À Vit : a md o Mo S à GE n ú nx Sorittts Sabantes —- o Le Museu Nacional do Rio de Janeiro, plus connu U Etranger sous la denomina- tion de Musée Impérial de Rio, rient de» receroir, grace a la protection particulicre» qu il doit a Sa “Magzeste U Emperewr du “Brésil, une» nouvelle organisation qui lui permettra de reunir, dans ses nouvelles galeries, des collections representant les richesses prodiguees par la nature a E Zimerique meridionale CG est dapres ce» nouveau reglement ques le» Museu Nacional a ourert cette» annee des cours publics dans son ampbhitheatre» et qua ete fondee> sa Revuer — Archivos do Museu Nacional — «ont le» premier numero vient de paraitres, ct qui, par la suite», doit publier- des renseignements sur les collections les plus importantes de» cet ctablissement, tout en en mentionnant les duplicata destines aux echanges. Dans ses rapports avec le» monde» savant, ley Muscum bresilien veut être, pour les naturalistes et les vovageurs quamene» au Brésil un but scientifique quelconque», une continuation de: la Patrie, une cspece» de» consulat Dospitulier ou il leur sera facile» d obtenirm des recommandations et même des mopens pour visite” Vintericur du pays afin dv faire» aisement leurs recherches. Jbena ete plus ou moins ainsi poor MM. Hart, Gorceix, Jobert, Reiss, Stubel, Van Beneden, Van Volxen, et autres savants explorateurs dans ces trois dernitres annees, ct pourtant te» Museu Nacional narai! pas alors les movens officiels nt les ressources qu il possede actuellement, Une» partie» des fonds de» Vetablissement, etant destincee» a Vachat de» livres et surtout de collections d" Histoire» Naturelle, tout catalogue» ou annonce> de» vente» de ces objets v sera recu arec empressement, fa direction du Museu Nacional, pour eviter les irregularites ou les abus, previent que tout individu dont les nom ne> se troure pas inscrit au tableau du personnel de Leta- Dlissement. publie dans le» premicr numero des Archivos, ipso facto n en fait point partie. Toute» la correspondance> pour le» Museu Nacional devra ctre» adressec a M. Lamistão Nerro, directeur-gênéral bi MUSEU NACIONAL Los RIO DE JANEIRO = fe “q EO E > E Es ARCHIVOM MUSEU NACIONAL RIO DE JANEIRO Nunquam alind natura, alind sapientia Jo 14, 3] In silvis academi queerere ver Quamquam Socraticis madet sei HH VOLUME I RL ias JAM EIRO IMPRENSA INDUSTRIAL 142—RUA SETE DE SETEMBRO—1 4% 1876 e A x RCHIVOS DO MUSEU NACIONAL EE rr 78 ENSA INDUSTRIAL “ a PR qe 5 “ut si mn MENBROS CORRASPONDENTES DO MUSEU NAGIONAL Agardh (G. II.) Hartt (Carlos F.) Baillon (Henrique). Hooker (José Dalton). Barboza du Bocage. (J. V.) Jobert (Camillo). Beaurepaire Rohan (Henrique de) Latino Coelho (J. M.) Beneden (Ed. Van). Moll (Hugo von). Bentham (Jorge). Morven (Ed.) Bom Retiro (Visconde do) Naudin (Carlos) Braun (Alexandre). Parbitores PRE Bureau (Eduardo). Philippi (R. A.) e: º) Candolle (Affonso de). Coelho d'Almeida (Thomas J.) Darwin (Carlos). Pringsheim (N.) Quatrefages (A. de) Radikofer L. Regnell (Andre). Reichenbach (L.H. 6.) Reichardt (MH. W.) Tulasne (L. R.) Decaisne (José). Delpino (F.) Duchartre (Pedro). Eichler (A. W.) Exner (Mauricio ). Fenzl (Ed.) Warming (Eugenio). Ferreira Penna (D.S.) Wiesner (J.) Fries (Elias). Wiener (6.) Glaziou (A. F.) Wirchow. Gorceix (Henrique). Zimmerman Gollheim. - . bege E e a e ME E aro já 31 — IMPRENSA INDUSTRIAL, pio a E a Dido ê pur o = . - "é dd ade , - o “ur € e x 4 Tha x o A aa e á 1 RA ' o a» : x á d - " . o o | os sa: se gia e um * a ; 4 “ “ EN E | o ; E LÁ o e E. | R t “4 As h ” t a o b ay E . » a Ta . eu q ' “ Y “> 1 » A a E 7) i 1] " " is p fe. A . o v x , . 2 E, má H +. sa ” nus i R a bad ” E: ad v +. e e M ç! e + + A lá Ru Pótas Ea A ' = sá MENBROS CORRESPONDENTES DO MUSEU NAGIONAL Agardh (G. 1H.) Baillon (Henrique). Barboza du Bocage. (J. V.) Beaurepaire Rohan (Henrique de) Beneden (Ed. Van). Bentham (Jorge). Bom Retiro (Visconde do) Braun (Alexandre). Bureau (Eduardo). Candolle (Affonso de). Coelho d'Almeida (Thomas J.) Darwin (Carlos). Decaisne (José). Delpino (F.) Duchartre (Pedro). Kichler (A. W.) Exner (Maurício). Fenzl (Ed.) Ferreira Penna (D. S.) Fries (Elias). Glaziou (A. F.) Gorceix (Henrique). Hartt (Carlos F.) Hooker (José Dalton). Jobert (Camillo). Latino Coelho (J. M.) Moll (Hugo von). Morven (Ed.) Naudin (Carlos). Parlatore (Ph.) Chilippi (R. A.) Pringsheim (N.) Quatrefages (A. de) Radikofer L. Regnell (André). Reichenbach (LM. 6.) Reichardt (H. W.) Tulasne (L. R.) Warming | Eugenio). Wiesner (J.) Wiener (C.) Wirchow. Zimmerman Gollheim. COMMISSÃO DE REDACÇÃO —— osiqico-— Ladislau “Netto Carlos FF Hart O T. de Saules Junior unha do pessoal Museu Nacional do Rio de Janeiro De conformidade com o novo regulamento a que se refere o Decreto n. 616 de 9 de Fevereiro de 1876. DIRECTOR GÉRAL Dr. Ladislau de Souza Mello e Netto. SECRETARIO Dr. João Joaquim Pizarro. BIBLIOTHECARIO Manoel da Motta Teixeira. AMANUENSE João da Motta Teixeira. PRIMEIRA SECÇÃO ANTHROPOLOGIA, ZOOLOGIA GERAL E APPLICADA E PALEONTOLOGIA DIRECTOR Dr. João Joaquim Pizarro. SUB-DIRECTOR Dr. João Baptista de Lacerda Filho. PRATICANTES Manoel da Motta Teixeira. Daniel d'Oliveira Barros d'Almeida. PREPARADOR Eduardo Teixeira de Siqueira. SEGUNDA SECÇÃO BOTANICA GERAL E APPLICADA E PALEONTOLOGIA EGETAL DIRECTOR Dr. Ladislau de Souza Mello e Netto. SUB-DIRECTOR Dr. Nicolau Joaquim Moreira. PRATICANTES Joao da Motta Teixeira. Lourenço José Ribeiro da Cruz Rangel. PREPARADOR Vicente Alves Ribeiro. TERCEIRA SECÇÃO SCIENCIAS PIYSICAS: MINERALOGIA, GEOLOGIA E “ PALEONTOLOGIA GERAL DIRECTOR Professor Carlos Frederico Hartt. SUB-DIRECTOR Dr. Carlos Luiz de Saules Junior. PRATICANTES Antonio de Souza Mello e Netto. Antonio Teixeira da Rocha. PREPARADOR Carlos Leopoldo Cesar Burlamaqui. NATURALISTAS VIAJANTES Dr. Frederico Miller. Domingos Soares Ferreira Penna. Carlos Schreiner. Dr. Eduardo Schwak. PORTEIRO Carlos Leopoldo Cesar Burlamaqui. CONTINUO