NUNO CATHARINO CARDOSO
Poetisas
Portuguesas
ANTOLOGIA CON-
TENDO DADOS BI-
BLIOGRÁFICOS E
BIOGRÁFICOS
ACERCA DE CENTjÇ
E SEIS PQÊTJ
LISBOA
LIVRARIA SCIENTIFICA
8í, Rua Nova do Almada, 8i
Poetisas Portuguesas
Composto e impresso na Imprensa
^ ^ de Manuel Lucas Torres ♦ •»
R. Diário de Noticias, 5g a 6i, Lisboa
NUNO CATHARINO CARDOSO
Poetisas
Portuguesas
ANTOLOGIA CON-
TENDO DADOS BI-
BLIOGRÁFICOS E
BIOGRÁFICOS
ACERCA DE CENTO
E SEIS POETISAS
\
LISBOA
EDIÇÃO E PROPRIEDADE DO AUCTOR
1917
A propriedade literária Oeste livro é
garantida ao auctor, em Portugal,
pela lei Õe 18-3-1911 e no Brazil
pela lei n." 2577 õe 17-1-1912
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PREFflei©
Não é unicamente nas paginas da sua Historia Mi-
litar, Marítima e Colonial, que Portugal se ufana de
contar os nomes ilustres de exforçados guerreiros e
de audaciosos navegadores, os quaes pelos seus bri-
lhantes e imorredouros feitos, levaram Camões a íêr
escrito :
E julgareis qual é mais excellente
Se ser õo munòo rei, se õe tal gente
taes e tantos foram os prodígios de valor que Por-
tuguezes operaram desde a fundação de Portucale
até Chaimite, Marraquene, Coolela, Magul, etc. Se
compulsarmos as paginas da nossa Historia Literária,
deparamos, logo, com uma série de nomes de Se-
nhoras que, pela sua inteligência e saber, se impõem
ao mundo culto.
Completando esse quadro já de si soberbo, vemos
que não é somente nas letras, mas ainda em quasi
VI "-
todos os ramos d'actividade intelectual, que se teem
distinguido as Damas Portuguezas.
Assim, em tempos idos, floresceram : na pintura^
Josépha d'AYaIa, Soror Maria da Cruz, a duqueza
D. Anna de Lorena, e Luiza Maria Rosa ; na cerâ-
mica, Ignacia de Almeida ; na avchitéctura, Mar-
garida de Noronha ; como teóloga, Izabel de Cas-
tro ; como matemática, a Condessa de Serem e Al-
buquerque ; como filosofas e humanistas : Marianna
d'Abrantes, falecida contando apenas 17 anos e au-
ctora de varias obras sobre Retórica Moderna e Fi-
losofia Moral, Joana Michaela, Umbolina de Távora ;
e, finalmente, como literatas : D. joanna da Gama,
auclora dos Ditos de Freira ; Soror Brigida de Santo
António (D. Leonor de Mendanha), D. Feliciana de
Milão, D. joanna Ignez da Cruz, a decima musa, co-
gnome que Lope da Vega também deu a Oliva de
Nantes e que anteriormente havia sido posto a Ber-
narda Ferreira de Lacerda, auctora da Espanha Li-
bertada e das Saudades do Bussaco; D. Izabel
Corrêa, D. Helena da Silva, Soror Maria de Mesquita
Pimentel, auctora de Cantos religiosos, Soror Maria
Baptista, auctora á'Obras ascéticas; Thereza Mar-
garida da Silva e Horta, auctora de Máximas da
virtude e formosura com que Diophanes, Cly-
-VII
meno e Hemireno, príncipe de. Thebas venceram
os mais apertados lances da desgraça; D. Maria
do Céo e D. Maria Magdalena Eufemia da Gloria, para
não falar noutras notabilidades femininas.
Que brilhante plêiade de nomes ilustres vem de
eras remotas até nossos dias!
Que magica aureola envolve os nomes da Rainha
Santa, convertendo ouro em fragrantes rosas ; os de
D. Filipa de Vilhena e D. Marianna de Lancastre, ar-
mando cavaleiros seus próprios filhos, bem como os
da varonil Duqueza de Bragança, D. Júlia de Gus-
mão, e da arrebatada e lendária Maria da Fonte!
Mãe de tantos Lusos insignes, a Mulher Portuguesa
revive sempre pela grata lembrança de suas obras li-
terárias e piedosas e por seus feitos militares e va-
ronis.
Como, ainda hoje, séculos passados, é suave e em-
polgante ler essas cartas de Soror Marianna, a Freira
Portuguesa, cartas em que o amor, a ternura e o
sofrimento em cada pagina se manifestam !
Como, ainda hoje, é grato pensar na Rainha D.
Leonor, a fundadora d'hospitaes e de misericórdias,
e que tantos beneficios espalhou no Paiz l
Como, ainda, volvidos tantos séculos, nos curvamos
VIII -
reverentes, ante os nomes da Condessa de Castelo
Melhor, da Condessa de Penaguião, de D. Luiza de
Faro, de Helena Peres, de Deusadeu Martins, da Pa-
deira de Aljubarrota; de Antónia Rodrigues, pelejan-
do em Mazagão, de D. Izabel de Castro, lactando no
cerco de Alcácer contra o rei de Fez, de D. Izabel
de Galvão, em Ceuta, de D. Maria Úrsula, em Am-
boná, intrépidas guerreiras, companheiras de Izabel
da Veiga, Anna Fernandes e Catharina de Sousa que
na índia deram sobejas provas de audácia e de bra^-
vura !
Como se no século XVI não bastassem os nomes
de Camões, Bernardim Ribeiro, Cristovam Falcão,
Sá de Miranda, António Ferreira, Diogo Bernardes,
Gil Vicente, João de Barros, Damião de Góes, Fer-
não Mendes Pinto e outros, para tornarem em ex-
tremo gloriosas as paginas da Historia Literária da
Pátria onde nasceram, como se o nome do Cantor
dos Luziadas não fosse só por si penhor bastante
para representar, belamente, uma literatura inteira,
surgem, também, os nomes notáveis de Paula Vicente,
filha de Gil Vicente e sua colaboradora; da Infanta
D. Maria, filha de D. Manoel I e de sua terceira mu-
IX —
Iher, Infanta tão letrada e conhecida pelo esplendor
dos Serões da infanta, a que se refere Sá de Mi-
randa, e que tanto brado deram ; de Publia Horten-
cia de Castro ; de Leonor de Noronha, e de Joanna
Vaz, a par das irmãs Luiza e Paula Sigea, conjuncto
este de damas que, sem duvida alguma, teve impor-
tante papel no resurgimento literário que nessa época
se dá em Portugal.
Os conhecimentos que essas Senhoras possuíam,
não se limitavam ao estreito âmbito que algumas pes-
soas podem supor.
Conheciam bem — línguas, teologia, filosofia, e hu-
manidades.
E' deste modo que, aos desasete anos de idade,
Publia Hortencia de Castro, que não pertencia á fa-
lange nobre dirigida pela Infanta D. Maria, tendo
cursado filosofia, humanidades e teologia, defende
teses em Évora, em 1563. A sua erudição era tal, que
Filippe II — que assistiu a uma prova publica em
que Publia Hortencia de Castro sustentou das mais
dificeis teses teológicas — lhe concedeu uma pensão
vitaHcia.
Não nos deverão, todavia, admirar em extremo es-
tes factos, se atendermos a que Joanna Vaz, filha do
licenciado ]oão Vaz e uma das três damas da In-
- X -
fanta D. Maria, escrevia em árabe, hebraico, grego e
latim, ao Papa Paulo III.
No século seguinte, apesar da decadência que já
se nota na Literatura Portuguesa, ainda se destinguem,
entre outras, Soror Violante do Ceu, auctora das Ri-
mas [/árias e do Parnaso dos Divinos e Huma-
nos versos; Soror Marianna, auctora dessas admi-
ráveis cartas dirigidas ao cavaleiro de Chamilly; e a
Condessa de Ericeira — D. Joanna de Menezes, —
muito versada em castelhano, latim, italiano e francês
e que escreveu quatorze volumes em que tratou as-
suntos vários.
Desejando prestar a minha homenagem a tantas
Senhoras Portuguesas que, de meados do século
findo, até hoje, se teem notabilisado como Poetisas,
(abro três justas excepções, tratando da Marqueza de
Alorna, da Viscondessa de Balsemão e de D. Fran-
cisca Possolo da Costa, que viveram num periodo
anterior á data marcada para inicio deste trabalho),
ou que simplesmente teem versejado com felicidade, e
que tão nobremente teem sabido continuar as glorio-
sas tradições literárias de suas antecessoras, resolvi
consagrar ás Poetisas Portuguesas o primeiro volume
- XI
desla Antologia, na qual, Portugueses, Brazileiros e
Estrangeiros encontrarão inúmeras jóias dispersas do
nosso vasto tesouro poético.
Da inteligência, saber e mérito de cada uma das
Musas de que se ocupa este livro, mais do que eu
possa dizer, falam as suas composições poéticas, nas
quaes, a cada passo, encontramos sentimento, graça,
lirismo e beleza que nos seduz e encanta.
Como poderiam deixar de ser notáveis as Senhoras
que nasceram na Pátria que se honra de contar na
numero de seus filhos insignes :
Garrett, Herculano, Castilho, João de Deus, An-
íhero do Quental, Camillo Castello Branco, Eça de
Queiroz, Ramalho Ortigão, Fialho d'Almeida, julio
Dinis, Gonçalves Crespo, Thomaz Ribeiro, Bulhão
Pato, Conde de Monsaraz, Fernando Caldeira, D.
João da Camará, Sousa Monteiro, João de Lemos,
Faustino Xavier de Novaes, Xavier Cordeiro, Soares
de Passos, Gomes de Amorim, Palmeirim, Simões
Dias, Alexandre da Conceição, Guilherme de Azevedo,
Guilherme Braga, Abel Botelho, António Feijó, Luiz
de Araújo, Rebello da Silva, Mendes Leal, Pinheiro
Chagas, Latino Coelho, Oliveira Martins, Silva Pinto,
Sousa Viterbo, Consiglieri Pedroso, Innocencio F. da
Silva, Annibal Fernandes Thomaz, Rodrigues Sam-
XIi
paio, Teixeira de Vasconcelos, António Ennes, Ma-
rianno de Carvalho, Emygdio Navarro, Silveira Ma-
lhão, Alves Mendes, Rodrigo da Fonseca Magalhães,
José Estevão Coelho de Magalhães, Júlio César Ma-
chado, D. Maria AmaHa Vaz de Carvalho, Theophilo
Braga, Xavier da Cunha, Fernandes Costa, Guerra
Junqueiro, Gomes Leal, Adolfo Coelho, Júlio Dan-
tas, Eugénio de Castro, António Corrêa de Oliveira,
Aííonso Lopes Vieira, Alberto Bramão, Augusto Gil,
Júlio Brandão, Alfredo da Cunha, MarcelHno Mes-
<}uita, Lopes de Mendonça. Alberto Pimentel, Carlos
Malheiro Dias, João de Barros, etc, etc.
Antecedendo as produções de cada uma das poe-
tisas que figuram no primeiro volume da Antologia
Portuguesa, que deverá compor-se de 6 tomos e
para a feitura da qual já consultei, sem um momento
de desfalecimento, cerca de mil e cem obras poéticas
— ha uns ligeiros dados biográficos e bibliográficos
que, propositadamente, escrevi numa linguagem sim-
ples, desapaixonada e sem hipérboles, dados que ser-
vem para apresentar cada uma das Senhoras a quem
me refiro.
Muitas das poetisas de que trato, por demasiada-
mente conhecidos seus nomes e apreciadas suas obras
literárias, não careciam de apresentação, se desse mo-
XIII -
do não desejasse reunir muitos elementos dispersos,
duma matéria que entre nós tem sido pouco versada
(Vide pag. 165 deste trabalho), e tornar mais útil e
mais interessante esta obra que, pelas notas biográfi-
cas e bibliográficas que insiro, fornece os elementos
necessários para se poder proceder a um balanço do
movimento intelectual feminino em Portugal, a partir
de meiados do século XIX, até nossos dias, designio
que, embora não completamente, penso ter realisado.
Ao organisar os seis volumes que constituem esta
Antologia que, pela sua orientação e conjuncto, con-
sidero uma das mais completas de quantas tentativas
e realisações similares se íeem efectuado em Portugal
e no Estrangeiro, não tive só em mira prestar a mi-
nha calorosa e respeitosa homenagem ás Damas Por-
tuguesas e aos Poetas Portugueses como também
dotar o meu Paiz com uma obra que ele ainda não
possuía, não obstante tão grande lacuna ser ha muito
notada.
Apezar de todas as meticulosas investigações e do
cuidado que puz em não omitir o nome de qualquer
poetisa que, de todo em todo, fosse injustiça deixar
de citar, certamente uma ou outra omissão haverá.
A's Senhoras que tendo merecimento e direito a
figurarem na minha obra, nela não virem o seu nome,
XIV-
peço me relevem essa falta, que só o desconheci-
mento de suas produçí3es poéticas ou a dificuldade
em obter dados biográficos me levou a cometer.
Se não fosse um tanto ou quanto rebelde a clas-
sificações e se uma vez estas estabecidas, não trou-
xessem melindres (razão porque resolvi, para os evi-
tar, seguir neste livro a ordem alfabética), dividiria as
poetisas a que me refiro, em : Poetisas falecidas e
Poetisas vivas.
Estas ultimas, subdividi-las-ia em dois grupos.
Como esta Antologia, pela sua própria natureza,
não é um livro de critica literária, embora algumas
das poetisas citadas tenham, é certo, mais mereci-
mento que outras, abstenho-me de taes classificações
que deixo ao critério e preferencia do leitor.
Concluindo estas explicações, resta-me apresentar
a todas as Senhoras e Pessoas a quem tive a honra
de entrevistar e a todas as Damas e Cavalheiros que
tiveram a amabilidade de me prestarem esclareci-
mentos, a expressão mais sincera do meu grande e
profundo reconhecimento pela forma captivante com
que umas e outros se dignaram anuir aos meus pe-
didos.
A's Ex."^' Senhoras D. Mecia Mousinho de Albu-
querque, D. Zulmira Franco d'Almeida Teixeira, D.
XV -
Maria Jacintha Teixeira Bastos, Q. Esther Amália da
Cunha Delem, D. Maria Figueiredo Feio Rebello
Castello Branco, D. Lia de Magalhães CoUaço, D.
Branca da Silveira e Silva, D. Alda Guerreiro Ma-
chado, D. Emilia Adelaide Moniz da Maia, D. Maria
0'Neill, D. Rosalinda Celeste de Figueiredo Santos,
e D. Rosa Varela que quizeram enriquecer esta An-
tologia, cedendo-me valiosos inéditos, aqui deixo ex-
presso o preito da minha maior gratidão.
Lisboa, Junho õe 1917.
Nuno Cathãrino Cardoso.
POETISAS PORTUGUESAS
ANTOLOGIA
D. MARIA ANNA ACHIOLI
D. Maria Anna Achíoli nasceu em Torres Veõras. E' filha
ôe D. Lia ôe Magalhães Collaço, ôa Casa ôe Conôeixa e òo
òr. Fonseca Achioli, ôescenôente õe uma família nobre e
ilustre õe Florença.
E', portanto, D. Maria Anna Achioli bisneta õos conòes Òe
Condeixa e sobrinha õos conões ô'Aviléz.
D. Maria Anna Achioli, apezar õe muito nova, tem já a
sua viõa esmaltaõa por titulos õe valor literário e artístico.
Obteve 20 valores no seu exame õo quinto ano õe portu-
guez, no liceu. E na pintura foi õiscipula õilecta e notável
õe Maõame Zoé Wautelet Batalha Reis.
As suas poesias são tão singelamente naturaes, tão im-
pregnaõas õe canõura, tão filhas õe um granõe coração, que
bem se encarregam essas obras õe iniciarem o alvorecer Õe
uma vocação poética õe primeira orõem.
CHAPINHANDO
Ao Õe leve, na viõraça
bate a chuva miuõinha
e ella, a Maria õa Graça
finge que a saia arregaça
e ri com gosto, a tontinha !
Poetisas Portuguesas
A cabeça òescoberta
e a chuva tão miuõinha . . .
E ella a rir. Iravessa e esperta,
pára na rua, õeserta,
e os pés na lama chapinha.
O cabello a òesfrizar-se
com a chuva miuõinha. . .
e ella, rinôo, a arregaçar-se,
como quem sêòas trajasse
em vez Õe curta sainha.
Ris, pequena enòiabraôa ?
E a chuva cae miuõinha . •
mas olha a saia encarnaôa
que ôe tanto arregaçaòa,
se não vê, a pobresinha !
Que gosto é esse, Maria ?
Cai a chuva miuòinha. . .
foge, corre, que ella é fria
e eu sei que alguém choraria
ao saber-te doentinha.
Maria Anna Achioli. Almanach de Lembranças^ 1913, pag.
150.
LAR FELIZ
Olha o sol já se escon&eu,
Não tenho tempo a perôer.
Vem o Manei, quer comer.
Toôo o õia a trabalhar,
E' tempo Òe õescançar !• . -
Tão branco e tão pequenino,
Como ôorme o meu menino
O filho que Deus me ôeu !
Poetisas Portuguesas
Na mesa nova õe pinho
Manchanõo a alvura 5o linho
Luz o veròe cangirão,
Dois talheres, copos e pão.
Ah ! mulher, temos bom anno,
Não ha fome cá n'alõeia,
A espiga é granôe e cheia,
Cahiu a agua ôos Céus
E inchoua, benza-a Deus!
E a gente sempre a pensar
Que a chuva a vinha estragar,
E ás terras causar õamno. . . *
A comiòa é bem frugal
Batatas, couves com sal ;
Mas na terrina alõeã
Cheira a sopa a hortelã.
— Está boa a ceia, Maria ;
Ah ! . Olha lá, meu amor,
Faz hoje um ânno, pois não ?
Que o bom õo senhor prior
Me Õeu para a minha mão
A cachopa mais bonita,
A moçoila mais catita
Que eu vi lá na romaria. —
E os copos enchem-se então
— <A' nossa e á ôo petiz>, —
Fructo õ'aquella affeição,
Enlevo òo lar feliz !
Maria Anna Achioli.
4 Poetisas Portuguesas
D. VIRGÍNIA DA C SILVA AGOAS
Faleceu contanôo apenas 27 anos òe iôaõe, Era filha 5o
empregado Ôo Ministério òa Fazenòa — Agoas.
O seu volume òe versos, Ouír'ora, prefaciado pelo Dr.
Canõiòo õe Figueiredo, foi comprado por mim em plena
rua, onde se vendia por preço ridículo, como sucede a tan-
tas outras obras. O facto apontado é a prova evidente do
pouco interesse que uma bôa parte dos Portuguezes tem
por assumptos literários.
E' com satisfação, que presto homenagem á sua auctora,
que em vida, tão assidua e distinctamente colaborou no in-
teressante jornaí Os Echos da Avenida que já conta bastan-
tes anos de existência e no qual se encontram as biogra-
fias e retratos de pessoas mais em evidencia no nosso meio
literário. D. Virgínia Agoas colaborou também nos jornaes
A Tarde, Folha do Sul, de Montemór-o-Novo, etc. Num
certapien literário iniciado pelos Echos da Avenida, em 1906,
uma das suas quadras foi das mais votadas.
Esta Poetisa tinha grande vocação para a pintura e para
a musica.
Escreveu ainda, um livro de contos. Silvas, prefaciado por
Carlos Malheiro Dias e que á semelhança do que aconte-
ceu com o seu volume de versos, foi publicado postuma-
mente.
SAUDADE
Saudade tem-se de uma rosa linda
que a gente vê desfolhar tristonha,
Saudade tem-se, quanto mais se sonha. . .
De um bem que morre. . de um prazer que finda.
Saudade, causa tanta vez, ainda,
a própria Dôr — a sensação medonha.
Mas essa é, a que provem risonha,
do recordar de uma ilusão infinda.
Poetisas Portuguesas
Sauõaôe — encanto e lagrimas — existe
ôe um sonho bom õe um sonho belo ou triste,
e tuôo envolve em sua roxa côr.
Sauôaòe ! — ai é sentir toòo um passaõo
nitiòamente e sempre reavivaõo,
— é òerraòeira pagina õo Amor.
Virgínia Agoas. Outrora, versos póstumos. Porto, 1913,
pag. 11 e 12.
IMACULADA
Um primor ôe arte antiga e requintada
essa meôalha Òe subtis lavores,
que eu encontrei um õia abanõonaõa
no banco ôe um jaròim, por entre flores.
Na tampa õe oiro, oval e cinzelada,
exibia uns iôilios ôe pastores,
abraçanôo-se á luz ôa maôrugaôa,
nos mais simples e canôiôos amores.
Encontrei-a, — e uma intensa vontaôe
levou-me a abril-a, cheia ôe ancieôaôe,
essa meôalha antiga e cinzelaôa. •
Vi então, mais formosa ôo que Ester
um retrato ôe ôeusa, ou ôe mulher,
e uma palavra só : — Imaculada !
Virgínia Agoas. Outr'ora, pag. 15 e 16.
Poetisas Portuguesas
DORMIR -ESPERAR .
Dormir, ôormir — esquecer
Coisa boa, que inõa existe !
Dormir é quasi morrer,
Allivio Õe quem é triste.
O tormento mais amargo,
o mais luminoso amor,
tuõo cae n'esse letargo,
sempre pacificaôôr !
Dormir ! — A paz para a alma !
— Tréguas para qualquer ôôr !
— Descanso para o sentir !
— Vaga, que instantes acalma !
Morte efémera õo Amor
Esquecer . . Dormir, Ôormir !
Virgínia Agoas. Outr^ora, pag. 41 e 42.
No calvário espinhoso ô'esta viôa,
vou caminhanõo em busca ôe uma luz
que me será ôepois, na õespeòiõa,
õerraôeiro clarão, õeposta a cruz.
Virgínia Agoas. Outr'ora, pag. 83.
Poetisas Portuguesas
D. MARIA CECÍLIA AILLAUD
D. Maria Cecília Aillauõ nasceu em Coimbra, senôo filha
òe João Peõro Aillauõ, negociante vinõo õe França e que
se estabeleceu naquela ciôaôe.
Em 1808 casou-se com o õr. Manuel Mathias Vieira e Fia-
lho õe Menôonça, latinista notável e poeta, e Òe quem en-
viuvou em 1833.
D. Maria Cecília Aillauõ, eõucaôa no Colégio Õas Urseii-
nas, foi uma pianista muito notável. Teve por professor o
estuõante Õe matemática ]oão Evangelista Torrianí, a quem
D. Frei Francisco õe S. Luiz veiu a chamar insigne tocador
de piano em que mostrava particular gosto e expressão.
D. Maria Cecília Aillauõ foi bastante infeliz.
Após a morte õe seu mariõo, faleceu-lhe uma filhinha.
Em 1834, õeixava õe existir seu filho, aluno õístíncto, e pre-
miaõo em toõos os anos õa Universiõaôe e a quem õeõi-
cava particular estima.
Nos escriptos õe D. Maria Cecilía Aillauõ preõomina
sempre granõe sauõaõe pelo filho e granõe amor e respeito
pela religião.
D. Maria Cecília Aillauõ õeixou muitos escritos originaes
e traõuziu bastantes trechos Õe auctores eclesiásticos e pro-
fanos, como : Bossuet, Massillon, etc, La Harpe^ Buffon,
Saint Lambert^ Voltaire, Rousseau, Corneille, Racine, Mo-
lière, Chateaubriand, Victor Hugo, Metestasio, etc.
Foi também auctora Õe meõitações, pensamentos, e õe
varias poesias.
A sua obra principal são as suas óMemorias.
Estes apontamentos foram extractaõos, em parte, õa obra
A Mulher em Portugal Õe D. António õa Costa. Nas Cartas
Selectas õe Fonseca Pinto vem também um interessante ca-
pitulo sobre esta Senhora que faleceu em 1857.
As poesias que apresento õ'esta Poetisa, õevo-as á ama-
biliõaõe õe Carlos Augusto õe Almeiõa. Foram traõuziõas
Poetisas Portuguesas
pelo òr. Castro Freire que foi lente òe matemática e antigo
Vice- Reitor õa UniversiõaÔe ôe Coimbra.
A' MEMORIA DE MEU CARO FILHO
MANUEL MATIAS VIEIRA
Tu que brilhar fizeste
Em minha noute escura
Doce raio õe amor e luz celeste ;
Tu que na terra teu amor me oeste
^■' Ah ! òe mim não te esqueças lá no céu.
Maria Cecília Aillauô.
De colina em colina vagueando
Do sul ao aquilão,
Meus olhos Òesôe a aurora ao occiôente
Tuòo correnõo vão.
Eu òigo : minha vista em vão procuro
Em sitio algum depara com a ventura !
Estes valles, as rochas, os palácios
E as chossas õe pastor
Para mim vãos objectos sem encanto
Não tem algum valor.
Sem um ser que vos falta, amenos praòos,
Rios, bosques, sois ermos, escalvados.
Quer o giro ôo sol vá ter principio
Quer esteja a findar
Eu, insensível sempre ; pelos ares
O vejo caminhar :
Quer sumido entre nuvens, quer radioso
Que importa o sol e o dia ao desditoso ?
Poetisas Portuguesas
Ainõa que em seu giro eu o seguisse
Dos céus pela extensão,
Meus olhos sequiosos só reviam
O vácuo, a solidão :
De quanto cobre o sol naõa apeteço
Ao munòo inteiro cousa alguma peço.
Que importa no momento ôo naufrágio
Se em pomposo baixel se ha navegaôo,
Ou se n'um batel ligeiro
Solitário e passageiro,
Se tem somente a praia borõejaôo ? !
Maria Cecília Aillauò.
D. ANNA DE ALBUQUERQUE
D. Anna õe Albuquerque foi actriz õo teatro òe D. Ma-
ria II, hoje Teatro Nacional, onõe fez a sua estreia, não fa-
zenôo má figura, segundo assevera Sousa Bastos, no seu
livro Carteira do Artisía, que ácêrca òesta Senhora pouco
mais aõeanta.
D. Anna õe Albuquerque abandonou a carreira teatral,
para se casar com o general e par ôo reino D. Luiz da Ca-
mará Leme.
A poesia que apresento foi publicada na Tragedia, n."
único de um jornal publicado pela sociedade dos artistas
dramáticos do Teatro de D. Maria, destinado a socorrer as
victimas dos terremotos em Hespanha, jornal no qual cola-
boraram, entre outros, António Pedro, Augusto Rosa, Rosa
Damasceno, Carolina Falco, Joaquim de Almeida, Thomaz
Ribeiro, Eduardo Coelho, Fernando Caldeira, etc.
D. Anna de Albuquerque colaborou no Almanach dos Pal-
cos e Salas, de 1899 e foi directora, segundo me informam,
do Almanach D. Luiz.
10 Poetisas Portuguesas
Sae-nos òo coração um pranto aròente
um mysterio, um perfume, um branôo som,
como passa no ar o aroma quente
õas aras virginaes ò'um anjo bom.
E o nosso amor, os nossos ais maguaòos,
õa nossa õôr as expansões tão francas,
irão cair aos pés õos Òesgraçaõos
como um Õiluvio òe violetas brancas.
Anna ôe Albuquerque. Tragedia, 1885, pag. 6.
D. MAFALDA MOUSINHO
DE ALBUQUERQUE
D. Mafalõa Mousinho òe Albuquerque que nasceu em
Lisboa, é como sua irmã D, Mecia Mousinho Ôe Albuquer-
que, ôe ilustre ascenõencia, não ôevenôo nós Portugueses
esquecer que á mesma ilustre familia, cuja nobreza vem ôo
tempo ôe D. Diniz e que tem ôaôo a Portugal tantos guer-
reiros e literatos, pertence Joaquim Mousinho ôe Albuquer-
que, o heroe ôe Chaimite.
Seu avô Luiz Mousinho ôe Albuqnerque, poeta ôe nome
e homem ôe Estaôo notável, foi uma ôas figuras ôe ôesta-
que na Revolução Patuleia, pela qual morreu na batalha ôe
Torres Veôras.
Seu pae FernanÔo Mousinho ôe Albuquerque, alem Ôe
ser um liberal, foi também um bravo. Foi um ôos mais in-
trepiôos caôetes que a ôivisão auxiliar que foi á Hespanha,
levou para combater o exercito Carlista. No combate ôe
Chão da Feira, foi feriôo ; e á frente ôo Batalhão Acadé-
mico, caiu varaôo ôo peito ás costas, no violento combate
ôo Alto do Viso.
Apesar ôe D. Mafalôa ter tantos motivos para justificaõo
Poetisas Portuguesas 11
orgulho, escolheu e firmou quasi toòos os seus trabalhos
literários com o ôespretencioso pseudónimo ôe Modtsta.
Foi nos últimos tempos õo granõe poeta Thomaz Ribeiro,
que apareceram os primeiros versos òe D. Mafalòa Mou-
sinho e que tantos encómios mereceram ao falecido auctor
ôo D. Jaime, que tornou conheciõa Ôo publico D. Mafalda,
que nessa época pouco mais era que uma criança.
Não se enganou, pois, Thomaz Ribeiro, quando profetisou
que D. Mafalda Mousinho de Albuquerque seria uma boa
poetisa, o que esta Senhora plenamente justificou com a
publicação das Nevadas Penas, aparecidas sob o pseudó-
nimo de Rubem de Lara, livro tSo querido de sua auctora,
bem como o romance Um Rembrandu obras estas em que
Rubem de Lara e Modesta atingiu a maior perfeição nos
seus versos e na sua prosa elegante.
Em- 1906 publicon o seu primeiro livro : Contos, prefaciado
por D. João da Camará.
Em 1907, Versos, prefaciado pelo dr. Cândido de Figuei-
redo.
Em 1908, O Coração dum Sábio, em que defende como
remédio social o divórcio.
Em 1910, Um Rembrandt e finalmente em 1913, Nevadas
'Penas, obras estas que abordam assumptos tão diferentes,
mas que nunca ferem a nota politica a que D. Mafalda é
completamente extranha.
Do valor literário dos trabalhos de D. Mafalda Mousinho
de Albuquerque falam nos mais elogiosos termos, as chro-
nicas literárias de vários jornaes, firmadas por António de
Campos Júnior, Cândido de Figueiredo, o falecido dr. Adolfo
Sarmento, etc.
SOMBRA
Nem eu própria sei bem porque sou triste,
Porque esta imensa dôr
Me annuvia, e me mostra quanto existe
Sombrio, aterrador !
12 Poetisas Portuguesas
Bem sei que para toòos ha espinhos
Nas rosas õo viver !
Que toòos têm nos ariõos caminhos
Da viõa, que soffrer !
Que nem tuõo é sinistro e negro e feio
Em ôerreòor Õe mim !
Mas não sei que tristeza, que receio
Gela meu peito assim !
Quando em pequena ainòa, me acolhia
Ao regaço òa mãe,
Dizem que poiícas vezes me sorria ;
E eu lembro-me também !
Hoje, em mulher, as sombras carregaram !
E, não sei bem porquê,
Inõa as minhas tendências não muõaram :
Ninguém sorrir me vê !
MoÒesta. (Mafalòa Mousinho Õe Albuquerque). Versos,
Lisboa, 1907, pag. 29 a 30.
SEM REMÉDIO
Alta noute. Na alcova, a lamparina
Lança uma luz serena, incerta e baça.
Pela memoria a òesòitosa passa
Os caprichos õa sua infausta sina.
E emquanto triste e languiõa õeslaça
As roupas õe cambraia e musselina,
Sobre o peito õe novo a fronte inclina,
Como a estatua õa õôr ou õa õesgraça
Poetisas Portuguesas 13
No braço, envolto em renôas perfumaòas,
Duas manchas enormes, azulaòas.
Que enfureciõo alli deixara alguém,
Trouxeram-lhe a sauôaôe òentro õ'alma,
Da viõa pobre, mas suave e calma.
Que ella gosára ao pé õe sua mãe !
Moòesta. (Mafalôa Mousinho ôe Albuquerque). Versos,
pag. 87 e 88.
POR QUE TE AMO
Amo- te, porque és tu a luz bemôita
Que as trevas õesta viõa me alumia !
Porque és tu minha única alegria !
Doce conforto õa minha alma afflicta !
Pharol abençoado que me guia
Neste mar ò'amargura e õe õesôita,
Onõe o meu coração se estorce e agita
Numa longa, uma intérmina agonia ! . . .
Amo-te, porque neste ignaro munôo
O meu longo Descrer Õoiõo e profunõo.
Não m'o expulsa ôo peito mais ninguém !
Porque ninguém no munõo se compara
Comtigo, alma õe luz formosa e rara !
Sublime encarnação õe toõo o bem.
Moõesta. (Mafalõa Mousinho õe Albuquerque). Versos,
pag. 148.
14 Poetisas Portuguesas
/EQUO ANIMO!
Vós o sabeis, senhora ! — Com certeza,
O sabeis quasi como eu próprio sei ! —
Que para mim não ha mais oura lei
Que esta ôa vossa glacial frieza !
Mas como a gente a tuôo se habitua,
E' para mim um facto, assente agora,
Que hei-õe seguir por toòa a viõa fora,
Observanõo uma lei severa e crua !
E' vosso nome o raõioso grito
Que aos meus lábios acoòe sem cessar !
Se òesviaes òe mim o vosso olhar.
Não podereis também vêr um ôelicto.
Neste preito õe amor tão levantaòo.
Que se póõe chamar-lhe aôoração !
Senhora, que me õaes a inspiração !
Senhora, que sois toõo o meu cuiõaôo !
O amor nunca se mendiga
E' ou não é .. e acabou!
Deus esta lei decretou
Porque toõa a gente a siga !
Vêòes portanto ! Não peço
Nem por sombras o impossível !
De um peito nobre e sensivel
Reclamo o que lhe mereço !
Um boccaòinho òe estima
Com tuôo se concilia
Só a vossa sympathia
Toòo o meu ser reanima. . .
Poetisas Portuguesas 15
Descei a mim vosso olhar
— Como não ha outro igual —
E vereis toòo o meu mal
Por encanto se acalmar !
Olhar, que traga somente
Um bocadinho pequeno
D'aquelle affecto sereno
Onòe abrigaes tanta gente 1
Sou como a ave sem ninho !
Senhora, õae-me o abrigo
Do vosso olhar, que eu prosigo
No meu agreste caminho !
E Òepois . quanòo cansaòo
Do frio intenso õo inverno,
Erguerei meu braòo eterno.
Em qualquer rocha sentado :
— Senhora õos negros olhos
E õas palavras serenas !
Vêõe estas «Nevadas Penas>
Do meu caminho òa abrolhos! . . .
Ruben ôe Lara. Nevadas Penas, Lisboa, 1913, pag. 3 a 6.
PRECE
Senhor ! ]á que a tormenta se não cansa
De contra mim rugir,
Doixae-me, inòa que ténue, uma esperança !
Deixae-mé, como um iris òe bonança
Vêr o seu ôoce e placiôo sorrir !
16 Poetisas Portuguesas
Dai-me, Senhor, emfim, toõa a amargura !
— Noite sem alvoraòa ! —
Irei buscar phantastica ventura
Na aòoração, na ferviòa ternura
Que me escraviza aos pés Ôa minha amaõa !
E a minha sorte negra hei 5e soffrel-a,
Senhor, sem me queixar.
Se attenòerões, Meu Deus, o que vos peço !
Que no caminho ouro que atravesso
Nunca me falte a luz òaquelle olhar !
Ruben ôe Lara. Nevadas Penas, 1913, pag. 45 e 46.
UM ENCONTRO
Passava òistrahiôo . . e tu bem viste
Que o pensamento meu não era ali,
Quanôo o teu rosto emfim reconheci
No olhar com que insistente me meôiste !
Ha longos annos já que te esqueci.
— Ao tempo, bem vês tu, naõa resiste ! —
. . .Se o meu olhar foi summamente triste
Certamente não foi porque te vi !
Que importa lá que os annos òecorressem
E que os factos emfim te convencessem
Que era simples e bom meu coração ?
E' tarõe ! Muito tarõe ! — Que loucura
Vir agora a acorõar uma amargura,
Hoje, fora Õe tempo- . . e õe razão. • .
Ruben òe Lara. Nevadas Penas, Lisboa, 1913, pag. 49e 50.
Poetisas Portuguesas 17
D. MECIA MOUSINHO DE ALBUQUERQUE
D. Meda Alousinho Õe Albuquerque é filha ôe D. Mafalôa
Augusta Barbosa õe Miranòa e õe Fernanõo Luiz Mousinho
ôe Albuquerque que foi o comanõante õo 'Batalhão Aca-
démico no Alto do Viso e neta õe Luiz õa Silva Mousinho
õe Albuquerque, auctor õe Ruy^ o Escudeiro e Õas Georgicas,
õois livros bastante conheciõos e apreciaõos.
D. Mecia Mousinho õe Albuquerque que é uma õistincta
poetisa, tem colaboraõo, em prosa e verso, nos jornaes Oc-
cidente, Novidades, Tarde, Nacioual, Dia e Nação.
Alguns õos escriptos õesla ilustre senhora que Õescenõe
õe Affonso Sanches, filho bastarõo õe D. Diniz, teem siõo
firmaõas com o pseuõonnimo õe Zoleica.
D. Mecia é auctora õos seguintes trabalhos : Tecedeira,
poemeto õestinaõo a uma obra õe cariõaõe e que renõeu
mais õe 1 conto õe réis ; .4 Bandeira ; Os Mortos de Cha-
ves, folheto.
Tem para publicar os seguintes trabalhos literários :
Verso: ^lusa das prisões ; Versos e Farpinhas, õe cola-
boração com sua filha D. Fernanõa Mousinho õe Albuquer-
que.
Prosa : Aventuras de Rudeguna.
D. Mecia Mousinho é, juntamente com a Senhora Conões -
sa õe Ficalho e D. Constança Telles õa Gama, õas Senhoras
Portuguezas a quem os presos políticos e emigraõos mais
altos serviços Õevem. E' funõaõora õe uma Associação que
tem por fim conceõer subsiõios e pagar renõas õe casas, a
monarchicos necessitaõos.
No Álbum dos Vencidos, ha um capitulo õeõicaõo a esta
Senhora, no qual se faz referencia aos serviços que aos mo-
narchicos tem prestaõo.
Rocha Martins, auctor õo D. Manuel 21, trabalho que a
par õos õe ]oaquim Leitão, muita luz lançam nos aconteci-
mentos que õeram origem ao 5 de outubro de igio e nos
que se lhe seguiram, no seu romance histórico Maria da
2
18 Poetisas Portuguesas
Fonte fornece valiosos elementos para o estuõc 5a família
Mousinho que conta tantos guerreiros e literatos ilustres.
A biografia ôo avô ôe D. Mecia, foi feita por Xavier Cor-
òeiro.
O ultimo trabalho literário òe D. Mecia Mousinho òe Al-
buquerque, ha pouco publicaõo, intitula-seFr.r^wie«ío5//í5-
loricos, elegante eòição, em que ha belas poesias, cheias
ôe Fé, e que encantam pela forma primorosa por que estão
escriptas, como os leitores poõerão apreciar no soneto òe-
òicaôo á memoria ôe Aivaro- l^inheiro Chagas.
DEPOIS DO BAILE
INKDITA
Terminou o baile . agora.
Dos seus triumphos ufana.
Uma formosa munòana
Expõe-se ás luzes Ô'aurora
A belleza soberana.
Que o munõo incensa e aõora —
E onõe o tempo, por ora.
Não pôz a mão ôeshumana,
Desprenõe o negro cabello.
Ao espelho — e fica-se a vel-os • .
De repente perõe a côr !
E' porque na ôensa matta,
- Um branco fio be prata
Apparece. . ■ ameaçador !
Mecia Mousinho òe Albuquerque.
Poetisas Portuguesas 19
OCULTAS MAGOAS
Como sombra que passa fugitiva,
Olhos fitos nas peõras òa calçaòa —
Lá vae Ella — a Conòessa pensativa
Em seu scismar infinõo mergulhaòa !. . .
Os tranzeunles param só por vê-la;
E caõa um, ao contemplá-la, õiz :
«Isto não é mulher . . é uma estrelia!»
«Um ente assim, como ha Õe ser feliz !>
Ao banquete òe finas iguarias
Onõe as flores se espalham nos crystaes,
Occultanôo profundas agonias,
A Conòessa engole amargos ais !
Mas os convivas forçam-lhe o sorriso,
E caòa um, ao contempla-la, òiz :
«Não ha mais bella flor no paraíso !>
«Um ente assim. . • como ha õe ser feliz !>
Vibra òo baile no ar o mago encanto,
Resplandece a alegria nos semblantes :
Só a Conòessa a custo gela o pranto
Que borbulha em seus olhos rutilantes !
As òonzellas cobiçam-íhe a frescura,
E caòa uma, ao contempla-la õiz :
«Tão rica e formosa . . que ventura !>
«Um ente assim . . . como ha òe ser feliz !>
Mas sobre fria e solitária lousa
Altar funéreo ò'um amor aròente
A altas horas a Conòessa ousa
Gemer. . . carpir. . . chorar eternamente !
20 Poetisas Portuguesas
E alevantanòo o seu olhar discreto,
Triste -O coveiro, ao contempla-la õiz
<Só eu conheço o teu pezar secreto,
Misera amante • e chamam-te feliz !>
Mecia Mousinho 5e Albuquerque.
A* MEMORIA DE FREDERICO PINHEIRO CHAGAS
[No 2,° anniversano da sua morte)
Em nome Õas senhoras Portuguezas,
Que ôas gloriosas épicas acções,
Das façanhas antigas, ôas proezas,
Guaròam n'alma as sagraòas traòicções.
Uma simples coroa ôe tristezas
Venho trazer, co'as nossas orações,
A esse moço, que a perfiòas grandezas.
Preferiu o sepulchro sem traições !
Fiel até á morte, a sua espaõa.
Reluzente, leal, immaculaòa.
Não se dobrou òe vencedor á lei —
Inerte . . embora ! ainda prestigiosa,
Ensina assim á Pátria revoltosa.
Como se guarda a fé jurada ao Rei !
Mecia Mousinho de Albuquerque. Fragmentos Históricos,
Lisboa, 1917, pag. 23 e 24.
Poetisas Portuguesas 21
MARQUEZA DE ALORNA
D. Leonor õe AlmeiÒa Portugal Lencastre e Lorena, 4."
Marqueza ôe Alorna e Condessa òe Oeyenhausen, nasceu
em Lisboa a 31 òe Outubro òe 1750.
A Marqueza òe Alorna era filha ôe D. Leonor òe Lorena,
filha òos Marquezes òe Távora e òe D. ]oão òe AlmeiÒa
Portugal, 2.0 Marquez òe Alorna.
Os antepassaòos Òe D. Leonor òe AlmeiÒa Portugal Len-
castre e Lorena, são òos mais ilustres. Aos Almeidas refe-
re-se Camões, no canto I, estancia 4.».
O titulo òe Alorna, Praça òa InÒia Oriental, foi conceòiòo
por D. João V. em 9-11-1748, a D. Peòro òe AlmeiÒa Por-
tugal, 3." Conòe òe Assumar e 1." Marquez òe Castello Novo,
Vice rei òo EstaÒo òa Inòia, cargo que também exerceu seu
avô D. Francisco òe AlmeiÒa.
O Apeliòo AlmeiÒa, segunòo refere Frei Dernaròo òe
Brito, no L.° 5." Capitulo 6.° da i.^ parte da Chronica de
Cister, Òata òe D. Sancho I, em que Paio Guterres tomou
o Castelo òe Almeiòa aos Mouros.
Paio Guterres é neto òe Pelaio Amaòo, cavaleiro princi-
pal na Corte òo Conòe D. Henrique.
Além Oestes, muitos outros ascenòentes notáveis teve a
a Marqueza òe Alorna.
Na noite òe 3 òe Setembro òe 1758, Òá-se o atentaòo
contra D. José,
Seu Ministro, o Marquez òe Pombal, que, por causas va-
rias e factos anteriormente passaòos, oòiava a fiõalguia,
aproveita tal ensejo, para manòar prenòer o Marquez òe
Gouveia, o Duque Òe Aveiro e o Marquez òe Távora — D.
João òe AlmeiÒa, ~ 2." Conòe òe Alorna.
Sua esposa, D. Leonor òe Lorena, e suas Òuas filhas D.
Maria õe Almeiòa e D. Leonor òe Almeiòa, foram enclau-
suraòas, no Mosteiro òe San Félix, em Chellas, onòe per-
maneceram perto òe 20 anos, e sofreram os rigores òa
22 Poetisas Portuguesas
prisão que lhes eram impostos pelo Arcebispo òe Laceòe-
monia, por orõem õo Conõe õe Oeiras — Sebastião José
Òe Carvalho e Melo, mais tarôe, Marquez õe Pombal.
Foi em Chellas, na prisão, que para se entreter, Alcippe,
— assim foi Ôenominaòa uma òas mais celebres poetizas
que Portugal tem tiòo, se õeòicou ao cultivo Òas Letras e
ôas Musas.
A Marqueza ôe Alorna — teve, por òirector espiritual, D .
Frei AlexanÕre õa Silva, tio òe Garrett, a quem por muito
tempo foram atribuiòas as obras òo auctor Òo Frei Luiz
õe Sousa.
Aòmiraòa pelo seu 4alento e rara beleza que fez sucesso
na Corte õe Vienna ò'Austria, onòe esteve acompanhanòo
seu mariõo, o conõe òe Oyenhausem, Alcippe brilhou não
só nos Outeiros, onòe acorriam os poetas da Arcádia Lu
sitana, a ouvi-la, como se notabilisou pelo impulso que õeu
á nossa literatura.
Theophilo Braga, na Carta Prefacio que anteceõe o bem
feito e conscencioso livro õe D. Olga õe Moraes Sarmento
ôa Silveira, Mulheres Illustres, — A Marquesa de Alorna —
obra õonõe extrahi algumas òas notas que reproõuzo, òiz
õe Alcippe, «que teve o òom õe encantar os granões poetas
õo seu tempo, e õe iniciar a renovação literária Õo Proto
Romantismo, reconhecenõo e õiriginõo a vocação incipiente
õe Alexanòre Herculano>.
O quaõro, A solidão, que fez em Vienna õ' Áustria, atesta
os seus merecimentos como pintora òistincta.
As obras poéticas e traõuções õe Alcippe formam 6 vo-
lumes.
A já numerosa bibliographia Alorniana, foi enriqueciõa,
em 1916, com um interessante volume, intitulaõo A Mar'
que^a de Alorna, õe que é auctor o Senhor Marquez õ'Avila
e Bolama.
Poetisas Portuguesas 23
SONETO
Feito na cerca onde tabalhavam uns homens na agricultura
Feliz esse mortal que se contenta
Com a herôaôe õos seus antepassados,
Que livre Òe tumulto e òe cuiòaòos
Só òo pão que semêa se alimenta.
D'entre os filhos amaòos afugenta
A õiscoròia cruel ; vê õos seus gaõos,
Sempre gorõos, alegres, bem trataõos,
Numeroso rebanho que apascenta.
O throno mais õitoso é comparável
Ao branòo estabo oeste que não sente
De um sceptro õ'ouro o peso formiõavel ?
O que vive na Corte mais contente
Provou nunca um prazer tão agraôavel
Como o oeste Pastor pobre, innocente ?
Marqueza Õe Alorna. Obras Poéticas, Lisboa, 1844, volu-
me I, pag. 16.
SONETO
Di^endo-me uma pessoa que eu nunca havia de ser felij
Esperanças õe um vão contentamento,
Por meu mal tantos annos conservaõas,
E' tempo õe perõer-vos, já que ousaõas
Abusastes Õe um longo soffrimento :
Fugi ; cá ficará meu pensamento
Meõitanõo nas horas malograõas,
E õas tristes, presentes e passaõas,
Farei para as futuras argumento.
24 Poetisafi Pnr/n.gue^as
]á não me illuòirá um õoce engano,
Que não trocarei ligeiras fantasias
Em pesaõas razões òo õesengano. •
E tu, sacra VlrtuÒe, que annuncias
A quem te logra, o gosto soberano,
Vem õominar o resto ôos meus òias,
Marqueza õe Alorna. Obras Poéticas, volume I.» pag. 17.
SONETO
A El-Rei, estando eu muito doente, em Chellas
Um moribunõo esforço, um fraco alento
Inòicio ò'uma quasi extincta viõa,
Envia uma infeliz, triste, abatiõa,
DesÕe o leito ôa morte ao Régio Assento.
Moòéra, oh Soberano, o meu tormento.
Solta o Pae, por quem choro ôiviõiòa :
Esta voz, já sem força proferiòa,
Faça em seu peito branòo movimento.
Quatro lustros, passaõos na amargura,
Comprehenòe somente a minha iòaôe ;
Entfo no quinto, e mais na sepultura.
Ah ! consente, Monarcha, por pieõaôe,
Que mão paterna beije com ternura,
Mate o ^osto quem morre ôe sauõaõe !
Marqueza õe Alorna. Obras Poéticas, volume I, pag. 34.
Poetisas Portuguesas 25
D. MARIANNA ANGÉLICA DE ANDRADE
D. Marianna Angélica Õe Anòraòe nasceu em Souzel, em
11 Ôe Maio õe 1840 e faleceu em 14 òe Novembro Òe 1882.
Foram seus pães D. Maria Francisca Pereira õa Silva e
Joaquim Aníonio Serrano.
Foi em homenagem a sua maôrinha, D. Gertruões Angé-
lica õe Anõraõe Ligeiro, viuva õe um rico proprietário, e com
a qual viveu õesõe pequena, que D. Marianna Angélica õe
Anõraõe aõoptou os apeliõos que usava.
Esta Senhora foi casaõa com o ilustre e notável homem
Õe letras, Dr. Canõiõo õe Figueireõo. Desse matrimonio
houve õuas filhas, senõo uma õelas a poetisa D. Rosalinõa
õe Figueireõo Santos, õe quem igualmente me ocupo neste
trabalho.
D. Marianna Angélica õe Anõraõe, foi uma senhora muito
'nstruiõa. Deixou õispersos muitos vestígios õo seu talento,
na Ga^ieta Setubalense, õe que foi reõactora ; na Vo^ Fe-
minina^ jornal a principio só colaboraõo por senhoras; no
Aimanach de Lembranças^ etc.
Foi auctora õe uma comeõia, as Esporas do Alferes e
traõuziu vários romances, publicaõos em õiversos jornaes.
As suas proõuções poéticas constam õe õois volumes :
Murmúrios do Sado e Revérberos do Poente — (1882) preía-
ciaõos por Gomes õe Amorim. Este ultimo livro apareceu
poucos õias ôepois õe ter faleciõo sua auctora.
Com a õeviõa vénia, transcrevo o que se a acha a pag.
259 õo livro Figuras Literárias^ ' acerca õos Murmúrios do
Sado :
*0s Murmúrios do Sado são a traõução completa õos
sentimentos mais íntimos Õa autora, õas suas aspirações,
õas suas crenças, õas suas tristezas, õas suas alegrias, õos
seus õesalentos ; são as capelas õe flores, que as virgens
Dr. Oanii do de Figueiredo.
26 Poetisas Portuguesas
varsovianas arremessam á corrente, por se libertarem òe
ruins cuiôaõos.>
De D. Marianna Angélica ôe Anòraõe que ôescenôia òo
poeta Curvo Semeôo, também trata D. António õa Costa no
seu livro, A Mulher em Portugal.
Um ano depois òa morte òesta Poetisa, seu esposo reu-
niu, em folheto, as condolências que recebeu òe inõiviôua-
liôaòes em õestaque na nossa literatura.
Se não estou em erro, Camillo escreveu, a esse propósito,
uma sentiòa carta que figura no mencionado folheto que se
intitula : Quator^e de Novembro.
A MINHA ESTRELLA!
Jamais se esconda tua luz tão bella,
Formosa estrella de meu puro céu !
Ah ! que se um dia te não vejo pura,
Toda a ventura para mim morreu !
Eu te procuro quando o sol nos foge
E ainda hoje namorar-te vim !
Quando te vejo scintillar, querida,
Esqueço a vida n'este enlevo assim !
Esqueço tudo quanto abrange a terra ;
A paz e a guerra, e o prazer e a dôr!
Deixando aos homens a ambição, que arrasta,
A mim me basta teu feliz amor !
Se um dia, a vista, percorrendo espaços.
Não visse traços de tão meiga luz,
Ficava triste, sem amor, sem vida. . .
No chão cahida deporia a cruz !
Marianna Angélica de Andrade. SMurmurios do Sado, Se-
túbal, 1870, pag. 106 e 107.
Poetisas Portuguesas 27
XXXIII
MYSTERIOS DO TOUCADOR
Cassilôa foi ao baile, e tão formosa,
Que fez inveja a toôas as senhoras ;
Muito embora gentis, encantaõoras,
Nenhuma era tão bella e magestosa.
Tinha a cútis rosaõa e setinosa,
Tinha no olhar o brilho õas auroras,
Tinha as formas perfeitas seôuctoras ;
E ella passava altiva e õonairosa.
De walsas e sorrisos fatigaõa,
Assim fallou õepois com a criaôa
A sós, ao toucador venòo as feições :
<Fui rainha òo baile ! que patetas
São os homens ! Recolhe nas gavetas
Os òentes, o cabello, os algoòões >
Marianna Angélica ôe AnÒraòe. Revérberos do Poente,
publicação posthuma. Porto, 1883, pag. 93 e 94,
D. MARIANNA BELMIRA DE ANDRADE
D. Marianna Belmira õe Anôraôe é, segunõo penso, aço-
riana.
Em 1875, publicou em Ponta Delgada, um volume 5e ver-
sos, intitulado Phantasias, õo qual extrahi a poesia que apre-
sento.
Tem colaborado em vários jornaes, como A Folha, de
que é directora, D. Alice Moderno, no Almanach de Lem-
branças, etc.
28 Poetisas Portuguesas
Pertence, pois, D. Marianna Belmira õe Anõraòe, ao nu-
mero õas muitas Senhoras Açoreanas que, por suas virtu-
des e conhecimentos, se teem ôistinguiòo.
Lamento bastante, não ter nesta ocasião, os elementos
necessários para poõer completar a biografia Desta Poetisa.
A MINHA TERRA
(na montanha)
Quão bella, quão formosa nos parece
A terra onõe nascemos, onôe a infância
Alegre nos sorriu ÕescuiÕosa . . .
Toucaõa c)'alvas flores ! . . . Quanto amamos
Os sitios que risonhos percorríamos
Nos brincos infantis ; quanôo a innocencia
Com uma luz tão pura nos lembrava, ^
E entre as illusões ò'um mago sonho
A mente acalentaòa aòormecia !. . .
Por isso te acho bella, ó minha terra,
E quanòo a primavera nos assoma
A rir por entre graças e perfumes •
De pé sobre alto monte flexuoso.
Da tarõe ao pôr õo sol m'encontras sempre.
Alli sob a ramagem fluctuante
Dos alamos fronòosos que me cercam,
A vista se dilata embevecida ■ . .
O dorso da montanha que s'eleva
Coberto por formosas larangeiras.
Ao sopro animador da guarda amena
Desata-se em festões da côr de neve. • •
E as brisas que perpassam entre a folhagem
Correndo pelas copas do arvoredo,
Agitam-no qual manto prateado
Das auras ao capricho estremecendo . .
As aves voejando em borborinho
Poetisas Portiiqaesas 29
Aninham-se entre as ramas perfumaõas,
Soltanõo em suas notas feiticeiras
O hymno òa sauõaõe ao fim ôo ôia.
Alem a extensa renque ôe rochedos
Alçanõo-se imponentes, escarpaõos,
Em sua côr sombria traõuzinõo
Reflexos ôa poesia granõiosa •
Emquanto a contrastar co'a nuõez sua
E como a engrinalõar-llie a fronte altiva
Os cimos se recobrem Òe verdura.
Onôêa o arvoredo, alvas casinhas
Avultam aqui e alli emolòuranõo-se
Das fayas na lustrosa ramaria.
Em baixo o oceano quêôo e lizo
Estenôe-se indolente e suspiroso. . ■
Em doce languidez beijando a base
Da villa cujas casas agrupadas
Alli se apinham junto á verde encosta
Os homens que desHsam brandamente
Deixando após de si longas esteiras. . .
Parecem bellos cysnes resvalando
A' flor do crystalino e puro lago. - ■
Marianna Belmira de Andrade. Phantaúas, Ponta Delga-
da, 1876, pag. 61 e 62.
CONDESSA DE ALMEIDA ARAÚJO
(d. HERMÍNIA FRANCO d'aLMEIDA ARAUJo)
A Senhora Condessa de Almeida Araújo, D. Hermínia
Franco de Almeida Araújo, nasceu em Lisboa.
Era a filha mais velha dos Viscondes de Falcarreira. Foi
asada com o Sr. Joaquim Palhares de Almeida Araújo,
rande proprietário.
Aos dotes de formosura e coração, aliava a Sr." Con-
30 Poetisas Portuguesas
ôessa õe Almeiòa Araújo, um temperamento veròaòeira-
mente artístico que muito a fez sobresahir no nosso meio
intelectual.
Ainôa está bem viva na memoria õ'aqueles que tiveram
a feliciõaòe ô'assistir a alguns õos concertos, promoviòos
pela Schola Cantorum (funõaõa por Alberto Sarti, no pro-
pósito õe desenvolver entre nós o gosto pela musica reli-
giosa), a agradabilíssima impressão que receberam, ao
ouvir, alguns õos trechos que tão magistralmente foram
cantaõos nelas Senhora Conõessas õe Almeiõa Araújo e
õe Proença a Velha, õirectoras õa referiõa Schola.
Entre as composições que nestas festas õ'arte foram
cantaõas, por estas Senhoras, citarei o Stabat Mater õe
Pergolesi, A Rissurei^áo de Lazaro, õe Perosi e Ala porte
du Cloitre, õe Grieg.
Foi, ainõa, nestes concertos, que se tornaram celebres
entre nós, pela noviòaõe e pela forma porque foram exe-
cutados, que Alberto Sarti fez ouvir, alem õe algumas
Oratórias õo Abaòe Perosi, Terre Promise Õe Massemet»
Rcquien õe Mozart ; Sete Palavras õ'HaYÕn, a missa de
Palestrina, a Moabita, õe Thomaz õe Lima, o concertante
õo «Amor õe Perõição», etc.
Parte õestas notas obtive-as õo livro Horas d' Arte, õe
Alíreõo Pinto (Sacavém).
