Sj
C 22} )
235 , se bem , sem o cuidado , e attenção que me-í^
rece a cultura desta planta.
A maior parte do Café, que agora se bebe
lí* Europa , julgo que lie oriurído das índias Oc-
cidentaes , com que o Café de Moca se tem redu-
zido grandemente o seu consumo a huma menor
quantidade. Á muitos annos que a Companhia das
índias Orientaes unicamente mandava dous navios
p2ra o exportar , presentemente somente manda
lium em cada biennio a este artigo, sendo verda-
de o qut me informarão , ainda quando se deve pre-
sumir que agora actualmente se consome huma maior
quantidade que antes.
Os Fiancezes , e as outras Nações , que ten^
possessões nas índias Occidentaes , clandestinamen-
te nos abastecem de grandes quantidades. He ver-
dade que nós importamos hum grande fundo de
Café bruto das no'sas próprias Ilhas , mas o me-
lhor he o cultivado nas Ilhas forasteiras. Os Fran-
cezes o cultivão com toda a particularidade : e he
mui semelhante ao que vem dos seus estabeleci-
mentos das índias Orientaes. Os que estão affeitos
ao uso frequente desta bebida , percebem huma dif-
ferença mui sensivel , que se manifesta entre os Ca-
ies Asiático , Francezes , e Americano. O suave aro*
jna do primeiro , e o seu gosto agradável sôbre-
|)assão em demasia ao do Café das índias Occiden-
|aes , como na verdud^ («nho observada* Este ten»
pc-
C 224 )
pequeno cheiro» hum goito de verde, c lhe deixa,
bebido , hum não sei que de desagradável , e especial-
mente , o que nos vem das IHias Inelezas , cue na-
da satisfaz , ao que está acostumado a bsber, do que
yQm de Moca.
A primeira arvore , que se levou á Martini-
ca , descendia de huma trazida de Batavia. Provavel-
mente os Hollandezes tcrião tirado de Moca as plan-
tas , que Itváião á aquella Colónia , e do que se se-
gue sem dúvida que as plantas actualmente cultiva-
das nas índias Orientais são oriundas do verdadei-
ro Café d* Arábia. Mas , reflectindo-se sobre as suas
circumstancias presentes , poderemos talvez mostrar
a causa , porque tanto tem degenerado.
A parte da Arábia , de que nos trazem o Ca-
fé da Ásia , he excessivamente arcisca , secca , e
íjuente.
Em Batavia , o terreno geralmente he rico e
profundo , e ainda que se assemelha aos climas Orier>
taes na estação secca , todavia no período das aguas,
a quantidade destas , que cahe , he excessiva. O vi-
cejante , e rico estado de vegetação na Ilha de Ja-
va , em que Batavia eslá situada , prova muito bem
esta proposição , e seguramente se pôde inferir »
que qualquer planta trazida d' hum terreno secco »
estéril , e areisco não só tomará huma apparencia ,
ou habito externo , muito differente , mas também
que seu frueto tomará huma qualidade mui diífc-
rca-
C 2Í5 )
rente , da que lie produzida eiti hum clírtia ferti!,
e húmido , sujeito a hum calor igual. Isto suppos-
to não deixa de ser provável que nesta circumstau-
cia a planta trazida de Eatavia para o Real Jar-
dim de França , e hum pé , ou muda transpor-
tada a clima muito mais abundante de humidade ,
que aquelie , de que fra originário , podia tomar
outra natureza disparatada, que não era fácil fazei-
la recuar á sua primitiva , e original exccilencia.
Desejo que esta circumstancia , seja como for ,
haja de ser unicamente contemplada como huma sup-
posição, a qual , ainda que não seja sem apparen-
cia de probabilidade , pôde muito bem acontecer
que a experiência a não abone sufficientemente. Puas
na verdade pôde mostrar que por algum niethodo
praticável se poderá chegar a conseguir o melhora-
mento do Café» Permitta-se que o Café se plante
em hum terreno , que seja , o mais que for possí-
vel , semelhante ao seu natural. Certamente a cuita
exposição , junta a esta carta , confirma as minhaí
conjecturas. Quanto mais secco for o terreno , em
que se cultive o Café , quanto mais pequenas fo •
rem as suas sementes , tanto mais excellente será o
seu fructo. Dão-se muitas castas de arvores > e tal-
vez será o maior número , cujos fructos , sendo no^
vas , pela maior parte são desenchavidos , ou o sen
gosto he muito menos delicado , que quando são
imi% ânnosasj ou tem avançado maior idade. O fru-
P cio
■M
C 2a6 )
fito da Nogueira nova he grande , mas asuacento e
insipido , mas avançando em ida !e , diminuem as
nozes o seu tamanho , e o seu gosto se augmenu
no agradável. Observa-se cm outras muitas especas
hum semelhante progresso , e não he improvável que
os CaíFeseiros nos hajão de dar também hum igual
exemplo destas propriedades. He certo que os Ca-
feseiros antigos dão hum fructo menor ^ e talvez
que algum paladar delicado possa descobrir o seu
i-ibor proporcionalmente melhorado. Póde-se recom-
inendar esta experiência aos Granjeiros do Café das
no sas Ilhas. Ora eu não tenho tempo para esbo-
çar todas as circumstancias que tendem provavel-
mente a diminuir o valor dos nossos próprios Ca-
fesaes.
Apresso- me a passar para outro ponto , o qual
porá os nossos granjeiros de Café na figuia de ven-
cerem todas as difficuldades , e os obrigará a se ap-
plicarem á cultura desta p'anta , a curarem o seu frii-"
cto, e remetterem-no no mais alto ponto de per-
feição possível. Quaes serão porém os meios , pe-
los quaes os Fazendeiros das índias Occidentaes se
hajão d' interessar na cultura do Caieseiro , de tal
sorte, que o seu fructo possa ciíeear em gosto, e
síibor ao da Ásia , quanto for possivel ? Pôde se r t
esta Fazer o seu interesse que he resposta a mais
breve que se pôde dar » a qual equivale a est* ou-
tra , aiiiiuar a Jiia importarão,
£s-
C 227 )
Estou muito bem informado por huma pesso»
íntelligente nesta matéria , que os direitos , e alca-
vallas do Café de nossas fazjsndas são as seguintes.
L. S. D,
Direitos do Café nascido nas fazendas
Jnglezas para o consumo domestico, vem
a ser Dor 1
1. 1 } s. 61- d.
Por cem de pezo que he quasi por
arrátel.
Alfavala - ^ a arrar. - - - P
Total por arr. 91 10
Quando se impõem huma tão excessiva carga
de despezas , como também de muitas difficuldades
sobre o plantador , carregador , e , por consequência,
do consumador do Café das índias Occidentaes , não
se devem admirar que os próprios Fazendeiros hajão
mui pouco cuidado de se applicarem á sua cultura.
Actualmente se dá mui pequena differença no pro-
ducto , e por consequência no preço. Os altos di-
reitos são também os impecilhos do seu uso entre
nós. O Café geralmente he máp , como taisbem
o seu preço em proporção.
Este descoroçoamento os faz menos cuidado-
s.os a seu respeito. Ruim como pode ser produzi-
do , encontraria consumadores forasteiros , e huma
venda cer$a corresponderia ao seu fim , .melhor que a
P ii cul-i
I
s -
( 228 )
cultura cuidadora d' hum género empachado com se-
meihantes direitos.
Os que- conhecem o gosfo ào Café de Moca,
e appetecem usar do novo das índias Occidcntaes,
presto o abandonão com di^gosto. O Café das JJhas
Francezas , sendo de hum producto mdhor que o
nosso próprio , acha clandestinamente os no-^sos por-
tos abertos, usa se a^sás , e o juhjo igual ao da
Turquia. Talvez que o gosto seja mais hum eff ei-
to do costume , que geralmente se toma. O Taba-
co he a prova mus forte , e a primeira que nes-
te momento me occorre. Aquelle , que a el!e se
não acostumou , lara vez pôde aturar o mais deli-
cado.
S'e os direitos, e alcavallas sobre o Café fo-
rem diminuidas , o seu consuu.o será augmentado.
O gosto se empenhará pelo melhor ; este será pes-
quisado , e o seu preço se augmeníará á propor-
cão; mas os direitos actuaes sno ounsi prohibitivos.
Seria justo que os eíTeitos d' hum semelhante di-
reito fossem vistos pala luz politica. Falio relativa-
mente a este artigo.
Nestes cem aniios , ha toda a probabilidade que
o povo de^te Paiz haja , pelo menos como hum
alimento, de fazer uso do Chá, Cafc , Chocolate.