João Goncalves Pereira Garcia. Decreto n. 0116 de 9 de Fevereiro de 197) Usando da autorização a que se refere o art. 20 da Lei n. 2640 de 22 de Setembro do anno proximo findo, Hei por bem Reorganizar o MUSEU NACIONAL nos termos do Requla- mento, que com este bwixa, assignado por Thomaz José Coelho de Almeida, do Meu Conselho, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, que assim o tenha entendido e faca executar. Palacio do Rio de Janeiro em nove de Fevereiro de mil oitocentos setenta e seis, quinquagesimo quinto da Independencia e do Imperio. Com a rubrica “de Sua Magestade o Imperador. homa; Jos Godlho de elmeda. REGULAMENTO A QUE SE REFERE O DECRETO N. bio CAPITULO 1 DO MUSEU NACIONAL, SEUS FINS E ORGANIZAÇÃO Art. 1º — O Museu Nacional é destinado ao estudo da Historia Natural, particularmente da do Brazil, e ao ensino das: sciencias physicas e natu- raes, sobretudo em suas applicações á agricultura, industria e artes, Para esse effeito colligirá e conservará sob sua guarda, devidamente classificados, os preductos nafuraes e industriaes que interessem aquelle fim. ArrT. 2º— Dividir-se-ha em tres secções : 12 De anthropologia, zoologia geral e applicada, anatomia comparada e paleontologia animal; 2: De botanica geral e applicada, e paleontologia vegetal; 3º De sciencias physicas : mineralogia, geologia e paleontologia geral. Arr. 3º — Emquanto se não realizar a creacão de estabelecimento especial para o estudo de archeolo- gia, ethnographia e numismatica, constituirão estas materias uma secção annexa ao Museu Nacional. Ant. 4º — A direcção e fiscalisação de todos os ramos do servico serão exercidas pelo Director Geral com o concurso de um Conselho Director, na fórma adiante estabelecida. Arr. 5º — Além do Director Geral haverá tres Directores de seccão e outros tantos Sub-Directores, um Secretario, um Amanuense, um Bibliothecario, um Porteiro, um Continuo, seis Praticantes, tres Preparadores, e naturalistas viajantes cujo numero será fixado pelo Ministro da Agricultura, Commercio e Obras Publicas sobre proposta do Director Geral, De igualsmodo será marcado o numero dos serven- tes. CAPITULO 1 DA ADMINISTRAÇÃO Arr. 6º — Ao Director Geral compete ; lo Presidir e dirigir as reuniões do Conselho Di- reetor tendo voto de qualidade em suas deliberações ; 2º Convocar extraordinariamente o mesmo Con- selho quando convier à bôa marcha do estabeleci- mento ; 3º Nomear os naturalistas viajantes ou auxiliares externos ; 1 4º Propôr pessôas idoneas para os cargos que tenham de ser providos por portaria do Ministro ; designar, no começo de cada anno, o Director de secção ou 0 Sub-Director que deva desempenhar as funeções de Secretario, os Praticantes que tenham de accumular as de Amanuense e Bibliothecario, e o Preparador quê deva servir como Porteiro ; 5º Nomear os serventes, e designar aos Pratican- tes e Preparadores as secções em que tenham de servir ; 6º Representar ao Ministro sobre as providencias que julgar convenientes ao estabelecimento ; promo- ver relações entre o Museu e analogos estabeleci- mentos nacionaes e estrangeiros; assignar toda a correspondencia expedida em seu nome ou no do Conselho Director, e abrir, encerrar e rubricar os livros da administração ; 7 Submetter ao Ministro, até o ultimo dia de Fe- vereiro, uma exposição do movimento administra- tivo e scientífico do anno antecedente, na qual poderá indicar as necessidades a que convenha at- tender e propôr qualquer providencia a bem do progresso do estabelecimento ; 8º Dirigir a secção, provisoriamente annexa ao Museu Nacional, de que trata o art. 3º, e Dem assim qualquer outra para que seja designado por portaria do Ministro . ArT.7º — Ao Conselho Director, que se comporá dos Dire tores de secção e Sub-Directores, e reunir- se-ha ordinariamente no primeiro dia util de cada mez, compete : 1º Deliberar sobre as questões em que fôr con- sultado pelo Director geral, indicar as providencias que julgar convenientes á administração do Museu e promover seu desenvolvimento ; 2º Organizar o programma dos cursos publicos e o regimento interno do estabelecimento, que ficam dependentes, para sua execução, da approvação do Ministro , 3º Designar annualmente a commissão incum- bida da redacção e publicação do Archivo do Museu Nacional ; o 4º Submetter á approvação do Ministro as ins- trueções que devam regular a fórma e prazos da inseripção e do concurso para preenchimento das vagas que occorrerem ; a natureza das provas e pro- cesso de seu julgamento, designando, sempre que tiver de ser preenchida por esse meio alguma va- ga, os examinadores que devam ser escolhidos d'entre o pessoal do mesmo Conselho ; ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 5º Conferir o titulo de Membro correspondente do Museu aos nacionaes e estrangeiros que se tornarem dignos desta distineção por seu reconhecido merito liticrario esclentífico, e servicos prestados ao esta- belecimento : 6º Velar pela execução do presente Regulamento e pela regularidade de todos os ramos do servico, Arr. 8º — Aos Directores de sec cão compe te: 1º Classificar, segundo as regras seientíficas, Os objectos que estiverem sob a guarda da secção, Or- ganizando o respectivo € atalogo, com declaração do estado em que se acharem e “indicação dos que fo- rem precisos para € omplet ar as colleccões; 2º Leccionar as materias da secção, de conformi- dade com o programma adoptado; 3º Submetter ao Director Geral, até o fim de Ja- neiro, à exposicão dos trabalhos realizados durante o anno antecedente, na qual poderá indicar as pro- videncias que entender acertadas ; 4º Cumprir e fazer cumprir as instrucções que, para o desempenho do serviço a cargo da secção, lhes forem dadas pelo Director Geral. Art. 9º — Aos Sub-Directores compete : 1º Substituir os Directores em suas faltas ou impedimentos ; 2º Ausxilial-os em todas as funecões; 3º Dirigir os Praticantes e Preparadores nos tra- balhos