Em 1912, após uma curta existência, minaõa por granões
õesgostos, faleceu a Senhora Condessa õe Almeiõa Araújo»
a õistinctissima auctora õum pequeno e mimoso livro õe
versos — Villancetes — cuja beleza e sentimento faciimente
os leitores õesta Antologia avaliarão.
Estes Villancetes foram escriptos, no ultimo ano Õe sua
viõa, mais como expansão d'alma ferida, que, propriamente,
como manifestação poética.
Compilados postumamente por sua irmã, a distincta poe-
tisa D. Zulmira Franco Teixeira e prefaciados por Júlio Dan-
tas, é para lamentar que poucos conheçam os Vtllancetesi
por não ter a edição entrado no mer ca£c.
Poetisas Portuguesas 31
VILLANCETE
Para sempre ouvir lamentos,
Para sempre ouvir gemiôos,
De que serve ter ouvidos ?
VOLTAS
Os meus ouvidos, outrora,
Anôavam mal costumados :
Ouviam sempre trinados,
Cantigas a toda a hora.
Mas para ouvir só agora
Lamentações e gemidos,
De que serve ter ouvidos ?
Ai, meu Deus, mais me valera
Ensurdecer de uma vez,
Pois não ouvindo, talvez
Meu coração não soffrera.
Não ouvir, ai quem me dera !
Senhor, para ouvir gemidos,
De que serve ter ouvidos ?
Condessa de Almeida Araújo (D. Hermínia Franco d'Al-
meida Araújo). Villancetes, Lisboa, 1912.
VILLANCETE
A desgostos sempre afeita,
Nem eu já me lembro bem
Do gosto que um gosto tem.
VOLTAS
Se para sof frer nasci,
Não posso ter outra sorte :
Soffrerei até á morte,
32 Poetisas Portuguesas
Morrerei como vivi
Tantos òesgostos soffri,
Que nem já me lembro bem
Do gosto que um gosto tem.
Bem quizera em caba õia
Recordar gostos passaòos :
Nos òias amargurados
Algum consolo teria.
Ai, que viòa õ'agonia
Que nem já me lembro bem
Do gosto que um gosto tem.
Conôessa õe Almeida Araújo. 'Viliancetes. Lisboa, 1912.
D. MARIA CHRISTINA DE ARRIAGA
D. Maria Christina de Arriaga era a filha primogénita de
D. Maria Christina Pardal Caldeira de Arriaga e de Sebas-
tião ]osé de Arriaga Brun da Silveira e Peyrelongue, ultimo
morgado da família Arriaga.
Nasceu na cidade da Horta e faleceu em 21 ou 22 de
maio de 1915. Do que foi em vida esta virtuosa Senhora,,—
que tanto protegeu os pobres e os infelizes, e que a tantos
outros predicados juntava o de uma inteligência viva e de
um espirito cultivado, di-lo o jornal O Telegrapho, diário
noticioso da Horta, onde a morte de D. Christina de Ar-
riaga foi muito sentida.
D. Maria Christina de Arriaga era irmã de José de Arria-
ga, escriptor bastante conhecido e do dr. Manuel de Arria-
ga, auctor dos Cantos Sagrados e das Irradiações, o vene-
rando e probo primeiro Presidente da Republica Portu-
guesa, a quem devo parte d'estes apontamentos, que me
foram dados com a distincta e captivante amabilidade que
lhe eram peculiares.
Poetisas Portuguesas 33
Esta Senhora era, por sua avó, D. Maria òa Pieõaõe Ca-
bral õa Cunha Gooõolfim õe Ia Rocca, ôescenôente, entre
outras pessoas notáveis, ôe : El-rei D, Affonso terceiro, 15.*
neta; õo rei ôe Leão, Ramiro 2.", õuas vezes neta ; õe D.
Hugo Capeto, Duque Õe França, Conõe õe Paris e Õe Or-
leans, 12." neta.
D. Maria Christina õe Arriaga foi uma poetisa notável.
Em õezembro õe 1910, publicou, õe colaboração com seu
sobrinho Roque M. õe Arriaga, M. Emilio, Marcelino Lima e
Osório Goulart, um folheto, Paginas Soltas, cujo proõucto
se õestinava ao Albergue Nocturno õa ciõaõe õa Horta que
õesta Senhora recebeu granõe impulso. Cariõosa por exce-
lência, era raro o õia, e isto suceõeu õurante anos, que não
visitasse o asylo õe Menõiciõaõe, onõe levava consolo aos
velhos e Unitivos á miséria.
Alem õesse folheto, escreveu um livro õe versos — Flo-
res d' Alma, senõo também auctora õe muitos pensamentos
que pela sua elevação e conceito são õignos Õe nota.
Serviu-me ainõa õe auxilio, para traçar estas ligeiras no-
tas biográficas, uma obra monumental que, ha pouco tem-
po, foi ofereciõa ao õr. Manuel õe Arriaga que teve a gen-
tileza õe m'a Õeixar consultar.
Nesse volume que é õe õesusaõo formato, õe 217 pagi-
nas, e que foi compilaõo por António Manuel õa Silva, com
elementos postos á sua õisposição pelo Sr. Roque õe Ar-
riaga, acham-se reuniõos inúmeros artigos õe jornaes, ilus-
trações, folhetos, etc, que sem Õuviõa alguma virão a cons-
tituir, um õia, um preciosa elemento õe estuõo, acerca õo
õr. Manuel Õe Arriaga e õe sua familia.
UM SEGREDO
Quanõo a brisa vem beijar
O linõo cálix õa flor,
Lembro-me que traz õo sol
Alguns segreõos õ'amor.
34 Poetisas Portuguesas
Elle moranDo tão longe
Lá nesse azul õa amplibão,
Talvez faça confiòente
A suave viração.
De lá offerece seus raios,
A sua luz e calor ;
E' como prova eviòente
Que á floresinha vota amor.
E o amor não meõe õistancias
P'ra sua acção exercer,
Naõa ò'elle está isempto,
Tuòo poôe submetter.
Venõo a briza perpassar
Beijanôo o cálix õa flor,
Lembro-me trará õo sol
Algum segreòo ò'amor. . .
Maria Christina ò' Arriaga. Na Ala do Bem, n." 1. Dezem-
bro õe 1910. Paginas Soltas, pag. 20. Horta, 1910.
D. MARIA RIBEIRO ARTHUR
D. Maria Ribeiro Arthur nasceu em Lisboa. E' viuva òo co-
ronel ôe infantaria, Bartholomeu Sesinanòo Ribeiro Arthur,
auctor òe vários livros curiosos, entre os quaes citarei:
(íírte e Artistas, 3 vol.; Da Legião Portuguesa ao serviço
de Napoleão, etc.
Em D. Maria Ribeiro Arthur, que é uma senhora muito
instruiõa, teve seu mariòo uma granõe auxiliar, nalguns ôos
seus trabalhos literários.
No jornal O Repórter, òe 1896, escreveu esta Poetisa os
seguintes artigos : Veraneando e Recordações de Peniche
Poetisas Portuguems 35
€ no jornal Branco e l^égro : aEnire o Cabo Carvoeiro e as
Berlengas, Viagens no Paij, Peniche, Pelas Margens do
Mondego^ Margens do Lima, Saudades do Lima, etc.
Também colaborou no Jornal da Infância onòe publicou
va rias poesias, Universo, etc.
Actualmente, resiòe D. Maria Ribeiro Arthur, em Louren-
ço Marques, onÒe vive em companhia ôo seu filho, o En-
genheiro SesinanÕo Ribeiro, Arthur sub-Ôirector ôo Cami-
nho De Ferro.
A MINHA PÁTRIA
Minha Pátria, és tão formosa
como as pétalas õa rosa
que nasce no solo leu !
Como é azul o teu céu,
sauòoso o teu arrebol !
As tuas flores õe matiz
tão variaõo e feliz,
que mimosas, que gentis
á viva luz Òo teu sol !
Que noites tão perfumadas!
que linòas as maõrugaõas l
Tens nos teus praõos bellezas,
tens nos teus campos riquezas
que poucos como tu tens ;
mas um Tejo tão formoso,
um Ave a gemer sauÒoso,
um Douro tão alteroso
como tu não tem ninguém !
E a rainha õo occiòente
recostanòo-se inòolente
pelas montanhas em flor,
a sorrir-se, toõa amor,
36 Poetisas Portuguesas
quando a bafeja o luar,
p'ra o namoraòo que a véla,
que a faz tão rica e tão bella,
e que prostraõo aos pés ò'ella
Ih'os vai submisso beijar!
Tens as veigas ôo teu Minho,
e no teu Algarve um ninho
ô'amor, sob o sol arõente,
tens, erguiôo altivamente,
á liberôaôe um paòrão
sobre as fraguas ôo teu Douro,
que salpica areias ò'ouro :
o teu seio é um thesouro,
a tua voz uma canção 1
Como te amo pátria qu'riõa
que foste tão alto erguiòa
na Ivra ôo teu Camões,
que ouviste as meigas canções
ôo mimoso DernarÔim
ôe Garrett as harmonias,
õe Castilho as meloôias,
soltas por formosos ôias
sob a olaya Ôo jarôim.
Que tiveste um Herculano
para com trabalho insano,
pelo pátrio amor levaôo,
ir Ôo abysmo ôo passaôo
tua historia levantar
e nas paginas ôa historia
que é para ti toôa a gloria»
ôe que heroes a memoria
se vê altiva brilhar !
Poetisas Portuguesas 37
Oh pátria, eu amo-te tanto
que por ti quizéra um canto
soltar, um canto õivino,
mas como é pobre meu hymno
para ti meu Portugal,
que o rouxinol amoroso
escutas, meloòioso
soltanõo o trinar sauõoso
òebaixo òo laranjal !
Maria Ribeiro Arthur. O Universo lllustrado. Semanário
ôe Instrucção e ôe Recreio, Lisboa, 1879, pag. 127 e 128.
D. MARIA HELENA JERVIS DE ATHOUGUIA
E ALMEIDA
D. Maria Helena Jervis õe Athouguia e Almeiõa nasceu
na ciõaôe õo Funchal. Pertence a uma familia ilustre òa
Ilha ôa Madeira — os Jervis Ôe Athouguia,
Tenõo ficaôo órfã Ôe pae aos nove anos õe iõaõe, fof
resiòir para o campo, na encantadora alòeia õe Nossa Se-
nhora ôo Monte, um õos pontos mais linõos õa formosa e
fértil Ilha õa Maõeira, local este que, sem õuviõa alguma,
contribuiu pela sua fascinante belesa, para que no juvenil
espirito õa Poetisa õe que agora me ocupo, se õesenvol-
vesse o gosto e o amor pela poesia, que tão expontanea-
"lente lhe brotaram õ'alma.
Trinta e tal anos esteve D. Maria Helena Jervis õe Athou-
: guia e Almeiõa fora õa sua terra natal.
As impressões que recebeu esta õistincta Senhora, ao
! tornar a ver a alõeia onõe passara parte Õos primeiros
anos õe sua mociõaõe, exprime-as numa linguagem simples
e comovente na sua poesia intutulaõa iV/<m dia chovoso.
Apesar õe D. Maria Helena Jervis Õe Athouguia haver
38 Poetisas Portuguesas
enviuvaòo e contratempos Ò3 varia natureza a terem afas-
taòo ôo convivio ôas Musas e õos estuõos, que sempre fo-
ram o seu enlevo e a que com tanta meticulasiôaòe e cons-
ciência se aplica, em 1909, apareceu a 2.» eôição Òo seu livro
Òe versos, Mosaicos, prefaciaòo por Sena Freitas.
O proõucto òa venôa òesta obra que sahiu sob o pseu-
Ôonimo õe Bertha de Athaide, õestinava-se a socorrer tu-
berculosos pobres.
A 3.* eõição ôos Mosaicos que Ôeve aparecer em breve,
contem bastantes poesias ineõitas.
De rêve en rêve
L*amour nous prenõ
En riant.
De rêve en rêve
L'amour s'enfuit
En pleurant.
Bertha ôe Athayôe. Mosaicos, 2.» eÒição, pag. 65.
A LAGRIMA
S.iUt lacrimae reram.
(Eneida).
VIRGI. IO.
Nasce no berço a lagrima
Tão õoçe e crystallina
Como o orvalho ôo céu ;
E morre sobre a campa,
Amargurada e triste,
Como ôa treva o véo.
E' que na infância a lagrima
E' filha õo sorriso ;
Tem prismas õa Alvoraòa
Que vem Ôo Paraíso
Poetisas Portuguesas 39
Mas a que òesce ao túmulo
Deriva Õa sauôaõe
Vem õas existências finõas,
ReÒime a humaniõaõe.
Nos lirios e nas rosas,
Em seus formosos cálices,
Ha lagrimas também ;
Penosas õeslisanòo
Quanõo, no seu canteiro
As colhe õa haste alguém.
Do naôa, nos abysmos,
Pois o pranto, não é
Filtraòo pela õôr
Dos martyres ôa fé ?
Lá no munòo ôos munôos
Caòa estrella que nasce
Caminha e resplandece,
Deixa canôente o sulco
No pranto maguaõo
D'um astro que esmorece.
Bertha òe Athayõe. 'íMosaicos, 2.' eõição, pag. 107 e 108.
REMINISCÊNCIA
Eu me lembro ainòa era pequenina —
D'uma noite. - . que noite sem luar !
Cahia tanta chuva. . . tanto frio . .
Que toôos se acolhiam junto ao lar.
Não se viam estrellas reluzentes
Espreitando ôe Vénus os amores ;
Nem õas faõas se ouviam as ballaôas,
Nem òos campos brotavam lindas flores.
40 Poetisas Portuguesas
E no horror õ'essa noite procellosa,
Minha mãe me ensinava uma oração,
Para o vento amainar, õo mar as onôas,
E ôesviar õo munõo a maldição.
E òepois, no meu berço Ô'innocencia,
Embalavam-me os anjos a sorrir. . .
Quanòo eu também alegre e já sem meòo,
Sorria-me para elles a õormir.
Dertha Òe Athayõe. Mosaicos, 2.» eôição, pag. 97 e 98.
«AZUL» "^
(D. ZULMIRA DE ALMEIDA FRANCO TEIXEIRA)
D. Zulmira ò'Almeiõa Franco Teixeira nasceu no Rio òe
Janeiro. E' filha ôe D. Carolina Augusta Ferreira ò'Almeiôa,
Viscondessa õa Falcarreira e ôe Pompilio Augusto Gonçal-
ves Franco, Visconde õo mesmo titulo, Fidalgo Cavaleiro
da casa Real, Comendador das Ordens de Christo, da Con-
ceição, etc, e uma das figuras mais insinuantes õo seu
tempo e que tantos benefícios proõigalisou, protegendo os
pobres e desamparados.
Pelo lado materno é D. Zulmira ò'Almeida Franco Tei-
xeira aparentada com as famílias do Conde de Carvalhiôo
e do Visconde de Ferreira d'Almeida, o importante e co-
nhecido banqueiro brazileiro.
D. Zulmira Teixeira que é casada com o Sr. Luiz Virgílio
Teixeira, antigo Deputado da Nação e 1." Secretario de
Legação que durante muitos anos prestou serviço nas Le-
gações de Portugal, em Madrid e nò Rio de Janeiro, é neta
de ]osé Gonçalves Franco — fundador da primeira casa
Bancaria Portuguesa, do seu tempo, que foi pae do Vis-
Poetisas Portuguesas 41
conôe õa Falcarreira e òo Marquez õe Franco que lhe su-
cederam na gerência Ôe seus importantes negócios.
Apesar õe uma ou outra vez terem siõo publicadas na
Ilustração Portuguesa, Jornat da Mulher^ Diário de Noticias,
Dia e noutros jornaes, poesias òe D. Zulmira õ'Almeiõa
Franco Teixeira que tem usaòo sempre o pseudónimo
A^uL a maioria Õas inúmeras composições poéticas que,
ôiga-se òe passagem, sua Ex.^ produz com extraordinária
facilidade, está inédita, devendo uma parte desses versos
figurar numa luxuosa obra em que trabalha ha bastante
tempo esta Poetisa.
A este livro está assegurado, por certo, grande êxito no
nosso meio literário e artístico, successo para que contri-
bue não só as apreciáveis e belas produções de sua au-
ctora, como também as assignaturas òe distinctos Mestres
que, inspiranòo-se nos versos Òe D. Zulmira Teixeira, fir-
mam as aguarelas, pasteis, sanguíneas e musicas que Òeve-
rão ornar esta Obra que ficará senòo um granòe e notável
Repositório d'Arte.
NO ANNO DE 1917
(inédito)
O' coração humano ! Obra divina,
Sacrário de clemência e de doçura
Emprestado por Deus á creatura
E aonde a clara face Elle reclina :
O que é feito de ti, ó pequenina
Parcela de uma essência forte e pura ?
Como te ha de encontrar quem te procura
Hoje, na humanidade que se arruina ?
Só vejo — ó dôr ! — por esse mundo vasto,
Nuvens de fogo, e em sanguinário rasto,
. Crimes dos homens que perdidos vão . .
42 Poetisas Portuguesas
E o coração, fonte Ôe amor constante,
MuÒaõo é errefeciòo a caòa instante,
Na taça venenosa õa ambição.
<Azul> (D. Zulmira õ'A!meiôa Franco Teixeira).
O OUTOMNO
Dias òe Outomno, õias sem eguaes !
O sol tem fogo, mas não queima, aquece.
Se já òo trigo não se avista a messe,
Chilreiam ainõa alegres os parõaes.
Sob os troncos erectos õos pinhaes
— Braços õa natureza em muòa prece
A urze côr òe rosa até parece
Tapete òe aòornar paços reaes.
Nos castanheiros riem os ouriços.
E Òeixam tremulanòo, moviòiços,
Cahir o fructo novo, cheio e são.
E eu julgo-me òoiraòa e fina abelha
— Scismo na tua bocca tão vermelha
Ao vêr meòronhos rubros pelo chão.
«Azul> (D. Zulmira ò'Almeiòa Franco Teixeira).
TU E SÓ TU
De ti só veio a minha musa triste.
Para ti vae o meu cantar magoaòo ;
As tristes notas ôo meu triste faòo
São para ti, ó Bem que me fugiste :
Poeíisas Portuguesas 43
Em ti só vivo e lá comtigo assiste
Meu pobre coração alanceaôo :
Para ti, o meu sonho illuminaôo,
E's a essência òe tuòo quanto existe.
Só os teus õeôos ò'oiro me susteem
O' meu eterno mal meu õôce Bem
Quero òeixar-te e sinto que não posso . .
Se ao menos juntos e na mesma cova
Poôesse, aberto n'uma seiva nova,
Florir n'um livro, caôa beijo nosso !
«Azul» (D. Zulmira Franco òe Almeiõa Teixeira).
SOL
(inédito)
Ninguém òeve ôizer «Esse õia linôo !>
Por que faz sol e que athmosphera é calma
Devemos consultar os olhos ô'alma,
— Olhos que só a ventura vae abrinòo.
Que nos importa o Ceu e o mar infinòo,
Do lirio a flor ou ôa palmeira a palma
A fonte que refresca e nos acalma
Ou a espiga que õe pão nos vae nutrinòo ?
O que poõe affligir a noite escura
A quem n*ella se encontra ou se aventura
Ou que as estreitas fujam ôe onôe estão ?
Que nos importa um temporal õesfeito,
Se sentimos calor dentro ôo peito.
Se é Õia claro em nosso coração ?
tAzul» (D. Zulmira Franco ô'Almeiõa Teixeira).
44 Poetisas Portuguesas
VISCONDESSA DE BALSEMÃO
(d. CATHARINA MICHAELA de SOUSA CÉSAR
D li LENCASIPE)
A Visconõessa õe Balsemão, D. Catharina Michaela Ôe
Sousa César ôe Lencastre, primeira VisconÕessa õo citaòo
titulo, nasceu em Guimarães a 29 òe Setembro òe 1749.
Foram seus pães D, Rosa Maria ôe Viterbo César Õe Len-
castre, filha ôos segunòos viscondes Ò'Asseca e Francisco
Filippe òe Sousa òa Silva Alcoforado.
Foi casaôa com o primeiro Visconôe õe Balsemão, Luiz
Pinto õe Sousa Coutinho, antigo governaôor õa Capitania
õe Matto Grasso e õiplomata e estaõista.
Acerca õa VisconÕessa õe Balsemão que foi amiga in-
tima õa Marqueza õe Alorna {Alcippe) e õe D. Francisca
Possolo, outra poetisa notável õessa época, õiz o Diccio-
nario' Popular Õe Pinheiro Chagas :
«Cheganõo á capital õa Grã Bretanha, conheceu D. Ca-
tharina quanto era õeficiente a instrucção que havia rece-
biõo e buscanõo õiversos pretextos para se afastar õa so-
cieõaõe, viveu por mais õe um anno em completo isolamento
entregue ao estuõo õas línguas e litteratura ingleza, fran-
ceza e italiana>.
«Depois õesse tempo õe reclusão, a que voluntariamente
se conõemnára, appareceu nas reuniões õa corte e em sua
própria casa se juntavam os homens mais õistinctos õe
Lonõres, e pela convivência com as illustrações õ'essa
granõe ciõaõe alargou os conhecimentos que havia aõqui-
riõo õurante o seu isolamento>.
Ao regressar a Portugal, teve granõe numero õe aõmira-
õores, senõo a sua casa frequentaõa por õistinctos cultores
õa poesia e õas belas letras.
Poucas foram as proõucções poéticas õa VisconÕessa õe
Balsemão que foram publicaõas.
O Soneto Mesericordia que reproõuso, foi feito por D.
Poetisas Portuguesas 45
Catharina, em 4 õe Janeiro õe 1821 (òia em que faleceu),
ôepois õe ter cumpriõo os últimos õeveres religiosos que a
sua consciência lhe ôictou.
O Saceròote, que assistia aos últimos momentos ôa Vis-
conõessa òe Balsemão, e a quem ela peôiu que lesse essa
composição, não pouõe passar alem Òa 2.» quaôra, pois
que ao começar a ler o primeiro terceto, faleceu D. Catha-
rina.
Os trabalhos mais notáveis õa Visconõessa õe Balsemão,
são:
Ode ao Marque^ de Pombal, o seu soneto â morte de Go-
mes Freire e as suas proõuções inspiraõas pela Revolução
Õe 1820.
Pela forma porque nas suas composições õescrevia o
amor, foi cognominaõa a Sapho Portuguesa.
MESERICORDIA
Granõe Deus! que Õo alto õ'esse throno,
Lanças o braço ao peccaõor contricto ;
Escuta Õo remorso humilõe grito,
Das tuas leis perõôa o abanõono.
Tu, õa graça efficaz único Õono,
Que nunca a pena igualas ao õelicto,
Dá-me socego ao coração afflicto.
Tão próximo a jazer no eterno somno ! . .
Bem õebaixo õe magica apparencia
Encobri os requintes Õa malõaõe.
Mas qual é hoje a triste consequência ?
Ah ! Senhor ! recebei-me com pieõaõe ! . .
Tiraste-me õo abysmo õa impruõencia,
Dai-me uma venturosa eterniõaõe.
Visconõessa õe Balsemão (D. Catharina). Àlmanack Luso
Brasileiro para 1858, pag. 237.
46 Poetisas Portuguesas
SAPHO
Sapho ao mar se precepita
Por impulso ôa paixão,
Vinga em si o alheio crime
Da perfiòa ingratiõão.
Muitos annos respeitaòo
Foi o peneôo fatal,
Mas por força õ'um exemplo
Logo um mal causa outro mal.
Se fizessem assim toõas,
Que se vêem ôespresaõas,
Forão ôe victimas tristes
As brancas onõas coalhaòas.
Sem ti que vale a firmeza,
O' santa conformiõaòe ?
Tu a perõoar ensinas
Loucuras òa humaniòaõe.
Viscondessa õe Balsemão (D. Catharina). Almanack de
Lembranças Luso- Brasileiro para o anno õe 1863. Lisboa,
1862. pag. 376.
UMA PAIXÃO
Inòa existe, cruel, inòa em meu peito
Se nutre òa paixão o fogo activo ;
Inôa contra o teu gosto por ti vivo,
Fazenôo o sacrifício mais perfeito.
Inôa te aõoro, ainôa te respeito.
Venõo em ti õe meus males o motivo,
Porem o coração, õe amor captivo.
No captiveiro vive satisfeito.
Poetisas Portuguesas 47
Se ás vezes contra ti queixumes solto,
Do que fiz insensato então me aõmiro,
E aos meus antigos sentimentos volto.
Só por ti vivo, só por ti respiro ;
Sahirá com a minha alma em pranto envolto,
Teu nome uniòo ao ultimo suspiro.
Visconôessa õe Balsemão (D. Catharina). Almanack de
Lembranças, 1857, pag. 227.
D. HORTENCIA PAULINA DE LIMA
BARBOSA
Apesar õe D. Hortencia Paulina õe Lima Barbosa, ter
«scripto ôiversas vezes, na Grinalda, jornal Ôe poesias
ineõitas, publicaòo no Porto, nos anos òe 1855 a 1869,
pouco sei acerca besta Poetisa a quem Innocencio se não
refere no seu Diccionario.
Esta Senhora viveu em Ponte Òa Barca, localiòaòe ôon-
í>e ôatou algumas ôe suas proõucões poéticas.
Na Grinalda que é um jornal curioso e bastante apre-
ciaôo, e que teve seis anos õe existência (caso raro entre
nós, em publicações õesta natureza) alem òe Nogueira
Lima e J. M. B. Carneiro, seus redactores, colaboraram :
Guerra Junqueiro, Alexandre Braga, Alexandre õa Concei-
ção, Alberto Pimentel, Augusto Luso, Camillo Castello
Branco, Custodio José Duarte, D. Clorinda M. Ernesto
Pinto de Almeida, Faustino Xavier de Novaes, Francisco
Joaquim Bingre, Sousa Viterbo, Guilhermino de Barros,
João de Deus, José Maria de Sousa Monteiro, José Ramos
Coelho, Júlio Diniz, Furtado Dantas, J. Guilherme Lobato
Pires, J. M. Barbosa Carneiro, J. M. Nogueira Lima, Ma-
nuel Duarte d*Almeida, D. Maria Amália Vaz ôe Carvalho
48 Poetisas Portuguesas
D. Mariana Belmira Ôe Anòraôe, D. Maria Peregrina õc
Sousa, Soares òe Passos, Theophilo Braga, Thomaz Ri
beiro, etc.
A PASTORA
Sou pastora, sou feliz
Meus rebanhos apascento ;
Na veròe relva me sento,
Colho as rozas côr ôe Hz,
Os jasmins e brancos lirios.
Louros verões e martirios.
Vejo as margens encantaôas
Do meu Lima, tão formoso*
Deslisanòo preguiçoso
Sobre as areias õouraõas ;
Vejo o sol no céu brilhante
De mil raios fulgurante.
Góso as noites tão saudosas
Em que a lua prateaòa.
De mil estrelles cercada,
Corre as campinas vistosas ;
Vejo nascer linòa aurora.
Que com seu brilho namora.
As auras vejo brincando
Co' as flores lindas mimosas,
As folhinhas graciosas
Sobre a terra debruçando.
Pela manhã orvalhadas,
A' tarde do sol crestadas.
Sou pastora, sou feliz.
Meus rebanhos apascento ;
Na verde relva me sento,
Poetisas Portuguesas 49
Colho as rosas côr Òe Hz,
Os jasmins e brancos lirios
Louros verões e martírios.
Hortencia Paulina ôe Lima Barbosa. A Grinalda, pag. 21
e 22, terceiro anno, Porto, 1860.
D. MARIA JACINTHA TEIXEIRA BASTOS
D, Maria Jacintha Teixeira Bastos nasceu em Lisboa.
E' filha õe D. Marina CanÔiÔa Villaverôe Teixeira Bastos
e 5o faleciõo publicista e poeta Francisco ]osé Teixeira
Bastos, auctor õas Vibrações do Século, Õos Rumores Vt4l-
caniços e ò'outros trabalhos literários õe valor.
Dos quinze para os õezaseis anos, escreveu, esta Senho-
ra, uns contos para creanças, os quaes foram publicaiios
em vários jornaes òa província.
Datam, aproximadamente, õessa época, as poesias que
insiro, e que senõo íneõítas, ôevo á amabiliôaòe Ôe sua au-
:tora, queé casaõa com o õistincto aòvogaõo Dr. João Va-
erio òas Neves Pereira, caricaturista õe merecimento.
O FUTURO
(tnedito)
Que é o futuro ?
Enigma escuro
P'ra nossa alma !
Na víõa calma
Que se õisfructa,
Ninguém prescruta
O que elle trará.
E' boa a viõa
. Na sua liõa.
50 Poetisas Portuguesas
Com tantos sonhos,
Doces, risonhos
Se vae passanôo,
Não nos lembranòo
Qual elle será.
Granôes castellos,
Linòos e bellos,
P'ra que os fazemos?
Se nós sabemos
Que p'ra o futuro
O íaõo ouro
Destrui-Ios-ha.
Futuro incerto !
Será ôe certo
No fim a morte.
Com esta sorte
Triste que temos
Nunca sabemos,
Como elle virá.
Maria jacintha Teixeira Bastos.
MEU CORAÇÃO
(inédito)
Está ôoiòo ! Mas que querem ?
Ficou assim, coitaòo,
N'um õia malfa<>aÒo,
Por uns olhos que ferem.
Olhou -os sem pensar
Que uns olhos tentaòores
PoÕem matar õ*amores
Aquelle que qs fitar.
Poetisas Portuguesas 51
Não mais teve alegria
Prenõeu-se e assim ficou
E aqueile que o matou
Ao vê-lo assim sorria.
Doiõo ! Quer-se matar !
Não ha um só momento
Que o seu negro tormento
O òeixe socegar,
Maria Jacintha Teixeira Bastos.
D. ELISA TOSCANO BATALHA
D. Elisa Toscano Batalha nasceu em Portel, uma ôas
mais soberbas localiòaões òo Sul õe Portugal, vila alente-
jana, onõe viveu por largos anos, e que ôista umas oito
léguas õ'Evora,
Ha anos, publicou o seu primeiro livro Òe versos, ao qual
ôeu o titulo õe Crepúsculos.
Passanõo a residir na Capital, tem esta Senhora colabo-
raòo, em prosa e verso, em vários jornaes e revistas.
Para o Jornal da Mulher, alem õe varias poesias, escre-
veu D. Elisa Toscano Batalha um ligeiro estuòo histórico,
baseaõo numa novela Castelhana, Jaritla, cujo enreõo se
prenõe com certas passagens õa nossa historia Pátria.
Esta õistincta Poetisa, que tem um fervoroso culto pela
Literatura que aõora, trabalha numa serie òe crónicas e
artigos que se referem á sua terra natal e arreõores, escri-
ptos que tenciona publicar num õos jornaes òe Lisboa.
Em 1915, o seu soneto que cito. Meu Tormento, obteve a
segunòa classificação, num concurso aberto pelo meneio -
naòo Jornal da Mulher.
52 Poetisas Portuguesas
MEU TORMENTO
<Como sofre !> — me òiz 5oce e excessiva
E tomanõo-me as mãos — «que õesalento !
Vê-se que ôa òesgraça o cruel vento,
Aqui soprou, com inclemência viva,
EncaneciÔa tem a pensativa
Fronte (assim posta quasi n'um momento)
Ah ! vamos, faça meu o seu tormento
Conte- me essa occorrencia pungitiva!
E calou-se. Entretanto, eu òigo assim :
Bemòita seja, teve Òó òe mim,
Commoveu-a a minha alma angustiada !
Quer saber as razões ?• . pueris talvez. . .
Olhe, certo vai rir-se ôesta vez,
E' que eu amei . . amei sem ser amaõa !
Elisa Toscano Batalha. Jornal da Mulher, n.' 97, ôe 30-5-
1915, 5.* anno, pag. 1409.
AN]INHO INFORTUNADO
E' pequenita. Só teas
Dez annos e é fraquinha ;
Alva loira, õelgaôinha.
Costuma, õe quanòo em quanòo,
Peòir-me a sua esmolinha.
Parece não ter ninguém ;
Vejo-a sempre sósinha.
Pobresita ! quanòo peòe,
Não insiste, não se exceôe.
Poetisas Portuguesas 53
E é só, com moòeração,
Que co'a ôor nos olhos seus,
Peôe, pelo amor õe Deus,
Um boccaõinho ôe pão.
Ontem, òiante Òe mim,
Alguém lhe fallou assim !
— A tua mãe onôe está ?
Porque não vai ela aqui,
Caminhando a par ôe ti,
E a terna mão te não õá ?
Porque, õe negro vestida,
Vagueias tu, sem guariba.
Pelo munôo, ao Deus ôará ? —
Ao que ela, então, responôeu !
— A minha mãe está no ceu,
Acompanha-me õe lá. —
Elisa Toscano Batalha. Echos da Avenida, Lisboa, Julho
õe 1916.
DE VOLTA AO CURRAL
Campina em fora, pela estraõa real,
Eles lá vêem. Buscam o õoce Abrigo
— Formosos bois —
Vêem õo pascigo.
Vêem no passo lento natural.
Entretanto, refulgem já no Ar
Estrellas ; por isso ele, o bom amigo
Maioral (um honraôo servo antigo)
Grita, õe vez em vez, p'ra os animar.
54 Poetisas Portuguesas
E a sua ruõe voz (mas carinhosa)
Casa-se aqui, então c'o som ôolente
Dos chocalhos e esquiías. Belamente,
Numa ingénua toaòa harmoniosa ■ .
Mas eis chegam emfim. Corre o maioral
A abrir ôe par em par o amplo portão,
E eles lá entram todos, Òe gangão,
P'ra ôentro õo vastíssimo curral.
D'aqui vão p'ra cabana, sem õemora,
E ali, ôepois, os levam a tomar
O seu logar á farta mangeõora,
Aonôe os prenôem.
Chamam-nos (é òo maioral a voz)
Chega cá Baixel ! eh ! chega Galante !
Pachá, Formoso! ■ » Emfim, toòos e toôos
— Que graça ! — logo vão, no mesmo instante.
Bonacheirões, um e outro e outro após .
Então, estanôo toÔos já afinal
No seu logar, comenôo a sã ração
E tuõo assim sereno
Ceia o maioral : toicinho e pão moreno,
Numa òoce e perfeita quietação. . .
Elisa Toscano Batalha. Jornal da Mulher, 3." ano, n," 16
Õe 30-5-1913, pag. 573.
Poetisas Portuguesas 55
MERCEDES BLASCO
(d. conceição victoría marques)
Mercedes Blasco nasceu no baixo Alemtejo como a mes-
ma õeclara no seu livro, Memorias de uma Actrij, publica-
do em 1908 (2." eòição), obra òonõe extraí alguns Õos Òa-
Òos que figuram nestas notas biográficas.
Também usou em cartazes teatraes, os nomes õe Judit
Mercedes Blasco e Õe Judit Mercês.
O verõaõeiro nome õe Merceôes Blasco, é Conceição
Vicioria Marques.
Até aos 7 anos òe iôabe viveu com seus pães na Anda-
luzia.
Depois passou a resiòir no Porto, onõe se instruiu.
Seu pae, José Maria Marques, tinha especial empenho
em que a filha cursasse Medicina.
O temperamento irrequieto e a atracção profunda que
sobre Mercedes Dlasco exercia a vida teatral, não lhe per-
mitiu fazer esse curso, tendo sido, todavia, aluna da Escola
Normal.
Um belo dia, sendo ainda menor, foge de casa pela se-
gunda vez — mau grado o horror que seu pae tinha pelo
teatro — e faz a sua estreia artística no teatro Chalet, do
Porto, sendo-lhe confiados os primeiros papeis.
Em Lisboa, trabalhou nos teatros da Trindade e Avenida.
Mercedes Blasco fez parte da companhia do teatro da Trin-
dade, desde outubro de 1890 a maio de 1899.
Entre outras peças representou : Mam'^elle Nitouche,
Moira de Silves, Piparote, Miss Helyette, O burro do Sr.
Alcaide, etc.
As suas principaes creações que lhe mereceram a popu-
laridade de que gosou, foram : o Morgadinho do brasileiro
Pancracio,o Diabo Eléctrico, Miss Helyette, 28 dias de Cla-
rinha, Solar dos Barricas, Mam^^elle Nitouche, etc.
Inteligente e dotada de uma bonita voz, Mercedes Blasco
56 Poeíisaè Portuguesas
ez sucesso, não só nas peças mencionaòas como tamben
cantando faõos e canções.
Representou no Pará, e em MaÔriò nos teatros Lara
Moderno e Romea. Em Lisboa, também trabalhou no Rea
Coliseu òe Lisboa, Aveniòa, Rua bos Conòes, D. Amélia, etc
A' bibliografia teatral portuguesa — ôe que neste momen
to me lembro terem siòo publicaòas as obras : JSo Theain
e na Sala, por D. Guiomar Torrezão ; O l^htatro em Fralda
por Olòemiro César ; liecordaçôes aa Scetia e de Fora d'
Scena, por Augusto Rosa ; Impressões de Theaíro, por Bra:
Burity ; Estros e Palcos^ por Luciano Corõeiro ; A Litera
tura dramática em Portugal^ por ]. M. õe AnõraÔe Ferrei
ra ; alem òos volumes sobre o actor António Peôro, Angeli
Pinto e Palmira Bastos — o livro òe Merceões Blasco i
mais um elemento que se vem juntar.
BOHEMIA
No seu olhar, tão negro e revoltoso,
Luzia a chamma õe infernal malícia . . .
Um riso branõo, um rastro òe caricia,
Brincava- lhe no lábio apetitoso. .
E o manòolim trilhava òôcemente
Sôb a pressão arõente òos seus òeòos,
A murmurar-lhe uns òivinaes segreòos. .
SeguinÒo assim religiosamente,
Uma canção singela e òesolaòa
D'um estribilho languiôo e fremente,
Recorõação òe tempo mais risonho,
— Talvez òa infância pura e Òescuiòaòa —
Que ela cantava òistrahiòamente.
A alma a errar pela ampiiòão ôo Sonho ! .
Merceòes Blasco. Musa Hysterica, Lisboa, 1908.
Poetisas Portuguesas 57
CASTA...
Quanõo a vejo passar, como o luar serena,
Luzindo- lhe o puõor no meigo olhar escuro,
Tenho a visão gracil òa palliõa assucena,
Brotanòo altiva e sã ôas peôras ò'um monturo.
O oiro ôo cabello enrosca-se vaiòoso,
Deijanõo-lhe, egoísta, a nuca õe setim. . •
Das faces o palor òá-lhe ao perfil gracioso.
Um mysticismo iòeal õe virgem ôe marfim. . .
E vae seguinôo alem, sem sombra ôe amargura
Roçanõo a poõriõão e o vicio a caõa esquina !
E naõa vae manchar-lhe a virginal canòura
Do riso que lhe encrespa a bôcca purpurina !
Por isso, ao vêl-a ir, como o luar serena,
Luzinôo-lhe o puõor no meigo olhar escuro.
Tenho a visão gracil ôa palliõa assucena,
Brotanòo altiva e sã òas peõras õ'um monturo.
Merceões Blasco. oMusa Bysterica.
D. ESTHER AMÁLIA DA CUNHA BELÉM
D. Esther Amália ôa Cunha Belém nasceu em Coimbra, a
25 Òe ]ulho ôe 1856.
E' filha õe D. Magõalena Emilia õo Carvalhal õe Miranõa
õa Silveira Vasconcellos e õo Dr. António Manoel õa Cunha
Belém, cirurgião em Chefe õo Exercito, e auctor õe muitos
rabalhos literários e scientificos.
Colaborou no Almanach das Senhoras, no Almanach D
uíf, na Creche, no Diário lllustrado (onõe publicou, alem
^Q poesias, perfis e biografias), e na Lisboa Creche.
Lisboa Creche, é um pequeno e interessantíssimo jornal
53 Poetisas Portuguesas
que foi publicaôo em Lisboa em Maio ôe 1884 ; foi seir
eòitor Daviò Corazzi.
Teve por directores artistico e literário, respectivamente,
Rapliael Borôallo Pinheiro e o Dr. Xavier Ôa Cunha, inôi-
viôualiòaôes consagradas no munõo intelectual.
Neste jornal miniatura que é ilustrado e que traz o fac-
simile 5a assignatura ôe caòa escriptor, colaboraram, entre
outros, em prosa e verso :
D. Esther ôa Cunha Belém, D. Guiomar Torrezão. Dr.
Cunha Belém, D. António ôa Costa, Brito Aranha, Camillo
Castello Branco, Christovão Ayres, Barros Lobo, Eôuarôa
Viôal, Gomes ôe Amorim. Fernanôes Costa, Fernando Cal-
Ôeira, Fernanôo Palha, Francisco Palha, Fonseca Benevi-
Ôes, Gervásio Lobato, Guilherme Ennes, Guilhermino de
Barros. Lopes ôe Mendonça, Oliveira Ramos, Andrade
Corvo, Pinheiro Chagas, Jaime Victor, Júlio César Machado,
Palmeirim, Moura Cabral, Pedro Vidoeira, Ramalho Ortigão,
Virgílio Machado, Visconde de Benalcanfor, VisconÔes ôe
Castilho, (António e Júlio), Visconôe ôe Ouguella, Xavier Ôe
Carvalho, etc.
Lisboa Creche foi ôeôicaôa a sua Magestaôe a Rainha
Senhora D. Maria Pia. Destinava -se a auxiliar as Creches.
D. Esther ôa Cunha Belém fez os seus primeiros versos,
contanôo apenas ôez anos ôe iôaôe.
As suas produções poéticas nunca foram reuniôas em
volume.
JOÃO DE DEUS
dNSDtTO^
Na Festa
Vem trazer-te a mociôaôe
Cantos, flores — que o tempo foge !
Diz o mestre com bonôade :
— A vida é o dia de hoje.
Poetisas Portuguesas 59
Na Morte
Murcham as flores, geme a lyra
Como a ventura se esvai !
Morre o poeta e suspira :
— A vida é folha que cai.
Esther Amália õa Cunha Delem.
AS ROSAS DA RAINHA
Como a Rainha Santa a historia grato encanto
Sublime e angelical ô'amor e Ôe pieõaõe
Um õia meigamente, abrinòo o régio manto
Em rosas transformara o pão 5a cariòaôe ;
Hoje, outra existe assim, Ôe quem meigos sorrisos
Faz bálsamo que extingue alheias funôas Ôôreô ;
Que em luz converte as trevas, as lagrimas em risos
Em agasalho o frio, e em cuiõaòo as flores.
Esther Amália ôa Cunha Belém. A '^Prece, Lisboa, 1884.
A CRECHE
A Creche : — um tepiõo ninho
ToÔo formaôo õe Amor !
Onòe as meigas crianchinhas
Revivem ao seu calor !
E' como um ceu constellaòo
D'essas estrellas formosas
Onòe sorriem os anjos
Onòe florescem as rosas.
Esther Amália òa Cunha Delem. Lisboa Creche, (Maio Òe
84).
60 Poetisas Pòríugueòas
PARA OS ORPHÃOS
Aos pobres, coitaòinhos.
Christãos õaí uma esmola
O' mães, ôai-lhes carinhos
Dai-lhes ó pátria a escola !
E assim tornemos riõente
O seu Òestino escuro
A's pombas õo presente,
A's águias òo futuro !.
Esther Amália ôa Cunha Delem. Para os Pequeninos. 1885
(Jornal a favor òa Associação protectora òas crianças).
D. MARIA RITA CHIAPPE CADET
D. Maria Rita Chiappe Caôet nasceu no Algarve, seguníx
supõe Innocencia ôa Silva. D. António Òa Costa julga-:
lisboeta (pag. 304 õa éMulher em Poríus^alj.
Faleceu em 5 òe õesembro Ôe 1885,
D. Maria Rita Chiappe Caõet foi professora 5e francês <
gerente ôa livraria Lalement. Colaborou em inúmeros jor
naes e almanacks.
Em 1870, publicou um livro intitulaôo Versos. E\ também
auctora ôe Sorrisos e Lagrimas (poesia), e Flores da In
fancij. contos e poesias moraes, ôeôicaôos á mociôaôe por
tuguesa.
Os Contos da Mamã e o Theatro das Creanças constituen
uma graciosa colecção õe onze pequenas comeôias ôesti
naôas á infância.
Foi esta Senhora, segunôo creio, a percursora, entre nós
ôa lAteratura Infantil, para a qual tem escripto numeroso;
livros: D. Maria Amália V. ôe Carvalho, D. Maria 0'Neill
Poetisas Poftiiguesas
D. Maria Feio, D. Emília òe Sousa Costa, D. Maria Sofia
Machaòo (Santo Tyrso), etc.
Alem õas obras citaòas, o nome òe D. Maria Rita Chiappe
Caõet está ligaòo a muitas outras composições originaes,
imitações e traduções.
A VARINA
Nas longas praias sem cessar banhadas
Das claras aguas ôo sereno mar,
Meu pobre berço õe varina tive,
Que as vagas vinham com amor beijar.
Ah ! foram ellas que affagaram ternas
Tranquillos sonhos Ôe infantil viver.
Que me ensinaram co'murmurio branõo
A lei õo Eterno a respeitar e crer.
Que bellos sonhos na primeira iõaòe
Minh'alma pura e juvenil creou ;
Que meiga esp'rança no futuro aguarõa
Quem o trabalho com prazer buscou.
Que importam liõas, se á faôiga affeito
Meu braço póõe com aròor liõar ;
Se o pão bemôito que o trabalho offrece
Vem a meus pães consolações prestar.
Ah i se o meu rosto, como as jovens õamas,
Mimo e alvura que ostentar não tem ;
Se a brisa aòusía que ôo norte sopra
As faces toôas requeimar-me vem.
Em troca õ'isso sinto o peito forte,
Livre e robusto palpitar õe arÒor,
E em meu caminho segreòar-me escuto
Vozes que faliam õe um porvir õe amor.
62 Poetisas Portuguesas
Quanôo ao romper Õa maõrugaòa acoròo,
Ergo-me e sinto o coração feliz,
Minha alma pura Õe prazer trasborda
E a Deus meu peito com fervor bemòiz.
Oh ! sim que ao brilho òa nascente aurora,
Na luz serena que raiar se vê,
Sente a varina palpitar-lhe o peito,
E Dentro õ'elle vigorar-se a fé.
Não gasto enfeites, meu vestir singelo
Não tem veluòos, ouropel, setim ;
O breve lenço que o meu seio encobre.
As largas abas òo chapéo varim.
A saia curta, õebruaôa apenas
De orlas vermelhas sobre um runôo azul.
Eis meu aõorno, Òa varina a gala,
Minha riqueza, meu trajar taful.
Porém, que importa s'inõa assim não troco
A sorte minha por um throno, oh I não !
Eu sou feliz n'esta pobreza honraòa,
Trabalho e ganho com prazer meu pão !
Não sonho flores, nem setins, nem jóias,
Vale mais que ellas meu gentil rubor,
Que sob os trajos õe varina humildes
Mais sobresae õa mociõaõe a flor.
O único sonho que na mente aífago,
Única esp'rança que minh'alma tem,
Toõa a ambição que n'este peito encerro.
Que a par ôas crenças vegetou também,
E' ô'esse lucro que o suor me custa,
Ténue parcella para mim guarõar.
Pingentes õ'ouro comprarei com ella,
E a cruz penõenõo õe gentil coliar.
Poetisas Portuguesas 63
Oh ! se o consigo, mais feliz na terra
Mulher alguma viverá ôo que eu,
Que importam liôas que o prazer esmalta,
Doces trabalhos que abençoa o ceu !
Tomo a canastra que o meu peixe leva,
E na ciòaòe que topar visinha.
Vou pelas ruas pregoanDo alegre :
<Biba, bibinha, quem a quer bibinha ?!...»
Maria Chiappe Caõet, Feríos, Lisboa, 1870, pag. 17 a 19.
D. LUTHGARDA GUIMARÃES DE CAÍRES
D. Luthgaròa Guimarães õe Caires nasceu em Vilia Real
í>e Santo António.
E' filha ôe D. Maria Thereza õe Barros Guimarães e ôe
José Roôrigo Guimarães que foi um granòe amaõor õe
musica.
Pelo avô õesta Senhora — Daniel Baptista õe Barros —
teve D. Luiz I especial estima, õatanõo esta amizaõe õo
tempo em que o pae õe El- Rei D. Carlos I anõava embar-
caõo como simples guarõa marinha.
O meio culto, em que õesõe bem nova viveu e se eõucou
a ilustre Poetisa õe quem estou falanõo, influiu, por certo,
bastante, para que no seu espirito germinasse o gosto pelo
cultivo õas Leiras e õas Belas Artes, estuõos estes que
tanto õesvelo e atenção merecem a D. Luthgarõa Õe Cai-
res, esposa Õo muito conheciõo aõvogaõo Dr. João õe
Caires.
Esta Õistincta Poetisa tem colaboraõo no Diário de No-
ticias, Capital, Brasil e Portugal onõe publicou, alem õe
carias poesias, um conto — O Conspirador — e no Secuio,
onõe escreveu interessantes artigos sobre assumptos so-
ciaes. Entre eles, merecem especial referencia :
64 Poetisas Portuguesas
Abaixo a penitenciaria (que contribuiu para a abolição
òa mancara aos presos), e A Mulher na Sociedade.
D. Luthgarôa Õe Caíres é auctora òos seguintes trabalhos^,
literários :
Em verso : Glicineas, Papoulas, 2.» eÕição, A Bandeira
Portuguesa (exgotaòa), Pombas feridas (plaquete), Sombra?"
c Cinjas, 2." eôição, A Revolta, peça em 1 acto, adaptação
em verso, õe uma scena simbólica, escripta em prosa, por
Nelly Roussel que permitiu que fosse ampiiaòa, o que D.
Luthgarôa õe Caires levou a efei*o, visto a peça em ques-
tão ser excessivamente pequena para poôer ser represen-
tada.
Em prosa : -4 Dança do Destino.
A auctora òas Sombras e Cinjas, trabalha actualmente-:
nas seguintes obras : O Dr. "Vampiro, romance, Castellos
de Estreitas, poesia, e As ires arvores
A historia oeste ultimo livro é muito curiosa. Nas ires-
arvores, serão publicaòos, alem õe alguns contos ineõitos,
o nome õas pessoas que teem contribuiõo com roupas e
õinheiro para a meritória obra õe cariõaõe que D. Luth-í
garoa õe Caires, com tanta õevoção, iniciou ha 3 anos, ves-
tinõo e Õistribuinôo brinqueõos ás crianças õos hospitaes
e, em especial, ás Õo Hospital D. Estephania, funõaõo pela
Rainha õo mesmo nome, a esposa õo Rei D. Peõro V,.
hospital este, a principio, só õestinaõo á infância.
Toõos os meses, esta bonõosa Senhora compra brinque-
õos e rebuçaõos que leva aos seus protegiõos-
A granõe festa õa õistribuição õas õaõivas que tanta
alegria causa aos pequeninos õoentes, realisa-se no õia õe-
Natal, senõo a promotora õesta bemfazeja e simpática obra^
auxiliaõa por õeõicaõas Amigas.
Para bem se avaliar õos primores õo coração õe D. Lu-
thgarôa õe Caires, basta õizer que parte õo proõucto Ôa
venõa õos seus trabalhos literários é õestinaõa a estes
actos õe cariõaõe.
Poetisas Portuguesas 65
AVE, MARIA
Avè, Maria, Mater dolorosa.
Cheia de graça e ôivinal fulgor !
Maria Santa, estrella raòiosa,
Mãe òe Jesus, o nosso Reôemptor.
O Senhor é comvosco, Virgem Santa,
Bemdita Sois, Vós, Casta flor Dos céus !
Que perlas finas, õe amargura tanta.
Vós não chorastes, pelo amor õe Deus I
Entre as mulheres, Mãe immaculaõa,
Bemdito é o fructo õa mais casta estrella ;
No Ceu, na terra. Sois abençoaõa,
E entre as mais santas, a mais pura e bella.
Do Vosso ventre, tão bemôito e santo
Jesus nasceu, nosso ôivino Guia,
Por quem Ôepois, correu o Vosso pranto,
VenÔo-o expirar na Cruz, Santa Maria !
Luthgarõa Guimarães õe Caíres. Glycinias, Lisboa, 1910,
ag. 29 a 32.
A VAGA
AÕoro-a ! como se aõora
O que seõuz e fascina, —
A vaga õiamantina
Que me atrahe ê~me enamora.
Quanõo louca ôesarvora,
E quanõo altiva õomina,
Quanõo arrebata e extermina,
Quanõo ruge. . . e quanõo chora.
66 Poetisas Portuguesas
Amo a sereia anõolante,
A preguiçosa bacchante,
Gemenòo queixas ôe amor. . .
Embora o seio turbado.
Sob o seu manto prateaòo
Alimente a morte e a ôôr !. . .
Luthgaròa Guimarães òe Caires. Glycinias, pag. 49 a 5í
LOURDES
Era ao entarõecer. Luz opalina.
Como eu fiquei ali extasiaòa !
Perante a Virgem branca immaculaõa,
Na sua gruta mystica e òivina.
Como lagrima pura, crystalina,
Corria um fio õe agua abençoaòa.
E uma rosa moõesta e õeslumbraõa,
Na rocha tremulava, pequenina . .
Oh ! Mãe Celeste ! Até as próprias rosas.
Mesquinhas oscilanòo ao vosso labo,
Se curvam, vaciliantes, receosas!
E o vosso olhar, õescenôo iiluminaòo,
Por sobre as multidões angustiosas,
Reòime a culpa, e limpa ôe peccaõo.
Luthgaròa Guimarães õe Caires. Glycinias, pag. 203 a 20íi
Poetisas Portuguesas 67
ANTE UMA CAVEIRA
Quem foste ? Tu que és hoje uns restos õo passado ?
Um martyr ? um banõiòo ? O' tu que foste alguém !
Quem sabe se inòa existe um peito angustiado
que chore a tua falta. . . um coração õe mãe !. . .
Nas órbitas sem luz, talvez que uns linôos olhos,
outrora com amor, chorassem combalidos. . .
Talvez que o teu caminho, erriçaòo õe abrolhos,
o regassem òe pranto os teus olhos perdidos !
E hoje, fria caveira, insondável mistério,
nem a terra te abraça o teu craneo gelado !
Nem sequer tens lugar num triste cemitério,
onde a saudade vá chorar o teu passado !
Luthgarõa Guimarães de Caires. Sombras e Cin:j[as, 1."
edição, Lisboa, pag. 53 e 54,
D. MARIA JOSÉ DA SILVA CANUTO
D. Maria José da Silva Canuto nasceu em Lisboa, em 28
õe Janeiro de 1812 e faleceu em 20 de Janeiro de 1890.
Foi jornalista, poetisa e professora de ensino primário.
Colaborou em diversos almanachs, na Revolução de Se
lembro, no Occidente, no Patwrama e na Revista Universal
Lisbonense, na qual escreveram entre muitos outros ho-
mens ilustres : António Feliciano de Castilho ; Alexandre
Herculano; António Augusto Teixeira de Vasconcellos ;
Pereira da Cunha ; António õe Serpa ; Silva Túlio ; Filippe
Folque ; Francisco Palha ; Silveira Malhão ; Ferreira Lapa ;
AnÕraõe Corvo ; João õe Lemos ; Costa Cascaes ; FraÕesso
da Silveira; Casal Ribeiro ; Correia Calòeira ; Augusto Pai-
68 Poetisas Portuguesas
meirim ; Gomes õe Amorim ; Fernanôes Thomaz, Visconõe
òe Sá ôa Banôeira, etc.
D. Maria José òa Silva Canuto publicou os seguintes
trabalhos: Escavações e Conferencias Pedagógicas.
Foi, principalmente, á instrução que esta Senhora òeôi-
cou o máximo Õe seu esforço e inteligência.
Morreu, õepois Ôe uma constante lucta pela viòa, con-
tando 82 anos Õe iõaõe.
Se os últimos tempos õe sua longa existência não foram
completamente angustiosos, Õeve-o a Rosa Araújo, — o
iniciaõor õos granões melhoramentos Õa ciõaõe Õe Lisboa
— que lhe conceõeu um subsiõio anual, que em parte lhe
minorou a õesgraça Õe se ver entrevaõa.
MAGDALENA
A que outr'ora opulenta e raõiosa
Õe belleza e õe amor não saciaõo,
leito ebúrneo, õe arminhos recamaõo,
a seus cultos sagrara caprichosa.
Eil-a. . aos pés õe }esus . tão lacrimosa !
De oõorifica unção lh'os tem banhaõo,
com as áureas maõeixas enxugaõo.
EsplenõiÕa na õôr ! sempre assombrosa !
A que outr'ora aos murmúrios responõia
õe menestréis acorões com harpejos,
que a seus festins opíparos reunia.
Muõa as turbas perpassa, ouve os motejos,
Amor celeste a mente lhe alumia ;
pranto e morte fixaram seus õesejos !
Maria José õa Silva Canuto. Almanach das Senhoras, 1878,
pag. 153.
Poetisas Portuguesas 69
D. LUCINDA DO CARMO
D. Lucinõa ôo Carmo nasceu em Lisboa.
A 22 ôe Setembro ôe 1882, encetou a sua carreira artis-
tica, representanòo, pela primeira vez, no Theatro Gymna-
sio, senôo a peça, em que tomou parte. Estação Calmosa,
comeõia em 3 actos, traòuziõa por José Augusto Ferro.
As principaes creações artísticas e peças em que mais se
tem salientado D, Lucinòa ôo Carmo que no meio teatral
português gosa òe justificaõo renome, e que conta geral es-
tima e simpatia òo publico, são :
Niíoiiche, Lili, Carraça, Doutora, Notte do Calvário, Fei-
ticeira, Innocencia, A Sombra, Cigarra, Intimo, etc.
No teatro D. Maria Pia, ôa ilha õa Maôeira, e nos Açores,
representou D. Lucinòa õo Carmo toòo o seu reportório,
alcançan&o extraorõinario successo.
Fazenôo parte õas companhias Furtaòo Coelho e Rosa e
Brasão, representou, respectivamente, no teatro ôa Comedia
de Madrid, õurante um mes, bem como no Rio ôe Janeiro
e em S. Paulo.
Em Paris e em Maôriô, onôe esta Actriz tem estaôo em
viagens ôe estuôo, assistiu a representações em que toma-
ram parte os mais iminentes artistas Ôo munôo.
Em 1891, entrou para o nosso primeiro teatro ôramatico»
0 Teatro Nacional, fazenôo parte ôa Companhia Rosa e
Brasão.