Eu fallo da generalidade. Presentemente o Chá to-
ma a dianteira. Donde veio que a sua historia ,
propriedades , e usos foruo tão completamente ex-
pos-
C ^29 )
postos que inteirainente ignoro que se possa dizei mais
ali';uma cousa a este assumpto.
Os Physicos tem , por muitas vezes , proposto
esta questáo : Qual seja melhor , se o Chá , ou o Café.
Talvez que a resposta desta questão tenha huma
única diíFiculdade. í^ão encontro que , quer os Chinsj
quer os Turcos estejão expostos a qualquer dos taes
efFcitos., que os sepáriío , pela falta de poderem fal-
]ar com precisão , que ainda hum lhes he maia noci-
vo que o owro. Deixo isto á expeiiencia dos indi-
viduos. O Caí^é he desagradável a huma porção do
povo, pelo fazerem réo de moléstias nervo^a^. O
mesmo Chá náo está innocente de semelhantes ac-
cusaçóes. Segundo as apparencias , como se à figura
humana fosse a pszar de tudo , tão felizmente cons-
truída, que cousas semelhantes tem menos poder de
affectalla que , a primeira vista , a força da imagina-
ção. As potencias animaes apparentemente são taes »
que , usando-se com alguma moderação , quasi se
podem conyerttír em seu proveito os principios op-
postos. Alguns bebem o Gafe immoderadaraente , e
condemrião o uso do Chá como nocivo , outros po-
rém pelo avesso. Tudo isto prova ,ap^íiei)o^;, co-
mo poucas pessoas são capazes de tirarem : próprias
illaçoes das experiências. -:
Eu julgo, que nem o Café , nem o Cha' pro-
duzem algum arrimo d' importância , isto he , cou'
tem mui poucas partes nutritivas 3 antes diria , que
el-
C»!0)
fcllcs são mais 6 vehiculo do nutrimento > que nií-
trimento próprio de si mesmos : o mais , que del-
Jes geralmente se pôde esperar , vem a ser , o se-
lem agradáveis , e mui pouco prejudiciaes. O u-o ,
ou coUume os tem adoptado a ambos , e somos
ros , os que os fazemos como ateis a nós me-çmos ;
« como servindo ao bem público , do modo que
podemos. A China que nos provê de Chá , está dis-
tante ; a navegação he longa , e perigosa ; o clima
nem sempre favorece aos nossos marujos : certamen-
te todas as viagens compridas são prejudiciaes , e o
clima mais quente o peior. Ora a toda a Nação ,
digo Nação Commerciante , que os seus cómmodos
dependem desta útil raça do povo , nós , como ami-
gos da humanidade , não podemos aconselhar o promo-
ver o co;isumo daquelles artigos , que se vão bus-
car com tanto desperdício , e estrago de vidas tão
úteis. A este respeito o Café de nossas piopriíis fa-
íendas deve ter toda a preferencia sobre o Chá :
a viagem he muito mais breve , e o seu risco mui-
to menor. Suppondo se então que o Chá e Café
são semelhantes relativamente á sua utilidade real ;
«lue hum não he inferior ao outro relativamente i
saúde dos corísumador^s : supponho do mesmo mo-
do que a desavantagem a respeito das lidas dos ho-
mens, seja igual , que , a pezar disto , o que realmen-
te não acontece. Aqui se dá huma differença essen»
ciai , pela quál se deve voltar a balança a favor do uso
mais
C 2ii )
mais geral do Café , vem a ser , o ser elle plantado
pelos nossos co vassalios , e pagos pelas nossas ma-
nufacturas. Pelo contrario o Chá se paga principal-
mente por dinheiro moeda. A quantidade de fa-
zendas Britânicas , que os Chins nos comprão , he
de pouca consideração» quando se compara coma
quantidade em ouro , e prata , sem o valor do cu-
nho CbuUion )
Os Chins nos comprão todos os artigos que
€lles podem voltar em seu provtito nacional , e tu-
do aquillo que os habilita ao melhoramento de suas
manufacturas. Além da seda crua , e alguns outros
artigos d' algum pequeno uso em nossas propriasf
manufacturas , e d' outras muitas cousas trazidas de
lá, nós podemos dispensar, especialmente, sendo
animado o consumo do nosso Café, Sejão os di-
reitos , e alcavallas , por exemplo , reduzidos á quar-
ta parte , se consumirá mais que o dobro da quan-
tidade que até aqui O consumo será maior , e os
fazendeiros acharião o seu interesse em cultivar es-
tas arvores com maior cuidado. Augmentada a en-
commenda , se augmentaria também o preço ; e co-
mo se enviaria muito mais ao mercado , e ant«s
se compraria o mais caro que hum d' inferior es-
pécie. Isto sei ia hum effeito certo do augmento das
receitas.
Ainda se dá outra consideração que tem o
inesmo peso , vem a ser , que a cultura do Café
pó-
(2jO
pode ícr levada a hum tal ponto , que possa fa-
zer subsistir os fazendeiros pobres , e alguns arti-
gos semelhantes , particularmente o algodão , com
ps-^ueno fundo de cabedaes , e sem despeza de mui-
tos escravos. O fa:endciro rico pôde demais fazer
assucar. A despeza de negros , gado , engenhos e
outros requisitos das fazendas d' Assucar he com-
prehendida. Se tiver alguma propriedade de terras ,
por hum ou outro meio se vé muitas vezes obri-
gado a vendelias a algum visinho mais rico, e mu-
riar-se para outro baino , menos desfavorável ás ^uas
a:tu;'.es circumstancias. Deste geito se despovoão
pouco a pouco as Ilhas de visinhos brancos. Isto
os indispõem para poderem subjugar dentro a in-
surreição dos seus negros , e também , para se op-
porem a qualquer invasão hostil , que possão ter
de fora.
A relação , Junta do Café , anticipa algumas
nofas , para fallar mais abundantemente , que em
GL-tras occasiôes , que lhe tem por muitas vezes
occorrido. O Escriptor desta breve Relação C sem
embargo disso) não esgotou todo o assumpto.
Descreve mui exactamente muitas circumstancias ,
fue tendem a fazer de menor valor o Café das
1 idias Orientâes que o Euroreo. Ke muito ver-
dideiro na sua observação acerca da differença da
cumtidade que se produz nos dififcrentcs terrenos,
C situações. He muito a propósito a coima , que
faz a«s Tnglezes pelo pouco cuidado com que o
embarcão para o Reino. Os Francezes immcnsa^
n:ente nos excedem a este respeito , e o maioF
preço , a que chega , se deve em grande patte ao
seu superior cuidado e meneio. Com toda a ardi-
leza accusa aos fazendeiros , e carregadores de con-
sentirem , por falta de attenção , de se carregar
no mesmo navio o Café com o rlium , e assucar
grosseiro , artigos capazes de lhe communicarera
hum ma'o gosto , que apenas se lhe pôde tirar
pelo fogo : tão penetrantes sâo os vapores , que
se levantão do rhum , c do assucar contidos no
porão do navio. Deve-se ajuntar tanto Café junta-
mente em hum lugar , quanto carregue hum navio.
Argumenta- se da mesma sorte : que o Café nas
Ilhas das índias Occidentaes não se pôde seccar fa^
cilmente d' huma maneira própria por ser o seu ar
muito húmido. Mas , havendo em todas as Ilhas
terras altas , se pôde levar o Café para ellas , para
o fazer seccar lá sufficieníemente.
Não se deve omittir outra circumstancia , è
vem a ser , que se usa logo do nosso Café, Aca-
so huma parte da excellencia do Café de Moca ve-
nha desta circumstancia. A Companhia das índias
Orientaes , manda cada dous annos hum navio úni-
co, Ke muito provável, que huma parte desta carre-
gação esteja guardada neste cálido , e secco paiz mais
de hum anno. Gasta seis mezes na sua viagem por.
mar
.A,.
C*i4)
mar a Inglaterra ; pôde- se- lhe conceder mais seu
ou doze mezes para passar as mãos > que o hão de
consumir. E defle modo se precisão dous para três
annos entre o tempo que foi produzido , e o do
seu consumo.
Muita parte da rHUcilagem , que , quando se
mastiga , faz a base do seu sabor , se melhora pe-
la sua demora , como na realidade a experiência o
confirma.
Além disso se podião dar muitos exemplos de
testemunhas acreditáveis (e com especialidade pela
relação do Governador Scott , junta á está carta , a
este respeito) o seguinte passou debaixo da minha
própria observação , e > até onde ella chegar , pódc
ser conclusiva.