que lhes forem distribuidos ; 4º Reger as cadeiras das seccões para as quaes forem designados pelo Conselho Director. Arr. 10. — Ao Secretario compete: 1º Redigir e fazer expedir a correspondencia, es- cripturar os livros da administração, lavrar e subs- crever as actas do Conselho Director ; 2º Conservar sob sua guarda, devidamente ar- chivados, todos os papeis e documentos relativos ao servico do estabelecimento. Arr. 11. — O Amanuense será o auxiliar do Secretario em todas as suas funções. Arr 12. — Ao Bibliothecario compete a gaarda e conservação da bibliotheca, de acecórdo com as prescripções do Regimento interno e as instrueções do Director Geral. Art. 13. — Os Praticantes e Preparadores em- pregar-se-hão nos servicos que lhe forem indica- dos. Anrr. 14. — Os naturalistas viajantes, auxiliares externos do Museu, prestarão os servicos de que forem incumbidos pelo Director Geral, Art. 15. — Ao Porteiro compete abrir e fechar as portas do edificio, velar pela seguranca e asseio deste e de suas de pendencias, expedir” a corres- pondencia e cumprir todas as ordens do Director Geral, de secção CAPITULO HI DOS CURSOS PUBLICOS Art. 16 — Oensino scientífico, a que é destinado o Museu Nacional, será dado em cursos publicos e gratuitos por meio de prelecções, que serão feitas pelos Directores de secção e Sub-Directores. Estas prelecções, que se effectuarão á noite nos salões do edifício, começarão a 1 de Marco e ter- minarão a 31 de Outubro. Cada materia será professada em uma licão se- manal, pelo menos. MH O objecto de cada prelecção será annunciado no Diario Oficial, Anr. 17 — As materias do ensino serão distri- buidas em cadeiras, para as quaes o Conselho Di- rector designará annualmente os Directores de sec- cão e Sub-Directores. Anr. 18. — O regimento interno providenciará ácerca das relações ar os Professores e ouvintes, e dos meios de manter a ordem nos cursos publicos do Museu Nacional. CAPITULO 1Y DAS PUBLICAÇÕES ArrT. 19. — O Museu Nacional publicará trimen- salmente, pelo menos, um revista intitulada; Ar- chico do Museu Nacional. Nessa revista dar-se-ha conta de todas as inves- tigações e trabalhos realizados no estabelecimento, das noticias nacionaes ou estrangeiras que interes- sarem ás sciencias de que se oceupa o Museu, do catalogo das colleccões mais import: pote s, dos do- nativos feitos ao estabelecimento, e dos nomes das pas, a quém seja conferido o titulo de que trata o art. 7º 8 5º. Sad publicados de preferencia os trabalhos ori- ginaes do pessoal docente. Arr. 20 — A commissão encarregada da redac- ção e publicação do Archivo do Museu Nacional compor-se-ha do Director Geral, um Director de seccão e um Sub-Director. O orcamento da despeza será, porém, organizado pelo Conselho Director, em cada anno, e submet- tido á approvação do Miinistrd: Arr. 21 — Será remettida gratuitamente a re- vista ás bibliothecas e estabelecimentos scientificos e litterarios do Imperio, fundados pelos poderes pu- blicos ou por iniciativa particular, e bem assim às bibliothecas e estabelecimentos estrangeiros com os quaes mantenha o Museu relações ou convenha estabelecel-as. Igual remessa poderá ser feita ás redacções dos periodicos e revistas, nacionaes e estrangeiros. ArT 22 — O Director Geral poderá communicar aos periodicos, nacionaes ou estrangeiros, o resul- tado de quaesquer investigações ou outro facto digno de publicidade. Poderá tambem autorizar, não havendo inconve- niente, a publicação gratuita, em qualquer jornal, das actas das sessões do Conselho Director. CAPITULO V SUBSTITUIÇÕES, APOSENTAÇÕES E VENCIMENTOS, LI- PENAS. DAS NOMEAÇÕES, CENÇAS, Arr. 23. — O Director Geral, Directores de secção e Sub-Directores serão nomeados por Decreto ; os Praticantes e Preparadores por Portarias do Mi- nistro, e os demais empregados pelo Director Geral, na fórma já estabelecida. Art. 24.—0s Directores de secção e Sub-Directores serão nomeados mediante concurso,no qual poderão inscrever-se os que, a juizo do Conselho Director, reunirem os seguintes requisitos : lo Qualidade de cidadão brazileiro ; 2º Maioridade legal; 3º Moralidade ; 4º Capacidade profissional. XO Art. 25. —Os praticantes serão igualmente no- meados, mediante concurso, para cuja inseripção devem os candidatos provar, a juizo do Conselho Director: 1º Qualidade de cidadão brazileiro ; 2º Maioridade de 18 annos ; 3º Moralidade ; 4º Habilitação em exame publico nas seguintes materias : linguas nacional, latina e franceza ; seographia, arithmetica e geometria. Art. 26.— Poderão ser dispensados do concurso para o preenchimento de qualquer vaga os que provarem ter professado com distincção em Uni- versidade, Faculdade, ou Escola, nacional ou estran- geira, as materias sobre que versarem as provas. Art. 27.— O Director Geral participará immedia- mente ao Ministro a existencia de qualquer vaga, para que este delibere si deve effectuar-se 0 con- curso, ou a nomeação nos termos do artigo antecedente, ou contractar-se pessoa habilitada, a juizo do Conselho Director, nacional ou estrangeira. Art. 23.—Em igualdade de circumstancias com os demais concurrentes, devem os Directores de secção ser nomeados dentre os Sub-Directores e estes dentre os Praticantes. Art. 292.— O Director geral será substituido em suas faltas ou impedimentos por um dos Directores de seccão, designado em portaria do Ministro. Art. 30 —Os empregados do Museu perceberão os vencimentos marcados na tabella annexa ao presente Regulamento. Art. 31. — Serão observadas, em relação aos em- pregados do Museu, na parte em que lhes forem applicaveis, as disposições dos arts. 27 a 39 do Regulamento approvado pelo decreto nº 5512 de 31 de Dezembro de 1875. Sómente os empregados nomeados por decreto ou portaria do Ministro terão direito á aposentação. Art 32.