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Full text of "Profecia politica, verificada no que está succedendo aos portuguezes pela sua céga affeição aos inglezes: : escrita depois do terremoto do anno de 1755, e publicada por ordem superior no anno de 1762, em Madrid."

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í 


PROFECIA 

POLITICA, 

Verificada  no  que  está  succedeíicfo 
aos  Portuguezes  pela  sua  eéga 
affeiçao  aos  Inglezes  ; 

Escrita  depois  do  Terremoto  ão  ànno 
de  i7$5->'e  publicada  por  jrdem 
superior  no  amo  :de  176a  %  em 
Madrid. 

-Traduzida  do  Hespai<fkòl. 


Augurium  ratio  est  &  conjectura  fotirri. 
Ovni.  Trist.  L.   1.  EU&  -t. 


'ma 


LI  SB  O  A, 

-"Na  Typo3RAFia  Rollanbiaha« 
1  8  o  8. 


^.L 


rjmmA 


(3) 

.A  D  VER  T  ENCIA 

DO 

EDITOR  «ESPANHOL..-  : 


J.  endo  chegado  ás  minhas  rnaos 
este  escrito  por  huma  rara  casua- 
lidade ,  o  puncipieia  lêrsem  mais 
objecto  que  o  da  minha  própria 
instrucçaõ  ?  crendo  mô  açha-r-nel- 
le  senaó  huma  relação  simples  ,  e 
nua  dos  dam  nos  que  causou  o  ter- 
remoto de  175-5-  era*  Portugal,  e 
algumas  reflexões  vagas  sobre  © 
seu  governOo  Fiquei  porém  adrni- 
redo  de  vêr,  contra  o  que  espe- 
rava j  quaõ  bem  discorre  seu  au- 
íhor  sobre  o  systêma  politico  dá- 
quelle  reino;  descobrindo  a  raiz, 
e  causa  de  todas  as  suas  misérias^ 
e  demonstrando  naõ  terem  estas 
a  sua  origem  no  physicó  dos  seus 
-contratempos  ,  mas  sim  no  dama© 


,  ^L 


I 


I 

1 


moral  da  sua  constituição  ,  que 
mo  he  outra,  senão  a  dedeixsr- 
se  cegamente  governar  pelos  In- 
glezes  ;  sem  reparar  que  estes  lhe 
vendem  a  sua  protecção  a  preço 
d'huma  escravidão,  como  o  temos 
visto  bem  comprovado  no  mani- 
festo que  ultimamente  se  dêo  á 
iuz  por  ordem  da  nossa  Corte. 

-Deste  principio  inferio  o  su- 
thor  ,  ha  seis  itmos  ,  todos  os 
damnos,  e  calamidades  que  neces- 
sariamente deviaõ  resultar  a  Por- 
tugal ;  c  que  por  desgraça  desta 
monarquia  sevanjá  verificando.  O 
que  me  move©  a  publicar  este  es- 
crito ,  com  o  titulo  de  Profecia 
Politica  ,  verificada  no  que  está  sue- 
cedendo  aos  Portugueses  pela  sua 
cega  affeiçati  aos  Inglezes ,  &c. 


cr) 


p"R-  E  F  AC1& 


Jtl  pezar  de  ter  o  reino  de  Por- 
tugal feito  hum  grande  papel  na 
Europa  desde  o  finado  reinado  de 
D.  Pedro  II. ,  sem  embargo  naõ 
se  conhecerão  com  individuação  os 
negócios  desta  monarquia.  A  Provi- 
dencia me  conduzio  a  este  reino  no 
anno  de  1752.,  &  desde  log.pcn.a- 
char-me.no -centro  da  desordem  po- 
litica da  Europa..  Vi  huma  monar- 
quia anniquilada  por  huma  serie 
contínua-  de  revoluções,  pertur- 
bada com  oçcultas.  seitas ,  c  em- 
pobrecida pelas  suas  próprias,  ri- 
quezas. 

Hum  povo  privado  da  devi- 
da instrucçaõ :  huma  nação  cujos 
costumes  a  fazíaõ  pouco  civilisa- 
da :  hum  estado  governado  por  usos 
asiáticos , .  naó  tendo  de  Europeo 
mmê  o  nome  ,  de  monarquia  se- 


■w^n-íi 


í 


í 


I 


(6) 

naó  a  forma,  e  de  potencia  senão 
a  sombra. 

O  que  porém  tinha  mais  des- 
truido  este  estado  no  nosso  sécu- 
lo, era  a  cega  confiança  que  tinha 
n'huma  naçaõ  ambiciosa  ,  cobiço- 
sa da  grandeza,  e  do  poder,  que 
ofterece  ao  principio  humamaõ 
para  soccorrer ,  e  que  opprime  de- 
pois com  huma  infinidade  de  bra- 
ços. 

A  Inglaterra  desfrutava  por  in- 
teiro as  minas  de  ouro  do  Bra- 
sil;  e  Portugal  naõ  era  mais  que 
o  ecónomo  das  suas  próprias  ri- 
quezas. Este  estado  se  via  cheio 
de  Inglezes  opulentos,  que  pos- 
suiaõ  todas  as  riquezas  do  Reino, 
e  nada  ficava  aos  Portuguezes  de 
propriedade,  &c. 

Finalmente  as  causas  physi- 
cas  concorrerão  com-  as  moraes  : 
os  elementos  suppríraõ  ao  que 
mó  alcançou  a  politica  ,  abrio-se 
a  terra,  e  destruio  os  que  a  des- 
truiaó.. 


4Èk-KZ2 


Isto  supposto,  digo  r  que  o 
Reino  de  Portugal  pode  tirar  hu- 
ma grande  vantagem  das  suas  des- 
graças ;  e  somente  para  provallo, 
se  compoz  este  discurso. 

Acaso  haverá  quem  julgue  que 
be  mui  succinta  a  relação  do  ter- 
remoto ,  que  serve  de  appendicej 
mas  persuado-me,  que  para  satis- 
fazer a  ânsia  que  tem  a  Europa 
de  huma  noticia  individual  deste 
successo  ,  basta  pôr-lhe  á  vista  os 
factos ,  tendo  podido  fazer  alguns 
volumes  ,  do  que  reduzo  a  pou- 
cas folhas. 

Que  espectáculo  da  vicissi- 
tude das  cousas  humanas  nao  offe- 
rece  á  vista  hum  Reino  inteira- 
mente trastornado  ,  huma  capital 
sepultada  nas  suas  próprias  ruinas, 
milhares  de  casas  abrazadas  ,:_  hum 
povo  inteiro  entregue  ás  chamas, 
quarenta  e  cinco  mil  pessoas  mor- 
tas~~repentinamente  ,  destruída  a 
fortuna  de  duzentos  mil  vassallos, 
e  por  fim  huma  perda  immensa  ,  e 
quasi  incomprehensi vel ! 


i 


(8) 
A  imaginação  naõ  tem  de 
trabalhar  ,  porque  todo  o  trabalho 
he  da  penna;  o  mal  está,  em  que 
nesta  espécie  de  relações ,  que  pa- 
recem exageradas,  costuma-se  sa- 
crificar o  principal  ao  accessorio; 
eu  porém  reduzi  este  suecesso  ao, 
suecesso  mesmo. 


(9) 


DISCURSO  POLITICO. 

Das  utilidades  que  Portugal ,  pode- 
x      ria  tirar  das  suas  desgraças 

JN  em   sempre    he  a    politica   a 

-causa  única  das  revoluções  dos  es- 
tados.-Terríveis  fenómenos  mudaõ 
Ás  vezes  a  face  dos  impérios.  Pó - 
de-se  dizer  ,'/  que  ás  vezes  estas 
irregularidades  da  natureza  sao 
precisas  ?  ^ porque  podem  contri- 
buir mais  que  qualquer  outra  ^ou- 
sa á  destruição  de  certos  syste- 
mas ,  que  se  dirigiaó  a  invadir  o 
universo. 

Se  os  .governos  ambiciosos 
(■fatio  dos  que  tudo  referem  a  si 
próprios ,  que  vendo-se  sós  no 
mundo  ,  naõ  tem  outro  objecta', 
senão  empobrecer  a  todos  univer- 
salmente ?  nem  outro  principio,, 
senão    a    dominação   gerai.)  naõ 


■■i  ■■ 


1 


fossem  commummente  impedidos 
por  causas  physicas  ,  converter- 
se-hia  a  terra  n'huma  mansão  pe- 
rigosa. Entaó  poderia  a  politica 
íazer-se  senhora  absoluta  do  mun- 
do :  os  estados  fracos  ficariaõ  sem 
recurso  algum  ;  o  povo  que  che- 
gasse a  ser  superior  a  outro,  con- 
servaria sempre  a  superioridade  : 
entre  este  estado  ,  e  o  da  monar- 
quia universal,  naõ  mediaria  in- 
tervallo  algum  :  creio  que  em  cer- 
to período  de  tempo  seria  escra- 
vos globo,  da  terra  :  tudo  se  per- 
deria entaõ,  e  todos  os  governos 
seriaõ  anárquicos. 

Fallando  somente  dos  meios 
políticos  ,  com  independência  das 
causas  extraordinárias,  he  en  cer- 
to modo  evidente  ,  que  hum  es- 
tado, ao  qual  outro  chegou  a  ser 
superior  ,  naõ  torna  a  si  quasi 
nunca.  Procede  isto  dequeosys- 
tema  geral  da  Europa  se  funda 
sempre  na  vantagem  actual ;  e  que 
o    estado    que  chegou  a  adquirir 


(  M  > 
esta  vantagem ,  augmcntãtião  as- 
sim as  suas  forças  verdadeiras  ,  e 
relativas,  chegada  vêr-se  em  cir- 
cunstancias de  nao  perdella  nun- 
ca. 

Parece  que  na  politica  somen- 
te existe  no  nome  a  moderarão. 
Os  soberanos  costumaõ  querer  ser 
sempre  tudo  o  que  podem  ;  e  pou- 
cos exemplos  ha  de  que  podendo 
hum  estado  ser  superior  a  outro  f 
o  rraõ   tenha    feito. 

Por  maia  que  se  estabeleça 
para  todas  as  nações  hum  direito 
de  gentes  politico-,  e  civil,  go- 
vernará seaipre  Doiundo  entre  os 
homens  a  lei  do  mais  forte;  por 
isto  disse  hum  dos  grandes  poe- 
tas do  nrçsso  -século  : 

O  primeiro  -Rei  ã$  mundo  foi 
hum  Soldado^  nas  suas  empregas  sem- 
pre afortunado. 

-Masaistodirád:  O  que!  he 

preciso  que  se  abra -a  terra,  que 

■trastorne  províncias,  que  sepulte 

cidades  inteiras,    para  dissipar  a 


í 


I 


cegueira  de  algumas  nações  5  c 
tSar-lhes  a  conheceres  seus  verda- 
deiros interesses  ?  Sim  ,  sem  temor 
o  digo,  he  necessário  por  algum 
modo.  Parece  que  ainda  nos  ele- 
mentos ha  huma  espécie  de  ins- 
tincto  ,  para  impedir  que  certos 
povos  ambiciosos  se  apoderem  da 
terra.  Vcja-se  como  a  physica  tor- 
na a  estabelecer  ás  vezes  certo  ni- 
vcl  nos  negócios  poliricc  s. 

Com  amicipsçaô  de  muito 
tempo  minava  secretamente  huma 
tiaçaõ  ambiciosa  o  poder  de  seus 
visinhos  j  a  sua  industria ,  e  o  seu 
commercio  lhe  tinhaõ  adquirido  a 
superioridade  sobre  muitos  esta- 
dos. Huma  maravilhosa  ,  e  bem 
combinada  polirica,  que.guiava  to- 
tíos  os  seus  desígnios,  a  tinha  in- 
sensivelmente, elevado  ao  poder 
supremo  por  veredas  extraviadas  • 
preoceupaçoes  de  moderação  que 
tinha  sabido  estabelecer  ;  hum  sys- 
tema  de  pacificação  com  que  tinha 
deslumbrado  os  olhos;  as  immen- 


mm* 


C  r?0 

^as  riquezas  do  Brasil  que  pos- 
suía inteiramente  ;  huma  forte  ma- 
rinha  ;  o  adiantamento  das  artes; 
o  estado  florecente  das  .ena  nu  fac- 
turas :  N  estes  saõ  os  <  instrumentos 
de  que  se  sérvio  para  dominar  va- 
i-los povos. 

Já  tinha  tudo  disposto  para 
cativar  parte  da  Europa  ?  quando 
o  fenómeno.. acontecido' em  Portu- 
ga! frustrou  todos  os  seus  projec- 
tos. 

Mas  huma  perda  de  mais  de 
sessenta  milhões  de  cruzados  ,  a 
suspensão  das  artes  ,  e  das  fabri- 
cas, como  também  a  interrupção 
das  riquezas  do  Brasil,  acabaõ  de 
atrazar  pelo  menos  hum  século  a 
dominação,  a  que  se  vê  que  aspi- 
ra -a  Inglaterra. 

Poderia  pois  a  politica  só 
ter  diminuído  até  este  ponto  as 
forças  deste  reino ,  e>ver-se-hia  res- 
tabelecido sem  este  fenómeno  o 
equilíbrio  da  Europa  ?  Na  verdade 
era  quasi. indispensável  hum  acon- 
tecimento .extraordinário. 


s 

* 


J 


( 14) 

Deve  suppôr-se  como  regra 
geral ,  que  os  abusos  introduzidos 
n'hum  governo  desordenado  por 
espaço  de  muitos  annos  ,  destroem 
insensivelmente  a  sua  constituição, 
e  regularmente  corrompem  todos 
os  ,seus  princípios  :  o  caracter  da 
naçaõ,  que  segue  sempre  o  sys- 
tema -geral,  se  une  com  os  seus 
vicios  políticos :  os  estados  estran- 
geiros ,  que  occasionaõ  esta  des- 
ordem, querem  aprovei tar-se  dei- 
la  ,  augmentando-a  continuamen- 
te ,-e-o  mal  chega  a  naõ  ter  re- 
médio. 

Quando  os  principies  d'hum 
estado  chegarão  a  corromper-se  , 
saõ  quasi  inúteis  as  novas  leis.; 
porque  a  reforma  do  primeiro  abu- 
so he  sempre  a  origem  d'outro  a- 
buso;  e  por  mais  que  se  faça,  só 
se  consegue  trocar  hum  mal  por 
outro  mal,  e  subsiste  sempre  a  cau- 
sa da  desordem  do  estado.  Como 
este  governo  se  acha  n'huma  si- 
tuação precária,  quantos  tratados, 


(ir) 

e  quantas  negociações  fazem  com 
elle  os  outros  estados  ,  se  conver- 
tem sempre  em  seu  prejuízo  ,  ca- 
da qual  se  aproveita  da  sua  fra- 
queza ,  e  he  o  alvo. a  que  atiraõ 
todos  os  estados  da  Europa.  Hum 
governo  pois  que  se  acha  nesta  si- 
tuação ,  e  que  ameaça  ruina  por 
todas  as  partes  ,  naõ  pode  deixar 
de  tirar  muita  vantagem  d%uni  tras- 
torno.y  ou  d'fautáa  revolução,,  e 
quiçá  he  d  único  remedia  que  lhe 
fica  para  renascer  das  suas  pró- 
prias cinzas  :  assim  como  as  en- 
chentes dos  rios  que  trasbordaô, 
saõ  algumas  vezes  necessárias  para 
fazellos  tornara  entrar  no  seu  lei- 
to natural,  donde  íinhaõ  safa  ido  , 
assim  também  ha  casos  em  que  pa- 
ra restabelecesse  hum  estado  ,  he 
preciso  quedem  parte  se  anniquile,, 
e  que  isto  seja  por  meio  de  algum 
acontecimento  extraordinário. 

Succedido  o  fenómeno  ,  der- 
rama-se  huma  nova  luz  nos  enten- 
dimentos .  ,■  e  destruídas  as  preoccu* 


i 


N 


(76) 

pações  por  meio  do  golpe  funes- 
to experimentado  no  governo  po- 
litico ,  e  civil  ,  descobrem-se  as 
-desordens,  que  o  costume,  e  á  se- 
rie de  huma  infinidade  de  causas 
estranhas  com  que  estavaõ  unidas, 
naõ  deixavaó  ver. 

Naó  estamos  já  naquelies  sé- 
culos^ em  que  os  legisladores  mu- 
davao  a  constituição  dos  estados 
corruptos  com  a  força  só  do  seu 
entendimento. 

Como  cada  nação  formasse 
então  hum  ^mundoá  parte  ,  ou  por 
melhor  dizer,  como  cada  estado 
se  considerasse  a  si  mesmo  só  no 
universo,  e  que  o  systemad'buma 
naçaõ  fosse  unicamente  relativo  a 
ella  mesma.,  achava  o  legislador 
grande  facilidade  para  a  reforma. 
Mas  depois  que  se  unio  comsigo 
mesmo-a  Europa  ;  isto  he^  depois 
que  os  interesses  políticos  d'hum 
estado  viérao  a  ser  os  interesses 
políticos  d'outro  estado,  abrirão 
os  olhos  todos  os  governos  sobre 


(17)  :.;  ' 

r  menor  mudança  que  medite  fazer 
qualquer  dos  seus  visinhosj  e  co- 
mo os  vicios,  e  defeitos  dos  mais 
fracos,  entra õ  na  composição  da- 
quellas  cousas  que  contribuem  a 
formar  os  mais  fortes  y  resulta  que 
naõ  se  permitte  aos  estados  ,  e 
governos  fracos  sàhir  de  sua  fra- 
queza, e  debilidade,  porque  d& 
sua  mediania ,  ou  pequeno  poder 
depende  a  grandeza  das  mais  prin- 
cipaes  ,  e  poderosas  monarquias. 
Por  isto  hum  governo  corrupto* 
está  necessitado  a  naõ  sahir  dos 
limites  que  lhe  signala  a  sua  pró- 
pria desordem  ;  naõ  servem  para 
sahir  delia  os  meios  de  que  poder 
riaõ  valer-se  os  grandes  ministros: 
porque  o  mais  que  podem  fazer 
hoje  em  dia  ,  naõ  he  anniquilar  os 
vícios  do  systema  actual,  mas  sim 
usar  de  remédios  palliativos  para 
conter  a  desordem,  e  arrimar  hum 
espeque  á maquina,  (  permitta-se- 
me  esta  expressão  familiar)  para, 
que  naõ  se  desfaça  totalmente^.  £: 


i 


I 


(  18) 
caia  por  terra ;  e  isto  succede  por- 
que huma  multidão  de  causas  com- 
plicadas ,  e  accidentaes  ,  que  nem 
saó  da  sua  inspecção  ,  nem  está  em 
sua  maõ  desviallas  ,  os  fazem  pa- 
rar, e  lhes  tirão  a  liberdade  de  o- 
brar  de  mil  maneiras. 

Hoje  em  dia  tudo  he  com- 
binações na  politica  ,  e  o  que  neu- 
tro tempo  se  chamava  grandes  ras- 
gos de  estado  ,  ou  de  politica  , 
naõ  he  a  propósito,  nem^ervede 
cousa  alguma;  e  naõ  occorrendo 
algum  acontecimento  extraordiná- 
rio, huma  monarquia  que  se  vio 
huma  vez  abatida ,  permanece  aba- 
tida para  sempre. 

Cromwel  ,  e  Richelieu  se  ve- 
riaõ  hoje  em  dia  precisados  a  pa- 
ramos primeiros  passos  ,  naõ  obs- 
tante o  seu  grande  talento ,  e  ca- 
pacidade ;  e  por  mais  que  medi- 
tassem com  madureza  os  seus  pro- 
jectos, e  preparassem  as  suas  má- 
quinas ,  logo  se  descobririaõ  os 
seus  desígnios  ,  e  a  sua  politica  ;e 


is  suas  '  primeiras  tentativas  frudò 
se  levantaria  contra  elles  para  fa« 
zellas  inúteis,  e  aquellesdous  su- 
blimes entendimentos  seriaõ  mui 
pouco  a  propósito  hoje  em  dia  pa- 
ra os  gabinetes  dos  príncipes.  Já 
naó  assassina  a  politica ,  mas  ma- 
ta lentamente :  hoje  todo  gover- 
no mina,  ouhe  minado;  e  geral- 
mente fallando,  o  mal  vem  sem- 
pre de  longe  :  do  mesmo  modo 
como  succede  com  aquellas  enfer- 
midades inveteradas ,  que  quando, 
se  querem  remediar  ,  já  naó  he 
tempo. 

Hoje  em  dia  se  prepara  a  mi- 
na de  qualquer  estado ,  e  gradual- 
mente o  levao  a  ella  ,  subminis- 
trando-ihe  insensivelmente  os  meios 
de    destruir~se  y  de  maneira  que 


chega   a  arrumar-se-  com  arte 


Só 


a  politica  dos  antigos  Romanos 
opprimía  as  nações,  tazendo-as 
mostrar-se  no  mundo  em  todo  o  seu 
esplendor,  de  maneira  que  naó  co- 
nfaeciaõ  a  sua  própria  ruina  senaó 


I 


,  *<•** 


í 


i 


■ 

I 


quando  já  naõ  tinhaõ  remédio  pa- 
ra evitalla  ;  eis-ahi  em  duas  pala- 
vras qual   era  a  situação  de   Por- 
tugal antes  das  suas  ultimas  des- 
graças, principiando  pela  do  hor- 
rível fenómeno-,  que  foi  o  espan^ 
to,  e  a  admiração  da  Europa.  An- 
tes destas  desgraças   estava  já  a 
monarquia  Portugueza  nos  últimos 
extremos :  tinhaõ-a  oslnglezes  de- 
baixo da  sua  dependência ,  e  in- 
sensivelmente a  tinhaõ  conquista- 
do ,    sem  se  exporem  sos  riscos 
das  conquistas :  eçtavaõ  os  Porta* 
guezes    atados    ao    carro  da  po- 
litica   Ingleza  :    naõ    lhes  ficava 
meio  ,    nem    recurso  algum  para* 
romper  as  suas  cadeias,  e  em  vez* 
de     poder   rompellas  ,    fortalecia 
Portugal   mais  e  mais  cada  dia  as- 
que   o    sujeitarão-  ao  systema  da 
Grã-Bretanha. 

Jamais  puzéraõ  melhor  os  In- 
glezes  por  obra  a  máxima  que  os 
inclina  a  destruir,  ou  ao  menos  a 
debilitar  todos  os  demais  systemasr 


para  dar  forças  ao  seu.  Nao  tinha 
alma,  digamo-lo  assim,  o  gover- 
no Portuguez  :  estavaõ  os  seus 
membros  todos  sem  vigor:  cada 
parte  esperava  para  mover-se  que 
lhe  viesse  o  movimento  da  Ingla- 
terra ;e  n5huma  palavra ,  estava  tu- 
do sem  esperança,,  nem  remédio. 

■§.  i 

jás  cousas  physicamente  ■■necessárias 
faltavao  a  Pêrtugal. 


&  sessenta  "«mios  a  esta  par» 
t€  foi  o  grande  systemados  ingle- 
ses y  para  sujeitar  as  nações  que 
devem  contribuir  ao  seu  engran- 
decimento,  têlías  na  dependência 
das  cousas  physícas  necessárias.^ 
destruindo  a  sua  agricultura. 

O  methodo  de  que  se  sérvio  o 
governo  Inglez  para  este  fim  ,  por 
singelo  que  seja ,  naô  deixa  de  en- 
cerrar em  si  hum  systema  comple- 
to de  tyrannia ,  pois  indirectamen- 


í 


i 


m-wtlê* 


! 


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% 


te  se  dirige  á  monarquia  univer- 
sal. Este   methodo  pois  foi  o  de 
ofFerecer,  e  fornecer  aquellas  cou- 
sas em  que    consiste   a   primeira 
subsistência  dos  povos,  osquaes 
intenta  pôr  debaixo  da  dependên- 
cia ,    por  muito  menor  preço  do 
que  poderiaõ  elles  mesmos  têlias 
no  seu  continente.  Foi    Portugal 
o   que   primeiro   cahio  no    laço  , 
deixando-se  prover  das  cousas  mais 
necessárias  ,  e  desde  aquelle  pon- 
to   perdeo-se  o  seu  estada  civil  ., 
e  politico,    e  sahíraõ  as  suas  ri- 
quezas do  seu  domínio.  Resultou 
disto,  que  dependendo  esta  mo- 
narquia da  de   Inglaterra  para  as 
cousas  physicamente  necessárias,  se 
fez  sua  escrava  jj  aturai;  e  resul- 
tou também  ,  como  consequência 
necessária  da  escravidão,  reduzí- 
rem-se   a  nenhum  valor  as  terras 
de  Portugal,  e  achar-se  sem  pro- 
ducções   o   continente,  no  que, 
como  se  deixa  ver,  perdeo  o  es- 
tado muitos  milhões  na  cultura  das 


s 


(*3> 
terras:  deixou-se  de  semear:    dí- 

minuio-se  o  numero  de  lavradores, 
e  minora  cada  dia  esta  classe  de 
gente,  que  deve  reputar-se  como  a 
base  do  governo  politico,  e  civil; 
de  maneira,  que  as  colheitas  tem 
sido  escassíssimas  no  reino,  e  a~ 
bundantissimasem  Inglaterra,  aon- 
de os  Portugueses  levaõ  o  seu  di- 
nheiro. De  tudo  isto  nasceo  ,  que 
se  perdeo  a  harmonia  nas  ordens 
do  estado ,  o  equilíbrio  nas  classes, 
e  por  consequência  naõ  pôde  sos- 
tér-se,  faltando  o apoio principal, 
€  o  estado  recebeo  a  ferida  na  raiz 
a  mais  essencial. . 

Varias  vezes  ouvi  perguntar, 
porque  tendo  Portugal  tantos  meios 
de  ser  poderoso  ,  era  o  Reino 
mais  fraco  da  Europa  ?  Naõ  víao 
os  que  faziaõ  semelhante  pergun- 
ta ,  que  esta  monarquia  estava  en- 
tregue a  hum  povo  que  a  devo- 
rava ,  a  hum  povo  que  naõ  lhe 
deixava  cultivar  as  suas  riquezas 
^nacionaes,  e  qua  a  obrigava  a  cor- 


i 


wmtiM 


■i 

i 


i 


(*4)   ,  .,    , 

Ter  após  huma  riqueza  fingida,  da 
.qual  tirava  toda  a  utilidade  aln- 
glaterra. 

Naõ  tinha  Portugal  no  anno 
de  1754  mercadorias  de  sua  eo* 
íheita  :  naô  produzia  o  seu  terre- 
no senaõ  alguns  fructos  :  os  dous 
terços  das  cousas  physicamente 
necessárias  lhos  subministravaõos 
Inglezes  ;  e  a  tal  estado  tinhaõ-es- 
tes  reduzido  Portugal,  quequasi 

0  tinhaõ  conquistado,  sem  mani- 
festai lo  ;  demaneira,  quenaõlhes 
faltava  senaõ  tomar  posse,  cousa 
.que  teriaõ  executado  facilmente  , 
se  elles  naõ  tivessem  opposto  a  si 
mesmos  varias  considerações  par- 
ticulares ,  tiradas  do  systema  ge- 

01  da  Europa. 


r*5) 
§  ii. 

O  commèrèio  mniqullado  em  Pó?* 
tugãk 

Oênbòra  a  Inglaterra  do  coinmer- 
cio  dos  Portuguezes  9  passava  tu- 
do pelas  suas  mâõs  :  erao  os  In~ 
glezes  feitores,  e  abastecedores 
de  -Portugal ,  e  tendo-se  apodera* 
do  de  tudo^  naõ  havia  negocio 
algum  que  naõ  se -fizesse  pelo  seu 
canah  Desde  que  a  corte  de  Lon- 
dres tomou  taõ  grande  ascendente 
sobre  -a  de  Lisboa  ^  e  desde  que 
a  Inglaterra  se  derramou  (diga- 
mo-lo assiíti  )  em  Portugal  ,  nao 
■fora 6  outra  cousa  os  habitantes 
deste  reino  3  senaõ  huns  testemu- 
nhas ociosos  do  grande  commer- 
cio ,  que  se  fazia  em  sua  própria 
casa  ,  e  huns  tranquillos  especta- 
dores j,  que  naõ  fízeraõ  papel  ai- 
g*am  no  seu  próprio  theatro,  con- 
-eiitando-se  com  olhar  da  platêa 

B 


™rí* 


I 

i 

i 


i 


.  (  .»6  ) 

para  a  trágica  scena  da  sua  pró- 
pria destruição. 

Os  Ingiezes  iaõ  ate  Lisboa 
para  tirar-lhes  o  commercio  do 
Brasil.  A  carga  ,  e  o  sortimento 
das  suas  frotas  ,  eraõ  dos  Ingie- 
zes ,  as  riquezas  que  traziaó  á 
Europa,  o  eraõ  igualmente,  naó 
tendo  de  Portuguez  este  commer- 
cio  senaõ  o  nome  ;  e  entre  tan- 
to, naõ  obstante  o  immenso  com- 
mercio que  se  fazia  em  Portugal , 
se  debilitava  miseravelmente  es- 
te estado,  porque  todo  o  provei- 
to o  levava  a  Inglaterra.  Desap- 
pareciaõ  os  Ingiezes  depois  de  te- 
rem feito  a  sua  fortuna,  levanJo 
huma  grande  parte  das  riquc/as 
do  reino ,  o  que  o  empobrecia 
continuamente  y  pelo  que  tei  ia  si- 
do melhor  que  naõ  se  fizesse 
ccmmercio  algum ,  do  que  deixar 
a  sua  utilidade  a  huma  naçaõ  es- 
tranha. Hoje  em  dia  he  o  com- 
mercio que  impõe  leis  á  politica, 
dimanando  delle  o  poder  de  hum 


C  *7  ) 

estado;  e  quantas  vantagens  che- 
ga a  lograr  huma  naçaõ  sobre  ou- 
tra nesta  parte  ,  se  dirigem  á  ruí- 
na da  que  as  concede,  de  manei- 
ra ?  que  naõ  ha  meio ,  nem  mo- 
deração ;  ou  destroe  ?  ou  he  des- 
truído aqueliepovo,  que  faz  o 
•cornmercio  com  h tim a  naçâÔ  so- 
mente. 