Tenho hum presente feito de muitas espécies
de Café crú das Ilhas das índias Occidentacs : sen-
do bem sabido o quanto desejo animar a cultura
desta planta, pelas razões acima allegadas, deixei
alguma parte deste Café em hum lugar secco fe-
chado • o qual , faz hum anno , não tinha sabor al-
gum • e não prestava para o uso : sendo porém
agora experimentado, se achou ter- se melhorado,
ou ertiendado muito pouco. Se o melhoramento se
houver de fazer á proporção do tempo , que de-
correr » passado outro anno mais , será mui pcuco
somenos ao Asiático. He de muita consequência
sibér-se « se o Café deve ser embarcado sobr^ si
uni-
( 2jO
unicamente , oti se deve vir de compahhia com ou-
tios géneros , ou solitário ! Se se deve guardar ent
lugares húmidos , e armaiens não seccos , ou se em
lugates seccos , e em casas ventiladas , se se deve
usar immediatamente , ou ao depois de se ter con-
isérvado por algum tempo considfeiavel ? Isto he mui
digno do trabalho, e despesas do fazendeiro , con-
servar o seu Café nesta Ilha d' hum p>fira outio an-
ho até obter huma lai quantidade , quer esta seja
do seu próprio , quer trazido d* àl|um dós lugares
dos seus arredores , que seja sufficiente a fazer a car-
ga d* hum navio pequeno , marcando as suas dine-
Tfentcs idades. Mas ò total desta acçao depende do
Governo , diminuindo os direitos , para augmentar
o seu consumo , e embaraçando o contrabando , ou
passagem por alto : habilita a muitos brancos a ga-
nharem o seu confortativo alimento , e â serem
jpagos por liossàs manufacturas. Como quer que el-
U seja plaritado pela liossa piròpria Nação , trazido
com menos risco da saúde , e vida da gente dò
ínar , examinados á liiz politica , certamente deve
íherecer huma favorável deliberação da legislatura*
O Café feito pela maneira seguinte he mui
agradável a muita gentfe , e merecfe toda à prefe-
rencia ao Chá , óií ao Café feito pêlo modo ordi-
nário para o alrhoço, Faça-se o Café pelo modo
ordinário huma tsrça parte mais forte. Ãccréscentê«
sè-lhc hite , quando muito , quente , antes que se
ti-
s .
tire do fogo a agua, deixe-se sentar, beba-se com
creme , ou nata , ou sem eljc , como lhe for mais
agradável. A gente pobre , e meam se disporá a pro-
curallo , e será muito mais nutritivo , e benéfico
que a miserável bebida do Chá muito ordinário ,
com que se acaritião. Deve-se usir de muito pou-
co assucar no Cafc ; fazendo-se doce , he arriscado
a azedar-se nos estômagos débeis ; e por esta sin-
gular razão muita parte do povo evita a bebida do
Café. Eu náo intento pôr esta questão importan-
te Qual seja preferivel o Café , ou o Chá ? A sua
resolução deve ser deixada á experiência dos indi-
víduos. Quanto a mim se me deve permittir fa-
xello evidente.
Quando tomo Chá , acho que nao satisfaz fa-
voravelmente á minha saúde por algumas circum-
stancia?. Eu escolho o Café , feito da maneira aci-
ma mencionada , e uio dclie por muitos annos cons-
tantemente sem leceber do seu uso o menor in-
conveniente.
Requer-se hum bom fundo de conhecimentos
physicos para determinar como haja de ser bom o
costume , que tem os Francezes , de tomarem Café
logo que acabão de jantar j mas entendo cuc se-
não deve disputar , qual dos dous será então me-»
DOS ruinoso á saúde , se hum copo de Café , ,ou
buina garrafa de vinho.
Com tudo Julgo que he menos nocivo beber
Ca-
( ^n )
Café immediatamente depois de jantar , que mais
tarde , ou á noitesinha , e pelo menos por huma ra-
zão que facilmente se descobre.
O Café certamente promove muito o innio ou
vigilia , ou por outra , a inclinação a dormir. Pa-
ra aquelles , por tanto que deseião não ser tão su-
jeitos a esta inclinação , o Café indubitavelmente
he muito melhor que o vinho , e talvez , que to-
do outro liquor.
São mui numerosos os exemplos das pessoas ,
ás quaes o Café tem sido antisoporiíero. Da outra
parte são igualmente numerosos os exemplos das
pessoas , ás qiues o vinho tesn causado os effei-os
oppostos. ^
He mui hypothetica a opinião que attribue a
vivacidade dos Francezes , ao depois de jantar , a
esta bebida Mas acho ser bem sabido que , ao de-
pois de huma comida larga , talvez de carnes gros-
seiras , na realidade na razão de mero diluente de-
ve ser preferido ao vinho , o qual , no entretanto
que dá huma fluidez temporária aos espiritos ani-
maes , mais depressa se oppõem á aquella necessá-
ria assemelhação que a natureza faz pontaria , ou
deseja nos officios da digestão.
Parece muito provável que , substitui ndo-se o
Café ao depois de jantar immediatamente a huma
garrafa , se tiraráó muitas vantagens , assim para a
saúde ào individuo , como para a geral economia »
-■i.--
c não me parece mer.os provável , pela bebida d<H
Café tão larga , co;tio usualmente praticada , que
nós interrompemos a digestão , e accr«scentamos hu-
ma nova carga de mattriM sobre a cue já se zeha
no estômago , que , ao depois d' huma larga comi-
da , não hc huma cousa indifferente.
Pçlo contrario , se eu posso ter opinião sobre
assumptos desta natureza , não posso deixar de pen-
sar que o uso do Chá ao depois de jantar no tem-
po ; e do modo que geralmente se pratica , he mui-
to mais prejudicial a muitas pessoas , e se muitos
tem escapado sem exper montarem alguns effeitos
prejudiciaes , cHei podem justamente attribuir á
firmeza de sua constituição , eu quasi hia a dizer,
á sua boa fortuna. Esta ipateria , a n.eu vér , he
€apaz de muitas disputas , e tanto mais , que de
parte a parte podem haver pequenas distincçóes ,
que se podem trazer a favor de cada huma delias.
Não posso com tudo concluir estas adveiten-
cias , sem resumir a substancia do que desejo in-
culcar j que relativamente ao seu real uso , como
huma parte do nosso alimento não tenho razão al-
guma evidente, que me persuada a julgar que o
Café seja inferior ao Chá.
Que relativamente a nacional economia , o pro-
veito das nossas Colónias , e as viifts dos nossos ma-
rítimos , são circumstancias que concorrem a dar a
preferencia ao Cjfé. Ell<? ie cultiva pelos nossos co-
vas-.
i
( 2J9 )
vassAlIos , he pago pelas nossas manufacturas , e o
seu rendimento ultimamente vem para a Grã-PirCf
tanha.
Que os altos direitos , e alcavalla$ são verda-
deiros obstáculos a hum mais amplo uso do Café,
Que , diminuindo-sc estes direilos , sem que
por isso se hcuvesse de diminuir o seu rendirpen-
to : porque o contrabando se desacoroçoaria. O con-
sumo se augmcntaria de modo que o Erário não
sentiria diminuição alguma.
Que se deveria procurar que os Granjeiros des-
ta planta houvessem de a cultivar com cuidado es-
crupuloso , para que ella podesse ter huma melhor
sahida nos mercados.
Que , como podem dispor a poucos Granjeiros
a que subsistão unicamente deste granjeo , ou cul-
tura , &c. se poderia augmentar pelo seu número
a sua força com o das outras Ilhas : porque os Eu-
ropeos podem soífier o trabalho que se requer pa*
ra a sua cultura.
Ajunto aqui hum papel » que me communi-
cou o Governador Melvill , cujo indefesso traba-
lho em promover os interesses da Grã-Bretanha ,
e de suas Colónias , merece hum público agrade-
cimento , c reconhecimento , e também a cópia de
huma Carta , que á muito tempo recebi de Scott,
ultimo Governador de Dominica. Estou altamen-
te capacitado que cjtas demonstrações , tão eviden-
tes 4
( 24C )
tes I devem merecer ao público alguma considera*
ção , e fazer-lhe al.^jm peso.
Julgando-se que alguma parte das navertencias,
que dou , em raião de amizade , pjde contribuir
para proveito , ou bem commum do público , quei-
xa este ujar delia livremente , conforme julgar > que
mais lhe convém.
Assignado (T. Fffthcrpll.^
OBSERVAÇÕES
SOBRE O CAFÉ
Fdr hum douto » e experimentado Fazendeiro em
Granada , commun içadas ao Doutor Fothcr^ill
pelo Governador MeívilU\
M
UiTAS pessoas na Europa irhaginãõ qiíe nas
nossas Ilhas se pôde colher hum Café muit© me-
lhor que aquelle , que actualmente delias nos vem.