-— Tambem serão observadas, na parte em que forem applicaveis, as disposições dos arts. dd a 46 do citado Decreto. As penas disciplinares serão impostas pelo Director Geral, e, salvo a de suspensão, pelos Directores de seccão. Cabe recurso voluntario, para o Ministro, da sus- pensão imposta pelo Director Geral, e, para 0 Conselho Director, das penas applicadas pelos Directores de secção. DISPOSIÇÕES GERAES. Art. 33. — Sobre representação do Conselho Di- rector poderá o Ministro elevar até o duplo o numero dos Sub-Directores e dos Preparadores, quando o desenvolvimento do ensino ou as necessidades do servico o exigirem. Art. 34.— Será franqueada ás pessoas decente- mente vestidas a visita do estabelecimento nos dias e horas designados pelo regimento interno. Aos membros correspondentes do Museu Nacional e ás pessoas que para esse fim obtiverem cartão especial de entrada, que poderá ser-lhes concedido pelo Director Geral, será permittida a visita em qualquer dia e hora, com tanto que dahi não resulte Inconveniente do servico. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Art. 35. — O regimento interno providenciará a bem da ordem e policia do estabelecimento e meios de fazel-as respeitar. Art. 36. Os nomes das pessôas que fizerem dona- tivos de importancia ao Museu Nacional a juizo do Conselho Director, serão escriptos de modo visivel junto aos objectos doados, e em livro especial com declaração do serviço prestado. Art. 37. — Sobre proposta do Conselho Director poderá o Ministro nomear por portaria pessõas competentes que, como titulo de Coadjuvantes do Museu Nacional, se encarreguem, nas provincias em que residirem, de obter informações que pareçam uteis; colligir productos ; chamar a attenção para a necessidade de qualquer investigação, e corres- ponder-se com o Director Geral sobre tudo quanto disser respeito ao progresso do estabelecimento. Art. 38.— Nenhuma despeza será autorizada pelo Director Geral sem approvação prévia do Ministro. Art. 39.— A disposição do art. 30 e a da ultima parte do art. 31 ficam dependentes de approvação do Poder Legislativo. Poderão, porém, ser pagos, desde já, os vencimentos da tabella annexa ao presente Regulamento, uma vez que a despeza com o Museu Nacional não exceda a verba que lhe é consignada nas leis do orçamento, Art. 40.— Ficam revogados o Regulamento que baixou com o Decreto n. 123 de 3 de Fevereiro de 1842 e as demais disposições em contrario. Palacio do Rio de Janeiro em 9 de Fevereiro de 1876. — Thomaz José Coelho de Almeida. Tabela, a que se refere o art. 30 do Regulamento approvado pelo Decreto nº 6116 desta data, dos vencimentos dos empregados do Museu Nacional. O | | | qa de de a q mo * Smithsorian Contribution vol. II, 179 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 03 ESTAMPAS VI] Nesta estampa cada objecto é visto de um lado e pela testa, e como na estampa Nº VII todas as figuras são de um terço do tamanho natural. | Fig. 1. — Machado de gneiss, da vizinhança do morro de Diogo Velho, prov. de Minas. Fig. 2. — Machado de pedra de cal, Alto Tocantins. Fig. 3. — Machado de gneiss, Minas-freraes. Fig. 4. — Machado de quarizito, Terra dos Maués, Amazonas, Cr Fig. 5. — Machado de gneiss, Piauhy. Fis. 6. — Machado de diorito, S. Pedro de Alcantara, prov. do Parana. Fig. 7. — Machado de gneiss, Amazonas. Fig. 8. — Machado de pedra feldspatho-hornblendica, sem procedencia. Fis. 9. — Machado de diorito, sem procedencia. Fig. 10. — Machado de syenito, sem procedencia. Fig. 11. — Machado de diorito, colonia Blumenau, prov. de Santa Catharina. Fig. 12. — Machado de diorito, sem procedencia, Neste artigo, impresso na ausencia do autor, o seguinie paragrapho foi acci- dentalmente omittido. As figuras 9 das estampas VIT e Vil representam uma bella e bem conser- vada amostra muito semelhante à fig. 7; a face, porém, é mais curva e as bar- bas mais fortemente inclinadas para traz. O corpo é muito fino e o gume extrema- mente agudo, como se vê na fig. 9 na estampa VIII, tornando-se assim a arma muito eflicaz. O punho se adelgaça um pouco para a testa. As outras particulari- dades estão sufficientemente indicadas pelas figuras. A substancia é diorito. Não ha nota sobre à procedencia do especimen, cujas dimensões são ; comprimento, . 120”; largura, . 142”; grossura do punho, . 090”, .s CONTRIBUIÇÕES para o estudo anthropologico das raças indigenas do Brazil PELOS DOUTORES LACERDA FILHO E RODRIGUES PEIXOTO PROLOGO Havera, quando muito, um seculo, que à anthropologia, a mais nova de todas as sciencias, começou a offerecer um campo immenso às investigações dos sabios; já então Blumenbach tinha accumulado um grande material, tirado à craniologia, para estabelecer a distincção das raças humanas, e Buffon, lançando as bases da historia natural do homem, havia creado a ethnographia ou descripção dos povos. Seguindo o caminho traçado por esses dois representantes da sciencia no seculo passado, Retzius, Morton, Prichard, Wagner, concorreram, cada um por sua parte, para augmentar os dominios da anthropologia, cujos horisontes foram se dilatando à medida que as sciencias, suas auxiliares, iam fazendo novos progressos. Todo esse immenso material accumulado à custa de Jaboriosas investigações, durante quasi um seculo, veio servir de base aos modernissimos estudos de Broca, Pruner-Bey, Quatrefages, Wirchow, Topinard e outros, cujos trabalhos mais practicos, e cujas vistas mais largas tendem hoje a dar uma nova face à sciencia anthropologica. Quando se considera o impulso immenso imprimido nestes ultimos annos aos estudos de anthropologia, graças ao labor infatigavel desses sabios, e se vê o valioso auxilio que está prestando essa sciencia à resolução de muitos problemas ethnologicos, não se póde deixar de lastimar que no Brazil taes estudos não tenham ainda encontrado fervorosos adeptos entre os homens scientificos, quando é sabido que muitas questões importantes attinentes aos caracteres elhnicos, linguisticos e archeologicos das raças indigenas do Brazil não puderam ainda ser elucidadas por falta de bons elementos. Voz. I—10 