§  ffi.        ,  , 


Da   nenhuma 


industria  -de  :Púf< 


Uigak 


oder-se-hia  diz^r  dos  -Porta- 
guezes  ,  o  quç  dizem  vários  au- 
thores  de  certos  povos  da  Africa; 
isto  he5  que  náõ  "tem  artes:  quê 
tem  em  abundância  metaes  precio- 
sos 5  que  recebem  iirimediatamen- 
té  das  maôs  da  natureza  :  que  to- 
das as  nações  cultas  se  achaõ  em 
estado  de  negociar  vantajosamen- 
te com  elles :  que  lhes  podem  fa- 
x,er  estimar  muito  cousas   de.  ire- 

B    2 


"^ 


I 


I 


«hum  valor,  e  receber  delles  ou- 
■tras  de  excessivo  preço. 

Vem    de   muito    longe   esta 
-inacção  de  Portuga] ;  mas  sempre 
a  originou  a  Gra-Bretanha.  Crom- 
wel  ,    por  meio  de  hum  tratado 
vantajosíssimo  á  sua-naçaõ,  anni* 
quilou   em  certo  modo  a  monar- 
quia Portugueza  ,  antes  que  exis- 
tisse ;  fez-se  este  tratado  entre  as 
duas  nações,  quarenta  annos  an- 
tes do  descobrimento  das  minas; 
istp    he.,    antes  que  Portugal  fi- 
zesse papel   na  Europa,    c"  nelle 
se  estipulou,  que  a  Inglaterra  ha- 
via de  subministrar  os  géneros  pa- 
ra  se    vestirem   os  Portuguezes  : 
desta  maneira  cortou  Cromwel  o 
nervo  do   systema  politico  desta 
naçaô  ,   e  com  hum  só  golpe  ar- 
rumou o  seu  governo.  Desde  en- 
raõ  ficáraó  desterradas  as  artes  do 
reino  ,    destruirão  se    insensive4- 
jnente  as  manufacturas,  entorpe- 
reo-se   a   industria  ,    que    a  final 
chegou  a  ser  nenhuma  :  o  alento 


que   se  dava  aos  Inglezes ,   rece- 
bendo os  seus  tecidos  ,  abateo  a 
actividade  natural  dos  Portugue- 
zer.  cahio  a  naçaõ  tfhuma  espé- 
cie de  Vethargo :  a  ociosidade ,  e 
a  preguiça  se  foraõ  apoderando 
dos  corações  rmô  deixando  nel- 
}ç$  asilo  ás  (temais  paix6è§ ,  eau- 
gmentoa-se  a  indolência  dos  Por- 
tuguezes  á  proporção  do  augmen- 
to  que  recebia  a  avareza  dos  In- 
glezes. Os  panos  ,-e  lenharias  que* 
a    Grã-Bretanha  ■  subministra-  an- 
nualmemte  aos  Portuguezes;    de- 
vem avaliasse  arn  vinte  milhões* 
de  cruzados  por  anno;  naõ  igno- 
rando ninguém,  que  a  França  na© 
vende   annualmente   em  Portugal 
cincoenta  peças  de  pano. 

Sendo  o  vestido ,  e  o  alimen- 
to duas  cousas  igualmente  neces- 
sárias em  qualquer  naçad ,  segue^ 
se  forçosamente,  que  subminis*- 
trando-as  aos  Portuguezes  ,  con- 
seguio  a  Inglaterra  tellos  na  maior; 
dependência-,  e  sujeição. 


i 


3 

I 


L   ^V 


BEL 


I 


I 


(30) 

§  IV. 

.M00  systema  de  política  em  Por~ 
tugak 

JL  endo-se  subtrahido  este  reino 
da  dominação  de  Espanha  ,  se  lan- 
çou nos  braços  dos  Inglezes,  cren- 
do  que  necessitava  no  mundo  de 
hum   allUdo  de  reputação,  cujas 
forças  marítimas  pudessem  deslum- 
brar a  mesma  potencia,  cuja  do- 
minação    acabavao     de    sacudir  ; 
mas  he  de  admirar,  que  huma  só- 
reflexão  ,    que   devia    offerecer-se 
desde  logo  aos  Portugueses  ,  naõ- 
os  conduzisse  a  finalizar  a- obra, 
para  o  que  naõ  tinhao  outra  cou- 
sa que  fazer,  senão  dar  hum  pas- 
so para  traz,  e  examinar  as  cau- 
sas  dáquelle  mesmo  suecesso. 

Toda  a  Europa  sabe  que  o 
projecto  ,  a  execução  ,  e  o  bom 
exko  da  revolução  de  Portugal , 


foi  obra  dos  Portuguezes  sos ,  «m 
soccorro  algum  estranho.  Sabe-se 

igualmente",-  que    naõ   servirão  , 
riem  tireraõ  efFetto  quantos  meios 

lhes  tinha  submiflistrado-  a  Ingla- 
terra. Sendo  isto  assim  ,  como  po- 
diaô    suppôr  os  Portuguezes  que 
a  Gra-Bretanha  havia  de  ter  bas- 
tantes   forças   para    impedir    que 
tornassem  a  entrar  na   aommaçao 
de  Espanha  ,    naÓ   teado  podido 
tirallos    delia   a  mesma  Inglater- 
ra >    Por   ventura,   he  mais  \mtt 
'fazer  que  huma  mçaõ  se  liberte  da 
dominação  de  outra ,  do  que  estor- 
var que   torne  ao  poaer  oa  mes- 
ma ?  Sem  embargo ,  aproveuando- 
«e   a  Inglaterra  daquella  espécie 
de  embriaguez,  tudo ■  prpmetKo , 
para  tudo  conseguir,    bao   infini- 
tas as  reflexões  que  se  me  spre- 
sentaS  agora  por  todas  as  partes : 
quando  huma  naçaõ  recobra  a  sua 
liberdade  politica,  he  huma  pro- 
va certa  de   ter-se  corrompido  o 
governo,  que  a  tinha  em  escrava- 


í 


I 


s 

i 


I 


■ 


«o;-  c-por  conseguinte,  que  nad 
se    acha  já  no  seu  primeiro  esta- 
do^ de   vigorj    neste  caso,  a  na- 
ção ,  que  alcançou  por  si  mesma 
a    liberdade  .    he    bastante    forte 
para   conservalla  ,   e  de  nada  lhe 
servira    o  seu    primeiro  esforço, 
senão  se  lhe  segue  outro  para  con- 
servasse  livre   sem    soccorro    de 
hum   alhada    poderoso  :    d'ourra 
sorte   torna  a  cahir  por  outro  la- 
do  na  mesma  escravidão  de  que 
samo.  ^ 

As  allianças   nao   sa6  outra 
cousa    senão    comrnercios-  políti- 
cos;   e  o  alliado  que  entra  com 
mais  poder  he  o   que  saca  delias 
mais  proveito.  Depois  da  revolu- 
ção de  Portugal,    tem  sido  este 
reino   mais  escravo  da  Inglaterra 
do  que  nunca  o  foi  da  Hespanh*: 
parece  que  os  Iftglezes  nao  ofFe- 
recêrao  a   Portugal,  na  sua  revo- 
lução, huma  rnaõ  amiga,  e  libe- 
ral ,  senão  para  opprimillo  depois 
$om<  imraa,  infinidade  dq  braços: 


X  33)         .        -    • 
t)  que  se  vio  logo  ,   pais  a  tinai 

os  destruirão  com  o  peso  do  seu 
^vstema  económico. 

Antes  do  acontecimento,  que 
arruinou  otimamente  Lisboa,  na© 
tinha  Portugal  vo7xdeiiberativa  por 
si  mesmo:  todas  as  suas  resoluções 
as  dictava  o  gabinete  de  Londres^ 
e  também  os  .passos  que  haviaô 
de  dar  nas  cortes  estrangeiras  os 
Ministros   Portuguezes,  os  pres- 
crevia a  Inglaterra.  Naõ  tinha  Pot'~ 
uigal    tropas   de  terra  ,    nem  de^ 
mar  :  tinha  perdido  aquelle  mo- 
vimento de  sã  politica,  sem  o  qual 
cahe  qualquer  governo  na  ukima 
debilidade.  Que  systema  taõ  in- 
feliz !  Descançai  em  mim  ,  dizia 
aos  portugueses  a  Gra-Bretanha.; 
fiai-vos   nas   minhas  armadas  oa- 
vaes  ,    e  naõ  façais  a  ninguém  a 
guerra  ,    que  -eu  a  faixei  por  vós. 
Naõ  ha  politica  mais  eirada  que 
a    de    manter-se    constantemente 
em  paz,  quando  todas  as  poten- 
cias 4a  Europa  estão  em^uerra^ 


i 


! 


;< 


-XV 


a 


I 


e  assim  ,  ainda  que  as  perturba- 
ções que  sobrevem  nas  demais  na- 
ções, naõ  interessem  pessoalmen- 
te r  he  preciso  tomar  aiguma  par- 
te ,  a  naõ  ser  que  os  inconvenien- 
tes da  guerra  sejaõde  mais  peso 
que  os  da  paz.  Engana-se  muito 
hum  estado  quando  cie  que  as 
victorias  que  se  conseguem  a  200 
léguas  do  seu  continente ,  naõ  o 
interessaõ  em.  nada,  pois  no  mun- 
do politico  suecede  o  mesmo  que 
no  physico,  em  que  o  primeiro  mo- 
vei dá  hum  movimento  geral. 

Ha  na  politica  huma  força 
ínotriz  geral  5  que  se  derrama,  e 
estende  por  todas  as  partes  :  es- 
ta força  ,  ou  he  directa,  ou  indi- 
recta ,  e  por  reflexão  ,  e  em  qual- 
quer parte  da  Europa  que  augmen- 
te  ó  seu  poder  hum  estado  ,  di- 
minue  necessariamente  o  de  algum 
outro.  Por  esta  ra/aõ  ,  he  do  in- 
teresse de  todos  os  estados  man- 
ter o  equilíbrio,  porque  delle  de- 
pende a  sua  segurança  ,  e  a  dis- 


tribuiçao  geral  do  poder  'politi- 
co-, interessa  "-a  todos  os  reinos  5» 
e   republicas  da  Europa. 

Nas  guerras   geraes  -convém 
roais  aos  estados  pequenos  do  que 
aos  grandes,  tomar  parte  nellas, 
ainda  que  seja  somente  para  poi- 
se   da  dos  roais  fracos  contra- os 
mais   poderosos  ;  e  sem  esta  po- 
litica adquirem  estes  cada  dia  mais, 
e  mais  forças  ,  e  absorvem  final- 
mente   aquelles ,;    porque    jamais 
falta  ás  grandes  monarquias  hum, 
ou  outro  pretexto  para  declarar  a 
guerra  aos  estados  ,  com  quem  até 
entaõ  nao  tiveraó  desavença  algu- 
ma. Os  estados 'poderosos  naÕ.a- 
tacaô  os   que  saõ  menos  podero- 
sos ,  sehaõ  porque  estes  nao  esta3- 
em    estado    de    deíender-se.  -Erã 
pois  máo  o   systema  politico   de 
Portugal,  porque   tinha  interesse 
a  Inglaterra  em  que  naõ -fosse  boixie 


i 


-\v 


i 


C  íO 


§  V. 


'Que  a  or:gem  das  riquezas  de  Por- 
tugal era  ma  ,  e  viciada. 

LA  sessenta  annos  a  esta  parte 
<S3Õ  as  minas  de  ouro  o  manancial 
das  riquezas  de  Portugal.  Sendo 
isto  certo,  naõ  ha  necessidade  de 
-ser   grande  politico  :    bastará   sa- 
ber  calcular  para   fazer   parente  , 
X]ue    hum    estado  quejixa  toda  a 
sua  administração  nas  minas,  de- 
ve  perecer   indefectivelmente.    O 
ouro,  e  a  prata  saõ  huma  rique- 
za fictícia,  e  imaginaria:  saò  hu- 
raa  representação ,  ou  signaes  mui 
duráveis,  como  convém  á  sua  na- 
tureza :    quanto  mais  se  mui  tipi  i- 
caõ  ,    mais   perde  do  seu    valor  , 
porque  representaõ  menos  cousas. 
^  Logo  que  se  conquistarão  o 
Peru,  e  o  México,  abandonarão 
os    íispanhoes    as    riquezas   natu- 
raes  pelas   de  representação  ,  ou 


nsignal ,  que  por  si  mesfflas  se  én- 
viíeciaõ  :  o  ouro,  e  a  prata  eraó 
até  entaó  mui  raros  na  Europa  ; 
e  senhora  a  Espanha  repentina- 
mente de  huma  quantidade  des- 
tes dous  metaes,  concebeo  espe- 
ranças que  jamais  teria  tido  sem 
elles  ;  sem  embargo  de  tudo  is- 
to ,  naõ  deixou  de  duplicar-se  o 
dinheiro  na  Europa,  o  que  se  co- 
nheceo  por  ter-se  auginentado  do 
dobro  o  preço  de  quanto  se  com- 
prava :  em  dobrado  tempo  tor- 
nou-se  novamente  a  duplicar  o  di- 
nheiro ,  e  diminuio  também  o  seu 
valor  de  metade  ,  o  <jue  succedeo 
desta  maneira. 

Para  tirar  o  ouro  das  minasv 
e  para  preparallo  como  convinha , 
era  necessário  algum  gasto:  sup- 
ponho  que  este  fosse  na  propor- 
ção de  hum  a  64:  assim  pois  as 
frotas  que  traziaõ  á  Espanha  a 
mesma  quantidade  de  ouro ,  tra- 
ziaõ hum  género  que  na  realida- 
de valia  ametade  menos,  e  cus- 


I 


,    (  3*-) 
tava  amerade  mais;  e  se  se  segue 

a  conta  de  dobro  em  dobro  ,  a- 
char-se-ha  a  causa  do  menor  po- 
der que  originarão  as  mesmas  ri- 
quezas. 

Neste  razoamento  se  encon- 
tra hum  extracto  da  historia  da  de- 
bilidade de  Portugal.  Filippe  II. 
(diz  hum  author  politico)  fez  a 
famosa  quebra  que  todo  o  mun- 
do sabe,  depois  do  descobrimen- 
to do  México.  Filippe  IV.  (diz 
outro  escritor  da  mesma  classe  ) 
se  vio  precisado  a  fazer  moeda 
de  muita  liga  ,  para  supprir  aos 
empenhos  do  estado. 

Mas  ainda  que  este  vicio  phy- 
sico  naô  estivesse  na  natureza  das 
mesmas  riquezas,  huma  só  refle- 
xão politica  bastaria  para  curar  os 
Soberanos  da  mania  (  digamo-lo 
assim  )  de  ter  estes  funestos  the- 
souros.  Se  os  que  descobrem  a- 
bundantes  minas  de  ouro  quizes- 
sem  considerar  ,  e  subir  até  ao 
principio  das  cousas,  encontrariam 


patpavelmente  a  ruína,  e  anrnqui- 
laçaõ.  do  seu  poder  nas  mesmas 
minas.  O- ouro  he  o  mesmo  po- 
der ,  porque  subministra  aos  es- 
tados os  meios  de  augmentar  as 
suas  forças.  Se  hum  Monarca  que 
descobrisse  minas  abundantes  qui- 
zesse  ajuntar  dentro  do  seu  rei- 
no todo  o  ouro  que  extrahisse  dei- 
las,  sem  dar  porção  alguma  aos 
demais  Soberanos  ,  poderia  elie 
só  ter  mais  dinheiro  que  todos  os 
demais  juntos,  e  poderiaõ  as  suas 
immensas  riquezas  levallo  á  mo- 
narquia universal ;  mas ,  que  suo 
cederia  ?  Armar-se-ina  contra  elie 
toda  a  Europa  para  destrusllo , 
antes  que  elie  pudesse  destruir  os 
demais ;  e  se  para  evitar  a  sua  mi- 
na meditada  por  todos  os  estados  5 
lhes  desse  parte  do  producto  das 
suas  minas.,  cahiria  por  outra  par- 
te no  inconveniente  que  tinha  que- 
rido evitar  ;  porque  fazendo-o  pas-^ 
sar  aos  demais  governos^  augmen- 
tando  continuamente  a  massa  das 


'VV 


(40).  .. 

suas  riquezas,  diminuiria  neces- 
sariamente o  seu  próprio  poder  , 
e  no  espaço  de  hum  século  naõ 
se  acharia  em  proporção  de  força 
relativa  com  os  demais  governos 
da  Europa.  Se  os  exemplos  fos- 
sem capazes  de  emendar  os  Sobe- 
ranos ,  nenhum  haveria  que  naõ 
estabelecesse  por  máxima  funda- 
mental o  naõ  permittir  abrir  as 
minas,  visto  que  se  pode  pro- 
var que  desde  a  creaçaô  do  mun- 
do ,  todos  os  estados  que  fixáraô 
«este  ponto  a  sua  administração, 
<:ahíraõ  na  debilidade ,  e  na  im- 
potência. Pode  pois  ter-se  por  má- 
xima certa,  -que  as  riquezas  das 
minas  devem  repurar-se  por  qui- 
méricas para  os  estados  que  as 
possuem ,  <los  quaes  pode  dizer- 
se,  que  propriamente  fallando,  naó 
saõ  mais  que  os  ecónomos ,  ou  dis- 
pensadores  de  seus  próprios  the- 
souros ,  pertencendo  somente  o 
terreno,  e  a  substancia  aos  povos 
industriosos   que  as  fazem  valer. 


A'4*í 

Tomemos  o  mesmo  Portu- 
gal por  exemplo  :  o  preto  que 
trabalha  nas  minas  de  ouro  do  Bra- 
sil ,  deve  o  seu  vestido  atingia* 
terra,  que  lho  subministra:  logo 
estas  minds  saò  relativas  álngla* 
terra ,  até  que  seja  pago  o  vesti- 
do: para  trabalhar  as  minas  he  ner 
cessar io  hum  cabedal  para  pretos : 
supponhamos  que  este  cabedal  he 
de  vinte  milhões  de  cruzados^ 
o  seu  juro  que  he  de  320  ,  ou 
400  contos  de  réis  ,  e  que  deVe 
sahir  das  minas,  diminue  por  for- 
ça a  somma  da  sua  extracção.  Ao- 
crescente-se  a  isto  a  subsistência 
de  quasi  cem  mil  pessoas  entre 
pretos,  e  brancos,  que  dependem 
das  minas  do  Brasil ;  subsistên- 
cia que  naõ  vem  do  mesmo  esta- 
do, e  que  he  preciso  recebella 
dos  estrangeiros:  ajunte-se  tam* 
bem  ao  referido  o  vestuário  5  e 
as  demais  espécies  relativas  ao 
luxo  que  subministra  a  Inglaterra 
aos  habitantes  do  Brasil :    e  ac- 


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I 


I 


(4») 

erescentem-se  por  fim  as  necessi- 
dades geraes  da  naçaô,  que  tendo 
deixado  perder  as  artes  desde  o 
descobrimento  das  minas  j  se  vio 
obrigada  a  prover-se  das  nações 
estrangeiras;  do  que  tudo  se  in- 
fere ,  que  o  ouro  que  se  extrahe 
das  minas  he  relativo  aos  demais 
governos  :  que  riqueza  pois  pô- 
de ser  aqueiia,  cuja  posse  envol- 
ve em  si  a  ruina  do  próprio  esta- 
do l 

§  VI. 

Que  a  fazenda  real  de  Portugal  es- 
tava inteiramente  arruinada. 


caba-se  de  ver  que  as  rique- 
zas de  Portugal  traziaô  comsigo 
hum  vicio  physico,  o  qual  arras- 
tava necessariamente  o  estado  a 
huma  destruição  geral  das  suas 
rendas  rcaes. 

Nos  annos  de  175^  •  e  17J4 
se  reduziaõ  todas  as  tique/as  de 
Portugal  em  espécie  y  ou  dinhei~ 


(4?.y     -Ifcw    4 

ro   physico  y  a   oito   milhões  de 
cruzados  ;    e   ainda  huma  grande 
parte  desta  somma  era  de  má  moe- 
da,  cheia  de  liga,    por  cuja  ra- 
zão naõ  queriaô"  acceitalla  os  es^ 
trangeiros  :  circunstancia  única  ,  a .. 
que  deve  atribuir  se  orno  ter  fi- 
cado aquelle  reino  sem  hum  real 
em  espécie  ;  o  que  porém  he  mais 
extraordinário  ,  e  quasi  parece  in- 
.  crivei  ,    he  que  o  Rei^  de  Portu- 
gal ,.  possuidor  das  minas  de  ou- 
ro mais  abundantes  9  Monarca  que 
toda  a  Europa  crê  taõ  rico ,  e  taa 
endinheirado  5  se  visse  precisado 
no  fim  do  antio  de  i?i3  a  tomar 
emprestado    de    huma    irmandade 
oitocentos  mil  cruzados  para  soe- 
correr  as    suas  necessidades.     He 
também  certo  que  nos  dez  annos 
anteriores  acfde  175  4  tinaa  feita 
Portugal  bancarrota  énr  quasi  to- 
das as  nações  da  Europa  ,  e  que 
só  á    Inglaterra    devia  vinte  mi- 
lhões de  cruzados;  de  maneira  que 
jà   naquelle   anno  tinha,  chegada 


i 
í 


( 44  > 

rortugaí  a  estar  insolvente.  O  go- 
verna naõ  tinha  erário  ,  nem  ha- 
via hum  real  no  thesouro  publi- 
co: qualquer  naçaó  que  o  tivesse 
querido  atacar,  o  teria  certamente 
dominado ,  porque  naõ  lhe  er* 
possível-  soportar  as  despezas  da 
primeira  campanha. 

-     He   verdade  que  nada  disto 
deve    a^mirar-nos  se  subimos  ao 
primeiro  principio,  pois  já  vimo* 
x\ue  as  artes,  as  manufacturas,  e 
até  as  cousas  da   primeira  neces- 
sidade   faltavaõ    inteiramente  em 
Portugal.  Naõ  he  possível  que  Ihi- 
ja    hum    systema  de  fazenda   real 
n'hum  reino  onde  a   despeza  ex- 
cede á  renda :  nos  estados  suece- 
de  o  mesmo  que  aos  particulares  , 
que   naõ  podem  deixar  de   arrui- 
nar-se  quando  gastaõ  muito  mais 
do  que  tem,  e  este  era  pontual- 
mente o  estado  de  Portugal.   Pro- 
duziaõ  as  suas  minas  de  ouro  24 
milhões  cada  anno,  e  recebia  de 
mercadorias  estrangeiras  28  ;   do 


(  45  ) 
quç  resultava  que  de  todo  o  pro- 

dueto  das  minas  ,  naõ  ficava  hum 
real  no  reino;  e  além  disto  fazia- 
se  Portugal  devedor  de  quatro  mi- 
lhões annualmente :  dir-se-ha  tal- 
vez que  esta  destruição  ,  e  falta 
de    dinheiro   naõ   diziaõ    respei- 
to ao  Soberano,  mas  sim  aos  par- 
ticulares \   ao  que  se  responde , 
que  se  engana  lastimosamente  a- 
quelle  que  pensa  ,  que  houve  em 
algum  tempo  hum  Rei  ricode  hum 
povo  pobre:  as  rendas  reaes  naõ 
tem  senaõ  dois  movimentos,  hum 
que  as  leva  ao  Príncipe  ,  e  o  ou- 
tro que  as  torna  a  trazer  aos  vas- 
sallos:  quando  estes  se  vêm  obri- 
gados a  prover-se  das  nações  es^ 
trangeiras  pa^a  o  seu  alimento,  e 
vestuário ,  esgótaõ  continuamen- 
te as  rendas  reaes,  e  a  final  vem 
a  sueceder  que  nem  os  vassallos, 
nem  o   estado ,   nem  o  Principe 
tem  riquezas. 


/  *  €ffi 


•>*— 


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3 

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(4ó) 
§    VII. 

Reflexões  sabre  o  influxo  que  tinto  ao 
as  minas  de  ouro  do  Brasil  no  sys- 
tema  geral  da  Europa. 


tem  embargo  da  grande  illustra- 
çaõ  do  nosso  século,  e  das  luzes, 
e  noticias  que  se  adquirirão  na  po- 
litica,* póde-se  dizer  que  de  ses- 
senta annos  a  esta  parte  ha  como 
huma  espécie  de  encanto  em  qua- 
si  todos  os  gabinetes  da  Europa, 
que  naõ  deixa  conhecer  aos  sobe- 
ranos os  seus  verdadeiros  interes- 
ses. -Falia -se  continuamente  dos  ne- 
gócios geraes:  tem  cada  naçaõ  hum 
conselho  politico:  sustenta  cada 
estado  poderosos  exércitos:  decla- 
rasse a  guerra,  faz-se  a  paz,  torna- 
se  a  principiara  guerra,  etorna-se 
também  a  fazer  a  paz:  combina- 
se  incessantemente  o  poder  dos 
estados,  calcula-se  o  seu  poder,  rne- 
de-se,  digamo-lo  assim,  a  força 


(  47  ) 
politica  de  cada  governo;  e  sem 
embargo  de  tudo  isto  ,  nao  se  eo- 
:ontra  o  ponto  fixo  do  poder  ge- 
ral ,  e  vem  a   ser,  a  meu  parecer, 
quenaÓ  se  repara  que  em  tanto  que 
as  riquezas  do  Brasil   se   inclmaó 
todas  para  hum.. lado,  ha  de  cahir 
precisamente  parah>este  lado  só  o 
poder  politico  da  Europa.  Os  an- 
tigos governos  tinhaõ  mais  recursos 
que  os  nossos,  porque  nelles  po- 
dia muitas  vezes  a  virtude  por  si 
só  elevar-  o   seu  poder  até  ao  mais 
alto  gráo?  e  hoje  em  dia  se  arrui- 
naria  necessariamente  hum  estado 
que  nao  tivesse  mais  que  virtude; 
deve  .entendesse  ,  que  se  falia  a- 
qui  -daquella  virtude  politica  \  que 
•formou  o  caracter  das    primeiras 
republicas, 

,No  século  em  que  vivemos 
-mudou  inteiramente  de  semblante 
.a  politica:  o  Reino  que- he  mais 
rico  .por  si  mesmo,  chega  de  ne- 
cessidade a  ser  o  mais  poderoso,, 
€  isto  he  conforme  a  nacuresa  da 


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(48) 
mesma  cousa  ;  e  hc  necessário  que 
seja  assim  n'hum  século  em   que 
lia  nações  inteiras,  que  se  vendem 
a  outras  para  fazer  a  guerra  ,  em 
que  para  ter  grandes  amigos  ,  po- 
derosos alliados ,  hábeis  generaes, 
e  bons  soldados,  naõ  he  preciso 
senaõ  pagallos  :  n'hum  século  por 
fim,  cm  que  se  vende t> valor ,  e 
em  que  tudo  lie  mercadoria,  até  a 
mesma  honra:  o  que  tudo  he  pre- 
ciso que   assim  sueceda ,  abrindo, 
como  abre,  o  ouro  ,  quasi  todos 
os  gabinetes,  desenredando,  como 
desenreda,  todas  as  negociações, 
«  labyrintos  políticos,  e  fazendo, 
como  faz  ,  quasi  todos  os    trata- 
dos :  n'huma  palavra  ,  a  força  de 
hum  estado  depende  hoje  em  dia 
do  cheio,  ou  do  vazio  dos  seus 
cofies  de  dinheiro,  e  o  poder  po- 
litico  mede-se  pelo   numero  dos 
milhões. 

Antes  que  se  descobrissem  as 
minas  do  Brasil,  tinha  a  Inglater- 
ra feito  os  maiores  esforços ,  pa- 


(49)     . 
*a  fazer  hum  dos  príncipaes  papeia 

da  Europa;  mas  como. estivessem 
ainda  sepultados  na  terra -os  mate* 
riaes  que  haviaõ  de  servir  ao  edi- 
fício da  sua  grandeza,  cornava  a 
cahir  sempre  .no 'seu  primeiro  es* 
tado  -de  debilidade-:  foi  pois  para 
a  Inglaterra  o  descobrimento  das 
minas  como  hum  a  revolução  9  e 
aquella  monarquia  ,  que  até  então 
tinha  caminhado  ás  apalpadellas, 
teve  logo  regras  ?  e  princípios  se- 
guros para  o  seu  poder ,  e  fixou 
desde  aquelle  tempo  o  ponto  em 
que  havia  de  estribar  o  seu  engran- 
decimento. Estavaõ  todos  corno  a- 
tónitos-,  e  admirados  ?  ao  ver  que 
hum  dos  reinos  mais  pequenos  da 
Europa  5  com  hum  continente  «,  e 
li  uma  poyoaqat>  inferior  á  de  ou- 
tros muitos  estados  ,  dava  a  lei 
aos 'mais  vastos -governos  5  e  vem 
a  ser,  que^oaõ  se  reparava  que  o 
mesmo  estado  tinha  adquirido  por 
via  da  sua  industria  ,  a  chave  do 
mais   rico  thesouro  do  universo  % 


C  que  com  a  inteira  posse  do  ou- 
ro do  Brasil,  fazia  inclinar  a  seu 
arbítrio  a  balança  nos  systemas  po- 
líticos da  Europa :  este  he  o  eni- 
gma do  poder,  e  grandeza ,  que 
até  agora  nos  sorprezou  tanto. 

Faila  se  continuamente  da 
constituição  do  governo  de  Ingla- 
terra ,  que  na  verdade  deve  con- 
siderasse como  huma  das  melho- 
res, principalmente  n'hum  sécu- 
lo em  que  a  combinação  do  po- 
der politico  ,  e  civil  dos  outros 
estados  he  inferior  ao  seu  ;  mas 
interiormente  ,  este  formoso  sys- 
tema  ,  que  tanto  se  exalta.,  nao 
influe  quasi  nada  na  pratica  do 
seu  governo,,  e  póJe-se  dizer,  que 
he  a  republica  ideal  de  Platão  , 
que  nunca  existio  senaõ  no  pen- 
samento daquelle  filosofo:  nao  se 
pôde  negar  que  he  o  mais  bello 
espectáculo  de  theorica  qué  ha  no 
universo :  mas  he  lastima  que  nao 
produza  nos  Inglezes  as  virtudes 
próprias  de  hum  cidadão ,  ou  que 


( f% )  . 

âo  menos  nao  lhes  tire  òs  vtàòf 
que  saõ  causa  de  naõ  te  lias.  Que** 
rer  que  tenhaõ  sempre  os  homens 
a  republica  ria  sua  imaginação ,  e 
diante  de  seus  olhos  5  que  sacri- 
fiquem Continuamente  os  seus  in- 
teresses particulares  ao  "befn  ge* 
■Tal  da  sociedade^  he  pedir-lhes 
cousas  impassíveis;  e  nliunia  pa- 
lavra ,  he  mõ  ter  ctfnhéciment® 
algsm  do  côraçaS  humairo ,  e  ig- 
norar a  força,  e  exteíssaõ  das  pai- 
xões. Os  legisladores  que  formaô 
systeruas  para  os  homens ,  'deve* 
riaõ  (  quanto  o  permittíssem  aquel- 
íes  primeito^  princípios  5  qtie  nao 
he  justo  9  nem  possível  abando- 
nar )  accommodar-se  á  fraqueza 
humana;  e  nâõ  o  fazendo  assim , 
enfraquecem  5  e  se  inutiMsaô  os 
mesmos  systemas. 