Não se duvida que isto assim s«ja , c o? seus vizi-
nhos o conhecem muito bem ; mas o sobrepujsnte
motivo ào interesse lhes embaraça diligenciar me*
ihor o rendimento desta planta*
São instruidos pela experiência , que huma ter*
ra solta , sccca , e as encostas , ou declives levanta-
dos produzem Café , de huma baga mais pequenaj
e de rtielhor e mais delicado sabor ; e que o Cafe-
seiro nascido em lugar raso , fértil , e terreno hú-
mido he máo , a baga grandtí , chata , c quasi de-
senchavida.
Também a experiência lhes tem ensinado , que
as arvores plantadas em hum tal terreno , produ-
icm de li a 16 onças de Café por cada planta »
e que nos terrenos d' outra natureza apenas dão mais
do que 6 até 8 onças : O que em razão do peso
faz huma differenca da anietade. Presentemente ení
q Fran-
( 242 )
França , Inglaterra , e nas demais partes dos merca-
dos d' Europa a única diffcrenca determinada no
preço entre este Café pequeno , e bem preparado,
e o da grande ou o da peior casta , ou qualidade
lie de 15 até 20 por cento. Consequentemente os
vizinhos desta Ilha , achão maior conveniência em
estabelecer as suas granjas desta planta em hum ter-
reno m.ais rico : c as pessoas , que tem o pequeno
e delicado Cafc , são aquellas , que possuem ter-
ras más , e nío tem hum sufficiente número de
braços > ou escravos para o menear , e benefi-
ciar.
He fácil de se fazer este cálculo : com hum
igual número de plantas se produz o dobro do seu
peso , e pela differença do preço somente se per-
de , o que vai de 15 para 20 por cento. Por con-
sequência e inteiesse tem embaraçado aos nossos
Granjeiros de cuidarem mesmo na cultura daquella
espécie de Café , que tem hum maior valor na Eu-
ropn. A differença do preço , entre as varias sortes
de Café , podia ser contemplada para os mover á
própria emulação entre si , como acontecco entre
os cultivadores das differentes castas do Assucar.
Poder-se-hia accrescentar á estas considerações,
que n* hum terreno fértil durão muito tempo , e
náo neçessitão ser transplantadas tco repetidas vezes.
Algumas pessoas atiladas se deliberai ao n rea-
lisar o methodo dos Árabes , pelo qual toca a pre-
par
C H! )
paraçíío do Cafc em duas cousas , a primeira em ô
lião colherem , até que ellc não esteja perfeitamen-
te maduro , a segunda em o seocarem á sombra >
tirando-Jhe primeiramente a carne , ou polpa.
A ultima destas rsra vez se faz possível j por-
que , além de ser o ar muito quente nestes cli-
mas , he constantemente tão húmido , que sabemos
por experiência , que o Café nunca se pôde seccar á
sombra sufficientemente , para ser exportado para a
Europa,
A primeira pode ser mui proveitosa , e he real-í
mente possivel , se outras pessoas , e não os ne-
f ros , fossem empregadas neste trabslho , os quaes
sendo preguiçosos , ignorantes , e geralmente de má
índole , ou não podesn , ou não querem cuidar nes-
te particular j e não tem outro desejo mais do que
acabar o seu trabailio com a maior presteza , que
podem , ou para ficarem livres da tarefa , qwe se lhe
impôs , ou evitar o castigo , se a não completarem.
Além disto , a estação de se colher o Café he pró-
xima ao invern.o , as chovas , cue neste tempo são
mui frequentes , fazem cue as bagas muitas vezes
caião sem estarem perfeit mente maduras.
Segundo o que diz a Kisíoria , o nosso Café
provavelmente tem a sua origem no de Babejman-
del , donde nos veio. A primeira arvore trazida á
r<Iartinica em 1727 ou 2% por M Delieu , foi ti-
rada do Jardim de S, Ma5:estjde Christianissima , e
t
■■í
( ^44 )
era da mesma espécie do de Batavia. Esta arvore
foi plantada junto a Portoreal cm hum terreno hú-
mido e muito fertiJ , e quasi no mesmo livel ào
mar , e por isso , pôde ser , que esta espécie se
haja de ter necessariamente muito degenerado.
Toda a classe baixa do povo em Martinica ,
antes do tempo da sua introducção , cultivava os
cacauseiros , mas hum contagio . segundo contão ,
difficultou a sua cultura . e por hum effeito geral
acabarão todos os cacausaes em 1727. Os vizinhos
meio arruinados , ao depois de terem havido mui-
tos projectos , por fim se resolverão ao granjeo do
Café , e a Companhia Oriental Franceza , tendo abai-
xado os direitos á sua cultura , foi animada.
Geralmente os Francezes usão no seu trans-
porte de muitas maiores cautellas , que não prati-
cão os Inglezes. Elles o embarricão em cascos mui-
to seccos: nas Ilhas de Sotavento, onde se prepá-
ra o melhor Café , o navio não carrega assucares
mascavados . e menos cachaça , ou agua-ardente. So-
mente exportão com elles assucares brancos , que
pouco damnificão esta semente. Também os Capi-
tães cuidão muito em pôr entre cobertas , ou em
algum outro lugar do navio que seja muito secco.
Os Inglezes porém » pelo contrario . o assucar mas-
cavo . a agua-ardente , o Café , tudo a barriseo , ou
misturadamcnte em qualquer parte do navio. Isto
faz
( 245 )
fsz hum prejuizo considerável ao Café , que se põem
próximo a elles.
Ainda se dá outra causa mais remota , que
poucas pessoas sabem , mas que contribue muito
para a ruindade do Gafe , que se exporta para In-
glaterra.
Fretâo-se muitos navios Ingle?es para carrega-
rem , os Capitães arrumao as cargas pela ordem ,
com que as recebem ; e os carregadores , ou donos
se dão por satisfeitos, enchendo bem os navios.
Para elles he hum ponto de pouca importância o
arrumar bem ou mal taes géneros j ou se elles se
deteriorarão , por se arrumarem huhs junto dos ou-
tros. Os navios Francezes geralmente carregão por
conta de seus donos , os próprios Capitães comprão
os géneros por conta dos mesmos , e , por isso , são
mais capazes de fazerem huma exposição da sua con-
diicta a este respeito , e a darem provas de terem
obrado com prudência e cautella , porque , não sen-
do assim , íicão responsáveis a dar huma conta ex-
acta da sua economia , ou meneo , e aprovar que el-
les obrarão «om prudência , e cautella ; pois são obri-
gados a cuidar escrupulosamente no arranjo da carga
dos seus navios , e em resguardar a sua carga , a que
não receba avaria. Segue se disto : que o Café se car-
rega muito melhor para Franca , que para Ingla-
terra.
EXi
C 246 )
E X T Pv A T o
De huma Garra de Jorge Scot , Tenente Go-
veixnador de Dominica ao Doucor
Forhergi!!.
Ilha Dominica na Casa do Governo aos
2 1 de Novembro d,; 17Ó5.
S e n Ii o r
XVI « — Certo Fazendeiro abastado de Granada ,
SFortando nesta ijha de passagem para esse Reino
no decurso da sua communicação me informou dos
vossos esforços p:.trioticos , em procurar o aug-
mento dos productos destas nascentes Colónias . que
ultimamente nos forao cedidas pelos Francezes , e
tendo hum grande desejo de concorrer com a mi-
nha pequenhez , para o adiantamento dos vossos nu.i
louváveis trabalhos , tomei consequentemente a li-
herdade de metter a bordo do navio Neptuno , de que
he Capitão Edmundo Stevenson , encarregr.do a ;.I.
Eeats de Londres , em huma caixa , dirigida por nós
jn^smos , três pequenas saccas de Café , as quaes me
íareii o favor de acceitar , não como cousa denodada,
{)çm que não tenha eu a honra de vossa amizade , mas
CO-
C 247 )
como unicamente applicada para qualquer experiên-
cia , que julgardes próprio a fazer delle.