Em 1898, foi D. Lucinôa ôo Carmo nomeaôa sociataria
ôe 1.* classe ôo mencionaôo teatro, onôe se tem conser-
jvaôo até hoje.
Em Maio ôe 1912, foi-lhe confiaôa a regência ôa 7.^ Ca-
[ôeira ôa Escola de Artt de Representar que funciona no
1 Conservatório ôe Lisboa.
E' nessa caôeira, que se preparam os alunos para as
[provas íinaes que são publicas e em que os ôiscipulos mais
[classificaôos ôisputam prémios.
Em 1911, publicou D. Lucinôa Ôo Carmo, uma ôas pou-
70 Poetisas Portuguesas
cas actrizas portuguezas que se teem òeòicaõo á^soesia, o
seu primeiro livro (prosa e verso) intitulado Fora de. Scena.
Como escriptora, colaborou no Almanach dos Palcos e
Salas, Illustrado e ôas Senhoras.
AS PALMAS
(monologo)
Quanto eu gosto òe as ouvir ! . . .
Fazem-me logo sorrir
Por mais triste que me sinta :
— E não ha quem me Desminta ;
(Pelo menos se esse alguém
Viver õa arte também
E artista fôr, ôe õireito.)
São as palmas o mór preito
Que o artista sempre anhela,
A ovação — a mais singela —
Sempre a nossa alma arrebata
Porque, em summa, ella é tão grata
Que nos deslumbra e extasia
Como a pura luz ôo õia !
O templo 5a Arte aôoraôo
E por tantos profanaôo
Quantas vezes se anniquila
Com a asneira que fusila
Sem que alguém lhe tenha mão ?
E cá fora a multiòão
Sempre bôa, complacente,
Tal profanação consente,
(Pois só pensa em ôivertir-se)
E acha graça, fica a rir-se ! . . .
Que santos, que ingénuas almas,
— Cae o pano . inòa òão palmas ! -
Poetisas Portuguesas 71
Se um artista é õe valor,
(Aquelle que seja Acior)
Que prazer ha ôe sentir
Ouvinõo rir, se elle rir,
E chorar, se elle chorar ! ? . . .
Ouvinõo esturgir no ar
As palmas e as ovações,
Que mil gratas sensações
D'alegria ha òe sentir ! ? . .
Ha õe, por força, sorrir.
Ha Õe, por força, animar-se.
Ha õe, emfim enthusiasmar-se !
Eu, por mim, naõa conheço
A que õê maior apreço
Do que ouvir uma ovação.
P'las palmas, a õevoção.
Em mim toca o fanatismo.
— E até quanõo o paroxismo
Da morte, se me abeirar
Eu prometto não chorar
Se no outro munõo as almas
Me receberem com palmas ! • ■
Lucinõa õo Carmo. Fora de Scena, Lisboa, 1911, pag. 115
í 117.
D. AUGUSTA FERNANDES PESSOA
DE CARVALHO
D. Augusta Fernanões Pessoa õe Carvalho nasceu em
Bucellas, em 1886.
Apesar õe ter resiõiõo, até 1910, nessa localiõaõe, e Õe
não ter tiõo professores que lhe ensinassem as verõaõeiras
regras Õe metrificação, as suas proõucções poéticas lêem-
72 Poetisas Portuguesas
se com muito agraòo, lai é a singeleza e naturaliòaôe t>e
que são revestiòas.
Foi no òiario, Novidades, que D. Augusta Pessoa òe Car-
valho fez a sua estreia literária.
No Jornal da Mulher, têm vinòo, por varias vezes, poe-
sias firmaòas por esta Senhora.
Os seus versos anòam Mspersos, senòo para lamentar
não se acharem ainòa reuniõos em volume.
SONHANDO
Em linôa noite estrelada
Que é o que eu penso sosinha
Na janela òebruçaõa ?
Aòivinha. . •
Que pensamento risonho
Vae minha mente afaganõo ?
Que riòente e alegre sonho
Vou sonhanõo?
Não sabes, queres que òiga ?
Mas eu sei lá o que penso
Que iòeias a mente liga
Com mais senso .
Eu comparo o pensamento
Quanòo assim, na soliõão
Ao espantoso movimento
Dum tufão.
Não ha naõa que não venha
Perpassanòo velozmente
Transformar em õensa brenha
Nossa mente.
São sauòaões, são lembranças.
São tristes recorõações.
Poetisas Portuguesas 73
São meigas ternas esperanças
Aos milhões.
Lembram maguas já passaòas
Despertam sonhos riòentes,
Mil iõeias são chocaõas
Tão õifrentes ■ •
Mas Oura tuõo um momento
Anõa tuôo a esvoaçar,
Como as folhinhas que o vento
Traz no ar.
E quanõo emíim despertamos
D'aquele louco rever,
Que projecto é que formamos
A valer?
Ai pergunta embaraçosa
De que eu livrar-me consigo,
Um projecto. . . cor Òe rosa. . .
Que não ôigo.
Augusta Pessoa òe Carvalho. Jornal da Mulher, II ano,
n.» 43, pag. 259.
D. DOMITILLA DE CARVALHO
D. Domitilla òe Carvalho nasceu em Travanca òa Feira,
òistricto òe Aveiro. E' filha òe D. Margariõa òe Carvalho e
òe Manuel Roòrigues òe Carvalho, òe quem ficou órfã, con-
tanòo, apenas um ano òe iòaòe.
Ao ^eu talento, perseverança, e exíorço próprio òeve D.
Domitilla òe Carvalho a sua formatura que fez com alta òis-
tinção na UniversiòaÕe òe Coimbra, nas antigas Faculda-
des de Medicina, Matemática e Filosofia.
74 Poetisaê Portuguesas
Os estuòos preparatórios fe-los D. Domitilla ôe Carvalho
em Bragança, Castelo Branco eLeiria onõe concluiuo curso.
D. Domitilla òe Carvalho foi a primeira senhora que fre-
quentou a Universiòaõe ôe Coimbra. Tão inteligente como
moõesta, alcançou nesta Universiôaõe as maiores Òistin-
ções:
Na Faculdade de Filosofia, um premio e 8 accessits ;
Na Faculdade de Matemática, 2 prémios e accessits nas
restantes cadeiras;
Na Faculdade de Medicina, accessits em toòas as cadei-
ras Ôo 1.° e 2." ano e prémios em toÒas as caòeiras ôo 3.°,
4." e 5.' ano.
Foram-lhe também conferidos o Premio Barão CasteUo
de Paiva (trabalhos anatómicos), e o Premio Alvarenga (ma-
téria medica).
Não resisto á tentação de aqui transcrever uma ou outra
passagem do prefacio com que Affonso Lopes Vieira abre
o volume de versos, de D. Domilla de Carvalho, publicado
em Coimbra, em 1909.
«Tenho a honra de pertencer á geração contemporânea
em Coimbra da senhora ilustre que assina este livro.>
«Eu me recordo, como todos que no meu tempo eram sen-
síveis, da graça moderna que imprimia á velha escola o seu
vestido de estudanta.» .
«Relembro a admiração profunda com que os cursos a
que ela pertencia falavam da condiscípula fraternal, que
conquistou sempre, com o mais franco aplauso dos cama-
radas e a rendida homenagem dos professores, as mais su-
bidas distinções e prémios, honrando desta vez quem os
conferia.»
<E, sobretudo, á minha lembrança acode que já então
essa rapariga modesta, de uma formosura simpática e de
uma gravidade risonha, que atravessava sozinha os nossos
grupos, guardada pelo nosso respeito e pela sua alma, me
fazia entender perante a desordem actual do feminismo, o
que ahi ha de verdadeiro e de proporcionado.»
Poetisas Portuguesas 75
«O incanto õesta mulher está em que ella ficou a mais
feminina ()as criaturas, õepois õa sua longa jornaõa através
ia sciencia.»
Do valor õe seus Versos que eu também consibero ôos
melhores õe quantos Senhoras Portuguesas teem feito,
ainõa é o auctor òas Canções do Sol e do Vento, quem
õiz :
«Se tivesse feito só estes versos — ôos mais sinceramen-
te compostos e interessantes que mulheres portuguezas
têm publicaõo — teria feito pouco. A vulgariòaôe Òas li-
sonjas não é para aqui, Elias seriam bem mesquinhas para
a mulher gloriosa que uma faculbaôe òe meõicina, violen-
tando os preconceitos terríveis õe uma escola e õe um país,
pretenõeu unanimemente contar entre os seus membros.»
A Acaõemia õe Sciencias õe Portugal, que ha pouco aca-
ba Õe comemorar o seu primeiro decenario, honrou-se, ins-
crevendo no numero õe seus sócios, a Doutora D. Domi-
tilla õe Carvalho.
Esta Senhora foi õirectora õo liceu feminino D. Maria
Pia, cargo que õeixou a seu peõiõo, para simplesmente
nele exercer o Õe professora.
D. Domitilla õe Carvalho trabalha, actualmente, num ou-
tro livro õe versos, certamente um novo primor literário, _
PORQUÊ?
Já que os nossos Õestinos são õiversos
E vae finõar a luz que me alumia.
Quero õizer-te em meus sentiõos versos
Aquillo que fallanõo não õiria.
Has õe saber emfim quanta agonia,
Quanta amargura e quantos ais õispersos
Se traõuzem em toõos os meus versos —
Se os teus olhos os lerem algum õia . . .
76 Poetisas Portuguesas
Como é que senõo tu melhor que um santo,
TenÕo um conforto a òar a toõo o pranto,
Tenôo sempre um allivio para a õor,
Como é que n'est^ magoa õoloriòa,
Senòo tu, como és, a minha viòa,
Assim me õás a morte, meu amor?
Domitilla õe Carvalho. Verbos, Coimbra, 1909, pag. 105 e
106.
FLOR QUE MORRE
No hospital
E' linòa como os anjos. Na pureza
Do seu olhar macio, avelluôaõo
Ha sempre a mesma febre e a mesma reza
Que o meu peito recolhe apieòaòo.
Com gesto òe quem peòe e essa tristesa
De quem presente o fim amarguráõo.
Ergue as mãos pequeninas òe princeza
E sorri para toòos com agráõo.
Com aquella iòeal resignação
E a mesma fé em Deus nosso Senhor,
Ha Òois annos que a vejo Doentinha.
Quanôo presa õe immensa compaixão
Do seu leito me acerco : <— Está melhor?»
Ella responõe sempre «— Melhorsinha. . .»
Domitilla òe Carvalho. Versos, Coimbra, 1909, pag. 39 e
40.
Poetisas Portuguesas 77
ORPHAS
Vi-as passar, as meigas criancinhas,
Vestes ôe luto em almas õe açucenas.
E sorriam ! Também as avesinhas
Vão levanõo a cantar as suas penas.
Sorriam, sim, contentes, a brincar
Lá iam, como as aves pelo ceu
Alegremente em banôo, a chilrear. . .
Mas õe vê-las sorrir, chorava eu !
Domitilla õe Carvalho. Versos, pag. 47.
MINHA SINA
AnÕei por largo tempo a imaginar
A Suprema alegria Õe te ver !
Tanto cuiõaõo puz em te guarõar
E só te encontro para te perõer !
Seguia-te õe longe. Era um prazer,
Um casto bem p'ra mim o recorõar
Essa altivez õe porte singular
Na esperança Õe um õia te merecer.
Tinha-te sempre a ti no pensamento.
Só a tua lembrança õava alento
A' õesolaõa viõa que me arrasta !
Bem sei que não tens culpa, é minha sina.
Vae atraz õ'essa luz que te fascina
Sê feliz, meu amor, isso me basta !
Domitilla õe Carvalho. Versos, pag. 83 e 84.
J78 Poetisas Portuguesas
POBRE MORTA
I
Entrou na viòa agreste e acciòentaòa
— Revolto mar òe lutas inconstantes —
Sem ter alguém, a pobre abanòonaòa,
Que lhe guiasse os passos vacillantes.
Sem um raio òe luz n'esta jornada,
Nem uns laços Òe amor cariciantes
Que a prenõessem á viôa n'uns instantes,
Por vezes quiz matar-se a Desgraçada !
Mas hoje, quanòo a morte percorria
O seu corpo òe cera emagreciòo,
Quanòo em gelos òe toòo arrefecia,
Ella ergueu para mim os olhos baços
E sem força na voz, ôiz num gemiòo :
«Não me òeixe morrer, òê-me os seus braços !
II
Vi- a ôepois, a pobresinha, fria,
Sobre a mesa òe peòra revoltante
Em que o ouro escalpelo principia
A òissecar, num gesto torturante
E ella que em viòa tanto horror sentia
Pelo theatro, pobre morta errante,
Do repouso òo tumulo òistante,
Resignaòa parece que sorria- . .
Não me poòe esquecer a immensa Òôr,
Um mixto òe pieòaõe e òe terror,
Que senti ao fitá-la com esforço :
Poetisas Portuguesas 79
Lábio roxo, cabello òesgrenhaôo,
Mas sobretudo o olhar ! o olhar paraôo,
Tenho- o cravaõo em mim, como um remorso.
Domililla ôe Carvalho, Versos, pag. 41 a 44.
D. MARIA DE CARVALHO
D. Maria õe Carvalho — a ilustre Poetisa que tanto honra
as Letras Portuguesas — nasceu na Chamusca.
Os três sonetos : No Minho, O Lampeão e o Velhinho,
que figuram nesta Antologia, foram pela primeira vez pu-
blicados, ha muitos anos, nas Novidades que Òeles õisse :
«Cae-nos na nossa banca be trabalho estes sonetos. Não
sabemos quem seja o auctor. Mas seja quem íôr, publica-
mo-los por sentirmos que vamos õar a lume qualquer coi-
sa que ha-õe ficar na lingua portuguesa.»
Estas proôucções que tantos elogios mereceram, foram
«nviaõas para o citaôo jornal, contra vontaôe òe sua au-
ctora, que, singelamente, as assignou com as iniciaes õo
seu nome e apeliõo.
Poucos òias õepois õe publicados (ViÔe o artigo de Joa-
quim Leitão, na Liberdade)^ D. João da Camará dizia numa
das suas crónicas Õo Occidente :
«Dei estes três sonetos para ensaio de dicção ás minhas
alunas do Conservatório, e disse-lhes : Decorem-nos por-
que de facto decoram três sonetos que ficam na historia da
literatura portuguesa».
Em 1915, D. Maria de Carvalho publicou um interessante
livrinho As Sete Palavras, ao qual a critica fez justas e
merecidas referencias.
Em 1916, apareceu o seu segundo livro de versos. Sone-
tos, volume que contem verdadeiras jóias poéticas, como
os leitores, pelas numerosas citações que faço, poderão
avaliar.
!
80 Poetisas Porluguem^^
NO MOINHO
Ha na várzea um moinho que, isolado,
Traballia alegre para toòa a gente,
Aproveitando as aguas ôa torrente
Que espuma nos açuôes. Levantado
Sobre a verdura rústica do prado,
Que o sol inunda, preguiçosamente,
Ergue a risonha e pittoresca frente.
Esse moinho branco, enfarinhado.
Arrulham pombos no beiral vermelho
Do seu telhado, e ladrão cão, já velho,
Aos camponios, que passam no caminho .
Quem me dera que tu . fosses moleiro !
E eu te pudesse ter por companheiro,
Na doce e branca paz d'esse moinho.
Maria de Carvalho. Sonetos, Lisboa 1916, pag. 43.
O LAMPEAO
Na moribunda luz bruxoleante
D'aquelle pobre lampeão de rua,
Triste, isolado, na parede nua,
Achei um não sei quê, vago e tocante.
Mais triste ainda sob o alvor da lua .
E puz-me a comparalo, n'esse instante,
A' saudade confusa e palpitante,
Que sempre em nós symbólica fluctua.
Pois se tivesse olhar o sentimento,
Que nos faz acudir ao pensamento
A lembrança do tempo já passado,
Poetisas Portuguesas 81
Devia ser assim — olhar sem viõa —
Como a luz fraca, trémula, penôiõa,
Do pobre lampeão quasi apagaôo.
Maria òe Carvalho. Sonetos, pag. 9.
VELHINHO
Muito velho, asseaôo e pobresinho,
Peòe-me sempre esmola ás terças feiras
Eu chamo- lhe, sorrinôo, o meu velhinho,
E converso com elle horas inteiras.
Falla-me ò'um fiõalgo, seu paôrinho,
Que lhe õeu um casal e algumas leiras ;
Antes õe empobrecer teve um moinho
E milho loiro, aos montes, pelas eiras.
E estas longas historias alõeãs,
Tão humilòes, tão rústicas e sãs,
]á eu sei como o velho as principia :
— «Quanòo eu era rapaz. •» e ao terminar
E' certo ouvil-o sempre confirmar :
E' como ôigo a vossa senhoria.»
Maria òe Carvalho. Sonetos, pag. 37.
ESQUECIMENTO .
Ao ver o mal por toõos aõmittiôo,
Como regra a que a viòa está sujeita —
Ao trocar a illusão pela suspeita.
Quem poôerá negar haver sofriôo ?
82 Poetisas Portuguesas
Depois, no coração fortaieciòo
Vae-se fazenõo a paz, quanõo se acceita
A crua viòa assim, tal como é feita
No munôo, sempre egoísta e corrompido.
Mas õe tuòo o que aõmitto, soffro e vejo,
— Tão contrario ao que sinto e ao que Õesejo
O que mais me perturba e me entristece,
O que afinal impéõe que eu me illuõa,
E' a maneira auôaz por que se muòa,
E a fácil rapiõez com que se esquece.
Maria õe Carvalho. Sonetos, pag. 17.
VIDAS
Algumas viòas ha em que parece
Pesar não sei que estranha malòição ;
Ha viõas, em que a òôr nunca se esquece
De esmagar lentamente o coração.
Dias e ôias, em que se envilhece
Como se fossem annos òe afflição ;
Horas e horas, em que se apetece
O gelaòo repouso ò'um caixão.
E julga sempre o munbo que avalia
As razões òe tristeza ou òe alegria,
Que tenta òescobrir em caõa viòa
E fala sem receio òe enganar- se !. . .
Como se a òôr puòesse avaliar-se,
Fora òo coração em que é sentiòa !
Maria òe Carvalho. Sonetos, pag. 35.
Poetisas Portuguesas 83
IV
Soffre-se tanto pela viõa fora,
Que o desalento õeve perõoar-se.
Saber luctar, viver e conformar-se,
E' ôifficil missão para quem chora.
O rapiôo heroísmo õ'uma hora
Poucas vezes consegue sustentar- se,
E' um sublime, um canòiòo Disfarce
Da fraqueza mortal que nos õevora,
O próprio Christo, sobre a Cruz exangue,
- O corpo esbelto gottejanòo sangue.
Jóias vermelhas n'um sagrado engaste. .
Teve um momento òe tamanha magua
Que soluçou, — os olhos rasos õe agua :
— Meu Deus ! meu Deus ! porque me abandonastes ?
Maria ôe Carvalho. .15 Sete Palavras, Lisboa, 1915, pa^. 21.
D. MARIA AMÁLIA VAZ DE CARVALHO
D. Maria Araalia Vaz òe Carvalho, a ôistinctissima Es-
riptora e Poetisa, ôe que neste momento me ocupo, nas-
eu na ciòaõe ôo Porto, segunôo afirma o Diccionario Fra-
co Jllustrado òe Jayme Seguier e em Pintéus, segundo
jsevera o Diccionario Portugal
Sua Excellencia é filha ôe D. Christina òe Almeiõa e Al-
iquerque, senhora assas inteligente e culta, e ôe José Vaz
í Carvalho, inòiviòualiõaòe não menos ôistincta.
A minha aòmiração pelo talento e vastíssimos conheci-
-sntos que possue D. Maria Amália Vaz òe Carvalho, é
84 Poetisas Poríuguef^as
tanto maior, quanto é certo que á notável escriptora, af
ma o Sr. Christovam Aires, no Boletim da II classe da Ai.
demia de Scicncias de Lisboa — «naõa foi ensinaõo.> «F;
taram-lhe aquelles mestres, tantas vezes atrofiantes e esl
rilisaôores, que toòos nós guarõamos entre as recoròaçõ
õa nossa infância.»
Foi auxiliada pela sua granòe inteligência e proõigio
memoria, lenõo, lenõo imenso, analisando, raciocinanõc
fixanõo, que D. Maria Vaz òe Carvalho se transformou
apreciaòissima e notável historiadora, jornalista, peõago
e moralista, que nacionaes e estrangeiros admiram e v
neram.
São de D Maria 0'Neill, as palavras que transcrevo,
um seu folheto intitulado Uma Satisfação á Ex.'"^ Sr.*
Maria Amália Vízf de Carvalho (Lisboa, 1911):
<0 seu olhar de águia, penetrante e fino, educado p
ella na constante observação dos homens e das cous;
abrange n'um relance os mais complicados problemas ps
cologicos e especulativos, mas longe de se irritar e romp
em justificada diatribe contra os erros e fraquezas da h
manidade, o sorriso benévolo que lhe enfeita os lábios ô
monstra que a experiência adquirida não lhe tornou seve
o juizo, nem duro o coração, como quasi sempre succeò(
A mocidade de D. Maria Amália Vaz de Carvalho foi pa
sada no velho solar de Pintéus, que, a breve trecho, se co
verteu num centro intelectual, onde homens de nome n
letras (isto succedia ainda no período romântico), iam prt
tar a sua homenagem de admiração e respeito a D, Ma
Amália Vaz de Carvalho, a juvenil Poetisa que aos de^
nove anos de idade, escreveu o seu primeiro livro, U'
Primavera de Mulher, obra que para a Literatura Por
guesa foi logo mais que uma esperança. Foi ahi em |
teus, que Gonçalves Crespo, o mimoso e admirável p<i
das Miniaturas, e dos Nocturnos conheceu D. Maria Arai
Vaz de Carvalho com quem anos depois, se consorcio^.
Do valor dos trabalhos literários de D. Maria Amaliai
Poetisas Portuguesas 85
òe Carvalho, escriptos tcõos numa linguagem sã, clara, ver-
nácula, bela e profunôa ou simples, consoante o assumpto
ôe que trata, e a òespeito Òe, ha muito, ter o seu nome con-
sagrado esta ilustre e notável Escriptora que é a auctora õa
obra mais vasta e mais valiosa que Senhoras Portuguesas
se poôerão orgulhar õe ter proòuziòo, fala a honrosa ex-
cepção que a Academia de Siencias de Lisboa, em sessão
ôa 11 classe, e por proposta ôe Henrique Lopes õe Men-
donça, abriu, elegenòo D. Maria Amália ôe Carvalho, para
o seu grémio, ôisíinção esta só conceõiõa, em Portugal, a
esta Senhora e a D. Carolina Michaelis ôe Vasconcelos.
- E' bem proveitoso, para quem com consciência queira
apreciar as proôuções literárias ôe D. Maria Amália Vaz ôe
Carvalho, ler o parecer que, sobre a sua canôiôatura, foi ela-
boraôo por Teixeira ôe Queiroz, e assignaôo por :
Raymunôo A. ôe Bulhão Pato, Júlio M. ôe Vilhena, ]osé
Ramos Coelho, José Leite ôe Vasconcellos, Henrique Lo-
jies ôe MenÔonça, J. FernanÔes Costa, Jaime Moniz, Joa-
'3uim Coelho ôe Carvalho, Gama Barros, Aniceto ôos Reis
jonçalves Viana, António Canôiôo, Teófilo Braga, Christo-
;'am Aires e Francisco Teixeira ôe Queiroz, (relator).
[. Este parecer que figura a pag. 484 a 493 ôo citaôo Bole-
tim, baseia-se, principalmente, no importante estuôo histo-
.ico ôesta Escriptora, O Duque de Palmela, obra em 3vo-
ames. Como se os Acaôemicos que firmam a proposta e
íarecer referiôos, não fossem só por si, bastante garantia
;o mérito Ôe D. Maria Amália Vaz ôe Carvalho, que no ci-
[lÔo Boletim apresenta um interessante estuôo histórico,
leòito até então, intitulado, A Murque:^a de Alorna — A
Kiedade e a literatura do seu tempo, trabalho que não che-
3u a concluir, ainôa se lêem no mesmo Boletim, aprecia-
res feitas pelo Sr. Conôe Ôe Sabugosa, Santo Thirso, Hen-
que Lopes ôe Mendonça, etc.
Não obstante só em 1912, A Acaôemia ter aberto as suas
irtas a D. Maria Amália Vaz ôe Carvalho, (visto precon-
|itos ôe varia natureza e entre eles a infração ôos Esta-
86 Poetisas Por/nr/nasa,^
tutos o não terem permitiòo fazer antes), já D. Luiz I ma-
nifestara vontaòe Òe ver esta Senhora eleita para essa õouta
Corporação, como no seu belo livro Gente d' Algo, afirma o
Sr. Conõe òe Sabugosa, um òos frequentaõores òos salões
òe SM Catharina, onòe D. Maria Amália Vaz òe Carvalho
tem reuniòo tuòo quanto ha òe mais selecto nas letras por-
tuguezas.
Sob qualquer aspecto que possa ser encaraòa, a perso-
naliòaòe òe D. Maria Amália Vaz òe Carvalho é notável.
E', ainòa, o Sr. Cristovam Aires que escreve :
<E nem por isso Maria Amália òeixou nunca òe ser í
mais simples a mais bonòosa a mais singela, a mais òoce
entre as mulheres portuguesas.»
«Nos seus belos olhos luminosos, muitas vezes o fulgoi
òo génio é embaciaòo pelas lagrimas que a òôr humana
nas suas ramificações infinitas lhe vae levar a caôa passo
tão intensa é a comunhão òa sua alma com o sofrimentc
òos humilòes, òos òesòitosos. òos pequeninos.>
«Quem um òia sentiu a Òore caricia òa sua voz- quen
viu òe perto em toòa a sua soberania, a bonòaòe inegua
lavei Òa sua alma, fica preso para sempre, mais òo que ac
seu talento e ao seu saber, a quanto tem òe infinitamenti
santo, simples e òoce essa fulgurante e rara encarnação ò<
òp Mulher.» (Pag. V òo citaòo Boletim).
Para concluir estes ligeiros òaòos biographicos, resta-mi
apresentar a nota òos numerosíssimos e valiosos trabalho
òe D. Maria Amália Vaz òe Carvalho, que outr'ora firmot
vários folhetins publicaòos em jornaes, sob o pseuòoninK
òe Valentina de Lucena :
Uma Primavera de Mulher (poema), 1867, Vo^es do Erm
(versos), 1876, Mulheres e Creanças (notas sobre eòucação]
1880-87, Contos e Fantasias, 1880, Contos para nossos filho
(òe colaboração com seu mariòo, Gonçalves Crespo), 8 eôi
ções. Arabescos, 1880, Urn como, 1885, Cartas a Luija (Mo
ral, eòucação e costumes), 1886, Alguns homens do meu tem
fo (impressões literárias), 1889 As Crónicas de Valentinc
Poetisas Portuguesag 87
1890, Cartas a uma Noiva, Pelo mundo fora, 1896, Arte de
viver na sociedade ou manual da vida elegante, 4 eòições,
Vida do Duque de Palmela, 3 volumes 1898-904, Em Portu-
s^al e no esírangeiro (ensaios críticos), 1899, Figuras de hon-
tem e de hoji', 1902, Cérebros e corações, 1903, 4s nossas filhas
(carta ás mães), 2 eòições 1905-906. Ao correr do tempo, 1906,
No meu cantinho (Homem, factos, ideias), 1909, Duquesa de
Palmela (In Memoriam), 1910, Impressões de Historia, 1911,
Cousas de Agora, 1913.
Jornaes em que sua Ex.^ colaborou :
Jornal do Comercio, ôo Rio òe janeiro, em que escreve
ha 34 anos. Diário Popular, Jornal do Comercio, Repórter,
(i4rtes e letras (jornaes ôe Lisboa), Actualidade, Porto, Co-
mercio do Porto, Pai^ (Rio òe Janeiro), etc.
Depois òe ter manòaòo o original para a imprensa, soube
por pessoa òa família Òe D. Maria Amália Vaz òe Carvalho,
que esta Senhora nasceu em Lisboa, na. Rua Òos Poyaes
òe S. Bento.
A ANDORINHA
D'onòe partiste, anòorínha,
minha alaòa forasteira,
que á terra òa larangeira
vens peòir luz e calor?
D'este clima abençoaòo,
chamou-te ao longe o carinho?
terás so> sobre o teu ninho,
e lá òentro muito amor 1
Aqui onòe a primavera,
se enfeita òe róseo manto ;
onòe òas aves o canto
verte harmonias sem par ;
onòe á noite se estrelleja
e palpita o ceu profunòo,
e áureas visões Òe além-munòo,
brincam nas onòas òo mar ;
88 Poetisas Portuguesas
aqui onôe em caòa flôr,
treme vivo e scintillante
um prismático Diamante,
que a aurora chorou ôos céus ;
onôe tuôo se illumina
òe mil ignotos fulgores ;
onôe pululam amores,
sob o amante olhar õe Deus;
onôe exhala. acres effiuvios
a rama ôos loureiraes,
e se une á flor ôos myrtaes
ôa vinha o verôe festão ;
aqui não terás sauôaôes
n'este ceu que a luz esmalta,
nem ôos terraços òe Malta
nem õas brisas ôe Ceilão.
Vens talvez ôa velha Athenas
onôe em ruínas marmóreas
viste esculpiôas historias,
que não sabes ôecifrar ?
Deixaste acaso o teu ninho
entre os mysterios òo Egypto,
e a uma esphinge ôe granito,
peôiste para o guarôar ?
Viste os brancos minaretes ?
viste as cúpulas reôcnôas?
e as verões profunôas onôas,
e os floriõos arrozaes ?
Conta-me as tuas viacens,
filha ôa luz e ôa aurora
que vens ôescançar agora
á sombra ôós laranjaes!
Maria Amália Vaz ôe Carvalho. Fofes do Ermo, 1876, pag.
lli a 113.
M
Poetisas Portuguesas ' 89
D. JOANA DE CASLELBRANCO
D. Joana õe Castelbranco que pertence á família Velosa
Ôe Castelbranco, nasceu na Ilha òa Maõeira, freguezia ôo
Fayal, onôe passou a sua infância e juventude.
Desõe bem nova, que D. ]oana õe Castelbranco verseja.
Apesar õ'isso, só em 1908 publicou em Lisboa o seu 1."
livro òe versos, As minhas flores.
Posteriormente, reuniu esta Senhora, em volume, sob o
titulo ôe Fluctuaçôes, algumas õas suas poesias.
Tem coiaboraôo em vários almanachs e jornaes.
TRISTEZA
Sou como a flor já mirraòa
aos raios õo estio arôente ;
sou como a onõa fermente,
gemenõo alem sem guariòa ;
Sou como a folha òo outomno,
que morta no chão existe,
sou como a lagrima triste
òo coração òesprenòiõa.
Sou como a nuvem que passa
tolòanõo o ceu tão formoso ;
sou como o ai pieõoso
que foge ao seio õescrente.
Sou como a noite gelaòa
em negro manto envolviòa,
sou como folha cahiõa
levaòa pela corrente.
Minha alma é muòa e sombria
como o jazigo òa morte.
Lucto e pranto é minha sorte
no albor òo meu viver.
90 loetisas Portuguesas
Sinto empanar os meus gosos
nuvens òe õor e tristeza !
Correr após a incerteza . . .
luctar sempre. . . e só morrer !
Joanna Õe Castelbranco. ^5 Minhas Flores, Lisboa 1908»
pag. 14. •
D. CAROLINA DA V. CASTELLO BRANCO
D. Carolina òa V. Castello Branco foi uma õas senhoras
que colaborou na Miscelânea Poética, jornal ôe Poesias pu-
blicadas Òesõe Julho Ôe 1851 a Agosto õe 1853 (2.^ Colec-
ção), Porto 1852,
No citaõo jornal, figuram versos òe : D. Ana Amália Õe
Sá, D. Antónia Gertuões Pusich, D. Maria Feliciõaõe òo
Couto. Brown {Soror Dolores), D. Maria Peregrina õe Sou-
za, A. C. Louzaõa, António Feliciano õe Castilho, AugustaJ
Luso, A. Lima, A. P. Calõas, Augusto Pereira Soromenho,|
Faustino Xavier õe Novaes, D. João õe Azeveõo, João Õ€
Lemos, J. Freire ôe Serpa Pimentel, Nogueira Lima, Pe-
reira õa Cunha, Camillo Castello Branco, etc, etc.
A pag, 201 ôa mencionaõa Miscelânea Poética, ha umaf
poesia ôe Camillo, intitulaõa Meditação, Ôeôicaôa a sua ir- '
mã, Carolina Castello Branco,
A pag. 73 õo referiõo jornal, encontrei a poesia que transa
crevo e que é firmaõa por Carolina õa V. Castello Branco.
HavenÔo, na familia õe Camillo, o apeliõo Veiga, (o gran»
Õe romancista teve uma tia chamaõa D, Rita Emilia õa Veiga
Castello Branco), será a irmã de Camillo, a senhora a quem
me refiro ? Esse da V. corresponderá a da Veiga f Será umt
mera coincidência o facto que aponto ?
Não tenho elementos para esclarecer este interessante
caso que em pouco se cifra.
Para o resolver, porém, parece-me que bastava saber:
Poetisas Portuguesas 91
»
primeiro : se a irmã òe Camillo, D. Carolina Castello Branco
que, Ôepois õe se casar com o meõico Francisco José õe
Azevedo, passou a assignar-se D. Carolina ô'Azeveòo Cas-
tello Branco (Romance do Romancista, pelo Sr. Alberto Pi-
mentel, pag. 37), alguma vez usou o apelido Veiga; segunõo :
se fez versos.
Quanto a esta ultima parte, parente próximo Òe Camillo,
informou-me que D. Carolina, não foi poetisa.
Tenõo recorrido a uma outra fonte segura e ò'auctori-
saõa opinião sobre assumptos Camillianos, naòa consegui
apurar.
Aqui fica posto o problema, para quem, com mais tempo
e elementos õo que tenho e disponho, o queira solucionar.
Se esta Poetisa tiver sido a irmã de Camillo, grande se-
rá a minha satisfação, por ter provocado o conhecimento
desse facto. Se tal se não der, registada fica a coincidência
que leva ás duvidas que apresento.
SCISMAVA
Passo aqui tardes, sósinha,
Nestes prados verdejantes
A scismar :
N'alma sinto as fundas maguas.
Ao murmúrio d'estas aguas
Murmurar.
Quando assim me vejo triste
D'um penar d'intima pena ■
Choro então ;
Que eu não amo a natureza
Na solidão.
Amo-a sim, embalsamada
Nos perfumes que lhe aspira
A alma em paz ;
92 Poetisas Portuguesas
Mas se a Õor punge òe aguõa
A natureza também muòa
Não me apraz
Sei que a õor tem ôesafogo
No alaúôe, terno amigo
Tam fiel.
Faço trovas, mas as trovas
São amargas, ouras provas
De agro fel !
Carolina òa V. Casteilo Branco. Miscellanea poética, 2.
collecção, Porto, 1852. pag. 73.
D. CATHARINA MÁXIMA DE FIGUEIREDO
ABREU CASTELLO BRANCO
D. Catharina Máxima òe Figueiredo Abreu Casteilo Bran-
co nasceu em Guiães (pequena alôeia õo õistricto òe Vila
Real), cognominada a Cintra Transmontana.
Esta Senhora tem uma ascendência muito ilustre, como
se lê no livro Os Estrangeiros no Lima, obra rara e curio-
sissima òe que é auctor Manoel Gomes òe Lima Bezerra,
e que foi publicada em Coimbra em MDCCLXXXV.
No mencionado livro, diz-se que os •< Abreus são Òas fa-
milias mais antigas e ilustres òo Reino.> «Segundo alguns
auctores, provem da Casa Real de França pela linha e va-
ronia òe Filippe e Carlos, Conòe òe Evreux.>
Nesta familia, tem havido, segunôo menciona o referido
volume, muitos eruditos, preòestinaòos, heroes e santos.
Assim, citarei, por exemplo, os nomes òe Frei Manoel do
Cenáculo, arcebispo de Évora ; D. Luiz Álvaro de Figuei-
redo, arcebispo da Bahia ; Bernardo d'Abreu Casteilo Bran«
CO, desembargador muito culto.
Poetisas Portuguesas 93
Apezar õe D. Catharina Máxima Ôe Figueiredo Feio só
se õeõicar á literatura, nos poucos momentos que as suas
ocupações caseiras lhe òeixavam livres, foi uma poetisa
Òistincta.
O que acabo ôe escrever, faz-me pensar quantas Sevi-
gnès e Georges Sano Portuga! poderia contar, se o nosso
meio fosse propicio á revelação e òesenvolvimento õe mui-
tos talentos e vocações que, por certo, se teem õefinhaõo
e peròiòo !
Aos õezaseis anos publicou esta Senhora o seu primeiro
volume òe versos, inMtulaòo Poesias.
E' também auctora ôe um romance. Amor de Mãe, pubti-
cabo em folhetins, e ôe mais ôois volumes cujos titulos são :
Fragmentos de Prosa e Verso e A Ultima Estancia, livro
qué foi prefaciaôo por Xavier RoÔrigues Corôeiro, o notá-
vel poeta, auctor ôo Tasso e ôa Doida de Albano.
O fragmento òa poesia, O Firmamento, que reproôuzo, é
extractaôo oeste livro. Na opinião ôe um ôos nossos ho-
mens ôe letras mais notáveis, poôe esta composição poé-
tica figurar a par Ôa ôe igual titulo, ôe Soares Ôe Passos.
Tenôo siôo Soares ôe Passos acusaôo ôe plagiário, Theo-
philo Braga provou na Revista Literária e Scientifica, ôe
O Século ôe ôezembro ôe 1904, que a poesia Firmamento
foi feita pelo auctor ôo Noivado do Sepulchro e não por
Lourenço ôe Almeiôa e Meôeiros.
O FIRMAMENTO
E' noute ! • • sobre o munôo aôormeciôo,
Fulge tranquillo o céo, profunôo e bello !
Eis a extensão immensa. . inôefeniôo
Abysmo. • . ôe razão constante anhelo !
Seus limites quaes são ? Onôe termina
Esta série ôe estreitas rutillaníes?. - .
Nos paramos ô'um Deus ; mansão ôivlna,
Povoaôa ôe aéreos habitantes ?
94 Poetisas Portuguesas
São munôos ; õa attracção no eterno laço
Sustidos pelo impulso que não cança ;
Giranôo sem ôestino n'esse espaço,
Que o espirito nosso não alcança?. . .
Mas tantos, tantos munôos ? ! Esta iòeia
Que esmaga o pensamento e a voz tem presa,
Mais nos oífusca a luz, porque a alma anceia.
Deixanõo-nos no vago a incerteza.
Que tormento, meu Deus! Não ser possível
Haver õa gloria vossa a comprehensão ! ?
Ser tuòo a tantos olhos o invisível,
O vácuo òa insonõave! confusão ! ?
Catharina Máxima òe Figueiredo Feio. A Ultima Estancia,
Porto, pag. 17.
COMPREHENDES?
Sabes porque no valle os brancos lirios choram
Quanôo o fogo õo sol lhes não bafeja a tez ? . .
Vês a rola sentiòa, entre as selvas que enfloram,
Gemer õo seu amor a longa viuvez ?. • .
Busca em a natureza a õefinição recta
Oos mysterios õa viõa ; o fim, a aspiração ;
E se póões após õiz se n'alma õiscreta
Entram õo seu segreõo a justa comprehensão ? „.
Catharina Máxima õe Figueireõo Feio. A Ultima Estancia,
Porto, pag. 52.
^
4
Poetisas Portuguesas 95
D. FLORA CASTELLO BRANCO
D. Flora Castello Branco é filha õe D. Anna Rosa Cor-
rêa e ôo Visconòe ôe São Miguel õe Seiõe — Nuno Cas-
tello Branco — falecido em 23-1-1896. •
. Neta mais velha õe Camillo Castello Branco e Õe D. An-
na Placiôo, D. Flora Castello Branco que resiõiu, Õurante
muito tempo em São Miguel õe Seiõe, era irmã õe Camillo,
Nuno Placiõo", Rachel, Simão, Manoel e Estella ôe São Mi-
guel õe Seiõe Castello Branco,
E' para lastima*r que os versos õesta Poetisa que chega-
ram a ser compilaõos pelo õistincto e infatigável Camillia-
nisía sr. Alberto Pimentel, não tenham siõo publicaôos em
volume, até hoje.
MEU VIVER
Ai ! como é triste o viver
De quem se sente captiva
Como uma pomba feriõa
Que na prisão vae morrer.
D'antes eu ia contente
Colher boninas õa aurora
Por esses praõoá em fora
Banhaõos Õo sol poente,
Guiava- me a liberõaõe,
BuscanÕo fructas e flores ;
Não tinha meu peito amores,
Desconhecia a Sauôaõe ! . .
Erguia os olhos aos Céos,
Enlevaõa, mas um õia
Levou-me toõa a alegria
Aquelle supremo Aõeus !
96 Poetisas Porcur/i^'-'"^
Ai ! como é triste o viver
De quem se sente captiva
Como uma pomba feriòa
Que na prisão vae morrer ! . . .
Flora Castello Branco. Occidente, n." 1006 õe 10-12-1906,
pag. 267.
M1NH'ALMA
Chora, alma, que no pranto
Da espr'ança meõra a flor ;
Tem coragem, sae ovante
D'esta mais que humana õor ! .
Vejo alem òe amargos õias
Aurora santa raiar ;
Espera, alma, não chores.
Que a ventura ha õe tornar !
Flora õe Castello Branco. Occidente, n." 1004 Õe 20-1 1 - 1<
pag. 250.
D. LEONOR DE FIGUEIREDO ABREU
CASTELLO BRANCO
D. Leonor õe Figueireõo Abreu Castello Branco, nasc€
em Guiães.
Era filha õe D. Genoveva Moreira õe Azeveõo e õe ]os4
Maria õe Figueireõo Abreu Castello Branco e irmã õe D.
Catharina Máxima õe Abreu Castello Branco, poetisa a què;
se refere esta Anthologia, e tia Õa õistincta poetisa e es*
criptora õe quem também se occupa este trabalho, D. Ma-.:
ria Feio (D. Maria Figueireõo Feio Rebello Castello Branco)/
Parte õas poesias Õesta Senhora que õescenõe õe pes*
Poetisas Portuguesas 97
soas illuslres, e que suponho ser aparentada com Camillo
Castello Branco, quanòo mais não seja, por parte ôo Dr.
Francisco Correia Botelho, conservador em Vila Real (con-
clusão a que teria o maior empenho em chegar, se as mi-
nhas inúmeras e opostas ocupações, me não deixassem uma
parcela minima õe tempo, para tratar ò'assumptos literá-
rios), foi publicado em diversos jornaes e almanachs, pos-
suindo sua sobrinha o manuscripto com as melhores pro-
ôucções poéticas, de D. Leonor de Figueiredo Abreu Cas-
tello Branco, as quaes um dia o publico terá ocasião de
aoreciar.
LAURA
Deitada á beira do abysmo
Coitadinha, adormeceu.
Por cama tinha uma pedra,
Por docel o azul do ceu ;
Somente por cabeceira :
I' Uns cabellos annelados
\ Côr da flor da canelleira,
Quasi nua, n'uns trapinhos
Parte do corpo envolvido,
Banhado o rosto de cera
Talvez do pranto vertido.
Mas que farta cabeceira
Eram seus bastos cabellos
Côr da flor da canelleira.
Pendido um braço no abysmo,
O outro sobre um rochedo,
Assim dormia serena
A creancinha sem medo ;
Só tendo por cabeceira
Uns cabellos annelados
Côr da flor da canelleira.
eonor de Figueiredo Abreu Castello Branco.
98 Poetisas Portuguesas
D. MARIA FIGUEIREDO FEIO REBELLO
CASTELLO BRANCO
(d. MARIA feio)
D. Maria Figueireòo Feio Rebello Castello Branco nasceu
em Guiães, alôeia Irasmontana.
E' filha õe D. Catharina Máxima Õe Figueiredo Abreu
Castello Branco, poetisa õe talento, e ôe Sebastião Pereira
Rebello Feio que era ôotaôo õe uma bonõaõe invulgar.
Os primeiros versos õe D. Maria Feio õatam õos onze
anos. Foram publicados no Ahnanach de Lembranças.
Apesar õe tão precocemente ter principiaõo a revelar-si
em D. Maria Feio a inclinação pelas letras, só muitos ano"^
Depois pouõe novamente entregar-se, á literatura e aos es-
tuõos sociaes e humanitários, os quaes constituem hoí
quasi o exclusivo fim^ôa sua viõa.
Tenõo siõo bastante infeliz e havenõo soíriõo muito,
Maria Feio resolveu õeõicar-se, ôe alma e coração, aos vaà
les õe que enferma a socieõaõe, e em especial á causal
ôignificação õa mulher, que aõvoga com são critério.
São õe D. Maria Feio as seguintes palavras que
ram a pag. Ill õo seu livro Alma de Mulher., publicaõo ai
1915:
«Que as nossas armas Õe combate sejam somente o sea
timento que enternece, a õoçura que cativa, a graça qtt
atrae, a bonõaõe que converte, que õomina e vence.»
Não sei que mais aõmirar, no seu livro Calvário de Mu
Iher, obra em que, a traços firmes, faz na parte õolorosa,
sua autobiografia, se a linguagem imparcial õe que, sempr
usa, se as granões conclusões que lira n'esse livro que,n
õizer õe Magalhães Lima, é uma tese õe psicologia e Õ
sociologia muito importante, para a obra õa civilisação.
Tenõo liõo o Calvário de Mulher que é õeõicaõo a ]ea
Finot e relacionatiõo iõeias, lembrei-me então õessa granZ
Poetisas Portuguesas 99
iveròaôe que Novicow òiz no seu livro Emancipação da Mu-
«CaÕa talento ôe mulher que não chega ao seu pleno de-
sabrochar é um passo a menos para a obra õa civilisação.>
Como poòerão os talentos Desabrochar em Portugal, se
o trabalho òas escriptoras é ainõa, em geral, peor remune-
raõo que o õos escriptores ? !
D. Maria Fei escreve ha 8 anos, mas sem remuneração
oficial ou particular !
Por este e outros factos, é que eu aòmiro a coragem
ôalgumas õas nossas Intelectuaes que, sem incentivos, e
atravez 5e mil òificuíòaões e inôiíerentismos, sulcam o re-
volto mar õas letras.
A obra ôesta Poetisa, poôe ser encarada, sobre diversos
aspectos.
Como escriptora, é auctora õe :
Alma de Mulher, 1915, (notas Õe um õiario intimo õe re-
; flexões; Calvário de Mulher, 1915; Ferííat/e5, (assumptos
; sociaes e políticos) ; Corações Infantis ; Argumentos. Neste
■ folheto, ha valiosas cartas escriptas por D. Carolina Michae-
lis õe Vasconcellos, D. Virgínia Õe Castro e Almeiõa, Teó-
filo Draga, Justino õe Montalvão e Sousa Costa, õirigiõas a
esta Senhora.
I Como jornalista, tem colaborado na Capital, Primeiro de
Janeiro, Lucta, Comercio do Porto, Vanguarda, Novidades,
etc,
I Alem õe um belo livro õe versos em que trabalha e cujo
titulo deve ser Sonho de Amor, tem para publicar as seguin-
tes obras :
Arte e Artistas, (apreciações sobre arte e artistas em Por-
tugal) ; A Belesa da Mulher, (estudo sob o ponto Õe vista
imoral); Contos Verdadeiros ; Vo^es do Coração, La':; aros
ie Magdalenas, (estuõos sobre o efeito õa avariose).
i Como conferencista, também é apreciável a obra õesta
i, Senhora.
100 Poetisas Portuguesas
FÉ
(inédito)
Minha alma num anòor 5e sete estrelas,
Subiu á torre iòeal Ôa sua Egreja.
Talvez õa terra nenhuma alma a veja
Mas ela vê do alto a toõas elas.
De lá, num explenõor ôe Eucarestia,
Como arco iris canõiôo õe abril
Envia a chuva proõiga e subtil
Do amor que fulge em nimbos õe poesia.
E ás pobres almas que anõam lá na guerra
Como anòorinhas loucas sem beiral
Em vez òe peòir para a alma Ôa terra
Quizera ouvir òizer em communhão
Que lhe inspirasse a Fé no mesmo Iõeal.
Bemõita seja a tua õevoção.
Maria Feio.
A CANÇÃO DO MAR
(inédito)
o verõe mar ôas esperanças
O mar verõe õa sauõaôe !
Vai e vem e torna a vir
Traz-me a onõa õa bonõaõe.
Onõinas que sois o espelho
Onõe se mira o sol-pôr
Trazei-me Õe longes terras
A Galera õo amor.
Poetisas Portuguesas 101
Galera ò'ouro e òe sonho
Sempre a nascer e a morrer
Como a luz õa lua cheia
Que nasce para bem querer.
Quem me dera no mar alto
Anbar sempre a navegar
Levanôo á proa os meus sonhos
Sempre, sempre, a timonar.
Iria aboròar õecerto
Aquela ilha õe Amores
Onõe a bqnõaõe poòesse
Ser padroeira Ôe õores.
Remae, remae, sonhos belos
Timoneiro anòa õepressa
Que bem poòe vir a morte
Antes que o òia anoiteça.
E emquanto sonhas no sonho
De Amor e bem querer
O mar se irá engalhanõo
Em trovas òe aõormecer.
Maria Feio.
D. EMÍLIA AUGUSTA DE CASTILHO
D. Emilia Augusta òe Castilho era filha òe Alexanòre Ma-
gno òe Castilho, bacharel formaòo em matemática, e òe sua
mulher senhora francesa que òesposou, quanòo emigraòo
constitucional.
D. Emilia Augusta òe Castilho nasceu em Lisboa, a 22 òe
Setembro òe 1841.
102 Poetisas Portuguesas
Aòoraõa por seu talentoso pae, teve brilhante eòucação,
e, ôesõe a meninice, tornou-se o encanto e aòmiração 5e
sua familia e òos íntimos.
Escreveu, por brincaõeira, alguns versos infantis que, por
vezes, foram publicados no Almanach de Lembranças fun-
Õaõo por seu pae em 1850.
Era muito formosa, como mostra o belo retrato, a oleo,
existente em casa õo eruòito investigador Sr. Visconde 5e
Castilho, auctor õe varias obras ôe merecimento, entre as
quaes mencionarei Lisboa Antiga, 8 volumes.
D. Emilia õe Castilho foi casada com seu primo co-irmão,
Alexandre Magno de Castilho, capitão-íenente, engenheiro
hydrografo, sócio da Academia Real das Sciencias de Lis-
boa, auctor de importantes obras scientificas, e filho do Dr.
José Feliciano de Castilho Barreto de Noronha, do Conse-
lho de Sua Magestade Fidelíssima, etc.
Esta Senhora de cujo talento muito havia a esperar mor-
reu na Figueira da Foz, a 20 de Maio de 1860, contando
apenas 19 anos. Deixou uma filha que morreu sendo ainda
criança.
VISÃO
Dormia ! O socego da noute reinava
Em torno de mim ! . . .
Somente ao Altíssimo o mar elevava
Seu hymno sem fim I. . •
E eu vi uma fada, tão branca, tão bela • .
Ao leito chegar ;
Na testa tão pura, cravada, uma estreita
Lhe vi scintillar. .
«f.evanta-te, disse com voz maviosa
Levanta-te e vem ! • . »
Ergui- me, seguí-a, sahio graciosa
Sahi eu também.
Poetisas Portuguesas 103
Anòámos um pouco ; em frente a uma porta
A faòa parou ;
Com um volver ô'olhos que inflamma e transporta
Que entrasse ordenou.
Em misero leito, finava, gemia.
Formosa mulher . .
E não lhe acalmava mortal, agonia
Um ente sequer ! . .
Senti um thesouro surgir em meu peito,
De õó e õe amor ! . ■
Senti svmpathia, tristeza, respeito
Por tão viva òôr ! . -
A faòa arrancou-me ôe scena tão triste ;
E olhanõo p'ra mim,
«Não é ainôa naõa o quaòro que visife,
Ha muitos assim !»
E fomos seguinòo mil ruas escuras
Da lua ao alvor ;
Mostrou-me em silencio cruéis Desventuras
E abysmos ôe ôôr !
Mostrou-me choupanas, anõrajos, ôeshonra,
Miséria, affiicção !. . -
Velhinhos sem cama, mulheres sem honra.
Crianças sem pão I
Exhausta e aflicta, me afasto e pergunto
Com trémula voz :
<Quem sois, 5e tão raras bellezas conjuncto,
Dizei, quem sois vós ?
«Eu sou a Cariõaòe, me õiz ôôcemente ;
E quiz-te mostrar
Que inúmeras õôres, com mão provi&ente.
Se poõem curar.
f:
104 Poetisas Portuguesas
Agora que as viste, minora a sentença
Lançaõa por Deus !
Do bem que fizeres terás recompensa,
Na terra e nos ceus.>
Sumio-se, e sosinha me achei, no meu leito !
Foi sonho ?. . . Oh ! que não.
Tarefa tão santa gostosa te acceito,
Brilhante visão !
Emilia Augusta ôe Castilho. Almanach das Senhoras, 1859,
pag. 382 e 383.
D. CACILDA PINTO COELHO DE CASTRO
Desòe criança, D. Cacilõa ôe Castro revela gosto e pro-
pensão pelo estuõo e pelas letras.
Ainòa òe saias curtas — e na iôàõe em que o iôeal é
brincar e o aprenòer uma maçada — já D. Cacilòa ôe Cas-
tro lia e estudava, sem òescanso.
Apesar òa sua grande aplicação ao estudo, e, talvez, por-^^
isso mesmo, poucos professores a satisfaziam.
Preferia estudar sem auxilio, fa^endo-o com orientação
própria. ,^
Tudo quanto sabe deve-o, pois, a si mesma e á sua inte- ,;|;
ligencia. :í|
Bem nova, contando apenas 15 anos de idade, publicou^
o seu primeiro livro Silhuetas, volume de contos que se^
acha exgotado e que a critica recebeu com louvores e jus-
tiça.
Sempre alheada da politica, D. Cacilda de Castro tem es-
cripto e colaborado em quasi todos os jornaes, revistas e^
almanachs que se tem publicado em Porti^al, desde 09|
Poetisas Portuguesas 105
mais obscuros, até os mais conheciòos como o Portugal»
jornal em que não colaboravam senhoras.
Em Julho òe 1911, foi representada no Theat}^o da IS aí u-
resa, na Estrella, com geral agraõo e sucesso, uma peça em
I acto, Merlim e Viviana, que esta Senhora escreveu em
II bias, a peòiõo õe Aõelina Abranches.
Esta Ôelicaòa peça teve não só belo õesempenho, como
luxuoso guaròa-roupa.
Um ano Õepois, D. Cacilòa õe Castro escreveu uma outra
peça teatral, Òe Grano Guignol, intitulada Esta Mascara
que cedeu a Alexandre de Azevedo que a fez representar
no Iheatro de Sá da Bandeira, do Porto, onde foi rece-
bida com as mais carinhosas frases, pela critica portuen-
se.
Entre essas apreciações destacarei, a de Simões Coelho,
o critico do jornal A Montanha.
Nesse mesmo ano, isto é em 1912, a auctora de Merlim e
Viviana, escreveu expressamente para a festa artística da
actriz Aurora Abranches, uma outra mimosa peça, Manhã
de Neve que, como as anteriores, obteve grande êxito.
A' excepção de Esta Mascara, todas as peças citadas, es-
tão publicadas.
A D. Cacilda de Castro cabe a satisfação de ter sido quem
primeiro fez ouvir e representar no teatro portuguez, o verso
natural.
Apesar do bom acolhimento que sempre tem sido dispen-
sado aos trabalhos desta Senhora, D. Cacilda de Castro
ainda se não animou a dar á publicidade novos lavores li-
terários começados.
NAS ruínas do convento DE ALMOSTER
Pesado e firme o alpendre do convento
Oppõe ao tempo, o vulto denegrido.
Dentro do velho claustro somnolento
Tem cada altar um écho dolorido.
106 Poetisas Portuguesas
Pela nave ôesòobra-se um lamento ;
E na estante õo cravo carcomiõo
Repousa ainòa, o ultimo fragmento
De um cântico nas trevas õiluibo . •
Rumoreja na cerca o arvoreôo,
Esparsas orações quase em segreòo .
E por toõo o mosteiro a Õesabar
Passam noviças num passinho breve,
Que òe ar contricto e ôe cabeça leve,
As sombras hoje vem corporisar.
Cacilõa õe Castro. Jornal da Mulher, Lisboa, I ano, n." II
òe 5 ôe õezembro ôe 1910, pag. 93.
O GAROTO DOS OLHOS AZUES
E' vel-o sempre no Chiaòo
Ôe perna ao léo, Ôe pé ôescalço,
toôo contente e esfarrapaôo !
No nosso encalço
peôinôo esmola, ,
com o ar feliz ôe quem a ôá •
Coitaôito !
Vivo e saltitante, lembra um passarito
fugiôo ôa gaiola !
Cinco annos terá . . .
não mais ôecerto ;
e assim pequeno e tão esperto,
a gente tem
ôe parar
a olhal-o bem.
Poetisas Portuguesas 107
E vê-lhe na cara suja, a protestar
immaculaôos :
os linòos olhos azues,
muito azues. . . e sombreaõos !
De um azul que me recorõa
o azul ôos olhos teus
quasi innocentes também
quanôo se fixam nos meus.
E contente,
òou-lhe a esmola
que elle espera impaciente -
receanõo que eu lhe fuja !
— Porque te evoco a ti,
na graça õ'aquellè olhar,
e no contraste que ri
n'aquella carita suja . •
Cacilòa òe Castro. Novidades (jornal).
SUPOSIÇÃO
Porque as õuviôas me affligem
e receio . .
E não creio
«o que os teus olhos me òizem
Se o que õizes não consigo
entender. . .
e te òigo
o que não quero òizer ;
se estremeço
quanòo te vejo chegar !
E entristeço
por te não encontrar .
108 Poetisas Portaauesas
E também :
— e isto é o peior —
Porque te encontro, melhor
que ninguém !
Porque eu gosto òe te ouvir
se me falias . .
E me fico a sorrir
se te calas :
Ninguém vês
que em tão pouco veja amor !
Mas tu és capaz õe o supor. .
e eu talvez. . .
Cacilôa õe Castro.