Bem"  podem  pois  exagerar  se 
©s  eíFekos  5  qtie  produz  aiibetd a-, 
■de  :  por  mais  que  se  faça,  ese<iíga, 
naõ  se  pode  assegurar ,  queexístf 
«o  mundo  «cnae  o  seu  ftome  X  beai 

Q  % 


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3 


êxdrrnnada  ,  naõ  he  outra  cousa 
senão  huma  sombra  sem  corpo., 
e  huma  formosa  quimera ,  sobre  a 
qual  se  fabricaõ  os  mais  bellos 
edifícios  de  raciocínios  políticos. 

A  servidão  sim  que  he  anti- 
ga ,  e  inveterada  enfermidade,  de 
que  está  infecto  quasi  todo  o  gé- 
nero humano,  e  he  como  a  idola- 
tria pratica  da  religião  civil  dos 
estados  :  podendo-se  dizer  que 
tem  cada  governo  o  seu  bezer- 
ro d'ouro,  perante  quem  dobra  o 
joelho. 

Quantas  disputas  se  levantaõ 
hoje  em  dia  no  nosso  mundo  po- 
litico sobre  a  independência  dos 
vassallos  de  hum  estado,  compa- 
rada com  a  independência  dos  de 
outro,  sao  somente  sobre  os  dif- 
ferentes  gráos  da  que  cada  hum 
tem;  pois  desde  que  os  homens 
se  sujeitarão  a  leis  politicas,  a- 
penas  se  pode  dizer  que  deixou 
de  haver  escravidão,  de  hum,  ou 
d'outro  modo ,  em  parte  alguma  da 


à 


C  >~3  ) 
terra,   e  a   que  tem  os  Inglezo? 
he  de  mui  disíincta  natureza  das 
outras  nações  ,    porque  sao  escra- 
vos da  sua  própria  liberdade. 

A  agricultura  da  Gra-Breta- 
nha  facilitou  aos  seus  habitantes 
muitas  vantagens  ;  mas  estas  te- 
riaô  sido  quiméricas  sem  as  minas 
de  ouro  do  Brasil  ,  sem  cujo  re- 
curso, por  mais  que  se  tivessem 
esforçado  os  Xnglezes  sobre  aquelv 
te  importante  ponto  r  o  mais  que 
teriaõ  conseguido,  teria  sido  fa- 
zer circular  as  riquezas  da  nação , 
mas  nao  augmentallas  até  taô .al- 
to gra'o. 

O  trigo  nao  produz  ouro  , 
mas  o  ouro  produz  trigo  ,  por- 
que facilitando  as  cornmodidades 
dos  lavradores  ,  dá  á  agricultora 
hum  movimento,  que  naõ  tinha 
antes  da  introducçaô  daquelle  m^ 
tal.  Estabeleça-se?  por  exemplo, 
huma  somma  de  50  milhões  era 
hum  estado  que  se  forme  de  no«- 
y®  r,  e   introduzir-se-ha.  sensivd> 


mm    í^bbrs 


^A. 


(J4)      .     , 
mente  nelle  huma  agricultura  re- 
lativa, a  esta  somma ;  e  se  se  do- 
bra o  capital,  augmentar-se-ha  á 
proporção  o  producto  das  terras. 

Assim  como  se  foi  espalhan- 
do na  Grã-Bretanha  o  ouro  do 
Brasil  ,  a  terra  foi  produzindo 
mais,  e  mais  :  este  augmento  fez 
baixar  o  preço  do  juro  dodinhei- 
ío;  e  os  colonos  que  tiveraõ  mais 
facilidade  de  adcjuirillo  ,  a  tive- 
raõ também  maior  para  fazer  va- 
ler as  terras,  Accrescentou-se  de- 
pois huma  nova  circulação  de  ri- 
quezas á  primeira,  e  vivificou  mui- 
tas partes  da  agricultura  que  esta- 
vaõ  paralyticas,  e  sem  movimen- 
to. Augmentou-se  finalmente  o 
consumo  á  proporção  do  dinhei- 
ro que  havia  em  espécie,  e  á  pro- 
porção daquelle  augmento  fez-se 
riquíssimo  o  estado. 

Esta  mesma  abunianciasub- 
ministrou  aos  Ihglezes  os  meios  de 
fazer  da  sua  agricultura  hum  obje- 
cto de  commereio :  este  commercio 


£  tf  > 

lhes  facilitou  formar  hurna  podèra* 
sa  marinha-, ,  e  sobre  esta  marinha 
estabelecerão  os  fundamentos  de 
todo  o  seu  poder. 

Obstar~se-ha  talvez ,  que  ain- 
da que  o  Brasil  naõ  tivesse  sub- 
ministrado  as  suas  riquezas. á  In- 
glaterra ?  lhe  teria  procurado  as 
mesmas  vantagens  a  sua  própria 
agricultara  ;  mas  atrevo-me  a  dizer, 
que  se  engana  manifestamente  o 
que  assim  pensa  >  e  o  provarei  com 
a-  seguinte  reflexão*  Por  multipli- 
cados que  sejaé --os -meios  de  que 
se  valhaõ  os  mais  hábeis  governos 
para  se  apoderarem  das-  riquezas 
dos  seus  visinhos,  que  nao  tem 
minas,  he  indispensável  que  estas 
mesmas  riquezas  ,  depois  d?hurft 
certo  período  de  tempo,  tornem 
ao  mesmo paiz  donde  sahiraõ  ,  sem 
o  que  perder-se-hia  a  Europa  em 
poucos  séculos ,  succedendo  mui- 
tas vezes  que  pela  debilidade  ,  c 
pelas  crises  (  digamo-lo  assim  )  que 
padecem  os  mesmos  estadas >  tor* 


(5-0 
»aÕ  a    entrar    nas   suas   riquezas. 

Os  estados  que  tem  minas  saã 
os  únicos  que  podem  dar  ,  sem 
recobrar  jamais,  porque  naó  tem 
meios  para  isto.  Os  progressos  das 
artes  em  Inglatrrra  nascerão  dos 
mesmos  princípios  ,  que  os  da  a- 
gricuitura,  tendo  posto  em  movi- 
mento o  ouro  do  Brasil  a  indus- 
tria dos  Inglezes,  que  tinha  esta- 
do entorpecida  até  que  chegou 
aquelle  metal,  que  sérvio •  ,  como 
huma  chuva  de  ouro  ,  para  regar 
as  manufacturas  Inglezas  ,  e  que 
as  fez  brotar  novos  ramos  com  ex- 
traordinário vigor. 

Desde  aquella  época  fabricou 
incessantemente  a  Inglaterra  para 
Portugal  ,  e  ajudando-se  ao  mes- 
mo tempo  do  seu  bem  combina- 
do systemade  artes,  e  manufac- 
turas, chegou  a  ser  huma  das  mais 
poderosas  monarquias  ;  mas  com 
esta.  differença  ,  que  o  mais  que 
podia  ter  conseguido  com  a  sua 
Industria  só..,  teria,  .sido  causar  ai- 


gumas  mudanças,  e  prejuízos  tios 
systemas  políticos  da  Europa.,  de- 
pois  do  que  se  teria  visto  preci- 
sada a  conter-se  nos  seus  antigos 
Hmites  ;  mas  eooi  o  ouro  do  Brasil^ 
e  o  consumo  de  suas  manufacturas 
em  Portugal,  pode  levar  adiante 
as  suas  vastas  ideas,  e  ambição. 
Ha  cousas  taõ  extraordinárias 
na  politica  ,  .que  quasi  saõ  incom- 
prehensiveis ,  .porque  se  oppóe-m 
ao  senso  commum  ,  <  e  á  razaõ  r  hu- 
ma  -delias  :he  ,  ..porque  alguns. .es- 
tados d-a  .Europa,  que ,-.-estaõ.'-álerta 
incessantemente  .-para  .prevenir  .o 
rninimo  prejuízo -que. -lhes  queirao 
occasionar  outras  potencias  yc-cui-' 
daõ  até  dos-apice-sdos-'Seus'iíitercs- 
ses-,  movem  disputas sobre-ass-um- 
ptos  de-  nenhuma- entidade ,  e  im- 
portatVeia,ou  rompem  talvez  a. guer- 
ra por  mui  leves  motivos ,  por  que 
razão  estes  mesmos  estados  deíxàõ^ 
€  deixarão  gozar  pacificamente  a  In- 
glaterra de  todas  as  riquezas  do 
.Brasil  .?  Quando  se  descobrirão  -es- 


Cf  8) 
tas  minas,  devera  ter  sollicitadoa 

França,  que  era  huma das  poten- 
cias mais  interessadas  naquelle  des- 
cobrimento, obrigar  Portugal  por 
todos  os  meios  possíveis  a  fechai- 
las  ,  ou  ao  menos  a  repartir  com 
ella  o  seu  produeto.  O  que  sem 
duvida  enganou  os  Francezes  ,  foi 
o  calculo  que  fizéraõ  dos  poucos 
meios  que  tinha  Portugal  para  be- 
neficiar as  minas ,  naõ  se  tendo  per- 
suadido que  o  poderia  executar 
hum  estado  despovoado,  e  dos  mais 
pobres  da  Europa  \  mas  deveriaõ 
ter  considerado  ao  mesmo  tempo, 
que  a  Inglatetra  havia  de  subminis- 
trar  aos  Portuguezes  quanto  neces- 
sitassem para  beneficallas ,  como 
fim  de  levar  todo  o  produeto.  Com- 
mettida  esta  falta  ,  restava  ainda 
aos  Francezes  o  recurso  desobri- 
gar Portugal  a  repartir  as  suas  ri- 
quezas novamente  descobertas  com 
as  outras  nações  ,  pois  somente 
com  a  repartição  delias,  feita  pro- 
porcionalmente  entre   os  estados 


dá  Europa  ,  se  teria  iitipedido  a 
mal ,  que  depois  se  vio ,  de  terem 
vindo  parar  todas  aquellas  rique- 
zas n?hurn  só  estada ;  e  o  descobri- 
mento das  minas  teria  sido  indilFe* 
rente  para  a  'Europa  9  naÕ  tendo 
resultado  outro  efifei to  no  sy&terra 
geral  ,  senaõ  o  de  augmentar  as 
riquezas,  com  proporção  relativa 
a  todos  os  estados.  Desde  o  des- 
cobrimento das  minas  teráô  sabi- 
do do  firastí  novecentos  e  ses- 
senta  milhões  de  cruzados  9  como 
pode  demonstrar- se  pelas  listas  de 
cada  huma  das  frotas  que  viéraô 
á  Europa  ,  as  quaes  se  a  eh  a6  tias 
mãos  d^ f todos  ém Portugal  ,  eto* 
do  este  immensd  capital  passou 
quasi  por  inteiro  ^Inglaterra  ?  e 
com  elle  fund  áraõ  os  Inglezes  o 
colosso tdo  seu  poder ,  e  grandeza^ 
com  que  alimeritáõ  a  sua  arrogân- 
cia ,  e  tem  como  admirada  a  Eu*- 
ropa, 

Perguntar-se-ná  talvez  x e  que 
se  fez  de  taõ  enorme   quantia  | 


m 


i 

i 


í 


(to) 

pois  he  cerro  que  nao  existe  hoje 
em  dia  em  .Inglaterra  ?  Ao  que  res- 
pondo ,  que  a  mesma  razaõ  de  naõ 
existir  na  Gra-Bretanha  ,  be  a  cau- 
sa do  poder,  e  abundância  deste 
reino.  Sc  se  exarninaô  as  listas  ge- 
raes  dos  gastos  da  Inglaterra  ,  lei- 
tos desde  o  anno  96  do  século  pas- 
sado, ve-r-se-ha  que  subioa  seis- 
centos e  oitenta  milhões  de  cru- 
zados o  que  consumio  no  extraor- 
dinário de  guerras  estranhas  ,  sub- 
sídios ,  tenças,  exércitos,  e  arma- 
das. Sem  embargo  disto,  augmen- 
tou  depois  continuamente  o  capi- 
tal da  nacaõem  dinheiro:  o  que 
dimanou  do  ouro  do  Brasil  ,  que 
a  tudo  supprio. 

Os  Portugueses  déraó  meios 
á  Inglaterra  para  conceder  avul- 
tados subsídios  a  Saboya-,  para 
comprar  alliançasem  Allemanha, 
para  manter  numerosos  exércitos, 
para  formar  huma  formidável  ma- 
rinha ;e  nluima  palavra,  para  obrar, 
negociar,  penetrar  ^e  averiguar  os 


(  6i  ) 
.negócios  do  mundo  politico-,    e 
para  nelle  fazer  o  principal  papel 

As  minas  do  Brasil  facilitarão 
aos  Inglezes  os  primeiros  elemen- 
tos-do  seu  commercio,  pois  co- 
mo ninguém  ignora  ,  o  continen- 
te de  Inglaterra  produz  mui  pou- 
cas matérias  primeiras;  e  a  naá 
ter  acudido  continuamente  á  Gra- 
Bretanha  o  ouro  de  Portugal,  pa- 
ra buscar  ,  e -comprar  nos  paizes 
estrangeiros  o  necessário  para  as 
manufacturas  Inglezas. ,  jamais  te- 
riaõ  estas,  chegado  ao  estado  flo- 
:.  recente  em  que  hoje  as  vemos. 

Nao  he  dizer  isto  ,  que  an- 
tes da  dita  época  ^naõ  tivesse  a  In- 
glaterra industria  ,  e  commercio 
próprio;  mas  esta  industria,  e  es- 
te commercio  tinhaó  limites.,  ern 
vez  que  depois  da  posse  das  minas 
depuro  do  Brasil,  naó  osconheeecv 
He  pois  evidente  que 'a  naõ 
ter  a  Grã-Bretaoha  o  recurso  do 
Brasil,  teria  de  sejeitar-se,  ou  a  ar- 
■  minasse  desde  logo  ,    gastando 


•>!» 


í 

i 


I 


3 

1 

I 


(«O 

roais  do  que  as  suas  rendas  lhe 
permittissem  ,  ou  a  permanecemos 
limites  em  que  a  teve  sua  pobreza 
por  espaço  de  dez  séculos. 

Do  que  deixamos  dito  nao 
deve  inferir-se  que  naõ  faça  mais 
que  passar  pela  Inglaterra  o  ouro 
do  Brasil:  sahe  huma  parte  ,  efi- 
ca  outra  dentro  dos  domínios  da 
Grã  Bretanha  ;  mas  he  taõ  com- 
mum  nelles  amoeda  Portugueza, 
com©  a  do  próprio  paiz  ,  e  taó 
conhecida  em  Londres  a  eifigie  do 
Rei  de  Portugal  como  a  do  de  In- 
glaterra. 

O  governo  Inglez  paga  as 
suas  tropas  com  cruzados  ,  e  o 
serviço  da  monarquia  se  faz  qua- 
si  inteiramente  com  o  ouro  do 
Brasil. 

Tem-se  usado  em  varias  oc- 
casiôes  de  distinctos  meios  para 
atalhar  o  extraordinário  poder  dos 
Inglezes;  mas  nunca  se  empregou 
o  único  que, pode  produzir  bom 
cffeito ;  de  maneira  que  parece  te- 


'uâ 


( 63 ) 

retn  convindo  os  mesmos  inimi- 
gos da  Inglaterra  em  submimstrar- 
lhe  os  meios  de  adquirir  mais  tor- 
ças ,  a  fim  de  polia  em  estado 
de  atacar  vantajosamente  as  outras 
potencias  da  Europa. 

Nós  pasmamos  de  ver  que 
resiste ,  e  resistio  a  Inglaterra  a 
tantos  esforços  dos  seus  inimigos  ; 
mas  naõ  reparamos,  que  nunca  *e 
acertou  em  dar-lhe  o  golpe  onde 
convinha;  e  como  os  estados  sao 
como  os  corpos  humanos ,  que  tem 
partes  solidas,  e  mortaes ,  e  par- 
tes que  naõ  o  saõ  ,  todas  as  re- 
tidas, que  naõ  se  daÕ  naquellas, 
podem  curar» se  com  o  tempo. 

Assim  pois  naõ  se  deve  pen- 
sar em  abater  o  formidável  poder 
da  Inglaterra ,  em  quanto  naõ  se 
destruírem  os  princípios,  por  on- 
de se  elevou;  isto  he,  em  quanto 
naõ  se  dividir  o  produeto  do  Brasil, 
ou  naõ  se  fechar  o  manancial  das 
suas  riquezas. 

O  estado  lastimoso  ús  ror- 


■ 


<ugal  ^poís  do  terremoto  do  a  imo 
ee  i7jy,  parece  que  heo  raais  pro- 
porcionado, para  fazer  abrir  os  o 
Ihos  aos  .Portugueses ,  corno  tam- 
tem    as    outras   nações  da   Euro- 
pa ••    ha  instantes  decisivos,  con- 
jecturas ,    e  acontecimentos  im- 
previstos de  tal  natureza ,   que  se 
na    habilidade   para  servir-se  dei- 
Jes  ,  e  naó  os  deixar  perder.,  po- 
dem con verter-se  em  universal  pro- 
veito.   SaÕ  muitas  as  nações  oue 
tem  interesse  em  reflectir  sobre  a 
situaçaõ   de  Portugal ,  menos  ar- 
nnnaao  com   as  desgraças  que  o 

ceo  fez  chover  sobre  elle,  do  que 
com  o  seu  máo  systema  politico, 
o  qual  se  conviessem  em  mudal- 
iç  os  Portuguezes ,  ajudados  de 
a.gumas  potencias  amigas,  pode- 
na  renascer  aquelie  reino  das  suas 
próprias  cinzas. 

ra^SIfnd°IStOCerto>  conside- 
rando bem  as  cousas  politicas,  pd- 
de-se  assegurar  que  nada  perdeo 
lortngalnas  suas  espantosas  de*. 


J 


(  fiy  ) 

graças,  causadas  pelo  terremoto.; 
a  destruição  de  muitas  casas  ,  e 
edificios,  a  de  huma  infinidade  ue 
mercadorias  pertencentes  quasi  to- 
das aos  estrangeiros  ,  o  incêndio 
dos  trastes  r  e  a  perda  de  alguns 
vassallos ociosos, que  nem  erao  la- 
vradores,  nem  artífices  ,  nao  por 
dem  formar  hum  vasio  no  systera* 
geral  do  governo:  assim  pois,  qual- 
quer  potencia  que  faça  conhecer 
.aos  Portuguezes  que  quasi  tudo 
o  que  perderão  era  fructode  pai- 
zes   estrangeiros,    lhes  mostrara 
que    somente  perderão   os  mate- 
riaes  da   sua  própria  ruína,  e  is- 
to mesmo  lhes  manifestará  que  tem 
ainda  outra   maior  calamidade  de 
que   lihertar-se  ;  mas   para  poder 
persuadillos  he    preciso  primeiro 
que  tudo  curar  aquella  nação  das 
suas  antigas  preoccupaçÔes  poli- 
ticas ;  e  se  isto  nao  se  logra,  se- 
rá  huma    perda  sem  contrapeso , 
tanto  pelo  que  respeita  a  Portu- 
gal, como  ás  outras  nações  da .bttr 


;. 


a 


(66) 
topa,  i  excepção  .dos  Ingleses,  que 
saberáó  desiorrar-se  de  tudo  com 
as  minas  do  Biasil. 

Deve  pois  principiar-se  a  dis- 
sipar em  Portugal  o  fantasma  po- 
litico, que  lie  a  base daquelle  mi- 
nistério,, persuadindo-lhe  que  pô- 
de  existir  o  Reino ,   e  ser  flore- 
cente,  e  poderoso  independente 
da  sua  alliança  com  a  Inglaterra- 
e  se  esta  verdade  naõ  se  Jhe  per- 
suade,.,  seráõ  inúteis  quantos  pas- 
sos se  dem  pelos  ministros  estran- 
geiros em  Lisboa  a  favor  daquel- 
Ja  corte. 

Ha  certas  cousas   na  politica 
que  se  tem  sempre  por  seguras  , 
so   porque    liuma  vez   se    crêraó' 
quando  Portugal  se  eximio  do  do- 
mínio da  Hespanha  ,  podiaá  pare- 
cer verosímeis  as  razões  de  bus- 
car a  protecção  da  Inglaterra  ;  mas 
estas  razoes   naõ    subsistem  já 
nem  se  quer  na  apparCncia  ,  por- 
que o  mundo  politico  mudou  in- 
teiramente de  face ;  mas  á  íngla- 


•w.  ^rj 


terra   impotta-lhe   manter  a  illj- 
Tdò  .até  da  obrigação  forçada  e^ 

que   está  de   apoiar  com    torças 
?ertos  estados  ,  cuja  rmna  caba- 
ia também  aSua  ,  soabepersua- 
dir  a  Portugal,  que  f  este  lhe  man- 
cas vanV^o^ 
«ue  lhe  tem  concedido   sobre  as 
outras  nações,    ella  o  protegera, 
Jlasuaparte.todasasvezesque 

aWa- potencia  pensar  em  inva. 
diUo,  oumokstallo-,  masbemis. 

Sr  ir  mui  pouco  versado  nos  ne-- 
«ócios   para  cahir  neste  laço-,.  * 
La  naó  conhecer,  que  soomte 
resseda  Grã^Bretanha  _  e  nao  o 
rportugalh.oqued.ctaaqueH 

las  refiexóes  ,.  oquefaz^e  ará 
proteger  aos  Portugueses,*  com- 
Sa^uaalliança  a  qualquer  pre- 

L,  e  naÓ  hum  principio  de  des- 
fnteresse,  de  generosidade,  ou  de 

conveniência  reciproca»  . 

Procurou  também  a  Inglater- 
ra com  extraordinário  cuidado  por 


I 

■A 


I 


i 


lan  rcl  °  sempre  da  sua  parte 
e  .par, ,1  b  d  a  uniaõ  com  I?  ^ 
Jha ,  porem  até  o  mais  apaixor». 
jo  pode  conhecer  depois  daíral 
t^açadePor/galnoCcv 
°\  * '>  ?  >  .V*e  os  desígnio*  oue 

a  Hespanha  pel0  espaço 

damenr^  ■  í°     ^  °  minimo  f"«- 
dksf,      aIn;e,rriente   convencido 

Por  aquelle   momento     Z    ti?,» 

£fr::-.^-td 


'tquistar  Portugal,  se  tivesse  sido 
essa  a  sua  antiga  máxima  de!  po- 
litica, como  suppóe  â  Inglaterra  ?; 
Com  dois  mil  homens  só  que  ti- 
vesse feito  entrar  no  reino,  se  te- 
ria apoderado  delíe ;  mas  portou- 
se  a  corte  de. Madrid  de  mui dis- 
tincta  maneira  :    tomou  parte   na 
desgraça  dos  Portuguezes :  dêo  or- 
dens para  soccorrellos-,    para  en- 
viar-lhes  viveres,  dinheiro,  &c; 
época  mui  notável  na  Europa  ,  e 
que   deve  destruir  para  sempre  a 
-preoccupaqaõ  geral  de  que/anhe- 
la  ,  e  anhelou  a  Espanha  a  occa- 
siaõ    favorável  de   apossar-se  da- 
quelle  antigo  pedaço  separado  da 
sua  monarquia, 

Naô  he  de  admirar  que  hu- 
rna  naçaõ  ,  que  se  exime  da  obe- 
diência do  seu  Soberano  ,  torne 
todas  as  precauções  necessárias 
para  naõ  tornar  ao  estado  de  que 
sahio  ;  mas  quando  9  e  onde  se 
terá  visto  ,  que  por  evitar  hum 
perigo  duvidoso ,    ou  imagitiario5 


S 


C7o) 
se  recorra  a  huma  ruina  certa,  e 
real  ?  Póde-se  assegurar,  que  Por- 
tugal, por  evitar  a  sua  perda  ,  se 
perdeo   miseravelmente  ,    pois  os 
•Inglczes,  com  pretexto  de  proteger 
aquelle  reino ,  o  privarão,  e  privao 
do  seu  commercio  ,  e  da  sua  indus- 
tria,   tiráraô-lhe,  e  tíraõ  as  suas 
riquezas  ,    destruirão  lhe ,  e  des- 
troem lhe  os  seus  exércitos-,  e  an- 
niquiláraõMhe,  e  anniquilaõ  a  sua 
marinha.  Que  maiores  males  lhes 
poderia  fazer  o  inimigo  ?  A  inda  que 
.Portugal  tivesse  tornado  a  entrar 
em  poder  da  >Espanha  ,  teria  per- 
dido tanto  o  seu  estado  politico? 
Quando   hum  governo  se  a- 
podera  das  riqúezasde  outro  ,  ten- 
do-o  na  mais  absoluta  dependên- 
cia das  cousas  physicamentc  neces- 
sárias, naõ  somente  perde  quan- 
to se  tem  insinuado,  mas  tamhem 
a  liberdade  civil ,  que  só  existe  no 
nome;  e  assim  pois  teria  sido  me- 
lhor para  Portugal  teilo  qualquer 
potencia   conquistado  com  as  ar- 


*nâs,    porque  neste  caso  só  teria 

pensado  nos  meios  de  romper,  e 

libertar  se  das  cadeias,  em  vez  que 

bo  outro  naó  hz  roais  que  arras- 

callas,,  e  soportar  o  seu  peso  com 

paciência,  ( 

Está  cheia  a  historia  de  nações 

que  sacudirão  o  tjugo  "do?  que  as 
conquistarão  á  força  de  armas  ;  mas 
quasi  nunca  se  vio  sahir  hurna  na- 
çaõ  daquella  espécie  de  escravi- 
dão em  que  a  poz  outra,  destruin- 
do as  suas  artes,  e  o  seu  commer- 
cio  ,  porque  tendo- lhe  tirado  as. 
suas  riquezas  lhe  cortou  o  nervo 
do  seu  poder  civil „  ^  politico. 

Í9aó  podia  ,,  nem  devia  a  In- 
olaterra^  por  causa  dliuma  infini- 
dade de  considerações  tiradas  do 
systema  geral .,  valer-se  da  força  7 
e  das  amas  pára  destruir  Portu- 
gal ,  e  assim  lhe  foi  preciso  ser- 
*vir-se  para  executallo,  d5ÍTuni  sys- 
tema  económico  de  princípios  des- 
truetivos  :  era  precizo  manifestar 
este  systema  sob  o  aspecto  ?  e  ap- 


(72) 

■parencias  mais  vantajosas  ,  e  fazer 
que  o  adoptassem  os  Portuguezes 
sem  embargo  de  ser-Ihes  por   ex- 
tremo prcjudicial.Conscguio-o  ta  6 
telizmenre  a  Grã-Bretanha  á  força 
de  artificios,  e  daquella  eloquên- 
cia ,  que  lhe  he  natural  quando  se 
trata  dos  seus  interesses,  que  che- 
gou   a  encantar  Portugal  com  as 
máximas  seguintes,  com  as  quaes 
reduz.o  este  reino  á  mina  ,    e  fa- 
talidade em  que  o  temos  pintado. 

I.  Que  o  ouro  he  huma  merca- 
doria como  as  outras. 

II.  Oue  Portugal,  cujo  terre- 
no he  naturalmente  estéril,  „ao pôde 
produzir  o  que  fe  necessita  para  a 
subsistema  dos  seus  halitantes. 

III.  Que  a  agricultura  era  imi- 
ti   ne.quelle  Remo  ,    c  que  cstavao 
obrigados  os  demais  estados  da  I 
ropa    a   sitbmimstrar-lhe  as  cousas 
physicameiit*  necessárias. 

IV.  Que  Portugal  voo  tem 
necessidade  de  exercito  de  terra  ,  nem 
de  esquadras  de  mar ;  e  que  toda  a 


s 


I 


1  ^to 


( n  ) 

Ègropa  esta  interessada  em' fnant eh 
4o  no  estado  em  que  se  acha, 

V.  Que  o  ouro  que  se  tira  das 
minas  àa  America ,  conduzido  d  Eu* 
repa  j  e  levado  depois  ao  Oriente pe- , 
lo  commercio  da  índia ,    se  consome 
como  as  outras  mercadorias. 

VI.  Que  por  mais^que  digaS  ? 
os  Portugueses  saÕ  mais  ricos  hoje 
em  dia,  que  antes  do  descobrimento 
das  suas  minas* 

VIL  Que  Portugal  nao rtem  ne- 
cessidade de  manufacturas  y  visto  que 
com  o  seu  ouro  pode  ter  todas  as  merca- 
dorias fabricadas  mais  baratas  do  que 
podiaô  fabricar- se  no  seu  Reino. 

VI IL  'Que  ainda  que  os  Por tu- 
guezes  quizessem  estabelecer  manufac- 
turas y  nao  o  poder  iao  conseguir,  por- 
que o  clima  do  paiz  he  opposto  ao 
estabelecimento  delias. 

IX.  Que  he  conveniência  o  fa- 
cilitarem os •  Inglezes  a  Portugal  qs 
meios  de  extrahir  o  seu,  ouro ,  pois 
sem  isto  os  negócios  da  Europa  ir  iao 
muito  mal 

D 


i 


"%V 


(74) 

y\.  Que  desde  a  alUança  de  Por- 
tugal com  a  Inglaterra  se  introduz w 
entre  os  Pcrtuguezes  hum  luxo ,  que 
he   infinitamente  proveitoso  d  nação. 

XI.  Que  Portugal  nao  pôde  pas- 
sar sem  o  auxilio  dos  outros  estados 
da  Europa ,  e  especialmente  da  In- 
glaterra. 

XI  í.  Que  a  frequência  dos  es- 
trangeiros cm  Portugal,  he  necessá- 
ria ,  que  esta  he  a  que  fez  mais  so- 
ciáveis os  Portuguezes ,  e  os  pojz 
de  nivel  com  as  outras  nações  culta  r. 

Xill.  Em  fim,  que  he  neces- 
sário na  ordem  geral  das  cousas ,  que 
algumas  nações  estejao  inteiramente 
ociosas,  em  quanto  outras  trabalhão,  e 
que  assim  o  tem  ordenado  aP  revidem  ia. 

Estas  máximas  encerraô  hum 
corpo  completo  de  meios  seguros, 
e  ínralliveis  para  arruinara  monar- 
quia Pcrtugueza,  e  assim  produ- 
zirão o  seu  eíFeito.  Vou  pròvallo 
demonstrativamente  máxima  por 
máxima. 