O da pequena sacca marcada N.° i , foi colhido
em o anno de S760 , o da que vai marcada ]N.° 2 em
17 6 j , e o do do N.'^ 5 o anno passado. Todos são na-
turaes desta Ilha, que se reputa produzir o melhor
Cafc das índias Occidentaes , menos ao da ilha de
Fjari^alante , e o do lado Occidental da ilha de
Martinica , em os montes oppostos á Rocha do Dia-
mante , a cujo Café dao os Francezes sempre a
preferencia , ainda que os moradores da mesma pre-
ferem o seu próprio , de que usão nos seus almo-
ços , tomando-o com igual quantidade deleite fer-
vido fou fallando com maior propriedade) com lei-
te fervendo , ou escaldando , e ao depois de jantar
commummente tomão hum copo , mas sem leite ;
e o-eralmente írozao de boa saúde , e de huraa bel-
la delicadeza de espíritos , para esta parte do mun-
do. Sem embargo disto , os vassallos Inglezes , aos
quaes he diíficultoso despirem-se de prejuizos , ain-
da persistem no uso do chá , e ainda que tenháo
huma boa consistência de saiide , náo parece que
po^suão araetade da viveza , ou esperteza igual á
dos Francezes , que vivem na mesma Ilha com«
nosco
Quanto a que se diz : que em Inglaterra mareão
o valor áo Cafc pela proporção da sua pequenhez ,
e peh cor verdoen^a do seu grão , aqui pelo con-
tra-
í
( 24S )
trario nem huma cousa , nem outra , isto he , o
tamanho , e a côr , quando o põem em seu próprio
uso ; e só sim á proporção do tempo , em que toi
colhido, e que o tem bem guardado em hum lu-
gar secco e quente , e exposto ao ar três ou qua-
tro vezes no anno j e conforme dizem , o maior
número de annos que elle tem sido guardado do
modo , que se acabou de dizer , o faz ainda ser mui-
to melhor. Também attribuem , como hum grande
fundamento da sua exceiiencia , ao methodo co;n
que o prepárão ; pois sendo muito torrado , adqui-
re hum máo amargo, e gosto de queimado, e se
o não torrão , o que basta , ainda que o Café te-
nha a antiguidade de cinco ou seis annos, adquire
hum saber , como o daquelle , que foi apanhado no
mesmo anno ; mas , sendo antigo , e bem torrado,
c immediatamente abafado na Cafeteira , cu copo
sobre o fumo quente , para evitar que as delicadas
partículas voláteis , e sabor se não evaporem ; se
quando moído se faz propriamente com boa agua
fervendo , se reputa estar no seu mais alto grão
de perfeição i a classe melhor dos Francezes , em
toáas as Ilhas prat/ca tomar hum copo com partes
iguaes de Café e leite fervendo , com huma costra
de pão quasi ao mesmo tempo que se Itvantão da
eama pela manhã. A razão , que dão rara este uso ,
he a seguinte , que elle aclara os miollos , aviva
OS sçiitidos, alimpa o çstonu^o , despenha algiima
rcu-
Ç 149 )
reiima , oii matérias fortuitas , que podem estar alo-
jadas peito da cabeça, estômago, ou bofes, do
máo ar , ou vapores pútridos. E do mesmo modo
dizem que preserva da pedra * e a cura totalmen-
te. Os Turcos também fazem huma grande esti-
mação do Café bom , expondo as suas qualidades
vivificantes dos espíritos animaes. Certamente por es-
te principio se deve preferir ao chá , que algumas
vezes causa effeitos mui contrários , e por muitas
formas differentes ; e na minha fraca opiiiíão só pre-
cisa , por ser hum dos melhores almoços nesta par-
te do mundo , para onde passa , ou arriba muita
honrada e valerosa gente da anuviada , ou nevada
Ilha da Grã-Bretanha , onde hi-ma semelhante raui-
tidao de melancólicos accidentes provem de hu;n
abatimento dos espíritos. Mas precisa-se averiguar
melhor que effcitos facão nos corpos , ou nos es-
piritos as duas célebres bebidas do Café , e do chá
por aquelles , que fizerão o seu principal estudo e
profissão no conhecimento da economia do corpç
humano , tendo sido a minha a das armas , e pre-
sentemente no do Governo desta Ilha : de donde
vos remeíterei com gosto , todo o Café , de qual-
quer sorte que for, que carecerdes para o vosso pró-
prio uso , pelo tempo da minha existência aqui por
ser, ainda que não conhecido por vós, muito
vosso obediente , e humilde servo
i^ssignado Qor^e S^oti.'}
O
p. s.
o methodo de curar o Café nas índias Occí-
dentaes , he passando-o pelo engenho ao depois de
estar maduro , e ser coJhido ; e feita esta opera-
ção , se lança em tanques , e se cobrem d' a^ua por
IO ou ift horas, até que a sua polpa se solte , ou
separe , então se lava , e o Café , que fica nas suas
lascas se amontoa , para suar , e para enxugar a
íigua por dous ou três dias mais , e então se assoa-
lha , ou estende ao Sol , e , seccando-se , se deita em
pilões , ( vasos de madeira côncavos ) , e com mãos
se pilão , até que a pellicula , chamada pergaminho,
se despegue , e se aventa ou joeira , e se torna a
pôr ao Sol até ficar cabalmente secco , e se con-
duza ao mercado. O Café , que vos remetto na pe-
quena sacca N.° j he huma certa quantidade , que
consegui dos cultivadores , o preparai lo á maneira do
de Moca , o qual , segundo as informações , que
tenho , he fazendo-o resuar , e seccar á sombra , de-
pois de se ter passado pelo engenho , e que , a
r. eu ver , deve ser preferido infinitamente ao en-
sopado d' ngiia , e secco ao Sol , o que certamente
ha de fazer perdtr grande parte das suas virtudes ,
e cualidades , e, com especi^diJ ide , a^.uelle cheiro
t;<o uelica.io , que t^c^m , que he tão a-radave! ao
ojiaio, lo^o quando se bota i^.as taças. Creio que
acha-
achareis est.-i pequena sacca muito boa , ainda qiis
náo tenha mais de déz mezes de curação , e se for
bastante para isto gnavdallo por três ou quatro an-
nos , se fará perfeitamente exceliente : no tocante
a CNte methodo , deve certamente ser o niclhor , e
eu me teniio esforçado a persuadir a muitos fa7en-
deiios o seguir este caminho , mas a grande despe-
za , que se precisa fazer em edifícios para os abri-
gar do Sol , e da chuva , no tempo em que se cu-
ia; o grande trabalho que causa, e tempo que le»
va , em. o curar pelo methodo da Arábia , o pe-
queno preço que actualmente va] , não consentirão
que elies prosigão avante por este caminho: sem
embargo de tudo , estou plenamente convencido que
o Café destas Ilhas he tão bom , quando cahe da
arvore, como qualquer da Arábia, havendo de ser
curado pelo m.eíhodo que ella pratica , o qual não
duvido que os fazendeiros , ou Granjeiros , a finai»
venhão adoptar , se subir o seu preço , que os h^*
ja de esTorçar a procuraUo.
Cãr"^
V -^'
( ^5* )
Carta d' hum Mercador de Londres a J. ElJis
Esc. F. R. S. Agente de Dominica.
Sept. 4 de 177J.
Charo Senhor
X Enho ouvido com prazer que vos preparaes a pu-
blicar algumas observações sobre o Café , pelo fim
de promover neste paiz hum maior consummo que
o que geralmente se faz deste estimável artigo de
nossas Colónias.
Conceituo que os nossos fazendeiros das Ilhas
Occidentaes encontrarão no vosso trabalho , que vai
a publicar-se , muitas fontes para o meliioramento
da qualidade do seu Café.
Mas encarecidamente vos ro?o , que me hajaes
de consentir o dizer-vos , que he baldado procurar-
se o augmento deste commercio , em quanto os di-
reitos , ao depois da sua exportação , continuarem
a ser tão immoderados.
Com isto não pertendo desanimar-vos : por
quanto , se os tempos são desfavoráveis por ordem
á reducção , ou diminuição d' alguma taixa , confio
que algumas Personagens illustres , occupadas na Ad-
ministração , patrocinarão huma medida , sem se fal-
tar á justiça , como o bem commum da sociedade
fcquer. Faço conceito que o caso , ou acontecimen-
to ,
(25» )
to , he desta naturcTa» Occorrem-me que estes di-
reitos forão determinados em tempo , que a cultu-
ra do Café era totalmente desconhecida nas nossas
Ilhas -, e cue , para o seu consummo , todo elle vi-
nha da Arábia. He provável que então o sobrecar-
regassem pela contemplação que este género era
meramente hum artigo de luxo , e não de necessi-
dade. Mas a«;ora estas circumstancias se tem mwda-
do sobejamente. As Ilhas , cujo domínio nos ficou
pertencendo desde a ultima pás , e em particular a
Dominica tem grandes Cafesaes , e os seus fazen-
deiros , e granjeiros se tem adestrado muito, e mui-
to na sua cultura. Elles provém o seu presente con-
summo , e podem além disso enviar alguma por-
ção. Sei que á poucos annos se levantou a alcaval-
Ia nos Cafés forasteiros pelo íím de se animar o
das nossas Ilhas Britânicas. Mas deixárão-se os di-
reitos , e alcavallas , que pagavão os nossos próprios^
como antes , que são tão immoderados , que pri-
vão o povo mediano , e commum , que singular-
mente faz hum grande consummo do seu uso. Pa-
rece-me , que os Francezes a este respeito entende*
rão melhor que nós o seu interesse. O seu Café
pois paga hum mui diminuto direito , e o nome
do Chá rara vez se ouve entre elles.