CÉLIA ROMA
(D. ALICE LAURENCE ORAM)
Célia Roma é o anagrama com que D. Alice Laurenc#i
Oram, a talentosa jornalista e poetisa que nasceu em Lis-,
boa, tem firmaòo as suas poesias e alguns òos seus tra-
balhos literários.
Aos òes anos õe iõaõe, f unõou no seu colégio Õe Campo-
liõe, um jornalzinho no qual segunõo a própria expressão
õesta Senhora, publicava verços erraõos e contos invero-
simeis.
A mociõaõe Õe D. Alice Oram foi passaõa num meio
culto. Em sua casa, em Cintra, õurante os meses õe verão
e por vezes nos õe inverno, reunia-se quasi tcõas as noi-
tes um grupo õe escriptores e poetas ilustres ; e foi ouvin-
õo-os e aõmiranõo-06 — <a um canto õa sala, silenciosa e
esqueciõa» — que D. Alice Oram apreõeu a pensar e eõu-
cou o seu espirito.
Poetisas Portuguesas 109
Entre muitos outros nomes Õe pessoas notáveis que se
reunião em sua casa, citarei os õe Eça Ôe Queiroz, Rama-
lho Ortigão, D. João ôa Camará, Silva Pinto, Latino Coe-
lho, Thomaz ôe Carvalho, Alberto Braga e Bernardo Pin-
ôela.
Desses saudosos tempos õa sua infância, conserva ainòa
D. Alice Oram, como preciosa relíquia, um òos seus cader-
nos òe colegial, no qual existem uns chistosos bouts rimes,
escriptos pelo punho Ôe Eça ôe Queiroz, Alberto Braga e
ôe ]aime Batalha Reis, nosso Ministro na Rússia.
E', principalmente, como jornalista que D. Alice Oram é
conheciôa.
Tem a seu cargo, actualmente, alem ôa informação tele-
! gráfica e por carta, para quatro jornaes inglezes e a repre-
, sentação em Portugal, ôo Associeted Press of America, a
reportagem para o Dailly Mail, ôe LonÔres, que ôeviôo á
• granôe activiôaôe e exforço ôe D. Alice Oram, foi o pri-
■ meiro jornal estrangeiro que ôeu a noticia Ôe ter rebentaôo
a Revolução 5 Ôe Outubro.
O que se passou em Portugal, nesses ôias sangrentos ôe
Outubro ôe 1910, noticiou-o em longas columnas, e telegra-
mas, o citaôo jornal lonôrino que, reconheciôo — pela for-
ma rigorosa ôas informações ôa sua corresponôente e pelo
moôo corajoso como se portou, nesses Ôias ôe revolução,
D. Alice Oram, que para colher entre a aluvião ôe boatos
contraôictorios, fieis e históricos pormenores, não ôuviôou
atravessar, entre fogo, os pontos e ruas sitiaôos, — en-
viou-lhe, como premio, ôe seus bons serviços um cheque
ôe 100 libras, acompanhaôo ôe honrosas referencias feitas
á sua pessoa.
Alem ôos referiôos jornaes, foi também corresponôente
Ôo Echo de Paris e ôe La Vie Finandère de Paris, missão
que ôeclinou, visto não lhe chegar o tempo para tantos tra-
balhos.
Como traôuctora, tem D. Alice Oram o seu nome ligaôo
ás versões :
110 PoetÍBas Portuguesas
Oliver Twist, òe Dickens, varias õe William Dlack e Aca-
ôon Hill e Contos õe Gabriel õ'Anunzio ; alem õas citaôas,
traòuziu mais alguns tomos Ôa colecção òe literatura poli-
cial, õe Conen Doyle que tanta voga obteve entre nós, no-
velas que também tiveram por Iraõuctores Augusto Gil, Lo-
pes õe Menõonça, Manoel õe Maceõo e Christovam Aires,
(filho).
No antigo teatro õe D. Amélia representou-se, em 1905,
peça Clairière Õe Donnay e Descavel igualmente traõuzi?
por D. Alice Oram.
A varias outras emprezas teatraes estão entregues veí
soes õe peças õe Pinero, Suõerman, e õe Jules RenarÕ, fei«J
tas por Célia Roma. |
Como poetisa e contista, a obra literária õesta Senhorá|
anõa espalhaõa por varias revislas Õ'arte e jornaes. Uma|
õe suas poesias publicaõa na Crónica mereceu õe Gomes^
Leal que não conhecia, a esse tempo, sua auctora, as maií
calorosas apreciações, achanõo o auctor õas Claridades do}
Sul, que quem tão bem fazia versos, não Õevia escrever^
prosa.
NUVENS
Do mar as nuvens leves vão subinòo
Em renõilhaõo veu,
Brancas teias õe aranha, revestinõo
O ciaro azul õo ceu.
Depois, impelle-as rapiõas o vento,
Correm sem õescançar.
Tão altas quasi como o pensamento
De quem vive a sonhar.
Alegres sonhos meus, haveis passaõo
No ceu õa minha viõa. . .
Assim as nuvens õo azul, em vôo ousaõo,
Vão lambem õe fugiõa.
Poetisas Portuguesas Hl
Errantes peregrinas ôos espaços,
A' luz òo fim òo õia,
Pintam na tela azul, a largos traços,
QuaÔros õe phantasia ;
Castellos negros, rochas escarpadas,
Sobre tranquillos mares,
Com tintas õas auroras irisaõas
Das regiões polares • . .
E vejo n'essa vaga nebulosa,
Um munôo povoaôo
Peias òivinas sombras côr òe rosa
Dos sonhos òo passaôo.
No anceio òe alcançal-os, n'um momento
De um munòo ao outro passo,
Pela escaòa fugaz òo pensamento
Subo atravez òo espaço.
E minha alma inconstante e fugiòia,
Veloz como Atalanta,
Vae azul fora em busca òa alegria
E a par òas nuvens canta.
Sem ver que o corpo preso á terra chora,
E geme e òesfallece,
Nem que a raòiante luz ò'aquella aurora
Breve òesapparece.
Célia Roma.
112 Poetisas Portuguesas
D. LAURA DA FONSECA CHAVES
D. Laura õa Fonseca Chaves nasceu em Lisboa. E' filha]
òo Dr. João Henrique Dias Chaves, já falecido, e ôe D. Pa-|
trocinia ôa Fonseca Chaves.
D. Laura Chaves que é auctora õe primorosos versos q\
encantam pela sua naturaliôaõe, graça e sentimento, como^'
se verá pelas poesias que transcrevo, fa-los sem pretenção, .
por mero passatempo. Só muito instaòa, aceôeu a sererari
publicaòos no Brasil e '^Portugal, Almanach das Senhoras^
e no Jornal da Mulher onõe as suas proòuções poeticasj
teem siôo muito bem acolhidas. <|
Alem õessas poesias e õe muitas outras que estão ine^^l
õitas, esta Senhora é auctora òe òiversas peças teatraes»^
em prosa e verso, que foram representadas por amado-;?,'
res. /
Nas suas poesias que abordam assumptos muito diferen-,
tes e nos seus restantes trabalhos literários, predomina a|
nota satírica, nota que esta Poetisa tem cultivado com exito.|
D. Laura Chaves que pertence ao grupo das jovens Poe-
tisas Portugue;?as que figuram nesta Antologia, é, pelos
seus merecimentos e talento, uma das mais lídimas espe-
ranças da Literatura Portuguesa.
raciocínio de criança
A' Helena
— O' mãesinha, ouve lá, explica-me isto, sim?
Dizem que tudo morre, e custa-me a entender.
Pois o paesinho e tu um dia hão de morrer
E tudo quanto existe ha de acabar assim ? —
— Dizem que os mortos vão — e eu acho isto esquisito,
Mettidos em caixões. Que lindos caixõesinhos
Devem levar p'rá terra as flor's e os passarinhos !
Quando eu morrer também irei assim bonito ? —
Poetisas Portuguesas 113
- Que patetinha és, sempre tens caôa iõeia !
A morte naõa poupa, é má, é muito feia !
Lhe respondeu a mãe n'um tom grave e profundo.
O pequeno ficou apreensivo, muõo,
Depois õisse a sorrir : — Se morre tuôo, tuõo.
Mas que granòe caixão ha õe levar o munôo !
Laura Chaves. Jornal da Mulher, n.° 103 õe 30-11-1915,
|5.* ano, pag. 1553.
SONETO
\o sair òa taberna, aos borõos pela rua
■/ae caminhando incerto o pobre borrachão.
; N"uma voz avinhada embirra com a lua
1^^'or pôr sombras na terra e confundir-Ihe o chão,
I Jisto tropeça e cae : p'rali fica deitado
^) corpo n'um novelo — um horror que faz dó !
|'!ão consintas ó Deus, que um ser por ti creado
|ienha por leito a rua^ e por coberta o põ !
I ão vês que o infeliz não tem pão para dar
|os filhos e á mulher ! Se bebe é p'ra olvidar
I fome que os tortura e os vae ceifando a eito !
I I que pregaste, Deus, na terra a egualdade
^,\ como o rico cumpre essa tua vontade !
l3ísfaz o mundo, vá ! que está muito mal feito !
? 'Laura Chaves. Jornal da Mulher, 6." ano, n.° 115. Lisboa,
íí 11-1916, pag. 1818.
114 Poetisas Portuguesas
^
À
O AMOR E O TEMPO
Voava pelo espaço o Amor alegremente
Pensanõo em fazer mal á pobre humaniôaòe,
Quatiòo a tolher-Ihe o vôo, apar'ceu ôe repente
O tempo, que a sorrir o olhava com bonõaõe.
Ao ver-se preso assim, Cupiòo Descontente
Murmurou n'um òesõem replecto õe malbaõe
<Afasta-te Ò'aqui, velho tonto e ôemente
E òeixa-me passar que eu quero a liberõaòe !»
«Ah, não me tens respeito» exclamou o tempo iraòo
«Pois eu para evitar que sejas malcreaôo
Hei òe seguir-te sempre onôe quer que tu vás I
E õesõe então o Amor não anõa satisfeito,
Não leva naôa ao fim, naôa lhe sae com geito,
Porque o tempo õestroe tuôo quanto elle faz I
Laura Chaves. Jornal da SMulher, n." 110 ôe 30- 6-916,!
ano. pag. 1710.
:t
A TEMPO
O baile ia acabar. A orquestra executava
N'um murmúrio òe sonho uma valsa onòolante
Eu, triste no seu hombro a cabeça pousava
Deixanõo-me levar semi-morta, anelante.
N'isto ele, aproveitando esse meu òevaneio,
Chegou-me muito a si ôizenõo com aròôr :
«Deixa o teu coração palpitar sem receio
«Porque eu ha muito sei que tu me tens amor !»
Poetisas Portuguesas 115
Ao ver que me arrancava o meu segreõo assim
Tive um meòo cruel òe não ter mão em mim,
Mas não qu'ren()o mostrar-lhe o meu granòe embaraço
Sustentei sem temer o seu olhar arõente
E õisse-lhe a sorrir, muito serenamente :
<Não fale mais, senão perõemos o compasso!
Laura Chaves. Jornal da Mulher, 5° ano, n." 102, Lisboa.
30-10-1915.
D. BRANCA DE GONTA COLAÇO
D. Branca òe Gonta Colaço, a inspirada e conheciôissima
Poetisa Portuguesa, nasceu em Lisboa. Filha õo granòe
poeta Thomaz Ribeiro, D. Branca õe Gonta Colaço que é
casada com o notável artista ]orge Colaço, tem sabiõo
continuar nobremente as gloriosas tradições literárias òe
seu pae.
Esta Poetisa é auctora òos seguintes livros :
Matinas, 1907, (exgotaòo) ; Canções do meio dia, 19Í2 ;
.Poetas d' Honrem, 1915.
Como conferencista, a obra Òe D. Branca òe Gonta Co-
flaço é também muito apreciada.
Poetas d'Eonteni, assim se intitula uma òe suas confe-
Cfencias, que por duas vezes fez nas elegantes salas da
lUga Naval Portuguesa, òe Lisboa, ante uma selecta assis-
(lencia.
Dessa conferencia, diz no Jornal da Mulher (n." 84 de
5 de ]unho de 1914), o sr. António Batalha Reis, o dis-
; inctissimo oenologo e escriptor que tão considerado é
)ela sua competência e saber :
«Tornar saliente a religiosa unção, com que ouvimos a
onferente recitar algumas producções dos Poetas d'Hon-
;m — entre as quaes sobresahiu, com inconfundível bri-
10, a Borboleta de Thomaz Ribeiro, é ainda uma veròaòe
116 Poetisas Portuguesas
bem veròaôeira. Mas tuõo isto, que quer aparentar alguma
couza, — não é naòa, por fim òe contas ! E não é naòa
porque, em tuõo que se poòesse òizer, — rezultaria sem^
pre a irremediável falta õe sublime enlevo que imprimit
naturalmente, nos ouvintes, — a suave, carinhosa e insi*
nuante voz òe Branca òe Gonla que chega aos nossos ou-
viòos como um canto celestial, — que nos ôelicia, — en-
canta, — prenòe e nos conòuz, branòamente, a um veròa-
òeiro extasis, completamente òivino e único!»
Esta apreciaòa conferencia foi mais taròe publicaòa ent'
volume, eòição feita a peòiòo e a expensas òo ilustre Câ»
monianista e Acaòemico Dr. Carvalho Monteiro.
Deòicaòo a uma obra òe cariòaòe, a eòição òos Poet0
d Hontem que consta òe 5^5 exemplares numerados^ e quê
não chegou a entrar no mercaòo, exgotou-se em poucos
Òias.
Em 1916, realisou esta insigne Poetisa, na mesma Liga
Naval òe Lisboa, agremiação onòe se teem feito ouvir, ein
belas conferencias, entre outros, Fernanòo òe Sousa, Cu-
nha e Costa, Anselmo Vieira, Alfreòo Pimenta, Pereira ôe
Matos, Gomes Mota, Freitas Branco, Hipólito Raposo, An-
tónio SarÒinha, etc, etc. — nova e brilhante conferencia que
mais taròe repetiu no Porto e em Coimbra e cujo titulo erai;
o amor da Pátria na obra de Thoma^ Ribeiro.
O ultimo trabalho literário òe D. Branca òe Gonta C0*
laço foi publicaõo em 1917. Destinaòo a socorrer uma fa-
mília necessitaòa, intitula-se : A' margem das Chronicas.
NIHIL!
Morrer!
Oh, quem nos òéra !
Achar, na morte,
a paz, que sobre a terra em vão buscamos !
Chegar òepressa ao porto, onòe esperamos
esquecer os balòões Òa nossa sorte '
I-oetisas Portuguesas 117
Morrer i
Mas, — ao morrer, para onòe vamos ?
(Ha lá ninguém que a Ôuviba supporte !)
Na viõa, ao menos, qualquer sonho é norte. -
— e ha sempre uma illusão que nós amámos !
Pobre Õo nosso peito exhausto, enfermo,
que sangra até por ver chegáõo o termo
ôa pena que na terra tem cumpriòo !
Valera talvez mais não ter esperanças !
Viver, na inconsciência Òas crianças ...
Valera talvez mais não ter nasciòo ! . ■
Branca õe Gonta Colaço. Matinas, Lisboa, 1907, pag. 59
e 60.
PRELUDIO
Passei, olhou. . . - não succeõeu mais naòa.
Taròe ao serão, no familiar cantinho,
pensei ôe novo, um pouco interessada,
n'aquelle olhar, seguinòo o meu caminho !
Ao outro òia, eu estava ôebruçaõa
a ver o azul õo már sereno e liso- •
— passou ! — Olhei- • . não succeõeu mais naõa
— mas õe então, na minh'alma alvoraçaõa,
porque anõa o choro a batalhar com o riso ? !
Branca õe Gonta Colaço. Matinas, pag. 84.
118 Poetisas Portuguesas
MEU AMOR !
II
Negar-te um beijo a ti, é significativo
Õ'uma affoiteza enorme, ou õ'um mortal receio ? !
E* fingir que õesprezo aquillo porque anceio ! ■
E' quasi recusar- me aquillo porque vivo !
Não é coragem, não ! — Afflige-me este enleio
que sinto ao pé òe ti, não sei porque motivo
Quero òizer-te sim — o õôce lenitivo,
e sempre vem o não metter-se ôe permeio !
Longe, faço a mim mesma uma promessa aròente
õe unir a minha bôcca á tua, brandamente,
n'um beijo que afinal não é crime nenhum!
Mas vejo-te, e não sei que tenho, mal te vejo !
Nem sei se é valentia o recusar-te um beijo
se um granõe mêòo, amor de não te õar só um . .
Branca òe Gonta Colaço. Matinas, pag. 51 e 52.
HISTORIA SILENCIOSA
Do tempo pelo rio crystalino,
na barquinha veloz òo seu ôestino
elle ia a ôeslisar.
Viu-a na margem ao passar, e ao vê-la
ambicionou a companhia ò'ella. •
que não se fez rogar !
E proseguiram juntos a ôesciòa
òa placiõa corrente õ'uma viôa
ôe mutuo bem querer ;
Poetisas Portuguesas 119
sorrinôo alegres aos clarões õa aurora
entristecenõo levemente, á hora
triste, ôo entaròecer . .
Mal falaram. As almas que se aôoram,
é ô'olhar para olhar que se namoram
n'um extasis sem fim !
Um ôesejo reflecte outro õesejo,
ôepois os lábios unem-se n'um beijo .
e vão sonhanõo assim ! • •
Quando o fim ôa viagem alcançaram,
á mesma sombra a repousar ficaram
na mesma primavera • .
E entraram a sorrir no Esquecimento ;
que é o Qranõe Sahará ôo firmamento
onòe o silencio espera .
Branca ôe Gonta Colaço. Canções do Meio dia, Lisboa,
1912, pag. 65 a 68.
PEDINDO ESMOLA
Uma, Esmolinha, sim ?
Eu sei que vos consola
õar pão e lume a um lar onôe a miséria entrou !
Por isso vim confiaôa a vós, peòir esmola,
E alinhavei sorrinôo a ephemera sacola
ô'uns versos que choranôo o coração ôictou.
Branca ôe Gonta Colaço. A' Margem das Chronicas,
Lisboa, 1917, pag. 3.
120 Poetisas Portuguesas
D. LIA DE MAGALHÃES COLLAÇO
D, Lia õe Magalhães Collaço nasceu em Lisboa. E' filha
òe Jerónimo õe Magalhães Collaço, filho òos Conôes ôe Cò-
õeixa.
Esta Senhora que é mãe òa poetisa D. Anna Achaioli, ca-
sou muito nova, tenõo feito, em solteira, versos cheios òe
simpliciõaôe e sentimento.
Depois Òe casaõa, porem, fizeram-lhe os extremos ma-
ternaes cortar as azas õa sua granõe imaginação, trocanôo
as suas inspirações poéticas pelos òeveres ôe mãe cari-
nhosa.
Seu pai, bacharel em õireito pela Universiôaôe ôe Coim-
bra resiôiu çi maior parte ôa sua viôa em Pariz onõe con-
quistou uma posição ô'elite no munôo aristocrático.
Dotaôo ôe um espirito vivo, subtil e acentuaôamente sar-
cástico, foi um ôos mais aprimoraôos rajffinés ôa elegância
parisiense, e poôe òizer-se sem perigo ô'errar que foi tão
aôoraôo pelas mulheres como temiõo pelos homens.
Teve sete Ôuelos em que ficou venceôor e a sua atituôe
cavalheiresca fez com que figurasse com elogio no livroí
Les hommes d'épée. I
A Jerónimo Collaço também se referiu Ramalho Ortigão,!
nas Farpas. V.
Sua filha D. Lia heròou ôele por completo a figura e al|
aguôeza õe espirito, substituinôo apenas a cáustica irónica ^
paterna por um charme especial que faz ôesta Senhora uma
ôama ôe trato muito interessante.
OS TEUS OLHOS
(inédito)
N'esses teus olhos, Maria,
Oceanos ôe luz pura,
Eu vejo tanta canõura
Tanta luz, que a luz ôo ôia.
Poetisas Portuguesas 121
Não tem aquella magia,
Não tem aquella òoçura.
Não tem o amor, a branòura,
D'esses teus olhos Maria.
Lia Magalhães Collaço.
«
SEM TITULO
(inédito)
No álbum de António Teixeira Carneiro
Não julgues que m'importa que o avarento
Tenha a seu laõo mil outeiros õ'oiro,
Não penses que eu espero outro thesoiro,
Sem ser o mergulhado em crú tormento.
Não julgues que a beleza me fascina,
Não creias que m'importa a fiòalguia !
Aòmiro Joanna ò'Arc, essa heroina,
De patriotismo e nobre galhardia.
Não aprecio o Rei pelo seu veto,
Enternece-me a luz õo meu affecto :
Inebria-me um granõe sentimento,
-ftlegra-me òo campo a soliòão,
E assim seguinõo sempre o coração,
Maravilham-me as chammas õo talento !
Lia Magalhães Collaço.
122 Poetisas Portuguesas
D. MARIA DA CONCEIÇÃO PEREIRA
DA CUNHA j
D. Maria Õa Conceição Pereira ôa Cunha nasceu em Lis-
boa em 15 õe Março ôe 1893, e faleceu contanòo apenas
17 anos, em 5 òe Maio ôe 1910, õeixanòo imersos na maior
ôôr — seus pães D, Maria José õe Pina Manique Pereira
Ôa Cunha, trineta õo celebre Intendente Pina Manique, e
o sr. Peõro ]osé õa Cunha, oficial Õe Engenharia e Reitor'
ôa Universiõaôe Õe Lisboa. ?
D. Maria ôa Conceição Pereira ôa Cunha que era neta òo i^
antigo õirector Õo Portugal Velho e ôa Nação, o jornalista Au-
gusto Porfírio õe Carvalho Pereira, começou por instincto,
visto nunca ter tiôo professor ôe poética, a fazer versos ões-
õe os 10 anos, como mostra o volume õe suas poesias pu-
blicaõo postumamente pelas suas amigas D. Laura Chaves
e D. Maria Canôiõa Parreira, Poetisas a que igualmente se
refere este livro.
Alem õesses versos, D. Maria õa Conceição Pereira õa
Cunha fez muitos outros, que rasgava õepois ôe os haver
recitaôo em familia. Outro tanto suceõeu com relação a al-
gumas ôas varias comeôias que escreveu e que foram re#
presentaôas em teatros particulares. f
Dotaõa ôe granõe habiliõaôe para o teatro, qualiõaõe esta
que revelou, õesôe bem nova, no Colégio de São l.ui^, on-
õe foi eôucaõa e se familiarisou com a lingua franceza, o
que lhe permitia versejar n'essa lingua com granõe facili-
Ôaõe, como se constata ôe algumas õe suas proõuções poé-
ticas, ~ foi D. Maria õa Conceição Pereira õa Cunha uma
ingénua ôe qualiôaões raríssimas como õemonstrou, na
peça õe ]ulio Dantas — Rosas de todo o ano, e noutras pe-
quenas comeôias que representou no mencionaôo Colégio,
e fora ôele.
Poetisas Portuguesas 123
A MORTE DA MICAS
A morte entrara aii ! No quarto a luz õo ôia
Brilhava frouxamente ! Ella, que agonisava
N'um sesto convulsivo a roupa arrepanhava
Como a querer reter a viõa que fugia . .
Depois p*ra nós volveu o amorteciòo olhar !
A custo Descerrou a bocca õesmaiaôa
E òisse n'uma voz já um pouco velaòa :
«Que mal fiz eu a Deus para assim me abanôonar?»
Mas a Virgem que é mãe, ouvinòo este lamento
Confragiôa ôe õôr, á terra então òesceu
A trazer-lhe na morte o alivio ao seu tormento !
Mais tarõe houve quem visse illuminar-se o espaço
Era Nossa Senhora a subir para o céo
Levanõo a alma õ'ella occulta no regaço. .
Laura Chaves.
QUADRAS
Mal sabes tu a razão
Porque é que a estrella caõente
Apenas surge no ceu
Se some tão òe repente
E' que eu pergunto-lhe sempre
Se anõo no teu coração ? !
E ella então foge depressa
Com ôó õe õizer que não ! -
Ave-Marias õão Õores
Paòre- Nossos alegrias
Que extranho rosário o meu
Só feito õ'Aves-Marias. .
Maria ôa Conceição Pereira òa Cunha.
124 Poetisas Portuguesas
DES VERS FAITS A MON CCEUR!
Mon coeur était petit comme les jeunes roses
Un peu timiôe et tenõre ainsi que les violletes
II repliait en lui ões tenòresses secrètes
Sans les òire, mon coeur, savalt òe õouces choses.
Alors, il a senti le chaste et òoux besoin
De verser sa tenòresse au fonò õ'un autre coeur ;
Et friieuK et tremblant ò'éspérance et õe peur
Mon cceur alia frapper à la porte õu tien.
11 le sentit três bon, aròent et généreux
Mais une voix brutale a retenti souõain : =
«)e ne veux pas Õe vous, partez, mon cceur est plein !»
Et mon cceur répartit, òéçu et malheureux.
Mais aujourò'hui mon coeur frappera õe nouveau
Et si tu me reõis, «mon coeur est plein, partez»,
Au lieu Ôe revenir enõolori, blessé,
Mon coeur prenòra le tien ôans un suprême assaut !>
II entrera surnois comme font les voieurs
Et saura lui chanter õe si pressantes choses
Versera tant õ*amour, Ò'éspérance et ôe roses
Qu' un jour il será seul à vivre õans tou cceur !
Maria õa Conceição Pereira õa Cunha. Janeiro õe 1910.
Poetisas Portuguesas 125
D. MARIA DA CUNHA
D. Maria õa Cunha era portuguesa, não obstante ser fi-
lha òe uma senhora brazileira e õe Francisco Zorro, ôe na-
cionaliõaòe hespanhola.
Desôe muito nova, esta Senhora que nunca ligou impor-
tância ás suas poesias, versejava.
Tenõo siôo um Ôia entregues, por um seu tio, ao Dr. Can-
ôiõo õe Figueireõo, (Viõe Diário de Noticias õe 25 õe Ja-
neiro Õe 1917), as suas composições poéticas, as quaes o
notável mestre õa língua portuguesa mostrou e õeu a apre-
ciar ao Conõe Õe Monsaraz e ao Dr. }ulio Dantas, resultou
Ôesse facto a publicação õo primeiro livro õe versos õe D.
"íaria õa Cunha.
Trindades se chama essa encantaõora e valiosa obra que
conta 2 eõições. Alem õe soberbas poesias, regista os mais
calorosos elogios feitos pelo auctor õa Musa Aíemtejana e
{ Ceia dos Cardeaes, como se verá õa transcripção que
iSSO a fazer. No citaõo Diário de Noticias, õiz o õr. Can-
5o õe Figueireõo.
«Quanõo porem tive lazeres para a leitura õaqueles
versos, a minha surpreza foi enorme : estava ali inõiscuti-
velmente um altíssimo talento feminino, realçaõo por vasta
cultura literária e possuiõor õa mais perfeita técnica õo
verso ; e, com receio õe que a auctora tomasse o meu con-
ceito na conta õas amabiliõaões vulgares, que aos homens
òevem as mulheres formosas e õe talento como ela, õei
conta õa minha surpreza a õuas auctoriõaòes literárias, que
não conheciam a poetisa, e que absolutamente confirmaram
elevaõo conceito que os versos me sugeriam : ]ulio Dan-
3 e o Conõe õe Monsaraz.»
«Os õois laureaõos poetas õeram-me por escripto o seu
.recer, com que se prefaciou o livro Trindades »
«Monsaraz achou brilhantíssima a estreia, pela mais com-
126 Poetisas Portuguesas
pleta correcção métrica, ampla fantasia, rica Õe côr e so|
noriôaôe, traço firme e tintas preciosas >
«Júlio Dantas escreveu que as Trindades revelaram um
talento poético õe primeira oròem, pois tuòo ha nelas : es-
pontanieõaôe, sentimento musical, plástica òo verso, técnica
perfeita, conhecimento ôe língua, movimento, cor. . »
«Ha até sonetos, — õiz Júlio Dantas, — que poõem até
consiõerar-se obras primas. >
Quanto havia ainòa a esperar òo talento ôe D. Maria ôa
Cunha, se a morte a não houvesse arrebatado, em plena
mociôaòe, õo numero õos vivos ! Longe ôa sua pátria, ôa
qual ôesalentos, ôesgostos, e talvez, até, injustiças, a afas-
taram, D. Maria ôa Lunha, faleceu repentinamente em S.
Paulo (onôe lhe tinha siôo garantiôa, por varias pessoas
importantes, uma colocação vantajosíssima no magistério),
a 10 ôe Janeiro ôe 1917.
Com a sua morte fica ineôito e incompleto, segunôo
penso, O Livro da Noite, cujo prefacio em belos alexanôri-"
nos fez successo no Brazil, onôe seus versos são igual- .„
mente muito apreciaôos. *
Na Época, ôo Rio ôe Janeiro, um ôos principaes jornaes
brazileiros, ôo qual é corresponôentee enviaôo especial
em Lisboa a ôistincta escriptora e jornalista D. Virgínia
Quaresma que também faz parte ôa reôacção ôe A Capitaly
Ôe Lisboa, publicou D. Maria ôa Cunha algumas ôe suas
aprecíaôissimas poesias, que não figuram nas IrindadeSyí^
taes como : -^
(l4 Fiandeira (muito elogiaôa pelos críticos), e Salomé, ^
3 sonetos feitos e inspíraôos pela musica Ôe Strauss. '
Não é só como poetisa que é notável a obra õe D. Maria
ôa Cunha.
Como jornalista, escreveu, a peôiõo õe vários reôactores
ôe jornaes brazileiros, algumas crónicas.
Foi, ainôa, uma conferencista brilhante, como atestam
as suas conferencias feitas no Rio Ôe Janeiro : ^i
Poetisas Portuguesas 127
Como cantam os velhos povos da Europa sentados á som-
bra das Lendas e A Itália Artística, que Alberto ôe Oliveira
classificou das mais lindas e das mais bem feitas de quan-
tas, portugueses teem feito no Brai^iL
PROÉMIO
Ao meu livro singelo e òesprenòiõo,
Cheio õe aspirações e õe sauõaões,
Livro õe quem viveu sem ter vivido,
Diz-lhe bem este nome õe <Trinõaões>.
Branõo cahir Õa noite, hora õe mágoas!
Penumbras que se estenõem lentamente.
Vozes tristes õas plantas e õas aguas.
Sonhos õispersos pelo ar Õormente,
Aves cansaõas procuranõo o õono,
Ovelhas loiras quasi ao abanõono.
Visões õe paz, õe amor que não existe,
Lucilações õa estreita vespertina,
Rumorejar õe ninhos em surõina. . .
Eis o meu livro, simples, vago e triste,
Maria õa Cunha. Trindades, Lisboa, 1909, pag. 9 e 10.
CROMO
Passa na rua, õonairosa e esperta,
Varinazinha, posta a mão na anca ;
Como ha calor, a camisinha aberta
Deixa entrever a pele fina e branca.
Cabelos loiros, presos sob o lenço,
Saia roõaõa pelo calcanhar,
Dou-lhe õez anos, quanõo muito, e penso
Que uma avezinha lhe ensinou o anòar.
128 Poetisas Portuguesas
Oh ! que gentil, esbelta figurinha !
Uns olhos granões, côr õe agua marinha,
Sorriso alegre como o sol õe v'rão !
Deixá-la ir! Se lhe òizeis que é linòa,
Desfaz-se o encanto : peròe esse ar que a alinôa,
Pragueja e insulta como um carrejão.
Maria ôa Cunha. Trindades, pag. 43 e 44
O INFANTE DE SAGRES
(quadro de malhôa)
No concavo õa rocha o Infante cisma, e crava
Ao longe, no horisonte, o olhar perscrutador ;
O largo oceano em volta amansa a fúria brava,
Como um leão õomaòo aos pés õo õomaõor.
Embebe-se num sonho altivo e refulgente :
Surge õo Mar òa Noite o Atlântico õa luz, . -.
As quinas tremulanõo ao vivo sol Õo Oriente. ■
Em terra õe infiéis a reõentora cruz .
Hão õe partir em breve ousaõas caravelas ;
Ha Õe guiar seu leme, e enfunar- lhes as velas.
Da sua funôa crença o sopro genial !. . ■
E' nisto que êle cisma, e nem sequer õuviõa
Que a frota há-õe voltar . . A gente é ÕestemiÕa,
Granões almas õe heróis, filhes õe Portugal !
Maria õa Cunha. Trindades, pag. 41 e 42.
Poetisas Portuguesas 129
MEIO DIA
O sol subiu. Agora é quasi a prumo :
Hora Ôa sesta abençoaôa e santa !
Sai òos casais, prometedor, o fumo,
Os gaôos õormem, a cigarra canta.
A' luz òo sol, a rosa brava Õeita
Um cheiro forte que entontece a gente ;
Nos milharais, a cotovia espreita,
A arvéioa salta na agua transparente.
E no silencio que se fez, profundo,
Ouvem-se as folhas cahir no chão,
E o palpitar ôo insecto moribundo.
Dormita á sombra o lavrador aldeão.
Em quanto o sol, progenitor do mundo,
Aloira os trigos e amadura o pão.
Maria da Cunha. T7'indades, pag. 103 e 104.
VIRTUDES TEOLOGAIS
;; Eu creio em ti, Senhor, quando, ás tardes contemplo
;; O campanário tosco e simples de uma aldeia,
l E as casinhas em volta ao pequenino templo,
1 A' sombra da tua cruz, ó Mártyr da Judeia.
: Espero, espero em ti, quando a estrelinha de alva
} Vem espiando no céu o despertar dos ninhos;
f Astro núncio do dia, a quantos ela salva !
1 Olhar da madrugada, irmã da flor dos linhos !. . .
130 Poetisas Portuguesas
Mas, quanòo escuto rir um banòo òe crianças,
Quanôo beijo na face um õ'êsses pequeninos,
Fazem bem á minha alma os risos cristalinos ;
Da infância õescuiôosa avivam-se as lembranças,
E eu amo-te, Senhor, que bás á orfanòaõe
Esse Ôom Òe viver ôo passado — a Sauòaôe.
Maria òa Cunha. Trindades, pag. 79 e 80.
CLAUDIA
N'aquelle tempo, junto ao pórtico sagrabo
Do rei magnificente e sábio, Salomão,
Jesus anunciava ao povo beslumbraòo
As glorias ba humilbaòe e o luar bo Perbão.
Falava bevagar . bizeres tão suaves
Como o rumorejar ba verbe Galileia :
Amava a canbibez bos lírios e bas aves,
Ensinava a sua alma á velha raça hebreia.
O' boce «Dôa-Nova> ! Em quanto Ele pregava
E o sol batia em. cheio os cebros bo Hebron,
No alto ba torre Antónia, imóvel, cogitava
Cláubia, mulher be Pôncio, a romana bevassa !
Turbara-a estranhamente o rabi casto e bom,
Que a chamava, talvez á luz ba sua graça !
Maria ba Cunha. Trindades, pag. 34 e 35.
foetisQs Portuguesas 131
SOROR DOLORES
(d. MARIA FELICIDADE DO COUTO BROWN)
D, Maria Feliciòaõe òo Couto Drown que usou os pseu-
?)onimos õe Soror Dolores e A coruja trovadora nasceu no
Porto, em 10 òe ]aneiro Õe 1890.
Foi casada com o negociante Manoel õe Clamouse Brown.
Os seus primeiros versos foram publicaõos em eõição
particular, (sem local õe impressão e õata), apenas õesti-
naõa a brinòes.
Foram firmaõos com o pseuõonimo õe A coruja trova-
dora. (Viõe Capitulo VI, pag. 163 õo livro õo senhor Alberto
Pimentel — Os Amores de Camillo^.
Na época em que Soror Dolores versejava, ainõa era feio
€ notaõo senhoras õeõicarem-se á literatura.
A única Diversão elegante õo Porto antigo era nesse
tempo, em que as õamas iam á missa embiocaõas na man-
tilha õe lapim, o Jardim de S. Lazaro. A elle se refere
numa poesia Soror Dolores.
Penso, ser ta. preconceito, que levava esta Poetisa a es-
crever nas obras que oferecia :
Para não passar a outra mão.
Segunõo õiz D. António õa Costa, em 1850, esta Senhora
iPUblicou um livro intitulaõo Soror Dolores.
Em 1854, eõitava um outro, ]'iraçóes da Madrugada (3.»
íôição refunõiòa Õe suas poesias), que também não chegou
» entrar no mercaõo.
A' SENHORA MARIETTA GRESTI
O rouxinol entre as flores,
Gorgeanõo seus amores,
Não tem voz mais argentina
Nem respira mais ternura.
Nem meloõia mais pura.
Do que tu, Gresti õivina.
132 Poetisas Portuguesas
Uma aura perfumaôa,
Lá ôo Oriente sopraôa,
Onòe linõa faõa mora.
CultivanÔo seus rosais,
Não murmura meiga os ais
Como a tua voz sonora.
Quanòo a harpa òe Sião,
De sublime inspiração,
Solemnes cantos vibrava,
Mais que tu não commovia,
Nem a compaixão movia,
Nem o remorso acordava.
O aõeus que á pátria ôiz
O proscripto, que infeliz
Para sempre a vai ôeixar,
E' um grito penetrante,
Tem um echo, é semelhante
Ao pungir òo teu cantar !
Deve assim no espaço ethéreo
Ser um anjo õe mysterio
Moòelanòo hymnos õ'amor ;
Deve assim vibrar sonoro
N'esse eterno, angusto coro,
Quanõo louva o Creaòor.
E*s o génio ôa harmonia,
Que puòeste, por magia,
Essa voz ao ceu roubar ;
A mulher não poõe tanto ;
Não tem o conõão ò'encanto
De toõos arrebatar !
Soror Dolores. Âlmanach de Lembranças Luso Brasileiro
para 1856, pag. 242.
Poethas Portuguesas 133
D. EMÍLIA EDUARDA
D. Emilia EõuarÒa nasceu em Lisboa em 1 òe Janeiro
ôe 1845.
Representou, pela primeira vez, no Theatro Therpsicore,
na rua ôa Conceição, á Praça õas Flores, onôe no õizer òe
Sousa Bastos, agraòou extraorõinariamente nas três co-
nieòias õe papeis muito òiferentes que teve a seu cargo.
nessa noite.
Depois òe enviuvar, entrou para o Theatro Òo Gymnasio.
Ahi fez a sua estreia, representando a comeòia em um acto
A esposa deve acompanhar seu marido^ traòução òe ]ulio
César Machaòo, peça em que também alcançou veròaòeiro
sucesso. (Viòe Carteira do Artista, por Sousa Bastos).
Como actriz, fez Emilia Eòuaròa, que era inteligentíssima,
parte òas companhias organisaòas pelas emprezas ]osé
Ricaròo, Taveira, Rente, e Garraio.
Em 1895, pertencenòo á Companhia Taveira, foi ao Rio
òe Janeiro, onòe alcançou sucesso.
Em Lisboa, trabalhou nos teatros õo Gymnasio, Varie-
òaòes e Príncipe Real.
Em 1898, fazia parte òo elenco òa companhia òo Theatro
I Carlos Alberto òo Porto, ciòaòe onÒe viveu muito tempo.
I A primeira poesia que o actor António Peòro recitou foi
I feita por D. Emilia Eòuaròa.
No Almanach dos Palcos e Salas, òe que é proprietário
o sr. Arnalòo Boròallo que teve a amabiliòaòe òe me pres-
tar alguns esclarecimentos sobre assumptos theatraes, es-
creveu D. Emilia Eòuaròa alguns contos e poesias.
Em 1895, publicou esta Senhora, no Porto, um livro inti-
ulaòo Contos Simples, que D. João òa Camará prefaciou.
N'UM ÁLBUM
Um formoso bouquet òe flores mimosas
— Lirios òo vai e pétalas òe rosas —
Eu venho aqui òepôr.
134 Poetisas Portuguesas
Fui roubal-as, ó õoce primavera,
Ao teu casto seio, onôe Flora gera
O seu primeiro amor !
;■ Inibria o perfume que rescenôe
— A flor õo campo, que 5e côr esplenôe,
Delicaba e gentil ;
Os jasmins brancos a pura neve
Graciosos penòem a haste branõa e leve
A sauòarem abril.
E sobre a flor òe fina transparência
— Flor etherea, sacrário 0'innocencia
Que até o sol ôescora, —
VinÔa òo céu, tremente e crystalina,
Vi cair uma pérola õivina
Do áureo manto ôe aurora.
Emilia Eõuaròa. Almanach dos Palcos e Salas, para 1895jj
(7.0 anno), pag. 31.
D. JÚLIA EUGENIA SILVA DE PEREIRA
LÚCIO ESCORCIO
D. Júlia Eugenia Silva õe Pereira Lúcio Escorcio nasci
em Lisboa.
E' filha õe D. Maria òel Rosário Matilae Lazara Francisca
ôa Silva Montãno Castãneôa y Domingues òe Pereira e õe
Zacharias }osé Pereira.
Esta ilustre Poetisa que é casaõa com o importante in-
õustrial sr. João Nicolau Lúcio Escorcio, publicou, em 1913,
o seu primeiro livro — Suspiros, obra em prosa e verso, es-
cripta em 4 línguas (português, hespanhol, francez e in-
glez). Foi prefaciaõo pelo escriptor Aõriano Anthero.
Em 1917, publicou esta Senhora, um novo livro — O
Poetisas Portuguesas 135
Protector de Inglaterra, — õrama em 3 actos, õe Don José
Maria ôe Ortiga Marejon, que aõaptou para português, em
verso elexanòrino.
Alem Òesta peça que foi entregue, no Theatro Nacional,
para ser representada, D. Júlia Eugenia Silva õe Pereira
Lúcio Escorcio traòuziu o õrama em 3 actos — Campo de
Arminho, Õe D. Jacinto Benavente, original, que õeve ser
representaõo no Theatro Republica.
Esta Escriptora tem colaboraõo na Illustração ^Portugue-
sa, Heraldo da Madeira, Jornal da Madeira e no Jon aí
da Mulher.
O NOSSO AMOR
Não sei como este amor teve começo,
Nem qual Õe nós, primeiro o inspirou.
Tu ou eu ? eis o segreõo. . . e õesconheço.
Qual õe nós õois, primeiro o outro amou.
Por mais longe que eu olhe no passaõo
Vejo-te sempre preso á minha viõa.
Tu foste õesõe sempre o meu cuiõaõo,
E õesõe sempre foste a minha liõa.
Olhaste-me e eu olhei-te e foi bastante.
Não precisa õe mais o coração.
Para saber que fica n'um instante,
A* mercê õ'essa eterna conõição.
Lembro-me só que n'um brilhante outomno,
Sereno e calmo como os há por cá,
Eu comecei a ter noites sem somno,
E õias sem cantar. . . amava já !
Júlia Eugenia Silva õe Pereira. Suspiros, Lisboa, 1913,
pag. 12.
136 Poetisas Portaauesas
A UM CRUCIFIXO
Foi olhanòo-te um õia, absorta e triste,
O' òoce imagem, minha companheira.
Que eu me volvi á crença veròaòeira,
Aquella em que na infância tu me viste.
Chorava ao contemplar-te. . tu sorriste,
Ao veres-me tornar á fé primeira ;
E ao teu sorriso, a alma toôa inteira.
Ficará presa, emquanto ella existe.
No teu olhar Òe amor e òe peròão,
]esus ! eu vi a minha reõempção,
Qual uma estrella, a rebrilhar nos céus !
Mentiu, Petrarcha ! o teu saber profundo.
Não só a Dor — existe n'este munõo.
Existe a Fé ! a òoce Esperança . e Deus !
Júlia Eugenia Silva Òe Pereira. Suspifos, pag. 58,
PECCADORA
Oh ! n'ini)uUei Jamais, one fomme qui tombe ;
Qui liait Bou* quel fardeau, la pauvre âms succombe !
Quanòo te vi, mulher, peròiòa, rastejanòo,
De anòrajos vis, teu corpo esqualiõo coberto ;
Os cabellos ao vento e sujos, òescompostos,
Cavaòa a face, o olhar amorteciòo e incerto.
Quanòo te vi, chegaòa ao extremo òa miséria,
Sem pão, sem honra, enferma e rota e sem abrigo,
Lembrei-me que ]esus, remiu a Magòalena •
Dastava-te a òesgraça e a òôr, por teu castigo!
Júlia Eugenia Silva òe Pereira. Suspwos, pag. 92.
Poetisas Portuguesas 137
D. IZABEL FERREIRA
D. Izabel Ferreira nasceu em Lisboa. E' filha òe D. Emí-
lia Maria Pereira (Dama Drazileira), e òe António Bernar-
ôino Ferreira.
Desôe criança, revela esta Senhora granòe inclinação
pelo estuõo õas letras e musica.
Os seus versos anòam Òispersos por vários jornaes e
almanachs.
No Mundo Elegante, publicou osta Poetisa alguns con-
tos em prosa.
MÃE
Ter mãe, é ter carinho, é ter amor
maõrugaõa Õ'abril, sorriso e flor ;
aòormecer nas pétalas õ'um sonho,
para acoròar n'um existir risonho.
Ter mãe, é ter arrimo e protecção
Um estro que nos guia — aòoração ; —
é receber n'um beijo seu a esp'rança,
aureola òivinal, luz õe bonança !
Não ter mãe, é viver na escuriòão !
A noite õe invernia, a soliõão !
é o ruõe calvário õe uma cruz,
sem um sorriso, um raio Ôe luz !
Não ter mãe, assistir-lhe á agonia,
é uma cruòelissima elegia. . .
é morrer òe tortura e ôe afflicção,
sentinõo esphacelar-se o coração !
Izabel Ferreira. Almanach das Sí-nhoras, 1906, pag. 339
138 Poetisas Portuguesas
O PODREZITO
]esus ao encontrar meigo, sorrinôo,
um pequenito nu, esfarrapado,
interrogou n'um õoce tom magoado :
não sentes filho, o frio qu'está cahihõo ? !
A creancinha erguendo a fronte loira,
olhar cheio õe azul, e crença e luz,
madrugada serena, encantadora,
respondeu a sorrir ao bom Jesus :
— Não canta o passarito, o bosque, a flor ?
a planta, a luz, o dia que se esvae !
também tu canto e rio, ó bom senhor,
sou feli^, tenho mãe e lenho pae !
Izabel Ferreira. Almanach das Senhoras, 1901, pag. 255^
D. LUIZA FERREIRA
D. Luiza Ferreira é filha de D. Emiiia Maria Pereira f
Ôe António Bernardino Ferreira. |
Irmã da Poetisa D. Izabel Ferreira, as suas produçõe^
que também são mimosas, teem sido publicadas em vario^
jornaes e, em especial, no Almanach das Senhoras, onôe
assiduamente tem colaborado. >
19 D'AGOSTO -^
A primavera é como a mocidade,
Manhã cheia de sol, toda florida ;
Depois o outono vem .. tarde da vida!
E da manhã gentil, resta a saudade !
Luiza Ferreira. A'manach das Senhoras, para 1909, pag.
230.
Poetisas Portuguesas 139
»
3 DE MARÇO
O ôeslisar ô'esta viòa
não é, não, feito ôe rosas,
cnõe vão poisar subtis
as borboletas formosas.
E' um caminho ô'agruras,
toôo gemiòos e Ôores,
Onòe òesmaiam esp'ranças,
onDe vão morrer as flores .
Ha mais espinhos que aromas,
mais tristezas que alegrias
sauõaões que choram R'alma,
as mais cruéis agonias !
Luiza Ferreira. Almanach de Lembranças, Ôe 1904, pag.
199,
í A CREANÇA E A VELHINHA
\
l No meu cantar ôe creança
\ Não ha sombras ôe amargura !
ÍEu chego, e trago a esperança
Da mais risonha ventura.
í_
£ — E eu que parto ôentro em breve,
i Levo comigo a sauôaôe
f Dos sonhos ôa mociôaôe,
i Que o tempo ôesfez em neve !
Luiza Ferreira. Almanach das Senhoras, 1907, pag. 210.
140
Poetisas Portuguesas
D. MARIA IZABEL GAMITO
D. Maria Izabel Gamito nasceu na Ilha ôa Maòeira.
filha õe D. ]ulia Gamito (já faleciòa), e õe Salvaòor Gamito.i
Aos onze anos õe iôaôe, numa inspiração simples ôeí
criança, compunha esta Senhora os seu primeiros versos.!
As suas poesias, que não se encontram ainôa reuniõas
em volume, teem siôo publicaõas no Diário de Noticias, òi,
Maòeira ; Noticias d' Évora , 'Diarin dos Açores ; O Conini'
bricense ; Primeiro de Janeiro^ òo Porto ; Diário Illustrado ;
Correio da Noite ; Echos d' Avenida ; Mala da Europa ; A^
Chronica, 5e Lisboa ; e La Temporada, ôe Maôriõ. D. {sa<|
bel Gamito que é uma ôelicaòa poetisa, colaborou tamber
em vários almanachs, entre os quaes citarei o Almanach dai^
Senhoras.
PALAVRA SANTA
Esp'rança é canto õos astros
Que ouvimos p'la viòa fora,
E' palavra que sorri
A' nossa alma que chora,
O veu branco onòe se prenõem
Toõos os sonhos òa gente
Esp'rança é o õivino anceio
D'aquelle que vive e sente.
Palpitam risos vermelhos.
Fogem tristezas ao vento
Esp'rança é átomo ò'oiro
Cahinôo no Soffrimento !
■fe-
Maria Izabel Gamito. Lisboa, 1915.
Pnetisas Portuguesas 141
INVERNO
Cáe neve. Canta o vento nos caminhos
A gelaõa canção õa Invernia ;
A folhagem õespeôe-se õas arvores
N'um convulsivo choro òe agonia.
Cáe neve e chuva. Esforcem-se os açuões
No espumante arquejar õas suas aguas ;
Flores e aves abraçam-se morrenòo
No sombrio estortôr õas granões Maguas !
Cáe neve. Canta o lume na lareira
A õoiraòa canção õas suas brazas.
Ha rocas õ'onÕe o linho se õesprenõe
N'um alegre agitar õe brancas azas. . .
E a avó, que tem as neves õa velhice,
Conta ás netas — sua viõa e seu calor
Aquella historia já contaôa e linõa
D'uma Princeza que morreu õ'amôr .
Maria Izabel Gamito. Lisboa, 1912.
VELHOS .
Ser novo, sim é ser a Luz e a Viõa,
E' ter rosas na alma õeslumbraõa,
E' ser feliz ! Que a õôr é para os novos,
Lagrima que não chega a ser choraõa.
Risos õe sol, bemõito meio õia
Que Deus nos pôz nas almas a sorrir ;
Ser novo é ser a synthese Õa Viõa,
Razão õo Amor e razão õo Existir !
142 Poethas Portuguesas
Ser velho é ter sauõaões ôe si mesmo
De rastos nas escarpas òa Ancieòaòe.
— Os velhos são menòigos ôo Passaòo
I A menõigar o pão õa Mociòaòe! —
Maria Izabel Gamito. Lisboa, 1914.
GIESTA
(d. branca da sílveira e silva)
D. Branca òa Silveira e Silva que usa o pseudónimo
Giesta, nasceu em Lisboa.
E' filha òe D Maria Henriqueta òa Silveira e ôo general
António Maria òa Silva.
Em 1911 e 1912, foram publicaôas no Diário Illustrado e
nas Novidades, as suas primeiras poesias ainòa com um ;
certo cunho òe infantiliôaõe. |
Em 1913, iniciou-se no Jornal O Dia, um interessantissimol
torneio poético travaòo entre Giesta e Abê (pseuòonimo -
então usaòo por um òos nossos mais mimosos poetas —
D. Alberto Bramão), òebate que pela suspensão òo jornal
referiòo, foi continuado no Diário de Noticias.
Entre os òois campeões, que tiveram a rara fortuna òe
constatar que nenhum fora venciôo, trocaram-se 25 sonetos
acompanhados òe alguma prosa.
Este original torneio foi encerraòo com uma oòe òe Abê
publicada no n." 11. de Outubro de 1914, da revista Vida
Mundana, de que foi redactor e proprietário Luiz Trigueiros.
Em 4 de Março de 1915, foi levado á scena no Theatro,
do Gymnasio, a peça em um acto, em verso. Amor de Ma--
rinheiro, original desta ilustre Poetisa e que obteve da im-
prensa justificados aplausos.
Poetisas Portuguesas 143
A um òos nossos primeiros theatros foi entregue uma
ova peça òesta Senhora, em 3 actos, e em alexandrinos, -v,
- Sangue A^ul, — género regional. " '
Em preparação tem D. Branca ôa Silveira e Silva, entre
utros trabalhos, uma peça histórica. Frei Gtl de Santarém,
juaimente escripta em alexandrinos. Esta òistincta Es-
riptora e Poetisa tem colaborado no Diário de Noticias,
xhos da Avenida, Dia e Nação onõe publicou um artigo
ititulaõo : A' memoria da Rainha Senhora D. Maria Pia.
SAUDADE
(inédito)
auòaôe !. . . Quanta vez o teu nome sagrado,
- sem nome, que traduz a mais lenta tortura —
;m ser comprehendido é por nós murmurado, ^
pmo inconscientemente a criança o murmura !. . .
'uantas vezes Saudade, és tu banalisada
;las almas que nunca ao teu pungir se abriram,
le em qualquer recordar te imaginam gravada,
;ie julgam conhecer-te e nunca te sentiram !. . .
L
íi)de viver em nós a suave lembrança
f alguém que nos deixou mas voltaria um dia;
saudade côr de rosa, ou verde como a esperança,
ce recordação que embala e acaricia.
Mas tu, a eterna dòr por um eterno ausente,
liaudade fatal, a saudade que mata,
firtirio que trucida a alma lentamente
hm noites de vigília em prantos se desata,
"és triste como a cruz que vela um condemnado
luz que em negro templo alumia um sacrário ;
éroxa como a flor que recorda o teu fado
€ veste que Jesus levou para o Calvário.
144
Poetisas Portugansas
A verõaôeira és tu, SauÔaòe roxa e triste :
não merece o teu nome a sauòaòe que espera
SauÔaòe. . ., é a õor fatal que no peito onõe existe,
veste Ôe luto a viõa, a esmaga e dilacera.
Sauòaõe, é isto, — só — : Mar imenso e profunõo
aonôe a alma se afunda e morre para o Munòo.
Giesta. 1916.
DIA DE ANNOS
Annos são rosas que murcham,
astros cadentes que correm ;
annos são prantos que nascem,
annos são risos que morrem.
São o despertar das horas
que passamos a sonhar ;
são illusões que nos fogem
com saudades a voar.
São folhas secas, esparsas,
porque os vendavaes as partem ;
são corvos negros que chegam,
são andorinhas que partem.
Annos são ondas revoltas
CHie, depois de encapelar,
se desfazem num rochedo
para nunca mais voltar.
Giesta. Ahnanach das Senhoras^ de 1915, pag. 15.
Poetisas Portuguesas
145
ESTRELA DO NORTE
íiNEono)
(N'um álbum)
Ha tantas, tantas estrellas,
pelo céu, a scintillar . ■
E no munõo, ha tantos olhos
onôe poisa o nosso olhar. .
Caminheiro vagabunòo
que, õe noite se peròeu,
para encontrar o caminho,
perscruta os astros ôo ceu
As almas tristes, errantes,
que anôam no munõo sem par,
nos olhos 0'alguem procuram
a sua estrella polar. .
Mas quanto tempo se passa
buscando o fanal òa sorte ? !
— Se ha tantos milhões õe estrellas,
Mas — uma só — é õo Norte ! . .
l Giesta. 1914.
D. JÚLIA DE GUSMÃO
D. Júlia õe Gusmão, a inteligente, simpática e instruiôa
'í 2nhora ôe que neste momento se.occupa esta Antologia,
f- isceu em Lisboa, a 21 ôe Outubro õe 1835.
í Apesar õisso, a sua letra é õe tal maneira firme e o seu
•« zer tão elegante e apropriaõo, que ninguém Õirá partirem
l 10
146 Poetisas Portuguesas
esses escriptos òe quem já conta 81 anos ôe iòaòe, muitas
vezes perturbaòos por granòes desgostos, como foi o b;
perõa ôe sua queri^a mãe.
Foram seus pães D. Maria José ôe Mello e Joaquiir
Victor Õa Silva Teixeira ôe Gusmão, 1." Oficial Ôo Ministe
rio ôa Justiça.
Aos 10 ou 11 anos, começou D. Júlia ôe Gusmão a es
crever linhas rimaôas, ôas quaes só tinham conhecimentc
sua mãe e seu pae que se comprazia em emenôar-lhe o?
erros Ôe metrificação.
Quanôo essas linhas começaram a merecer o nome ôt
versos, alguns foram publicaôos em varias revistas, a pe
ôiôo Ôe amigos ôe seu pae, que com ôesvanecimento, lhe
havia mostraôo as proôuções poéticas ôe sua filha.
Passaôos anos, um ôia, encontrou-se esta Poetisa num
sala com Thomaz Ribeiro, que tenôo-lhe ouviôo recita
algumas' ôe suas poesias, peôiu licença para as publicai
Apareceram na Revolução de Setembro, acompanhaôas ô'
uma elogiosa carta Ôo auctor ôos Sons que Passam, ôirigiò
a Matheus Ôe Magalhães, encarreganôo-o ôe apresentara
poesias ôe D. Júlia ôe Gusmão no jornal ôe que ele er,
então folhetinista.
Mais tarôe, em 1867, esta Senhora publicou um livro!
versos — Flores Singelas — prefaciaôo por Pinheiro Cha
gas, que a pag. 10, ôiz:
«Eu tenho a firme convicção ôe que este volume ha
obter successo porque tem a granôe qualiôaôe que falt
maior parte ôos livros ôe poesia contemporânea, é verôí
Ôeiro, é espontâneo, é o ôesborôar ingénuo ôe uma aitn
que não quer represar as suas sensações e que as ôeix
ôesabrochar e fulgir ao sol ôa poesia, como as flores «n
valhaôas pela aurora, e surprehenôiôas pelo astro explen
ôiôo».
Em 1900, foi-lhe confiaôa a ôirecção ôo Q^lmanachéí
Poetisas Portuguesas 147
Senhoras onõe õeixou muitos escriptos seus, em prosa e
verso.
Em 1911, por falta òe sauôe, õeixou esse cargo, que
exerceu sempre com a maior meticulosiõaòe e õeõicação.