Qundo  n'hurn  estado^se  ad- 


** 


minem  semelhantes  maxiíftas,  tu^- 
do  vai  perdido,  e  ninguém  con- 
cederá que  nao  tendo  hum  povo  mo- 
do de  governar-s.e  ,  e  este  viciado  > 
seja  preciso  seguilio. 

De  hum  século  a  esta  parte 
temos  visto  vários  governos  apon- 
to de  perecer  pelas  desordens  in- 
troduzidas na  sua  constituição;  mas 
também  os  vimos  emendaiias  ,  e 
com  a  sua  reforma  fazerem-se  na- 
ções  poderosas.  Será  pois  possível 
cue  esta  regra  seja  boa  para  todas 
as  outras  naç<k&>  e  má  somente  pa- 
ra Portugal  ? 

Naõ  ignoro  que  quando  hum 
^ovo  tem  estabelecido  hutn  certo 
modo  de  conduzir- se ,  he  hum  pou- 
co peiigoso  mudallo;mas  naõ  he  es- 
te o  caso  em  que  se  acha  Portu- 
gal :  este  Reino  está  cheio  de  gen- 
te, que  vio  nascer  este  systema, 
^  que  padece  os  damnos  deiie. 
Naõ  ha  sessenta  annos  ,  que  esta 
naçaõ  se  conduzia  por  máximas 
diametralmente  oppostas. 


\ 


s 


\ 


fflF 


^  J     (  76  ) 

lodo  o  mundo  sabe,  que  es- 
-te  povo  se  manteve  mais  de  mil 
.annos  só  com  a  sua  industria  ,  e 
valor  ,  sem  o  soccorro  de  mina  al- 
guma de  ouro.  Que  nova  fatalida- 
de pois  se  derramou  sobre  elle  ? 
que  encanto  he  este?  que  illusaõ? 
Se  as  antigas  máximas  foraõ  boas 
.até  Pedro  II.  porque  haõ  de  ser 
más  agora  ?  Alguém  me  respon- 
derá, que  hoje  está  o  escado  so- 
bre outro  pé,  e  systema  que  na- 
quelle  tempo ;  se  porém  este  sys- 
tema  hemdo,  se  se  dirige  á  destrui- 
ção da  uberdade  da  nação  ,  que 
duvida  poderá  haver  cm  dcstruillo  ? 

Em  matéria  de  governo  poli- 
tico ,  e  civil  9  he  máxima  segura 
de  estado  ,  que  se  quando  corri- 
gindo os  abusos,  saõ  maiores  os 
inconvenientes  que  resultaó  ,  he 
forçoso  deixallos  como  estavao  ; 
mas  quando  elles  saõ  superiores  aos 
inconvenientes,  nao  deve  haver  a 
menor  duvida,  em  que  seja  pre- 
ciso reíormallos  ,   porque  110  go- 


(77  ) 
verno   succede    o  mesmo  que  em 
todas  as  outras  cousas  do  mundo? 
que  o  maior  sempre  arrasta  o  me- 
noiv 

§.  V1ÍL 

Que  o  ouro  he  hama  mercadoria  co- 
mo as  outras. 

Segundo  o  systenia  que  se  acab& 
de  expor,  o  ouro  hehuma  merca- 
doria ,  da  qual  se  desfazem  os  Por- 
tuguezes  em  beneficio  dos  Ingle- 
ses, como  os  Hollandezes  da  sua\ 
pimenta  com  o  restante  da  Eu- 
ropa. 

Se  se  considera  o  ouro  como 
metal  ,  he  certo  que  he  huma  mer- 
cadoria ;  mas  também  está  deter- 
minado ?  que  as  suas  qualidades  o 
fazem -superior  a  todas.  O  ouro 
representa  tudo :  he  o  signal  da  ri- 
queza, e  do  poder:  dura  mais  qus 
as  outras  mercadorias,  e  muito  tem- 
po depois  de  consumidas  estas  , \$&~ 
conserva  no  mesmo  estado. 


r^w 


! 


í 


3 

I 


(72) 
Destas  breves  leflexóesse  de- 
duzem consequências  mui  funestas 
para  a  nação  que  se  desfaz  do  ou- 
ro ,  pois  facilita  ás  outras-  os  meios 
mais  seguros  de  fazellas  superio- 
res ,  e  mais  poderosas. 

Em  nenhuma  historia  se  lè, 
que  hurna  nação  se  tenha  servido 
desta,  ou  daquella  mercadoria  pa- 
ra destruir  hum  Reino;  mas  a  ca- 
da passo  se  achaó  exemplos  ,  de 
que.  o  ouro  d'hum  estado  que  pas- 
sou a  outro  ,.  servia  para  subju- 
gallo. 

Se  o  ouro  he  mercadoria  tal , 
se  he  hum  género  como  os  outros, 
por  que  razão  todos  os  príncipes 
da  Eurooa  fizéraô  leistaõ  rigoro- 
sas  para  impedir  que  saia  dos  seus 
estados?  e  pelo  contrario,  por- 
que animaõ  ,  e  daó  recompensas 
aos  que  de  outras  nações  o  intro- 
duzem nas  suas  ? 

Os  Portuguezesincorrem  aqui 
n'huma  contradicçaõ  manifesta  :  he 
çejtis-simo  ,  que  a  primeira  maxi- 


C  79  )  .  r 
tm  do  governo  politico  hs  r  que 
o  dinheiro  naõ  saia  do  estado  :  to- 
dos os  soberanos  do  mundo  con- 
cordaõ  sobre  este  ponto ,  ainda  que 
em  outras  cousas  do  governo  naõ 
sejao  uniformes* 

N'hum   reino  rico,    e  opu- 
lento em  si,  que  tem  grandes  en- 
tradas ,    e  cuja  posição,   e  com- 
mercio  se  avarrtajaõ   sobre  as  na- 
ções que  commerceao  com  clle  , 
pode  muito  bem  es-t^belecer-se  o 
fazer   do  ouro  mercadoria  ;.   por- 
que   se  hum  primeiro  giro  o  fa# 
sahir  fora ,    torna    logo    a   entrar 
por  outro  giro  ?  e  quasi  sempre 
com  augmento.  He  mais  hum  ra- 
mo ,  que  estes  estados  accrescen- 
taõ  ao  seu  commercio, 

M»s  nlium  reino  ,.  que  pela 
situação  dos  seus  negócios  deve 
a  todo  o  tirando ,  e  ao  qual  nin- 
guém deve  nada  ;  que  nao  tem 
senaõ  huma  porta  por  onde  sahe 
o  seu  dinheiro,  cujo  ouro  vai  sem 
remissão  augmentar  as  riquezas  de 


\ 


outras  nações,  em  tal  reino  nao; 
deve  ser  considerado  este  metal 
como  mercadoria. 


§  IX. 

Que  senda  Portugal  estéril  por  na- 
tureza ,  naS  pode  bartar  para  a 
subsistência  dos,  seus  habitantes. 

kJe  fosse  verdade  o  que  os  par- 
tidários do  systema-  Ifiglez  asse- 
guraõ  sobre  a  esterilidade  de  Por- 
tugal ,  eu  confesso  que  seria  hurtv 
dos  fenómenos  mais  extraordiná- 
rios da  natureza,e  hum  caso  novo  na 
mundo  :  isto  he  ,  que  depois  de 
ter  produzido  a  natureza  dois  mi- 
lhões de  homens  n'hum  continen- 
te ,  se  negasse  a  dar-lhes  a  pre- 
cisa subsistência. 

Naõ  conhecem  os  que  fabri- 
cafí  taes  systemas,  quaó  absurdas 
saõ  as  suas  proposições.  A  con- 
servação tem  huma  intima  relação 
com  a-creaçaõ:  a  primeira  he  sem- 


(St  ) 
.pre" consequência  da  segunda.;  -e 
este  systema  he  superior  a  tu- 
dos  os  systemas,  porque  he  o  da 
natureza  mesma.  Se  suppomosque 
Portugal  padece  hum  a  estei;ilida-: 
de  -natural',  he  preciso  também 
suppor,  que,  sempre  a  padecei,; 
porque  a  qualidade  pbysica  nun- 
ca se  altera  tanto ,  que  cause  ta- 
manhas :revoíu.ções,,  de  sorte  que 
huni  paiz  que  tenha  produzido  a 
-subsistência  .necessária^  deixe  de- 
pois de  produzi  11  a. 

Além  de  que  seria  hum  ca- 
so mui  extraordinária,  que  todos 
os  historiadores  tivessem  convin- 
do de  nao  dizer~nos  ,  que- este  rei- 
no na  (5  podia  dantes  subsistir  por 
si  mesmo ;  mas  suecede  muito  re-lò 
contrario,  pois  nos  dizem  que  ion- 
-ae  de  ser  escasso  de  alimentos, 
abunda  delles  ,para  sortir  os  seus 
lisinhos. 

Se  alguma  má  influencia  se 
espalhou  em  Portugal,  ioi  certa- 
mente depois  do  tratado  de  Croín- 


9  if  w 


í 

i 


I 


Wei  ;  antes  dc^ta  época  tinha  em 
6i  este  reino  aquilio  de  que*  pre- 
cisava ;  de  sorte  que  o  ar  que  o 
esterilisou,  veio  de  Inglaterra. 

Naõ  ignoro  que  o  terreno  de 
Portugal  he  menos  abundante  de 
certas  causas,  que  alguns  outros 
paizes  da  Europa  ;  mas  também  sei, 
que  a  sua  supposta  esterilidade 
tem  a  sua  raiz  no  s-ysterna  de  agricul- 
tura de  Inglaterra.  Depois  que 
com  a  arte  se  achou  o  meio  de 
sjpprir  a  natureza,  e  que  a  agri- 
cultura ,  como  todas  as  outras  par- 
tes da  administração,  se  sujeitou 
á  razão  do  calculo,  todos  os  pai- 
zes do  mundo  se  podem  fazer  fér- 
teis até  hum  mesmo  grão,;  por 
exemplo  :  hum  estado,  cujo  terreno 
he  três  vezes  menos  bom  que  o  de 
outro,  naõ  tem  mais  do  que  aug- 
mecttar  do  triplo  a  cultura  das  suas 
terras,  c  porá  o  seu  produeto  ao 
nivcl  com  as  que  saõ  três  vezes 
melhores.  Este  he  o  systcma  de 
agricultura  dos  Suissos.  Quantos 


(»3) 
estados  ha  na  Europa  m^nos  fér- 
teis que  Portugal,  que  sem  em- 
bargo daó-com  abundância  a  sub- 
-sisiencia  aos  seus  habitantes? 


::§  x 

Que   todos  os  estados  devem  sortir 
-Portugal  do  que  necessita. 

Jtixpõe-se -a -tantos  riscos  hum  po- 
vo, que  recebe  de  outras  nações  as 
cousas  necessárias  para  a  sua  sub- 
sistência, que  por  muitos  que  re- 
sultem do  meíhodo  contrario,  de- 
ve-se-lhe  dar  a  preferencia.  Go- 
mo todo  governo  se  acha  tfhutna 
posição  violenta  ,  cada  governo 
(ainda  em  tempo  de  paz  )  deve  con- 
siderar-se  n'hum  estado  de  guer- 
ra respectiva  ,  e  pôr-se  em  esta- 
do de  naõ  precisar  das  outras  na- 
ções. E  assim  como  o  objecto  dos 
vassallos  he  a  sua  fortuna  parti- 
cular, o  de  hum  estado  deve  ser 
•o  se-u  engr^ndecimemo^geraL 


i 


.      (  *4  )  . 

A  primeira  máxima  da  guer- 
ra he  ter  mantimentos :  huma  pra- 
ça atacada ,  que  carece  delles,  naõ 
se  pode  sustentar;  e  naó  ha  ne- 
cessidade ae  empregar  as  armas 
contra  ella  ,  porque  está  perdida 
sem  remédio. 

Sem  muito  exame  se  conhe- 
ce a  difierença, ,  que  ha  entre  as 
nações  que  podem  subsistir  por 
si  mesmas,  e  as  que  rirão  a  sua 
-primeira  subsistência  das  estran- 
geiras. A -França,  e  a  Inglaterra 
-existiriaõ  ainda  que  o  resto  do 
mundo  se  anniquilasse  respectiva- 
mente a  ellas.  A  razaõ  he  mui 
singela,  porque  estas  duas  nações 
-tem  dentro  de  si  as  cousas  mais 
necessárias  para  a  vida  ,  e  nao 
■devem  este  beneficio  tanto  á  sua 
natural  posição  ,  e  terreno  ,  quan- 
to á  sua  politica  ,    e  agricultura. 

Nao  basta  a  hum  povo  ter 
metaes  com  que  acuda  ás  suas  ne- 
cessidades ,  necessita  ter  ainda  no 
seu  território  as  cousas  de  primei- 


ra  subsistência  para  a  vida.  A  bticn 
Imperador  da  China  apresentou 
hum  particular  hunias  pedras  pre- 
ciosas ^  que  tinha  sacado  de  huma 
mina  y  mas  -aquelte  Príncipe  *a 
marido^  fechar  dizendo,  que  naõ 
queria  que  o  seu  povo  se  occu- 
passe  nrhuma  cousa,  «que  por  si 
mesma  naõ  .-era  boa  nem  para  co- 
íiier,  nem  paia  vestir. 

Ha  huma  grande  diferença 
entre  as  cousas  necessárias,  e  os 
-meios  de  ad-quirillas.  Estes  estaõ 
sujeitos  a  huma  infinidade  de  ac- 
cideates;  e  com  os  mesmos  com 
que  se  .concede  algumas  yezes^u- 
rna  cousa,  naõ  se  pôde  lograr  ou- 
tras vezes,  ' 

Por  mais  que  se  altere  o  sys- 
tema  geral  da  F.uropa  ,  qualquer 
estado  que  tenha  em  si  as  cousas 
de  primeira  necessidade ,  achará 
sempre  dentro  de  si  próprio  os 
meios  de  reparar  os  golpes  ,  que 
lhe  dêm  os  seus  visinhos.  Bas ta- 
lhe  para  sua  defeza  despertar  © 


! 


(  86  ) 
valor  dos  seus  povos,   e  Ievan- 
tal-los  se  estaõ  abatidos  (  cousa  fá- 
cil de  executar  quando  se  trata  da 
vida  ,    e  fortuna  delles);   mas  o 
que  naõ  se  pode  recobrar  de  re- 
pente ,    he  a   industria  que  a  na- 
ção   tiver    perdido.    Saõ  precisos 
alguns   séculos  para  que  torne  a 
alcançar  por  si  mesma  numa  sub- 
sistência, que  está  costumada  a  re- 
ceber de  tnaó  estranha;  e  terá  de 
vencer  para  este  fim ,  naõ  somen- 
te as  circunstancias  politicas,  mas 
ainda  as  mesmas  paixões  dos  ho- 
mens ;    porfie  quando   a   ociosi- 
dade, a  preguiça  ,  e  a  aversão  ao 
trabalho  lançarão  raizes  n'hum  po- 
vo ,    naõ  saõ  cousas  que  se  cor- 
rijaõ  em  hum  anno.  He  impossi- 
vel  reformar  de  repente  huma  na- 
ção:   saõ  precisas  algumas  gera- 
ções: e  neste  tempo  ninguém  po- 
de impedir  a  hum  estado  ambicio- 
so que  ponha  em  execução  os  pro- 
jectos perniciosos  que  tiver  me- 
ditado. 


(*7) 

I Por  mais  que  se  combmefei 

os  differentes  modos  de  governo^ 

por  mais  que  se  estabdeçaõ  no- 
vos, sy&temas  de  politica  v  será 
sempre  verdade  que  se  achará  em 
.hutna  situação  precária  todo  o  po- 
vo ,  que  naó  tirar  do  seu  próprio 
território  o  que  lhe  he  physica- 
. .mente  necessário:  as  melhores  leis 
seráõ  inúteis  >  supérfluos  todos  os 
regulamentos  de  policia .,  e  o  seu 
ooverno  politico,  e  civil  hum  en- 
te de  razão. 

As  superfluidades  se  .podem 
muito  bem  receber  dos  estrangei- 
ros, porque  sem  ellas  pódern  pas- 
sar os  povos;  mas  o "  preci sãmen- 
te necessário  deve  achar-se  den- 
•  tro  do  estado..  Nào  ha  systètna  de 
politica  que  possa  supprir  a  sua 
.falta;  quero  "dizer ,  a  privação  do 
paó  j  e  do  vestido. 

Do  que  fica  dito  se  deduz ^ 
que  naó  se,  precisa  difama  grande 
revolução  para  ver  arruinado  o  go- 
verno de  PoftugaL.Bastaquedua% 


*mM 


(S8) 
ou  três  colheitas  faltem  á  "Ingla- 
terra ;  porque  o  supérfluo  desta 
província  heo  que  abastece  do  ne- 
cessário a  Portugal.  E  na  verdade 
que  naô  será  nenhum  milagre  ver 
esta  falta  de  colheitas  na  Gra-Bre- 
tanha. 

§  XI. 

Que  Portugal  nao  tem  necessidade  de 
exercito  de  terra ,  nem  de  esqua- 
dras de  mar  ;  e  que  toda  a  Euro- 
pa está  interessada  em  mantello 
na  situação  em  que  se  acha. 

JtLu  me  persuado  facilmente  qut 
o  systema  presente  da  Europa  he 
favorável  ás  máximas  com  que  se 
governa  hoje  em  dia  Poirugal  ^ 
mas  deixará  de  ser  hum  grande  des- 
acerto do  governo  deste  estado  o 
ter  deixado  perder  a  sua  milícia^ 
nao  ter  nem  exercito  5  nem  solda- 
dos;  n'huma  palavra,  nao  ter  for- 
ças com  que  defender-se?  Pcisua- 
diraõ-se  os  Portuguezes  ?  que  o 


(*9\     , 
systema  da  Europa  ha  de  ser  sem- 
pre o  mesmo?  Nao  poderá  pade- 
cer huma  revolução  geral  esta  par- 
te do  mundo?  Na6  poderáo  mu- 
dar os  interesses  dos  seus  prínci- 
pes? Desgraçada  a  politica",  que 
mo  vê  as  cousas  sena6-.no  ponto 
actual.  Este  defeito  encheo  a  ter- 
ra de  males,  e  derribou  mais  d'hurn 
trono ;   porque  quando  as  cousas 
tem  tomado  já  hum  certo  curso* 
nao  parece  que  pode  chegar  o  caso 
de  mudar-se;e  ólha-se  sempre  co-    - 
mo  impossível  qualquer  outro  sys^ 
tema  que  se  aparte  do  que  ha»es* 
tabelecido.  . 

Mas  para  vero  contrario  lenv- 
bremo-  nos  somente  do  que  succedea 
na  Europa   de  hum  século  a  esta 
parte,  e  veremos  que  tudo  o  que 
a  politica  julgava  então  como  im-. 
"  possive!  succedeo  depois.  Segundo 
estavao  então  as  cousas,    parecia 
impossível  que  a  Borgonha  chegas- 
se a  ser   província  da   França  ^    e 
muito  menos  o  ELoussillpn.  Tanir 


li 


t 


3 

I 


.  C  90  > 

pouco  parecia  regular  que  adquiris- 
se huma   parte  íaõ  considerável  d* 
Flandres,  porque  tudo  isto  pare- 
cia contrario  aos  direitos  de  cada 
principe  em  particular ,  eao  equi- 
líbrio geral  da  Europa.  Do   mes- 
mo modo  parecia  impraticável ,  que 
a  Alsacia   pudesse  obedecer  a  ou- 
tros príncipes  ,  quenaô  fossem  os 
seus  antigos  Senhores ,  pois  esta 
desmembraçaõ  ,  ao   mesmo  tempo 
que  diminuía  as  forças  do  Impé- 
rio >  augmentava  a?  âa  potencia  a 
que  se  aggregav*.  Quem  havia  de 
crer,  segundo  os  mesmos  princí- 
pios,   que   hum   principe  da  casa 
de    Bourbon  havia  de  oceupar   o 
trono  de  Hespanha,  quando  rodos 
os  políticos  estarão  prognostican- 
do ,.  que  se  isto  chegasse  a  suece- 
der ,  a  liberdade   da  Europa  ficava 
destruída? 

O  mesmo  systema  tinha  per- 
suadido como  huma  cousa  imnos- 
siycl,  que  alralia  pudesse  ser  do* 
minada  por  hum  dos  ramos  da  ca- 


(9*), 
sa  de  França,  quando  os  interes- 
ses desta  monarquia  ,  .eosde  Hes- 
panha  chegassem  a  ser  huns  ;   e 
pelos  mesmos   princípios  se  jui- 
pavacomo  imaginaria  a  adquisiçao 
da  Lorena  para  a  França.   Esta  é- 
poea  se  considerava-  como  a  aa  es- 
cravidao  universal  da  Europa  :  es- 
tas ideas  fazia6  que  a  pragmática 
sancçaÔ  de  Carlos  V.  fosse  olhada 
como  o  fundamento  do  equilíbrio 
da  Europa  }    e  naÓ  obstante  tudo 
isto,  os  bens  da  casa  de  Aus«aA 
se  víraó  divididos.   Nada  dorete- 
rido  parecia  que  devesse  sueceder; 
mas  sem  embargo  ,  tudo  suecedeo. 
Se  hum  politico  no  meiado  do 
século 'passado  tivesse  prognosti- 
cado as  alterações  acima  declara- 
das ,  seria  tido  por  hum  visioná- 
rio,  ou  por  hum  louco.  Mas  os 
interesses  dos  príncipes  daquelle 
tempo  riaô  sao  os  mesmos  que  os~ 
dos  príncipes  actuaes.  Os  gover^ 
nos  que  naquelle   tempo  applicar 
vaõ  todos  os  seus  esforços.a,dHUfc 


I 


ti! 


I 


(  j*  ) 
puir  o  poder  de  certos  estados,  ho- 
je  procurao    por   todos  os  meios 
possíveis  o  seu  augmento  ,  e  prós- 
peridade. 

Os  soberanos  naõ  saó  infal- 
íveis em  matérias  de- politica     e 
enganao-se  grosseiramente   os  que 
se  figurão  que  naô  podem  errar : 
muitas  vezes  se  allucináraõ  sobre 
os  seus  próprios  interesses,  e  es 
seus    erros   occasionáraõ    funestas 
consequências    para  os  seus   esta- 
dos. Na  historia  moderna  achaÕ-se 
bastantes  exemplos  do  que  vou  di- 
zendo.  A  casa  de  Áustria  se  vio 
muitas  vezes  abandonada  daquellas 
potencias ,  que  tinhaõ  mais  interes- 
se em   naó  separar-se  nunca  delia; 
N'òutras  occisiôes  a  Hollanda  se 
unio  com  a  França  para  abater  as 
forças   de   huma   potencia  maríti- 
ma ,    que   em   boa    politica  devia 
procurar  ver  aagmWrtadás. 

Todos  sabem  que  a  Inglater- 
ra  naó  pôde  ter  outro  svstema 
que  o  de  obrar  de  concerto' com  a 


(  93  ) 
Hollanda  para  oppôr-se  ao  engran- 
decimento da  França;  e  sem  em- 
bargo houve  tempo  era  que  os 
Lnglezes,  e  os  Francezes  se  uni- 
rão para  arruinar  inteiramente  a- 
quella  republica. 

Toda  a  Europa  está  ingres- 
sada em  que  o  Turco  naõ  adian- 
te as  suas  conquistas;  e  todo  o 
mundo  vio  que  a  maior  parte  dos 
Soberanos  lhe  deixarão  lazer  mui- 
tas. Os  Venezianos  nas  guerras, 
de  Cândia, 'e  da.Moréa,  se  víraõ 
.abandonados  ao  furor  dos  Musul- 
maos.  Em  summa  ,  os  systémas 
daquelles  tempos  já  nao  existem; 
e  aos  de  agora  chegará  o  dia  em 
que  lhes  sueceda  o  mesmo.  E 
que  suecederá  então  a  Portu- 
gal, se  entre  tanto  naõ  cultiva 
as.  suas  terras  ,  e  naõ  adianta  as 
suas  manufacturas. 


(94) 

§  xir. 

*Que  o  ouro  que  se  tira  das  minas  da 
America ,  conduzido  á  Eurcpa ,  e 
levado  depois  uo  Oriente  pelo  canal 
ac  cemmercio  da  Índia ,  se  consome 
como  as  outras  mercadorias. 


ntes  do  descobrimento  das  mi- 
nas do  Brasil  ,  fazia  a  Europa  com 
pouca  diflerença  o  mesuro  coni- 
inèfcio,  que  hoje  em  dia  faz  com 
as  índias  Orientaes  :  aquclle  com- 
bíercio  se  fazia  do  mesmo  modo 
que  o  de  agora:  istohe,  levando 
lá  metaes  que  se  trocavas  por 
mercadorias;  que  he  o  modo  com 
•que  em  todos  os  tempos  commer- 
ciou  esta  parte  do  mundo  com  à- 
quella. 

He  pois  evidente,  que  se  a 
Europa  naó  tivesse  achado  o  modo 
de  remediar  os  inconvenientes  da- 
quellecommercio7já  naõ  se  acharia 


( 9P 

*ieíla  huma  onça  de  ouro ,  nem  de 
prata:  he  pois  evidente,  que  ex- 
trahindo  sempre  riquezas  d'huma 
espécie,  e  naô  as  supprindo  com 
outras  da  mesma  natureza  ,  ha  de 
chegar  o  caso  de  se  esgotarem  to- 
talmente ,  nao  obstante ,  a  expe- 
riência provou  o  contrário. 

O  estabelecimento  das  com- 
panhks  da  índia  antes  do  desco- 
brimento das  minas  de  ouro  do 
Brasil ,  nao  diminuio  a  somma  fixa9 
e  permanente  das  riquezas.Fizéraó- 
se  estes  estabelecimentos  sem  que 
delles  lhe  resultasse  mudança^  al- 
guma ;  porque  a  Europa  conside- 
rada como  hum  sé  corpo  ,  tinha 
iiurn  recuso  geral,  que  contrape- 
sava os  inconvenientes  do  com- 
jnercio  da  índia,  e  era,  como  o 
he  ainda  hoje  em  dia *,  o  produc- 
to  dus  minas  de  Espanha, 

Sempre  se  fez  com  prata  "o 
commercio  da  índia ,  e  até  de  mui 
poucos  annos  a  esta  parte  naô  se 
levava  lá  ouro  algum.  'Assim  naS 


l 

I 


i 


•*» 


1 


91 


J 

I 


-       <  ?6  ) 
se  ia  perder  na  índia  o  metal  de 

Brasil,    como  se  suppõe   no  sys- 

tema  Inglez ,  pois  pelo  contrario 

íkava  na  Europa,,  e  anniquilava 

pela  mesma  razaõ  Portugal. 

Desde  o  Reinado  de  Philip- 
-pe  II.  teraó  sahido  das  minas  de 
Hespanha  mais  de  três  mil  milhões 
•de  patacas  ,  e  com  este  cabedal  taõ 
enorme  fez  a  Europa  o  commer- 
cio  da  índia  -,  pois  de  todo  elle 
talvez  naó  passara'õ  de  cincoenta 
milhões  os  que  ha  hoje  em  dia 
cm  Hespanha. 

Póde-se  saber  com  pouca  dif- 
ferença  o  prbducto  das  minas  de 
ouro-,  e  prata  da  America  ;  mas 
naõ  a  diminuição  destes  metaes, 
porque  varia  muitíssimo. 

A  maior  parte  dos  estados  da 
Europa  evitaó  com  pragmáticas  o 
seu  consumo.  O  luxo  ,  as  modas , 
os  caprichos  de  certos  povos  saõ 
causa  de  que  se  use  mais  o  ouro, 
e  a  prata  n'hum  século  que  neu- 
tro. Nos  reinados  anteriores  tudo 


■(97)  

era  irso,e  agora  tudo  lie  doura- 
do. Já  naõ  se  usaõ  os  trastes  de 
ouro,  e  prata  que  foraõ  de  moda 
durarite  muitos  annosy  e  até  os 
templos  contribuem  a  haver  va- 
riaqaó  tias  riquezas  do  nosso  mun- 
do politico  5  porque  he  positivo 
que  consomem  mais  -prata  n?hmís 
tempos  que  n'outroSo 

Só  pelo  preço  das  mercado- 
rias, e  do  trabalho  pessoal  se  po- 
de calcular  o  augménto  do  oura 
D3  Europa,  separadamente  do  com- 
m  e  rc  i  o  da  I  nd  i  a  5  qu  e  h  e  a  se  pui- 
tura  das  nossas  riquezas. 

Trabalhei  muito  tempo  pa« 
-ra  descobrir  a  proporção  que  ';hâ 
entre  o  augmento  das  riquezas  de 
hum  estado  5  e  o  relativo  aíígmeií- 
to  do  preço  do  seu  trabalho  pes* 
soai ,  e  descobri  (  ao  menos  me 
pareceo  descobrir  )  que  n5huma 
monarquia  ,  como  por  exemplo,  a 
França,  isto  he,  n'hum  reino  otv 
de  o  primeiro  capital  das  rique* 
m$  fosse  de  cento  e  oitenta  trai 


i 


i 


I 


■ 

■I 


( 98 ) 

íhões  de  patacas ;  o  numero  dos 
seus  habitantes  de  dezesete  mi- 
lhões; onde  as  classes  de  gente 
estivessem  divididas  com  o  mes- 
mo   methodo  ;    onde   o 


governo 


tivesse  os  mesmos  princípios;  on- 
de a  actividade  dos  vassallos  es- 
tivesse no  mesmo  gráo  ;  o  com- 
niercio  no  mesmo  periodo;  se  o 
clima  for  com  pouca  differença  se- 
melhante ,  que  houvesse  o  mes- 
mo luxo  ,  o  mesmo  gosto  ,  as 
mesmas  paixões,  &c.  digo  que  o 
augmento  de  vinte  milhões  ,  ac- 
crescentados  a  primeira  massa  ge- 
ral, faria  que  subisse  hum  quin- 
to mais.  o  preço  do  trabalho  pes- 
soal. 

Resulta  disto,  que  sendo  ex- 
acto o  meu  computo,  seria  facii 
descobrir  em  que  parte  da  Euro- 
pa estaõ  hoje  os  thesouros  do  Bra- 
sil, e  bastava  para  isso  comparar 
o  preço  da  industria  de  todos  os 
estados  antes  do  descobrimento 
das  minas  Portuguezas,com  o  que 
tom  hoje  era  dia- 


C  99  )       ,;  , 
Poder-se-hia   descobnf  Cúít& 

este  thermometro  politico  o  gráo 
das  riquezas  de  cada  nação  5  e  cal- 
cular por  conseguinte  o  do"  seis 
poder. 