Pode acontecer que este artigo seja neste paiz ;
do mesmo modo que o Chocolate, mais caro que
O Chá, pelos seus desproporcionados, e enormes di-
teu
5 <•
( 2>4 )
reítos , os qiiaes não sendo assim se comprariSo ba-
ratos , e provavelmente seria este hum gra:)de meio
ou medida , para seiíilo levar o ^.o^so ouro , e pra-
ta para a China. !sto só se poderia evitar, sub^ti.
tuindo outro liij:<or social . c rtfrhcrante em vez
do Chi O Café , e o Chocolate são seus rivaes
natos , e per tendem , com toda a vcrcscinelhança ,
alçar-se com a superioridade , se o governo con-
viesse em contribuir para as necessidades do Estado
com alguma proporção , e moderação, ft/as na oc-
casião presente he exacto, e unicamente o que Ijies
deiTÍba , e balda a pertensão , e rivalidade Eu não
vacilio em julgar por cousa pasmosa , e estranha ,
que o3 géneros , que podem produzir as nossas pró-
prias Colónias , hajão de pagar hum maior di.ei o
que as producçóes dos Chins , cujo lu^ar elles , a
não ser isto , poderião supprir muito bem Vós talvez
julgareis que eu me engano no que digo. Eu pro-
curarei provallo de hu;r<a maneira tão clara , que
não só vos haja de convencer , mas ainda a toda
aquella pessoa , que não for muito acostumada a re-
flectir.
Para isto preciso construir o seguinte plano ma-
terial do fp.cto. Kuma oitava parte d' huma onça
de Chá , que vem a ser , huma colherada , commum-
mente se usa para almoço d' huma pessoa. Com es-
ta quantidade se gasta em ^2 dias a quarta parte
d* hum arrátel , a qual , não contajas as quebras ,
«e
(255)
se pode tomar por hum mez » assim em razão des-
te j como dos outros artículos , de sorte que no
seu total não haja differença. Kuma quarta parte
d' arrátel, por mez, dá trcs arráteis por anno.
Avalia-se que a quarta parte d" huma onça he
commumniente necessária para humn boa taça. Pó-
de-se muito bem suppôr que , quando pouco , se
gastáo em hum almoço três taças iguaes. Para evi-
tar objecções , conto só duas , as quaes requerem
meia onça de Café , que vem a ser quatro vezes
o peso do Chá , consequentemente hum arrátel por
mez , e doze no anno.
Informárão-me que he ordinário rcpartir-se
hum páo de Chocolate em pequenas divisões , das
quaes oito fazem a quarta parte d'hum arrátel , pa-
ra se fazer huma taça. Precisão duas , pelo menos
para hum almoço , que terião da peso huma onça,
o que oito vezes mais que o Chá , c o dobro do
peso do Café. Gastar-se ha por consequência no mez
dous arráteis , e no anno vinte e quatro.
Disto se faz claro que , se o Chá , sendo car-
regado com direitos , e alcavallas , sobe de 28. loi.
d. por arrátel , que he o caso , actualmente se pôde
mostrar que torrado o Café , cuja quantidade qua-
tro vezes mais he necessária para encher as mesmas
indicações , deva pagar mais huma quarta parte da-
quella somma , que vem a ser $ d. e 1 ths por
arrátel , e o Chocolate huma oitava parte , sendo 4
d.
Ç Í50
á. è A_ ; se se devein continuar a pa^ar dó Cate ^
antes de ser torrado , ou ustullado ; porque então
deve ter huiiia quarta parte menos , do que men*
cionei , porque perde do seu peso, torrando se , em
Ií2 arrat. 24 arrat. A perda do peso do Clioco-
late he igual a 18 arráteis em hum cento.
Concedendo-se isto , o<: direitos do Café tor-
rado se poderiáo reduzir a 6 e 1 d •, o Chocolate
não devia p^r^ar mais que j i em vez de J j 5. ó d.
por cem : compreiíendendo a fazenda do Café , e ca-
sa d* Alfandega , o Café não deveria pagar mais aue
4. d por arrátel , e 10 , e 6 d. por alcavalla 5 por
tudo 22 d. , e isto d<rveria ser ao depois de terra-
do , que ficão então 112 arrat. reduzidas a SS ar*
rat. ; e 22 dinh. do direito antigo he no ultimo
Desembarcandô-se o caca'o , papja-se 11 s. e 1 1
e i d. por cento, que vem a ser li por arrátel,
e B alcavalla no Chocolate, quando feiro em páos
he 2 s. 5 d. mais por arrátel. Consequentemente
os direitos sobre hum arrátel deste artigo são qua-
si os mesmos que sobre o Café , ainda que se re-
queira para hum almoço o dobro da quantidade.
Os direitos do Chá são os seguintes , 2 5 por
cento ad valorem , pagos pela Companhia das ín-
dias Orientaes , e oulro tanto pelo comprador , fa*
zendo hum e outro 50 por cento , e que no arren-
damento avaliado de Chá he 22 e i- por arrátel ;
por-
( íW )
porque , conforme a melhor informação que pud'
ter , dos do Chá j soldos 9 d. he o preço médium
da venda , as sortes de preços altos como o hyson»
c o Souchon não chega a huma decima parte da
importação. Além dos direitos mencionados acima •
ainda se dá i soldo por arrátel de alcavala , ao to-
do 2 soldos lOT d. por arr. cm 3 s. 9 d de valor que
vem a dar em 18 por cento. Quando a fazenda de Ca-
fé , que he avaliada em 15 d. ainda que na realidade
se venda por 6 d. , e o Chocolate , que se appro-
xima ao mesmo valor , paga 2 soldos $ d. por ar-
rátel , que he 480 por cem.
Julgo que não preciso provar mais» o que dis-
^e sobre os direitos , e somente o reduzir a hum
ponto de vista toda a somma , que o Governo re-
cebe de cada pessoa por hum consumo annual so*
bre o fundamento , que propuz.
For
( íi8 )
Por j arráteis de Cha.
I
7 =
?
-6fi
L. s. d. L, s. d.
Avaliado j s 9 d. por arrat.
iie - - - - ^ - o 11 j
O direito , e alcavala em 2 s. lo^ d.
monta ---------o 8 77
Em IS4 de Café não torrado, que sendo reduzido
a uso , «56 reduz a 1 2 arrat,
O 1.° custo em 6 d. por
arrat. he-----0 7
O supposto direito em 157 arr. e 64" d.
por arrat. ---------o
Em 29 4 arrat. de Cacáo , que fazem 24 artateis.
O 1.*^ custo de 29J arr. e 1^ 1
6 d. por arrat. > he J
Cs suppostos direitos até aqui em 3 e 1
por arrat.- -_------ 0—8—6
Os direitos pagáveis ao presente de algumas quan-
tidades dos dous últimos artigos , sendo assim
Em 1 5 1 arrat de Café não torrado igual
9 12 arrat. sendo próprios para
em I arr. 1 ] s. 6;^ d por centi
he 4 d. por ari^t. - -
Alcavala no mesmo em 1 s. 6 d. por arrat. 1 2 10
5 iguaU
o uso (
\0 que (
1 7 114-
Em
C 2?9 )
Em 29 arrat. de nozes de Cacáo em 11
s. 1 d. por 100, que he li d. por
arr. -------*--- oj
Alcavala nesta quantidade feita em Cho- 1
colate , produz 24 arrat. em 2 s. /• 2 14
j d, por arr. ' -^
2 17
Creio que a qualidade do Café das índias Oc-
cidentaes pode ser muito melhorada, se os Faren-
deiros forem animados pelas grandes encommen-
das , ou pedidos da Europa. Huma das grandes razoes
da sua inferioridade ao de Moca actualmente lie :
que os Hollandezes e Alemães , póde-se dizer , que
são os únicos compradores , tem huma inexplicável
attenção á cor : pois elles preferem , o que tem
huma cor esverdeada , á luzidia , e para ter esta qua*
Jidade , precisa que o Café seja novo. O Fazendei-
ro , tendo rara vez outro mercado , se vê na obii-
gação de se conformar ao seu gosto , e se apressa
cm remetter o seu Café ; o qual embarcado pôde
muito bem arder, pois na realidade não teve tem-
po para perder o seu máo sabor natural. Além do
que os preços , que lhe áão , são tão baixos que
o Café se tem por esta causa feito indigno do cui-
dado de hum Fazendeiro f e menos que o Go-
verno o não anime com alguma consideração , creio
, K ii fir-
C 260 )
íirmemcnte que será desaire igado de todas as Ilhas ,
e perdido o ne^jocio do Cat« para com a Nacáo.