Entre muitos jornaes e revistas em que colaborou D,
Júlia òe Gusmão, poõerei citar : Almanach das Senhoras e
òe Lembranças, Diário de Noticias, Archivo Lisbonense,
Boudoir, õMundo Elegante e Brapl e Portugal.
Nesta ultima revista, escreveu um artigo acerca õa morte
ôa sua granõe amiga D. Amélia ]anny, o qual ôepois publi-
cou em folheto.
Alem òoutras traõuções, fez a ôe Le Disparu ôe A. Dau-
ôet.
ALÉM
Nos raios òo luar, no brilho òe uma estrella,
no perfume subtil òo jasmineiro em flor,
no branco ciciar òa brisa que á noitinha
perpassa junto a mim n'um sopro acar'ciaòor,
Eu julgo presentir o frémito ò'uns lábios,
um som meigo e sauõoso, um echo, a voz ò' Alguém
que Deus chamou a si, que além, no ceu existe,
sorrinòo para mim òo mysfrioso Além !
E a voz que eu julgo ouvir no lume Òas estrellas,
nos raios òo luar, na emanação òa flor,
no ciciar òa brisa, o som que me inebria,
eu creio • • vem òo Além fallar ò'um santo amor.
Além ,! ponto òe esp'rança ! irraòiação òivina !
orvalho matinal nas anciãs òe soffrer !
pharol a illuminar na senòa òa existência
o pouco que me resta ainõa a percorrer I
]ulia òe Gusmão. Almanach das Senhoras, Lisboa, 1909,
39." anno), pag. 376.
148 Poetisas Portuguesas
N'UM JAZIGO
Ha sauôaôes õe sauòaôes,
e são as mais lancinantes !
Quem me õera ter agora
sauôaôes que eu tinha ô'antes !
Ajoelhaôa em teu jazigo,
Oranôo, pensanôo em ti,
eu sinto enorme sauôaôe
ôe sauôaôes que soffri.
]ulia ôe Gusmão. Almanach das Senhoras, 1901, pag. 338.
IVALDA
(d. ALICE MONTEIRO LEITE)
D. Alice Monteiro Leite nasceu na ciôaôe ôo Porto.
E' filha ôe D. Emilia C. G. Monteiro e Ôe EôuarÕo F. Leite,
Seu avô António Luiz Monteiro, natural ôe Coimbra ser-
viu como voluntário õa Rainha e foi um dos mil e qui-
nhentos bravos que desembarcaram no Mindello e entraram
no Porto com D. Peôro IV.
Pelos seus feitos militares, foi-lhe conferiôo pelo aluôiôo
monarca, o grau ôe Cavalleiro da Torre e Espada, senôo a
primeira pessoa agraciaôa com tal Ôistinção, na Invicta Ci-
dade, onôe morreu (exercenôo o cargo ôe tabelião), e está
sepultaôo.
Sobre o seu tumulo, ha as seguintes palavras que foram
escriptas a seu peôiôo :
«Esta viôa Ôeixo contente: servi a minhaPatria, ameia
minha gente».
Poetisas Portuguesas 149
Desõe criança, que D. Alice Monteiro Leite sente pro-
pensão pelas letras.
Tenòo feito os seus primeiros estuõos nos melhores co-
légios Õo Porto, não pouõe por falta òe sauõe matricular-se
num curso superior, como era seu òesejo.
Por outro laõo, seu pae citava-lhe, sempre, o exemplo
ôe escriptores morrerem õe fome, em Portugal, e que ver-
bos só Junqueiros os beviam fazer.
Apesar Òe tão juôiciosos conselhos, Ivalda (tal é o pseu-
dónimo que esta Senhora escolheu para firmar algumas òe
suas poesias e escriptos em prosa, publicaòos em jornaes
portugueses e brazileiros), não òesanimou em absoluto :
«Calaòa e òesconsolaòa, mais procurava então viver a
sós comsigo mesma, estuòanòo as obras òo granòe poeta
<Guerra Junqueiro), relenõo-as, òecoranòo-as, procuranòo
òecifrar-lhe os mais Íntimos segreòos, as mais alaòas ins-
pirações òo genio>.
Assim, òeu principio a um poema, que tem quasi con-
cluiôo e que se intitula : A Terra.
Provanòo que Ivalda aproveitou com a leitura òo auctor
òos Simples e òa Morte Òe D. João, òi-lo o seu trabalho
literário a que me refiro.
Por ser granòe o trecho que òesse poema li, não posso,
como queria, òar òele um specimen. Porém, nas poesias
Semente pequenina e Quero sonhar..., os leitores encon-
trarão certa compensação á falta que aponto.
A actual guerra, nas suas variaòissimas manifestações,
em que o cumulo òa barbariõaòe, òo sofrimento e òa he-
roiciòaòe a caòa passo se chocam, forneceu a esta ilustre
Poetisa e Escriptora tema para uns curiosos e bem feitos
artigos, que tem publicaòo com o pseuòonimo que usa, em
vários números Òo Commercio do Porto.
150 Poetisas Portuguesas
SEMENTE PEQUENINA
Eu vi uma semente pequenina
Que sonhou ser na fria escuriôão,
A Flôr gentil — a Forma peregrina
Da sua concepção.
Nasceu a folha. O Sonho òa semente
Foi crescenôo como ella . . Então pensava
Não era só a flôr somente,
Aquillo a que aspirava . .
Mais tarôe a flôr, encerrando, esconòiôa.
A pura essência õ'essa aspiração,
Fez-se Perfume — foi, n'uma outra viôa,
A luz ò'um sonho, a voz õ'um coração !
Ivalõa. Lisboa, 17 Òe Setembro Ôe 1915.
QUERO SONHAR. .
Quero sonhar um sonho tão suave
Como um beijo õe flôr :
Sonho, em que o pensamento seja ave ;
Beijo, que seja amor !
As aves também sonham quanõo cantam
A' tarôe, ao pôr õo sol. .
Ha trinados õ'amor, que nos encantam.
Na voz õo rouxinol !
E eu oiço dentro em mim também um canto
Que sempre me enamora ;
Que me õiz o que ri e sente e chora
Sem eu ver riso ou pranto !
Poetisas Portuguesas 151
Que me conta os segreôos òos vallaòos,
Os segreôos ò'amor. • .
Diz-me se a ave, voanòo sobre os praôos,
Inveja alguma f!ôr. . .
Se, ainòa rasteira e humilõe, a hera aspira
A erguer-se para os céus,
E Õepois, ao mirar-se, se suspira
D'amor nos sonhos seus . . .
Se o lyrio ao ver a abelha ancioso.
Tonto òe meõo e ôôr,
Venòo-a roubar-Ihe o néctar precioso
— Alma gentil õa flor !
Se tuòo que na terra existe e vive,
Do loôo á creatura
Anceia, sonha, morre e, emfim, revive
Na própria sepultura. .
Diz-me os segreôos que a natura esconòe
E só quem soffre vê. • -
Que palpitam na flor, na ave, e mesmo aonõe
Ninguém, ninguém os crê !
Quero sonhar a viõa que presinto
Em torno a mim,
E quero ouvir o palpitar, que eu sinto.
Em tuôo, emfim !
A viôa tem encantos reservaôos
Que eu quero ter
Com os meus olhos ô'alma, enamoraôos
De tanto vêr !
Ivalõa.
152 Poetisas Portuguesas
D. AMÉLIA JANNV
(a poetisa do MONDEGO)
D. Amélia Janny, era natural òe Coimbra, ciôaõe onõé^
faleceu a 19 Ôe março õe 1914, contanòo 73 anos õe iòaôe.
Desta Poetisa ôiz o senhor Pedro Eurico (Pinto Osório),
no seu livro Figuras do Passado, Lisboa 1915, pag. 210:
«A senhora D. Amélia Janny provém ôe uma família que
tem os mais ilustres pergaminhos literários, ôe que poõe
orgulhar-se esta vila ! ' De uma família, em que os ôotes
privilígiaôos õa intiligencia e õo talento foram património
comum ôe toôos, cujos nomes aínôa anôam na memoria
ôos vivos !»
«O Sábio D. Francisco ôe S. Luiz — Carôeal Saraiva;
António Correia Calôeira, eloquente parlamentar e ôistin-
tíssimo homem publico ; o poeta Luiz Correia Calôeira, têm
os seus nomes inscriptos nas folhas ôe ouro ôa historia, ôa
literatura e ôa politica ôo nosso paiz !>
«Frei Luiz Saraiva irmão ôo Carôeal, foi lambera homem
muito inteligente e instruiôo !
E num artigo acerca ôa morte õe D. Amélia ]anny ôiz O
Dia Ôe 8-7-1914:
«Ella fazia versos pelo menos, ha 58 annos, pois que aos
14 ôa sua eõaôe como poetisa fora apresentaôa a António
Feliciano ôe Castilho em 1856, ficanôo ôesôe então consa-
graôa, e senôo Xavier Corôeiro o paôrinho ôa apresenta-
ção.>
«E foi uma poetisa de verdade, no sentiôo ôe se restrin-
gir ao sentimento, pois que hoje mais ôo que nunca, se torna
mister ôifferençar entre poetas ôe sentimento e poetas õe
1 PoQte de Lioia.
Poetisafi Portuguesas 153
arie ; e se aquelles vão passando, ô'estes muitos temos hoje,
perfeitíssimos na forma, talentosos na concepção, que en-
tusiasmam e recebem incensos õa critica, e mais ainõa õo
noticiário, embora noticiário e critica por vezes sejam sus-
peitas pelas camaraderies òas clientelas. >
D. Amélia Janny tomou parte no celebre sarau realisaõo
no Teatro Académico, em maio ôe 1862, festa em que esti-
veram alem òa Acaòemia, Castilho e Teófilo Braga, que re-
citaram versos ; Guerra Junqueiro que pela primeira vez
aparecia ante a Acaòemia, e que também recitou, e Anthero
õo Quental que leu alguns õos seus versos, que òepois in-
cluiu nas Odes Modernas.
Das Figuras do Passado (pag. 215), transcrevo o que Òisse
Castilho, òe D. Amélia Janny, quanõo òessa festa, õaõo que
o auctor ôesse livro extratou òa Conservação Preambular
do D. Jaytne, l.a eòição, 1862:
«Como que simbolisanòo a Musa òo Monôego, uma gen-
til poetisa, veio, nova Sapho, merecer n'este certamem co-
roa òe louros e murtha.>
«Ditosa filha òe Coimbra ! com os teus òonosos vinte anos
em flor ; com a tua voz suave e timiòa, como o aroma exa-
laòo òa tua alma 1»
«Amélia Janny 1 peròoa-me, se hoje òiante òo maior pu-
blico, te renovo os meus aplausos.>
Os primeiros versos òe D. Amélia Janny foram publica-
ôos no n." 11 òo Cysne do Mondego. Publicou poesias nos
Prelúdios Liiterarios ; Estreia Literária; Portugal Pitto-
resco ; Panorama Photographico de Portugal (jornaes lite-
rários òe Coimbra) ; Almanachs das Senhoras, Luso Brasi-
leiro, òo Commercw do Lima, eíc, etc.
D. Amélia Janny nunca reuniu em volume as suas poe-
sias.
Ultimamente estava òisposta a faze-lo, ajuòaòa pela ilus-
tre escriptora e poetisa, a Senhora Marqueza òe Pomares,
òesignio a que a morte poz termo.
No Brasil e Portugal (essa bela revista que infelizmente
154 Poetisas Portuguesas
òeixou õe se publicar), 5e 1-4-1914, escreveu D. Júlia õe
Gusmão um artigo comemoranòo o passamento õe sua
granòe amiga — A Poetisa do Mondego.
AOS ANNOS DE MINHA MÃE
A ti, que òebruçaòa no meu berço, -^
Por noites Õe amargura e Õe agonia.
Velaste, coração em ôôr submerso,
Abrazaòa na febre em que eu arôia ;
A ti, que me ensinaste entre mil beijos,
A louvar o Senhor em caôa aurora,
Que encerraste as esperanças e os òesejos
Em vêr-me alegre e forte õ'hora em hora ;
A ti, que òa affeição fazenõo escuõo,
Affrontaste o rigor õe atros õestino.
Que ao õeixares, por mim, família e tuõo
O teu seio õe mãe soltava um hymno ;
A ti, ó minha Mãe 1 martyr obscura.
Que percorreste a via Õolorosa,
Forte õo teu amor, com mão segura,
A amparar-me, a sorrir-me carinhosa ;
A ti, que eu vejo sempre, se a õoença
Me entristece, me abate e curva a fronte,
}unto õe mim, qual brilha em noite õensa.
Uma estrella surginõo no horisonte ;
Livro em cujas paginas eu leio
Um poema õe amor e õe ternura,
Voz — como outra não ha — , seguro esteio,
Reprehensão que sorri ; perõão que Oura ;
Poetisas Portuguesas 155
Olhar em que se espelha o affecto immenso,
Onõe vão reflectir-se as minhas òôres ;
Abrigo sem igual, luz Ôo que eu penso,
Mystica urna ôe immurchaveis flores,
A ti, no Òia ôos teus annos, òera
A alegria, que em prantos consumiste,
Os folgueòos õa tua primavera.
Em vez Õa tua viôa amarga e triste !
Amélia Janny. Fiouras do Passado, por Peõro Eurico-,
Lisboa, 1915, pag. 217 e 218,
CAMARÁ ARDENTE
No luxuoso salão õe purpura forraòo,
Avista-se uma urna em peòestal ôoiraôo.
Sobre ella onòeia e treme a chamma òe mil lumes ;
Respiram-se no ar suavíssimos perfumes ;
E sobre o pavimento, em profusão Òe cores.
Alastram-se festões Õe peregrinas flores.
Em õesalinho, solta a farta e longa trança,
Suspira ajoelhaõa e muribunõa a Esperança ;
E Õefronte, gentil e bello como a aurora.
Na urna õebruçaõo, o Amor soluça e chora,
E quanõo esmorecia o som õa résa.
Trahiõa a meia voz Õos lábios õa Tristcijfa.
E se iam apaganõo os últimos clarões
Dos cirios funeraes e õas mortas illusões ;
156 Poetisas Portuguesas
Então, com mão febril, fechei o athauõe
Onõe ficava morta a minha Juventude !
Amélia Janny. Figuras do Passado, por Peõro Eurico,
pag. 206 e 207.
SONETO
O sino repicara alegremente
Chamanòo á festa a gente òo povoaòo ;
Para ouvir um oraòor muito afamaòo,
íuõo ia ligeiro e impaciente,
Vivera ali, creança e aòolescente,
Pelos montes errante, a guaròar gaòc :
Orôenára-se á custa õo morgaõo.
Homem pieòoso, bemíazejo e crente.
Ficara bom : nunca esquecera aquella,
Que ao peito seu, tão pobre e amanôo-o tanto,
Tanta vez o levara a essa capella !
Sobe ao púlpito, emfim, sob esse encanto ;
Mas na turba só vê a imagem õ'Ella,
E desce, sem fallar, banhaõo em pranto 1
Amélia Janny. Almanach das Senhoras, 1908, 38.° ano,
Lisboa, 1907, pag. 218.
Poetisas Portuguesas 157
D. GERTRUDES FERREIRA LIMA
(humilde camponeza)
D. Gertruões Ferreira Lima era natural ôe Santo Antão,
uma õas ilhas que no archipelago õe Cabo-Verôe formam
o grupo de Barlavento, ao qual pertence também a ilha Òe
S. Vicente, notável pela sua magnifica situação geográfica,
importantes ôepositos ôe carvão e amplíssimo, seguro e
belo porto.
Falar Òe D, Gertruões Ferreira Lima que foi uma se-
nhora muito inteligente e instruiõa, eôucaòa no extincto
colégio õas Urselinas, em Coimbra, é recorõar os primeiros
anos Õa infância passaõos na minha terra natal, nessa al-
cantilada e muito pictoresca Suissa Caboverdiana-
Falar õa ilha Õe Santo Antão, é trazer á memoria a bra-
veza celebre e inõomita õo seu mar, que por vezes, vem
beijar as primeiras casas õa Villa D. Maria Pia e as lan-
chas que, para fugirem á fúria õa suas vagas, são arrasta-
õas até á rua principal Õa povoação.
Falar õo seu mar, é ainõa lembrar essas gigantescas
onõas que, galganõo o granõe pareõão õo cães, se õesfa-
2em, em altas colunas õa mais branca espuma.
Falar õas suas tempestaões, é avivar a lembrança õesses
ôestemiõos marinheiros, tão familiarisaõos com os perigos
õa sua profissão.
Falar õas suas interessantes, e quasi sempre formosas
ribeiras, é recorõar esses singulares e perigosos caminhos,
talhaõos nos montes, montanhas e rocheõos, mais aõquaõos
a passagem Ôe animaes, que Õe gente, assim como as pri-
mitivas e simples povoações e logares, que no seu percurso-
se encontram. Lembrar esses caminhos, é rememorar ver-
õaõeiros abysmos em que a vista se perturba, e aos nossos
ouviõos chega o sussurro longínquo e lúgubre õo mar Ões-
fazenõo-se õe encontro ás peneõias !
Falar õa Ilha õe Santo Antão õe Cabo-Verõe é evocar
158 Poetisas Portuguesas
as historias ingénuas õe jitecéras e gongons, (feiticeiras e
ôuenòes), por mim ouviôas quanòo criança.
Falar õa Ilha òe Santo Antão é registar alguns nomes
ilustres õe seus filhos, como Roberto Duarte Silva, chimico, |
notável, que foi professor em Paris, onòe era muito consi-
òeraõo ; os õistinctos meõiccs Drs. Bernaròo ]o£é òe Oli-
veira, Joaquim Esmeralôo Nobre, ]oão Gualberto Pinto e
Oliveira Teixeira ; o engenheiro Lima ; e os oficiaes ò'ar-
tilharia Viriato Gomes õa Fonseca e Luiz Nobre õe Mello ;
o mais jovem õos professores õa Universiõaõe õe Lisboa,
Dr. Martinho Nobre òe Mello, logar que alcançou em bri-
lhante concurso publico ; o poeta Januário Leite, etc, etc,
não õevenôo também ôeixar õe mencionar os nomes õ'ou-
íros não menos ilustres Caboverõianos, como o Dr. Fran-
cisco Freõerico Hopffer, coronel meõico, e ilustre homem
òe sciencias, Acaõemico e publicista ; }osé Maria õe Sousa
Monteiro, òistinctissimo Acaõemico e escriptor, auctor õe
Sonetos, ^Poemas Mysiuos, O uuto dos Esquecidos, etc. ; o
Marquez õe Fontes (Dr. António Maria õe Fontes Pereira
òe Mello Ganhaõo) ; os Drs. João Augusto Martins ilustre
meõico e escriptor, auctor õo livro Cabo- Verde, Madeira e
Guine ; Dr. Freitas e Cosia, Dr. Jorge Portella e Praõo.
Dr. Júlio José Dias, Dr. João òe Sousa Machaõo e Dr.
Henrique õe Vasconcellos, poeta, prosaõor e Õeputaõo por
Cabo-Verõe ; os oficiaes õ'Armaòa Christianos José òe
Senna Borcellos, Acaõemico e auctor õos Subsídios para a
Historia de Cabo- Verde e Guine e Borja õ'Araujo ; os ge-
neraes Sérvulo õe Paula Meõina e Henrique õ'Almeiõa
Leite ; José Barbosa, leaõer õo partiõo Unionista e Vera
Cruz, 1." senaõor por Cabo-Verõe ; Simplício João Roõri-
gues õe Brito consiõeraòo primeiro pintor òa Corte õo Bra-
zil ; Simão Manoel Alves Juliano, cujo ousto figura na pra-
ça òo Comercio õo Rio õe Janeiro, como um õos benemé-
ritos òa navegação, etc, etc.
Como poetas citarei os nomes õe Meõina e Vasconcellos ;
Eugénio Tavares; José Lopes; Guilherme Dantas; José
Poetisas Portuguesas 159
BernarÕo Alfama, etc. e tantas outras inõiviòualiòaôes que
nos vários conhecimentos humanos se teem òistinguiôo.
A titulo õe curiosiôaõe õou o nome õe alguns nacionaes
e estrangeiros que se teem ocupaòo õe Cabo-Verõe :
João ôa Silva Feijó ; Félix António õe Brito Capello ;
Lopes õe Lima, António AlfreÕo Barjona õe Freitas — que
foi õistincto governaõor õe Cabo-Verõe; o general Au-
gusto Fructuoso Figueireõo õe Barros, antigo e muito ilus-
tre secretario Geral õe Cabo-Verõe, a quem essa provin-
da muito õeve ; João Carõoso Júnior, sócio õas Acaõemias
ôas Sciencias õe Lisboa e õe Portugal, auctor õos Subsídios
para a Matéria Medica e Terapêutica das Possessões Ultra-
marinas Portuguesas, e õas Cryptog arnicas das Ilhas de
CaboVerde, etc. ; Ernesto õe Vasconcellos ; AlfreÕo õa Costa
Anòraõe ; Chelmiki ; Francisco A. õe Varnhagen ; Dr. Bru-
ner ; Darwin ; Dr. SchmiÕt ; Dampier ; Eveleight ; Melikon ;
Saint Claire õe Ville ; Stubel, Frieõlaenõer, etc, etc.
D. GertruÕes Ferreira Lima foi uma õas cclaboraõoras
5o Almanach Luso- Africano para 1895; também publicou
ji/arias poesias no Almanach de Lembranças.
SAUDAÇÃO
Eu vos sauõo magestosas serras,
Montes e valles, verõejantes plagas !
õoce mysterio que na gruta encerras,
perfumes õa tarõe, harmonias vagas !
Eu vos sauõo laranjaes floriõos
ribeiro manso que o luar pratea ?
celestes lumes õa ampliõão cahiõos
fronõente ramo que p'ra Deus s'altea !
Eu vos sauõo murmurosas aguas,
que meigas falias segreõaes ás flores,
õo peito triste minoranõo as aguas
e o curtimento õe profunõas õôres !
160 Poetisas Portuguesas
Eu vos sauòo, toòos vós, n'est'ancia,
e, hoje, a mente n'esta augusta hora :
relembra mais a minha, òôce infância,
prazer suave que minh'alma aôora.
Ah ! que sauòaõe n'este peito enfermo
òa pobre mãe que foi gentil e meiga ! . . .
amor õivino que enflora o ermo,
matiz rizonho que tapiza a veiga !
Oh ! como sinto um turbilhão ò'iòeias
aqui sosinha contemplanòo os montes,
Virentes cumes, crystalinas veias,
ouvinôo meigo o sussurrar õas fontes !
E* que hoje lembro com tristeza infinòa
riôentes plainos, outro campo bello,
affectos puros, como a aurora linòa,
ou como òas aves o cantar singelo.
E vós, perfumes òe manhã festiva,
fulgente estrella òe pallôr formoso,
quebrae-me as peias porque sou captiva
levae-me áquelle Portugal formoso.
Humilde Camponeza (Gertruões Ferreira Lima). Ahtiú
nach de Lembranças^ para 1893. pag. 214.
ALBERTINA DE LUCENA
(d. MARIA DE MONTAURY DO NASCIMENTO)
D. Maria Albertina õe Montaury òo Nascimento nasceu e
Lisboa a 6 òe julho òe 1879, senòo a mais nova òos filhí
Peòro Augusto õo Nascimento, já faleciòo e Òe D. Mar
Leopolòina òe Oliveira Òe Montaury. Por sua mãe, é âç
Poetisas Portuguesas 161
ôe Marco António õe Azeveõo Coutinho Ramos õe Mon-
taury, senhor ôo morgaòo õe Chorozeira, na freguesia õe
Alõeiagavinha, concelho Ôe Alemquer, Fibalgo õa casa 5e
El-Rei Dom João V7I. e õe sua esposa D. Antónia Canòiôa
Ò'01iveira, irmã ôo Senaòor õo Império, òiplomata e mi-
nistro ôo Estaõo brazileiro — o granôe matemático Canôiôo
Baptista ôe Oliveira ; bisneta ôe Marco António ô'AzeveÔo
Coutinho, moço ôa Camará ôe D. Maria I, em cuja quali-
ôaòe acompanhou a Família Real ao Brazil, Fiôalgo Caval-
leiro ôa Casa Real e ôe D. Catharina Ramos Ôa Silva ô'Eça,
senhora ôo citaôo Morgaôo Ôe Chorozeira ; terceira neta ôe
João Baptista ô'Azeveôo Coutinho ôe Montaury, governa-
ôor ôo Ceará Granôe, Tenente General e Governaôor ôas
Armas ôa Corte ôo Rio ôe Janeiro, etc; quarta neta ôe Mar-
co Antoiio ôe Azeveôo Coutinho ôe Montaury, general e
governaôor ôo Rio ôe Serra ; quinta neta ôe Marco Antó-
nio ô'Azeveôo Coutinho, Enviaôo Extraorôinario e Ministro
plenipotenciário nas Cortes ôe Paris e Lonôres, Fiôalgo Ôa
Casa Real, Secretario ôos Negócios Estrangeiros e ôa
Suerra, (o 1." que houve nestas Repartições), e ôe Nicole
: lulie ôu Poeta, Conôessa ôe Thiange e Marqueza ôe Mon-
f aury (origem ôos Montaury em Portugal) ; sexta neta ôe
jíBartholomeu ô'Azeveôo Coutinho Governaôor ôa Provin-
da ôa Beira e Fiôalgo ôa Casa Real; sétima neta ôe Jorge
ie Azeveôo Coutinho ôe Mesquita ; oitava neta ôe Sebas-
ião ôe Lucena ôa Azeveôo Coutinho, Alcaiôe Mór ôe Portel,
I Guarôa Mór ôe Lisboa no tempo ôa peste ; nona neta Ôe
^'asco Fernanôes Ôe Lucena, Alcaiôe Mór ôe Pernambuco.
Em homenagem á varonia ôa casa ôe sua mãe, que é
ucena, é que D. Maria Albertina ôe Montaury ôo Nasci-
lento usa o pseuôonimo ôe Albertina de Lucena. Pela casa
li Chorozeira esta Senhora entre outros antepassaôos
;;istres, conta a Mathias Ayres Ramos ôa Silva ô'Eça, que na
ia qualiôaôe ôe Familiar ôo Santo Oficio, protegeu muito
infeliz António José ôa Silva, o judeu, poeta satírico no-
vel e a ultima victima ôa inquisição em Portugal.
11
162 Poetisas Portuguesas
D. Albertina de Lucena tem colaboraôo na Nação, òe qi
é muito ilustre Director o apreciado Jornalista Sr. Joãií
Franco Monteiro, que teve a amabiliôaòe òe me íornecg
estes elementos, nos Echos da Avenida, na Semana lllui
irada, e no Almanach de Lembranças.
Durante õois anos, D. Albertina de Lucena teve um jo»
nalsinho que era unicamente escripto por ela : a principie
feito á mão, òepois em copiografo. O Vigilante se intitU'
lava esse curioso semanário.
Os seus primeiros versos õatam òos òesasete anos.
^ ]Á TARDE
Encontraram-se um òia n'uma estraõa
Dois pobres que se haviam conhecido
Em tempos õe ventura ; hoje sem naòa
Choravam tobo o bem que era perõiõo.
Passa o Destino, e olhanòo-os òesòenhoso
Ergue a voz, com solemne magestaòe
Dizenòo-lhes : — «Sou eu o Poderoso
Que esmaga a mais indómita vontade.
«Eu fiz de vós, quem éreis, e quem sois ;
De felizes, tornei-vos desditosos ; . »
Os velhinhos olharam-no, e os dois
Apertaram-se as mãos silenciosos
«Eu sei que fui cruel, despiedado;
Dizei hoje, uma vez, o que é que quereis ;
Sou clemente, farei que o vosso fado
Inda possa mudar, pedi, vereis !>
Mas os pobres, serenos, alheiados.
Apenas levaram, cheios d'espanto.
Os olhos para o Céu ; tristes, pezados
Uns olhos todos magua, todos pranto.
Poetisas Portuguesas 163
E o Destino insistiu : — «Então, peõi !
Serei o vosso pai, bem tarôe, embora».
Elles então òisseram : — Pai, parte
E tarõe já ; ôeixai chorar quem chora !>
Albertina õe Lucena. Novo Almanach de Lembranças,
para 1917, pag. 148.
BERTHA LUPI
Apesar òe não ter obtiòo a tempo, os elementos òe que
carecia para poõer fazer mais õetalhaõamente a biografia
besta illusíre Poetisa, não quiz õeixar õe incluir o seu nome
sntre os ôas Senhoras que cito.
1 D. Dertha Lupi é uma ôas Damas que tem escripto na
^agina Feminina que o iJiar.o Nacional publica ás 5."
eiras.
í; Entre muitas outras Senhoras, teem colaboraòo em prosa
í' verso, nessa interessante pagina literária e artística, õe que
[í ôirector o Dr. Annibal Soares : D. Domitilla õe Carvalho,
5). Branca õe Gonta Colaço, D, Maria õe Carvalho, D.
\ecia Mousinho õe Albuquerque, D. Maria Leonor Reis,
;>. Alice Monteiro Leite, D. Albertina Paraizo, D. Canõiõa
yres õe Magalhães, D. Elisa Baptista õe Sousa Peõroso,
'. Maria Magõalena Trigueiros õe Martel, Marqueza õe
io Maior, D. Isabel õ'Ornellas, Conõessa õe Vinho e Al-
■ eòina, D. Maria Emília Telles õa Silva, D. Maria Õe Len-
istre (Alcáçovas), e D. Maria õe Sampaio Forjaz õe Tri-
ueiros.
DISTRAHIDA
Oiço ás vezes Õizeres agastaõo
Que sou, sem ter emenõa, Õistraiõa ;
Que vivo em munõo á parte e ignoraõo
Em terra que te é õesconheciõa.
i
164 Poetisas Portuguesas
Que tenho sempre o espirito afastado
De tuòo o que me cerca, aborreciòa,
Com o pensamento em mim só concentraõo.
Distante, alheia ás coisas ò'esta viõa.
Talvez tenhas razão, talvez a õôr
De ver tanta malòaõe sem remeõio —
Me traga ao coração este amargor.
Talvez eu queira então no meu torpor.
Fugir Õo munòo que me causa teõio
E viver só meu sonho toòo amor. . .
Dertha Lupi. Pagina Feminina, 5o Diário Nacional, }k
2-2-1917.
-I
1
AO ESPELHO CRUEL
Por ti, ó espelho, eu tinha antigamente
Uma paixão pueril e orgulhosa,
Queõava-me esqueciõa em tua frente
Horas sem fim a contemplar- te, ociosa.
Acreditava então òe boa mente
Que eras sincero e a sorrir venturosa,
Só a ti aõorava ingénua e crente
Como enlevaòo quer a artista á rosa.
E agora, agora. . Como foi não sei.
Que se acabou a minha fé em ti
Que ò'antes eras meu prazer e lei !
Muôa|ste tu, ou fui eu que muõei ?
Se eií nunca em minha viõa te menti
Porque mentias no que acreditei ?
Dertha Lupi. Pagina Feminina, Òo Diário Nacional,
15-3-1917.
Poetisas Portuguesas 165
D. CLORINDA MÁXIMA DE MACEDO
Senòo os dicionários portugueses ò'um granõe laconismo
10 tocante a biografias ôe Senhoras Portuguezas, falta que
)rincipalmente se nota acerca Òas que viveram num pe-
ioôo relativamente moòerno (não quero já falar òas bio-
jrafias õe muitas Senhoras contemporâneas òistinctas, so-
)re as quaes naõa òizem), tem-se me tornaõo, por vezes,
)astante arõua a tarefa Ô'obter elementos, que me permi-
am escrever algumas linhas referentes a õeterminaõas
'oetisas òe que trata este livro.
Assim, òe D. Clorinòa Máxima òe Maceõo, sei apenas,
ue õatava bo Porto muitas Òas suas proòuções que foram
ublicaòas em vários aimanachs e jornaes, taes como : O
^erilampo, etc. e que em 1878 publicou um volume òe ver-
3S intitulaòo Sombras, prefaciaòo por Gomes Leal.
! Do valor òesses versos avaliarão os leitores pela poesia
Ue apresento.
UM QUADRO
Quanòo o sol vae a sumir-se
alem Ò'aquelle pinhal. . .
e o rouxinol vae carpir-se
nos ramos ôo salgueiral ;
quanòo alta vaga espumosa
vem junto á rocha quebrar
e que escuta a voz sauòosa
ôo bronze chamanòo a orar
quanòo a estrella vespertina
fulgura no céu. . • além •
e por Òe traz òa coUina
se eleva a lua também .
166 Poetisas Portuguesas
eu sinto elevar-me a mente
ao seio õo creaòor,
ante esse quaòro imponente
ôe poesia, paz e amor !
Prostrada, então curvo a fronte
aos pés õ'esse immenso altar,
que tem por tecto — o horisonte ;
por órgão — a voz õo mar ;
a luz Òa lua — por cvrios ;
o puro céo — por missal
e o branòo aroma ôos lyrios
— por incenso perennal !
E assim — minha alma esqueciòa
òo peso òa negra cruz,
ascenòe ôe novo á viõa . . .
tem esperanças, crença e luz !
Clorinõa Máxima òe MaceÔo. Sojnbras, Porto, 1878, pa
123 a 125.
D. ALDA GUERREIRO MACHADO
D. AlÒa Guerreiro MachaÒo nasceu em S. Thiago ôe C
cem, onôe resiôe actualmente.
E' filha ôe D. Catharina Maria F. Guerreiro e ôe Mam
Ôo Espirito Santo Guerreiro, que foi um entusiasta pe
artes. Cultivou como verôaôeiro artista a pintura ôe
ôeixou certo numero ôe boas telas.
Tenôo D. Alôa Guerreiro Machaôo siôo eôucaôa
seus pães na veneração ôas granôes obras ôe toôo!
géneros, foi ôesse moôo que se lhe ôespertou o g(
pela poesia, a que ôe preferencia se fem ôeôicaôo.
Poetisas Portuguesas 167
A causa ôa instrução popular merece lambem especial
atenção a esta Poetisa, que por meio õe artigos e òo ensino
tem tentaôo combater o analfabetismo.
As poesias Õ'esta Senhora acham-se õispersas em varias
revistas, em jornaes 5a província e na Encyclopedia das
Famílias, curioso mensario que já conta 31 anos ôe exis-
tência e òe que é proprietário o sr. Manuel Lucas Tor-
res.
D. Alôa Guerreiro Machaôo é auctora õuma bela serie
,; Õe sonetos sobre Fiouras Históricas Portuguesas, proòu-
%■ ções que estão íneõitas,
1^ Por esse motivo e por constituirem um género ôe poesia
"t pouco cultivaõo em Portugal, é tanto maior a minha satis-
fação em poòer publicar nesta Antologia quatro ôessas mi-
mosas composições poéticas.
Ao contrario Ôo que tem feito esta Senhora, que se ocu-
pa exclusivamente ôe Figuras d'Outrora, D. Mecia Mousi-
nho ôe Albuquerque, D. Emilia Maia e D. Branca ôe
Gonta Colaço, teem tomaôo, por vezes, para tema Ôe al-
gumas ôe suas poesias, Individualidades históricas d'aciuali-
dade.
A publicação ôesses sonetos, em volume, será uma iôeia
feliz, que fará reviver muitos nomes ilustres Ôa Nossa His-
toria Pátria.
SAUDADE
Sauôaôe, paixão ô'alma amarga e triste
Complemento ôo amor nasce ôa ausência.
Floresce, vive, cresce e fina essência
Exala ; acre e subtil só na alma existe.
E' ôôr que tem ôoçura ; ela consiste
N'um afecto que abrange uma existência.
Se um coração prenôeu com violência
Ao soffrer Ôesse mal ninguém resiste.
168 Poetisas Portuguesas
Quem não soífreu um õia essa amargura
Que òa recorôação sempre se evola ?
Ninguém busca fugir-lhe era loucura.
Sauôaòe é flor mimosa, e na corola
O gérmen se encerrou õa desventura
E' uma õôr que mata e nos consola ?
Alõa Guerreiro Machaõo,
D. HENRIQUE
(l.-tEDlTO»
Era um sábio o infante ! lõéias arrojaòas !
Um sábio e um heroe ! A fronte pensativa
Austera, nobre e grave, alevantava altiva
Na sombria altivez ôas almas inspiraòas.
Quinhentos annos ha ! Nas rochas escarpadas
De Sagres, julgo ver- lhe a sombra fugitiva!
— Deu nome a Portugal ! Foi sua iniciativa
Sondar a vastidão das aguas aniladas.
A sua vista d'aguia, o sol do seu olhar,
O mundo illuminou ; rompeu os nevoeiros
Que envolviam então as terras d'alem-mar.
Navegador audaz, primeiro entre os primeiros
Trabalhou e venceu e poude triumphar,
N'este pais de heroes, Nação de Marinheiros !
Alda Guerreiro Machado.
Poetisas Portuguesas 169
NUNO ALVARES
(inédito)
Cheio ôe misticismo em meio ôo acampamento,
Alevantanôo o olhar, Nuno Alvares fitava
O sèu'stanõarte branco a balouçar ao vento !
De súbito, porem, com altivez braõava :
Por S. ]orge ! E cinginõo á cinta o armamento,
No anceio õe combater, o pendão que alvejava
Revia enterneciõo inõa por um momento,
Partinõo após, correnõo, á guerra que o tentava.
)eu exemplo Òe arrojo ás hostes lusitanas,
lonseguinòo vencer as tropas castelhanas !
:m campanhas viveu ! Guerreiro infatigável !
las um õia òeixou a espaòa, o elmo, a cota,
^estiu-se òe burel, o heroe õ'Aljubarrota
foi morrer n'um claustro, o Santo Conòestavel 1
)a Guerreiro MachaÕo.
DUARTE D'ALMEIDA
(inédito)
Na batalha õe Toro a gente portugueza
Cairá berrotaòa. O alferes-mor então
N'um rasgo òe inergia e não vulgar braveza,
N'um esforço supremo, ergueu o pavilhão.
l Uma lança contraria apanha- o ôe surpresa,
ií , Certeira vem ò'um golpe e arrebatou-lhe a mão.
Mas não caiu em terra á mingua ôe ôefêsa
O penôão nacional ; em meio ôa confusão.
170 Poetisas Portuguesas
Inôiferente á ôôr, levanta-a novamente,
Na mão esqueròa, firme, esse heróico solòaòo,
Um novo golpe a corta, e a resistir, ardente,
Entre a gente que o fere, então arrebatado.
Nos Dentes a prenòeu, cainõo finalmente !
E á pátria veiu morrer õe fome . . <o õecepaõo !»
AlÕa Guerreiro Machaôo.
•
EGAS MONIZ
(inédito)
Do Portugal antigo um nobre cavaleiro
De nome Egas Moniz, um vulto glorioso,
Simbolo õe honradez, fiel e generoso.
Rebrilha ainôa hoje e impôe-se ao munôo inteiro.
Cercado o nosso rei em sitio traiçoeiro
Pelo rei de Leão - um homem valoroso.
Vassalo dedicado, altivo e corajoso
Escravo do dever, leal e verdadeiro.
Tinha a Affonso VII a palavra empenhada
Por Affonso primeiro ; e ao vê-la assim quebrada
Por decisão d'el-rei, que julga humilhação
A clausula que impôz o reino de Leão,
Com filhos e mulher, partiu de animo forte.
Caminho de Toledo, a oferecer-se á morte !
Alda Guerreiro Machado.
D. EMÍLIA ADELAIDE MONIZ DA MAIA
D. Emilia Adelaide Moniz da Maia nasceu no Rio de Ja-
neiro em 1848, sendo portuguesa pelo facto de ter casado
em Portugal, com José Rufino Moniz da Maia que falecei
em 1899, no posto de general.
Poetisas Portuguesas 171
Contanõo esta Senhora apenas quinze anos ôe iôaòe,
apareceu publicada na Revista Popular, ôo Rio õe Janeiro
(pag. 251), uma poesia sua, intitulaòa Supplica, que mereceu
òos poetas brazileiros òessa época, e òe Carlos José õo Ro-
sário, escriptor e proprietário ôa citaõa revista, as mais hon-
rosas referencias.
D. Emilia Maia é não só uma poetisa ôistincta como ainòa
uma Senhora muito caritativa.
Não posso esquivar-me ao prazer ôe citar alguns factos
por onòe se poôe aquilatar Ôos seus botes ôe coração e es-
pirito.
Assim, em 26 Ôe março ôe caôa ano, comemoranôo a ôata
em que nasceu seu mariôo, ôá lím boôo a 12 viuvas po-
bres ; no mesmo Ôia costumava também manôar ôistribuir
no quartel õe caçaôores 2, onôe seu esposo começou a car-
reira militar, como aspirante, um premio ôe 12 mil reis, Ôes-
tinaôo ao solôaôo melhor comportaôo, recompensa que,
pela extincção Ôesse regimento, é actualmente ôaôa no ôe
Infantaria 2.
Esta Poetisa é auctora Ôos seguintes trabalhos literários:
Fleurs, obra em francez publicaôa em 1878 ; .4.* sete pala-
vras de Nosso Senhor Jesus Christo, 1916, folheto ôestinaôo
a um fim ôe cariôaôe, bem como Angelus. livro ôe poesias
ineôitas que tem no prelo ; Trenas, volume ôe versos apare-
ciôo em 1912, (ao qual se referiram em termos muito elogio-
sos, A Nação, ôe 27-4-1913; O 'Bia, Ôe 19 e 23-8-1913 e
os Echos da Avenida, ôe 6-4-913) ; parte ôa eôição Oeste li-
vro ofereceu- a sua auctora ás pessoas ôas suas relações,
tenôo siôo a outra parte venôiôa no Brazil ; com o proôucto,
comprou D. Emilia Maia um enxoval que ofereceu a uma
órfã nasciôa e batisaôa na sua freguesia natal, Candelária.
D. Emilia Maia foi uma ôas Senhoras que escreveu no
semanário A Voj Feminina, funôaôo em 1868, e que teve
por colaboraôoras D. Marianna Angélica ô'Anôraôe, D
Guiomar Torrezão, etc.
No Almanach das Senhoras, ha muitas proôucções poe-
172 Poetisas Portuguesas t|i
ticas òesta ilustre Dama, mãe õo actor Fernanòo Maia, ge-
rente Ôo teatro õe D. Maria, e que faleceu bem novo, quanòo
tuõo lhe fazia prever um futuro glorioso.
A' muita amabiliòaòe besta ilustre Poetisa òevo a ce-
dência õo precioso autografo õo granõe poeta brazileiro
Gonçalves Dias, o qual com o maior õesvanecimento torno
conheciõo.
E' bem singela a narração õo facto que õeu origem a
que este Poeta, quanõo õa sua estaôa em Lisboa, tivesse
enviaõo ao pae õe D. Emilia Maia, a carta que reproõuzo.
Senõo esta Senhora, uma fervorosa aõmiraõora õo auctor
õos Primeiros Cantos e Õos Segundos Cantos (vem aqui a
propósito õizer que na primeira õas obras citaõas, se en-
contra a conheciõa poesia Minha terra tem palmeira ., com-
posta em Coimbra em 1843, e que tão celebre se tornou
em Portugal e no Brazil), escreveu uma poesia intitulaõa
Americana que õeõicou a Gonçalves Dias, que responõeu
com a carta referiõa e com uma poesia, Emilia, que poõe
ler- se a pag. 430 õas Obras Posthumas Õe Gançalves Dias,
compilaõas por António Henrique Leal (São Luiz õo Ma-
ranhão 1868).
D. Emilia Maia, é igualmente uma traõuctora õistincta,
como os leitores verão pelo soneto Santa There^a de Jesus.
Ao evocar o nome õo granõe lirico Gonçalves Dias, tão
precocemente faleciõo, vem-me naturalmente á memoria
os nomes õessa pleiaôe brilhantíssima õe poetas, juris-
consultos, romancistas, historiaõores e críticos que o Bra-
zil possue, taes como : Casimiro õ'Abreu, Alberto õe Oli-
veira, Olavo Bilac, Raymunõo Corrêa, Machaôo Õe Assis,
Fagunões Varella, Junqueira Freire, Alvares õ'AzeveÕo,
Mário Artagão, Luiz Guimarães, Fontoura Xaxier, Riiy Bar-
bosa, ]osé õe Alencar, Bernarõo Guimarães, Aluizio õe
Azeveõo, Affonso Celso, D. Júlia Lopes õe Almeiõa, D.
Aõelina Lopes Vieira, Ccelho Netto, Lúcio õe Menõonça,
Graça Aranha, Sylvio Romero, Tobias Barreto, José Veris-
simo, Clóvis Bevilacqua, EucliÕes õa Cunha, etc, etc.
Poetisas Portuguesas
173
V_
174 Poetisas Portuguesas
DOR SUPREMA
Na estraòa solitária o arvoreòo
enlaça as ramas como verõe manto.
Entre as folhas occulta, triste canto
gorgeia a tutinegra quasi a mêõo.
O ceu nublaòo õe um aspecto treõo
vae orvalhanòo a terra com seu pranto :
em carreira veloz passa entretanto
carro que leva sepulchral segreòo . .
Bem uniòas na ôôr, n'um só gemiòo,
òuas mulheres vão n'aquelle Horto
guarôanõo o seu thesouro enternecibo :
Uma ò'elias em funõo òesconforto
como a Mãe ôe Jesus : em pranto ungido,
leva nos braços o seu filho morto !
Emília Maia. Penas, Lisboa, 1912, pag. 70.
O AMOR DE DEUS
<TRAnUCÇÃO DE UM SONSTO DS S.ta thEREíA DE JESiS;
Eu não vos amo meu Deus, por esperar
O goso que me tenôes promettiòo.
Não me move o inferno tão terniõo.
Para que eu õeixe por isso Òe pecar,
Mas move-me tão somente o contemplar,
Pregaõo n'uma cruz, escarnecido,
O teu corpo õesnuòo e tão feriôo,
E a angustia mortal òo teu olhar !
r^
Poetisas Portuguesas 175
Move-me emfim, teu amor õe tal maneira
Que sem mesmo haver Ceu eu te aõorara
E sem haver inferno eu te temera ;
Que pelo teu amor tuôo perõera,
E se o goso que espero não sonhara,
Com o mesmo afan minh'alma te quisera.
Emilia Maia.
MEU DEUS, MEU DEUS, PORQUE
ME ABANDONASTE?
IV
No Ociòente o sol já se esconôia
E Christo sobre a Cruz abanòonaôo,
Divagava o olhar angustiaòo,
Pela turba que o escarnecia.
A formosa cabeça lhe penôia
Sobre o peito ôe chagas consteiraôo,
E òe ôôres cruéis atormentaõo,
N'uma angustia mortal, estremecia.
Ergue-se o peito nas vascas òa aíflicçãO'
E fica-se em õolorosa contracção
Como um lyrio penòiòo sobre a haste.
E n'essa soliôão perõenòo a vi&a,
Ao Pae invoca em voz amorteciõa :
«Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste ? !»
Emilia Maia. Ás Sete palavras de Nosso Senhor Jesus
iristo no Calvário, Lisboa, 1916.
176 Poetisas Portuguesas
D. CÂNDIDA AVRES DE MAGALHÃES
D. Canòiõa Ayres 5e Magalhães é filha ôe D. Maria £)•
Carmo Vaz ôe Carvalho e òo coronel õe Cavalaria, socii
õa Acaòemia õas Sciencias õe Lisboa e ilustre poeta e pro
saòor Christovam Ayres õe Magalhães Sepúlveda, o notí
vel auctor õa Historia do Exercito Português (14 volumet
e õe muitas outras obras õe real valor, õe que tratare
quanòo noutro tomo, continuação õesta Antologia, me oo)
par Õos Poetas Consagrados.
D. Canõiõa Ayres õe Magalhães que é sobrinha Õa muft
notável escriptora Sr.^ D. Maria Amália Vaz õe Carvall»
publicou os seus primeiros versos em 1906, na Illustraçi
Portuguesa, onõe também escreveu umas curiosas poes|
sobre õitas infantis.
Tem ainõa colaboraõo na Revista Transmontana, Jon
da mulher, e Diário Nacional, e sobretuõo, na Águia,
gão literário õa Renascença Portuguesa. Nessa bela revijf
portuense, publicou esta ilustre Poetisa alguns capitu||
õ'um trabalho (por concluir), e que pelo seu lirismo e
lesa õe forma, lembram bastante as poesias õe Uma
mavera de Mulher, e õas Vo^es do Ermo.
Figura também no livro In õMemoriam, em que escrevi
ram õistinctas escriptoras e escriptores, e que foi õeõica?
pelo sr. Christovam Ayres, a seu filho José Vaz õe Caní
lho, o soneto Risopara os outros, que incluo nesta colec^
D. Canõiõa Ayres õe Magalhães faz versos, õesõe p'
quena.
No 'Brasil e Portugal Õe 1914, n'um artigo escripto p(
D. Maria 0'Neill acerca õo auctor Õa Historia da CavalU
ria 'Portuguesa, achei O seguinte curioso pormenor reí»
rente a sua filha D. Canõiõa :
No colégio õas Francesinhas õe São Luiz, onõe a aucto:
õos Nimbos, conheceu aos nove anos D. Canõiõa Ayn
õe Magalhães, via-a sempre, com os bolsos õo bibe chei(
ôe versos.
Poetisas Portuguesas 177
RÍSO PARA OS OUTROS
Puòe entrar n'esse quarto onõe morrias
amanòo a Viòa ! • O teu olhar buscava
lêr, em quem Ôo teu leito se abeirava,
que não era õe morte o que sentias. . .
E quanôo, ainôa a fallar, já não sorrias,
porque essa luz na Morte se apagava. .
eu puòe rir. . n'um riso que emballava
A illusão em que tu aòormecias .
E rio ainòa. . . e já te vi morrer !
E' que na viõa o riso é um òever :
(causar tristeza aos outros faz remorso. . .)
Depois. . . choro baixinho e ás escuras,
a Òescançar õo riso em que me esforço
por esconôer tão funõas maguas !
Canôiôa Ayres Ôe Magalhães. Almanach Illustrado (õa
'arceria Pereira), para 1912, pag. 64.
MOCIDADE...
Não ter amor, esperança ou fé que alente
Não ter sequer um bem que nos sorria,
nem consolo, nem paz. . . e não ter guia
na viõa que promette e assim nos mente ;
Sentir ôentro õe nós, sempre gemente,
o coração faminto õa alegria,
como um cego que pela luz ôo ôia
viva a chorar na sua noite ingente ;
Braõar, erguenõo os braços para a Morte : —
<— Em ti conhecerei quem me conforte,
«Oh ! leva quem não Õeixa uma sauõaõe. . >
12
178 Poetisas Portuguesas
E volver-nos ôe longe a Morte : < - E' ceõo !»
«E's moço, ainõa cumpre o teu õegreòo !»
Para quantos é isto a Mociòaõe. . •
Canõiòa Ayres òe Magalhães. Pagina Feminina, ôo Z)í|
rio Nacional, ôe 18-1-1917.
LAGRIMAS
(EPiCRAPHE DO LIVRO Lagrimos)
«In Memoriam» de meu irmão o Dr José Vjf de Carvalh
Ayres de Magalhães
I
Não ha na terra lagrimas mais santas,
nem mais abençoaòas,
õo que essas tristes lagrimas pieòosas
que choravam por nós olhos amigos. • .
Por isso é que os Antigos
— almas videntes, almas religiosas
que por òivino instincto se guiavam,
depunham com fervor e com ternura
òentro òa sepultura,
que ia esconder aos sofíregos olhares
esse alguém que partia,
um vaso Òe crystal que recolhia
as lagrimas em fio
õos que ficavam na desolação. ■ •
E a doce fé deixava-lhes suppor
que essas lagrimas, symbolo e expressão
da saudade e do amor,
iam servir de eterna companhia
na eterna solidão. . .
Cândida Ayres de Magalhães.
Poetisas Portuguesas 179
SAUDADE
A sauõaôe começa no momento
em que a gente já sabe que não oura
o bem que nos seòuz ;
e í>a própria sauòaôe sae a luz
que embelleza essa hora fugiõia,
e ôá encanto a tuõo em que tocar,
como a belleza triste òo luar
como a sauòosa luz òo fim ôo Ôia .
Canôiõa Ayres òe Magalhães. Pagina Feminina, òo Dia-
o Nacional, òe 1-3-1917.
D. MARIANNA ANTÓNIA PIMENTEL
MALDONADO
D. Marianna Antónia Pimentel Malòonaòo nasceu em
Lisboa em 1772 ou 1774 e faleceu em 1855.
Esta Senhora era irmã òe 3oão Vicente Pimentel Malòo-
naòo, notável poeta òa Escola Arcaciica e auctor òos Apo-
logos, coleção òe cem fabulas que a Garrett mereceram as
mais encomiásticas referencias.
Esta Poetisa colaborou com 3 sonetos publicaòos sob o
pseuòonimo òe Uma Senhora, no Jornal Poético ou collec-
ção das melhores composições em todo o género, dos mais in-
signes poetas portugueses, tanto impressas como inéditas of-
ferecidas aos amantes da Nação, por Desiòerio Marques
Leão, publicação feita, com licença, em Lisboa, em 1812, e
|10 Portugue^ Constitucional, òe Pato Moniz. Nos versos Òe
I. M. òa Costa e Silva vem uma poesia òesta Poetisa, que
|;screveu numerosas poesias que estão ineòitas. '
D. Marianna Antónia Pimentel Malòonaòo publicou:
180 Poetisas Portuguesas
Ode ao triste anniversario da trafica morte de Gomes
Freire de Andrade, publicação apareciòa sem o nome õa
auctora.
A GRÃ BRETANHA
(soneto)
Não tanto hum òia Roma libertaõa
Do jugo òe tyrannos oppressores,
Mais graças Òava, õava mais louvores
Do granõe Bruto á vingaõora espaòa ;
Quanto, ó nossa benéfica Alliaõa,
Graças õevemos òar-te ainôa maiores :
Teu braço nos vingou òe vis traiòores,
Nos trouxe a liberõaõe òesejaòa.
Bem que ò'Elisa já no seio aròia
O fogo òe justíssima vingança
As chammas lhe abafava mão impia :
Em ti os olhos fita, em ti òescança ;
Tu arrancaste o sceptro á tyrania,
Quebraste os ferros, que nos punha França.
Por huma Senhora. Jornal Poético, por Desiõerio Mar-
ques Leão, Lisboa, 1812, pag. 278.
D. ZULMIRA DE MELLO
(n ZULMIRA DA COSTA l.E FERRKÍRA FRKIRE DE ANDRADE)
D. Zulmira òa Costa òe Ferreira Freire òe Anòraòe nas-
ceu na pictDresca e bela província Òo Minho, na alòeia ôe
Ajuòe, òe Povoa òe Lanhoso.
E' filha òe José Augusto Pereira õa Costa e òe D. Erme-
Poetisas Portugueêas 181
linôa JuIia õe Ferreira õe Mello Freire òe Anõraõe, òa
Casa ôas Agras.
Seu avô materno, José Joaquim òe Ferreira õe Mello
Freire õe Anõraõe que manteve relações literárias com
Camillo Castello Branco, era muito Õaõo a assumptos õ'arte,
senõo â sua livraria no Solar õas Agras, uma õas primeiras
õa província.
Foi, sem òuviõa alguma, esse ambiente õ'arte e as lei-
turas que D. Zulmira õe Mello (nome com que tem assi-
gnaõo as suas proõuções poéticas), fez na livraria òe seu
avô, que tão ceòo lhe õespertaram a granõe inclinação pe-
las letras e pela poesia, que com tanto gosto, carinho e fe-
ieciõaõe tem cultivaõo òesòe bem nova.
Esta Poetisa, não tenòo aõormeciòo á sombra õos lou-
ros colhiõos e õesejanòo aperfeiçoar- se, não hesitou em
peõir a João Penha (poeta septagenario que á similhança
í>e Gomes Leal e Camões chega á velhice, pobre òe òi-
nheiro e confortos), ensinamentos e conselhos, ao que elle,
benevolamente aceõeu, tenòo no jornal A Chronica, ao
apresentar a sua õiscipula, frases bem justas e elogiosas
para D, Zulmira òe Mello, que õurante bastante tempo co-
laborou nessa publicação, onòe figuram muitos nomes ilus-
tres.
A maioria òas poesias ôesta Senhora nunca foi publicaõa.
I Darão um belo livro, que sua auctora pensa intitular J''lo
\res de Sonhv, ou Rosas de todo o anno.
A ascenòencia Òe D. Zulmira òe Mello, como escreveu o
|sr. Conòe õe Valenças, é õas mais nobres e antigas.
D. Soeiro Raymundo, rico homem e um õos fiòalgos mais
|y;alorosos õa corte õe D. Sancho I — acompanhanõo Ri-
haròo I, Coração òe Leão, Rei òe Inglaterra, e Freòerico
parbara Roxa, Imperaõor òa Allemanha e Philippe Augusto
[el õe França, na cruzaõa que estes reis emprehenõeram
[>ara a conquista õa lerra Santa, -~ õeu taes provas òe va-
'que mereceu o titulo õe Bravo dos Bravos
'or ter õaòo um assalto á porta òo muro òa torre cha-
182 Poetisas Portuguesas
maôa Mello, õe que fala o velho Testamento no Paralipo-
mon LIIl Cap. XXXII e em que hasteou na torre a banòeira
ôas cruzaòas Coração Ôe Leão, abraçanòo D. Soeiro Rav-
munòo, lhe ôeu aquele epíteto, aòquirinòo o apeliòo Mello.
Em 1204, D. Soeiro Raymunòo povoou a quinta a que poz
o nome òe Mello, povoação elevaõa a vila por D. Affonso V,
Foi ahi que ôepois se estabeleceu o solar õos Mellos, ôe
quem ôescenôem os Caôavais, os Sabugosas, os Conões
ôe Vila Real e outras famílias ilustres.
Pelos Freire õe Anõraõe, provem õos ConÕes òe Trans-
tâmara e õe Trava.
SOMNAMBULA
N'um castello sombrio como a õor
Em que gemia, perpassanõo, o vento,
Dias ôe choro, noites õe tormento
Triste eu passava, immersa em funõo horror.
Junto á porta, um Õragão, sempre em furor,
Olhos em braza, me guarõava attento ;
De súbito, resôa, estranho evento !
D'entre o arvoreõo uma canção õ'amor.
Aõormece o Õragão, feroz, meõonho,
D'aquelia harpa ao som mavioso e linõo,
E eu venõo tuõo azul, o ceu risonho,
Atraz Õo novo orpheu, sempre fuginõo,
Pelos meanõros Õo paiz Õo sonho,
Somnambula õ'amor o fui seguinõo
Zulmira õe Mello.