48 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Entretanto no norte e no extremo sul do novo continente esses estudos estão ja adiantados; a notavel colleeção de crancos de Morton em Philadelphia passou até bem pouco tempo como a mais rica € à mais importante do mundo; e quando alli os successores daquelle celebre anthropologista, continuando à obra por elle encetada, vão accumulando todos os dias novos materiaes para o estudo das raças americanas, no sul as recentes investigações de Moreno sobre os craneos da Patagonia promettem resultados de subido valor para a elhnologia desta parte da America. As indagações anthropologicas no norte e no sul do novo continente tendem, pois, a encontrar-se, o que falta é ligar por meio de sérias indagações sobre os caracteres das raças indigenas do Brazil, os dois extremos dessa extensa cadeia, € assentar sobre bases solidas toda a anthropologia americana. Na parte archeologica e linguistica sabemos que alguma cousa se tem feito entre nós que promette bons resultados; nada, porém, se tem emprehendido quanto aos caracteres physicos, tirados à anatômia, caracteres que occupam um logar proeminente nas questões ethnologicas. O trabalho que vamos submetter à apreciação do mundo scientifico é apenas uma contribuição para o estudo anthropologico das raças indigenas do Brazil; quizemos aproveitar da resumida colecção de crancos, que possue o Museu Nacional, esses poucos elementos que ahi estavam esquecidos e que bem aproveitados pódem constituir a base de estudos mais completos no futuro. Não poupámos esforços para imprimir o verdadeiro cunho scientifico ao nossso trabalho; as medidas craniometricas foram tomadas com extremo cuidado e verificadas repetidas vezes afim de excluir toda a causa de erro. Fazemos preceder à descripção dos craneos algumas considerações geraes sobre os Botocudos, cujos caracteres physicos exteriores, lLirados à descripção de alguns autores, devem constituir uma parte complementar dos nossos estudos anatomicos. As principaes medidas craniometricas vão resumidas no fim em pequenos quadros para facilitar o seu estudo comparativo. Quanto à terminologia e processos craniometricos, de que nos servimos, são todos da escola do sr. Broca, e de industria os preferimos por nos parecerem os mais completos e os mais exactos. Os crancos por nós descriptos acham-se representados de frente, de perfil, segundo a norma verticalis de Blumenbach e segundo o foramen magnum nas heliogravuras que acompanham este trabalho, e que são a reproducção fiel do original reduzido a 1/4. Para que as nossas investigações osteometricas não ficassem incompletas, descre- vemos tambem a bacia do homem e da mulher, pertencentes a dois esqueletos de Boto- cudos, cujos craneos estão aqui representados, assim como os ossos longos dos membros pelvianos e Lhoraxicos, unicos dos quaes se póde tirar alguns caracteres anthropologicos. Duas heliogravuras que acompanham este trabalho dão uma idéa exacta das duas bacias, que descrevemos. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 49 Os T3otocudos Os craneos, cuja descripção e medidas constituem a parte principal deste trabalho, pertencem à individuos da grande familia dos Botocudos, cujas tribus numerosas estanciam ainda hoje no interior das florestas virgens, que acompanham as margens do rio Doce e do Mucury. Alguns, de indole bravia e indomaveis, têm resistido a todos os meios de catechese, e fugindo diante da civilisação internam-se cada vez mais no coração das florestas; outros, mais doceis e mais accessiveis, vão se deixando conduzir ao gremio da religião christá e abandonando, pouco e pouco, os habitos e costumes da vida selvagem. São estes ultimos que formam os diversos aldeamentos que se encontram no norte da provincia de Minas, onde elles obedecem à voz de um chefe ou de um missionario. São elles geralmente indolentes, pouco amigos do trabalho, de um caracter excessivamente desconfiado, vingativos, e sustentam-se, uns com 03 productos da caça, outros com os productos da pesca. A denominação de Botozudos, que é aquella pela qual são mais geralmente conhecidos no Brazil 03 selvagens de tribus differentes, tem a sua origem no uso de um botoque, que elles trazem atravessado nas orelhas e no labio inferior. À sua estatura não é muito elevada; alguns vio o professor Hartt que tinham 5 pés e 10 pollegadas de altura. São, em geral, espadaudos e corpulentos, mas tem as pernas e os braços delgados, as pernas prin ipalmente cuja curteza é notavel, comparadas com as do negro e do branco. Já Von Tschudi e Agassiz tinham notado esse contraste entre as fórmas massudas do tronco do Indio e a delgadeza dos seus membros inferiores. Melhor que Serres ninguem ainda descreveu o habito externo do Botocudo. Elle examinou alguns specimens levados para França por Porte, e os resultados desse exame foram publicados no Comptes Rendus T. XVI pag. 7 e transeriptos como uma extensa nota na obra do professor Hartt — Geology and Physical Geography of Brazil, 1870. É desta ultima obra que extractâmos para aqui a descripção de Serres. « O thorax era bem conformado no homem, um tanto achatado adiante sem a especic de convexidade, que se vê ao nivel do grande peitoral nos homens da raça caucasica, desenvolvidos no mesmo grão, convexidade que era bem notavel nos Americanos loways, como ella é notavel nos homens mais fortes da raca caucasica. Em compensação elle parecia mais alongido no Botocudo, e mais largo do que costuma ser na região inferior. O thorax da mulher era posteriormente mais arqueado que o do homem, adiante elle inclinava-se para baixo de uma maneira tão sensivel, que me foi mister medil-o muitas vezes para ter certeza de que não havia exageração no desenho que delle fez o nosso distincto pintor do Museu Verner. Desta inclinação do peito resultava o abaixamento do seio, que fazia lembrar o das mulheres ethiopes e que 50 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL poderia tornar-se um caracter de grande importancia, se não houvesse alguma cousa de individual n'essa disposição. Como o do homem o thorax da mulher era mui largo inferiormente ; este alargamento parece-me ter a sua causa no abaixamento do figado, que eu reconheci pela percussão nos limites inferiores, limites que não attinge jámais este orgão, no seu estado natural, na mulher caucasica. Com este abaixamento do figado coincidia o abaixamento do umbigo e a este correspondia um descahimento do pubis, o que reconheci com dificuldade por causa da saliencia gordurosa do monte de Venus. O abaixamento do umbigo fazia proeminar o abdomen para baixo e para os lados e o do pubis produzia a inclinação da bacia para baixo e para traz, donde resultava a amplidão da região glutea, já menos desenvolvida do que na mulher caucasica. » Diz o professor Hartt que, em geral, as mulheres têm o abdomen muito volumoso, as mamas balófas e pendentes, e não raras têm as pernas arqueadas. A face é um tanto chata, os 03503 do rosto geralmente muito salientes, a boca sempre muito grande e os labios muito espessos. Serres diz que os cabellos dos Botocudos são negros, espessos, curtos, lisos e dispostos em semicirculo sobre a fronte. À barbã é muito rarefeita por- que elles arrancam-na geralmente e o mesmo fazem às sobrancelhas. Todos tem a fronte baixa como notaram Von Tschudi, Neuwied e Serres. Os crancos O primeiro craneo de Botocudo conhecido nà Europa foi levado do Brazil pelo principe de Neuwied e acha-se figurado nas Decades Craniorum de Blumenhach Est. 58 e no Crania Americana de Morton Est. 15. Vimos o desenho deste craneo no Atlas, que acompanha a obra do principe de Neuwied Reise nach Brasilien 1822 e na propria obra de Morton. Referindo-se a elle disse Blumenbach: «Si abstrahirdes por um momento do maxilar inferior, do intervallo das orbitas, da espinha nasal saliente e de outras parli- cularidades peculiares ao homem, o aspecto geral approxima-o mais do orangutango do que de qualquer outro craneo de nação barbara que se vê na minha collecção. » A julgar pelo desenho do principe de Neuwied, do qual os de Blumenbach e de Morton não são senão uma copia fiel, aquelle representando o craneo em posição obliqua e este de perfil parece que se não póde rejeitar as conclusões de Blumenhbach. Exami- nando-se a estampa do principe de Neuwied, vê-se que é um craneo pequeno, alto, com um notavel prognathismo do maxillar superior e com o maxillar inferior tão retrahido que um grande intervallo separa o bordo alveolar superior do bordo alveolar inferior. Ou conslitue essa disposição uma anomalia toda individual, que não póde servir de caracter a uma raça, ou, 0 que é mais provavel, o maxillar inferior que alli vemos representado não pertence a esse craneo. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 51 Para explicar tal anomalia nom mesmo se póde appellr para a compressão exer- cida pelo botoque, porquanto em outros crancos de Botocudos que usavam do botoquo não se nota essa singulur disposição da mandibula, que so vê no craneo descripto por Blumenbach. Demais nelio o maxillir tomado isoladamente é mui bim conformado, é quando a compressão exercida pelo botoque tivesse de produzir alguma di fyrmidide, essa consistiria na inclinação para dentro do bordo alveolar e não na reiracção egual de todo o maxillar. Seja como fôr, o exame feito posteriormente em outros crancos de Botocudos veio provar que as conclusões de Blumenbach não pódem ser applicadas à generalidade dos individuos dessa familia. Ha alguns annos o professor Hartt obteve em S. Matheus um cranso de Botocudo e enviou ao professor Jefírics Wymann de Cambridge, Massachusetts, afim ds estudal-o. Eis a nota de Jeffries Wymann ao prsfessor Hartt : « Pelo que se v3 no Thesaurus Craniorum do Dr. J. Barnard Davis, pag. 235, parece que sómente alguns craneos d? Botocudos tem sido descriptos; ao todo não excedem a 5 e desses apenas um fui medido, e isso mesmo de uma maneira imperfeita pelo Dr. Davis pois elle apenas possuia um molde em gesso e O original estava em Sto- ckolm. O specimen de S. Matheus é portanto uma valiosa addição às collecções já existentes. Pertence a um homem avançado em annos; as suturas saggital e Jambdoide acham-se consolidadas nos pontos em que ellas se tocam. As paredes reunida à fórma de tecto da lateraes do craneo são ver- abobada, da a todo o cra- ticaes e a abobada apresenta neo, quando olhado de fren- a fórma de tecto. O foramen te, uma fórma quasi pyra- magnum (buraco occipital) midal, comparada com outras tem quasi a mesma posição tribus barbaras em geral. O que na generalidade dos comprimento do craneo é de aborigenes americanos, sendo 910 millimetros, e a sua ca- o seu indice 40.6, em quanto pacidade 1,435 centimetros nestes à 40.9. A largura ou 84 pollegadas cubicas. O tomada nos ossos malares, comprimento do cranco sendo considerado como 100, sua largura é 72.8; é portanto dolicocephalo. Todo elle é massiço e pesado e na parte posterior especialmente muito espesso. « Ainda que um pouco menor este cranco, como se póde vêr no seguinte quadro, 52 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL » daquelle que foi descriptô pelo (4a approxima-se muito, quanto às suas proporçõe Dr. Davis no seu Thesaurus: CRANEOS CIRCUMF. | COMPRIM. | LARGURA | ALTURA mm So MAhQUS nt SE cio o SIN Nao ia 510 187 136 138 Coletando deDAvis.