Se  o  ouro:  do  Brasil  .passas- 
se somente  pelas  oiaõs  dos  Euro- 
peos  sem  deixar-lhesfructo  algum 
como  se  suppõe  no  systerna  Xn- 
glez,  fixaria  hum  equilíbrio  inal- 
terável no  preço  do  trabalho  pes- 
soal ,  e  jamais  augmentaria  9  nem 
diminuiria  a  industria  ;  mas  to- 
dos sabemos  que  -succede  o  con- 
trario. 

Para  provar  a  dissipaçá'6  des- 
te metal  ?  diz^se^  que  desde  o 
descobrimento  das  minas  de  ouro 
do  Brasil  f  o  maior  luxo  formou 
novos  ramos  de  oommercio  y  que 
contribuirão  para  que  a  Europa  se 
desfaça  da  excessiva  quantidade 
desta  mercadoria  da  America-;,  mas 
naõ  posso  persuadir-me  ,  que  este 
novo  commercio  tenha  seguido  a 
proporção  do  ouro  ,    porque  a& 

E  % 


■i 

iTiais  das  vezes  se  tem  poraugmen- 

5  to  de  commercio  o  que  he  mera- 

mente effeito  da  sua  variação.  O 
commercio  sempre  gira  sobre  si 
mesmo  ,  e  as  suas  alterações  saó 
xjflasi  sempre  no  modo ,  e  naõ  no 
seu  cabedal ,  pois  lhe  tocaõ  mui- 
to menos  do  que  se  crê.  Se  se  for- 
ma hum  novo  ramo,  toma-se  lo- 
go por  augmento  o  que  he  somen- 
te variação  ,  sem  reparar  em  que 
estes  novos  ramos  oceupaó  o  lu- 
gar dos  antigos. 

Os  caprichos  ,  os  gostos ,  as 
modas,  e  as  fantasias,  que  saó  o 
manancial  continuo  das  novas  es- 
peculações de  commercio,  se  suc- 
cedem  humas  a  outras;  mas  naõ 
se  augmentaõ  :  sempre  se  estabe- 
lece o  novo  commercio  sobre  o 
antigo ,  porque  se  se  forma  hum 
ramo ,  destroe-se  outro. 

Cada  naçaõ  tem  huma  espé- 
cie de  medida  geral  de  gastos , 
da  qual  naõ  acerta  a  sahir.  Pôde 
yarialla  de  muitos  modos  y  porque 


(  lor) 
sueccáe  que  as  cousas- frívolas- oe- 
cupaÔ  o  lugar  das  úteis  ,  e  he  cons- 
tante que  as  nações  que  gastao 
mais  em  superfluidades  y  econorai- 
sao  mais  no  necessário. 

Em  todo   o  orbe   se    dérao 
sempre  a  ma5  a  prodigalidade.^  e- 
a  avareza  ;    quando  hurn-a  guarda 
por  hum  lado,  a  outra  despeidi- 
p  por  outro. 

Qm  por  mais  que-  se  diga \  os  Por- 
'  tuguezes  sao  mais  ricos  hoje  \  em 
dia ,  do  que  antes  do  descobrimen- 
to das  minas  do  BrasiL 


alsa^  supposiçao  9  p&is  as  rique- 
zas sao  relativas.  A  mesma  quão.- 
tidade  de  ouro  j  e  prata  ?<  que  faz 
que  hum  estado  seja  mui  rico  em 
hum  tempo  ,  pódè  fa&er  que  se- 
ja mui  pobre  n'outro?:  porque  ã' 
riqueza  de  hum  povo  consiste  -na 
proporção  dâ  que  tem  comparada 


i 


KJWflHi 


C   102  ) 

som  a   dos  outros,    ou  no  preço 
das  suas  próprias  mercadorias.  Se 
somente  houvesse  hum  estado  no 
inundo,  seria  indifferenre  a  dimi- 
nuição, ou  o  augrnenro  dos  seus 
metaes.    Nunca  seria  mais  rico  , 
nem  mais  pobre,  porque  naõ  ha- 
veria nenhum  que  fosse  msisrico, 
nem   mais    pobre  que  elle.    Pode 
chegar  hum  estado  a   ser  ameta- 
de  mais  pobre  do  que  era  ,  aug- 
mentando-se   em  dobro  as  suas  ri- 
quezas, e  hasta  para  isto  que  aug- 
mentem  os  outros  assuas  com  ex- 
cesso a  esta  proporção  ,  sendo  mui 
indifferente  em  si ,  que  o  cabedal 
geral  das  riquezas  da  Europa  se 
augmente,  ou  diminua,  isco  he, 
que  o  total  tfham  século  seja  de 
dois  mil  milhões  ,  e  de  vinte  mil 
n'outro;  porque  no  primeiro  caso 
a  njçaô  que  possue  a  maior  par- 
te dos  dois  mil  milhões,  será  taô 
rica  como  a  que  tivera  maior  par- 
te dos   vinte  mil    no  segundo.  A 
occssiva    quantidade   de    metaes 


( JoO 
sx5  serve  de  embaraço  ?  e  o  rrie&- 
mo  papel  podem  fazer  vinte  mi- 
lhões como  vinte  mil: 

Pelo  que  diz  respeito  a  Por- 
tugal y  engana  muito  a- compara^' 
çaô  que    se  faz  do  estado  actual 
das  suas  riquezas  com  o  estado  eii* 
que  estavaõ  ha  dois  séculos  ,  se- 
parado tío  das  riquezas  das  outra?- 
potencias  daquelle  tempo.  A  com- 
paração deveria  ser  das  riquezas 
daquellè  tempo  com  as  de  agora*, 
feita   com   as  riquezas   que  agora 
tem  a-Europa.  Se  se  observaõ  nes- 
ta comparação  todas  estas  propor- 
çc&s  relativas,  vêr-se-ha  que  a  mo- 
narquia   Portuguesa   he   hoje  em 
dia  mais  pobre  que  nunca,  Rofn- 
peo   o   equilíbrio  o  descobrimen- 
to das  suas  minas  r  e   se  empo* 
breceo  a  si  mesma  ,  porque  enri- 
que ceo  muito  as  outras  nações.  He 
evidente   que  o  reino  he  surnma- 
mente   pobre  r  e  já  disse  doutra 
parte,  que  o  estado  deve  aos  es- 
trangeiros cousa  de  viate  milhões 


S 


k\^l 


I 


I 


I  I 

I 


oe  cruzados  :    apenas  haverá  ■  sek 
efiectivos  em  todo  Portugal;  com 
que  ainda  ihe>faltao  qtiarorze  mi- 
lhões para  chegar  a  ter  hum  real 
próprio.    O  seu  povo  he   o  mais 
miserável  da  terra,  as  mercadorias 
as  mais  caras,  e  no  continente  ha 
províncias  cujos  habitantes  jamais 
víraõ  em  moeda  de  ouro  a  effigie 
do, seu 'Soberano.  Ouvirão  dizer, 
ou    lêraô  que  Portugal   tinha  mi- 
nas, de  ouro :    mas  desfruta©  me- 
nos as  riquezas   do  Brasil  que  as 
vassallos  dos  outros  Príncipes  da 
Europa. 

§  XIV. 

Que  Portugal  páde  com  o  seu  ouro 
ter  as  mercadorias  fabricadas  por 
melhor  preço,  que  aqueíle  por  qm 
elle  as  poderia  fabricar. 

JLíSte  lie  hum  laço  que  a  Ingla- 
terra armou  a  Portugal  ,  repetindo- 
líve    incessantemente   ,    para    que 
JSbitais.de  raaiw £a :t uc as  2  Nós  ; 


yôs  daremos  das  nossas  por mcltet 
preço,  que  aquelle  por  que  pode- 
ríeis JbbÀctàk*.  Bsta  -'economia- 
prejudicial  teve  9  e  tem  como  en- 
cantado o  ministério  r  e  sobre  este 
ponto  ^eai  iyiçr-i  ■  n^i  -  adiantou 

mais, 

!  Qt>ando-se.:-queria  estabelecer 

alauma  manufactura se  principiava 
por  calcular  -se  -  se  poderia  fabri- 
car taó   barato  como  em  Inglater- 
ra ,  donde  se   tirava  o  .género  fa- 
bricado,r  ecomo  se-  vi s se-  que- era 
sempre  mais  caro  o-  trabalho  -pes- 
soal,di*i^se  que  ganhava  a  nação 
em  servir-se  'das -manufacturas  In- 
.-glezas-,-  e  «qúe,  pela  mesma  razão 
naõ  se  estabelecia©  em   PortugaL 
íHecousa^notavel  que  entre  os  mui- 
tos  ministros  que  -se  suecedêrao 
desde  o  estabelecimento  desta  po- 
lítica ?  que  fez  adoptar  manhosa- 
mente    a    corte  de-  Londres  à  de 
^Lisboa,   nenhum  ?  notasse-,  que  *® 
-preço  do  trabalhador  'nacional  era 
:©usa>  imaginaria >  ;è  :.que  .pe- 


jjf*ffli 


lo  contrario  o  augmenro  do  tra- 
balho pessoal  formava  maior  cir- 
culação ,  e  que  o  ouro  ficava  den- 
tro do  JReino.    He  mui  estranha 
que  naó  se  visse  que  huma  pata- 
ca por  dia ,    dada  a  hum  obreiro 
do  paiz,  nao  sahindo  do  estado, 
podia    combinar-se  cada   instante 
de  infinitos  modos  com  vantagem 
sua;  e  que  hum  real  dado  a  hum 
artífice  estrangeiro  causava  huma 
perda  efectiva  ■ :    sendo  certo  que 
toda  combinação  vantajosa  da  moe- 
da se  acaba- no. instante  em   que 
sahe  do  estado.  íJDesditosa  a  nação 
cujo  ministério  vive  taó  atrazado, 
«o  systema  eccnomicOo 


*■'(  107  > 

§  '."XV. 

\'Que  o  clima  se  oppce  ao   estabeleci* 
mento  de  manufacturas  em*Põf- 

t, 


Imbuído  hum  governo  de  rnâxi* 
mas  erróneas  ?  acha  sempre  pretex- 
tos para  oaó  fazer  o  que  devêns, 
e  ria'6  os  achando  na  politica  5  vai 
buscallos  no  elima0  Se  dous  /  ou 
três  ministros  Pottuguezes^  que  se- 
guirão caminhos  errados  para  esta- 
belecer manufacturas  ,    ou  alguns 
particulares  sem  engenho ,  sem  ta- 
lentos ,  e  sem  capacidade  ,  naõ'  sa- 
hiraõ  bem  do  projecto  destes  es- 
tabelecimentos 9  actribuia-se  a  cul- 
pa ao  clima  9  e  naô  se  lerabravâo 
que   tendo  tido  eíFeito  nos  tempos 
antigos  os  mesmos  estabelecimen- 
tos ,  podiao  teilo  também  ■depois, 
pois  o  clima  d'hum  século  se  dif- 
ferença  pouco  de  outro.    He  çvr* 
4$mèk  conforme  isto,  que  se  se 


w 


i 


I 


J 

I 


C  ff»  ) 
--tivessem  tomado  medidas  exactas, 

€  adequadas  ,  -  se  íeriaò  estabele- 
cido manufacturas  em  Portugal  co- 
mo nos  outros  reinos. 

-Ainda se  viaõ  noannode  1754 
em  differentes  províncias  as  relí- 
quias dos  teares,  que  até  meiados 
do  século  passado  puzéráõ  a  mo- 
narquia Portugueza  em  estado  de 
oaõ  necessitar  das  outras  ;  e  co- 
mo nos  poderemos  persuadir  que 
as  laas  daqueMe  clima  ,  que  du- 
rante tanto  tempo  contribuirão  a 
manter  as  manufacturas ,  se  consi- 
derassem depois  como  hum  obstá- 
culo ,  quando  se  pensou  em  res- 
rabelecellas  ?Busque-se  pois  a  cau- 
sa dess^  fenómeno  na  politica  da 
Inglaterra  ,  e  descobrir-se-ha  a  sua 
origem  nos  manejos  secretos  da 
corte  de  Londres  com  a  de  Lis- 
boa. 

Haverá  36  annos  que  tendo 
resolvido  no  reinado  de  D.Joaó 
V.  hum  hábil  ministro  Português 
estabelecer  >  manufacturas    naquel- 


1  Ie'  Reino ,  tomou  medidas  adequa- 
das para  ser  hemsuccedidonasua 
empreaa.  Escavaô  vencidos  todos 
os  obstáculos  ,  e  ia  já  cedei  á  po- 
litica, a   imaginada  ingratidão  do 

<  terreno  }  quando  dous--.mil.-  gui- 
néos  dados- a  tempolhe restituirão 
a  sua  -  antiga  maligna  influencia. 
Qppoz^se  sempre  desde  entaõ  o 
clima  ao  estabelecimento  das  ma» 
nufacturas  j.naõ  devemos!  porém  at- 
tribuir  esta   mudança  ao  ar.,    mas 

i  sim  ao  dinheiro  ,  ou  á  cobiça» 

■"Que  he  grande^mofitúgem  ú  dar  álti- 

glaterra  meios  a  Bortagal  .para 

■  extrãbir-  o  ouro  do  t  Brasil ,  e  qut 

sem*  este  recurso  estafiâõempemr 

estado,  os  negócios  da  Europa. 

JL  ode  succeder  que  ríssemos  tudo 

-pelo  contrario:  he  verdade  que  o 

augmento  deste  metal  alentou  mui- 

i  m  a.  indimna  -geual  : .,  e  que  pelo 


n 


f  IIO  > 

novo  consumo  de  que  foi  causa  ^ 
augmentou  também  vários  ramos 
do  commercio  universal.  Mas  com- 
pensão  acaso  estas  vantagens  ou- 
tras infinitas  desordens  ..,  que  cau- 
sou na  Europa. 

Se  retrocedemos  ao  principio: 
de  todas  as  nossas  guerras  de  ses- 
senta annos  a  esta  parte,  descobrir- 
se-ha  a  sua  origem  nas  riquezas  do 
Brasil  ,  porque  huns  príncipes  que 
antes  do  descobrimento  destas  mi- 
nas se  viaõ  precisados  a  manter- 
se  nos  estreitos  limites  da  impos- 
sibilidade, que  lhes  prescrevia  a  sua 
natural  pobreza  ,  ricos  depois  com 
os  thesouros  do  Brasil ,  inquieta- 
rão toda  a  Europa. 

He  também  verdade  ,  que  an- 
tes desse  descobrimento  tinhaò 
guerras  os  povos  da  Europa  ,  mas 
eraõ  de  distincta  natureza  das 
nossas.  Vencida  humanaçaõ  esta- 
va acabada  a  guerra ,  porque  naõ 
tinha  meios  de  refazer-se :  era  ver- 
dadeira a  sua  perda:   o   seu  pro- 


(m  y 

fúo  sangue  era  o  que  se  derrama- 
va :  com  as  batalhas  se  dava  fim 
ás  batalhas,  e  entre  nós  nascem  aa 
guerras  das  mesmas  guerras» 

Desde  que  se  vio  a  Europa 
inundada  das  riquezas  da  Ameri- 
ca, pudéraõ  os  Príncipes  satisfa- 
zer mais  facilmente  a  sua  ambiqaõ« 
Estimulada  esta  paixão  pelos  mes- 
mos meios  de  polia  em  movimen- 
to^ causou  mais  dissensões  que  nos 
tempos  antigos  :  formarão  as  mi- 
nas de  ouro  na  nosso  mundo  po- 
litico hum  novo  manancial  de  ca- 
lamidades humanas  ,  pois  houve 
príncipes,  desde  que  hetaõcom- 
nuim  aqueíle  metal  ,  que  tivéraõ 
meios  de  comprar  nações  inteiras 
parai  enviallas  a  destruir  outras,  e 
era  todas  a§  .partes  acharão  os  so- 
beranos instrumentos  mercenários 
da  sua  ambição. 

Náõ  me  deterei  neste  assum- 
pto, cuja  grande  extensão  podia 
dar-mo  para  escrever  muitos  vo- 
lumes^  e  assim  direi  somente  que 


5 
i 


I 


(IT2) 

nas  nossas  ultimas  guerras  se  pa- 
garão quasi  sempre  com  prata  do 
México  as  tropas  Francezas  em 
Itália  ,  e  com  ouro  do  Brasil  as 
do  Duque  de  Saboya  5  e  as  In- 
glezas. 

Pode- se  ter  por  certo  ,  que 
•se  as  minas  do  novo  mundo  naó 
tivessem  produzido  taõ  immensas 
riquezas  y  jamais  se  teriao  visto 
na  Europa  estas  guerras  que  des- 
truirão tantas  nações  ,  causarão 
tantas  inquietações^  e  arruinarão 
tantos  povos ,  porque  naõ  saõ  as 
guerras  como  os  outros  negócios 
da  politica  ?  e  naõ  se  põem  ex- 
ércitos em  campanha  com  syste- 
mas  theoricos,  mas  sim  com  cou- 
sas effectivas  5  e  reaes. 

Antes  que  regule  hum  Mo- 
narca as  operações  da  guerra  ,  he 
preciso  que  conte  com  o  seu  the- 
soureiro,  sendo  a  fazenda  o  prin- 
e  o  exercito  o  accessorio* 
pois  antes  de  se  irem  matar  os 
homens  ^    querem  saber  por  que 


preço.  A  falta  de  dinheiro  poe 
hum  exercito  na  maior  consterna- 
ção ;  e  pelo  contrario  9  a  vista 
do  ouro  avigora  os  soldados  ,  e 
he  quasi  sempre  a  alma  das  viera- 
rias.  Pela  riqueza  da  caixa  mili- 
tar se  deve.  calcular  o  gráo  de  va- 
lentia da  tropa. 

He  impraticável  ó  projecto  de 
diminuir  a  ambição  de  quasi  to- 
dos os  príncipes*  eo  único  meio 
quç  poderia  pôr  limites  aos  seus 
insaciáveis  dçsejos  d.e  se  engran- 
decerem, era  o  de  huma  certa  mie-- 
dida   de  riquezas. 

Sobre  a  quantidade  de  rique- 
zas geraes  se  funda -a  das  calami- 
dades humanas,  e  quanto  maior 
seja  aquelia*  tanto  maiores  seráo 
os  males  do  mundo.  Pode-se  as- 
segurar que  seria  a  Europa  mais 
feíiz  se  nao  se  tivessem  desço- 
to  ta6.  abundantes  minas-  Se  se 
tivessem-  mudado  menos  as  for- 
tunas dos  estados,  nao  teriaõ  si- 
do taõ  frequentes  as  revoluções 


I 


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»--•» 


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I 


nao  se  teria  familiarisndo  tanto  a* 
gente  com  os  homicídios ,  e  com- 
os  outros  horrores    que'  acompa- 
nhaó    sempre    as  guerras.    Have- 
ria  por  conseguinte  mais  quieta- 
ção   nos    espíritos    (  pois   os  ho- 
mens  hefdaõ  as  paixões  de   seus 
pais  )  mais  bondade ,  mais  recti- 
dão ,    mais    franqueza    no  trato  ;; 
'menos  vicios,  menos  corrupção  r 
e    por  conseguinte    mais    honra  , 
mais  probidade  ,    e  n5huma  pala- 
vra ,  mais   virtudes. 

§  XVII. 

Que  desde  a  aUiançn  dos  Porticzue- 
zes  com  a  Inglaterra^  se  estabe- 
lecei) em  Portugal  hum  grande 
luxo  que  lhe  he  necessário. 

uem  entrar  nas  discussões  susci- 
tadas entre  os  politicos  sobre  o  lu- 
xo, direi  unicamente  que  nao  he 
igual  a  sua  utilidade  para  todos 
os  povos. 


(  ny) 

0  luxo  he  nalgumas  monar- 
quias da  Europa  hum  negocia  de 
estado \  entra  na  politica,  do  go- 
verno \  e  vem  a  ser  huma  das  mais 
firmes  xolumnasda  coroa ■■;■  mas  pa- 
ra isto  saõ  precisas  algumas  cir- 
cunstancias particulares,  e  muitas 
causas  segundarias.  Em  Inglaterra^ 
por  exemplo ,,  onde  está  estabele- 
cido o  Iuxo.no  fructodo  trabalho 
do  lavrador ,  augmentao  poderia 
monarquia,  e  he  huma  mó!a  mais- 
oaqueiíe  governo  ,  ■  que. dá  novo- 
vigor  ao-  estado politico.-  Para  con^ 
seguir  isto  5hç  indispensável  que 
o  estado    tire    quasi  tudo  da  sua 
própria  colheita;  ehe  regra  geral 
infallivel  ,.  que  quando  humana- 
caõ  naõtem  as  primeiras  matérias 
do  seu  luxo  r  lhe  he  sempre  pre- 
judicial ,    porque  a  vantagem  da 
trabalho  pessoal  naô  pode  contra- 
pesar aquclle   primeiro    inconve- 
niente. 

Nao   saó  os   pó>os  ricos  os, 
que  devem  temer  mais/os  ef&itos- 


WÈÈ  I 


■>!■ 


S 

I 


I 


do  luxo,  porque  em  geral  tem  em 
si  recursos  com  que  compensaõ  os 
seus  prejuízos  ;  mas  os  estados- 
pobres  arruinaõ-se  ,  porque  lhes- 
faltaõ  meios  de  supprir  os  pre- 
juizos  que  continuamente  lhes  cau- 
sa. 

Ha   hum   meio    seguro    para 
saber  se  se  deve  favorecer   o  lu- 
xo n'hum  estado  ,  e  vem  a  ser  o 
de  examinar  se  o  povo  tem  den- 
tro de  si,  e  facilmente  as  cousas 
physicamcnte  necessárias^   porque 
he  preciso  desterrallo  quando  he 
precária    a    primeira    subsistência. 
He   verdadeira ,  e  segura  máxima 
politica,    a    de  que  as  artes  úteis 
sao    primogénitas  dns  artes  agra- 
dáveis,    e  que  he  necessário 'que 
precedao  aqnclhw  a  estas,  e  as- 
sim se  estabelece  hum  erro  quan- 
do se  dá  corno  regra  geral  ,  sem 
dis.tincçaô  aiguma  ,  a  de  que  o  lu- 
xo he   necessário  em  todos  os  es- 
tados monárquicos. 

Se  pode.  chegar  a  ser  uiil-a 


%  "7')f 
alguns  estados  por  alguma  dispo* 

siçaõ  particular,  causa  por  outro 
lado  tantos  prejuízos  a  outros  mui- 
tos governos  ,  e  estes  prejuízos 
tem  tantas  consequências  para  a 
sociedade  ,  que  talvez  de  dester- 
rallo  do  mundo  resultaria  univer- 
sal beneficio. 

Por  mais  que  a  politica  quei- 
ra tirar  vantagens  até  dos  vícios 
mesmos,  nunca  pôde  contribuir 
a  corrupção  i  grandeza  de  hum 
^povo  j  e  suppor  que  naõ  faraó  gran- 
des progressos  os  vícios  n'huma  na- 
ção, que  tem  bum  grande  luxo,  he 
naó  conhecer  a  cadeia  que  une  as 
paixões  entre  si. 

Os  homens  se  pagaõ  muito 
clasextenoridades,  e  o  governo  po- 
litico depende  por  algum  modo  do 
vestido  dos  vassajlos. 

A5s  vezes  huma  estofa,  con- 
fundindo as  classes ,  e  estados  das 
pessoas ,  causa  ao  estado  hum  pre- 
juízo universal. 

A  deosa  Minerva }  inteaca»- 


Iffi 


1 

t 

i 

^1 


I 


í 


ao  estabelecer  na  terra  hum  go- 
verno  perreuo,  quiz  que  cada  clas- 
se de  homens  se  distinguisse  com 
hum  vestido  diíFereme. 

GíFerece-nos  a  historia  neste 
assumpto  huma  anecdota  mui  no- 
tável, que  prova  que  o  luxo  foi 
sempre  o  principio  da  corrupção 
de  todos  os  governos. 

Refere  Suetonio  :  «  Que  sò- 
»  mente  intentou  JulioCesar  apo- 
•»  derar-se  da  liberdade  da  sua  pa- 
»  tria,  porque  nao  sabia  de  que 
»  maneira  pagasse  as  dividas  que 
»  tinha  contrahido  com  o  seu  ex- 
»  cessi-vo  luxo.  Muitos  tomarão 
»  meramente  o  seu  partido  por 
»  íalta  de  meios  para  manter  o 
»-  luxo  em  que  se  tinhaõ  empe- 
»  nhado,  e  porque  esperavaõ  ga- 
»  nhar  na  guerra  com  que  manter 
»  o  seu  primeiro  fausto.  » 

Ao  mesmo  tempo  que  sedi- 
irnnue  o  luxo  n'hum  estado  ,  se  li- 
smtaõ  os  desejos  dos  cidadãos  , 
porque  desapparecem  infinitas  su- 


(119) 

perfluidades,que  dantes  se  repu* 
tavaõ  como  outras  tantas  cousas 
necessárias  ;  e  livres  os  homens 
deste  confuso  tropel  de. fantasias, 
tem  menos  vivas  as  paixões. 

Naõ  consiste  b  prejuízo  que 
do  luxo  resulta  a  hum  estado  em 
que  se  introduza  junto  do  Prínci- 
pe, e  dos  grandes.  Odarrino  pro- 
cede de  que  fazendo-se  geral  o 
contagio.  ,  passe  aos  que  natural- 
mente deveriaô  ter  somente  o  phy- 
sicamente  necessário.  Quando  ã 
delicadeza,  e  o  apego  i  commó- 
didade  transcende  á  plebe,  entaS 
sim  que  tudo  deve  reputar-se  por 
perdido. 

«  Quando  o  luxo  se  apodera 
»  de  huma  naçaõ  (  diz  hum  Au- 
»  thor)  chega  a  ser  hum  mal  qua- 
»  si  incurável  Assim  como  a  de- 
»  masiada  authoridade  he  nociva 
»  aos  Reis,  assim  o  luxo-he  n©- 
»  eivo  a  huma  naçaõ.  Habituan- 
j>  do~se  a  considerar  como  preci- 
»  sas  as  cousas  mais  supérfluas  ? 


n 


Wfâli 


1  I  III  i 


h 


í 


i 


»  hwentaõ-se  cada  dia  novas  pre- 
»  cisões  ,  que  destroem  as  fami- 
»  lias,  e  impossibilitaõ  os  parti- 
»  culares  de  contribuir  aos  gas- 
»  tos  necessários  para  o  publico.  » 

que 


A    isto    accrescentarei 


quando  o  luxo  chega  a  apoderar- 
se  de  huma  naçaõ ,  acaba  se  a  har- 
monia entre  as  classes.  Os  que  pe- 
la sua  situação  estavaõ  dantes  con- 
demnaçlos  a  hum  trabalho  forte  , 
e  penoso,  debilitados  pelo  luxo-, 
arrojão  de  si  hum  peso  que  lhes 
parece  naõ  poderem  soportar ,  e 
immediatamente  se  estabelecem 
hum  sem-numero  de  oíficios ,  e 
profissões  frívolas. 

•Para  que  hum  estado  naõ  de- 
caia ,  he  forçoso  que  a  parte  do 
povo,  que  tem  a  seu  cargo  a  prin- 
cipal subsistência  ,  esteja  isenta 
da  corrupção  ,  que  certo  luxo  traz 
sempre  comsigo.  Esta  falta  de  ad- 
ministração civil  he  a  causa  de 
que  tantos  declinem  insensivelmen- 
te ;  e  por  fim  pereçaõ,  sem  que 


^•-  ,- 


se  possa  sinalar  a  época  da  sua  qué- 
*da. 

Em  Portugal  todo  o  género 
de  luxo  concorria  a  debilitar  a  mo* 
-narquia,  porque  tinha  a  sua  prin* 
eipal  origem  íóra  do  reino, 

Í  XVItt 

Que  Portugal  nao  fade  deixe f  dê  ne- 
cessitar dos  outros  estados  da  Èés 
ropa ,    e    especialmente  de  Íngla> 

terra. 

%Aie  desgraça  succcde®  â  este 
reino  ,  que  já  nao  pode  obrar  por 
si  mesmo,  e  que  para  manter- se 
necessita  dos  outros  estados  ?  Len- 
do a  historia  de  Portugal  vê-se  5 
que  o  edifício  daquella  monarquia 
se  eriglo  (i)  sem  o  auxilio  das  ou- 
tras nações, 

(  i  )  A  verdade  da  historia  he  que  o 
Rei  de  Castella  e  Leão  D.  AtTonso  VI. 
casou  sua  filha  D.  Theresa  com  Henrique 
de  Lorena  ,  que  tinha  vindo  coino  aventurei* 


£  f*.    ! 


0W 

t 

í 


í 


(  íit  ) 

Todos  sabem  que  Afíbnso 
Henrique,  primeiro  Rei  de  Por- 
tugal ,  conquistou  aos  Mouros, 
Lisboa ,  Mafra  ,  Cintra ,  Óbidos  , 
Beja ,  Elvas  ,  Coimbra ,  Évora  ,  C^c. 

Sancho  primeiro  unio  a  Por- 
tugal hum  novo  reino ,  e  restabe- 
leeeo  as  cidades  de  Valença ,  e 
Montemor.  Sancho  II.  tomou  aos 
Mouros  a  província  do  Alemtéjo. 
Aífbnso  III.  conquistou  Odemi- 
ra ,  Monforte  ,  Valença  do  Minho  , 
Viana  ,  Castro  ,  Portalegre ,  ^i/- 
A?  Viçosa  ,  £  Monção.  Diniz  fun- 
dou   varias  cidades   novas  j    e  já 


J 
I 


ro  servillo  na  guerra  contra  os  Mouros  , 
é  lhe  assignou  em  dote  tudo  o  que  esn 
Portugal  tinha  ganhado  sotoffi  os  lUouros 
com  o  titulo  de  Conde  ,  e  com  condição  que 
fosse  vassallp  dos  Reis  de  Castella  ,  e  vies- 
se ás  Coites  do  reino  ,  e  á  guerra  com  suas 
armas  ,  e  gente  ,  todas  as  vezes  que  fosse 
•visado  :  as  primeiras  conquistas  deste  Con- 
de Henrique  ,  e  de  seu  filho  D.  Affonso 
primeiro  ,  que  tomou  o  nome  de  Rei  de 
Portugal  ,  se  tízeraó  sem  duvida  ,  com  au-i 
xiliu  das   armas  do   liei   ds   CastelU. 