Fdz dous aniios cjue os AJemáes o pagarão por
dobrado preço , mas tem concorrido diversos mo-
tivos , para lhe abaterem o scii vaior , e alguns des-
tes porem são de huma natureza momentânea , co-
mo são o alto preço do trigo por toda a Europa ,
as perturbações da Polónia ^ mas os outros são de
peior condição , e diminuirão o seu consumo.
Certificão-me que o Rei de Prússia lhe aug-
nientára os direitos de 5 c por cento ; e que o
Landrrave de Res.se rigorosamente vedara o seu uso.
Outras circumstanciâs desaniiT.ão , e desa:oro-
çoão aos nossos Fazendeiros , e vem a ser , qut; os
Hollandezes de ^urinam , e Bci biche tem pasmosa-
nicate augmentado o número dos seus Caíesaes ,
e com a vantagem d' hum terreno íertiiiosimo , e
as terras muito mais baratas , huma fácil communi-
caçáo por agua , e maior facilidade de cmp.estimos
dç dinlieiro para grandes emprezas desta natureza ,
e melhor disposição para continuar o commercio.
Também o Francez importa pasmosas qu:int idades
das Ilhas de Eourbon e I\l auri cia , onde compiao
baratos os escravos de Madagáscar.
Sem embargo de tudo isto , huma opportuna
interposição do Governo p6ie , :odavia , não somen-
te salvar os Catesaes de nossas Ilhas da ruina , ma«5
\àO bem exaltallos , pondo-os n' hum pc mais fló-
rea-
( .61 )
rente que ate nqui. N?fda mais he necessário para
isto . ciue rcsíLjhr os direitos com equidade • e se o
Cafc , e o Chocoh.te houverem de pagar direitos á
rroporcíão do Chá , julgo que posso affirmar que.
para o futuro , as rendas não serão diminuídas , to-
mando o primeiro o lugar do ultimo. Antes , pelo
contrario , como os p.oductos das índias OcciHen-
taes são pa:^os pelas nos.as manufacturas . o artista
industrioso , o commerciante , e o lavrador , em ca-
sa se disporão melhor , para poder pagar as suas tai-
xas. A lista dos artigos exportados nos mostrao a
cuantidade de empregos , que o negocio das índias?
Occidentaes fornece ao nosso povo , nos quaes qual-
quer se achará interessado a si mesmo ©U directa,
ou indirectamente.
Ainda accrescem outras consideráveis vantagens
da ccnnexão do Norte d' America , Irlanda , e Afri-
ca com as Ilhas , a^ora de maior consequência para
a Pátria mãe , o qual , para se traçar aqui , cem al-
guma precisão , requer tempo mais dilatado , do que
posso gastar prementemente , e me empregaria mui-
to mais do necessário
Isto hc certo , que os proveitos do? nossos es-
tabelecimentos das índias Occidentaes , por differen-
tes canaes , se vem a concentrar em a Grã-Breta-
nha , para onde se recolhe o Fazendeiro , ten-'o ad-
quirido o seu cabedal , a reestabelecer a sua enfra--
quQcida constituição, e a gozar dos lucros custosa-
( 2^2 )
mente conseguidos com contínuos perigos , c af-
ílicções.
Os nossos desditosos Empreiteiros do Café nas
}ihas cedidas, segundo ctiço dizer, começão a per-
tier ioda a esperança de conseíjuirem algum galar-
dão pelos seus trabalhos ; c]ue aífeitos a ter , debai-
>o de alfjiins io^jjros , hum prospero retorno a favor
de sua fainilia , e seus amigos , o seu crédito tem para-
tlo pela difíkuldade dos cempos , e as suas pioduc-
<;ões apenas lhe rendem a an.etade , do que deo em
3770; pois que o valor de seus géneros abaixou , i
vista dos seus correspondentes 5 pois , sem embargo
de serem hábeis , duvidarão soccorrellos , vendo a
sua si uação desesperada. As suas perdas em cscra-
^os e bestas forão inimensas , em ra7ão do embara-
ço da cultura das Ilhas , cobertas totalmente de ma-
tos , e consequentemente húmidas, e pouco sadias ;
pela falta de sustento , e de abrigo para os sobre-
«litos escravos , e gado. Em huma palavra : os seus
negócios estão em huma figura tão crítica c,ue , a
não serem soccorridos immediat2m<í;nte pela prudên-
cia , c justiça do Parlamento , de necessidade hiráo
apique debaixo de tantas desgraçai , e dentro de
))Oucos d. as seião a preza das aladroadas garras de
usurários, e Let roídos.
D' outra maneira, o Fazendeiro pôde ser con-
servado , e animado em proporção ao augmento , que
ti. eiCiii os seus productos 5 a renda dw Ilhas levan-
ta*
( 25j )
tadas de 4 e meio por cento . podem em pouco
tempo se.eai muito maiores. Os Fa rendeiros . qud
tem comprado sitios ao Governo , solúveis aposse.
podem , se assim for , promptificar-se melhor , a sa-
tisfazer as suas obrigações j e as terras , cedidas pelos
Çaraihes de S Vicente , encontrarão compradores por
4,um bom pieço , o que se não deve de sorte algu-
ir.a esmerar no estado presente das cousas. Foi mui-
to bem reflectido , no requerimento çntregue ao Par^
lamento, pelos vizinhos de Dominica na ultima ses-
são , que os Cafesaes , e Cacausaes , ou granjas des-
tas duas plantas mereciao particular contempbçao •,
por quanto elles pod^ão ser estabelecidos sobre hutn
iTienor fundo cue as fazendas d'A.sucar , que re-
querem muito maior extensão , e editicios muito mai.
custosos. Todo. procurão repartir as suas proprieda-
des , e , por consequência , fornecerão meios de sub-
sistir á hum ma^or número de habitantes brancos .
augmentando com isto as forças das libas , e dis-
pondo-as, para que melhor possão defendellas , as-
sim da^^ violências dos de fora , como dos levanta-
mentos domésticos dos escravos.
F.evejoque me podem argumentar contra, di-
zendo : que ainda que eu tenha mosíraJo que os
direitos, ealcavalas do Café , sendo reduzidos a 6i
d. por avratel, e o Câcáo era fructo a 5^ d. que
estes artigos possão dValgum modo supp ir o lugar
ào Chá , a perda da renda do ultimo se poderia
com-
C 2^4)
compensar pelo augnicnto da renda no primeiro;
tom tudo que a differença destes direitos , que pro-
puz , e que prementemente se pagão , taria descahir
a renda do Governo , contando com o presente con-
summo do Ca^^c , e do Chocolate.
Eu creio que , se todo , quanto se consome ,
liouves»* de pagar direitos , e alcavalas , que senãj
devei ia temer a menor perda, ou descahimento ;
por quanto não tenho a menor dúvida , rue se es*
travião á estes mesmos direitos , por contrabando ,
ímmensas quantidades de Café , por toda a circum-
ferencia deste Reino , e particularmente peias cos-
tas , que ficáo ao Sul . e a Oeste , onde me cer-
tificão , que se pôde ter , bem que em pequenas
quantidades , pelo preço de 14 a 18 d. por arraiei,
o que he pouco mais que ametade dos direitos , e
alcavalas. Isto he muito mais ruinoso á Inglaterra,
por ser também todo e^te Café , principalmente pro-
duzido nas Ilhas Francezas , e ser pago , alem disso ,
em moeda corrente,
He mui provável que três tantos mais de Ca-
fé das índias Occidentaes se hajão de introduzir
por este modo , que aquelle que paga os direitos ,
c alcavalas. Logo , fazendo se a reducção de três par-
tes para quatro deste mesmo direito, não causaria
a menor perda ao Governo , com tanto porém que
a totalidade do consumo houvesse de entrar recular-
íi.cme , e póde-sc presumii que , entrando assim *
( 265 )
SC viria a dar de mão , e a abandonar totalmente
o contrabando. i
IVlas , concedendo-sc porém que , pelo abati-
mento do direito , pagando todos de boa vontade ,
a parte que lhe couber , ainda assim pôde haver
íílguma falta. Todavia se deve racionavelmente sup-
pòr que devem ter maior peso com o Britânico
Parlamento , e Administração certas considerações da
Politica , e da Justiça das Colónias , que huma dif-
ferença denodada sobre hum dos ramos das suas ren-
das. Com tudo , para prevenir todas as objecções ,
que quizerem pôr , sujeito o seguinte piano , para
compensar o Governo de qualquer differença , que
se supponha levantar-se da diminuição dos direitos ,
da maneira que tenho mencionado , e também pa-
ra estancar o contrabando do Café , e do Chocola-
te. Em primeiro lugar desejo , que se observe que
o maior consumo do Café , e dos outros artigos ,
presentemente se faz nas casas públicas de Café.