* rio sad 525 190.5 139.5 | Dita de Blamenhação ea qro re | rdias | Ro 25 PARAR RR | « Não é possivel ter uma idéa exacta da fórma do maxilar inferior no crane) de S. Matheus porque elle está um pouco quebrado. Os dentes já não existem e os alveolos estão quasi obliterados. Entretanto no que existe nada indica grande tamanho ou pro- jecção para diante. O cranco em sua totalidade póde ser comparado com vantagem aos craneos de outras tribus barbaras da America. Certamente nada se vê ahi que indique extrema degradação. » Em uma carta que acompanhava essa nota, dizia o professor Wymann : « E muito curioso vêr como são inteiramente diferentes o craneo de S. Matheus comparado com aquelle famoso craneo descripto e figurado por Blumenhach, o qual até aqui tem servido de base para tudo quanto se tem escripto sobre os craneos dos Botocudos. « Si existissem somente o vosso cranco de S. Matheus e o de Blumenbach, e elles cahissem em mãos differentes para serem descriptos, um dar-nos-hia o annel que liga o homem ao macaco, emquanto que o outro dar-nos-hia um selvagem americano altamente respeitavel. » Em fins de 1875 0 Museu Nacional do Rio de Janeiro, por intervenção de S.M. o Imperador, remetteu aos professores Wirchow em Berlim e Quatrefages em Paris, uma colleeção de craneos de Botocudos e dois esqueletos completos. A collecção de craneos indigenas, que possue actualmente o Museu do Rio de Janeiro é pequena e para enriqecel-a não seria talvez bastante o trabalho de alguns annos, pois não é cousa tão facil, como se pensa, obter um craneo de Botocudo. Para dar uma amostra dessa dificuldade referiremos o que a tal respeito nos com- municou o naturalista viajante do Museu Schwach, o qual em uma excursão na pro- vincia do Paraná, procurou por ordem do Museu obter alguns craneos de indios da tribu dos Caygois, que estão aldeados junto ao rio Paranapanema. Tendo-se entendido para esse fim com Fr. Thimoteo Castelnuovo, missionario nessa tribu, disse-lhe este que era cousa mui dificil obter um craneo naquellas para- gens, pois 03 indios guardavam com extremo cuidado os restos mortaes dos seus ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 53 companheiros. Entretanto, gracas aos esfurcos do missionario, um dos chefes dessa tribu depois de haver recebido as aguas do baptismo, prestou-se a acompanhar o mturalista é o missionario ao lugar em que estavam guardados os restos indianos. Depois de uma travessia de mais de 3 leguas por dentro da mata virgem, vencendo mil dificuldades no caminho, chegaram a um lugar sombrio e escuso, e ahi en“ontraram por baixo de umas palmeiras (Grconomas) cujas frondes formavam em cima a abobada da floresta, tres tumulos sobre um dos quaes estava collocada uma urna de barro. Foram dahi des- enterrados dois esqueletos, achands-se um delles muito estragado. É preciso, pois, lutar com as idéas supersticiosas dos indios de um lado, e com os escrupulos muitas vezes exagerados dos missionarios de outro, para se obter entre nós um craneo ou esqueleto de raca indigena. Os craneos de Botocudos que compõem actualmente à pequena collezção do Museu do Rio de Janeiro vieram, uns das margens do rio Doce, outros di caverna da Babylo- nia (Provincia de Minas). Os primeiros foram tirados de uma valla, onde poucos annos antes linham sido enterrados alguns individuos da tribu dos Potós, mortos em combate por um troço de soldados que faziam a guarnição militar desse lugar. Á bondade do sr. Dr. Ladislau Netto devemos as seguintes informações sobre a caverna da Babylonia, onde foram encontrados alguns craneos da nossa collerção e uma mumia que existe actualmente no Museu”. « Foi a caverna de Babylonia descoberta em [875 e formou-se pela decomposição parcial de algumas camadas de greiss no flanco N. E. da montanha, 309 metros acima da planicie. Observada devaixo na distancia de 3 à 4 kilômetros, dir-se-hia um buraco aberto em uma muralha gigantesca, inaccessivel ao homem. « Entretanto sem grande difficuldade consegue-se lá chegar, agarrando-se ás touceiras das Wriesea e das Gesneria, adherentes à rocha, e cujas flóres ornadas de córes vivas, contrastam com o aspecto sombrio da montanha e o azul do eso. Esta caverna tem 25 metros de profundidade e 15 de largura. Ella deve ter mais de 6 metros de altura no interior, porém como os fragmentos do tecto tem cahido e coberto o solo, a sua altura actual tem quando muito 4 metros. « Tal é à sepultura escolhida pelos Indios pertencentes provavelmente à tribu dos Coropós ou dos bravios Goytacazes, que repellidos do littoral pelos Portuguezes, ha dois seculos mais ou menos, se foram reunir aos antigos Coropós, dos quaes receberam alguns usos, como, por exemplo, o de raspar parte dos cabellos. « Perseguidos pelos europeus até o interior das florestas, procuravam elles naturalmente occultar nos logares mais inaccessiveis aos invasores o que possuiam de mais caro no mundo — seus mortos. Graças à extrema seccura da caverna, estes ! Estas informações são traduzidas litteralmente de uma nota em francez enviada pelo Dr. Netto ao sr. Quatrefages. 9! ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL conservaram-se com o aspecto de mumias, apezar de não haverem passado por processo algum de conservação. Existiam, é verdade, espalhados sobre os esqueletos, as sementes de uma laurinca odorifera, Cryptocarya moschata, mas estas sementes estavam ahi talvez mais para exprimir uma superstição do que como meio de conservação. « As crianças tinham sido mettidas dentro de potes de barro ou enfaixadas em folhas de Vriesea e de uma especie de Marantha; os adultos em suas rêdes. « Cada cova achava-se revestida de fragmentos de casca de uma Cecropra, talvez com o fim de preservar o cadaver do contacto da terra da caverna. Esta não é outra cousa mais do que gneiss decomposto, misturado com diversos fragmentos de ossos de morcegos e de pequenas sementes, que parecem ser de cucurbitaceas. « Sobre os esqueletos pertencentes quasi todos a mulheres muito novas e a crianças estavam collocadas varinhas dispostas em cruz e molhes de fibras de Vriesea com um nó no meio. » Como a caverna da Babylonia devem existir no Brazil muitas outras ainda não conhecidas e exploradas, que guardam os restos de tribus já extinctas ou que estão para extinguir-se. As celebres cavernas da Lagôa Santa em Minas, que forneceram ao infatigavel Dr. Lund a mais notavel collecção de fosseis americanos, que existe actualmente no Museu