^-  ^9X 


havia    cousa  de    trezentos  ahfiòs> 
que    aquella    monarquia  se  tinha 
formado  na  Europa,  mantendo-sè 
sem  ajuda  dos  estrangeiros  ,  quan- 
do Joaô  primeiro  emprendeo  a  con-' 
quista  de   Africa.  'Elte  por  si  só 
formou  o  projecto ,  e  somente  com 
os  meios  que  extrahio  de   Portu- 
gal ,  o  pôz  em  execução*  foaõ  IL 
fez   conquistas -sem 'mais  soccor- 
ro  que  o  de  seus  vassallos  :  e 'es- 
tava tao  longe  de  valer- se  dos  de 
outros    estados    para   effeituar  os 
seus  designios,  que  sómeotepor* 
que  Christovaô  Colombo" era  es- 
trangeiro 5  naó -quiz  adóuttftr  ò-offe- 
rccimento  que  lhe  fez  da  Ameri- 
ca. He  certo  que  as  grandes ,  e 
decisivas  determinações  de  estado: 
daquella   monarquia    se     tomarão 
sem    assistência    dos  dernais   pol- 
vos. 

O  descobrimento  do  ouro  do 
Brasil  foi  o  que  chamou  os  estran- 
geiros a  Portugal  ,  pois  antes  da- 
q.ueUa  época  úm  havia  naçaõqufc 

F   2 


i 


i 


~^mm 


(    I24  ) 

coubesse  o  caminho  daquelle  rei- 
no. 

Em  quanto  duráraõ  as  dis- 
putas de  Portugal  com  os  Mou- 
ros, naõ  houve  potencia  que  inter- 
viesse nos  seus  negócios  particu- 
lares: mas  apenas  descobrirão  os 
Portugueses  tamanho  thesouro  , 
logo  todos  acudirão  a  reparti  lio 
entre  si.     - 

§  XIX. 


Que  o  trato  dos  estrangeiros  fez 
mais  sociáveis  os  Portugueses ,  e 
os  igualou  com  as  nações  cultas. 

oucos  vocábulos  ha ,  cuja  signi- 
ficação seja  mais  vaga  que  a  da 
palavra  sociedade.  Desta  se  tem  or- 
dinariamente huma  idéa  geral  que 
confunde  sempre  a  ordem  das  cou- 
sas ,  flgurando-secommurr.mcnte  , 
que  para  que  hum  povo  seja  mais 
sociável  y  hc  preciso  que  seja  tao 
alegre,  e  festivo  como  outro j  sem 


nunca  deter-se  ern  reflectir ,  que 
ha  alguns  delies  cujas  virtudes, 
moraes,  e  civis  procedem  da  sua' 
simplicidade  ,  e  lisura.  E  assim  ás 
vezes  se  reputa  por  mais  sociável 
huma  nação ,  que  na  realidade  se 
tornou  mais  barbara  do  que  dan- 
tes era  ;  pois  naõ  ha  diwida  que 
sempre  vai  decahindo  hum  po^- 
vo,  que  chega  a  extraviar-se  da 
vereda  daqueUas  virtudes  ,  que  por 
largo  tempo  tinhaõ  sido  como  a 
base  do  seu  principal  caracter. 

A  palavra  sociedade  hé  sem- 
pre voluntária.  O  que  para  hum 
povo  he  sociedade  ?  he  commum- 
mente  libertinagem  para  outro; 
Hurrí  Author  Chinez  reputa  por 
hum  prodígio  de  continência ,  que 
hum  homem  chegue  a  ver-se  cara 
&  cara  n'hum  quarto  separado  com 
huma  mulher,  sem  violalla.  Que 
legislador  poderia  estabeleceria  fre* 
quencia  de  ambos  os  sexos  naquel- 
le  paiz  ? 

Com  a  frequência  dos  estran* 


(  n*  ) 

geiros  em  Portugal,  huma  multi- 
dão de  costumes  ,  modas  ,  enfei- 
tes ,  e  divertimentos  públicos  des- 
•  conhecidos,  antes  naquella  monar- 
quia ,.  concorrerão  a  promover  o 
gosto  daquelle  povo  ,  que  saloio 
entaõ  pela  primeira  vez  do  reti- 
io  em  que  tinha  vivido  desde  o 
tempo  dos  Mouros.  Viraõ-se  re- 
ciprocamente, e  entaõ  notáraô-se 
naquelle  governo  huma  infinidade 
de  excessos,  e  irregularidades  ci- 
vis. 

A  separação  dos  dois  sexos 
impede  no  Oriente  a  extincçaõ  dos 
governos  poli  ticos  :  e  com  effei- 
to,  em  que  viriaõ  a  parar  aquel- 
le.s.  estados  mal  seguros,  se  os  o- 
dios>  as  inimisades,  os  zelos,  as 
idéas  fantásticas  ,  os  caprichos  , 
n'huma  palavra  ,  as  paixões  gran- 
des, e  pequenas  das  mulheres  pu- 
dessem entremetrer  se  no  systema 
do  estado  ?  Tudo  se  perderia  ir- 
remediavelmente :  de  sorte  que  es- 
te  costume  preserva  aquelies  es- 


(  ™7  )  ,  r 

ta  dos  de  males  maiores  que  todo 
o  beneficio  3  que  poderia  seguir-sc- 
lhes  das  melhores  leis. 

Ninguém  ha  que  ignore  que 
os  Portugueses  tinhaõ  dos  Mou- 
ros os  seus- antigos- costumes- ;■  e 
que  o  seu  governo  politico  tinha 
por  norma  aquelles  mesmos  cos- 
tumes. Ainda  que  nesta  monarquia 
Christá   naõ   houvesse  serralhos, 
havia  naõ  obstante  huma  clausu- 
ra civil  de  mulheres  f  connaturali- 
sada  já  naquellâ  Baçaõ. 

O- único  meio  que  encontra 
Platão  para  conservar  os  costumes 
de  Hum  povo ,  he  o  de  apartar  dos 
nacionaes  os  estrangeiros.  O  ca- 
so naõ  he  averiguar  se  os^  usos  r 
e  costumes  de  huma  naçaõ  estra- 
nha saõ  melhores  5  mas  sim  saber 
se  estes  usos  convém  ao  povo  em 
que  os  querem  introduzir..  Ao  mes- 
mo tempo  que  hum  modo  de  a- 
presentar-se  nas  concurrencias  ,  de 
explicar-se,   de  ves;tir-se >    de  à- 
jjinta^se  ,,  introduz  novos  gostos 


! 


N 


*  C  I28  > 

n  nim>  povo ;  produz  nelle  sempre 

novas  paixões.  Como  huma  naçad 
adopte  os  divertimentos,  as  mo- 
das,  os  adornos  doutra,  mui  ce- 
do conrrahirá  também  os  seus  vi- 
cios,  e  defeitos.  ' 

A  origem  das  paixões  he  em. 
todas  as  partes  a  mesma  :  e  assim 
sempre  que  se  empreguem  os  mes- 
mos meios  para  exeitallas,  póde- 
sq  ter  a  certeza  de  que  resultarão 
os  mesmos  effeitos.  Isto  suppos- 
to,  quando  pelo  trato  dos  estran- 
geiros chegap  a  corromper-se  em 
algum   povo   os   costurpes  ,  ficao 
por  conseguinte  as  leia  sem  bas- 
tante vigor  para   poder  manter  o, 
governo  politico. 

Aponte-<;e-me  hum  só  gover- 
no sequer  no  mundo  que  naõ  te- 
nha decahido  pela  corrupção  dos 
costumes.  As  máximas  dos  Roma- 
nos, e  naõ  as  suas  conquistas  fo- 
?aõ  as  que  formarão  o  seu  gran- 
de poder,  pois  naõ  somente  at- 
tçndiaõ   os   censores   da  republi- 


(120 

ca  aos  excessos  capitães,  mas tsm- 
bem  aos  roais  mínimos  descuidos. 
-Este  era  o  segredo  da  grandeza 
daquelle  povo;;  e  a  decadência  da 
republica  se  seguio  iromediatamen- 
te  á  de pravaçaõ  dos  costumes  dos 
seus  concidadãos. 

Nao  faltará  quem  diga  que 
os  Romanos  vivi  a  5  sob  hum  go- 
verno que  tinha  por  principio  furr^ 
damentaí  a -virtude-,  e-que  naõ  a 
requerem  os  estados  monárquicos 
-modernos.  Mas  se /a  virtude  naõ 
he  nos  nossos  governos  taõ  abso- 
lutamente necessária,  os  costumes 
o  saõ~  sempre.  Porque  como  ,  ou 
por  que  regra  se  poete  presumir 
que  possa  hum  estado  chegar,  a 
fazl*r-se  poderoso,  nem  ainda  a 
conseguir  manter-se  em  certo  gráo 
de  mediania,  quando  domina  neí~ 
le  a  corrupção  geral;  quando  naõ 
conhece  a  moderação  dos  desejos^ 
a  sobriedade,  nem  a# temperança;, 
^quando  a  delicadeza  ,  e  o  delei^ 
te  cativa  todos  os  corações ;  quan- 


1. 

i 


i 


ào  o  fausto,  a  preguiça,  a  ocio- 
sidade, e  o  abandono  prevalecem 
como  vícios  da  moda ;  quando  os 
deleites  dos  sentidos,  e  as  com- 
modidades  da  vida  humana  saó 
os  únicos  bens  a  que  todos  aspi- 
raó  ? 

Esta,  esta  he  z  pintura  de 
Portugal  desde  que  com  o  trato 
estrangeiro  chegou  aquelle  povo 
a  ser  o  que  se  chama  sociável. 

§  XX. 

Que  a  disposição  das  cousas  requer 
que  estejao  ociosas  nações  bit  eiras , 
em  quanto  outras  tralcâhao,  por- 
que assim  o  resolveo  a  Providen- 
cia. Div  ma. 

V/uando  se  demonstra  evidente- 
mente-  a  falsidade  do  systema 
•que  estabelecerão  em  Portugal  os 
ínglezes  ;  quando  se  aperraõ  ,  e 
se  deixaó  sem  sahida  os  seus  par- 
tidários, reduzindo-os  como  i  a- 


(  ijO'  _ 

górria ,   c  deixando-os  sem  saroí? 

que  replicar :  fazem-se  fortes  re« 
correndo  ao  •■seu  •ultimo  árgumen* 
to.  Assim  o  dispêz ,  dizem  elles ,f 
a  Providencia:  e  ficaâ  ufanos  dan- 
do já  por  sua  a  victor ia/  Os  po- 
líticos que  discorrem  assim  ,í pó- 
denvse  comparar  aos  máos^poe tas 
cómicos ,  que  sempre  recorrem  a 
alguma  deidade ~,  quando  insta  a 
solução  das  suas  composições  thea- 
traes.  Chegando  hum  ministério 
a  a  d  o  p  ta r  se  mel  h  a n  te  s  modo  s  de 
discorrer..,  vem  fâ  -ser  inúteis  todas 
as  máximas  de  governo  -assim  po- 
litico como  civil. 

Segundo  este  plano  da  Pro- 
videncia, o  povo  mais  idiota  po- 
deria T^êr-se  ta 6  bem  governado 
como  a  naçaõ  mais  illustrada  ;  sen- 
do esta  cabalmente  a  doutrina 
dos.Musulmaós,  que  vivem  per- 
suadidos que  hum  rígido  destino 
dispoz  todas  as  cousas  de  modo, 
que  nada  tem  de  fazer  a  politica.^ 

Haverá   quem   possa  sugpar 


i 

í 


i 


que  tia  sábia  mente  da  Providen- 
cia, atalaia  vigilantíssima  da  con- 
servarão de  todos  os  governos  , 
tenha  cabido  a  idéa  de  que  hou- 
vesse na  terra  hum  que  continua- 
mente se  estivesse  destruindo  a 
si  próprio  ;  que  se  abandonasse 
gostoso  a  voracidade  d'outrcm  ; 
que  se  debilitasse,  se  abatesse, 
e  se  prostrasse;  que  continuamen- 
te Fosse  consumindo  elle  mesmo 
o  seu  poder  politico,  ^  civil. 

Antes  que  Portugal  descobris- 
se as  suas  minas  ,  os  seus  natu- 
raes  ,  achando-se  sem  mais  recur- 
so que  o  commercio,  e  a  cultura 
das  terras,  eraõ  trabalhadores,  e 
industriosos  :  do  que  se  infere  que 
somente  necessitaõ  hoje  <£m  dia 
do  estimulo  da  emulação.  Sem  du- 
vida devia  ser  a  Providencia  a  que 
naquellcs  tempos  passados  manda- 
va que  trabalhassem;  e  conforme 
o  systema  Inglez  a  mesma  Provi- 
dencia he  quem  agora  quer  que 
este. povo  esteja  ocioso.  Naó    he 


Iml      .   ... 

isto  morar  das  cousas  mais  sagra- 
das, e  pretender  reduzir  a  syste- 
tua  a  Providencia  mesma  ? 

Sem  embargo ,  todos  os  es- 
tados da  Europa,  como  se. a  to- 
dos resultasse  o  maior  beneficio 
da  anniquiiaçaõ  da  industria  da  na- 
ção Lusitana,  adoptarão  ,  e abri- 
garão o  systemalnglez;  ou  o  que 
em  substancia  vem  a  ser  o  mesmo, 
naõ  houve  quem  se  oppuzesse  a 
elte.  Erro  que  causa  admiração 
ter-se  commettido  n'hum  seeuio  taô 
illustrado  como  o  nosso  ! 

Seja-me  licito  retroceder  hum 
pouco ,  e  deter  me  a  considerar 
nesta  espécie  de  geral  lethargo 
huma  cousa  ,  que  naõ  creio  tenha 
havido  até  agora  nenhum  author 
poiitico  que  a  tenha  notado  :  e 
permitta-se-me  ao  mesmo  tempo 
que  ponha  presente  a  historia  do 
nosso  mundo  ,  o  nó  gordiano  da 
Europa,  qm  até  agora  ninguém 
desatou  ,  e  que  descubra  ,  n'huma 
palavra  ,  o  enigma  do  systema  ge- 
ral. 


I 

■à 


s 


i 


i 


I 


l 


( 134) 

Formou  Henrique  IV,  Rei  de 
França,  o  grande  projecto  de  es- 
tabelecer na  Europa  huma  paz  fi- 
xa ,  e  permanente  :  e  ainda  que 
o  seu  desígnio  fosse  digno  d' hum 
bom  Rei  ,  contribuio  mais  a  acre- 
ditallo  de  amante  da  humanidade, 
que  de  intclligente  no  conheci- 
mento dos  homens. 

O  abbade  Saint-Pierre,  author 
Francez  ,  que  muito  depois  publi- 
cou hum  plano  semelhante  de  pa- 
cificação ,  escreveo  sobre  o  mes- 
mo assumpto  cousas  muito  boas, 
mas  somente  para  serem  lidas  ;  ten- 
do-se  comparado  o  seu  projecto  com 
huma  arma,  que  pelo  bem  acaba- 
do delia,  se  conserva  em  algum  ga- 
binete de  curiosidades  ,  sem  que 
possa  servir  para  outra  cousa  ;  pro- 
põe o  dito  author  ajunta  d'huma 
dieta  geral  que  arbitrariamente  im- 
pedisse tedaías  guerras  :  c  sobre 
este  principio  se  engolfa  n'hum 
mar  de  vantagens, que  resultariaõ 
á  Europa  ;    como  se  a  formação 


(135) 
d5huma  dieta,  pudesse  mudar  a  na- 
tureza ;  diminuir  as.  paixões  dos 
homens ;  desterrar  a  ambição  ?  e 
transformar  os  príncipes  de  homens 
em  anjos. 

He  isto  fazer  o  papel  de  po- 
litico, ou  o  de  apostolo  ?  Cha- 
ma-se  isto  n'huma  palavra  ,  pre- 
gar o  evangelho ,  a  cujas  leis  ha 
por  desgraça  nossa  tao  poucos  que 
se  sujeitem. 

Naõ  percebo  como  haja  quem 
possa  persuadir-se  que  hum  a  dieta 
geral  ^eria  sufficiente  para  obrar 
semelhante  milagre,  quando  a  ca- 
da passo  estamos  rendo  nos  nos- 
sos congressos  ,  que  huma  cadeira 
collocada  fora*  do  seu  lugar  cor- 
respondente ,  hum  criado  d'hum 
plenipotenciário  maltratado  por  ca- 
sualidade r  rompem  as  negociações 
mais  importantes  da  Europa. 

Além  deste  aaõ  faltarão  ou- 
tros engenhos  delicados  9  que  te- 
nhaõ  formado  outros  projectos  de 
pacificação,  fazendo  para  istoxal- 


I 


t 


ctilos  do  poder  de  cada  estado;  das 
suas  riquezas  respectivas  ;  das  suas 
forças; -do  valor,  e  espirito  mar- 
cial dosdiffertntes  povos;  da  in- 
fluência que  o  clima  pode  ter  para 
infundir-lhes  mais ,  ou  menos  alen- 
tos &c. ,  pondo  ,  digamo-lo  as- 
sim ,  contrapeso  a  algumas  mo- 
narquias parareduzilias  a  equilí- 
brio com  outras.  De  maneira  que 
se  pode  dizer  com  razaõ  ,  que 
ainda  que  semelhantes  systemas 
manifestarão  até  onde  alcança  o 
entendimento  humano;  nem  por 
isso  deixarão  de  agitar  o  mundo 
novas  revoluções  ,  e  discórdias  a 
pezar  de  combinações  taõ  bem 
dispostas. 

Tampouco  os  vínculos  do 
sangue  bastarão  para  subministrar, 
por; via  dos  matrimonia  ,  remé- 
dio mais  proveitoso  a  mal  tama- 
nho ,  abrindo  caminho  á  tranqui- 
lidade geral ;  porque  se  isto  tivesse 
podido  conduzir  a  semelhante  fim, 
haveria  já  muito  tempo  que  osso- 


beranos  da  Europa  gozariao  de  hu^ 
ma  profunda  paz,  sendo,  como 
saô  ,.  quasi  todos  parentes  huns 
dos  outros. 

Pelo  que  diz  respeito  aos 
tratados,  que  alguns  considerarão 
como  o  melhor  meio  para  afiançar 
a  tranquillidade  publica  ,  sou  de 
parecer  que  naõ  ha  meio  algum 
que  seja  mais  inefficaz  que  os  mes- 
mos tratados,  pois  de  cem  annos- 
a  esta  parte  apenas  houve  hum 
que  tenha  tido  inteiro  comprimen-, 
to.  Nunca  falta  huma.  porta  secre- 
ta ,  ou  interpretação  por  onde  a? 
char  sahida  ;  e  qiiasi.se  poderia 
julgar  que  a  maior  parte  desses 
tratados  tinhaõ  sido  dictados"por 
probabiiistas,  sese  attende  ás-res*- 
tricções  mentaes  de  que  abundaõ» 
Além  disto ,  os  Soberanos  saô 
sempre  considerados  como  meno~- 
res:  todos  sabem  que  naõ  podem 
fazer  cousa  alguma  contra  o  in- 
teresse do  seu  estado ,  naô  igno- 
rando  tampouco  ninguém  que  d 


ÍWW&lí 


5 


i 


J 


(i3«> 

que   n'hum  tempo  he  vantajoso  , 

deixa  de  o  ser  rfoutro.  Agora  sim  \ 
quem  duvidará  que  segundo  esta 
máxima,  naõ  se  podem  annullar  to- 
dos quantos  tratados  se  concluirão 
no  mundo  ? 

Fica  pois  só  o  meio  das  ar- 
mas, pois  ha  hum  século  que  se 
principiou  a  crer ,  que  meramente 
com   a  guerra  se  pode  conseguir 
a  paz.  Hoje  em  dia  principinó  as 
hostilidades  :  toma-se  a  expedição 
de    muitos   correios   como    huma 
prova  de  que  os  ministros  entra- 
rão na  lide  ,.  e  viéraõ  já  ás  maõs : 
e    depois   de  ter  precedido  huma 
infinidade  de  despachos  ,    deixaó 
ambas  as  partes   a  cargo  de  cem 
mil  homens  o   terminar  os  escri- 
tos. De  hum  século  a  esta  parte 
cançáraõ  a  Europa  tantos  sítios  r 
e  batalhas,  que  se  delles  pudesse 
resultar    a    paz,    ha  muito  tempo 
que  viveríamos  quietos:  mas  a  ex- 
periência nos  demonstra  que   de- 
pois de  trinta  batalhas  dadas,  no? 


(" I39 )  t.^ 

achamos  com  pouca  dilrerença  n® 
mesma  situação  que  dantes. 

He  de  admirar  que  entre  tan- 
tos homens  grandes  ,  que  trabalhai 
sobre  o  systema  geral  de  pacifi- 
cação y  nao  tenha  havido  nem  se 
quer  hum  que  tenha  dirigido  as 
suas  miras  para  a  industria  ,  a  qual? 
desattendida  em  alguns  estados  y 
e  aperfeiçoada  em  outros  até  o 
gráo  mais  alto  r  occasiona  conti- 
nuas variações  no  sys tema  gerai 
da  Europa», 

Ponto  he  este,  que  se  algu* 
ma  vez  se  considera  >  foi  unica^ 
mente  olhando-o  como  causa  ac- 
eessoria  ,  e  naô  como  principal. 

Nos  tempos  primitivos  em 
que  o  lavrador  era  soldado  ,  e  a 
soldado  lavrador;  em  que  as  artes 
ainda  toscas,  incultas ,  e  imper- 
feitas, de  nenhum  modo  influiao 
no  poder  dos  estados,  teria  sido 
cousa  mui  inútil  querer  buscar  hum 
systema  de  pacificação  na  indus- 
tria dos  povos  j  mas  desde  que  a 


j 


i 


' 


ii 


I 


C  140  ) 
guerra  tira  desta  todos  os  seus  ar- 
bítrios; desde  que  naõ  saõ  os  ho- 
mens que  pelejaõ,  mas  sim  as  ma- 
quinas ;  desde  que  o  soldado  de- 
ve á  industria  as  armas,  as  rique- 
zas o  estado,  e  os  recursos  o  Prín- 
cipe, depois  que  a  industria  su- 
gerio  meios  de  construir  cidades 
ambulantes,  que  atravessando  o 
Oceano,  passaó  a  novos  mundos 
para  fazer  novas  conquistas  ;  de- 
pois que  as  artes  ,  e  officios  che- 
garão a  ser  os  interesses  mais  es- 
timáveis das  monarquias;  depois 
que  as  que  possuem  mais  cousas 
desta  espécie,  vem  a  ser  as  mais 
florecentes  ;  desde  então  para  cá  , 
digo ,  só  pode  cada  nação  por 
si  fundar  a  sua  segurança  na  pro»- 
porção  relativa  da  industria  geral. 
Fazendo  hum3  séria  reflexão  ,  com- 
prehender-sc-ha  claramente  que  a 
industria  só  de  alguns  povos,  at* 
trahindo  a  si  as  riquezas  dos  de- 
mais ,    fez  inclinar  o  svstema   da 


Europa  para  a  parte  que  mais  as 
favorece. 


( I4I ) 

Em  quanto  Luiz  XIV.  Rei 
de  França,  naõ  promoveo,  e  aug- 
srientou  a  industria  dos  seus  vas- 
sallos  ,  ninguém  lhe  attribuio  o 
pensamento  da  monarquia  univer- 
sal. Naõ  ha  duvida  ,  que  aquelle 
projecto  de  conquistar  o  mundo  foi 
unicamente  bum  fantasma  politico, 
inventado  pelos  seus  emulas;,  -mas- 
ninguem  fallou  de  tal  projecto  qui- 
mérico, em  quanto  aquelle  Prínci- 
pe naõ  augmentou  as  artes  em 
seus  domínios  :  porque  he  hum 
axioma  certo  de  politica,  que  hu- 
Ria  naçaõ  ,  que  pela  sua  industria 
attrahe  a  si  os  thesouros  d  outros 
estados  ,  ha  de  chegar  a  termo  de 
poder-lhes  dar  a  ler. 

Hum  author  mui  célebre  diz, 
que  a  historia  do  luxo  das  nações 
seria  huma  obra  mui  curiosa  ,  e 
importante  ;  mas  a  da  sua  pregui- 
ça ,  e  ociosidade  o  seria  muito 
mais.  Alli  se  descobriria  a  uniaõ, 
e  raiz  da  maior  parte  dos  grandes 
suecessos  que    tantas   vezes  mu-- 


-\\ 


( 14* )     Al1.     r 

dáraó  a  face  da  terra.  Alh  se  fa- 
ria patente  como  hum  povo  indus- 
trioso se  foi  apoderando  insensi- 
velmente das  riquezas  d'outro,  que 
o  era  menos,  e  aproveitando-se  da 
sua  ociosidade  ,  lhe  minou  todo 
o  seu  poder. ISPhuma  palavra, des- 
cobrir-se-hia  a  historia  geral  das 
revoluções  do   mundo. 

Todo  povo  deve  adiantar  a 
sua  industria  quanto  possa.  Esta 
máxima  he  das  mais  importantes, 
e  delia  depende  unicamente  a  se- 
gurança de  todas  as  nações.  Hu- 
ma  vez  que  a  industria  fixar  as  ri- 
quezas das  nações ,  conforme  cor- 
responder a  cada  huma  delias  , 
conseguir-se-ha  insensivelmente  a- 
quella  tranquillidade geral  ,  que  se 
procura  estabelecer  em  vao  por 
meio  d'outros  systemas:  de  modo 
que  se  pôde  dizer  ,  qi\e  todas  as  li- 
nhas da  industria  do  nosso  mando  po- 
litico devem  dirigir -se  a  hum  centro \% 
e  que  deste  ponto  fixo  depende  todo 
o  equilíbrio  da  Europa  j  pois  o  centro 


1 


X  143  )  ] 
«wãÕ  he  outra  cousa  senão  a  abundância 

das  tpusas  necessárias  d  vida  ,    de 
que  nasce  a  tranquilíidacle  geral. 

Paliemos  agora  circunstancia- 
damente do  motivo  por  que  Portu- 
gal se  acha  sem  riquezas ,  e  aclare- 
mos ,  se  he  possível,  o  principio 
•da  sua  ruina.  Além  das  causas  ge- 
raes  por  que  este  reino  devia  ern- 
pobrecer-se  necessariamente,  havia 
outras  que  lhe  era^  particulares, 
Suppondo  huma  naçaõ  composta  de 
dous  milhões  de  habitantes,  que 
naõ  tem  manufacturas  próprias,  pó- 
de-se  calcular  que  gastará  annual- 
mente  vinte  milhões  de  cruzados  a 
razão  de  i  o  cruzados  cada  indivi- 
duo, Tium  por  outro,  que  por  for- 
ça haô  de  passar  a  mãos  de  outras 
potencias.  Naõ  obstante  qsíq  cal- 
culo, sabemos  que  Portugal  (que 
cabalmente  se  acha  no  caso)  gas- 
tava mais  de  quarenta  milhões  de 
cruzados  só  neste  ramo.  E  que 
naõ  sabia  fazer  com  muito  ,  o  que 
outras  nações  fazem  €.qo)  "pouca. 


A  causa  de  taõ  grande  difrerençâ 
he  a  que  vou  explicar. 

Os  Inglezcs  empregavaô  mais 
de  cem  navios  grandes  somente 
para  o  commercio  de  Lisboa ,  e  do 
Porto,  que  fazem  hum  capital  de 
quasi  dezeseis  milhões  de  cruza- 
dos ,  cujo  juro  pagava  Portugal  á 
Inglaterra  a  razaõ  de  trinta  por 
cento  por  anno ;  porque  hum  ca- 
pital de  navios,  que  se  gasta  con- 
tinuamente, e  que  he  forçoso  re- 
novar cada  vinte  annos,  naõ  pode 
deixar  de  levar  estejuro,  cuja  som- 
rna  sobe  a  quatro  milhões  oitocen- 
tos mil  cruzados  a  cargo  de  Por- 
tugal. A  marinha  Inglezaoccupa- 
va  para  este  commercio  mais  de 
vinte  mil  marinheiros,  cuja  subsis- 
tência deve  Sohir  por  forçado  fun- 
do com  que  a  Grã-Bretanha  com- 
mercea  em  Portugal ;  o  que  pela 
parte  mais  diminuta  faz  hum  ren- 
dimento de  dous  milhões  e  quatro- 
centos mil  cruzados. 

O  frete  das  fazendas,   aba- 


tido  o  juro  dos  navios,  e  o  sa- 
lário dos  marinheiros  ,  se  pode 
regular  em  quatro  milhões  ;  e  a 
commissaõ  da  venda  em  hum  mi- 
lhão e  duzentos  mil  cruzados.  Es- 
ta partida  naó  admira  aos  que  fo- 
rem instruídos  do  modo  como  os 
Inglezes  fczem  este  commercio  ; 
pois  he  constante,  que  osPortu- 
guezes  nada  recebem  em  direitu- 
ra de  Inglaterra  ,  e  que  vem  a~ 
quelles  até  á  mesma  tisboa  ti/ar- 
lhes  das  mãos  a  commissaõ. 

Todas  ^estas  sommas  juntas 
formão  hum  total  de  doze  milhões 
-e  quatrocentos  mil  cruzados  que 
paga  Portugal  á  Inglaterra  todos 
-os  annos  y  o  que  augmenta  de  hum 
trinta  e  cinco  p>of  cento  o  preço 
das  cousas  que  necessariamente  se 
gastaõ  em  Portugal.  Isto  bem  en- 
tendido sem  contar  o  que  im por- 
tão as  expedições  das  mercadorias^ 
porque  aqui  naõ  se  trata  senaõ  das 
sommas  que  os  Portugirezes  podiao 
forrar  indo  por  si  mesmos  buscar 

G 


! 


í 


X  146 ) 

á  fonte  as  cousas  que  necessitas- 
sem. Defeito  de  economia  ,  sobre 
o  qual  está  fundado  o  maior  lucro 
que  os  Inglezes  tiraõ  de  Portu- 
gal. 