He a minha tenção não innovar cousa al^u-
ma nos direitos d*Airandega j e ficarem o dos Cafe-
saes do mesmo modo , em que estão.
Converter as alcavalas , presentemente pagas pe-
lo Café dei fora em direitos , que não deve ser des-
contado pela exportação , porque daria occasião cer-
tamente a muitas fraudes, isto não faria differença
alguma no Café de Moca ao Governo.
Tirar todas as alcavalas ao Chocolate e Café ,
e
C 2<56 -)
c impor , attendida alguma suppo^ta deficencia cm
os Caies , e Chocolates , Inima taxa proporcionada
nas licenças concedidas ás casas de Caf»i , e tam-
bém em todas aquellas > (^ue vendessem Café , e Cho-
colate feitos. As pessoas , que tiveicm as taes casas,
não terão razão algema de se queixareju da taixa ;
porque elles podem comprar o Cale produzido nas
Tíossas Ilhas por hum preço muito mais baixo , nem
de fazerem alguma tortura a seus freguezes ; pois
não tem algum justo motivo para lhe levantar o preço.
Outro motivo, que favorece á este plano , \ em
a ser , que o pagamento da taxa não pôde ser eva-
dido , e nóde ser facilmente pago
Kão tenho diuida alguma que , quando a at-
tenção d' hum tão Sahio Financeiro , como o actual
I\linistro , se applicar á este objecto , os no<;sos co-
vassalos das índias OcciJentaes se disporão a con-
tinuar a cultura do Café , e Cacáo , ou amêndoas
òo Chocolate com tanta vantagem da Pátria mãe ,
como dos próprios Granjeiros. Eu porém tenho ex-
cedido CS limites d' huma Carta , e posso concluir
seguramente que , se , o que escrevi , vos pôde servir
ái; vossas vistas de promover os interesses da Ilha,
de que sois o Procurador , não deixarei de dar o
nieu tempo por bem empregado. Eu sou com o
maior respe ito A m a d o S e n h o r
Vosso muito obediente, e humilcle servidor.
Assignado !* * *
F I M.
índice
Do que contém esta primeira Parte.
S\^fAiiSodiàe Cahovetlcíe ligaío et soluto sermo-
ne cx auctoribus decerpt^ xv
fíistvria do Café, Copiada , da (jite escrcveo cm
Iiiglez. John Ellis , . . . xix
Ciãuira do Cirfé , historia da sua iiitroducçÕ»
na Furopa > i irada do Discurso preliminar da
obra Franceza t í^or N. F. J. £%. Pag. I
Extracto do Café , Por By Erian Edvvarcís. . . 1 1_
Cálculo das despegas , e lucros da cultura do Ca-
fé nos montes de Jamaica , distantes do mar
14 milhas ém o papel moeda desta Ilha , com
o abatimento de 40 por ico menos que as es-
terlinas 26
Despezas mnnuaes ^7
Lucros de 4 annos a L. 4 por (jnintaL ( Estejoi
o preço do Café 5 r^nnos antes de 179a.) » . ibid.
Recompensas do 5.° anno , e seguintes, ... 28
Mota • ibid.
Observações pertencentes á cultura do Café , em
a Ilha de S. Domingos , e do seu cu^mento
provável em Jamaica , no ^aso de não ser abo-
lido o negocio dos Escravos pelo acto do Par*
lamçnto , Por Samuel Vaughan Es(], . , . 29
Tra-
( 2ÒS )
Tratado sohre « Cultura do Cofé , Por Mr. Mo-
nereau. Descripção data arvore t e de seu pre-
parativo «..t...^}
§ II. Os terrenos dos morros são de pouea du-
ração 4)
§ III. Mehs de conservar o terreno ibid.
5 IV. Por<]ue senão deva mondar a enxada. • 44
§ V. Segredo do P. Ldbat ibid.
§ VI. Meios de conservar es Cafeseiros. • • 4$
§ VII. Modo de aparar os Cafesthos, ... 46
§ VIII. Declinação da arvore 47
§ IX. í7 Café pede terra nova ibid.
§ X. Diferença das terras entre Martinica , e
S. Domingos 4%
§ XI. Ca/é de Martinica preferido ao de S, Do-
tningos, 49
§ XII. Q,uulidades notáveis dos seus habitantes. 50
§ XIII. l^oiitos pri/rcipaes para se ter bom Café, 5 }
§ XIV. ^ causa do dtspreio do Café de S. Do-
mingos «$4
§ XV. Politica dos Hollandcx.es 55
§ XVL Modo de plantar o Café 56
$ XVII. A ijue distanci.i se planta o Café , e vc-
rias opiniões sobre isto. ....... 57
§ XVIII Profundeza das covas. ..... 59
§ XIX. Segundo modo de fazer covas ibid,
§ XX. A estação de se plantar o Café, . . . (ji
§ XXI. Viveres , que se podem plantar nas aveni-
das
( 269 )
das entre os fiUWas do Café , em quanto crescem, 6t,
§ XXil. Descripção da arvore. • .... 6;
§ XXIII. Flor do Café 67
§ XXIV. Figura do seufructo 68
§ XXV. O Café não amadurece ao mesmo tempo. 7 1
§ XXVI. Qual seja a estafão de o colher, , .7*
§ XXVII. Três espécies de Café inferior. . .75
5 XXVIII. Disposição na casa do Engenho. . .74
§ XXIX. Como se passa o Café pelo Engenho, . ? 5>
§ XXX. Advertências (jue se devem fax.er, . . 7^
§ XXXI» Meios para acautellar os escravos de
muitas moléstias. ....»...• 7®
§ XXXII. Descripção da explanada ^^
§ XXXIII. Em qac tempo se pila o Café. . . §4
§ XXXiV. Como se pila o Café. . . . . Sf
§ XXXV. Como se aventa o Café, . . . . 87
§ XXXVI. Rendimento do Café 89
Memoria sobre a Cultura do Café , Por Mr. Fu-
sée Aublet 9J
Rapsódia da Maison Rustique de Cayenne , Por
Mr. de Prefontaine 107
Memoria sobre o Café , Por Filippe Miller Ingh
Caracteres 11*
Instrucção sobre a Cultura do Café , traduzido
dê Hollandex., Por Mr. Alleon Dulac. . . . lâj
Carta es cripta a Mr. Elias Monereau , sohre o
seu tratado de Café , Por Mr. Graimpre , vi-
zinho de Moca, • . • 14?
Vre-
C 270 )
Pfeclsa-sc deduzir as Jç^spcr.as ijo
Kespcslade Mr. Monereau , a ]Mr. Graimpre» so-
bre o conteúdo da Carta oclma , na ijual sails'
Jax. ai ohjecqÕes ij^
Memoria sohre o Caji , Por Mr. Abbade Rosier.
I. Introducção •..167
CAPITULO I. Historia do Café ibid.
CAP. II. Descripção do Café pelo Senhor Jussleit, 1 7 5
CAP. III. Da sua Cultura I77
CAP. IV. Das suas propriedades 19Ó
Methodo de se tirar o máo cheiro , e desagradá-
vel sabor do Café , importado da Jamaica. . 20 )
Relação da Cultura do Cofesciro na Aralla Fe-
lix. , extrahida das viagens de I\I. de la Roque. 2c6
Modo de preparar , e de se tomar o Cnfé entre
os Árabes , extrahldo do mesmo Aulhor. . * 20%
Extracto da viagem de Nichuih á Arábia , ulti-
mamente publicada em Dinamarca 211
Observações sobre o Café 213
Extracto de huma Carta do Doutor Fother^ill a
Joh Ellis Escudeiro. Agente de Dominica (jue
9ontéin observações sobre a Cultura , e uso do
Café 22a
Observações sohre o Café , por hum douto , e ex-
perimentado Fazendeiro em Granada , commU'
nicadas ao Doutor Fothergill pelo Governador
Welville 241
Extracto de huma Carta dt Jorge Scot , Tenen-
te
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