Poetisas Portuguesas 183
I
PHANTASIA
Oh ôoce e branòa lua, quem me òera
Possuir um alcaçar, fulgurante
D'esmeralõas, opalas e Òiamante
Em teus reinos õe luz e ôe chimera !
Levaòa em bergantins ôe folhas ô'hera,
Ir eu quizera á região Òistante,
Onõe és a soberana triumphante,
OnÔe a Poesia, o eterno ^onho, impera !
N'um paço õefenõiòo por Õragões,
Guarôar eu òesejava as mariposas,
Brancas, brancas, õas minhas illusões ;
Desfolhar lirios e jasmins e rosas,
E ao som vago õe murmuras canções
Vestir õe azul imagens vaporosas .
Zulmira õe Mello.
 DEIRA-MAR
I Vão passanõo as gaivotas, embalaôas
I Nas salsas onõas õ'esse mar õe rosas ;
I Brancos flocos õe espumas vaporosas
I Lhes tremulam nas azas orvalhaõas ;
l
f, E õa praia as conchinhas variegaõas
Alvejam pelas Õunas arenosas,
Quaes fragmentos õe peõras preciosas
Dispersos pelas onõas praleaõas.
184 Poetisas loriuuueíius
Ao pôr òo sol, já quanòo o ceu e o mar
Se confunòem, minha alma õe viòente
Embebia-se em funõo meõitar :
Reminiscências, que evocava a mente,
Das vagas ao constante murmurar
Nas brumas se esvaiam lentamente .
Zulmira òe Mello.
D. MARIA JOSÉ FURTADO DE MENDONÇA
D. Maria José Furtado õe Menòonça resiòiu outr'ora em
Celorico õa Beira.
Colaborou, escrevenòo folhetins em verso, no jornal O
T>istricto da Guarda.
Nos almanachs antigos, é vulgar aparecer o nome ôesta
Senhora (que foi sogra õo falecido aòvogaôo Dr. Aureliano
õe Mattos), firmanõo poesias e charaõas.
Em 1898, publicou um livro õe versos, Piores de Inverno^,
que foi prefaciaôo pelo Dr. Canõiõo õe FigueireÕo.
Esta Senhora também é auctora Õo Q.4uto da Vida de S.
Sebastião, eõitaõo no Porto em 1862.
O REI DE THULE
(VERSÃO UVBE)
Outr'ora em Thule reinou
Um bom rei, tão extremoso,
Que até morrer foi cioso
Da mulher que õesposou.
Quanõo esta o munõo ôeixou.
Entre õores cruciantes.
Poetisas Portuguesas 185
Chamou por alguns instantes
O Rei, e ôeu-lhe um legaõo,
Áureo vaso, cravejaõo
De rubins e õe Òiamantes.
Quanòo o bom rei viu perõiõo
Dos seus amores o objecto,
Desõe logo o seu affecto
Concentrou no vaso q'riòo.
Tinha por elle bebiòo,
Dos verões annos na flor,
O òoce néctar Òo arr^or
Que õocemente o embriagou. . .
Por isso, jamais òeixou
O precioso penhor.
Se uma sauòaôe o pungia,
Mirava o vaso aòoraõo :
Tinha-o na mesa a seu laõo,
Só por elle é que bebia.
Apesar õ'isío, sentia
Que as forças lhe iam faltanõo ;
Repartiu seus bens ; mas quanòo
Pensou no vaso queriòo.
Rompeu em pranto sentiòo,
Largo tempo soluçando.
E logo em tom resoluto
Os seus cortezãos chamou,
— E nenhum ò'elles notou
Seu pranto, já agora enxuto ! --
«Antes òos õias õe luto,
- Diz-lhes com voz commoviõa,
«Quero a corte reuniõa
«No castello junto ao mar,
«Para ahi vos offertar
«Um festim ôe òespeõiõa.
186 Poetisas Porlagaesa^
Dito e feito : a fiõalguia
]á cercava a lauta mesa ;
Mal òisfarçaõa tristeza
Nos semblantes transluzia
Notavam que o rei bebia . .
Bebia. . e sempre seõento ;
Similhante ao avarento
Que a alma tem no thesouro,
Libava no vaso ô'ouro
O seu ôerraõeiro alento.
Não pôòe mais resistir !
Atirou o copo ao mar,
Via-o nas onòas boiar. . . «
Fugia . tornava a vir . . \
Emfim, ao vel-o afunõar
Ergueu a tremula mão
N'um <aõeus» e a commoção
InÔa prantos lhe arrancou ;
Depois, seus olhos cerrou,
Cahiu sem viôa no chão.
Maria José FurtaÒo õe Menõonça. Flores de Inverno, LiSh
boa. 1898, pag. 133 a 136.
D. ARSENIA BETTENCOURT MIRANDA
D. Arsenia Bettencourt Miranòa é natural òa Ilha Ôa|
Maõeira.
As suas composições poéticas acham-se ôispersas ej
òifferentes jornaes õa sua terra natal.
No Álbum Madeirense,, compilado por Francisco VietóiiJ
também foram publicados alguns versos õ'esta Poetisa.
Poetisas Portuguesas 187
ANHELOS
(fragmento)
Minha alma, que peões, que queres ?
Que Òesejas que anhelos são os teus ?
E' ôebalõe que imploras a Deus
Uma hora, um lampejo õe luz ;
Densas trevas fenvolvem, te cercam,
E, por ellas a custo seguinõo,
Vaes terríveis angustias sentindo,
Dôr acerba que a voz não traòuz.
Doces sonhos me v'em por momentos
Esta viòa alegrar, colorir,
Cuiòo então nessas horas fugir.
Triste munòo, p'ra longe ôe ti !
Esquecendo òa viòa os pezares,
Vou transpondo a sorrir o espaço,
Não sentindo a fadiga, o cansaço.
Que me prostram, me matam aqui !
Alta noite no ceu vejo a lua
A mirar a cidade dormente,
Prateando a ligeira corrente
Indo ao longe embalar-se no mar !
E eu escuto ness'hora encantada,
Uns sons vagos de grata harmonia,
De saudades, d'amor, de poesia,
Que me v'em docemente inspirar !
Arsenia Bettencourt Miranda. Álbum Madeirense.
188 PoelUas Portuguesas
D. ALICE MODERNO
D. Alice Moõerno nasceu em Paris em 11 õe Agosto ôe
1867.
E' fillia ôe D. Celina Pereira òe Mello Maulaz Moòerno|
€ õe João Roòrigues Moòerno. i
Descenbe esta ilustre Escriptora e Poetisa ôo celebre j
liberal António Januário Moõerno, õa Ilha ôa Maòeira, aoj
qual se refere o Tomo V, pag. 244, 325 e 478 õos Docu-^^
mentos para a Historia das Cortes Geraes da nação poriu-.i
guesa. ''\
Tenòo vinôo para Portugal em 1875, D. Alice Moõerno ;
foi a primeira senhora que cursou o Liceu ôe Ponta Del-j;j
gaõa, onõe vive e funõou um jornal litei»rio, A Folha, no^
qual tem colaboraõo inõiviõualiõaões ilustres nas Letras l
Portuguesas,
Esta Senhora é auctora òos seguintes trabalhos Htera^J
rios : ^
Verso: Aspirações, Trillos, Os Martyres do Amor, AsylA^
de ãAlendicidade, No Adro (obras exgotaõas), e Versos á^íf
mocidade. '^
Prosa: Pessoas e coisas, O Dr. Lun^ Sandovaí, Açores i
(õescripção õo archipelago), Recreio das Salas (revista lite- -
raria), etc, etc.
Pertence ao Instituto Ôe Coimbra, e International Wo-^
men Union, õe Lonõres.
Muitos õos seus versos foram traõuziõos em alemão,
sueco, francez, inglez, hespanhol e italiano.
Em 1907, a Alma Feminina ôe que foi ôirectora D. Vir-
gínia Quaresma, abriu um concurso, em que eram premia-
õos os poetas portugueses, que melhor formassem um so-
neto com õuas quaôras que lhes eram õaôas.
Entre os 40 concorrentes, foram apenas premiaôos nesse
certamem, D. Alice Moõerno, D. Domitilla õe Carvalho e D.
Branca õe Gonta Colaço.
Poetisas Pof^tuguesas 189
Ha pouco, num outro concurso poético realisaòo pelo
Jornal da Mulher, coube a utn soneto ô'esta Poetisa o pri-
neiro premio.
MINIATURA
Só òuas cousas õiviso
Que sejam inõa mais bellas
Do que o brilho õas estrellas,
Do que a harmonia òo mar :
— E' o imam òo teu sorriso
E* a luz õo teu olhar !
Alice Mo!)erno. Aspirações. — Primeiros versos - Pont>j
Delgada, 1886, pag. 69 e 70.
LAGRIMAS
Eu quizera poõer guaròar n'um cofre
Talhabo em ôiamante ou rubi,
; As transparentes lagrimas õe aljofre
Que hei ôerramaôo, meu amor, por ti
•' Alice Moderno. Aspirações, pag. 213
CREANÇAS
N'utrta festa escolar
Eu quero muito ás creanças.
Essas alminhas òe luz,
Esses ramos òe esperanças
Esses irmãos òe ]esus.
190 Poetisas Portuguesas
Dentro em sua alma impoUuta
Esplenôe e brilha o canôor,
Como, ao funòo ôe uma gruta,
A's vezes, nasce uma flor.
Sempre que as vejo, suaves,
Irrequietas, buliçosas,
Mais travessas òo que as aves,
Mais fragrantes õo que as rosas,
Digo : Senhor I Não as tisne
Do vicio o labéu fatal !
Deixa-las ser como um cysne
No seu lago õe crystal !
Deixa-las ser sempre puras,
Deixa-las ser sempre bellas,
Como são, lá nas alturas,
As lucilantes estrelias!
Alice Moòerno. Versos da Mocidade, Ponta Delgaôa, 191 Ij
pag. 13-14.
VISCONDESSA DAS NOGUEIRAS
(d. mathilde izabel de sant'anna e vasconcellos
MONIZ de Bettencourt)
A Visconòessa òas Nogueiras (D. Mathilõe Izabel òe
SanfAnna e Vasconcellos Moniz õe Bettencourt), nasceu
na Ilha õa Maõeira a 14 òe Março õe 1806 e faleceu em
23 õe õezembro õe 1888.
Esta Senhora que pertencia a uma antiga e nobre famí-
lia maõeirense, era filha Õe D. Francisca Emilia Teixeira
òe Menezes e õe }osé Joaquim õe Vasconcellos.
Foi casaõa com o Visconõe õas Nogueiras Qacintho òe
Poetisas Portuguesas 191
infAnna e Vasconcellos), escrivão ôa Mesa Granôe õa
fanõega õo Funchal, e á qual se refere a pag. 8 Õo livro
Hestado genealógico õe João Carlos Feio.
Poetisa e Dama muito õistincta, òela trata o Dicciona-
0 ôe Innocencio òa Silva, e Bulhão Pato, a pag. 279 Ôo
Dlume 2.0 õas suas Memorias.
Mãe Ôo Visconòe òas Nogueiras, representante ôe Por-
gal nos Estaôos Uniòos õa America (auctor ôo volume
i versos, Amor e Pátria)^ D. Mathilôe õe Sanfanna e
asconcellos escreveu com as iniciaes M. S. A. V. os se-
lintes livros :
O cura de S. Lourenço, 1855, romance ; O Soldado de Al-
barrota, 1857, romance histórico ; Dia'ogo entre uma avó
sua neta, para uso. õas crianças õe cinco a Ôez anos,
)rovaõo peio conselho superior Ôe instrucção publica,
!62.
TraÔuziu : As Casíellãs de Rossilon ; e Genoveva ; verteu
jra francês, Eurico o Presbítero, õe Herculano.
Os versos ô'esta ilustre Poetisa nunca foram compilaôos
n volume.
Colaborou em muitos jornaes e no Álbum Madeirense.
UMA NOITE DE LUAR
(fragmento)
Já ôe estreitas recamaõo
A noite estenõeu o veo,
Fulguram astros brilhantes
No panorama õo ceu ;
E sobre a praia arenosa
Rola a vaga preguiçosa.
Nuvem não ha que escureça
O azul Ôo firmamento.
Roçam apenas nas folhas
192 Poetisas Portuguesas
As leves azas ôo vento ;
Canta em loureiro visinho
O rouxinol num raminho .
E o fugitivo planeta
Que o ceu Ôeixára apressaòo,
Quanòo alli viu girar
Do sol o carro òouraôo,
Agora, vagando errante,
Nos mostra a face radiante :
Tem já metaòe cruzaôo
Das celestes regiões,
Onõe formam as estrellas
Formosas constellações,
Que variam na figura
Por sua forma e altura :
O frouxo pallor que esparge
Sobre o lago prateado
Deixa na face õas ondas
Um novo ceu retratado,
Onde se mira vaidosa
Da noite a princeza airosa.
Viscondessa das Nogueiras. Álbum Madeirenst
ONDINA
Tal é o pseudónimo usado pela auctora do volume ò*
versos. Pombas Feridas, impresso em Paris, em 1906.
De Onditia que nasceu numa das ilhas do Archipelaff
Açoreano, diz o Brajil e Portugal :
<Ondina não é, pois, só ilustre e fidalga pelos seus sen
timentos e merecimentos ; é nobre e ilustre também pel
Poetisas Portuguesas 193
ua ascenôencia e pelo seu casamento. Pois apesar õ'isso,
andina é tão moôesta que, poõenõo usar brazões ilustres
! assignar os seus escriptos com um titulo nobilissimo, é
>e uma simpliciòaõe aõmiravel, e assigna verõaòeiras ma-
aviihas com um moõesto e simples pseuDonimo».
«Bem õotaõa pelo nascimento, pela intellectualiôaôe,
)elo talento, pela poesia, pelo coração, não o é menos
>elas graças».
«Vénus, se a visse, õespeõiria òecerto uma õas três
^ymphas que a acompanham sempre, e aòmitiria em seu
ogar a graciosa e gentil Ondina. Ou se não tivesse coração
jara õespeôir uma õas trez Graças, ella ficaria Decerto
íenòo a quarta e passaria a ser a Graça do sorriso». O seu
iorriso não tem rival. E' simplesmente ôelicioso, estontea-
i»or, macio — , como uma musica, um affago, uma aza • . »
l Ignoro se esta Poetisa chegou a publicar um livro em
|Ue trabalhava e cujo titulo era : Espumas.
POMBAS FERIDAS
Vão, ás vezes, as pombas pelo espaço,
pelo espaço azulino a palpitar. . .
aos bandos, aos cardumes, foragiôas,
as azas estenòiõas,
por sobre torreões, jarõins, o mar.
Vão em õemanòa òos paizes quentes,
fabricar outros ninhos mais além
Vão fuginòo aos nevões, ao inverno, á cheia.
buscar Roma ou }uõea,
jaròins ò'Asia, talvez Jerusalém.
Ruflanôo as azas, vão, com mil arrulhos,
beijos õanõo com os roséos biquinhos .
e as nuvens côr õe prata atravessando
n'um doce enlevo brando,
— ao ar, á luz, ao sol. pelos caminhos.
13
194 Poetisas Portuguesas
Mas, ás vezes, nos bosques sussurantes,
um caçaõor, nas sombras ôa espessura,
Òispára contra as pobres emigrantes •
Das azas palpitantes
gotas sanguíneas chovem lá õa altura !
Feriòas vão • . e comtuòo vão voanôo
as peregrinas, tristes, a arrulhar. . •
e as que passam nas peõras õas estraõas
plumas ensanguentaòas
vêem ás vezes recortando ar.
Leitor, — também nas folhas oeste livro ~
que eu compuz, como ao vento uma canção,
muitas plumas sangrentas vão cainòo.
Parecem cair, rinòo. . .
— mas tombaram choranòo o coração.
Onòina. Pombas Feridas, Paris, 1916, pag. 15 e 16.
D. MARIA 0'NEILL
(d. MARIA DA CONCEIÇÃO INFANTE DE LA CERDA
PEREIRA d'eÇA CUSTANCE o'NEILL)
D. Maria 0'NeiII (nome com que assigna os seus trab;
lhos literários), nasceu em. Lisboa.
E' filha ôe D. Maria Carlota Infante Òe Lacerõa Perei
õ'Eça e Ôe Carlos Torlaôes 0'Neill, ha pouco faleciôo.
Esta õistincta e ilustre Poetisa e Escriptora que õesceni
ôe famílias nobres, é sobrinha òo Visconõe õe Santa M
nica, auctor õo In Metnoriavi e õo Fabulario^ e neta
general José António Pereira Ò'Eça (sobrinho ôo Con
òas Antas), comandante õo Asilo òe Invaliõos Militares, €
Ruma, õe quem era amicíssima e pela memoria õo qi
tem a maior veneração.
lottisas Poríagueauè 195
Sào õo seu livro ôe contos —Vida Real, — as enterneci-
ôãs palavras que passo a transcrever :
íQuem lhe visse a estatura aprumada e marcial, a ruga
que, perpenõicular, lhe sulcava a testa, os olhos verões e
penetrantes como gumes toleòanos, tinha a consciência òe
€star õeante õe um forte, mas não poòia suppôr que sob
aquelle peito, arcaõo e amplo, òe velho caçaòor se abri-
gava um coração ò'imensa e quasi feminil sensibiliõaôe.
. Nas Cartas da Guerra (colecção õe sonetos inspirados
'por um sonho), òiz ainòa ôe seu avô, esta Senhora :
Foi Ião iageuuo, sliivo e puro ser,
Que, atravessando largamente a vidr.,
A terminou sem bem a conhecer.
Foi cheio de bondade e de tslento,
Comaigo austero, mas co'ob outros nâ .
Olhando sempre o azul do Firmamento
Passou na terra tem fitar o chão.
Se percorrermos as restantes obras òesta Escriptora,
i nelas sempre acharemos uma palavra ôe sauôaôe para o
í seu «melhor e mais ôeôicaôo ami20>.
Tenôo siôo apresenlaõo a D. Maria 0'Neill, uma ôas
nossas intelectuaes que maior numero ôe lavores literários
tem proôuziôo, puôe ôe perto apreciar a serie ôe variaôos
conhecimentos que possue, o que lhe permite aborôar os
géneros literários mais opostos, como facilmente verifiquei
ouvinòoa, e lenôo a sua vasta obra literária.
Não é unicamente como escriptora que ôeve ser enca-
rada a personaliôaôe ôesta conhecida e apreciaôa Poetisa.
Quem tenha tiôo o prazer ôe falar e ôe conviver com D .
Maria 0'NeiIl, notará logo que, á sua extrema simpliciôads
í despretenção, se alia um profundo amor pelo trabalho e
pelo próximo.
Humanitária e sempre disposta a sacrificar-se, é ôuma
||ranôe deôicação para com toôos que ôo seu auxilio ca-
ecem. *
196 Poetisas Portuguesas
Como jornalista, escreveu em vários jornaes muitos <
interessantes artigos sobre assumptos sociaes, literários í
artísticos.
Citarei apenas : No Intransigente, jornal funôaòo por Ma
chaòo Ôos Santos — uma entrevista com o Ministro õa:
Colónias; no 'Braijiii e 'Portugal, òe 1914, sob o titulo õ<
Os nossos Artistas, uma colecção òe curiosos escriptos
com os quaes tenciona formar um volume.
Aos òez anos òe iòaòe escreveu O Morgado do Juncal
Em 1908, apareceu o seu primeiro livro òe versos
Nimbos. obra que foi prefaciaòa pelos ilustres AcaÒemicoí
José òe Sousa Monteiro, seu mestre e granòe amigo, e Du
Ihão Pato que, a pag. Xi e XIV ôo prefacio, òiz :
«Maria 0'Neill, nas suas composições prima mantenòt
sempre a simpliciòaòe e correcção pouco vulgar». «A su;
linguagem nas locuções flexíveis e graciosas, é corrente
elegante e moòerna».
«Termino, sauòanòo a auctora òos Nimi-us pelo seu ele
vaòo talento e felecitanòo-a peia sua primorosa estreia».
Sousa Monteiro finõa oeste moòo a sua carta acerca òo
Nimbo s :
«Do muito, òo muitíssimo que tinha para n'este grat
assumpto òizer, òirei apenas isto» :
«Expliquei já o porquê òesta abstenção custosa. No
mestres, como nos pães a gloria òe seus filhos, se reflect
a gloria òos òiscipulos».
Directora òo Almanach das Senhoras e òo Almanach l
lustrado (òa Parceria Pereira), tem colaboraòo nos jornae
e revistas : Jornal da õMulher, Zig-Zag, Correio da Europt
Bem Publico, Sátira, Serões (outra bela revista cuja publ
cação é para lamentar ter finôaòo), Illustraçáo Português*
etc, etc.
D. Maria 0'Neill é auctora òos seguintes trabalhos, ei
verso : Nnnbos, Tudo Perdido (poema), Carias da Guern
Fora as Congregações., Aos Políticos, e São João nas rua
Poetisas Portuguesas 197
E em prosa :
llliisão desfeita, Psalmos de Amor, 1910 ; Cma satisfação
â Ea'.'^" Senhora D. Alaria Amália Vaif de Carvalho, 1911 ;
*Vvi drama de ciiimes, Lucta de Sentimentos, A Marquesa de
Vale Negro, 1914, (romances); Vida l^eal^ 1915; para a
Biblioteca da Infância, escreveu : Horas de Folga, Recrea-
res Infantis, Para ler nas férias, Por bom caminho, Para
divertir, Alegrias, Historias famosas, bem como 7 folhetos
para a colecção Um imitador de Sherlock Holmes.
Alem ò'estes trabalhos, tem traôuziõo vários livros, como
Lea, Dama das Camélias, etc.
Apesar õ'outras ocupações lhe tirarem tempo e socego,
D. Maria 0'Nei!l, que fez a sua estreia literária em 1907,
trabalha actualmente nas seguintes obras :
Claudia, Psycologia de uma americana^ Milagres de
Santo António, A TJibora, romances ; Mulheres e reticencias.
contos ; Folhas mortas, versos e Contos da Mamã.
í Tem também promptos vários ôramas e peças teatraes
i:ujos títulos são : Amor serôdio — comeòia òo tempo Òo
[Vlarquez õe Pombal ; Scenas da Revolução — òrama em 3
chs ; Sombra do Passado, iõem, iôem ; Scenas do Campo,
^...i, iòem ; Um primo do ISrasil, e Xeque Mate, comedias.
j Esta ultima é uma aòptação em verso. Do seu livro, Um
rama de ciúmes, õiz o Dr. Canõiõo õe Figueireôo na Chro-
ica literária, õo Diário de Noticias: «]á vimos muito tarõe
ara falar Oeste romance firmaôo por um òos nomes mais
ustres e mais simpáticos òa actual pleiaõe õe escriptoras
ortuguesas».
«A acção õe Um drama de ciúme, não poõe ser, como se
:, mais impressiva e impolgante.»
<Ha quaõros traçaõos com enexceõivel maestria.»
í . Acerca õo mesmo livro e õa Lucta de sentimentos, expri-
le-se oeste moõo Fernanões Costa, auctor õo Eterno Fe-
nino e õoutros belos livros, numa notável carta aberta
blicaõa no Dia õe 31-7-913:
198 PoptiRúfi Portiiaup.^ns
«Encontrei nas Õuas obras qualiõaòes ingenitas que mij
impressionaram vivamente. A leitura õe muitos ôos seus ca
pitulos não se poòe fazer sem commoviôo interesse, sem ur
forte prazer literário, sem se estar reconhecendo, ôe cont
nuo, a imperativa aptiòão artística e a innegualavel vocaçã
romântica òa escriptora engenhosa que os ôelineou e
creveu. Movem-se os seus personagens com õeliberaõa n;
turaliòaõe, com impressionante faciliôaõe õe gente viv
surprehenòiõa pela intelligente e sagacíssima observaõor
em animaõos instantâneos ôa existência real e veròaôeir
«A ôialogação é espirituosa, é saltitante, é fértil, éprofu
õa, é cómica ou õramatica, conforme as circunstancias a
clamam, na absoluta e completa proprieõaõe com os caso?
«Estes são preòicaõos salientes òos seus trabalhos
campo ôa literatura imaginosa, onõe V. Ex.^ marcanbo o s
logar com afirmações ôe talento e òe graciosa e energi
espontaneiòaòe, que ninguém imparcialmente, lhe póõe cc
testar. E muito mais alto subiriam as Demonstrações ôo s
gran^ôe merecimento artístico, se V. Ex.^ cultivasse as
peciaiiõaôes literárias, em que já é òistincta, n'um meio i
outra forma propicio ao òesenvolvimento progressivo ôel
A obra literária õe D. Maria 0'Neill tem siõo õevi^
mente apreciaõa, como tive ocasião õe verificar por u
bela e elogiosa coleção õe autógrafos que possue, firr
õos pelos nomes mais em eviõencia na Literatura Por
guesa.
O ineõito que publico, faz parte õos versos õe que|
compõe o seu livro a publicar — Folhas Mortas.
Por esta poesia poõerão facilmente os leitores iulgar|
beleza õas restantes proõuções õas Folhas Mortas.
Poetisas Portuguesas 199
FLIRT
(INEDIIO)
Quer que lhe ôiga o que é? Um jogo õe malôaôe
Que arrasta muita vez mais longe a vontaõe :
E', sabenõo-se isenta, avassallar alguém
E sugeita-lo após com risos e õesôem :
Nc.o ter em conta alguma o coração alheio,
Mas õar granõe valor a um Oito, um galanteio :
Trazer sempre após si uns ocos tagarellas
Que pasmam alta noite em frente ôas janellas.
Fechadas, já se vê, que a mulher troça- os rinôo,
E õiz depois que o rol õos parvos é, infindo !
Eu nunca o quiz fazer. E' vil dissipação.
Um sacrário respeita-se : — O que é o coração ?
laria O' Neill.
O QUE SÓ TERMINA COM A MORTE
Perdidas illusões que tanto amei,
Fulgente enxame ao seio acarinhado.
Vós me fallaes ainda do passado
E me fazeis sorrir do que chorei.
Curou-me o tempo o coração lanhado,
Mas deixou-me a lembrança do que errei
Porque não peque, no que já pequei
Crendo ser ouro o que só é dourado.
Se olho as antigas crenças com piedade
Um ecco do que fui me vibra n'alma
Ao folgar juncto a mim a mocidade.
200 Poetisas Portuguesas
Mas commove-me vê-la em tanta calma
Correr ôespreveniõa á realiõaôe
Que finõa tuòo menos a sauòaòe.
Maria ò'Eça 0'NeiU. Nimbos, Lisboa, 1908, pag. 200.
UM SONHO
Sonhei que me mataste e tive pena
Da ôôr que õe fazê-lo sentirias • .
Não te rias, meu anjo, não te rias
Nossa alma poõe, se Ôe affectos plena,
Olhar a morte impaviõa e serena
E succumbir a alheias agonias.
O mais pungente ò'essa triste scena
Era, acredita, ver que padecias.
Tenòo-me morto tu õepois choraste , .
Ouvi-te alli, sem me poõer mover
Sentindo em ôôr o coração estalar! . ■ .
Sonho maldito que o Senhor afiaste :
Ter-te junclo de mim, ver-te soffrer
E não ter voz para te consolar.
Maria d'Eça 0'Neill. Nimbos, pag. 4.
APÓS UMA JORNADA D'AMARGURA
Eu sei mui bem. Senhor, que não mereço
De que ao meu peito, nunca descançado,
Baixeis, Consolador Immaculado
A suavisar-me a dôr de que padeço.
Poetisas Portuguesas 201
Se ô'ira, muita vez, n'alma estremeço
Contra o õestino, que é por Vós manõaòo,
Basta pensar no meu Jesus amaôo
Para volver á paz òe que careço.
Se em Vós a minha mente ôoloriòa
Sempre tiver amparo e achar guarida
Nas batalhas õa viòa, hei òe vencer! —
E quanôo Òesça emfim á sepultura
Apóz uma jornaõa õe amargura
Como eu, Senhor, acharei bom morrer,
Maria ò'Eça 0'NeilL N^imbos, pag. 35.
D. ÁGUEDA LEONOR ALVARRÃO PACHECO
D. Agueòa Leonor Alvarrão Pacheco nasceu em Elvas.
Irmã òe D. Maria ]osé Alvarrão Pacheco Simões, e òe
D. Henriqueta Pacheco é filha òe D. ]ulia Victoria Alvarrão
Pacheco, e òo general Paulo Eòuaròo Pacheco, ambos já
faleciòos.
Esta ilustre Poetisa, que professa um veròaòeiro culto
pela literatura, é auctora òe belos versos em português e
em francês, òe alguns contos, comeòias e òiversos artigos,
trabalhos estes quasi toòos publicaòos nos jornaes òe Lis-
boa : Diário de Noticias, Diário Illustrado, Echos da Ave-
nida, etc.
D. Agueòa Pacheco tem também colaboraòo nos Aima-
nachs òas Senhoras e Luso Brasileiro e no jornal ^'l Folha
òe que é òirectora e proprietária a conheciòa escriptora D.
Mice Moòerno.
Nesse jornal, foi publicaòo um artigo seu intitulaòo JFe-
mnismo, que mereceu a honra òe ser Iranscripto em va-
los perioòicos Òcs Açores.
202 Poetisas Portuguesas
Entre as poesias mais apreciadas besta Senhora, posso,
mencionar : A Duquesa de Bragança, A morte de Cleópatra-
e os sonetos Trovejando e Porque ? ; Myrtes, T>u trouble
partout e a versão õo Triste monge, òe Gomes Leal, etc.
Nos versos em francês usa D. Agueõa Pacheco o pseu-
õonimo õe Eleonor de S. Y. : nos contos o õe Edelwiss.
PORQUE?!
Meu Deus ! porque não ôás á pobre criatura
Uma parcela só ôo teu poôer imenso ? !
Se a toõos cabe em õote o sofrimento intenso,
E a viõa inteira é ôor, tristezas e negrura ;
Se os bons momentos são. ■ momentoe, naba mais,
Se na terra não pousa a perfeita ventura ;
E se o cansasso vem após tanta amargura,
A ponto be par'cer que somos imortais ;
Porque não bás Senhor, na tua alta bonbabe,
A' pobre criatura a quem a bor invabe
Um meio simples, bom, para fugir bo munbo ?
Porque não beixas tu que a viba, ao menos, seja
Um livro que se lê emquanto se beseja,
E que se fecha, emfim, quanbo o sofrer é funbo ?
Agueba Pacheco.
TROVEJANDO
Estraleja o trovão no cinzeo espaço,
Resfriam-se bo ether as camabas,
'Scurecem bas montanhas as quebrabas,
E envolvem tobo o vale em negro abraço.
Poetisas Portuguesas 203
No rio — que se estenõe em longo braço —
De grossa chuva as gotas apressadas
Repetem, sobre as aguas assustadas,
Liquiõos õiscos õe perfeito traço.
Gemem os choupos e os pinheiros mansos
Ao peso enorme õa cauôal tormenta ;
Fogem as aves, tremem mesmo os gansos ;
Somente a luz ôo sol, toõa beleza,
Surginôo emfim por entre a cor cinzenta,
Ri õo pavor ôa térrea natureza.
Agueôa Pacheco. 1910.
D. HENRIQUETA GUILHERMINA
ALVARRÃO PACHECO
D. Henriqueta Guilhermina Alvarrão Pacheco nasceu em
?lvas.
Era a irmã mais nova õas poetisas D. Maria ]osé Alvar-
lo Pacheco Simões e D, Agueõa Pacheco.
Esta Senhora que foi casaòa com seu primo Manuel
Joaquim Desiôerio Pacheco, oficial Ôistincto e professor õo
Colégio Militar, faleceu em 1905.
Dotaõo òe uma intiligencia viva e clara, e ôe belas quali-
õaôes, possuia granôes aptidões artísticas.
D. Henriqueta Pacheco apreciava muito as Belas Artes
e, em especial, a musica.
Escreveu em prosa, uma comedia de sala, num acto, in-
ti'ulada Uma partida de damas, comedia que se represen-
u varias vezes, em soirées, sendo muito aplaudida.
Nas suas produções poéticas, simples e pequenas, ha
:uns versos de muito realce e colorido.
204 Poetisas Portuguesas
A TARDE
Declina o õia ! no horisonte linõo
Vermelhas nuvens perpassanõo vão,
E o sol fulgente a occultar-se quasi,
já òesmaiaõo nos alumbra então !
Vai pouco a pouco agonizando placiôa
Douraòa chama òesse facho intenso ;
E o veu òe trevas òe uma noute amena
Cae òesôobraõo, silencioso, imenso ! i
Como òa noute o tenebroso manto
'Scurece o praòo, o campanário, a cruz !
Assim 'scurecem, em minh'alma os brilhos
Quanbo os teus olhos não me òão a luz! . •
Trás me sauôaôes, esta aragem tépida,
Suspiros, cantos, òe um amor celeste ;
Bálsamo puro no meu peito aròente • .
Suave orvalho na campina agreste ! !
Henriqueta Pacheco. Almanach Illustrado, Literário e
Charaôistico para 1886,(2." anno), Extremoz, 1885, pag. 228.
D. MARIA ]OSE ALVARRÃO PACHECO
SIMÕES
D. Maria José Alvarrão Pacheco Simões nasceu em El-
v%s, senòo a filha primogénita õe D. ]ulia Victoria Alvar-
rão Pacheco, já faleciòa e õo general Paulo Eõuarõo Pa-
checo, antigo comandante geral da Arma de Artilharia
cargo de confiança e espinhoso.
Esta Senhora conta na sua familia grande numero de li-
teratos. Alem do seu marido, o coronel òe Infantaria sr.
Poetisas Portuguesas 205
Luiz Henrique Pacheco Simões, oficial muito ilustraòo e
■abalhaõor e consiõeraõo escripíor militar, e ôe seu filho
'lario César Pacheco Simões (mais conheciòo pelo nome
erário ôe Mário Pacheco), professor efectivo õo liceu Al-
.3 Martins, òe Vizeu, auctor õos livros Òe versos : Horas
Claras, Himnos á vida e ao amor, Livro de Trovas, Dálias
^ Canções do meu lar, e õe suas irmãs D. Agueôa e D.
enriqueta Pacheco, ainòa se teem ôeòicaõo ás letras,
seus cunhaõos, os apreciados escriptores Luiz Leitão e
sua esposa, D. Maria Pacheco Leitão, auctora òe Ivonne e
Pitais, Estimulas (serie ôe contos vertiôos ôo francez e
ôestinaôos ás creanç.as Ôas escolas primarias), e Um Evan-
geli^ador da Bondade e Beleza, folheto no qual reuniu Õi-
versos artigos publicaôos em ôiferentes jornaes, e pelos
quaes se poôe avaliar ôa missão altruísta e ôos iôeaes òe
Luiz Leitão.
Desòe muito nova que esta ilustre Poetisa verseja. Po-
rem, só mais taròe consentiu que fossem publicaôas algu-
mas òe suas poesias. Fe: em 188!, no Eborense, a sua es-
treia literária.
Tem colaboraôo nos jornaes, almanachs e revistas : Porta
Férrea, òe Coimbra ; Folha de óMafra ; O Meridional, òe
Montemor-o-Novo; Jornal das Senhoras, òe D. ]ulia San-
ôoval ; Folha, Jornal da Mulher, Diário de Noticias, Alma-
nach das Senhoras, Alma Feminina, Revista do Bem. ôirigi-
òa por Luiz Leitão, e no Tiro e Sport, onòe no numero 359
òo 13." ano, referente a 31 òe Julho òe 1907, teve esta Se-
nhora a satisfação ôe ver publicaòa na secção Sala das
Pérolas, a sua traòução ôo monologo òo fim òo primeiro
acto òo òrama — Hernâni, Òe Victor Hugo, trecho que vem
acompanhaôo òo retrato ôe D. Maria José Alvarrão Pa-
checo e òe palavras muito elogiosas, e que mereceu as
melhores referencias ôe abalisaôos poetas e escriptores, a
quem, previamente, havia siòo mostraòa pelo professor e
ilustre oficial òe Engenharia sr. Marrecas Ferreira.
Foi também na Sala das Pérolas que apareceu a traòu-
206 Poetisas Portuguesas
ção em alexandrinos, bo monologo ôe Carlos V, feita por
Pinheiro Chagas.
Alem òa bela tradução òo Hernâni, que os leitores ôesta
Antologia poderão apreciar, esta Poetisa tem feito outras,
como õe Freôeric Passy, SuUy Proô'home ; õe Theophile
Qautier, verteu um conto, O ninho de rouxinoes.
Em 1913, publicou D. Maria José Alvarão Pacheco, um
folheto em verso, sob o titulo òe Sombra e cMisterio ; esta
Senhora pensa fazer uma selecção òe seus versos, para os
reunir em volume, o que será mais um bom serviço que
presta á Literatura Portuguesa que, desse modo, ficará en-
riquecida com valiosas produções poéticas (até hoje disper-
sas), entre as quaes avultam alguns inéditos.
Do valor dos versos de D. Maria José Alvarrão Pacheco,
avaliará quem ler as Novas Alvoradas.
NOVAS ALVORADAS
Porque abates, mulher, a tua nobre fronte
Aos pés do teu senhor, ao peso que te esmaga,
Se o teu sentir é santo e a tua voz affaga
E se é tão lindo e vasto o teu vasto horisonte ?
Porque te algemam dize, qual servidor ingrato
Se tu és livre e és águia a revoar no espaço ?
Com que direito a lei. ousando erguer o braço,
Trucida o teu talento e o teu sonhar maltrata ?
Porque os olhos fechaste ás gerações passadas,
E és tu que tens na mão as gerações futuras,
Porque não tens também em teu poder seguras
A liberdade e a luz das novas alvoradas ?
Porque te envolve ainda o baixo servilismo
Que faz nascer o engano, a falsidade, a treva ?
Quando é que o sol rompendo, ao teu caminho leva
O clarão sem egual, que mate o vil egoismo ?
Poetisas Portuguesas 207
5e tuôo em teu sentir Õesperta uma cohorte
)e mil Òeôicações ! Como é que ninguém sabe
iue o teu valor immenso até nem mesmo cabe
"ío logar que lhe ôesse a gratiõão mais forte ? !
ião curves a cabeça !• . . Estuõa lê, meôita !
transforma o campo inculto em jarõim perfumaòo !
frabalha, aprenõe, ensina ! até que vás ao laõo
)esse ente que comtigo o mesmo chão habita,
:m vez òe inõifferente ou revoltaòa, apura
^ forma a novas leis que possam sustentar-te.
desponta já o sol que õeve illuminar-te,
íasga, mulher, os véus õa tua noute escura !
•ío munõo. o teu logar não é a vã chimera
lue se òesfaz qual fumo ! . . e é bello o teu caminho 1
Ensina-o bem a pomba, entrelaçanòo o ninho,
z com arôente afan, no seu covil, a fera.
3 teu logar, mulher, é junto a quem paòece !
l é junto á prole ingénua ! • . . E's tu tal como o porto
)nòe o cançaõo nauta encontra almo conforto
luanõo a tormenta vem e o ceu azul 'scurece,
or mais que ao longe paire o teu pensar inquieto,
or mais que ao longe vás em nova e crua liòa
ia òe puxar-te ao lar ignota mão queriòa !
io lar te ha-òe levar o veròaõeiro affecto •
ias não ao lar que existe ! . ao lar ainòa òistante
\as não ao falso ninho, onõe ha grilhões ainòa !
lO lar onòe a mulher por uma aurora linòa
>os novos iòeaes, encontre a luz brilhante !
Maria ]osé Alvarrão Pacheco. Echos da Avenida, n." 996,
e 5.Xn-1909, XXanno.
208 Poetisas Portuguesas
FRAGMENTO DO «HERNÂNI»
(de VICTOR HUOO)
(acto primeiro — scENA IV — Hemant, só)
Tu o òisseste, ó rei ! õo teu séquito sou !
Dia e noite te busco ; atraz Õe ti eu vou,
Caôa. passo que ôás, logo o meu passo o segue
Em mim, a minlia raça, a tua, em ti, persegue.
De olhos fixos no rei, punhal sempre na mão,
Vê tu que senòa aponta o meu fatal conòão !
E agora és meu rival ! . Apenas um instante.
Entre amar e oòiar eu fiquei vacillante,
Pois no meu peito aròente oh ! crê ! não ha logar
Para o meu oõio insano e o meu amor, a par !
Ia esquecenòo já, quanto te oõeio, amanòo ;
Porém tu vens lembrar o meu sentir nefanõo.
E's tu quem me òespería ! és tu que vens òizêr :
«Acorõa, sonhaõôr, seguir-me é teu õevêr.>
E o meu amor inclina a trémula balança,
E vem cair também õo laòo òa vingança ! . . .
Do teu séquito sou ! Tu o disseste, ó rei !
Caminha pois e vê, que aíraz õe ti irei.
Nunca os teus cortezãos servis ou palacianos.
Nem serviõores teus õo seu mister ufanos.
Irão junto õe ti, fieis ao seu senhor.
Como eu irei, ó rei, com tão seguiõo arõôr !
Os que te cercam, crê, cubicam só granõezas !
Frívolas honras, luxo ! o fausto e as riquezas.
E os granôes õe Castella os poõerios vãos.
Que póõem õar á larga, as tuas regias mãos.
Eu não ! Eu quero mais ! Não sou tão fraco e louco.
Que vá prenõer-me a ti e õesejar tão pouco !
Se a tua mão õestróe na minha viõa a paz
A minha ha õe vingar o teu arrojo auõaz !
I
Poetisas Portuguesas 209
Eu quero mais !. . . Se em óòio o peito me incenõeias,
Quero o sangue que tens a circular nas veias !
Quero a tua alma, a viôa e tuõo que um punhal
Revolve, arranca e extingue em coração venal !. . .
Caminha tu na frente ; atraz irei : não cança
O passo meu á voz õ'esta infernal vingança.
Irei onõe tu vás ! Imperturbável, só,
ft lucta intentarei num guerrear sem ôó :
Tu não ôarás sequer, um passo em pleno õia,
Sem que eu te espreite e mostre a fronte mais sombria
Nem volverás òe noute, o teu altivo olhar
Sem que o persiga o meu, em fogo, a rebrilhar 1
Maria ]osé Alvarrão Pacheco. Tiro e Sport, n.° 359 Ôe 31
òe Julho Õe 1907, ano XIII.
D. ALBERTINA PARAIZO
D. Albertina Paraizo nasceu na ciõaôe òo Porto.
A sua mociõaõe foi passaõa em contacto com talentosos
loetas e escriptores ; conviveu muito com António Nobre,
luctor òo Só e õas Despedidas, Eõuaròo Coimbra, õos
ispersos, e António Fogaça, ôos Versos da Mocidade.
Do mesmo moôo que os Poetas Brazileiros Alvares ôe
kzeveôo, faleceu contanôo 21 anos õe iòaõe; Junqueira
reire, 22 ; Casimiro ô'Abreu, 23; Castro Alves, 24 ; Aure-
ano Lessa, 31 e Fagunòes Varella, 34 ; — António Nobre,
òuaròo Coimbra, Cesário Verôe, António Fogaça e José
uro, auctor õo Fel e AlfreÔo Serrano, auctor ôa Manhã
^ourada — morrem em plena primavera Õa viõa !
Entre as varias publicações Ôe que esta mimosa Poetisa
m siõo õirectora, citarei : Jornal da Mulher, Almanach
xs Senhoras Portuenses, cujo primeiro ano foi publicaõo
14
\
:
210 Poetisas Portuguesas
em 1885, e o Almanach das Senhoras Portuguesas e Brasi-
leiras. No primeiro oestes Almanachs, escreveram, entre
outras pessoas :
D. Alice MoÔerno, D. Maria José òa Silva Canuto,
D. Alberto Dramão, António Fogaça, Hamilton õ'Araujo,
Eõuarõo Coimbra, António Nobre, Bulhão Pato, ConÒe õe
Sabugosa, Eugénio Õe Castro, Francisco Palha, Gomes
Leal, Guerra Junqueiro, ]. Leite òe Vasconcellos, Joaquim
õe Araújo, Júlio César Machaõo, Manoel Duarte õ'Almeiõa,
Visconõe õe Monsaraz, Oliveira Martins, Roõrigues õe
Freitas, Teixeira Bastos, etc, etc.
O Almanach das Senhoras Portuguesas contem artigos Õe
D. Maria Amália Vaz õe Carvalho, Alberto Pimentel, An-
thero õo Quental, Canõiõo õe Figueireõo, Brito Aranha
Eça Õe Queiroz, Fernanões Costa, J. AnõraÕe Corvo, Mar-
celino Mesquita, Pereira Calõas, Ramalho Ortigão, Santo?
Valente, Theophilo Braga, Visconõe õe Ouguella, VisconÒí
õe Sanches õe Frias, Coelho õe Carvalho, Christovam Aires
Xavier õa Cunha, etc.
D. Albertina Páraiso é auctora õe um belo livro òe ver
SOS — Rosas e Musgos, que abre com um autografo Ô
João õe Deus.
Esta Senhora tem colaboraõo Õesõe muito nova em inii
meros almanachs, revistas e jornaes ; nalguns sustentei
õurante anos, secções õiarias, lenõentes a eõucar e instru
sensatamente a mulher portuguesa, muito lhe õevenõo pc
isso, a causa õa eõucação feminina.
No jornal o Dia, esteve a seu cargo uma secção assíf
interessante — <Joias e Flores».
D. Albertina Paraizo vive actualmente muito em especil
para o resurgimento õas InÕustrias Portuguesas, senõo[
organisaõora õe uma exposição permanente, na qual
encontram representaõas as mais curiosas e típicas inõuj
trias regionaes, õo paiz como tive ocasião õ'apreciar qual
õo procurei esta ilustre Poetisa no seu escriptorio õa rj
õo Alecrim, que toõa Lisboa conhece. ú
Poetisas Portuguesas 211
A MINHA MÃE
Para algaem sou o lyrio entre 09 abrolhos.
GONÇALVES CRESPO.
A ti, ó Santa, côr õe jaspe e arminho.
Aza e conforto ôo meu pobre ninho,
Para quem tenho as perfeições ôos astros ;
A ti, qu^ nunca em tuas ôoces preces,
Minha primeira amiga, tu me esqueces
E a quem eu sempre hei õe aõorar õe rastros ;
A ti, que instillas o frescor Õas rosas
A's minhas longas febres tormentosas.
Na Santa Uncção õos beijos que me ôás,
A ti, que estás mais alta que as Rainhas,
N'um céu, toõo borõaõo Õe anõorinhas,
CoroaÕo õe cecéns e õe lilaz ;
A ti, em cujo rosto apenas leio
Poemas õe martyrios que o teu seio
Encerra Santamente, ha largo espaço ;
A ti, estes versitos Õe creança :
Rosas simples, que prenõo á tua trança,
Musgos verões, que ponho em teu regaço.
Albertina Paraizo. Musgos e Rosas, Lisboa, pag. 25 e 26,
MARES
Lá, no profunõo e tumultuoso mar,
O nácar gera a pérola luzente.
Que brilha, como o palliõo luar
No seio õ'uma noite transparente. . .
212 Poetisas Portuguesas
Assim também, no mar ôas minhas máguas,
A ôôr gerou o pranto abençoaõo,
Que ôesliza atravez as ouras fragoas
Como um celeste bálsamo sagraõo. . •
Albertina Paraizo. Musgos e Rosas, Lisboa, pag. 39.
MADONA
Não sei se eram mais bellas, mais formosas^
As MaÒonas õe Sanzio celebradas ;
Nem se os vultos ôas granões Amorosas,
Coroaôas õe Mirthos e õe rosas,
Tinham as tuas formas òelicaõas.
Sei que na minha esthetica mais pura
Tu tens a torturaôa linha iòeal,
Duma suave e biblica figura,
Illuminanòo as folhas õ'um missal ■
Albertina Paraizo. Musgos e Rosas, pag, 71.
NAUFRÁGIO
Como caõaver, frio e regelaôo.
Sobre as aguas errantes, no alto mar,
De fragua para fragua arremessado.
Sem nunca a paz Òo tumulo encontrar,.
Tal no meu peito um vulto inanimaõo
— O coração ! — extincto rouxinol,
Vae boianõo, boianõo amortalhaõo
Nas penas que lhe servem õe lençol .
Albertina Paraizo. Musgos e Rosas, pag. 129,
Poetisas Portuguesas 213
DOLOROSA
Dizer quizera ao coração — revive ! —
Para poôer amar;
E as õoces crenças, que eu outr'ora tive,
Tornal-as a encontrar !
Depois, aòormecer, trémulamente,
A' luz Õo teu olhar,
Ter a visão ôum munòo transparente
E nunca òespertarí
Albertina Paraizo. Musgos e Rosas, pag. 89.
D. MARIA CÂNDIDA DE BRAGANÇA
PARREIRA
D. Maria Canôiõa ôe Bragança Parreira nasceu em Lis-
boa.
E' filha ôe D. Henriqueta õe Bragança Parreira, e ôe An-
tónio Maria ôe Oliveira Parreira, antigo professor Ôe linguas
€ historia ôo liceu Camões, e auctor ôe vários trabalhos li-
terários apreciaôos, como os Luso Árabes.
Apesar Ôesta Senhora se ôeôicar mais a escrever peque-
nas peças teatraes, Ôo género revista e opereta, ôo que á
poesia, conta já ôuas eôições o seu livro Fersos, prefaciaôo
por Lopes ôe Menôonça.
Em 1916, õe colaboração com D. Magôalena Trigueiros
ôe Martel Patrício e João ôe Vasconcellos e Sá, escreveu o
Sarau dos Românticos, que com tanto êxito e brilhantismo
foi levaôo á scena numa recita ôe cariôaôe, realizaôa em
4-6 no Teatro Politeama, recita em que tomaram parte Se-
nhoras e Cavalheiros ôa mais ôistincta socieôaôe ôe Lisboa.
i
214
Poetisas Portuguesas
Dessa noite, guarôo, como por certo succeòe a toõa a se-
lectissima assistência, que por completo enchia o Politeamar^
a mais grata e viva lembrança.
E ainõa hoje (õecorriôos mais õe õois anos após essa
òata), não sei que mais aòmirar, se o fino gosto que pre-
siõiu á feitura ôas engraçaõas e òelicaõas peças que nesse
serão 5'arte e encanto espiritual me foi õaôo ver repre-
sentar, se o bom õesempenho que amaôores tão õistinctos
ôeram aos seus papeis, se, finalmente, o aspecto feérico que
apresentavam em conjuncto, os balcões, os camarotes, as
frisas e a sala.
E agora, fechando o parêntesis que abri, e ponõo ponto'
a amenas õivagações, ôirei que D. Maria Canõiõa Par-
reira — a inteligente aluna òo 3.° ano òo curso òa Facul-
òaõe òe Direito òa Universiõaòe òe Lisboa — é a única
senhora a quem o ano passaòo foi conferida uma õistinc-
ção nesse estabelecimento, para a matricula no qual se
habilitou em 21 meses, tempo que levou a fazer os 7 ano»||
que constituem o Curso õo Liceu.
LEMBRAS-TE?
A oliveira era velha !
Mas no seu tronco risonho
E' que eu te contei um Òia
Como nascera o meu sonho.
Eu. . . era a viòa futura . .
EUa. . a viòa que passou- . .
Porém o sonho òesfêz-se. . .
E a oliveira ficou.
Maria Canòiòa Parreira. Versos, Lisboa, pag. 55.
Poetisas Portuguesas 215
SUPLICA
«Não vás ! não quero eu ! ôizia-te zangaõa,
«Tu não póôes partir õeixanôo-me assim triste !
«E' òemais ! E' cruel ! Então em que consiste
«Esse tão granõe amor, se eu fico abanòonaõa ?
«Se partes, nunca mais terás no meu olhar
«O mesmo amor profunôo, a mesma ancieôaòe,
«Acabarei também eu por me habituar,
«Por não sentir Òe ti a mais leve sauôaôe !»
Dizia- te isto altiva e cheia òe despeito,
Nervosa, a Disfarçar a granõe commoção,
E palliòa, a tremer, levava a mão ao peito
Como a qu'rer comprimir lá õentro o coração !
Mas n'isto o teu olhar cruzou-se com o meu,
Li n'elle tanta ôôr que temi o castigo !
E n'um impulso òoiòo a rir e a chorar . . eu
Peôi-te ; — «Parte, amor ! mas leva-me contigo.>
Maria Canôiòa Parreira. Versos, pag. 61.
SAUDADE
Ao despedir ine de Lagos
Essa palavra studade
Aquelle que a inyentou,
A primeira veas que a dijse
Curo certeza que chorou.
I.. VIEIRA.
Desòe que contei partir
Tanta tristeza me invaòe
Que eu sei emfim traôuzir
Essa palavra saudade.
216 Poetisas Portuguesas
Sauòaôe ! — Prazer sombrio
Só quem a experimentou
Comprehenòe o que sentiu
Aguelle que a inventou . . .
Foi sensação Õe tristeza ?
Quem sabe ? talvez sorrisse
De magoa, òôr e surpreza
A primeira ve^ que a disse.
Mas se foi o coração
O único que fallou . .
Não sorriu, õe certo, não,
Com certeza que chorou . . .
Maria Canòiòa Parreira, Versos, pag. 101.
D. MARIA MAGDALENA VALDEZ TRIGUEI-
ROS DE MARTEL PATRÍCIO
D. Maria Magòalena Valõez Trigueiros òe Martel Patricio
nasceu em Lisboa.
E' filha Ôe D. Maria Henriqueta õe Mascarenhas GoÒinho
Valôez e õe João Campelo Trigueiros õe Martel.
Esta Senhora, que é casaõa com o õr. Francisco António
Patricio, publicou em 1915, Le Livre du Passe Mort^ obra
que contem formosos versos que foram inspiraõos no seu
granõe amor pelo PassáÕo e pelas coisas frívolas e femi-
ninas que encantam a sua sensibiliõaõe, e que o seu espi-
rito aõora.
Le Livre du Passe Mort foi acolhiõo pelos nossos inte-
lectuaes e por toõa a Imprensa Portugueza com mereciôas
palavras õe louvor.
Neste original livro faz a õistincta Poesia õe quem me
I
Poetisas Portuguesas 217
estou ocupanôo. a reconstrução òo Passáòo, numa lingua-
gem harmoniosa, apropriada e evocadora.
Para bem se avaliar õa inôole òe Le Livre du Passe Mort,
cujos capítulos são :
A la beaufé mouraníe des choses du passe! (que com-
prehenõe os sonetos, Vieilles soies, Vieux miroirs, Vieux bi-
joux, Vieux Evantails, Vieux cristaux et porcelaines, etc.) ;
Oraisons au Charme qui s'evolle des belles choses fragiles ; A
la couleur triste et f^aie des heures qui secoulent ! ; Rêves et
impressions fugitives! (que se compõe Õos sonetos Femse à
Vheure ou les belles choses sont plus belles /, Seville à Vheure
oii les jardins sont embautnés, et Lheure oii la paix tombe.,
divine, sur nos champs /, etc.) Evocations du vieux passe —
que comprehenòe Dans les temps heroiques de la Grece
dorée — (Impressions õe la Danse ôes Faunes et ões Ba-
chantes ôe Tremisor), La Belle Epoque Romaine sous VEm-
pire d'Hardrien (impressions õe la vallé õe Tibur), Dans
les temps mysterieux du Moyeu Age \ Dans les splendeurs
de la Renaissance Italienne ! (souvenirs õe la cite Ões mar-
bres et ôes lys, etc. — reproduzo o que a este respeito õiz
sua auctora, que modestamente o firma com o nome de
Maria Magdalena :
«A toutes les íemmes, dont les ames três femenines, peu-
vent seules comprendre le charme et la beauté des choses
frivoles et fragiles, que nous adorons, je dedie ces vers faits
pour elles, comme des pauvres oraisous que j'adresse à tout
ce qui est beau et doit mourir. • >
D. Maria Magdalena trabalha num interessante livro em
que o seu temperamento creador, original e verdadeira-
mente artístico, por certo se revelará mais uma vez. Rendas^
se intitula essa obra, certamente um novo triunfo para a sua
auctora.
I Ao falar nesta distincta Poetisa, é justo lembrar ainda o
jpapel que bem recentemente tomou, ajudada por distinctas
ie dedicadas amigas, na encantadora festa do Mercado Re-
<írional., realizada a favor dos Soldados Portugueses.
218 Poetisas Portuguesas
Esta Ôeliciosa, interessante e pictoresca òiversão, em que
figuraram ilustres Senhoras e gentis Meninas e Rapazes õa
nossa primeira socieòaôe, vestinõo os caracteristicos trajos
ôe õiferentes regiões òo Paiz e õa Iliia õa MaÒeira, pertence
ao numero õas festas cuja grata impressão perõura e que
òo mesmo moõo que o Mercado Regional, realizaõo no
Porto, a instituição ôas Madrinhas de Guerra (iòeia que
partiu Òe D. Sophia Burnay ôe Mello Breyner), e a Festa
da Flor levaòa a efeito, com granõe sucesso e brilhantismo,
em Lisboa, Porto, Coimbra e outras ciõaôes e terras ôe
Portugal — serão lembraòas com sauôaòe, não só por to-
dos aqueles que a elas assistiram, como também com gra-
tiôão pelas inúmeras famílias a quem tão simpáticas e bem-
íazejas iniciativas proporcionam inúmeros benefícios. 3
No Mercado Regional, realisaôo em Lisboa nas salas ôa
SocieÕaõe Nacional õe Belas Artes, tomaram parte, alem
ôe D. Maria Magôalena Trigueiros e D. Zulmira Franco Teí
xeira (auctora ôe belas e alusivas quaôras que acompanha
vam as flores que se venôiam) :
D. Maria L. ôe Brito Rocha e Mello, D. Helena ôe Brite
Rocha e Mello, D. Anna ôa Cunha e Menezes Pinto Carôosc
(Lumiares), D. Maria Luiza Barroso ôa Camará, D. Fran-
cisca Seabra ôe Lacerôa, D. Maria ôe Brito ôa Rocha <
Mello, D. Emilía Cabral ôa Silva, D. Maria ôe Roure, D. So
fia Peôreira, D. Maria Carlota ôe Paiva Raposo, D. Alber
tina ôa Camará Roôrigues, D. Constança ôe Berquó (Loulé)
D. Maria Viana ôe Lemos ôa Costa ôe Albuquerque Sale
ma, D. Maria ôa Conceição Viana Machaôo Castello Branc<
(Caria), D. Ema Ferreira ô'Almeiôa, D. Helena ôe Queric
Macieira, maôemoiseles Levy, Tavares Pinto ô'Avellai
WaÔôington, Zaguri, Amzalak, D. Maria ôe Sola Telles ô
Castro Lopes, D. Izabel ôe Aguiar ôe Castro e Sola (Fran
cos), D. Maria Clara Telles ôa Silva Ôe Castro e Sola, E
Maria ôo Carmo ôe Menôonça Pessanha (Rezenôe), D. Ma
ria Luiza Ôe Vasconcellos e Sousa Alves, D. Helena ôa Ca
mara Viterbo (Ribeira), D. Alice Bettencourt, D. Angelin
Poetisas Portuguesas 219
Plantier, D. Olga Buzaglo, D. Maria Lima Pefers, D. Octa-
via Sassetti, D. Maria òa Maòre õe Deus Sampaio Mello e
Castro e D. Palmira Navarro Viana Bastos.