Até  aqui  naõ  vimos  senaõ  os 
damnos  que  padece  Portugal  pela 
má  forma  do  seu  commercio  ;mas 
o  fundo  delle  he  ainda  muito  peior. 
As  nações  mais  incultas  da  Ásia  , 
os  povos  mais  estúpidos  ,  n'huma. 
p^avra  ,  os  mesmos  Iroquezes  tem  . 
melhor  systema  de  commercio  que 
os   Portuguezes  :    os  Turcos  em 
troca  de  muitas  das  suas  primei- 
ras matérias  ,    e  de  algumas  das 
suas  manufacturas  vem  quasi  a  e- 
quilibrar  a  sua  entrada  com  a  sua 
sabida  ,  e  o  mesmo  vem  a  suece- 
der  com  os  Chinezes,  e  Japone- 
zes.  Mas  entre  a  Inglaterra,  e  Por- 
tugal toda  a  perda  está  da  parte 
delta  nação.  As  lás  que  os  Ingle- 
zes compraÕ  neste  reino  v©ltaó  pa- 
ra elle   depois  de  fabricadas  com 
hum  lucro  para  a  Inglaterra  de  qua- 


(  147  ) 
trocentos  por  cento  sobre  o  sen 

primeiro  valor.  Isto  he,  que  cada 
parte  desta  mercadoria  que  tiver 
occasionado  a  entrada  de  hum  mi- 
lhão no  reino ,  depois  de  fabri- 
cada ,  e  vendida  em  Portugal  ^ 
faz  que  saião  delle  cinco  milhões* 
Naõ  obstante  ser  tamanha  es- 
ta perda  ,  ainda  he  maior  a  que 
occasionao  as  sedas,  porque  este 
reino  compra  de  maõs, estrangeiras 
a  primeira  matéria  fabricada ,  e 
assim  saõ  immensas  as  sommas  que 
os  Inglezes  sacaõ  do  que  intro- 
duzem deste  género  no  Brasil-,  e 
em  Portugal.  Tampouco  saõ  me- 
nores as  que  tiraõ  das  estofas  de 
pelio,  como  cameloter,  durantes 
&c.  O  algodão  fabricado  ihes  dá 
também  infinito  proveito  5  pois  he 
constante  ,  que  quatro  onqas  des- 
ta matéria  ,  cujo  primeiro  valor 
intrínseco  he  de  menos  de  8o  réis, 
depois  de  trabalhada  em  tela  fina 
se  pode  vender  por  mais  de  qua- 
tro patacas. 


,       V^  .    X 


^  .«Hi 


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3 


<  148  ) 

Naõ  me  parece  ser  necessá- 
rio advertir,  que  todas  estas  mer- 
cadorias fabricadas  naõ  deixaõ  tan- 
to beneficio  aos  mercadores  parti- 
culares que  as  vendem  em  Portu- 
gal ,  como  ao  geral  da  naçaõ  on- 
de se  fabricaõ.  Os  grandes  ga- 
nhos para  hum  governo  já  cstaõ 
feitos  desde  logo  que  a  matéria 
ioi  fabricada.  O  fabrico  sérvio  pa- 
ra occupar  huma  infinidade  de  vas- 
sallos,  e  empregar  muitas  mãos; 
.0  que  conttibue  a  dar  huma  no- 
va circulação  ás  riquezas  do  paiz, 
a  aperfeiçoar  a  agricultura  ,  e  por 
conseguinte  a  augmentar  a  povoa- 
ção. 

O  ramo  de  quincalharia  ,  e 
o  seu  commeixio  em  Portugal,  he 
outra  fonte  de  riquezas  para  a  In- 
glaterra. Rum  arrátel  de  ferro  fa- 
bricado se  vende  aos  Portuguezes 
por  cincoenta  vezes  mais  do  que 
vale  no  seu  primeiro  custo ,  e  a 
relojoaria  só  de  Inglaterra  he  bas- 
tante para  empobrecer  a  Portugal, 


.f  149-5   ;  . 

Hum  mostrador  de  relógio r  erat1 
que  haja  cousa  de .  dois  vinténs 
de  matéria  r  se  vende  muitas  ve- 
zes em  Lisboa  por  mais  de  dez- 
eseis  mil  réis :  isto  quer  dizer  7 
que  hum  capital  de  quatrocentos 
mil  réis  em  Inglaterra  ,  ou  no  com- 
mercio  de  relojoaria  destinado  pa- 
ra Portugal,  dá  aos  í nglezes  de  ga- 
nho' cousa  de  quatrocentos  mil 
cruzados. 

Em  fim ,  até  o  papel  em  que 
se  escrevem  •%$  leis  deste  reino , 
serve  da  instrumento  para  empo- 
brecello.  Oslnglezes,  osHollan- 
dezes,  e  os  Genovezes  estiveraô- 
na  posse  de  vendello  aos  Porto* 
guezes  trezentos  por  cento  mais 
caro  do  que  o  seu  primeiro  va- 
lor, 

O  luxo  de  que  já  temos  fat- 
iado ,  he  outro  dos  mananciaes; 
mais  copiosos  para  os  Inglezes, 
que  andaõ  buscando  pelas  outras- 
Rações  os  meios  de  estimular  a 
vaidade  dos  Portuguezes  : :  de  sor*- 


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,    (  iyo  ) 

te  que  cada  moda  estrangeira  he 
hum  novo  imposto  sobre  as  rique- 
zas do  estado;  e  o  capricho  y  a 
velleidade  ,  e  a  inconstância  dos 
povos  he  huma  nova  mercadoria 
para  a  Grã-Bretanha. 

A  desordem  do  commercio 
de  Portugal  influc  também  no  seu 
governo  politico;  e  assim  vê-se, 
que  a  Inglaterra  dá  o  vestuário 
para  a  tropa  :  de  modo  ,  que  se 
arruina  o  estado  por  aquella  par- 
te que  o  deve  defender;  e  ainda 
naô  pára  aqui  o  abandono,  por- 
que até  as  mesmas  munições  de 
guerra  as  subministrnõ  os  Ingle- 
zes  ,  e  he  hum  artigo  dos  mais 
vantajosos  para  o  seu  commercio. 

Naõ  quizeraõ  cahir  na  con- 
ta os  Portuguezes  de  que  as  som- 
mas  immensas,de  que  se  despojao 
para  estas  provisões ,  saõ  as  pri- 
meiras brechas  por  onde  foi  ata- 
cado o.  seu  governo  politico  :  po- 
dendo-se  demonstrar  o  mesmo  do 
abastecimento  da  marinha  j    pois 


(  1*1  >     . 

os  mastros,  velais ,  enxárcias,  pez, 
alcatrão ,  e  demais  aprestos,  en- 
riquecendo taÕ-  consideravelmente 
a  Inglaterra  ,.  vaó  continuamente 
destruindo  Portugal. 

Parece  incrível  o  deleixo  que 
temos  referido;  mas  ainda  he  maior 
o  do  commercio  económico.  Bas- 
tava este  só  para  anniquilar  Por- 
tugal. O  commercio  de  grãos  pôz 
nas  mãos  dos  ínglezes  a  chave 
deste  reino  :  o  trabalho  do  lavra- 
dor Inglez  se  converte  em  rique- 
zas physicas,  e  reaes;  e  cada  co- 
lheita vale  á  Inglaterra  huma  mi- 
na de  ouro. 

Mas  para  que  nos  canqamos 
em  individuar  estas  matérias,  quan- 
do huma  só  palavra  he  bastante 
para  dar  huma:  idea  da  desordem 
geral  da  monarquia  Portugueza  ? 
Tome-se  huma  nota  dos  géneros 
que  introduzem  os  ínglezes  em 
Portuga! ,  e  ver-sc-ha  que  tfhuma 
somnia  de  quarenta  milhões  de 
cruzados ,  apenas  ha  dous  de  gri- 


í 

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i 


meiras  matérias:  todo  o  restante 
he  o  producto  da  industria. 

A  difFcrença  do  juro  legal  do 
dinheiro  entre  Inglaterra,  e  Por- 
tugal  he   outro   dos  desconcertos- 
que  padece  o  seu   commercio.  ris- 
te grave  darrmo  tem  a  sua  raiz  na 
falta  de  confiança^  que  tem  fempre 
huma  naçaõ,  que  naõ  entende  bem 
os  seus  interesses.  Por  exemplo  : 
o  dinheiro  naõ  vale  em  Inglaterra 
senaõ.a  dous  e  meio  por  cento  de 
juro  ,    e  em  Portugal  vale  a  dez. 
Vista  esta  desigualdade  conhece- 
se  que  naõ  saõ  precisas  nenhumas 
mercadorias  para  despojar  este  es- 
tado das  suas  riquezas ;    pois  so- 
mente o  credito  de  vinte  particu- 
lares Inglezes  o  podem  conseguir. 
Supponha-sehumasomma  de  cinco 
milhões  tomados  de   empréstimo 
em  Londres,  e  girados  depois  so- 
bre Lisboa;  estes  deverão  causar 
huma  extracção   taõ  exorbitante  , 
que   o   capital  da  divida  será  pa- 
go pelos  juros,  cada  dez  annos ,. 


ficando  a  divida  sempre  em  p&, 
Este  methodo  he  excellente 
para  dobrar  o  preço  das  mercadorias^ 
e  huma  arte  para  multiplicar  ao  in- 
finito os  proveitos  que  os  Jngle- 
zes  tiraõ  de  Portugal  ;  porque 
quanto  menos  recebe  huma  n&çaé 
a  fiado  da  outra,  tanto  menos  ca- 
ra compra  a  industria  delia.  O  pra- 
zp  naó  he  outra  cousa  senaõfeum 
arbítrio  seductivo  de  commcrcio  ^ 
pois  ainda  que  o  juro  naõ  se  es- 
tipule em  certos  contratos  de  cre- 
dito j  sempre  vai  embebido  no  pre^ 
ço  da  mercadoria. 

O  que  mais  aniquilou  a  ino- 
narquia  portugueza  foi  o  estabe* 
"cimento  de  tantos  Ingleses  na  sua 
capital.  Lisboa  está  juncada  dei- 
-les  ^  assim  como  das  suas  merca- 
dorias. Quando  hum  Inglez  que- 
bra em  Londres  5  embarca -se  pa- 
ra Portugal  a  £mde  refazer-se  daâ 
suas  perdas  ;  e  quando  hum  Ir- 
landez  pela  sua  miséria  naô  sabe 
<qae  fazer  na  sua  pátria  >    em  ve& 


fi 


kP 


n.x 


{  k/4  ) 

âc  k    a  Londres  fazer   serviços 

para  que  alli  o  enforquem  ,  to- 
ma o  caminho  de  Lisboa  para  pro- 
var melhor  fortuna. 

He  certo  que  todos  os  go- 
vernos da  Europa  fazem  o  que  po- 
dem para  attrahir  a  si  os  estran- 
geiros. Esta  he  huma  máxima  ex- 
ceilente ;  porque  os  estrangeiros 
multiplicando  o  numero  dos  habi- 
tantes, contribuem-a  aperfeiçoar  a 
industria  ,  e  "augmentaô  o  consu- 
mo dos  géneros.  Mas  para  isto  he 
preciso  que  haja  industria  que  a- 
perfeiçoar,  e  géneros  que  consu- 
mir; e  huma  e  outra  cousa  falta 
em  Portugal.  Nunca  se  discorreo 
nesta  monarquia.,  que  sendo  a  sua 
situação  inteiramente  distincta  da 
dos  outros  Reinos  da  Europa  ,  de- 
via governar-sc  por  máximas  intei- 
ramente distinctas. 

Antes  do  terremoto  se  conta- 
vaõ  quinze  mil  estrangeiros  em 
Portugal.  Isto  hc  huma  bagatclla, 
pois  naô   ha  cidade  capitalna  Eu- 


topa  que  naõ  tenha  muitos  mar& 
Naõ  obstante  este  curto  numero 
causava  grande  damao  a  este  rei- 
no j  porque  como  nelle  naõ  hou- 
vesse com  que  alimentar-,  nem 
vestir  os  seus  próprios  habitantes^ 
c  em  o  a  s  ua  ag  ri  cu  1  tu  r  a  5  as  s  u  as  ai> 
tes ,  e  manufacturas  naõ  podiaõ  es- 
tar em  mais  deplorável  estado  y  era 
preciso  receber  d'outras  nações  as 
cousas  necessárias :  deste  modo  os 
quinze  mil  estrangeiros  que  sub- 
sisti ao  no  estado  ,  lhe  eraõ  pesa- 
dos em  vez  de  lhe  serem  úteis  ; 
porque  faltando  nelle  com  que  ves- 
tir-se,  e  alimentar-se,  era  forço*- 
so  que  o  estado  cem  as  -suas  ri- 
quezas contribui  se  ao  seu  susten- 
to ,  do  mesmo  medo  que  ao  das 
seus  -habitantes  náturaes. 

O  que  allucinou  o  governo 
Po r tu gu e z  nes te  p o n t o  v  h e  a  per- 
suasaõ  em  que  está  de  que  os  es- 
trangeiros tiraõ  a  sua  subsistência 
da  sua  própria  industria  ;  mas  naõ 
cepãra  que  o  valor  desta  subsis- 


i 


icncia  sáíiio  já  do  estaco;  e  que 
9.  sua  industria  naó  faz  mais  que 
restituir  ao  governo  o  mesmo  que 
-este  lhes  tinha  antidpado.  He  cer- 
to que  os  estrangeiros  correspon- 
dem., e  cumprem  como  estado  em 
tudo  aquillo  que  tomaõ  delle..;  mas 
deixaô  em  descoberto  o  estado 
£omsigo  mesmo,  pois  o  produeto 
do  que  temaó  d'outras  nações ,  he 
para  ellas,  enaõ  p<ara  aquella  on- 
-de  immediatamente  se  consome, 
-O  mesmo  luxo  destes  estrangei- 
tos  he  também  gravoso  a  Portu- 
gal ,  porque  a  primeira  compra  das 
-matérias  que  o  fomentaõ  se  fez  com 
o  ouro  desta  potencia. 

O  damno  que  a  Inglaterra  fez 
6  Portugal  fazendo-lhe  abandonar 
a  sua  industria  ,  e  a  sua  agricul- 
tura, ainda  he  maior  do  que  nos 
podemos  figurar  ;  pois  he  regra 
geral  ,  que'  quando  hum  estado 
destroe  n'outro  estado  as  artes  me- 
cânicas, com  o  mesmo  golpe  an- 
niquila  as  liberaes  ;  o  que  trans- 


í  157 ) 

4orna  sempre  qualquer  systerma  da 
^politica.  A  prova  se  vê  neste  rei- 
no ,  pois  desde  que  a  Inglaterra 
formou  o. projecto  de  destruir  a 
>$ua  agricultura  ,    o  entendimento 
dos  seus  naturaes  se  reduzio  á  es- 
terilidade ,    como  o  seu  terreno^ 
e  por  mais  que  a  Europa  se  te- 
^nha   illustrado  com  tantos  desco- 
brimentos, a  ignorância  desta  na- 
ção foi  sempre  em  augmento,  ao 
4tiesmo  tempo  que  o  systema  In- 
glez    foi  cobrando  novas  forças  5 
,e  em  quanto  a  nova  luz  das  scíen- 
cias  se  vai  espalhando  sobre  a  ter- 
ça ,    Portugal    só  permanece    nas 
trevas  da  sua  primeira  ignorância. 
O  Norte,  aquelle  paiz  opaco 
onde  tudo  he  matéria,  fez  gran- 
des progressos. -nas- sciericias^  eo 
influxo  destas    alcançou  todas  as 
nações  do  mundo,  mçnos  Portu- 
gal ,  onde  naó  pôde  penetrar ;  e 
assim  se  pode  dizer  com  verdade, 
que  elle  he  o  paiz  inculto  dos  po- 
&os  cultos  da  Europa,* 


^ 


J 


Esta  ignorância  naó  he  effei- 
to  certamente  do  seu  clima,  pois 
Talvez  he  o  mais  a  propósito  da 
Europa  para  produzir  grandes  en- 
genhos ;  como  com  efTeito  os  pro- 
duzia nos  tempos  de  JoaÕ  II.,  e 
do  Rei  Duarte,  tanto  que  forao 
a  admiração  do  universo. 

Assentemos  pois ,  em  que  as 
sciencias  entraó  no  piano  de  hum 
bom  systema  politico;  e  assim  ve- 
ja-se  como  por  tdlas  cultivado 
com  tanto  esmero  a  França-,  e  a 
Inglaterra  ,  adiantarão  tanto  nas 
artes  liberaes,  e  adquirirão  tanta 
distincçaó  entre  as  outras  nações 
da  Europa. 

Na6  he  fácil  conceber  como 
a  monarquia  Portugueza  pôde  ca- 
hir  no  abatimento  em  que  se  a- 
cha ,  naõ  tendo  padecido  nenhu- 
ma daquellas  grandes  revoluções 
que  transtornaó  os  estados  ;  mas 
cessa  a  causa  da  admiração,  se  se 
considera  que  he  impossível ,  que 
dei.xe  de  decahir  huma  naçaõ  igno- 
rante. 


O  império  das  sciencias  an- 
da  sempre  acompanhado  do  impé- 
rio da  terra.  Nas  quatro  famosas 
revoluções  do  mundo,  que  saõ  o 
século   de  Alexandre  ,  o  de  Au- 
gusto ,   o  dos  Médicis,   e  o  de 
Luiz  XIV. ,  em  que  as-  artes  ,  e 
as   sciencias  renascerão  do  nada? 
em  todas  as  quatro  mudou  a  ter- 
ra de  semblante;  o  que  prova  que 
as  revoluções  das  sciencias  andao 
sempre   unidas  com  as  da  politi- 
ca ;  de  sorte ,  que  seria  mui  fácil 
provar  que  as  nações  que  mais  cul- 
tivarão  as  sciencias,    e  as  artes? 
saõ  as  que  sempre  se  avantajarão 
ás  outras.  As  sciencias  pois  saõ, 
sem  que  o  pareça ,  as  que  tacita- 
mente   dirigem   os    princípios  da 
politica.  Supponha-se,  ainda  mais, 
huma  naçaõ  inteiramente  ignoran- 
te da  geometria,  e  será  impossí- 
vel achar  nellà  a  menor  ord^nv no 
seu   governo  politico,  e  civil;  e 
pelo  contrario,  vemos  que  em  todos 
os  estados,  onde  houve  grandes  filo- 


s 

i 


3 

l 


sòfos ,  floreccraõ  ao  mesmo  tempo 
políticos  insignes. 

He  cousa  digna  de  notar-se, 
■que  quasi  todos  os  famosos   filó- 
sofos,   poetas,  sábios  oradores, 
pintores,  arquitectos,  litteratos, 
advogados,  engenheiros,  generaes, 
políticos  &c.    foraõ   contemporâ- 
neos em  França  no  reinado  de  Luiz 
XIV.  Parecia  que  aquelle  Prínci- 
pe tinha  semeado  huma  nova  se- 
mente de  engenho  ,  e  talento  uni- 
versal na  nação,  que  produzia  ho- 
iricns  grandes  ^m  todas  as  mata- 
rias. 

Nos  reinados  precedentes  ti- 
nha estado  a  França  n'huma  escu- 
ridão, e  trevas  continuas;  mas  na- 
quelle  tudo  foi  Juz ,  e  claridade, 
e  nunca  se  tinha  conhecido  Trin- 
ei pe  mais  hábil  na  arte  de  fazer 
cousas  grandes. 

Por  certo  que  nao  pôde  deixar 
de  causar  admiração  o  considerar, 
que  este  monarca  nao  somente  en- 
riquecia os  vassallos  próprios,  que 


C  161  ) 
mostravaó   talento  ,  mas  também 
procurava  saber  quaes  eraõ  os  qae 
sobresahiao  entre  os  vassallosdos 
outros  Soberanos  da  Europa,  para* 
recompensallos  com  o  louvável  fim 
de  dissipar  a  ignorância,  que  se 
tinhs  derramado  no  universo  ,  imi- 
tando o  grande  Hercules,  que  em- 
prendeo    elle  só  aHmpar  a  terra 
de   monstros.  He  cousa   sabida  , 
que  Colbert ,  por  ordem  do  Rei* 
seu  amo,  ao  enviar-lhes  regalos, 
lhes  escrevia ,  que  visto  que  o  Rei 
naõ  era  seu  Soberano,  lhes  pedia.* 
que  levassem  a  bem  fosse  seu  bem- 
feitor. 

As  sciencias  necessitaó  abso- 
lutamente de  recompensas  ,  e  naa 
se  conhecem  muitos  meios ,  que  se- 
jaó  mais  a  propósito  para  promo- 
ver  o  gosto  dos  homens  para  as 
b-eílas  artes,  fora  do  de  satisfazer 
a  sua  cobiça  ,  porque  he  tal  a  es- 
tructura  do  coração  humano  ,  que 
os  vicios  mais  vis  sa6  os  que  mui- 
tas vezes  servem  de  alicerce  á& 
grandes  virtudes* 


s 

i 


J 


Todas  as  partes  que  compu- 
nhaô  o  governo  politico  ,  e  civil 
de  Portugal  ,  tinhaô  experimenta- 
do os  effeitos  desta  ignorância  ge- 
ra!,  e  cada  raraodelle  estava  co- 
mo impedido,  e  paral\*tico.  Este 
defeito  de  administração  tinha  des- 
truído ainda  até  a  esperança  de  ter 
grandes  reformadores  ;  porque  co- 
mo se  pôde  presumir,  que  possaõ 
nunca  formar-se  homens  de  estado 
nlwm.  Reino  ,  do  qual  estejaõ  co- 
mo desterradas  as  sciencias  y  e  on- 
de naô  se  viaja  para  adquirillas?- 

Os  governos  políticos  se  vaõ 
aperfeiçoando,  ao  mesmo  tempo 
que  as  sciencias  de  especulação 
c.ommunicaõ  novas  --luzes  aos  en- 
genhos y  e  ao  mesmo  tempo  que 
se  enviaõ  sujeitos  para  viajar,  e 
ver  as  outras  coites. 

No  systema  geral  da  Euro- 
pa ,  que  tem  a  sua  origem  na  das 
bel  las  artes  ,  ha  huma  progressão 
contínua;  de  sorte,  que  se  hum 
estado  naõ  procura  manter-se  por 


oé3>,  ...  ; 

esta  parte  rfhum  grão  igual  ao^ 
outros,  ficará  sempre  atrazado.  Ha- 
via muito  que  se  esperava  em  Por- 
tugal hum  Colbert  ;  mas  pergun- 
to, poderia  produzir  aquella  mo- 
narquia hum  talento  semelhante? 
Decida-se   esta   questão. 

Avinda  dos  grandes  ministros 
se   vai  preparando  muito  de  ante- 
mão ?  e  nao  he  cousa  que  se  effei- 
tue  de  repente  ,  pois  ás  suas  lu- 
zes devem  ter  precedido  outras  lu- 
zes ,  q«e  lhes  sirvaS  de  guia.,  e  he 
precisa    huma    preparação    locaL 
Na.6.  foi  Colbert  que  intentou  o 
magnifico  sistema  ,  que  deo  tanto 
poder  ao  Reino  dà -França;  e^ de- 
ve-se-lhe  somente  a  execução  do 
que  Henrique  IV.  tinha  deixado- 
delineado.  Se  aquelle  ministro" naó 
tivesse  achada  aberto  o  caminho, 
talvez  nunca  teria  descoberto  meio 
para  effeituar  taó  grandes  cousas, 
visto  que  rara  vez  o  mesmo  esta- 
dista que  inventa, chega  a  pôr  em 
execução. 


5 


I 


J 


(  1*4  ) 
Como  em    Portugal  na 6    se* 
tivesse  cuidado    de  que  floreces- 
sem   as  sciencias  ,    naó   se   tinha 
tampouco  disposto  cousa  alguma 
para  ô  systema  politico,  nem  de- 
lineado plano  algum  de  governo; 
nem  se  quer  alguns  esboços  que 
fossem  a  propósito.  E  ainda  que 
tivesse   nascido  hum  Cblbert  em 
Portugal,   nunca  teria  havido  hum; 
Henrique  IV.  que  o  tivesse  pre- 
cedido &c. 

Finalmente,  dos  mesmos  Por- 
tuguezes  depende  abrir  hoje  em 
dia.  os  olhos  á  vista  do  seu  peri- 
go >  e  até  as  próprias  desgraças 
podem  offerecer-lhes  meios  para 
sahirem  do  seu  deleixamento  po- 
litico. Que  mQmento  taõ  decisivo 
para  aquella  nação  !  Antes  deste 
acontecimento,  qualquer  reforma 
que  tivesse  intentado  a  sua  poli- 
tica se  teria  fundado  em  falso  ; 
porque  quando  os  princípios  dlium 
governo  chegarão  a  corrompcr-se  ; 
quando  a  constituição  delle  se  foL 


(  i6y.) 
amoldando,  e  formando  segundo 
os  abusos  ; quando  as  preoccupações 
antigas  concorrerão  para  crear  no- 
vas faculdades  productivas;  quan- 
do li  um  excessivo  luxo  se  apode- 
rou da  naçaô  ;  quando  máximas 
depravadas  occupáraõ  o  lugar  que 
devêraõ  oceupar  as  boas  ;  quando 
o  povo  perdeo  a  vereda  dos  seus 
antigos  costumes;  enraõ  ,  digo  > 
todas  as  leis  ,  por  sábias  ,  por 
prudentes ,  e  acertadas  que  sejaõ, 
saó  inefficazes ,  e  de  nenhuma  uti- 
lidade. O  único  remédio  he ,  que 
a  Providencia  suprema  arroje,  di- 
gamo-lo assim  ,  hum  raio  que  des- 
trua tudo. 

Portugal  se  acha  hoje  em  dia  , 
como  hum  povo,  que  acaba  de  nas- 
cer; pois  a  desdita  geral  igualou: 
as  fortunas  dos  particulares.  O  ter- 
remoto afroxou  o  luxo  ,  princi- 
piando pelos  seus  próprios  alicer- 
ces. Huma  calamidade  publica  une 
commummente  os  corações,  e  os 
unimos  entre  si.  Que  cousas  nau 


(  i66) 

pôde  fazer   em   semelhante   caso 

hum    reformador  ?  O  leitor  pode 

infetillo  melhor  ,  do  que  eu  ex- 

piicailo. 

Mas  aquella  monarquia  ,  em 
vez  de  aproveitar-se  de  tantos,  e 
taõ  grandes  recursos,  como  as  suas 
desgraças  lhe  subministráraõ  suc- 
cessivamente  para  sacudir  o  jugo 
vergonhoso  que  a  oppritne  ,  se  foi 
pelo  contrario  sujeitando  mais  ,  e 
mais  a  elle ,  e  apertando  mais  a 
cadeia  que  lhe  prende  a  sua  liberda- 
de. E  costumada  a  Inglaterra  des- 
de muito  tempo  a  converter  em 
beneficio  próprio  as  maiores  des- 
graças alheias  ,  medita  já  concluir 
o  edifício  do  seu  poder  sobre  as 
cinzas  daquelle  infeliz  reino  ,  a- 
proveitando-se  para  isso  da  mes- 
ma cegueira,  com  que  a  naçaõ  Por- 
tugueza  se  entrega  ao  ambicioso 
arbítrio  da  Ingleza. 


(  i«7  ) 
KELAÇAÕ  HISTÓRICA 

do  Terremoto  de  Lisboa. 

xNaõ  houve  no  mundo  monarquia 
mais  exposta  ?  que  a 'de -Portugal, 
a  grandes  revoluções,  pois  se  se 
abre  a  historia  politica  daquelle 
reino,  encontraõ-se  a  cada  passo 
successos  extraordinários ;  e  se  se 
passa  á  sua  historia  natural  ?  no 
ta-se  que  naõ  houve  nação  algu- 
ma na  Europa  ,  que  tenha  pade- 
cido mais  raros  fenómenos. 

Vio-se  Lisboa  varias  vezes 
destruída  por  causas  sobrenaturaes. 
Do  interior  da  terra  sàhíraõ  fogos 
soterraneos  ,  que  a  abrazáraõ  quasi 
inteiramente ;  espantosos  furacões 
derribarão  os  edifícios  ,  e  trans- 
tornarão inteiramente  aquella  ca- 
pital:  no  século  decimo-quinto 
hum  terremoto  arruinou  huma  gran- 
de parte  dos  edifícios  daquelle  po- 
vo. 


<  i68  ) 

Dificilmente  se  poderá  deter- 
minar a  razaõ  das  causas  por  que 
estes  fenómenos  saó  mais  frequen- 
tes em  Portugal  do  que  n'outras  par- 
tes, a  naó  serque  se  queira  dizer  que 
procede  de  que  em  Portugal  ha 
huma  só  estação  ,  sentindo-se  mais 
calor  do  que  frio.  Naó  pode  a  ter- 
ra estar  exposta  a  enfermidades  co- 
mo o  corpo  humano  ?  Naõ  neces- 
sita da  alternativa  do  frio,  e  do 
calor  ?  Acaso  huma  estação  sem- 
pre igual  naõ  pode  ir  preparando 
de  hum  a  c.tro  século  as  causas 
destas  revoluções  physicas  ? 

Como  quer  que  seja ,  já  ha- 
via mais  de  dous  séculos  que  Lis- 
boa naõ  experimentava  nenhum 
destes  fenómenos,  quando  no  dia 
primeiro  de  Novembro  de  175-5 
tornou  aquella  cidade  a  ligar  a  in- 
terrompida serie  das  suas  primei- 
ras desgraças  (1). 


(  1)     Quanto  a  diíer-se  que  nos  dous  sé- 
culos  antes   do  presente  ,  naõ   houve   ter* 


(  i69) 

Peias  9  horas  e  20  minutos 
da  manha  sentio-se  hum  espanto- 
so estremecimento  ,  que  derribou 
a  maior  parte  das  Igrejas  y  e  mui^ 
tos  edifícios  ,  palácios ,  e  casas 
particulares.  Acompanhou  este  tre*» 
mor  de  terra  hum  ruido  tremendo, 
que  parecia  sáhir  do  centro  da  ter- 
ra ,  ainda  que  procedia  s<5mente 
da  queda  dos  edifícios  $  e  hura 
instaure  depois  principiou  a  cida- 
de a  arder  toda  envchammas. 

Ainda  que  eín  varias  rei aqdeU 
se  ,  publicou  que  tinhao  sido  in- 
cendiários òs  que  tinhao  lançado 
o  fogo,  carece  de  probabilidade* 
Por  mais  viciosos  qu-e  sejaõ  os  ho^ 


remotos  em  Portugal  engana-se  o  autbòr^ 
pois  neste  houve  htim  no  anno  de  1724,1 
e  no  anno  de  1700  houve  outro:  no  sé- 
culo anterior  a  27  de  Outubro  de  1 699  , 
houve  hum  ,  e  no  aóno  de  i óoo  houve 
outro  :  e  no  século  precedente  houve  hu<n 
a  27  de  JúJho  de  1598  ,  outro  a  7  de 
janeiro  de  1575  ,  outro  a  28  de  Janeiro 
de  1551  ,  e  outro  a  7  do  ifleswro  mez  nè 
anno   de    1531, 

H 


i 


í 


C  170  ) 
mens,  por  mais  cobiça  que  tenhaõ 
de  adquirir  riquezas  pelos  cami- 
nhos mais  breves,  sempre  subsis- 
tem aquelles  primeiros  instantes 
de  susto,  que  naõ  dependem  dos 
mesmos  homens  ,  e  nos  quacs  a 
avareza,  e  a  ambição  emmudecem 
á  vista  de  huma  morte  próxima* 
E  he  cousa  evidente,  que  jamais 
houve  instante  mais  critico,  pois 
o  primeiro  vaivém  do  terremoto 
foi  tamanho,  que  se  receou  hum 
transtorno  gerai. 