L'HEUSE ROUGE
DéSsechée au grano loin se Ôeroulait la plaine
Telle une vaste mer aux enormes vaisseaux
Et c'etait les hameaux, eblouissants õe chaux,
Voiliers proõigieux õe cette mer lointaine.
Le soleil flamboyait õans sa granõeur paienne,
Acablés Õe chaleur peisaient les animaux,
Et le soleil brulait et bergers et troupeaux,
La terre s'embrasait Õe rougeur incertaine . . .
La terre s'enõormait pesante õe someil,
Défaillant aux baisers farouches õu soleil,
La cigale chantait õans Tepaisseur Õu foin.
L'heure rouge flambait en chansons õe lumière,
E cette heure semblait être Theure õernière,
Que les cloches sonnaient õans les clochers au loin !
Maria Magõalena. Le Livre du Passe Mort.
ORAISON AUX DENTELLES
}áÕore la souplesse fine ões õentelles . .
En les touchant parfois Ões Õoigts impatients
Le õoux frémissement ões tissus anciens
Me fait trouver une âme aux choses irreélles !
Jáõore la souplesse fine ões õentelles . .
Des femmes Õ'autreíois aux profils patriciens,
Ont broõé patiement, õe leurs õoigts magiciens,
Ces rêves transparents, aux grâces éternelles !
220 Poetisas Portuguesas
Vous õurerez toujous òentelles òu passe,
Car sur vos vieux Õessins, un parfum, éffacé,
Vous òonne Ia fraicheur comme une eau qui jallit.
Et Ia calme Beauté qui se meurt õans votre âme,
Nous reparait en grâce, et charme, sur la femme,
Dentelles õe Venise, Irlanôe ou Chantilly !
Maria MagÔalena, Le Livre du Passe Mort.
D. MARIA DO CARMO PEIXOTO
D. Maria òo Carmo Peixoto é filha òe D. Maria Aòelaiôe
N. òe Abreu Peixoto e òe ]osé õa Cunha Abreu Peixoto.^
Os versos òesta Senhora nunca foram reuniõos em vo-
lume, o que é para lastimar, pois formariam um apreciável
cônjucto, em que predominaria a beleza, originaliòaòe e
graça.
As poesias õesta Senhora teem siõo publicaòas em va
rios jornaes, como a Nação, Jornal do Comercio, etc.
DEIXÁE QUE EU SONHE...
Se a Crença que me anima e acalenta
Se o Amor e o Bem, tuòo que é bello
E' mentira na Viõa. . .
Se é tuõo um sonho, o que me faz viver . .
Oh ! õeixae-me sonhar a viõa inteira
Quero viver illuòiôa !
Quero viver no Sonho e na Chimera
Se me chamarem louca, o que me importa ? !
Se sou feliz assim ? !
Eu quero acreditar que o Amor existe . . '
Que a virtuòe, não é uma mentira . .
Que a viõa não tem fim !
Poetisas Portuguesas 221
Acreôito nas almas côr õ'arminho
E que mesmo nas almas õesôltosas
Negras como o Horror.. .
Ha um cantinho branco, aonôe occultos,
Fallanôo mui baixinlio - • existe o Bem
A Crença e o Amor ! • .
Não me rasgueis o veu õa illusão
E õeixae-me sonhar. . . Se é mentira
Se a viõa não é isto. • .
Não me acoròeis- . Cuiõaõo ! a viõa é breve !
Ah ! õeixae-me sonhar . . Que eu só Desperte
Um õia aos pés õe Christo !
Maria òo Carmo Peixoto.
A UNS OLHOS .
Teus linõos olhos raõiosos
Não sei que fatal conòão
Possuem, que o coração
Nunca mais senti bater
Depois õe os ver !
Ha uns olhos que ôão viôa
Ha outros que morte õão
Teem esse fatal conòão
Os teus olhos, meu amor
Mas Senhor !
Como é bom assim morrer
Depois òe os ver !
Maria òo Carmo Peixoto.
222 Poetisas Portuguesas
D. EUGENIA REGO PEREIRA
D. Eugenia Rego Pereira nasceu na Ilha òa Maòeira.
Tem colaboraôo em õiversos jornaes òessa Ilha e no
meaòamente no Diário da õMadeira, òe que é õistincto õl
rector José Cruz Baptista Santos, auctor òas Rosas e Jas
mins.
Ao ilustre poeta, bem como ao meu amigo ]orge õa Silva
Freitas, aqui òeixo expresso o meu sincero agrabecimento
por algumas indicações que me forneceram acerca õas
Poetisas Maòeirenses.
AO CAIR DA TARDE
Vae aos poucos o sol esmorecenõo
Entre as nuvens Òoiraòas, setinosas ;
E as aves o espaço percorrendo
Vão no ar como pétalas õe rosas.
Choram as fontes, e as flor's tremenôo
Na haste se baloiçam õeleitosas,
Longe, o pastor o gaõo recolhenòo
Entoa triste umas canções sauòosas.
Uma vaga tristeza nos invaõe.
Em noss'alma se espalha uma sauòaòe,
Echo õistante ôe passaòo hymno.
E o sol em fogo, treme agonisante,
Depois. . a noite apaga-o n'um instante,
Como lagrima ao riso cristalino.
Eugenia Rego Pereira. Funchal.
Poetisas Portuguesas 223
ECHOS QUE PASSAM
Noite Ôe estio arõente. — Pelas alõeia,
Nas eiras cantam linõas raparigas
Loiras, õa côr bo oiro Òas espigas,
O amor que as almas moças incenõeia.
A lua, hóstia Òe luz, no ceu vagueia,
Ao som plangente e terno Õas cantigas,
Sentinôo reviver canções antigas
O pensamento vôa, devaneia.
E õeixa-nos sonhar. — E a sonhar vamos
Passaõo fora, á infância que lembramos.
Mas, sonhos òe luar, tuõo acabou !
Ao longe, o echo morre docemente,
E òá-nos a illusão que é o som dolente
Dos cantos que o passaõo nos levou,
Eugenia Rego Pereira. Madeira.
D. LUIZA MARIA PEREIRA
D. Luiza Maria Pereira é natural da Ilha da Madeira.
Os seus versos vêem publicados na obra «Flores da Ma-
eiran «poesias de diversos auctores Madeirenses colligi-
as pelo Dr. José Leite Monteiro e Alfredo César d'01i-
'eira>.
A 2.^ serie das^ Flores da Madeira entre outros nomes
e poetas, menciona os de :
Januário Justiniano de Nobega, João Fortunato d'01iveira^
oão da Nobega Soares, João C. Coutinho Gorjão, José
mtonio Monteiro Teixeira, José Mareia da Silveira, etc.
224 Poetisas Portuguesas
TRIBUTO DE SAUDADE
Ergue-te, pomba, õo gelaõo leito ;
Vem escutar a minha voz sauôosa ;
Vem ver-me o pranto que hoje aqui, chorosa,
Por ti rebenta õe meu triste peito.
Dos puros lábios o ingénuo riso
Venho buscar, para apagar-me a õor
Que me õeixára Òa mubez o horror
Em troca òo terreno paraiso.
Em quantos peitos a viuvez deixaste !
Em quantos olhos borbulhando o pranto
Que em vão reclama ò'essa voz o encanto,
Que ôéste a Deus e n'alma nos gravaste !
Eras ôo ceu, angélica assucena !
Teus òias a virtuôe numerou ;
Dos anjos a symQathica ternura
Na bella fronte o berço te gravou.
Ai berço, berço õe flores
Que a materna mão creou ;
Ai berço aonõe a virtuôe
Seu perfume ensinuou !
Bebeu teu seio esse aroma
Que no sepulchro fechaste,
E ás almas que acarinhaste
Esse néctar ainda assoma !
Eras õo ceu, sympathica assucena !
Envia ao seio õo amaõo esposo
Esse perfume õ'alma que, choroso,
Ella procura para a viva pena.
Poetisas Portuguesas 225
Solta-lhe n'alma, que a sauôaõe rala,
O hálito que a viõa lhe afagava !
Essa òoçura que o alimentava
Mate-lhe o fel que nos seus ôias cala.
Luiza Maria Pereira. Flores da Madeira, 1871.
D. MARIA DA COSTA PEREIRA
D. Maria õa Costa Pereira beni como outras Senhoras a
quem faço referencia nesta Antologia, nasceu na riõente e
bela Ilha ôa Maôeira,
Nas <^ Flores da Madeira», obra que já varias vezes citei,
ha colaboração ôesta Poetisa.
O 1." volume— 1." serie — òa mencionaõa publicação
[jpareceu em 1871 e a 2.' serie em 1872.
Entre os Poetas mencionados nesse trabalho, leem-se os
liomes &e :
António Policarpo ôe Passos Sousa, Alfreòo César ò'01i-
eira, Alipio Augusto Ferreira, Diogo Derenger }unior,
|',òuaròo E. ôe Carvalho, Francisco Vieira, etc.
A MINHA IRMÃ
I
Da natureza fecunõa
Na primavera gentil,
Quanòo òo seio õo Eterno
Chovem thesouros, a mil,
E o grémio òa terra exhala
Perfumes gratos nas flores,
Tuõo é esperança e ventura
E tuòo respira amores,
15
226 Poetisas Portuguesas
Da tua existência o òia
Primeiro a luz conheceu ;
As impressões ò'esta quaõra
Tu'alma toÊas bebeu.
11
Hymnos !• . . hymnos teus annos me peòem !
No meu seio a amizaõe os contêm ;
Mas a lyra, instrumento òe máguas,
Para o goso já forças não tem,
Hymnos!.. 4 hymnos talvez maguassem
De teu peito a feriõa ternura ;
Do pesar ouve os sons que conheces,
Co'a amargura se justa a amargura.
Para erguer os punhaes òe teu seio,
O meu seio não ôeixam curvar
Os que o meu cruelmente laceram ;
Só me resta comligo chorar !
Tuas òores são minhas e tuas ;
Meus pezares, sombrios, são teus ;
Do martyrio a c'rôa e a palma
Para nós guaròa o seio õe Deus.
Maria õa Costa Pereira. Piores da Madeira, 1862.
D. BEATRIZ PINHEIRO
D. Beatriz Pinheiro nasceu em Vizeu.
Foi no liceu ôessa ciõaôe, onõe fez com muito brilhe
curso complementar òe sciencias e letras, no qual obt
ôistinções em quasi toõas as õisciplinas.
Os primeiros trabalhos literários õesta ilustre Poe
Poetisas Portuguesas 227
ram publicados quanòo frequentava os últimos anos
liceu ; apareceram na revista acaôemica A Mocidade,
lõaôa nessa ciõaòe por seu conôiscipulo Carlos ôe Le-
is, poeta e professor com quem anos ôepois se uniu por
;os matrimoniaes.
Nessa ciôaôe, crecu D. Beatriz Pinheiro, ajuõaôa por
u esposo, a revista ôe arte e critica, Ave A^ul que ourou
is anos. Na secção Sala de Visitas ôesta interessante
/ista, figuram versos õe : Fausto Gueões Teixeira, Euge-
) Òe Castro, Manoel ôa Silva Gaio, Carlos õe Mesquita,
irrea ôe Oliveira, Affonso Lopes Vieira, Camillo Pessanha,
Thomaz õe Noronha, etc.
Foi, principalmente, a partir õe 1900, que esta Senhora
lis activamente se preocupou com o problema õa eman-
>ação õa mulher pela instrução e pelo trabalho, como
k/elou em muitos artigos e crónicas que em Portugal e
) estrangeiro õespertaram bastante interesse, tenòo al-
ns õeles õaôo origem a larga polemica como a que sus-
itou o faleciõo paõre e escriptor Senna Freitas, na Tri-
na.
Os artigos a que aluõo, foram publicaõos na Ave A^ul,
òe D. Beatriz Pinheiro colaborou, escrevenõo muitos
ntos, que tiveram a honra ôe ser, quasi toõos, traõuzi-
s e ôivulgaôos, em revistas õe Itália, por A. Mari.
m verso, alem õa Oração, e õos sonetos Psiché, Cri-
ida e as folhas de um Álbum (uma õas suas primeiras
nposições poéticas), escreveu os poemas Q4nheUa e Os
j cavaleiros que Thomaz Camizzaro e Phileas Lebesgue
teram, respectivamente, para verso italiano e para prosa
laòa franceza.
)s trabalhos literários õesta Poetisa foram carinhosa-
tite apreciaôos na Imprensa Portuguesa por Roôrigo
oso, TrinõaÕe Coelho, Teixeira Bastos, Luiz Trigueiros,
H)lfo Portela, José Agostinho, }ulio õe Lem.os, José õe
|;eõo. Augusto õe Castro e por outros escriptores cujos
hes me não lembro neste momento.
228 Poetisas Portuguesas
A eles se referiram também as revistas estrangeiras, (
labria, Iride de Reggio, Esperta, õe Caserta, VHumai
Nouvelle, Verbeine, Mercure de France, etc.
Igualmente tiveram palavras òe encómio para esta 5
nhora :
A. Paôulla, Prospero Peragallo, L. Zuccaro. V. Çmile
chelet, Thomaz Camizzarro e Any René ò'Yvemont, que
Mercure de France escreveu :
— «Beatriz Pinheiro ['Aòa Negri ôu Portugal. . . »
J'ai retenue au hasarô une õelicieuse Oraison (Orai
emquanto meu filho õorme) õigne õe João ôe Deus, la t
laõe òes Trois Cavaliers (Os três cavaleiros) qu'on ôi
õe folklore, Psiché, Anhelia, õ'un souple si õelicieusem
subjectif et pantheistique>.
Como prosaõora, õe D. Beatriz Pinheiro, õisse Any R'
õ'Yvemont, na Verbeine : J'ai lu et relu bien ões fois /J
almas, (Deux ames) Nouvelle õe Beatriz Pinheiro, oúj
sentiments sont sufisement ciselés. Duas almas est um
tit chef õ'oeuvre õigne õe nos meilleurs ecrivains>.
Por ocasião õo caso Calmon, coaõjuvaõa por um gr
õe senhoras que a escolheram para presiôente õa Ui
de Senhoras Liberaes de Viijfeu, funõou D. Beatriz Pinhe
como protesto contra a eõucação congreganista, a Es<
Liberal João õe Deus, para raparigas pobres.
D. Beatriz Pinheiro foi, õurante três anos, professor?
Liceu Maria Pia. Actualmente, é professora õe Litera
Portuguesa no Curso especial õe Eõucação Femininé
sócia õe mérito õa Associação õas Escolas Moveis Joã
Deus, por proposta õe Magalhães Lima ; é sócia corresi
õente õo Instituto õe Coimbra, por proposta õo Dr. I
narõino MachaÕo.
Poetisas Portuguesas 229
CRISÁLIDA
Des ailes ! des ailes ! des ailea !
TH. GAUTIER.
Nas horas õe silencio, olhos fechaòos
Ao beijo hypnotico õo luar bemõito,
Que azas leves são essas que eu agito
Por longínquos caminhos ignoraòos ?
Que azas fluiòas são essas que, se fito
Do alto õelas os munôos afastados,
Meus olhos logo sinto õeslurabraôos
Na luz õessas pupillas õo Infinito ? !
Azas leves, mais leves òo que a aragem. . .
E fluiòas, vaporosas como a imagem
Dum clarão sobre as aguas fugiòias. . .
Azas que me arrebatam, céus em fora,
Para onôe o sonho vive e onôe a Luz mora,
Ao êxtase õas òivinas alegrias !
eatriz Pinheiro.
HINO AO SOL
(do poema Anhelia)
Oh Sol que com teus raios, mal assomas.
Azulas toõo o ceu e a terra aloiras :
Que o chão mal tocas com as fulvas comas
E a poeira ôo chão p'ra logo òoiras :
Oh Sol, que és tuõo quanto ha na Terra :
Que és flor e és fruto, que és perfume e és còr :
Sol, cujo seio a viõa toõa encerras,
3ue a viòa não é mais òo que calor :
230 Poetisas Portuguesas
Oh Sol que estes meus olhos enxugavas,
Quanòo elles, razos ò'agua, mal te viam . .
A ver se com teu hálito secavas
A fonte ôonõe as lagrimas nasciam :
Oh Sol que no meu lábio agora cantas,
Meu sangue aqueces, nos meus nervos vibras
Sol que p'ra o Ceu õa Terra me levantas
E que entre o Ceu e a Terra me equilibras :
Claro Sol ! Vivo Sol ! Oh Sol Õivino !
Pela luz cujo rasto agora sigo,
Em que anôava perõiõa sem Destino,
Oh ! Sol ! eu te bemòigo !
Beatriz Pinheiro.
A' MEMORIA DO POETA DAS PENINSULARES
DR. SIMÕES DIAS
Poeta Ôo Amor, que o puro Amor cantaste
E tão ceòo fugiste ao nosso amor,
D'o!hos fitos no vivo resplenòor
Do sonho que na terra não achaste :
Se /i, onõe o teu sonho realisaste,
Tu que foste na terra um sonhaòor.
Algum ecco perôiôo, algum rumor
Ainòa chega õo munõo que Deixaste :
Que o perfume òas rosas òesfolhaòas,
Que a essência òas lagrimas choraõas
Na cova, onõe o teu corpo repousou,
Num claro raio ôe luz p'ra ti voanòo
Te façam o ether brando inõa mais branõo
Lá, onõe o teu espirito voou.
Beatriz Pinheiro. Ave A^ul, Revista õe Arte e CriticaJ
rie I, fascículo n." 4, Vizeu, 15-4-1899, pag. 146. »
Poetisas Portuguesas 231
D. ANNA AUGUSTA PLÁCIDO
(viscondessa de CORRÊA BOTELHO)
D. Anna Augusta Placiõo nasceu na ciõaôe ôo Porto, em
setembro Òe 1833.
Faleceu contanôo 62 anos Òe iõaõe, em São Miguel ôe
Seiôe, aos 19 õe setembro ôe 1895.
Era filha ôo comerciante portuense José Placiòo Braga
— uma Ôas victimas ôo celebre naufrágio ôo vapor T^orto,
suceôiôo na tarôe ôe 29-3-1852— e ôe D. Anna Augusta
Vieira, natural também ôo Porto.
Dos ôoze filhos oeste consorcio, em 1862, apenas resta-
vam quatro, no numero Ôos quaes se contava D. Anna
Placiôo, que a este facto aluôe no aômiravel prologo ôo seu
livro Luiji coada por ferros, que foi escripto como é sabiôo,
na caôeia ôa Relação ôo Porto.
D. Anna Placiôo consorciou-se, em primeiras núpcias,
com o rico comerciante portuense Manoel Pinheiro Alves,
Ôe quem enviuvou em 15 ôe ]ulho ôe 1863, tenôo haviôo
ôesse matrimonio um filho Manoel Placiôo que faleceu na
Povoa ôe Varzim em 17 ôe setembro ôe 1877, contanõo
apenas 19 anos ôe iôaôe ; a sua morte foi muita sentiôa
por Camillo, que nas Scenas da Hora final escreveu a pro-
pósito oeste acontecimento algumas ôas suas mais belas
paginas ôe prosa.
No ôia 9 ôe março Ôe 1888, Camillo casou no Porto, na
sua casa ôa rua ôe Santa Catharina n.° 458, com D. Anna
Placiôo, ôe quem teve os seguintes filhos : ]orge Camillo
Castello Branco —o primogénito que mais tarôe enôoiôe-
ceu e a quem por ôecreto ôe 23-5-1889 foi conceôiôa uma
pensão vitalícia anual Ôe um conto õe reis ; e Nuno Cas-
tello Branco, agraciaôo com o titulo ôe Visconôe ôe São
Miguel ôe Seiôe, faleciôo em 23-1-1896.
D. Anna Placiôo, Senhora muito culta, versaôa em lite-
ratura esoíreòora, escreveu: Linj coada por ferros ; no jor-
232 Poetisas Portuguesas
nal O Leme, òe seu filho Nuno, publicaòo em Seiòe, co-
meçou, sob o pseuòonimo Ôe Lopo de Sousa, um romance
— Núcleo de Agonias, trabalho este, em que ha, como na
Z,uf coada por ferros, veròaôeiros traços revelaòores õe
òôre passagens que são claras notas autobiográficas.
Traduziu : A Marcelle, òe AmaÔée Acharõ, com o titulo,
Como as mulheres se perdem^ Porto, 1874,
No mesmo ano, e òo citaòo auctor, A vergonha que mata ;
em 1875, Aprender na desgraça alheia, trabalhos em que
usou o pseuòonimo já citaõo ; A vida futura, òe Lescoeur,
1877 (versão revista e prefaciaòa por Camillo), e O Papa e
a liberdade, òe R. Constant, etc,
D, Anna Placiòo também usou na Gaveta litteraria òo
Porto, òo pseuòonimo òe Gastão Vidal de Negreiros.
Colaborou em inúmeros jornaes.
Foi por causa òe D. Anna Placiòo que Camillo òeu en-
traòa na caòeia òo Porto em 1-10-1860, òonòe sahiuabsol-
viòo em Outubro òe 1861,
No cárcere, escreveu o mais fecunòo romancista portu-
guês alguns òos seus melhores livros, senão os mais per-
feitos e belos :
Amor de perdição, Romance de um homem rico, Annos de
prosa, alguns òos Do^e casamentos felizes, etc.
Para bem avaliar òa enorme influencia que D. Anna Pla-
ciòo exerceu sobre Camillo, que pela primeira vez que a
viu — já noiva — num baile òa Assemblêa Portuense lhe cha-
mou a sua mulher fatal, é muito útil e interessante a lei-
tura òas seguintes obras òe Camillo : Memorias do cárcere,
Annos de prosa. No bom Jesus do Monte, Eusébio Macário,
Os brilhantes do brasileiro, Scenas itxnocentes da comedia
humana e Ao anoitecer da vida, livros em que D, Anna Pla-
ciòo é trataòa, por Rachel, Adriana, Henriqueta, Ludovina,
Leonor, etc.
A lista citaòa ficaria incompheta, se não mencionasse oS
trabalhos òo eruòito investigaòor sr, Alberto Pimentel, cu-
jos titulos são : éMemorias do tempo de Camillo, Romance
Poetisas Portuguesas 233
do Romancista, e sobretudo o seu conscencioso estuòo Os .
Amores de Camillo. Quem ler as obras citaòas ficará com
uma iòeia completa e nitiòa Õos vjranòes Òramas amorosos
ccorriôos na viõa òo maior romancista português.
A' poesia Maldita, que reproòuzo nesta Antologia, res-
ponõeu Camillo com uma outra intitulaôa, Maldita porque ?
que começa e termina oeste moõo :
Maldita I Que importa que o mundo te brade,
Qae a infâmia na fronte te escreva : «maldita !•
O Chriíito, no Itntjo da dor infinita,
Também foi meldito da raça precita,
E Ohristo era um Oeus.
Bemdita, bemdita, 6 martyr tu lejas,
Que um dia sonhaste ventura no amor !
Cabisttt da altura dos teua devaneios
Cahiste e clioraste ; e a chorar, pasmam cheios
Tena dias de dôr !
Camillo Castello. Branco. Ao anoittcer da vida.
Provanõo o seu afecto por D. Anna PlaciÕo, vou repro-
j)uzir a seguinte quaòra escripta pelo auctor ôe Um Livro
Duas Épocas da Vida, copiaôa õo n." 521, õe 4-2-1906
jKII anno), pag. 2 òa Mala da Europa.
A RACHEL
fULTIMOS versos)
Eu deixei de viver, quando os meus olhos
Deixaram de le v@r, ó minha amada !
Ceguei, morri I De mim que reata agora ?
O estortor da alma atormentada.
IE' òo livro Camillo inédito, õo Visconõe òe Villa Moura
Iseguinte trecho õe um autografo òe Camillo :
«Os incuráveis soffrimentos que se vão complicanõo
os os òias levam-me ao suiciôio, único remeõio que
s posso òar. Roòeaõo õe infeleciõaões õe espécie mo-
senõo a primeira a insânia ôe meu filho Jorge, e a se-
234 Poetisa/i Portuguesas
gunõa os õestinos ôe meu filho Nuno, naòa tenho a que
me ampare nas consolações Ôa família. A mãe oeste õois
õesgraçaõos não promete longa viõa ; e, se eu puòesse
arrastar a minha existência até ver Anna Placiôo morta,
infallivelmente me suiciòaria.>
<Não Deixarei cahir sobre mim essa enorme desventura^
— a maior, a incomprehensivel á minha granõe compre-!
hensão òa òesgraça.»
«Esta Deliberação òe me suiciòar vem õe longe, com um
presentimento. Previ òesòe os trinta annos este fim. Re-
ceio que chegaôo o supremo momento não tenha a firmesa
õe espirito para traçar estas linhas».
Camillo tomou a resolução a que se refere esta carta em
1-6-1890.
D. Anna Placiôo faleceu 5 anos òepois.
Acerca òa morte õe Camillo, viòe um artigo õo auctor
ôesta Antologia, intitulado Camillo e os seus amigos, a sahirj
num interessante livro colaboraòo por escriptores portu-
gueses e brazileiros, obra que se òeve á iniciativa õo sr |
Ventura Abrantes.
MALDITA ! ^
Malõita ! malõita ! eis a voz que eu escuto
Nas sombras õa noite, se geme o tufão ; ^
Ao longe lá ouço bramir a tormenta, f
Não menos meõonha no meu coração.
Malõita ! malõita ! me braõam os raios.
RaianÕo-me a fronte sinistro fulgor.
E eu palliõa e triste qual anjo repulso
Debalõe levanto as mãos ao Senhor !
Malõita ! malõita ! os ferros me Õizem
Que inertes assistem á minha afflicção ;
E a estreita, que passa ligeira se esconõe
Deixanõo nas trevas bramir o trovão.
Poetisas Portuguesas 235
Malôita ! malòita ! os echos repetem
D'um munôo feroz que exulta á victoria ;
Malõita tu sejas mulher infamada
Por culpa que é n'outras suprema gloria.
Anna Placiôo. Os Amores de Camillo, por Alberto Pimen-
tel. Lisboa, 1899, pag. 313.
A CAMILLO CASTELLO BRANCO
{l5 DE AGOSTO DE iSSg)
Passou, meu Deus, foi um sonho
De que é ôoce o despertar,
Das negras feias, visoens,
]á nem me quero lembrar.
Tornei a achar o remanso
Do meu tão ôoce sonhar . .
Volto quasi á paz serena
Dos meus òias infantis ;
O meu anjo me segreõa
Mistérios. • . que não se ôiz
Vejo o futuro coroaòo
Pela esperança a que me affiz.
E' muito para a minh'alma ;
Importa òa viòa o ceu ;
Sobre os falsos ôons òo munòo
Lançarei cerrado veu.
Das ambições a mais nobre
E' chamar-te um ôia meu.
Anna Augusta. Livre PeHsame;jfo, Coimbra, maio õe 1895,
n." 2, pag. 46.
236 Poetisas Portuguesas
MARQUEZA DE POMARES
{d. MARIA MANUELA DE BKITO E CASTRO DE FIGUEIREDO
E MELO DA costa)
A Marqueza òe Pomares, senhora muito õistincta, é filha
ôe D. Maria Ignez òa Luz òe Carvalho Daun e Lorena e ôe
António ôe Brito e Castro ôe Figueireôo e Melo ôa Costa,
õoutor em Cânones pela Universiôaôe ôe Coimbra, fiôalgo
cavalleiro ôa Casa Real, comenôaòor ôa orôem ôe Christo,
€tc.
Casou em 30 ôe junho ôe 1864 com D. Luiz Maria ôe Car-
valho Daun e Lorena, Marquez ôe Pomares, Moço Fiôalgo
ôa Casa Real, Par ôo Reino vitalício, etc.
Depois ôa morte ôe seu esposo, a Senhora Marqueza ôe
Pomares vive muito afastaôa ôa socieôaôe, ôeôicanôo-se
especialmente a sua numerosa família, e aos seus pobres e
protegiôos.
Esta Senhora que é extremamente caritativa, já em 1876
foi iniciaôora ôe uma importante obra ôe cariôaôe, a que
se refere num curioso artigo publicaôo na Pagina Femini-
na, ôo T>iario Nacional, ôe 24-5-1917, a ilustre Marqueza
ôe Rio Maior, que ultimamente tem escripto no citaôo jor-
nal, explenôiôos artigos evocaôores Ôe Lisboa antiga :
«Quanôo se õerar:i as granôes innunôações ôo Tejo, em
1876 e 1877, tiveram logar muitas festas Ôe cariôaôe ôa ini-
ciativa ôe S. M. a Rainha Sr.^» D. Maria Pia.»
«Uma ô'ellas foi organizaôa pela sr." Marqueza ôe Poma-
res, no theatro ôe D. Maria II, nas noites Ôe 25 e 26 ôe ja-
neiro ôe 1877, e revestiu-se ôe um raro explenôor.>
«Representou-se o Frei Lui:^ de Sousa, que creio nunca
mais tornou a ser tão bem representaôo por amaôores.>
A Senhora Marqueza Ôe Pomares é auctora ôe um livro
em prosa. Os pobres e ricos (Coimbra, 1906), cujo proôucto
reverte a favor ôa Creche e ôo Asilo Ôa Infância ôesvaliôa
Poetisas Portuguesas 237
ôe Coimbra, único volume ôe suas obras que entrou no
mercaõo, e ôe ôois livros òe versos. Intitula-se um ôelès,
salvo erro, Sob a Cru^.
E' para lamentar que o granõe retrahimento Òesta bon-
òosa Senhora não permita a òivulgação õas suas obras poé-
ticas, õo merecimento bas quaes se avaliará pelo soneto
Saudade, que copiei õo livro A Tachyi^raphia ou Stenogra-
phia (sem mestre), por Manuel Joaquim õa Costa, Lisboa»
1909, pag. 87.
SAUDADE
Toõos guarôam comsigo uma sauõaõe ;
E' raro quem na viôa uma só tenha.
Ha sauõaõe que õá pena tamanha
Que, uma só, faz na viõa a soleõaõe.
Nem frios õa velhice, nem vaiõaõe.
Transformam coração em oura penha,
Em quanto õa õemencia não lhe venha
Esquecer tempo, affectos e verõaõe.
Sauõaõe não é só memoria triste
De ausentes, õa ventura além perõiõa ;
E' veneno subtil, e que resiste
Ao tempo, que nos leva amor e viõa.
Em quanto o homem pensa em quanto existe
E' fibra Õentro õ'alma já partiõa !
Marqueza õe Pomares. Sob a Cru^.
238 Poetisas Portuguesas
D. FRANCISCA DE PAULA POSSOLO
D. Francisca ôe Paula Possolo õa Costa nasceu em Lis-
boa a 4 Ôe outubro õe 1783 e faleceu em 19 ôe Julho õe
1838.
Esta ilustre Poetisa era filha òe D. Maria ôo Carmo Cor-
reia õe Magalhães e òe Nicolau Possolo.
E' auctora Ôe : Henriqueta de Orleans ou o Heroísmo, no-
vela aparecida em 1819; ôeum folheto em que reuniu al-
guns ôos seus sonetos liberaes, recitaõos no teatro õe S.
Carlos em 1826, quanôo õa promulgação õa Carta Consti-
tucional ; Francilia, pastora do Tejo, volume õe poesias que
contem sonetos, oões anacrionticas e horacianas, canções,
elegias, e epistolas.
Deixou ineõitas : uma novela e a traôução õa Pluralidade
dos mundos, õe Fontenelle e õuas comeõias, Ricardo ou a
força do destino e Claves. Traõuziu Connna õe maõame Õe
Stael e a Carta do Conde de Las Cases a Lociano Bonaparte.
Amiga intima õa Marqueza õe Alorna, a quem o auctor
õa Harpa do Crente e õas Lendas e Narrativas, chamava a
Mulher Extraordinária, D. Francisca Possolo era muito
consiõeraõa por Castilho que foi um õos numerosos fre-
quentaõores õos seus salões, onõe se reunia a elite õo seu
iempo.
JURAMENTO DE AMOR
(madrigal)
Não te engano Marilia (repetia
o loiro Anfrizo á õuviõosa amante)
amar-te-hei sempre. E oeste amor constante
o meigo juramento lhe escrevia.
Mas o pranto suave, que a ternura
aos olhos lhe chamava
Õa mimosa escriptura
Poetisas Portuguesas 239
as começadas letras apagava ;
e p'ra maior Ôesgraça; oh ! sorte oura !
tentanõo renovar o que escrevera
pobre Anfrizo ! já tuõo lhe esquecera.
Francisca õe Paula Possolo õa Costa. Poesias, Novo Al-
manach das Senhoras para 1878, pag. 154,
EPISTOLA
(FRANCISCA possolo)
Francilia de Alcipe (Marque^jfa d^Alorna)
«Zoilos, treinei I Posteridade és minha.»
BOCAGE,
Se á musa õe Francilia é òaòa a gloria
D'erguer na voz õa lyra o nome egrégio,
O nome illustre õa extremaòa Alcipe ;
Se á cantora immortal, irmã òe Phebo,
Póõe ser grato o som Õe humilôe canto ;
Alcipe, honra ôe Lysia, acolhe meiga
A pura offrenòa õa singela musa,
Versos, que o coração remette aos lábios,
Filhos õa natureza, eia, animae-vos ;
Da gratiõão nas azas côr õe neve
Aõejai, versos meus, õ'Alcipe aos lares ;
De Alcipe, cuja lyra magestosa,
O nom.e õe Francilia aos céus manõanõo.
Impõe silencio aos Zoilos ; e os colloca,
A par õo nome seu, na Eterniôaõe.
Zoilos, receios, timiõez inerte,
Prejuízos fataes, fyrannos õo estro ;
Da mente que até hoje escravisaste,
240 Poetisas Portuguesas
Apartai-vos, fu^; cantou-me Alcipe; ^
Alcipe honrou meu nome, honrou meus versos
D'AIcipe ôivinal a lyra eterna
Meu nome, os versos meus salvou ôo Lethes.
Francisca ôe Paula Possolo. Almanach das Senhorai
1882, pag. 122 e 123.
D. MARIA ADELAIDE FERNANDES PRATA
D. Maria Aòelaiõe Fernanões Prata nasceu no Porto er
1825, e faleceu em Lisboa a 18 ou 19 ôe março õe 1881.
Os seus escriptos, em prosa e verso, anòam espalhado
por almanachs, jornaes e revistas õa época.
Entre as varias publicações em que colaborou, citarei
Esperança, jornal ôe recreio literário, hoje muito raro e er
que escreveram alem õe Camiilo, D. Anna Placiôo, D. Mari
Peregrina ôe Sousa, Ramalho Ortigão, Theophilo Draga
Sousa Viterbo, Alberto Pimentel, Guilherme Braga, João ôi
Deus, etc.
Os ôois volumes oeste jornal, que tinham, respectivamen
te, 381 e 142 paginas, apareceram á venõa no 2.» leilão ôoí
livros que pertenceram ao faleciôo bibliograío Dr. RoÔrigc
Veloso, o paciente auctor ôe inúmeras investigações lite
rarias que ôeixou registaôas na Aurora do Cavado, jorna
seu que contou trinta e tal anos ôe existência.
D, Maria Aôelaiôe Fernanôes Prata é auctora Ôe um livre
õe poesias, O filho de Deus. Verteu Ôe Ossiam o poema em
6 cantos, Fingal.
O FILHO DE DEUS
Mesmo ôo Salvaôor, n'essa hora extrema.
Os Summos sacerôotes motejavam,
Dizenôo-lhe — «se és Deus, ôa cruz Ôesce,
«Obra agora um proôigio e em ti creremos !»
Poetisas Portuguesas 241
Então, amargo fel, cruéis solõaõos,
Aos incenõiôos lábios lhe chegavam.
Mas elle sem queixar-se, ao Ceo rogava.
Pelos que até á morte o atormentaram.
«Perôoae-lhes, õizia, ó Pae celeste
«Que miseros, não sabem o que fazem ! •
«Frágeis entes Ôa terra ! que são elles ? !
«Ténue porção ò'argilla que não poòe,
«Sem uma luz celeste apresentar-se,
«Ante a face Ôivina õo Altíssimo. . »
E junto á cruz vê já com turbos olhos,
Uma mulher que chora amargurada !
Era a Virgem saudosa e sem conforto,
A Mãe que vê morrer o filho caro !
E o ôiscipulo amaõo que em seu peito,
Outr'ora reclinara a fronte pura,
^:!le fixa também ; á Mãe õizenòo : —
- «Angélica mulher! eis o teu Filho ! . . .
E eis alli tua mãe, Ôisse ao mancebo.
Após, affiicto, um ai solta õe morte,
Clamanõo : por que ó Pae me abanôonaste ? . . .
Maria Aõelaiõe Fernanões Prata. O Filho de Deus, pag.
;i e 142.
D. ANTÓNIA GERTRUDES PUSICH
D. Antónia Gertrudes Pusich nasceu na Ilha õe S. Nico-
1, òe Cabo-Veròe, em 1805.
pra filha òe D. Anna Maria Izabel Nunes e ôe António
[sich, ilustre governaôor õessa província.
:sta õisiincta Poetisa, Escriptora e Jornalista, faleceu na
õe São Dento, em Lisboa, em 1883, contanõo 78 anos
iõaõe. Na casa em que habitou, e que õefronta com o
rcaôo õe São Bento, foi colocaõa uma lapiõé comme-
rativa, com os seouintes õizeres :
16
242 Poetisas Portuguesas
N'Esía Casa
Falleceu A Illustre Escriptora
E Poetisa
D. Antónia Pusich
Que muito honrou a Pátria \
Com o seu talento I
i
Alem òesta lapiõe, ha em Lisboa, apenas, mais 7, perpe-
tuanõo a memoria ôe : Alexanòre Herculano ; Visconòe òe
Almeiòa Garrett ; Visconòe òe Castilho ; Bocage ; Innocen-
cio Francisco José õa Silva ; Luiz õe Camões, e Camillo
Castello Branco.
Não obstante esta Senhora ser filha òe um almirante,
neta òe tenentes generaes e òe ter siòo casaõa com um mi-
litar òistincto, vaivéns õa sorte fizeram-na passar òa abas*
tança para uma situação òificil que pouco menos era que|
miséria.
A seu cargo, ficou a eòucação òe suas filhas. Foi com c
proòucto òa penna, que numa lucta encarniçaôa, constantí
e corajosa, D. Antónia Gertruòes Pusich fez face á situaçãc
angustiosa òe sua viòa — lucta tanto mais òesigual e ex
tenuante, quanto é certo que em Portugal o trabalho inte
lectual é, como se sabe, pessimamente compeyisado. *
Em inúmeros jornaes, publicava oòes, elegias, poemaíj
mil artigos em que, principalmente, aòvogava a causa ôo
oprimiòos e òos fracos.
Em varias Assemblêas publicas, onòe por vezes se òis
cutiam interesses vitaes para o Paiz, mais òuma vez se ou
viu a sua voz. r
Funòou os jornaes Assembleia Litteraria, 'Bemficencia
q4 Crufada.
Esta inteligente Caboveròeana é auctora òe : Os do
mysterios, OHnda, ou Abadia de Cumnor Place, (poema e
5 cantos, Lisboa 1847) ; Elegia á morte das infelizes victimc
assassinadas por Francisco de Mattos Lobo, na noite de 2
7-1841 ; Júlia, òrama ; .4 conquista de Tunis, iòem ; Espar^
Poetisas Portuguesas 243
o monte, comeõia ; Ashaverus \ Regedor de parochia ; Cons-
inça ou o amor tnaternal, Õrama em 3 actos, o qual era a
listoria õo seu viver õomestico.
Constança e Regedor de parochia foram representados
m 1849, nos teatros ôo Gymnasio e òa Rua õos Conòes.
- Publicou em 1872, uma curiosa biografia acerca 5e seu
iae, oficial ò'Armaõa, õistincto escriptor e antigo governa-
lor õe Cabo-Verôe, cargo õe que foi ôsposto em 1820
juanôo õo pronunciamento realisaòo na ilha Ôe S. Thiago.
\ junta governativa enviou António Pusich para a ilha õo
ilaio e õ'ali veiu para Portugal, onõe as Cortes o não que-
iam õeixar õesembarcar, visto ter siõo fiel ao Rei que teve
>e ficar por seu fiaõor. Abrangiõo peio òecreto õe 16-9-1833
oi õemitiõo. E' auctor õa Descripção hydrografica das lUias
\e ('.abo- Vf.rdc, e õas Memorias physico politicas.
MADEIRA
^^AUDAÇÃO I YRICA)
Salve ! linõa Maõeira, ilha õitosa !
E's Õo Oceano a flor !
E's õas ilhas princeza a mais formosa,
Mimo õo Creaõor !
Tens mil plantas, mil flo^s preciosas,
Teu solo a alcatifar ;
Onõe teus pés, submissas, respeitosas,
Vem as onõas beijar.
Verõe é teu rico, magestoso manto !
Tens õiaõemas õe luz !. .
O seio teu, õa natureza encanto.
Mil encantos proõuz !
Não é õe Itália o sol tão claro e bello,
Mais puro que o teu sol :
Manhãs õe Portugal (que tanto anhelo)
Dão-te o linõo arrebol !
244 Poetisas Portuguesas
Que noutes tão amenas tens, Maôeira !
Tens aguas õe cristal ;
Tens no frescor Ôa brisa mais fagueira
Perfume òivinal ! •
Em throno alto e seguro te sustentas ;
Tens o céu por õocel. . .
Para pintar os campos que alimentas
Quem tivera pincel 1
Oh ! não !. . . pincel não poõe o mais sublime
Pintar o brilho teu !
A poesia te cante, ella se exprime
Co'a linguagem õo ceu !
Mas não te cante vate òolorosa
Avezaõa a carpir ;
Cantem-te os filhos teus, ilha ôitosa ;
Dá-lhes leõo porvir !
Que eu possa apenas com rasteiros traços.
Com òebil, triste voz,
Sauòar teus lares, òemanõar espaços
Cumpre ao génio veloz.
Como ás nuvens sobranceiros
Se erguem teus montes, assim
Teus génios subão, ligeiros.
Com azas õe cherubins 1
Em som òivino entoando
Suaves hymnos ò'amor.
Vão teu nome eternizando
A'quem e alem Òo equaôor!
Não achem povos no munòo
Que te não saibam prezar ;
Que no teu solo fecunõo
Não quizessem repousar !
Poetisas Portuguesas 245
E mais tarõe á lusa historia
Pagina Õe oiro offerecer,
Onõe no esplenòor õa gloria
Possão teu nome escrever !
Antónia Gertrudes Pusich. Almanach de Lembranças Lii-
t^o-lSra^ileiro para 1856, pag. 206 e 207.
I D. CLOTILDE RAFAELA DE BATTAGLIA
RAMOS
D. Clotilôe Rafaela õe Battaglia Ramos nasceu em Lis-
boa, a 24 òe Outubro ôe 1882, e faleceu no Estoril, a 17
ôe ]aneiro õe 1904, contanõo apenas 22 anos òe iõaõe.
Filha mais nova òo insigne lirico João Òe Deus (o maior
poeta òo amor, segunòo afirma Marco António Canini em
II Libro deirAmore), era irmã òe ]oão òe Deus Ramos e
Òo Visconòe òe S. Dartholomeu òe Messines, auctor òa
Breve noticia sobre a Ordem do Santo SepulchrOy da Re-
publica de S. Marinho (exgotaòos), e òos Pensamentos de
To Ho de Deus.
Aos Òez anos òe iòaòe, compoz uma poesia. A' Manhã
iourada, inspiraòa na òe igual titulo òe Alfreõo Serrano,
ersos que òeòicou a seu professor Freitas e Costa, a quem
ne refiro a paginas 158 oeste trabalho.
Pelas quaòras que insiro, cheias òe sentimento, natura-
òaòe e belesa, fácil é calcular a situação òe Òestaque
ue, sem Òuviòa, viria a ocupar nas letras portuguesas D.
lotilòe Ram.os, se a morte tão cruelmente a não houvesse
rostraòo em plena juventuòe !
246 Pnedsrifí Port:
QUADRAS
Na íorça õa minha magua
Não sei bem o que é a Ôor ;
Os olhos, quanõo chorosos,
Não é que vêem melhor.
Ninguém fale em suas maguas
A quem mais maguas não tem.
Só tem maguas ô'outras maguas
Quem maguas tiver também.
Por uns olhos que fugiram,
O lume õos meus peròi :
Porque nem elles me viram
Nem eu também mais os vi !
Chamam-te òoiòa em nf.o teres
O pensar que os outros têm !
Deixa lá falar quem fala,
Faze tu por pensar bem.
Quanõo os teu olhos õiziam
Coisas que os meus encantavam,
Sei que os teus olhos sentiam,
Sei que os teus olhos choravam.
Vão-se as penas que se teem
Nos suspiros que se òão
Mas se assim vão, assim vêem,
Voltam, assim como vão !
Infeliz 5'esse que pensa,
Não crê em naõa e em ninguém.
Creanças que tenões crença,
Ensinae-me a crer também !
Poetisas Portuguesas 247
Leve-me breve o Senhor,
Naôa no munòo me tem ;
Já que peròi teu amor. . .
Que perca a viòa também.
Tolòam o céu nuvens negras
Que se õesfazem em agua- . .
Desfazem-se nos meus olhos
As nuvens õa minha magua 1
ClotilÒe Ramos. <Piíala da Europa, n." 523 òe 25 Òe
18-2-1906, XII ano, pag. 2.
D. MARIA CAROLINA RAMOS
D. Maria Carolina Ramos fez a sua estreia literária em
1916, publicanòo no Âlmanach lllustrado, Ôa Parceria Pe-
reira, as quatro inspiraòas quaôras que reproòuzo.
A sua apresentação foi feita em calorosas frases, por Al-
bino Forjaz õe Sampaio, ha pouco eleito para a Acaõemia
ôe Sciencias õe Lisboa, o conheciõo e estimaõo auctor õa
Gente da rua, Palavras cynicas, Lisboa trágica e õe muitos
outros trabalhos que tanta aceitação teem tiõo.
D. Maria Carolina Ramos é aluna òa Escola Meôica òe
Lisboa.
QUADRAS
Sonhava alto e sonhanôo
Ouviu-me õizer alguém
— «Ai tu não me Desprezavas
Se fosses pobre também.»
Mas õepois, julgo, accorõei
Nunca mais aòormeci,
E toòa a noite pensei
Pensei, mas somente em ti.
248 Poetisas Portuugesas
Naòa ha que tanto canse
Nem ha naòa que mais custe,
Que procurar uma alma
Que á nossa alma se ajuste.
Quem a encontra é feliz,
Tuòo tem realisa&o.
— Mas quanta gente ahi passa
Sem nunca a ter encontrado . .
Maria Carolina Ramos. Almanach Illustrado, para 1916.
D. ZULMIRA RAMOS
D. Zulmira Ramos representou como actriz, em Lisboa,
nos teatros õa Trinôaòe e ò'Aveniòa e no Porto no teatro
Carlos Alberto.
Segunòo me informam, resiõe actualmente no Drazil.
Colaborou, escrevenòo versos, no Almanach dos Palcos e
Salas.
MAIO
Vem rompendo a manhã ; o sol õoiraòo
clarêa as cumiaõas Ôos outeiros,
Gorgeia o pintasilgo em tom magoaôo
nos ramos enlaçados dos vimeiros.
Nasce o dia. Do pincaro escalvado
descem aguas aos trépidos ribeiros.
Emana um cheiro agreste, embalsamado,
da mata rumorosa de salgueiros.
No centro da cidade onde se agita
o despotismo vil que ao ódio incita,
é rara a animação dos bons romeiros ;
I
Poetisas Portuguesas 249
mas, na campina, em festivaes cortejos,
caminham, entre oitos e gracejos,
enverganôo os seus fatos õomingueiros.
Zulmira Ramos. Almanach dos Palcos e Salas, Lisboa,
1913, pag, 42.
D. EMÍLIA ACCIAIOLV REGO SÉNIOR
D. Emilia Acciaioly Rego Sénior nasceu na Ilha ôa Ma-
ôeira.
E' auctora õe um pequeno livro òe versos cujo titulo
ignoro.
Foi uma Ôas colaboraòoras ôa interessante publicação
«Flores da Madeira», obra que consta ôe õois volumes, e
que foi publicaõa por Alfreõo César ò'01iveira e José Leite
Monteiro.
Entre os Diversos nomes que figuram nesse repositório
poético, leem-se os õe : Luiz õa Costa Pereira, Luiz A. Ri-
beiro ôe Menôonça, Luiz António }arôim, Luiz õ'Ornelas
Pinto Coelho, Marceliano Ribeiro ôe Menôonça. Maurício
Carlos Castello Branco e Manoel Luiz Viana ôe Freitas.
O ARCO íris
GÉNESIS IX, l3.
I
Formoso arco celeste
Qu'nos céus te vais curvanôo,
E o alto firmamento
De mil cores matizanôo !
Aquelle que com Seu sopro
Tão acima te elevou,
E com variaôas tinctas
Sabiamente te pintou,
250 Poetisas Portuguesas
II
Aquelle que te sustenta
Com tanto brilho e belleza,
Foi coberto em sua viòa
Com o manto òa pobreza,
Aquelle que te curvou
Do moõo o mais magestoso,
Foi conôemnaõo a morrer
Como um facinoroso.
III
Com o seu sangue innocente
O seu rosto foi manchaòo —
Esse precioso sangue
Que por nós foi õerramaôo.
Toõo o calis ò'afflição
Sobre elle se exgotou ;
E para nos libertar
Em tormentos expirou.
Emilia Acciaioly Rego Sénior, Flores da Madeira.
D. MARIA LEONOR REIS |
D. Maria Leonor Reis nasceu em Lisboa, a 14 òe marçQ
ôe 1900.
Esta Poetisa, talvez a mais nova õas que figuram nesta
Antologia, é filha õe D. Elisa Albertina òa Silva Lobo Reis
e òo conheciõo e ilustre pintor Carlos Reis, e neta Òo es-
criptor António Augusto Ôa Silva Lobo, antigo reòactor ôa
Gaveta de Noticias, òo Rio òe ]aneiro e reòactor em chefe
Òo Diário do Senado brazileiro.
Datam òos oito anos as suas primeiras tentativas poéti-
cas. «Aos Òoze fazia as suas primeiras òescripções òe pas
Poetisas Portuguesas 251
seios que òava com seus irmãos, õescripções estas, que se
caracterisavam pelo humorismo com que òescrevia situa-
ções cómicas, riòiculas ou alegres, õesses passeios>.
Aos quinze anos compoz o seu primeiro soneto.
D. Maria Leonor Reis que se òeòica com verõaôeiro
amor ao cultivo õa poesia, tenòo siõo animaôa a publicar
alguns õos seus sonetos, por D, Branca Colaço e pelo sr.
conôe ôe Sabugosa, fez a sua estreia literária em 1917, co-
laboranôo na Pagina Feminina, Õo Diário Nacional.
Tenciona "reunir as suas proòuções poéticas num pequeno
volume, que conta publicar em breve.
O meio extremamente intelectual e artístico em que vive,
por certo contribuirá muito para que as suas produções ve-
nham em breve a ser contadas entre "as melhores feitas
por Poetisas Portuguesas.
ASSIM TE FOSTE!...
Porque te foste oh! Musa inspiradora
E me deixaste em troca o desalento?
Porque de mim fugiste no momento
Em que eu quizera recordar a hora
D'aquelle dia, em que uma doce aurora
Me segredou fazendo juramento :
Eu vir a ter mais tarde algum talento
Se versejasse pela vida fora ? ! .
Porque fugiste então e me deixaste
Sem amparo se ssmpre me guiaste ? !
Sem tão nobre columna a que m'encoste ? !
Agora . do meu sonho feito em nada
Só me resta a expressão desalentada :
«Assim como vieste. . . assim te foste» ! . .
Maria Leonor Reis. Pagina Feminina, do Diário Nacional,
de 19-3-1917.
252 Poetisas Portuguesas
ASSIM TE PODES IR...
Quizeste ôivertir-te á minha custa
Quizeste que eu ficasse arreliaòa :
Por isso tu fugiste arrebatada
Por tua cruelòaõe oh ! Musa injusta !
De ti já não me importo ! Estou robusta
D'aquelia pieguice já passaõa. . .
Pôòes viver ôe mim muito afastaòa
Que a tua ausência já me não assusta !
Fica-te em paz no sitio onòe estiveres
Que eu viverei melhor se tu viveres
Longe ôe mim sem nunca mais te ouvir ! . . .
A este òesamparo muito afeita
Tu òeixas-me õizer-te satisfeita:
«Como vieste. . . assim te póòes ir !> . . .
Maria Leonor Reis. Pagina Feminina, òo Diário Nacional,
Ôe 19-3-1917.
D. ANNA AMÁLIA MOREIRA DE SA
Francisco Gomes õe Amorim òiz a pag. 366 e 367 òa se-
gunda eòição õo primeiro volume òos Contos Matutinos
(Lisboa 1866), o seguinte:
«Em Õezembro òe 1849 appareceu no Periódico dos Po-
bres do T^orto uma poesia, assignaòa por uma senhora, á
rosa encarnada. Em seguida vieram no mesmo jornal òois
poetas, cantando a rosa branca, e proclamando-a superior
á outra. A dama da rosa encarnada voltou ao campo, de-
clarando aos seus contrários que. depunha a lyra por não
poder sustentar a luta. Os dois cantaram a victoria, mas a
Poetisas Portuguesas 253
mim (que tinha então 22 annos) ferveu-me o sangue, e en-
tendi que me não salvaria se não saisse a terreno em õe-
fesa õos opprimiõos !
«ManÔei, pois, para o Periódico dos Pobres a composição
a que se refere esta nota, e as mais que se lhe seguem até
pag. 206. Ignorando se os nomes òos poetas portuenses
eram verôaõeiros, ou se os encobria o pseuõonimo, as-
signei-me Grão Magriço.
«Os cantores òa rosa branca não gostaram Òe que eu me
mettesse nas suas contenòas, e responõeram-me com aze-
õume ; eu repliquei também asperamente e a questão che-
gou ao ponto õe eu tirar passaporte para ir ao Porto salòar
as contas com elles. Devo ao meu falleciòo amigo e mestre
Garrett o haver-me livraòo õesta riòicula questão com o tre-
menòo sermão que me pregou ao saber a minha resolução.
«Felizmente ainõa não havia caminhos òe ferro, n^m se
òava um passo neste paiz sem o auxilio Ò'um passaporte ;
aliás quem sabe se veríamos renovaôas em Portugal as
guerras Õe York e õe Lencastre, que por iguaes motivos
assolaram a Inglaterra !
«Faço estas confissões como verôaõeiros actos õe peni-
tencia, e õeclaro solenemente que nunca procurei saber
se a Õama õa rosa encarnada era um mytho, ou se real-
mente existiu a ex."»^ sr.^ D. Anna õe Sá.
«Eu não fui o único a tomar a sua õefesa. Depois Õe
mim, alguns poetas õe Lisboa publicaram nos jornaes Õo
Porto poesias contra a rosa branca ; e, seguinõo o meu
exemplo, os partiõarios õa sr.^ D. Anna õe Sá escolhiam
os nomes, com que assignavam os seus versos, entre os
õoze õe Inqlaterra>.
D. Anna õe Sá existiu õe facto. Em 18'61, publicou na
Porto, um volume õe versos intitulaõo Murmúrios do Vi-
{elta.
D. Anna õe Sá é a mesma pessoa que D. Anna Amália
Moreira õe Sá.
254 Poetisas Portuguesas
SAUDADE
Saud ide ! goútú «margo d'>nfHli<es
Ueliciovo pungir d'acerbo espinho !
Sauòaõe ! sentir acerbo
De penetrante sofírer !
E' poeta o que no peito
Uma vez te viu nascer:
E' poeta, oh ! sim, poeta.
Quem te soube comp'ren()er !
Sauõaõe ! nome caòente,
De suave inspiração .'
Exprime òôr e ternura,
O viver òa soliôão,
Harmonia que òo peito
Geme era lúgubre canção !
Quem ha que ôiga — sauòaõe
Sem também òizer — amor ?
— Es§e nome sempre preso
A' lyra ôo trovaõor !
O melhor òos sentimentos.
Que nos õéra o Creaòor !
Sauòaòe òiz o meu peito,
Diz — sauõaòe, a mais não ser !
Eu amo a flor oeste nome,
Por também lhe pertencer ;
Amo tuòo, que saubaòe,
Sauòaòe póòe òizer,
Anna Amália Moreira De Sá. Murmúrios do Vtjella, Porto,
1861, pag. 105 e 106.
Poetisas -Portuguesas 255
D. ESMERALDA DE SANTIAGO
D. EsmeralÒa õe Santiago nasceu na ciòaòe ôo Porto,
nõe resiõe.
\ E* filha õo ôistincto meõico oftalmologista Dr. Manoel
opes Santiago.
Tenòo siõo sempre muito aplicaòa ao estudo, seus pães
'pensaram em que cursasse meòicina, não tenòo porém che-
-gaòo a frequentar a antiga Acaõemia òo Porto, por não
sentir vocação para a carreira que iiie propunham.
D. EsmeralÒa òe Santiago que é bastante nova, verseja
ôe os 15 anos,
dm 1914, fez a sua estreia literária na lllustração Portu-
guesa, semanário em que tem colaboraòo.
A maior parte òa sua obra poética está ineòita.
Inste se intitula o livro òe versos que tem para publicar,
prefaciaòo por ]ulio Dantas.
OUTR'ORA E HO]E
I
QuanÒo eu era creança, uma inocente
Contanòo Õ'anos uma Òuzia apenas.