O  certo  he  ,  que  o  incêndio 
se  originou  ao  cahirem  as  ca- 
ías ,  que  como  cada  huma  delias  ti- 
vesse lume,  o  communicáraõás  ma- 
térias combustíveis.  BuSta  reflec- 
tir sobre  a  natureza  do  elemento 
do  fogo  ,  para  persuadi r-se  que 
teria  sido  hum  fenómeno  dnda 
ruaior  que  o  do  terremoto  ,  se 
tendo  desabado  de  hum  golpe  tan- 
tos milhares  de  casas,  naõ  tives- 
se o  fogo  pegado  em  alguma  parte. 

Ainda  que  o  movimento  foi 


c  m  x 

inteiramente  universal  \   sem  êtíi- 
bari*o  ?  fez-se  muito  mais  sensível 
nalguns   bairros  do   que   neutros. 
Para  a  parte  do  Tejo  colheo  em 
certo  modo  o  terremoto  a  cidade 
ao  soslaio  5    mas  a  ^ua  maior  vio^ 
lencsa    foi   desde  a  Moeda  até   á 
paragem  onde  está  a  forca  9  e  foi- 
se  minorando  em  duas  aks  ,   que 
corriaõ  hum  a  até  '«Belém  ,    e  a  ou- 
tro até  ao  Beato  António.  :De$âe  ® 
espaço  ,  que  media-entre a  casada 
raoeda  ,    ea   forca  5  subio  até    ao 
castello  -que  está  situado  na  maior 
altura  de  Lisboa  ye  por  conseguin- 
te a  maior   parte  da  antiga  cidade 
-dos  Mouros* 


■■Emmerâ-çàfi  ios  'mortos \ 


K 


1  aô  he  possível  determinar  o  nu- 
mero das  pessoas  que  morrerão  em 
Lisboa  neste  terremoto  ;  sendo  a 
razaó  principal  disso  ?  que  aqioelh 
cidade  mó  tinha  enumeração  ce¥- 
í-a  da  sua  .povoação  j   outro  dos 

ti  i 


i 


i 

i 


rnuitos  defeitos  da  administração 
cio  governo,  e  o  que  até  o  armo 
de  1748  se  dizia  acerca  da  povoa- 
ção de  Lisboa,  se  fundava  unica- 
mente no  erro  do  povo,  pois  se 
assegurava  commummeme,  que  na- 
quella  capital  havia  quinhentas  mil 
almas. 

Mas  houve  hum  Inglez  ,  que 
apostou  huma  grande  quantia  de 
dinheiro,  que  naõ  chegavaõ  a  Tre- 
zentas mil  ;  e  desde  logo  se  créo 
que  a  mesma  corte  de  Londres  ti- 
nha tido  parte  na  aposta  ,  sendo 
a  curiosidade  deste  particular  só 
hum  pretexto  politico  de  estado. 
Com  effcito  importa  muito  a  hum 
governo  ,  estreitamente  unido  com 
outro,  saber  com  certeza  a  sua 
povoação  ,  pois  este  he  o  mais  se- 
guro norte  pari  guiar-se  em  todos 
os  projectos  poluicos. 

Como  quer  queseja,  por  meio 
desta  aposta  se  logrou  fazer  humi 
enumeração  pontual  dos  moradores 
de   Lisboa  casa  por  casa  ,   e    $c 


(  173  )  .  .  ' 
averiguou  que  naõ  havia  tnais  de 
duzentas  e  sessenta  mil  pessoas 
com  pouca  differença  ,  contando 
os  estrangeiros. 

Mas  como  o  governo  naõ  fe& 
caso  desta  indagação  ,    nem  tam- 
pouco se  registou    formalmeiKs, 
para  que  no  vindouro  constasse  ã; 
povoação  daquella  cidade  ,  foi  pa- 
ra   o  estado  politico  como  se  naô 
se  fizesse  ,  sem  que  houvesse  mais 
que  alguns  particulares,  que  fossem 
informados  pontualmente  do  nume- 
ro de  habitantes  de  Lisboa  ,  sub- 
sistindo assim  sempre  o  erro  -po- 
pular ;  pois  quasi  todos  os  recur- 
sos que  poderiaõ  ter  ficado  ao  go- 
verno Portuguez  eraõ  defeituosos 
em  si,  ou  por  natureza,  ou  por- 
que os  inutilizou  a  mesma  desgra- 
ça, e  transtorno  do  terremoto. 

De  sorte,  'que. -este. próprio 
fenómeno  oceultou  para  sempre  o 
verdadeiro  cumulo  de  males  que 
occasionou,  sem  que  possa  jamais 
saber-se ,  nem  naquelle  reino ,  neca 


, 


i 


3 


(  i74  ) 
em  nenhum  da  Iiuropa  o  numero 
cabal  das  pessoas  que  perecerão 
bo  terremoto.  Naõ  ha  duvida  que 
cada  particular  nao  ignora  quan- 
tos parentes  lhe  faltarão  cntad  ; 
mas  repito  que  o  esrado  naõ  che- 
gará nunca  a  saber  em  geral  os 
vassallos  que  perdeo. 

Nao  obstante  r  o  ministério 
o  teria  podido  conseguir,  obri- 
gando a  cada  particular  a  dar  hu- 
ma  razaô  exacta  dos  mortos,  que 
lhe  pertenciaõ.  Mas  por  outra  par- 
te a  politica  se  oppõe  a  esta  enu- 
meração ,  porque  seria  informar 
assim  ao  mesmo  tempo  as  outras 
potencias  do  quão  despovoado  ti- 
nha ficado  Portugal  j  sendo-o  já 
tanto  dantes. 

Varias  relações ,  que  pouco 
depois  se  enviarão  de  Lisboa,  es- 
critas as  mais  delias  por  ministros 
estrangeiros  ,  assegurava^  que  o 
numero  dos  mortos  era  de  cem 
mil;  mas  conhece-se  que  o  terror 
fpattko  dictou  semelhantes  relações. 


( m3      ,      . 

naó  sendo  estranho  que  hum  in- 
dividuo que  acaba  de  sah.ir  de  pe- 
riao  raô  grande,  dê  tudo  por  perdi- 
do    e  escreva  no  mesmo  conceito. 
Com  somente  reflectir  que  a 
extensão  daquella  cidade  he  sum- 
mamente  dilatada,  e  que  todaei- 
la  está  cheia  de  jardins,    e  se  pa- 
da por  ai  ws  montanhas ,  se  infe- 
re  quão   estranha  catástrofe  teria 
sido  que  tivesse  perecido  a  terça 
parte  dos  seus  moradores 9  para  o 
que   seria   necessário   que  a  terra, 
tragasse  .toda   aquella  capital. _  A 
maior  mortandade  foi  nas  igrejas, 
pois  fundindo-seas  abobadas  ^se- 
pultarão  a  maior  parte  dos  con- 
correntes. Por  fortuna  na 6 >  era  ain- 
da a  hora  precisa  ,  em  que  se  cos- 
tumaõ  dizer  as  missas  cantadas  em 
Lisboa,  em.  cujas  Parochias  mô 
principiao    senão  is  dez   horas  , 
pois  o  primeiro  vaivém  do  tremor 
ée  terra  principiou  ás  nove  e  vin- 
te minutos  pouco  mais  ,    ou  me~ 
aos,  A  esta  circunstancia  se  deve 


i 


(  *7«  ) 
o  ficarem  em  Lisboa  trinta  mil  pes- 
soas mais  com  vida. 

Outra   circunstancia  foi  cau- 
sa de  mó  perecer  gente  da  nobre- 
za ;  e  nem  também  mu  ira  da  se- 
gunda classe.   Está  geralmente  es- 
tabelecido em  Portugal  o  uso  de 
que  as  pessoas  de  alguma  distinc- 
çaõ  tenhaõ  em  sua  casa  Oratório 
para   dizer  missa  ;    e  a  gente  da 
visinhança,  que  carece  desta  com^ 
modidade  acode  áquellas  casas  em 
que  a  ha,  pois  os  donos  naõ  re- 
cusaõ  a  entrada  a  ninguém:  rara 
vez   principiaõ  estas  missas  antes 
das.  onze  ,    de  sorte  que  ás  nove 
cada  hum  está  ainda  em  sua  casa. 
Outra  circunstancia  salvou  a 
muitos  indivíduos;  e  consiste  em 
que  naquelle reino,  comotaó  tem- 
perado ,    está   a  gente  no  campo 
até  o  mez  de  Novembro,  sem  vir 
á  cidade  para  ouvir  missa  nos  dias 
de  festa,  porque  tem  também  Ca- 
pellas  nas  casas  de  campo. 

Finalmente,  segundo  as  re- 


■{■177}     .  ' 

laçoes  que  parecem  mais  etâcm  f 

e  feitas  por  sujeitos  sem  interesse 
pessoal  em  augmentàr  ^  ou  dimi- 
nuir a   perda  ,    suppôe-se  que   o 
numero  dos  mortos  foi  de  vintes 
cinco  a  trinta  mil  indivíduos  :    e 
até  se    comprehendcrá  que  he    o 
mais   a  que  se  poderá  estender ,  se 
se.calcular  a  perda  dos  Portugue- 
ses pela  dos  estrangeires.  Geral- 
mente se   Sabe  que  todosv os   mi- 
nistros, á  excepção  do  de  Hespa- 
nhã,  èaínraô  livres  do  perigo-  ^ 
o  de  França  ,  que  naô  perdeo  fiem 
se  quer  hum  criado,  teve  tempo, 
para  tirar  todos  os  seus  trastes. 

Quiçá  naõ  houve  desde  o 
principio  do  mundo  desgraça  ,dt~ 
gamo-lo  assim  ,  mais  feliz.  No 
bairro  âo  Remvteres  9  que  he  o  que 
mais  padeceo,  e  cujo  transtorno 
foi  mais  geral ,  só  perecerão  três, 
ou  quatro  estrangeiros  ,  e  assim 
dos  demais  bairros.  Advertio-se  en- 
tão qu^  o  mais  forte  da  desgra- 
ça o   experimentou  a  gente  com- 


j 


"( m ) 

-irarm-do  povo;  salváraó-se  todas 
as.  pessoas  réaea,  e  a  maior  parte 
da-  nobreza  ?  e  apegas  houve  in- 
dividuo   algum   de   caracter,  que 
naõ   tivesse  a  fortuna  de  mó  ver- 
se envolto  naqueila  catástrofe  las- 
timosa ;  mas  se  o  numero  de  pes- 
soas que    pereceo   naquella  occa- 
siao  foi  menor  do, que  provavel- 
mente se    devera    temer  ,    o  das 
casas.,    e  edifícios  arruinados  foi 
maior    do  que    se  podia  pensar  .j 
pois  em  toda  a   cidacle  foi  geral, 
e  quasi  igual  no  vaivém  ;  e  ainda 
que  o  damno  for  maior  em  alguns 
bairros  do  qut  noutros  ,  sem   em- 
bargo he  constante  que  o  estraço 
foi  universal  quanto  aos  edifícios. 
De  modo,  que  de  quasi  vinte  mil 
casas  que   compunhaõ  esta  capi- 
tal ,  apenas  ficáraó  tres  mil  que  se 
podessem  habitar  com  segurança* 
pois  ainda  que  muitas  .naõ  tenhaõ 
sido  inteiramente  destruídas,  co- 
mo os  seus  alicerces  se  resentiraõ 
tanto  ,  ao  menor  impulso  poderão 
vir  ao  chaõ. 


•  (  '179  )  :   * 

:hto  supposto- ,  .  pôde- se'  fàfc~e* 
hum  juizo  prudente  da  perda  na- 
cional relativa  aos  edifícios ,  deste 
trmdo.  Pelo  palácio  real.  Pátrias 
cal  ,  alfandega  ^sete-casas^e  thea- 
iro  real,  dez  milhões  de  cruzados. 
Esta    perda   embora    poderá  cha- 
mar-se  quimérica,  naõ  tornando. il 
restabelecer  os  edifícios  ;  mas  pe- 
lo contrario  acabará  de  arruinara 
nação ,    porque  os  principaes  ma- 
tefiaes  ^kveráó   vir  de  p a izes  es- 
trangeiros 

Quanto  á  raina  das  casas  dos 
particulares  ,  He  indefinivel  a  grife 
to  fixo  ?  mas  considerando  que  fa- 
raó humas  4oze  mil  as  arruina- 
das,  póde-se  regular  a  sua  perda 
em  pouco  mais  de quatorze  mi- 
lhões de  patacas  ,  avaliada  tum* 
por  outra  em  duzentas  moedas;  mas: 
o  real,  ou  o  quimérico  desta  perda 
depenlerá  do  modo  de  reedificai  la  §3» 
como  já  temos  dito. 

-Tampouco  he  fa^H  regular  a 
valor  dos  trásies  que  se  queima- 


1 


ÍS 


VMTBm 


■t. 


tta  :  o  certo  lie  ,  que  depois  do 
reinado  de  Pedro  II  ,  e  dodesco- 
hrktícrkp  das  minas  de  ouro,    se 
tinha     introduzido    em    Portugal 
hum  grande  luxo  de  trastes  ;    d? 
sorre    que    cada   palácio  era    hum 
tíiesouro  particular,  tanto  em  pin- 
turas, e   tapeçarias,  como  em  ou- 
tros   effeitos  preciosos  ;    e  assim 
póde-se    prudentemente  discorrer 
quão   immensa   terá  sido  esta  per- 
da. 

A  do  dinheiro  de  contado 
naõ  pode  ser  das  maiores  ,  pela 
pobreza  em  que  se  achava  este 
Reino;  comprehendido  o  do  erá- 
rio real  ,  e  o  dos  particulares  na- 
cionaes  ,  e  do  Brasil  (  que  alli 
chamaó  commummente  Mineiros"  ) 
poderá  ser  ern  tudo  de  dez  mi- 
lhões de  cruzados. 

Acrescente-se  a  esta  partida 
a  de  jóias,  pedrarias,  e  prata  la- 
vrada ,  tanto  da  coroa,  como  de 
particulares,  de  igrejas  ,  e  com- 
munidades  ,    e  achar-se-ha  huina 


X  iSr) 
sonrma  que  excede  toda  imagina- 
ção; pois  além  de  ser  a  corte  de 
dsboa  a  mais  rica  da  Europa  em 
pedras  preciosas,  e  terem  pereci- 
do todas,  á  e&cepçaõ  dasque  tra- 
ziaô  naquella  hora  as  pessoas  reaes 
sobrç  si ;  as  duas  ruas ,  onde  mora-. 
vaõ  os  mais  ricos  ourives  de  pra- 
ta, e  de  ouro^  foraõ  as*  que  mais 
soffrêraó  no  tremor  ,  e  no  incên- 
dio. 

A  perda  que  nesta  desgra- 
ça sofFrêraó  as  naçâes  estrangei- 
ras he  mais  fácil  de  regular  ;  por* 
que  como  cada  bumsabia  qual  era 
o  seu  cabedal  antes  deste  aconte- 
cimento,, naó  he  preciso  mais  que 
juntar  as  partidas  particulares  para 
saber  a  sõmma  geral. Esta  pois  che- 
ga, conforme  hum  calculo  segu^ 
ro  que  se  me  mostrou  ,  e  sem 
exageração  alguma,,  a  quarenta  e 
eito  milhões  de  patacas  ,  tanto  em 
dinheiro,  como  em  mercadorias^ 
repartidas  deste  modo : 


j 


i 

í 

i 


I 


A   Inglaterra,   Irlanda .,    e 

Escossia.  . •  •■  3a 

Hamburgo.  .........   8 

Itália. 5 

Hollanda.     ......*..   i 

Suécia c  5 

AUeroaiiha .  .  .  oj 

França.  . i 

O  damno  que  disto  se  se- 
guio  a  tantas  nações  ,  o  resarciráo 
facdmente  com  a  sua  industria  «, 
cornmercio ,  e  actividade;  mas  os 
infelizes  Portuguezes,  que  estaõ 
privados  de  tudo  isto  ,  naõ  hr>ó 
de  achar  ta5  fácil  o  remédio  ao 
seu  tua!.  Naô  obstante  podiao  ain- 
da convalecer  de  perdas  taõ  MH 
•roensas ,  se  para  isto  soubessem  ap- 
plicar  os  meios   convenientes. 

Estes  saõ  fáceis,  e  se  redu- 
zem a  dous  únicos  pontos  y  que 
saõ  empregar  com  vigor  a  indus- 
tria dos  seus  habitantes ,  e  naõ  ad- 
mittir  os  saccorros  dolosos  ,  e  in- 
teresseiros das  nações  estrangeiras. 


(  *g3  )         r    ., 
:'&  Portugal  recorre  aos  liigtezes 

para  restabelecera  sua  capital;  se 
contra  o  seu  próprio  interesse  fe- 
cha os  ouvidos  á  voz  da  razão  , 
tudo  vai  perdido  ?  e  em  vez  de 
resarcir-se  das  suas  calamidades  ^ 
se  engolfa  mais  nellas  para  sempre. 
Os  Inglezes  saberáó  entaõ  recorra 
pensar-se  com  usura  das  suas  per- 
das á  custa  dos   Portúguezes. 

Trabalhem  estes  para  que  o 
ouro  do  Brasil  oao  passe  á  Ingla- 
terra ,  e  para  que  sirva  somente 
para  remédio  de  seus  males  y-  e  en- 
tão conhecerão  que  naõ  sao  incu- 
ráveis ;  e  que  só  com  a  melhor  ad- 
ministração dos  seus  thesouroSí  po- 
derá restabelecer-se  a  sua  monar- 
quia no  antigo  estado  de  poder ,  em 
que  algum  tempo  se  vio. 

O  zelo  ,  e  a  compaixão  me 
sugerirão  ^stas  reflexões  a  tavor 
desta  monarquia  infeliz.  As  razoes 
em  que  se  fundão,  creio  que  per- 
suadirão a  todas  as  nações  euro- 
peas;    á  excepção  da  Ingleza  5   e 


i 


ra 


í 


( 1*4 ) 

da  Portugueza  :  a<juella  pelo  setr 
interesse,  e  esta  pelas  suas  preoc- 
cupações,  e  pelo  seu  erradomodo 
de^  pensar  em  matérias  de  poli- 
tica. 

F  I  M. 


1 


(   2*5  ) 


ÍNDICE. 

Advertência  doEO- 

tor  HespanhoL  ■--.-- 
PREFACIO.  -     -     -     -     - 

DISCURSO  POLITICO. 
Das  utilidades  que  Portugal 
poder ?a  tirar  dai  suas  des- 
graças.   -     -     -     -  ■  -     - 

§.  I.  As  cousas  physicamente 
necessárias  faltavao  a  Por- 
tugal,      ------ 

§  II.  O  commercio  anmquilado 
em    Portugal.     -     -     -  '  - 

§  III.  Da  nenhuma  industria 
de    Portugal      -     -     -     - 

§  IV.  Mdo  systema  de  politi- 
ca em.  Portugal.      - 

§  V.  Que  a  origem  das  rique- 
zas de  Portugal  era.md ,  e 
viciada.    -  -  -     -     -     - 

§  VI.  Que  a  fazenda  reul  de 
Portugal  estava  inteiramente 
arruinada. 

§  Vil.  Refieocoes  sabre  o  in? 


21 


n 


17 


3° 


I 


I 


-  -  42 


:xmm 


{  i«6  ) 
fluxo  que  tinhao  as  miras  de 
ouro  do  Brasil  m  systema  ge- 
ral da  Europa.  -     -     -     -     46 

§  VIII.  Que  o  oura  he  huma 
mercadoria  como  as  outras.     77 

§  IX.  Que  sendo  Portugal  es- 
téril por  natureza,  nao  po- 
de bastar  para  a  subsistência 
dos  seus  habitantes.  -     -    .-     80 

§  X.  Que  todos  os  estudos  de- 
vem sortir  Portugal  do  que 
necessita.       -     -  ■   -     -     -     83 

§  XI.  Que  Portugal  nao  tem 
necessidade  de  exercito  de  ter- 
ra j  nem  de  esquadras  de 
mar  ;  e  que  toda  a  Europa 
estd  interessada  em  mantello 
na  situação  em  que  ?e  acha.     88 

§  XII.  Que  o  ouro  que  se  ti- 
ra das  minas  da  Âmerka  , 
conduzido  d  Europa ,  e  leva- 
do depois  ao  Oriente  pelo  ca- 
nal do  cêmmercio  da  Índia  5  se 
consome  como  as  outras  mer- 
cadorias, ------94. 

§  XIII.  Que  por  mais  que  se 


"M-Ti 


104. 


I-©f 


( 187 ) 

diga  y  os  Portugueses  sao 
mais  ricos  hoje  em  dia ,  do 
que  antes  do  descobrimento, 
das  minas  do  Brasil     -     -   l'Oi 

§  XIV.  Que  Portugal  pode  com 
o  seu  ouro  ter  as  mercado- 
rias fabricadas  por  melhor 
preço  9  que  aquelle  por  que 
elle  as^f aderia  fabricar,     - 

§  XV.  Que  o  clima  se  oppoe 
ao  estabelecimento  de  manu- 
facturas: em  Portugal.  -     % 

§  XV  í.  Que  he  grande  vanta- 
gem o  dar  a  Inglaterra  meios 
a  Portugal  para  extrabkr  o 
ouro  da  Brasil,  :e  que  sem  : 
este  recurso  estariaõ  em  peior 
estado  os  negócios  da  Europa.    1&9 

§  XVII.  Que  desde  a  allianca 
dos  Portugueses  com  a  In- 
glaterra,  se  estaheleceo  em 
Portugal  -hum  grande  luxo 
que  lhe  he  necessário.  -  -  114 
§  XVIII.  Que  Portugal  naS 
pode  deixar  de  necessitar  dos 
outros  estados  da  Europa  y  e 


t 


&$ 


TH 


i 

i 


í 


(188) 
especialmente  de  Inglaterra,   121 

§  XIX.  Que  o  trato  dos  es- 
trangeiros fez  mais  sociáveis 
os  Portuguezes ,  e  os  igua- 
lou com  as  nações  cultas.     -   124 

§  XX.  Que  a  disposição  das 
cousas  requer  que  estejao  0- 
ciosas  nações  inteiras  ,  em 
quanto  outras  trabalhai),  por- 
que assim  o  resolveo  a  Pro-  K 
vidência  Divina.  -     -     -     -   130 

RELAÇÃO  histórica  do  ter- 
remoto de  Lisboa  do  anno  de 
1755*      ------  167 

Enumeração  dos  mortos.   -     -  171 


LIVROS  Imprejfbs  por  Francisco  RollAnp, 

Imprcssor-Livreiro    em  Lisboa  ,  a&  Largo  êo 

Loreto. 


A, 


tias   moderno,   com    24  Mappas.    ( 
Aventuras    de  Telemaco  ,  em.  8. 
-Amigo  do  Príncipe  ,  e  da  Pátria  ,   ou  o  bom 

Cidadão,   em   8.    Í779. 
Adeiiá    de    Senange   ,     ou    Cartas    do   Lord 

Sydenham  ,  traduzidas  em  Vulgar  ,  em  S. 
Adágios  ,    e  Provérbios  ,  da   Língua -Portug. 

em    8. 
Arte    Poética    de   Horácio  ,  trad.  e    illust. 

por    Cândido    Lusitano  >  em    8. 
.Bom  Lavrador  ,  e  Boa  Lavradora,  em  8.  3  V. 
Belizario   de  Marmontei  ,   em  8. 
Gollecçaó  de  Peças  importantes  ,    &c.  em  8. 

1806. 
Choupana   índia,    em    12.    1806. 
Costumes    dos    Israelitas,   e.  dos   Christãos, 

em    8,    3    Vol. 
Collecçaó   de   Historias  ,  Anecdotas ,  em  S. 
.     3  vo!.  1799»-         ;     *     * 
Coiiecçaõ   de    Decretos  ,      e   Edifaes  ,   &c. 

em    4.    1808. 
Calendrier   de   Lisbonne  pour  1'an   de  1808, 

em    12,  ;'    - 

Diccionario    da  Língua  Poitugueza  ,    em   4, 
Desgraças    da  Inconstância  3    em  12.   2  Vol. 

1807. 
Diálogos   dos   mortos    ,  em    8. 
Diccionario     abreviado    da    Bíblia   ,    em    $• 
Desvarios  da  razaó  ,  &c.  em  8.  3  Vol. 
Eneida  ds  Virgilio,  por  João  Franco  Barreto  , 

em   8.   2  Vol.  1808. 


Escolha  de   Anecdotas  ,  antigas  ,  c  moder- 
nas ,   em  8.  1 806. 
Emma  ,   ou    a  Filha   do   Desgosto,    em    12 

2  Voi.    1807. 
Emília  ,  e  Affonso  ,  noveila,  em  8. 
Evangelho    em    triunfo  ,   em    3.    8    Vol. 
Escolha   das    imitares  Novel  las  ,   e   Contos 

moraes  ,  em  8.  7  Vol. 
Elogios   dos   Reis  de  Portugal  ,    em    8. 
Escola  fundamental  de  ler  ,  escrever,  e  con^ 

tar  em    1 2.    1807. 
Elementos   da   Civilidade  ,  em  8. 
Fabulas    de    Esopo  ,   em    â.  - 
Filosofa   por   Amor  ,   ou   Cartas   de  dous  A- 
inaiues  apaixonados  ,  em  12.  2  Vol.  1806. 
Historia   Romana,    em    8.  4  vol.  1806. 
Historia    de    Bonaparte  ,    em    8.   4  v"l. 
Historia    Geral  de  Portugal  por  M.  La  Clede, 

em  S.  16  Vol. 
Historia  de    Portugal    por  Damião  António, 

em  8.  20  Vol. 
Historia  Universal  de  MiMot,  em  8.  gr.  9  Vol. 
Historia  Ecclesiastica  de  Ducreux  ,  em  8.  gr. 

1  1  vol. 
Historia  de  Theodosio  o   Grande  ,    em  8. 
Historia    da    Virtuosa  Portugueza  ,    em    8. 
Historia  da   virtuosa   ,   e  infeliz   Clara   Har- 

iowe  ,   por  Richardson  ,    em  8.  6   Vol. 
Historia   galante  do  Joven    Siciliano  ,  em  8. 

Historia    de   Carlos   XII.,    Rei  de    Suécia, 

em    8.    2.    Vol.    1807. 
Historia    de    Mafoma  ,    em    3.    1808. 
Irma  ,  ou  as  Desgraças  de  numa  joven  Orfa  # 

Historia  indiana,  em  8.  4  Vol.  iík>4« 


í-içdes  da  Natureza,  em  12.   iSoj. 

Livro   dos  Meninos  ,  traduzido  ào  Francês, 8» 
Laura   de  Anfrifo  ,  em  8. 
Ajulher   feliz  ,   dependente  èo  mundo  ,  e  da 
fortuna  ,   em  S.  3  Vol.  1807. 

Mil   e  íiuma  Noites  ,    Contos  AraMcos 
duzidos   em  vulgar  ,   em    12.    8  Vol. 

Mil  e   hum  quarto  d'hora,    Historias  da  Tar- 
taria  ,   em  12.   $  Vol.    1806. 

MedícinaDomesticadeBuchan,  em  8.10V. 

Misce lia nea  curiosa,  e  proveitosa,  em  8.  7  Vol. 

Noites    Romanas  no  Sepulehro  dos  Scipiões, 

l    em    8.    2    Vol.    1808. 

Noites  dToung  ,  Tradúcçaô"  de  Vicente  Car- 
los d'01iveira  ,   em  8.    2   Voi. 

Noites    Clementinas  ,  em  8. 

Naufrágio  de  Sepúlveda,  Poema  de  Jeronym© 
Corte-Real  ,   em  8. 

Noticia   da   Mythologia  ,    ou  Historia  do  pa- 
ganismo ,  em  8. 

Numa  Pompilio,por  Mr.Florian,  em  12,  2  V. 

Origem  ,  e  Orthograíia  da  Língua  Portugue- 
za  ,   em  S. 

Oíiicio  da  Semana  Santa  ,   em  12. 

Obras  escolhidas  de  Garaccioli  ,  em  8.  9  Vol. 

Obras   de   Sá  de   Miranda  »   em   8.  2  Vol. 

Obras  Poéticas  de  Valadares  ,  em  8.  2  vol. 

Panegyricos  ,  e  Discursos  Evangélicos  ,  4.  vol. 

Paulo,    e    Virginia  ,    em    12.    1806. 

D.  Quixote,  traduzido  em  Portuguez,  em  8. 
6  Vol. 

.  2  vol.  1  806*. 


Rimas  de  Manoel  Mathias,  em 

Reflexões  sobre  a  vaidade  dos  Homens,  em  S. 

Secretario     Portuguez    ,     aug-mèntado     com 


dois  Supplemuntos    8.    grande.    1801 


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Sciencia  dos  Costumes  ,   ou  Filosofia  morai» 
em    8.    1788. 

Syntaxe  Latina  ,  explicada  segundo  o  moder- 
no systema   filosof.    8. 

Tratado    completo   de    Anatomia  ,   por    Mr. 
Sabatier.   Em  8.     6   vol. 

Tratado  das  doenças  Cirúrgicas,  em  S.  $  vol. 

Tratado   das   Aguas    das    Cal  dais.    8. 

Tratado   das   Obrigações    da    Vida    Çhristã , 
em  8.  2  vol. 

Thesouro  de  Pregadores  por  Fr.   António  de 
Pádua   e   Bellas  ,  em  8.  2   vol. 

Theatro   Estrangeiro  ,  em  8.  6  Num. 

Viajante  Universal  ,   ou   Noticia    do  Mundo 
antigo  ,  e  moderno  ,   em  8.    45    Vol. 

Viagens   de    Antenor    pela    Grécia,   e   Ásia, 
em  8.    6  Vol. 

Vida    privada  ,    e    publica  de  Luiz  XVI.  Rei 
de    França  ,    em    8.    2    Vol. 

Vade    mecttra    do    Medico  ,    ou  Breve  Resu- 
mo   de  Medicina    Pratica  ,    em   8. 

Vida  de  D.Joac5  de  Castro,  por  Jacintho  Frei- 
de  de   Andrada  :  com  estampas  ,    1786. 

Victor,    ou    o    Menino    da    Selva,   em    12. 
2    Vol.    1807. 

Verdadeiros    Interesses   da  Pátria  ,  em  3. 


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