Nas taròes estivaes, calmas, serenas,
Oihanòo o céu embeveciòamente,
Ficava-me a cismar !. . . E o rir õolente
Das estrelas, fulginòo ás centenas
Em. granões gotas, meòias e pequenas
Apoz cerrar a noite suavemente.
Vinha acoròar minh'alma enterneciòa 1 . . .
Agitava-me então extranha viõa,
Ajoelhava crente, e uma oração
256 Poetisas Portuguesas
Voava ôos meus lábios para os céus,
Onòe eu via a imagem ôo bom Deus,
N'uma aureola ò'Amor e Õe Perõão !
II
Pobre òe mim ! . . . já hoje assim não é ! . . .
E se á noite contemplo o firmamento
E* só tristeza e òôr e soffrimento
Que invaòe a minha alma que em Deus crê ! . . .
E' certo que conservo a mesma fé
Que outr'ora me elevava o pensamento
Junto õo Creaòor, nem um momento
Ela me abanõonou, e julgo até
Que ela augmentou, com minha õesventura ;
Mas este imenso Amor, òoce tortura
Que me consome e abraza sem cessar,
Fez-me esquecer Õe toôo a oração !. . .
E meu esfacelaòo coração
— Só lagrimas, Senhor, sabe rezar !
Esmeralda õe Santiago, lllustraçáo Portuguesa, n." 448^
21 õe Setembro õe 1914, pag. 382.
D. ROSALINDA CELESTE DE FIGUEIREDO
SANTOS
D. Rosalinõa Celeste õe Figueireõo Santos nasceu em
Lisboa.
E' filha õe D. Mariana Angélica õe AnõraÕe, poetisa ilus-
tre a quem me refiro a pag. 25 a 27 oeste trabalho e õo Dr.
António Canõiõo õe Figueireõo.
Poetisas Portuguesas 257
Esta Senhora foi uma boa e òeòicaõa auxiliar ôe seu pae,
em muitos trabalhos literários.
Alem õe varias obras clássicas que, para a livraria Tava-
res Caròoso, D. RosalinÔa Santos traõuziu, fez ainõa tra-
òuções òe folhetins no Diário de Noticias, õurante quatro
anos, e na Vanguarda.
Tenõo contrahiõo núpcias com o capitão õe Infantaria
sr. Henrique Figueireòo Santos, esta ilustre Poetisa a quem
ôevo a gentileza ôe me ter fornecido os ineòitos que re-
produzo, abanõonou as letras, õeõicanòo-se exclusivamente
a cuiõar ôos seus.
Como poetisa, nunca òesejou colaborar em jornal algum ;
no entanto, a leitura òas suas poesias agra&a bastante.
Os versos, õesta Poetisa, como os õe D. Maria õa Gloria
Teixeira õe Vasconcellos, são íntimos, e inspiraõos peio
amor õe seus lares, que cantam numa linguagem simples
e bela.
POMBAS
(inédito)
Como vos quero, mansas pombinhas i
Não ha, na terra, mais linõas aves !
As vossas penas tornam as minhas
Como o ar puro, leves, suaves.
Nas horas õ'ocio, sois meu enlevo,
. Penas õe neve, penas õoiraõas !
Umas seõosas, outras relevo.
Também ha, negras e bronzeaõas !
Mil atractivos tem meu pombal.
Ninhos, borrachos, amor e arrulhos !
Não ha ôiscorõias ; caõa casal
Lembra o meu ninho, lar seranjarulhos . .
17
258 Poetisas Portuguesas
E quantas vezes, as sentinelas,
(Eles, os pombos), não vou ronòar!
Guarõam, atentos, os ninhos Òelas,
Empoleiraòos, sem arrulhar !
Pombinhas brancas! pombas morenas!
Meu passatempo ! cuiôaôos meus !
Quero ir convosco, nas vossas penas,
Quanòo voarôes, um òia aos céus !
RosalinÒa Celeste õe Figueiredo Santos.
AO MEU RUI
(lNED'XO)
]á três annos tens
Aurora em botão
E tuõo illuminas
Com esse clarão !
Teus olhos, meu Rui,
Tão bellos, risonhos,
Só õizem esp'ranças,
Ternuras e sonhos !
As flôr's á porfia,
]á anòam, vê lá !
Tiranòo-te espinhos,
Que o munôo tem cá !
E querem, vaiòosas.
Encher- te o caminho,
E as asas tornarem-te
Bem leves, anjinho !
Poetisas Portuguesas 259
Mimosa criança!
E' tua bellêza
Teu riso, que encanta
E afasta a tristeza !
Ventura, anelos,
P'ra ti só ôesejo ;
Criança, és um sonho !
Criança, és um beijo !
Rosalinõa Celeste òe Figueireòo Santos.
D. MARIA OLGA DE MORAES SARMENTO
DA SILVEIRA
D. Maria Olga òe Moraes Sarmento ôa Silveira nasceu
em Setúbal.
E' filha õe D. }ulia Canõiòa õe Moraes Sarmento e òe
Francisco Máximo òe Moraes, oficial superior òo Exercito,
já faleciôo.
Pelo laòo materno, é neta òo general CanòiÒo Higino òe
Moraes Sarmento que òescenòia òas famílias mais ilustres
õe Traz-os-Montes. Nela paterna òo faleciôo major Justi-
niano Máximo òe Moraes, que por feitos militares foi lou-
vaòo, acha-se exposta na Socieòaòe òe Geographia òe
Lisboa á espaòa ò'honra que D. Maria II lhe ofereceu.
D. Maria Olga òe Moraes Sarmento òa Silveira foi casaòa
com o meòico naval òe 1.^ classe Manuel João òa Silveira^
morto no combate òo Cuamato, contanòo apenas 34 anos
òe iòaòe.
O nome Òesta òistincta escriptora é bastante conheciòo
e apreciaòo, não só em Portugal, como em Maòriõ, Paris
(sua resiòencia habitual). Rio òe Janeiro, S. Paulo e na Ar-
gentina, onòe tem siòo muito bem acolhiòas as conferen-
cias que fez nesses paizes.
260 Poetisas Portuguesas
Em 1913, foi eleita sócia ôo Instituto õe Coimbra. Em 6
ôe maio õe 1908, A Acaôemia õe Sciencias õe Portugal que
conta entre os seus sócios os nomes ilustres õe Teófilo
Braga, Santos Lucas, Alfreòo 5a Cunha, Augusto òe Mi-
ranDa, António Cabreira, Ramos õa Costa, Belo òe Moraes,
Silva Amaôo, Dr, Júlio Henriques, João Caròoso Júnior,
Costa Sacaõura, Abel Botelho, Alberto Bramão, Anselmo
Õe Anõraõe, Costa Mota, Ernesto õe Vasconcelos, Queiroz
Veloso, Bruno, Cunha e Costa, Júlio Neupart, Freitas Bran-
co, Magalhães Lima, Marquez õo Funchal, Rocha Martins,
Teixeira Lopes, Veloso Salgaõo, Ventura Terra, Alfreôo Õe
Mesquita, Moreira ôe Sá, Viana õa Mota, Severo Portela,
Bento Carqueja, Augusto õe Lacerõa, Carneiro õe Moura,^
paõre Himalaia, Conõe õe Sabugosa, Visconõe õe Sanches
õe Frias, Maõame Curie, D. Domitila õe Carvalho, Analotc
France, Camile Saint Saens. Henri Turpin, L. Phileas Lebes-
gue, Pierre Prevost, Prospero Peragallo, Ribeiro Y. Rovira,^
etc, etc, elegeu sócio a D. Olga õe Moraes Sarmento õa'
Silveira. Investigaõora profunõa e meticulosa D. Olga õe
Moraes Sarmento, é uma õas figuras õe mais realce na li-
teratura feminina portuguesa na qual se õestacam os no-
mes õe D. Maria Amália Vaz õe Carvalho, D. Carolina Mi-
chaelis Õe Vasconcellos, D. Emilia õe Sousa Costa, D. Marj
ria 0'Neill, D. Virgínia õe Castro e Almeiõa, D. Anna õJ
Castro Osório^ D. Angelina Viõal, D. Alice Pestana (Caie!)/
D. Clauõia õe Campos, D. Maria Paula õ'Azeveõo, D, Ma-
ria Beneõicta Mousinho õe Albuquerque e Pinho, D. Con-
ceição Eça õe Mello, D. Mafalõa Mousinho õe Albuquerque,
D. Maria Feio, etc. Prosaõora e poetisa brilhante, õirigiu
ôurante muitos anos a revista Sociedade Futura.
Em 1906, publicou: o Problema Feminista; em 1907, A
Marquesa de Alorna, obra a que me refiro a pag. 22 õestaí
Antologia ; em 1909, A Infanta D. Mana e a Corte Poriu
guesa (Conferencia realisaõa no Instituto õe Coimbra e$\
4-5-1909) ; no mesmo ano, Arte, Literatura e Viagens e
nalmente em 1912, La Pairie Bresilienne.
Poetisas Portuguesas 261
Para estas obras tiveram os jornaes portugueses e es-
trangeiros (merece especial referencia um artigo òe Maxime
Fromont, no Mercure de France), as mais rasgadas e enthu-
siasíicas apreciações.
São õo Dia òe 25IV-1912, as seguintes palavras:
«A õistinctissima senhora D. Olga òe Moraes Sarmento,
que em Paris foi alvo òas mais calorosas homenagens por
occasião òa sua conferencia, tem siõo muito festejaòa pela
alta socieòaôe òe Maòriõ e pela elite intellectual òa capital
òo visinho reino, senòolhe feita uma recepção gentillis-
sima>.
«Uma outra excepcionalissima òistincção, que muito fol-
gamos òe registar aqui, teve a sr.' D. Olga Òe Moraes Sar-
mento : a Infanta D. Isabel, não poòenòo assistir, por in-
commoòo òe sauòe, á conferencia, conviòou-a a passar a
taròe òe sexta feira no seu palácio, a fim òe lhe lêr e á
íamilia real esse tão bello trabalho litterario».
O trabalho a que se refere este artigo é La Patrie Bre-
silienne.
NEVER MORE...
O sol ôescae no poente e as nuvens côr òe rosa
Formam-se em turbilhões cercanòo-!he o áureo leito.
Que torrentes òe luz 1 que surprehenòente effeito !
No emtanto triste òesce a noite silenciosa.
Assim eu vi cahir, entre illusões ôesfeito,
O amor que illuminou minha'alma òescuiòosa.
Foi um occaso ! e apoz a treva angustiosa
Invaòiu torvamente o vácuo òo meu peito.
[Toòavia o sol volta abrinòo a porta ao òia,
Mas o amor. . . oh ! o amor. . . a òivinal poesia,
[Que nos perfuma o ser, não voltará jamais!
262 Poetisas Portuguesas
Não voltará jamais ! e uma atroz sauõaõe
Repete ao coração esta fatal verôaôe
Como ironia cruel aos sonhos iòeaes.
Maria Olga Òe Moraes Sarmento õa Silveira. Almanach
das Senhoras, òe 1913, pag. 247.
D. ELVA ÇDUARDA DA CUNHA SERRÃO
D. Eiva Eõuarôa ôa Cunha Serrão nasceu na Figueira òa
Foz.
E' filha òo falecido escrivão-notario ]u!io Augusto Gaspar
õa Cunha Serrão e õe D. Mabilia Augusta õo Reis Serrão.
TenÕo viviòo muitos anos no Alemtejo, fez a sua estreia
literária no jornal A Vo^ d^Estremoj.
As suas poesias teem siôo publicadas nos Almanachs das
Senhoras e õe Lembranças e, sobretudo, no jornal, Sucessos^
ô'Aveiro.
A obra desta Senhora, como de tantas outras de quem
falo, nunca foi reunida em volume.
SONETO
— Deixae chegar a mim os pequeninos !
Disse Jesus sorrindo santamente
E dos seus doces olhos peregrinos
Rolou na face a lagrima tremente . .
E a afagar- lhe os cabelos finos
E o rosto branco de expressão ridente,
Fitava os olhos d'elles, azulinos,
Emquanto lhes falava mansamente ■
Na sua meiga voz, suave e calma,
Tentava, em vão, encher-lhes bem a alma
De tudo o que é bondade, o que é meiguice. . .
Poetisas Portuguesas 263
Mas foi õebalôe. A pequenina grei
Quanõo mais tarõe um banõo sem ter Lei
Não recoròou o que ]esus lhe õisse.
Eiva Serrão. Almanach de Lembranças, ôe 1910, pag. 142.
SONETO
Na Ôelicaôa haste — òebruçaõa
Nas suas folhas tenras, setinosas,
Vi uma linõa rosa nacaraõa
Entre-abrinÕo as pétalas viçosas. • .
E o vento a sacuòil-a — balouçaòa
Na hastesita, em curvas caprichosas,
Ficava a rosa um pouco reclinaõa,
Penôiôas suas pétalas mimosas ■ ■
E n'essa posição tão peregrina
A inclinar a coma pequenina
Com õesusaôa graça e compostura • .
Fazia-me lembrar — ao vêl-a airosa —
Uma õama gentil, pretenciosa,
Fazenõo gravemente uma mesura .
Eiva Serrão. Almanach das Senhoras, õe 1910, pag. 356.
D. MARIA PEREGRINA DE SOUSA
D. Maria Peregrina 5e Sousa nasceu no Porto em 13 Õe
fevereiro òe 1809.
Colaborou : no Archivo Popular, Revista Universal Lis-
bonense, Bra^ Tisana, Pirata, Aurora, Lidador, íris, Òo
Rio õe ]aneiro, Grinalda, etc.
264 Poetisas Portuguesas
Na Revista Universal Lisbonense usou D. Maria Peregrina
õe Sousa o pseuòonimo ôe Obscura portuense.
Castilho foi aòmirabor Õesta Senhora.
PARÁBOLA DA MINHA VIDA
Em jarõim me vi formoso,
Tão alegre, tão mimoso,
Que outro nunca vi assim :
Longas ruas espaçosas,
Flores mil, toõas viçosas.
Julguei vêr n'este jarõim.
Era então òe maôrugaòa :
Nebrina òe côr rosaòa
No começo õ'este òia
Mil encantos presentava ;
Os õesares occultava.
As bellezas òiffunõia.
Vem o õia : esclareceu
Pouco a pouco terra e ceo.
Ruas que vira vistosas,
Vi tristonhas, apertadas ;
Murchas, sêccas, õesfoihaòas
Vi as flores mais formosas.
Só meòravam lá martYrios,
Chagas vivas, roxos lirios ;
Os suspiros, ais singelos,
Tristes lagrimas penõiõas ;
As sauòaòes õenegriôas,
Malmequeres amarellos.
Quasi estava já no fim
Do symbolico jaròim,
Eis me falta arrimo e luz !
Poetisas Portuguesas 265
Em terra cahi prostraòa
De sauòaôes roõeaòa
Abracei funérea cruz.
Maria Peregrina ôe Sousa. A Grinalda, II ano, Porto,
1857, pag. 17 e 18.
I
D. GUIOMAR TORREZÃO
D. Guiomar Torrezão nasceu em Lisboa a 26 õe novem-
bro õe 1844 e faleceu em 22 ôe outubro õe 1898.
Nos primeiros anos Òe sua existência luctou com muitas
òificulòaões esta Senhora que foi uma granõe trabalhadora.
Aos oito anos õe iòaõe, ficou órfã õe pae, restanõo-lhe
apenas sua mãe que extremecia, õois irmãos pequenos e a
avó que pouco tempo õepois faleceu.
Dotaõa õe granõe força õe vontaõe, intiligente e muito
estuõiosa, poucos anos õepois era professora õe instrução
primaria e õe francês.
Tinha pouco mais õe õezasseis anos õe iõaõe, quanõo
escreveu a sua primeira obra literária, Uma alma de mulher-
E' auctora õos trabalhos : Rosas Pálidas, No Theatro e
na sala, Meteoros, Paris, Família Albergaria, Flavia, Bata-
lhas da vida, A comedia do amor, Idilio á inglesa, etc.
Para o teatro õo Gymnasio escreveu Educação Moderna,
comeõia e Naufrágio do Brigue Colombe, peça õestinaõa a
um teatro õo Brazil.
D. Guiomar Torrezão também traõuziu muitas peças tea-
íraes, como : Condessa Sara, Dois garotos. Menina dos te-
lelefones, etc, etc.
Folhetinista õistincta, colaborou no Repórter, Diário 11-
lustrado, Gaveta Setubalense, etc.
Em 1871, funõou o Almanach das Senhoras que õirigiu
õurante muitos anos, tenõo-lhe por sua morte, suceõiõo no
aluõiõo cargo, sua irmã D. Felismina Torrezão.
266 Poetisas Portuugesas
RelacionaÒa com os escriptores mais em eviòencia òo
seu tempo, o nome õesta ilustre Poetisa e Escriptora é so-
bejamente conheciòo nas letras portuguesas.
A MINHA MÃE
(no dia dos seus anos)
ó minha mãi quem puõera
cingir-te a fronte òe flores !
e ajoelhar aos teus pés,
sanctuario òos meus amores !
Ai ! quem puòera n'um raio
ôo sol manòar-te minha alma.
A sauõaõe é um martyrio,
mas um martyrio sem palma !
E tu és na minha viòa
a ôoce luz òe uma fé,
que nunca póòe extinguir-se,
que brilha sempre õe pé !
Ó minha mãi quem puôera
voar. . . voar para ti !
e ôizer-te em meigo enlevo
surri meu anjo ! . . . surri I
Guiomar Torrezâo. Almanach das Senhoras, para 1872, 2."
ano, Lisboa, 1871, pag. 127.
D. ROSA VARELLA
D. Rosa Varella nasceu na freguezia õe Ganfei, concelho
õe Valença õo Minho.
E' filha Õe D. Maria Rosa õe Sousa Varella e õe Domin-
gos Gonçalves. Professora oficial em Loivo õe Cerveira ,
Poetisas Portuguesas 267
concluiu o curso para o magistério primário oficial, na Es-
cola Normal òe Braga, em 4 ôe Julho òe 1904.
Fez a sua estreia literária em 1913, ano em que publicou
o seu primeiro livro (prosa e verso), Ondas do Minho, im-
presso em Vianna òo Castello.
Em 1917, eôitou um volume õe poesias, //ar/ja ia Tumba.
Tem colaborado nos jornaes : Correio Litterario, òe Lis-
boa, Comercio do Lima, õe Ponfe Òe Lima, Vbf de Cerveira
e nos Echos de Cerveira.
D. Rosa Varella que consagra os poucos momentos que
tem òe seu, á literatura, trabalha num romance intitulaòo
Flor das Campas e Jem no prelo um novo volume òe versos
— Revoadas — òo qual faz parte o soneto Lei Universal
que abaixo transcrevo.
LEI UNIVERSAL
(iNEDlTO)
Desfralòa-se uma vella aventureira,
Sulcanòo altiva as aguas agitaòas.
Por sobre ela a águia em revoaòas,
Vejo o espaço transponòo altaneira.
A' mente trazes coisas já passaòas,
Águia austera viril e sobranceira,
Que òeixas ao passar como uma esteira,
Cortanòo a névoa òas manhãs nevaòas.
Sobes com altivês alem õa serra,
E's senhora suprema ò'ampliòão,
Foges ás sombras tumulares òa terra.
Mas não foges á morte esse òragão,
Que a viòa a toòo o ser, cruel encerra ,
E ao naòa faz volver a creação !
Rosa Varella. Do livro Revoadas.
268 Poetisas Portuguesas
PROVAÇÕES DA VIDA
(o QUE NOS ESPERA)
Da creança o negro õestino,
Que oura malòaõe encerra,
Mais vale o eterno somno,
No frio leito ôa terra.
E' ave que livre esvoaça,
E cantanõo poisa na flor :
No silveõo busca agasalho
Onòe a espera o caçaòor.
Rosa Varella. Ondas do Minho, Vianna, 1913, pag. 15.
DESVENTURAS
Desventuras cá neste munòo o que importa ?
Neste munòo ha venturas, prazeres, paixões,
E efémeras risos Da sorte que volta.
Delicias, òesgraças... òa sorte os bal&ões-
Se chora a miséria que importa então ! ?
Afasta o õitoso a vista com teõio,
E é inútil implorar a compaixão,
Crime é peõir para a òesgraça remeõio.
O remeõio está nessa fria moraòa,
Aonôe tuòo finòa no esquecimento,
E se resume a viôa nesse pó ôo naòa,
E nossos pobres ò ramas nos vais- vens òo tempo.
Rosa Varella. Harpa da Tumba, Vianna, 1917, pag. 87.
Poetisas Portuguesas 269
D. MARIA DA GLORIA PEREIRA TEIXEIRA
DE VASCONCELLOS
D. Maria ôa Gloria Pereira Teixeira õe Vasconcellos nas-
ceu na quinta ôe Pascoaes, em Amarante.
E' filha ôe D. Carlota Gueôes Teixeira ôe Vasconcellos e
õe João Pereira Teixeira ôe Vasconcellos.
Irmã ôo poeta Teixeira ôe Pascoaes, tenl esta ôistir.cta
Poetisa que é casaõa com o sr. José Monteiro Carvalhal, co-
laboraôo na Revista de Coimbra, na Chronica, na Alma /^e-
w/muae, ultimamente, na Águia, bela revista mensal, ôe li-
teratura, arte, e sciencia, filosofia e critica social, na qual
tem escripto ; Aarão ôe Lacerôa, Afonso Duarte, António
Carneiro, António Sérgio, Augusto Casimiro, Aurélio ôa
Costa Ferreira, Eurico ôe Seabra, Gomes Leal, João Lúcio»
Leite ôe Vasconcellos, Leonarôo Coimbra, Mário Deivão,
Phileas Lebesgue, Teixeira Lopes, Teixeira ôe Pascoaes^
Teófilo Braga, Visconôe ôe Vila- Moura, etc, etc.
Esta Senhora usou o pseuôonimo ôe Maria Estella^ como
se vê ôo bonito soneto que incluo nesta coleção.
D. Maria ôa Gloria Teixeira Ôe Vasconcellos tem em pre.
paração um interessante volume ôe versos que tem por ti-
tulo : O Livro de minha filha, obra em que ha belas poe-
sias, repassaôas ôe ternura. Viôe pag. 257 ôesta Antologia.
PRIMEIROS CUIDADOS
Com a tua linôa cabeça
Tombaôa sobre o meu peito
Chegaôinha ao coração
Que batia com mais geito.
Com teus braços enrolaôos
Ao meu pescoço, Maria ;
Teus granôes olhos febris
Fechaôinhos á alegria.
270 Poetisas Portuguesas
Murchinha como uma flor
De baixo ô*um sol arôente.
Como é triste para uns braços
Suster um filho òoente !
Ai, são como o sol õ'inverno
As alegrias ôa Mãe !
Tão òepressa tem òe rir
Como ha-õe chorar também.
Sêr Mãe é tornar a ser
Mais uma vez pequenina.
Quantas vezes eu não sei,
Se sou a Mãe, se a Menina !
Ser Mãe é olhar a infância
Que em creança se não viu. . .
Como nos volta nos filhos
Aquillo que nos fugiu !
Maria Teixeira õe Vasconcellos. A Águia, Revista mensal
Ôe Litteratura, Arte, Sciencia, Filosofia e Critica Social, n.«
38, Porto, Fevereiro ôe 1915, pag. 62.
SONETO
No azul immenso o meu olhar cançaòo,
Como elle gosta lá ôe repousar !
De ver o munòo está tão õesgraçaõo
Que se desfaz em lagrimas no ar.
Para alem ôo infinito constellaôo.
Ha uma estrella que me quer levar,
Astro õe estranha luz illuminaõo.
Que vem sobre o meu peito repousar!
Poetisas Portuguesas 271
Nas azas õ'essa estrella vou voanõo
Mas sempre minha Mystica sauòaôe
De roxas nuvens tuôo vae tolõanôo.
Desfaz-te, ante meus olhos, roxo veu !
Quetuôo encobres, õize-me a verôaòe,
Se para além õo Ceu, ainôa ha mais Céu ?
Maria Estelia. A Chronica, nS 61, 3.» anno. Lisboa, março
òe 1902.
D. MARIA AMÉLIA VAZ
Esta Senhora é, como a Visconõessa òas Nogueiras (D.
MathilÒe Izabel Ôe SanfAnna e Vasconcellos Moniz ôe
Bettencourt), D, Maria Helena Jervis ôe Athouguia e Al-
meiôa, D. ]oanna Castelbranco, D. Arsenia Bettencourt Mi-
ranôa, D. Leolinõa Jaròim Vieira, D. Emilia Acciaioli Rego
Sénior, D. Luiza Maria Pereira, D. Maria õa Costa Pereira,
e D. Eugenia Rego Pereira, — natural õa Ilha òa Maòeira,
D. Maria Amélia Vaz tem colaboraòo assiòuamente em
almanachs, Õiferentes jornaes e, especialmente, no Diário
da Madeira.
MORTINHA
Veste Õe neve a creancinha,
Que vae mortinha a enterrar.
Com um sorriso !
A flor õ'um èia que jaz penbiòa.
Emmurcheciôa, irá brilhar
No Paraiso.
E a acompanhal-a ao cemitério
Um coro ethereo ! Um banõo linòo,
Aquelle banòo !
i
272 Poetisas Portuguesas
Linòas creanças inòa innocentes
Pensam contentes, que vae òorminòo.
Seguem cantando.
No campanário repica o sino,
Parece um hymno o seu tocar
Alegremente.
Rozas ôesfolham p'lo cortejo
E tem ensejo òe a beijar
O sol poente.
Lá n'um casal, ó òôr pungente.
Amargamente a mãe chorava
O ouro açoite
Da negra morte. Mas uma estrella
Pouõe alguém vêl-a a mais brilhava
No ceu á noite.
Pois é geral, ahi na alòeia,
A' bocca cheia, tJiz a gente :
Essas estrellas
Que se estão venòo no azul prezas
Serão accesas eternamente
Pelos anginhos •
Amélia Vaz. Santa Cru^, 1912.
D. MARIA RITA CORRÊA DE SÁ BENEVl
DES VELASCO DA CAMARÁ
D. Maria Rita Corrêa òe Sá BeneviÕes Velasco òa
mara nasceu em 2 òe Outubro Òe 1821 e faleceu em 30 *<
Janeiro Òe 1868.
Irmã ôo sétimo Visconòe òe Asseca, Salvaòor Corrêa òf
Sá, e|a filha òe D. Rita òe Castello Branco, terceira filhi
Poetisas Portuguesas 273
ôos primeiros marquezes ôe Bellas e Õo Visconde ôe As-
seca, António Maria Corrêa õe Sá Beneviôes Velasco õa
Camará.
Esta ilustre Senhora foi casaòa com D. José Maria õa
PieòaÕe Ôe Lencastre, segundo filho õo quarto Marquez
ôe Abrantes e ôa Marqueza D. Helena Ôo Santíssimo Sa-
cramento Ôe Vasconcellos e Sousa, filha ôos Marquezes ôe
Castello Melhor.
A SOLEDADE
Voe soll I
Que voz õolorosa, que tristes gemiôos
Os echos retumbam ô'antiga Sião ? !
Rachel lamenta Ôos filhos perôiôos ?
Não ha consolal-a, por que elles não são ?
São ais e sauôaôes, que solta Maria,
Chamanôo entre angustias seu caro Jesus.
Debalôe o procura com tanta agonia !
Do filho que resta ! . no monte uma cruz !
A cruz, que sua alma consola e tortura !
Agora na terra seu único amor . .
Oh vós, que provastes ôa viôa a amargura,
Dizei se ha tormento que eguale essa ôôr !
O archanjo, se agora baixasse. Senhora,
SauÔanõo teu nome ôa parte ôe Deus,
Esse ave festivo calara Ô'outr'ora,
Seus ais compassivos unira co'os teus.
Nem «Deus é comtigo» teria juntaôo,
Que Deus já parece ôe ti se ausentou.
Deixou mesmo o filho, foi surôo a seu braôo ;
Do seu ôesalento Jesus se queixou.
Mas ah ! se outr'ora te ôisse Bemdicta,
Não menos agora t'o Ôeve ôizer ;
Que a benção celeste por Deus foi preôicta
A quem sobre a terra chorar e soffrer.
18
274 Poetisas Portuguesas
BemÕize, pois, Virgem, as maguas que soffres.
Que eterna ventura no céu te òarão !
Com ellas, abrinõo òas graças os cofres,
Alcança conforto p'ra os filhos òe AÔão.
Maria Rita Corrêa ôe Sá. Parnaso Mariano, (2.* eòição),
Coimbra 1890, pag. 181.
D. MARIA VELEDA
D. Maria VeleÔa nasceu em Faro, a 26 òe fevereiro ôe
1871. Foram seus pães ]oão Diogo Frederico Crispia,
oriundo òe uma familia ingleza, òe comerciantes, que se
estabeleceram no Algarve, e D. Carlota Perpetua òa Cruz
Crispin.
Tenôo ficaòo órfã òe pae aos onze anos, começou a tra-
balhar aos quinze anos, para ajuòar a viver sua mãe e um
irmão mais novo, Òeòicanõo-se òesòe essa iôaòe ao pro-
fessoraòo.
Aos òezanove anos fez a sua estreia literária num lorna
provinciano — O Districto de Faro.
Colaborou, ôepois, em vários jornaes òe Lisboa e òa proi
vincia, como o Diário lllustrado, O Globo, o Repórter,
Vanguarda, O Século, O Heraldo, O Lidador, etc, etc, e
em òiíerentes revistas como A Tradição, A Sociedade Fu
iura, A Mulher e a Creança, etc.
As suas proòuções, quer em prosa, quer em verso, fo
ram, a principio, exclusivamente literárias ; mais taròe, po*
rém, revestiram um caracter acentuaòamente feminista e òi
propaganõa em favor òa eõucação infantil.
A sua activiòaòe literária aòquiriu nova feição òesòe 19
em que começou a colaborar em òiversos jornaes politic
Òe caracter republicano, passanòo òesòe logo a ser solici»
taòa para colaborar com os homens mais em òestaque
nesse partiòo.
Poetisas Portuguesas 275
Na propaganda òo mesmo iõeal, D, Maria Veleòa discur-
sou em comidos e fez conferencias.
Dos seus numerosos artigos politicos, o que adquiriu
maior notoriedade foi um que publicou na Vanguarda, de
que era director Magalhães Lima, e que se intulava : A pro-
pósito, e que obteve grande êxito e teve três edições suces-
sivas.
As suas conferencias mais notáveis foram reunidas em
volume, intitulado A Conquista, prefaciado por António
José d'Almeida. Publicou diversas plaquetes — A Emanci-
pação feminina, etc. Manteve, em Serpa, uma publicação
mensal, Côr-derosa, contos moraes para creanças.
Como poetisa, a sua obra anda dispersa por inúmeros
jornaes, revistas e almanachs.
D. Maria Veleda foi durante muitos anos colaboradora
assidua do Almanach das Senhoras.
Actualmente, tendo abandonado por completo a propa-
ganda politica e feminista, e estando afastada da literatura,
dedica-se, exclusivamente, á sua missão de amiga das
crianças, vivendo só para elas, como Delegada da Tutoria
Central da Infância e Directora professora da Obra Mater-
nal, da qual foi fundadora, e onde são recolhidas creanças
do sexo feminino que estejam ao desamparo ou em perigo
moral, sendo este segundo cargo exercido gratuitamente.
PÉTALAS
Déste-me um dia, sorrindo
Tua alma para a guardar. . .
— E era um hymno a tua voz.
Era um ceu o teu olhar.
Guardei-a junto da minha,
Em tão estreita união,
Que por fim já não sabia
Se eram duas ou não.
276 Poetisas Portuguesas
Mas quizeste rehavel-a,
Tiveste õe a espeõaçar. . .
— Tinhas-m'a òaõo sorrinòo,
E levaste-m'a a chorar.
Maria Veleõa. Almanach das Senhoras, para 1901, pag. 83.
MATER DOLOROSA
Lançae-me á vala. Amigos ! Que me importa
Apoõrecer com párias lá no funòo ! . .
— Ha-ôe ser como um farõo sujo, immunôo,
O caôaver òa vossa infeliz Morta.
Atirae-me e esquecei-vos ()'esse õia,
Que eu não quero Õeixar-vos um Ôesgosto . .
Esquecei o meu riso, a voz, o rosto . . .
Essa máscara alegre que illuòia,
E quanòo não houver, emfim ninguém
Que o meu nome recorde ou me lamente,
Vós vereis arrastar-se, lentamente,
Caminho ò'essa vala, uma velhinha,
Carregaõa õe flores — coitaòinha. . . —
E chorando por mim — a pobre Mãe !
Maria Velleôa. Almanach das Senhoras, para 1903,pag. 123.
D. VIRGIiNIA VITORINO
Desta inspirada Poetisa, auctora ôo soneto Incerteza,
sei, apenas, o que a seu respeito õiz com justiça, O Século ^1
{edição da Noite)^ Ôe 4-6-1917 :
<Faz hoje a sua estreia literária, no nosso jornal, uma
Poetisas Portuguesas 277
nova poetisa, a sr.» D. Virgínia Vitorino, que, em plena
mociòaõe — tem apenas 20 anos — se Kveia na posse ôe
toòos os segreòos òa mais õificil õe toòas a formas poé-
ticas : o soneto. Desôe hoje é-nos licito contar, entre as
nossas ilustres cultoras òo verso, mais um talento, que é
uma autentica e raôiosa esperança».
INCERTEZA
Mentes-me muito sim. ]á m'o tens oito
E eu tinha-o já também aòvinhaòo.
Mas que me importa a mim esse pecaõo
Se té desculpo até, se te acreòito ?
Qual será ôé nós õois o mais culpaõo ?
Tu que mesmo a mentir és tão bonito,
Muôanòo em graça o teu maior õelito,
Ou eu, porque te tenho acreòitaòo ?
Tu vaes ôizenòo aquilo que não sentes ;
Eu anõo presa a ti, n'esta ancieòaõe
De saber o motivo porque mentes.
Enganamo-nos ambos sem pensar :
Tu a mentir, òizenôo-me a verõaôe,
Eu crendo em ti, mâí8 sempre a õuviòar.
Virgínia Vitorino, Século, (edição ôa noite) òe 4-6-1917.
D. LEOLINDA JARDIM VIEIRA
D. Leolinõa Jardim Vieira é natural 5a Ilha òa Madeira.
Poetisa e cantora de notáveis recursos, casou com o Dr.
"João José Vieira, jornalista e antigo director do extíncto
Diário Popular, do Funchal.
Esta Senhora foi uma das colaboradoras do livro Flores
da cMadeira.
278 Poetisas Portuguesas
NUM ÁLBUM
Nos jarõins mais formosos tão línõas vegetam
Alegres florinhas,
e vezes mãos ferinas a morte ôecretam
ás innocentinhas !. • -
Succeõe que nos montes nasce a flor inculta
e morre ignoraôa
na escarpa òe um outeiro, lá quasi sepulta,
mas não maltrataòa.
Tal como a flor Ôas serras, singela lembrança
Venho aqui õepôr, —
fraco penhor õe affecto, um signal õ'esperança,
ô'eternal amor.
Leolinõa JarÔim Vieira. Flores da Madeira.
D. ANGELINA VIDAL
D. Angelina Viõal é filha Òo notável maestro Joaquim
Casimiro e viuva õo meòico naval, Dr. Luiz Augusto ôe
Campos Viõal, faleciòo na Guiné em 21-7-1894.
Começou, bem ceòo, a sua carreira literária que tem siòo
sempre agitaòa, como a sua viòa.
Escriptora, Professora inscripta no Lyceu e no Conser-
vatório, Sócia efectiva ôa Associação ôa Imprensa Portu-
guesa, Sócia benemérita Òa Associação õos Trabalhadores
ôa Imprensa, Membro õe Honra õa Liga Internacional Po-
lonesa õos Amigos õa Polónia, etc, a obra õe D. Angelina
Viõal como escriptora, professora, jornalista, poetisa e ora-
Õora é invulgar e revelaõora Ôe profunôa eruõição.
Porém, Õe naõa lhe tem serviõo, praticamente, o seu
granõe talento e as inúmeras ôistinções que, em concursos
literários internacionaes, os seus trabalhos teem obtiôo.
Poetisas Portuguesas 279
Quantas vezes, na sua solitária resiôencia õa rua õe S.
Gens, acompanhaõa pelos seus fies companheiros — os
seus cães e por um ou outro õeõicaôo amigo —D. Angelina
Viòal ao ver-se ôesamparaõa e òoente, terá feito amargas
reflexões acerca ôos homens, ela que tanto trabalhou em
favor ôe uma humaniòaòe perfeita !
Não poucas vezes, por certo se terá lembraôo òa frase
õo granõe Affonso õe Albuquerque.
D. Angelina Viôal foi proprietária e reòactora dos jor-
naes : Syndicato, Justiça do Povo e A Emancipação.
Colaborou no domingo JHustrado, Bocage, Partido do
Povo, O Tecido, A Lii^, O Trabalho, Partido Operário, Lu\
do Operário, Constructor, Liberdade, ^Vulcão, Marselhesa,
Tribuna, Officina, Vo{ do Trabalho, Vanguarda, Alma Fe-
nina, A Chronica, Gabinete dos Reporters, Livre Pensamento
(Maõriõ), Diário Metallurgico, Revolução, Caixeiro, Com-
mercio de Lisboa, Vo{ do Operário, etc, etc.
D. Angelina Viôal é auctora õos poemas : Liberdade,
Morte de Satan, O Marque^ de Pombal á lu^ da philosophia,
O Ultrage, Semana da Paixão, consagrado á rainha D.
Amélia (braõo eloquente a favor òos marinheiros conõe-
mnaõos), A noite de espirito, ôeòicaôo a ]oão Òe Deus, e
premiaòo num concurso internacional ; ícaro, igualmente
premiado num concurso realisaôo no Rio Qranòe õo Sul ;
Nas florestas da vida {{a propósito Õa catástrofe ôe Cour-
rières), Lisboa, 1906 ; Jesus no templo e Espiraes de dor.
Por almanachs e jornaes anõam ôispersos um sem nu-
mero õe suas poesias, que ôariam um valioso volume.
Em prosa, alem õe inúmeros artigos em que tem versaõo
quasi toõos os ramos ôos conhecimentos humanos, é au-
ctora õos aômiraveis Contos de Crystal e Contos negros,
que só por si bastariam para noutro paiz em que a litera-
tura fosse amaôa, consagrarem quem os architectou.
Para o teatro, escreveu esta notável Senhora : Caminho
errado, comeõia em 3 actos, em verso ; Castigar os que
280 Poetisas Portuguesas
erram, iõetn, iòem, em prosa; Nobresa d'alma, Licção Mo-
ral e Conselheiro cocado.
Ao terminar estes singelos ôaõos biográficos, tenho es-
perança que ainòa surgirão melhores òias para D. Angelina
Viòal que, por certo, não será esqueciòa principalmente
pela Associação òa Imprensa e por aqueles a quem o seu
granòe coração e elevaòo espirito sempre beneficiou.
CONFRONTO
<Pae, porque me abanòonas?» exclamava
O ôoce Nazareno agonisante,
E seus olhos sem luz na luz filava
Do paternal império Deslumbrante.
Mas õo céo impassível não baixava
O rocio ôa pieõaõe ; e Òo semblante
Da victima serena, ôeslisava
A supplica õe um pranto soffocante.
Deus, o cúmplice horrível ò'este crime,
Deixava-o espeòaçar, qual branòo vime
Que o tufão colossal prosta e retalha.
Mas eis, n'este momento, junto á cruz.
Alguém chorava a òôr ôo bom Jesus ;
Era um paria infamaòo, era a canalha i
Angelina Viòal. Almanach Republicano, para 1880 (6 '
anno) pag. 99.
CANÇÃO DO ENGEITADO
Sem ter ninguém eu anôo assim
Sempre a mau trato, ao sol ao frio
Enfermo ou são, ninguém sentiu
Um só carinho ou ôôr por mim.
Poetisas Portuguesas 281
Amos, ganhões, ovelhas, cães,
N' esses cazaes e choças varias,
Almas christans ou alimárias
Toõos são filhos- . teem mães !
Trigaes òo campo, aguas õa fonte
Cepas, ginjaes, pinheiros, tilias
Ouvi Õizer que têm famílias. • •
Eu nunca a tive, eu anõo a monte. .
Levanôo as cabras n'esses trilhos
Passo por baixo Ôos pomares,
E penso então, toòo em pezares :
A flor é mãe, os fructos filhos.
Beijos õe mãe, como serão ?
Era Òe peòra a mãe que tive ?
Ai ! se eu soubesse onõe ella vive
Guarõava-a aqui, no coração.
Quanõo recolho á noite os bois
Peço, a chorar, a caõa estrella ;
Dize, onôe está ? Só quero vêl-a,
Chamar-lhe mãe morrer õepois !
Angelina Viòal. Lisboa, Novo Almanach de Lembranças
Lu^o-'Brapleiro, para o anno õe 1908, pag. 54.
A PENA DE MORTE
Sou õemocrata e mãe ; procuro um norte
De Liberõaõe e Gloria !
Aceito essa revolta ardente e forte
Que faz tremer a Historia,
Porem conòemno o imman õesvario
Que mata a sangue frio !
Angelina Viõal. Vi^eu Ilustrado, pag. 201.
282 Poetisas Portuguesas
VISCONDESSA DE VILLA MAIOR
(d. SOPHIA de ROURE AUFFDIENER PIMENTEL)
A sr.* Visconõessa ôe Villa Maior nasceu em Lisboa, a
17 òe março ôe 1821.
Era filha õe D. Emilia Auffòiener e òe João õe Roure.
Esta ilustre Dama foi casaõa com o Visconde òe Villa
Maior, Júlio Máximo ôe Oliveira Pimentel, reitor òa Uni-
versiôaôe ôe Coimbra e auctor ôo Douro lllustrado.
Esta Poetisa foi mãe Ôa sr.» Marqueza ôe Bellas e Ôe
Emilio Pimentel que fez as estampas com que seu pae or-
nou o livro citaôo.
A Senhora Visconõessa ôe Villa Maior escreveu um livro
muito interessante e que foi aprovaôo pelo Conselho ôe
Instrucção Publica — Poesias lyricas selectas de Lui^ de
Camões (1876). A esta obra se refere Seabra ôe Albuquer-
que na Bibliographia da Imprensa da Universidade, ano
Ôe 1876.
De D. Sophia ôe Roure Auffòiener Pimentel fala O Par-
naso Mariano, coli9Íôo por Abilio Augusto òa Fonseca Pinto,
Conimbricense muito ilustre.
A SENHORA DA AGONIA
Vós, Senhora ôa Agonia,
Dos homens consolaôora,
Tenôe ôó ôa peccaôora,
Oh Virgem Sancta Maria ! •*
De luz carecem as flores ;
Sem luz extingue-se a viòa ;
O iris Òe paz promettiõa
Sem luz não tivera cores.
Sem a graça, luz formosa
Das almas, tuòo era pranto
No munôo. A luz e o encanto
D'esta terra tembrosa.
Poetisas Portuguesas 283
Ella em negra escuriôaòe,
Ella, a canòiõa Joanninha
De mal ò'amor se definha,
De longa acerba sauõaõe.
Dae, Senhora ôa Agonia,
Dae á triste luz e esp'rança ;
Dae-lhe ôias Õe bonança
Oh Virgem Santa Maria !
Sophia Pimentel. Parnaso Mariano, 2.» eòição, Coimbra,.
1890, pag. 100.
D. AMÉLIA DE GUIMARÃES VILLAR
D. Amélia õe Guimarães Villar é filha ôe D. Margariòa
Guimarães Villar e õe José ]oaquim Marques Villar.
Nasceu na freguezia õe Victoria õa ciõaõe õo Porto, em
6-10-1890.
Em 1908, principiou a escrever algumas quaõras, no se-
manário õe Aveiro, Os Successos.
Para satisfazer a vários peõiõos, tem colaboraõo nos
jornaes : A Vo^ do Leça, A Scenielha, A manhã, A madru-
gada, A semana lllustrada e Pontas de Fogo.
Em 1909, publicou esta Õistincta Poetisa, o seu primeiro
livro Õe versos — Tímidas Aspirações, que está exgotaõo,
bem como o seu monologo, Um mau engano, eõitaõo em
1910.
Em 1916, apareceu o seu livro õe poesias Lagrimas, pre-
faciaõo pelo ilustre poeta Campos Monteiro.
Este ultimo trabalho também teve o mais elogioso aco-
lhimento feito pelos principaes jornaes õo norte, entre os
quaes mencionarei : O Primeiro de Janeiro, Cotnercio do
Porto, Jornal de Noticias, etc.
O soneto Miragem, que figura nesta Antologia, é copiaõo
1 õo livro Lagrimas.
284 Poetisas Portuguesas
Em 1916, obteve o soneto a que me refiro, num concurso
poético realisaõo pelo Correio Literário^ õe Lisboa, o pri-
meiro premio, entre 175 concorrentes.
VERSOS
No teu peito ao meu amor
oeste guariõa.
Amo-te mais que ao munõo.
E's minha viòa.
Repara : — O amor que sinto
No meu peito,
E' o mais louco, o mais puro,
O mais perfeito.
Amélia õe Guimarães Villar. Tímidas Aspirações.
MIRAGEM!
Vejo-te em toòa a parte, a toôo o instante l
Teus lábios a sorrir, nesse sorrir
Que sabe comover e confundir
Meu coração num goso Delirante.
Vejo-te em sonhos, vivo, tam flagrante.
Como uma rosa Õ'ouro a reflorir ! - . .
Vejo-te em sonhos ! . Como é bom Òormir. . .
Miragem tam sublime e tam amante !
E vejo-te no mar n'esse quebranto
Da sua magestaôe e galharòia,
E nos lamentos ôos pesares seus !
E vejo-te no ceu, cheia Òe encanto !
Tam bela como os olhos Òe Maria !. . .
Tam pura como as lagrimas òe Deus !
Amélia òe Guimarães Villar. Lagrimas, Porto, 1919, pag.
52.
Poetisas Portuguesas 285
ADITAMENTO
I
D. FLORENCIA DE MORAES
D. Florencia õe Moraes nasceu em Vila Real.
E' filha õe D. Anna Pereira Òe Moraes e õe José Correia
õe Moraes.
Esposa õo Dr. Abel ]osé Fernanões, juiz ôo Ultramar,
D. Florencia õe Moraes tem estaõo, acompanhanõo seu
mariõo, em S.'» Antão õe Cabo-Verõe, em Pangin e em
Moçambique, onõe resiõe ha 8 anos.
E' auctora õe : "Vo^es da Índia (poema) e Fé e Vagar, pe-
quenos livros õe sonetos em alexanõrinos ; tem prompto, a
entrar no prelo, um novo livro õe versos. Em 1911, publi-
cou em Vila Real um pequeno opúsculo, em verso, Para
as crianças.
Tem colaboraõo na Aurora da Liberdade, Povo do Norte^
Districto de Dila Real, Novidades, Evolução, e nalguns jor-
naes õe Cabo-Verõe e Inõia.
Devo estes apontamentos á granõe amabiliõaõe õum pa-
trício õesta Senhora, o conheciõo e apreciaõo jornalista e
escriptor, Dr. Sousa Costa, auctor ôa Pecadora, Fructo pro-
hibido, Coração de mulher, Sempre virgem, etc.
SONETO
— O' meu paiz sauõoso, onõe ha poentes
õe sangue e õe viuvez em caõa outomno
em ti quero õormir o ultimo somno
õe amor e morte sob a cruz õos crentes.
286 Poetisas Portuguesas
E tu, coração meu, tem bem presente
as horas ôe sauôaõe e õe abanòono,
como um Õoente, occiòental outomno,
passaòas sob os inõicos poentes.
A noite e a viõa, esse mysterio enorme
que junto ao seio ôe ignoto òorme,
como o Iõeal que ôentro em nós habita,
vae ôum a outro polo, como os ventos,
na rosa colossal ôos pensameutos,
ôispersos pela abob^ôa infinita.
Florencia ôe Moraes. Vojes da índia.
^
!
:
índice
Pag.
Prefacio V a XV
Achioli {Maria Anna) — Chapinhanôo 1
Lar feliz 2
Agoas ( Virgínia da C. Silva) — Sauôaòe 4
Imaculada 5
Dormir, esperar 6
No Calvário espinhoso õesta viôa 6
Aillaud (Maria Cecília) — A' memoria õe meu caro
filho Manoel Matias Vieira 8
De colina em colina vagueanòo 8
Albuquerque [Anna de) — Sae-nos òo coração um
pranto arõente 10
Albuquerque {Mafalda Mousinho de) — Sombra .... 11
Sem remeõio 12
Por que te amo 13
/^quo animo! 14
Prece. 15
Um encanto 16
Albuquerque {Mecia Mousinho ie)— Depois òo baile* 18
* Esto lignal indica qao as poesias a que se refere tSo inéditas.
'^'^88 Poetisas Portuugesas
Occultas magoas 19
A' memoria ôe Freôerico Pinheiro Chagas.. 20
Alorna {Marquesa de) — Soneto 23
Soneto 23
Soneto. . . 24
Andrade (Mariana Angélica de) — A minha estrella. 26
Mysterios ôo toucaõor 27
Andrade (Marianna Belmira de) — A minha terra. . . 28
Araújo {Condessa de Almeida) — VUIancete 31
Villancete 31
Arriaga {Maria Christina de) — Um segreòo 33
Arthur (Maria Ribeiro) — A minha Pátria . 35
Athouguxa e Almeida {Maria Helena Jervis de) — De
rêve en rêve ^ 38
A lagrima 38
Reminiscência 39
A^iul — No anno ôe 1917 * 41
O outomno 42
Tu e só tu 43
Sol • 43
Balsemão ( Viscondessa de) — Misericorõia 45
Sapho 46
Uma paixão 46
Barbosa {Hortencia Paulina de Lima) — A pastora . 4»
Bastos (Maria Jacintha Teixeira) — O futuro * . . • • 49
Meu coração * 50
Batalha (Elisa Toscano) — Meu tormento 52
Anjinho infortunado 52
De volta ao Curral • 53
Blasco (Mercedes) — Bohemia 56
Casta 57
C«,u.o iMaria José, _ Mag5ale„a
^■'"■""' <^"""^''^'')- As palmas..
"^^"^K-S-'-''°-^
Poetisas Portuguesas^ 289
Belém (Ejilier ^,„a„c da Cu,,/,.^ , -
J= rosas ôa raSha ^' " '"'^ »^ Deus'. 58
Ç^ Creche 59
Para os orphãos..' .' ' 59
•"^''"Atír^.'^:"--«^^)-A„.Ma„;'::."
Lourdes "■ ^g
Ante uma caveira.'.".'.*.';; ' " ' 66
67
68
70
72
FÍor;qu7morr^7'^°''^"^ 75
Orphãs ■ j?
Minha sina ....'; 77
Pobre morta 77
Velhinho....: lo
Esquecimento. . ...'.* 81
Viôas Jj
Soffre-se tanto peia viôa 'fora! ." 82
Carvalho (Maria Amália Var de) a . ^ •
. , „ ^ ^' ~" A anõorinha . .
-^<eWra„co (Jo„,a ,e) _ Tristea .
astello Branco {Calharim Mmí„,„ j c-
"^"°ms^?í':?!'.::.«- -•-.';■ .■;■;;';.■.•
83
87
89
91
93
94
95
96
97
19
290 Poetisas Poriagueêas
Casiello Branco (Maria Figueiredo Feio Rebello) —
Fé* 100
A canção õo mar • 100
Castilho {Emitia Augusta de) — Visão 102
Castro {Cacilda Pinto Coelho de) — Nas ruinas õo
convento õe Almoster.. 105
O garoto õos olhos azues 106
Suposição 107
Célia Roma — Nuvens 110
Chaves (Laura da Fonseca) — Raciocínio õe criança 112
Soneto 113
O amor e o tempo 114
Atempo . 114
A morte õa Micas • • 123
Colaço (Branca de Gonla) — Nihil ! 116
Preluõio 117
Meu amor 118
Historia silenciosa 118
Peõinôo esmola 119
Colaço (Lia de Magalhães) — Os teus olhos * 120
Sem titulo * 121
Cunha (Maria da Conceição Pereira da) — Quaòras 123
Des vers faits a mon cceur ! 124 .
Cunha (Maria da) — Proemio 127
Cromo 127
O Infante òe Sagres 128
Meio òia 129
Virtuòes íeologais 129
Clauõia 130
Dolores (Soror) — A' senhora Marietla Gresti 13l|
Eduarda (Emilia) — N'um álbum 133"
Escareio (Júlia Eugenia Silva de Pereira Lúcio) —
O nosso amor . . . . : 1 -
Poetisas Porfuguesas 291
A um crucifixo 136
Peccaòora 136
Ferreira {Isabel) — Mãe 137
O pobrezito 138
P^erretra (Lui^a) — 19 Ôe Agosto 138
3 õe março 139
A creança e a Velhinha 139
Gamito [Maria IjabelJ — Palavra santa 140
Inverno 141
Velho 141
' ^:esta — Sauaaòe * 143
Dia D'annos 144
Estrella Do norte * 145
Gusmão (Júlia de) — Além 147
N'um jazigo 148
Ivalda — Semente pequenina 150
Quero sonhar 1 50
Janny {Amélia) — Aos annos Ôe minha mãe 154
Camará arôente 155
Soneto 156
JAma {Gertrudes Ferreira) — Sauôação 159
Lucena {Albertina de) — Já tarde . . . . , 162
Lupi {Tiertha) — Distrahiòa 163
Ao espelho cruel 164
Macedo {Clorinda Máxima de) — Um quaôro 165
Machado {Alda Guerreiro) — Sauòaôe 167
D. Henrique * 168
Nuno Alvares * 1 69
Duarte Ôe Almeiôa * 169
Egas Moniz * 170
'aia {Emilia Adelaide Moni^ da) — Autografo ôe
Gonçalves Dias * 173
r,
292 Poetisas Portuguesas
Dôr suprema 174
O amor òe Deus 174
Meu Deus, meu Deus, porque me abando-
naste? 175
oMagalhães {Cândida Ayres de) — Riso para os ou-
tros 177
MociÕaÕe 177
Lagrimas 178
Sauõaôe 179
^Maldonado {Marianna Antónia Pimentel) — A' Grã
Bretanha 180
Mello {Zulmira de) — Somnambula 1 82
Phantasia.. 183
A' beira-mar 183
Mendonça {Maria José Furtado de) — O rei õe Thule 184
Miranda {Arsenia Bettencourt) — Anhelos 187
Moderno Alice — Miniatura 189
Lagrimas 189
Creanças 189
Nogueiras {Viscondessa das) — Uma noite ôe luar.. • 191
Ondina — Pombas feridas 193
(JNeill {Maria) — Flirt * 199
O que só termina com a morte 199
Um sonho 200
Após uma jornada ô'amargura 200
Pacheco (Águeda Leonor Alvarrão) — Porquê ? . . . . 202
Trovejando 202
'Pacheco {Guilhermina Alvarrão) — A tarde 204
Pacheco Simões (Maria José Alvarrão) — Novas al-
voradas 206
Fragmentos do Hernâni. 208
Paraií^o {Albertina) — A minha mãe • . • 211
Poetisas Portuguesa;^ ^'ií%,293
Mares 211
MaÕona 212
Naufrágio • 212
Dolorosa 213
'Parreira (Maria Cândida de Bragança) — Lembras-
te? . 214
Suplica .... 215
SauôaÒe 215
Patrício [Maria Magdalena Valde^ Trigueiros de Mar-
te!) — Lheure rouge 219
Oraison aux õentelles. 219
Peixoto (Maria do Canuo) — Deixae que eu sonhe. 220
A uns olhos 221
Pereira (Eugenia Rego) — Ao cair õa tarõe . j • . . • 222
Echos que passam 223
Pereira {Lui^a Maria) — Tributo ôe sauôaõe 224
Pereira [Maria da Costa) — A minha irmã 225
Pinheiro [Beatri^) — Crisálida. 229
Hino ao sol 229
A',memoria ôo poeta õas «Peninsulares» Dr.
Simões Dias 230
Plácido {Anna Augusta) — Malõita ! 234
A Camillo Casíello Branco 235
Pomares [Marquei(a de) — SauÒaòe 237
Possolo [Francisca de Paula) — Juramento õe amor 238
Epistola 239
Prata [Maria Adelaide Fernandes) — O filho ôe Deus 240
Pusich [Antónia Gertrudes) — MaÔeira 243
Ratnos [Clotilde '%afaela de 'Bataria) — Quaõras- . 246
Ramos [Maria Carolina) — Quaõras 247
294 Poetisas Portuguesas
Ramos (Zulmira) — Maio 248
Rego Sénior (Emilia Acciaioly) — O arco iris 249
Reis [Maria Leonor) ■— Assim te foste ! 251
Assim te poões ir 252
Sá {Anna Amália Moreira de) — Sauõaõe 254
Santiago (Esmeralda de) — Outr'ora 255
Hoje 256
Santos {Rosalinda Celeste de Figueiredo)— Vomhzs* 257
Ao meu Rui * 258
Silveira [Maria Olga Moraes Sarmento da) — Never
More 261
Serrão [Eiva da Cunha) — Soneto 262
Soneto.. . 263
Souja [Maria Perigrina de) — Parábola òa minha
viôa 264
Torre^ão [Guiomar) — A minha mãe 266
Varela [Rosa) — Lei universal * 267
Provações õa viõa 268
Desventura 268
Vasconcellos i Maria da Gloria Teixeira de) — Pri-
meiros cuiòaòos 269
Soneto 270
FíTf [Maria Amélia) — Mortinha . . • . 271
oxioriniT OjIioíoiT -rrO oiiorínil otc'/,'
aitnEÍfit ?.n\\6 ;?itnf.'lní í>rX-/-
Poetisas Portuguesas
295
Vidal (Q^ngelina) — Confronto 280
Canção Ôo engeitaòo. • . . . > 280
A pena õe morte 281
Villa Maior (Viscondessa de) — A Senhora õa Ago-
nia 282
Villar (Amélia de Guimarães) — Versos 284
Miragem , . 284
ADITAMENTO
Moraes (Florencia de) — Soneto . . .
285
ERRATAS PRINCIPAES
Pag.
onde sele
deve ler-se
7
Metestasio
Metastasio
15
Doixae-me
Deixae-me
52
Só teus
Só tem
56
ez
fez
74
D. Domilla
D. Domitilla
160
Õos filhos Peõro
õos filhos Ôe Peõro
217
moyeu
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219
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PQ Cardoso, Nuno Catharino
9033 Poetisas portuguesas
C3
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