de Copenhague, não ficarão de certo unicas no seu genero, desde que homens verdadeiramente dedicados à sciencia quizerem imitar o exemplo de Lund. Nessas cavernas formadas pela decomposição da pedra calcarea, encontram-se esqueletos humanos já fossilisados de mistura com ossos de animaes pertencentes a especies já extinctas como o Platyoniz Buclklandi, Clamidotherium Humboldt, Dasypus sulcatus, Hydrocherus suledens, ete. Os ossos humanos ahi encontrados apresentavam-se em parte petrificados, em parte penetrados por particulas ferreas, o que dava a alguns delles um brilho metallico imitando o bronze e um peso extra- ordinario. Os esqueletos eram de tamanho ordinario ; havia, porém, dois de homem, que offereciam dimensões acima do vulgar. Bascado nos resultados de indagações feitas sobre a antiguidade dos grandes mamiferos terrestres, que representam hoje especies extinctas, Lund assignala para os ossos humanos encontrados na Lagôa Santa uma edade de 3,000 annos. Estudando os caracteres physicos dos craneos notou elle que a estreiteza da fronte, a proeminencia dos ossos zygomaticos, o angulo facial, a fórma da maxilla e da orbita, tudo levava a dar a esses crancos um logar entre os mais caracteristicos da raça americana. Relativamente à depressão da fronte, accrescenta Lund: neste particular não só os craneos antigos das cavernas da Lagôa Santa assemelham-se muito aos da raça americana, mas alguns delles offerecem este caracter em um grão exagerado até o desapparecimento total da fronte. São estes mesmos caracteres craniographicos que se vêm esculpidos em alguns monumentos antigos do Mexico e em outros pontos da America. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL So Um carater notavel nesse; craneos fosseis, e que muito chamou a aftencão de Lund, é uma conformação singular dos dentes incisivos, que em vez de terminarem por uma lamina cortante transversal, como é proprio dos dentes desta classe, apre:en- tam uma superlicie plana triturante, analoga à dos dentes molares ; interessanie phe- nomeno tambem encontrado nos antigos habitantes do Egypto. O Instituto Historico e Geographico Brazileiro possue um desses craneos humanos, “que foram encontrados por Lund nas cavernas da Lagõa “anta, e como julgamos muito importante o conhecimento desse specimen fossil, representante de uma raca prehi to- rica, daremos em seguida à descripção dos nosso: craneos de Botocudos, os seus cara- cleres descriptivos e craneometricos, acompaihados de uma heliogravura. cranco N.1 (Vib. A Esr. 1) — Pertence à serie dos que foram encentrados na caverna da Babylonia. E” um eraneo de individuo do sexo masculino, cuia idade na orcasião da morte não podia exceder a 4) annos. Tem as arcadas superciliares proeminentes, a glabella bem visivel, o inion rugoso e saliente; as arcadas zygo- maticas delgadas, a linha curva do oeripital muito apparente. Não offerece anomalia alguma, nem disfórmidade. Notam-se 32 alveolos dentarios, 19 em cada maxilla, ne- nhum delles se acha obliterado. No maxillar superior faltam todos os dentes, excepto o segundo grande molar esquerdo, e no inferior existem sómente dois grandes molares esquerdos e um grande molar direito Todas as suturas acham-se mais ou menos con- solidadas, e a sua denticulação é em geral complicada. A disposição do ptereon em B não é mais visivel. O plano do buraco ocripital prolongado vai passar junto à espinha nasal anterior. As fossas temporaes são um tanto deprimidas; a crista temporal pouco saliente e quasi horizontal. A fronte é baixa, e inclinada para traz. Na região occipital nota-se um achatamento sensivel, correspondente ao lambda e prolon- gando-se acima deste ponto na extensão de 4 1/2 centimetros. Para baixo do lambda o oceipital descreve uma curva mais ou menos regular, que vai até o bordo posterior do buraco occipital. Os 03595 malares são pequenos, elevados e projectam-se um pouco para fóra do seu angulo externo ; a chanfradura submalar é profunda; a raiz do nariz convexa e muito deprimida; as fossas caninas muito escavadas ; a espinha nasal sa- liente. As cavidades orbitarias são irregularmente quadrangulares; tendo 9 bordo inferior quasi horisontal e liso, e o bordo superior ligeiramente curvo e mais espesso junto à articulação do 0330 malar. À conformação total do craneo é pyramidal, ca arcada do maxillar inferior parabolica. O seu indice cephalico é 75.00; 0 seu indice nasal é 48.97; a sua capacidade é de 1420; o seu angulo facial de Cloquet é de 69º. MEDIDAS GRANEOMETRICGAS RD CANCRO DOStErionn a o BR (ode) registo crops age cias sopra Rara re 18 cent, = Nr . > CELAS VEESO CITAR II ORA ace pics ho sa Sar OPA o CoD RR STO RÉ 18,5 » AVE D EI CAS: ER O o A RD pa do NE Tr RR RR SRI 12,5 » 6, ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL é |Do ponto nasalao ophryon. . . .....cccucacc co. 1,6 cent. Z ÀDo ophryon ao bregma. +... .cccocscsass au... DL) E g Do bregma ao lambda . ie a ja cmi ol (nt on an cao do ado e oo e 11 » z “Do lambda 20*IM LON. dsfroR Ro Ro SR ct Doo = Po ROO RR 9 » S Do inion'a0 OpisibrondaR ERR ren e E o DD) Gircumferencia Mransvérsa A No eo o RR O 33 » Corda dessm CULVAS E Woo) UNS PR SNC RO OA e jo ET Bl 5) Circumferencia HOmSOntalso Eae) e Sono RA e PR 52 » pinhas sdomasion a suturatnasale 10,3 » Diameixo conta superior RR a VESRD) Ditogideta Minos => ame cu Doors o ara aê cajoiço ey to ONO eae RR RS o 93 » Dito occipital de um asterion'a outro . -. . cc L sado sc... TO 9» Dito bilempora masi. aa a aa eo 13,2 » Dio Jobs OVO ao a PS os DO o AE o a O Deo Sao aa É 12» Dipo za atos leon 5 Ao E o 6, 6 equi o Vo O pio Boa sono o DR 6 ai) Compunento simplesidamtace na E SE” 8,2 » Dito totalida faces END a e spo amis cd SRS PIaA (6 SME oa Rc SEN o sopas pc Fr lol» Diametrortransyerso da orbita”; 2 Ds RT a. MS Ditosveriicalidarorbria RE SR o o ce e 3 foro E MPR Protundidade-darorbitag so eo sen O qro Co Sarto Cao a 5 PS PS »D » Diamiêiro: biorbitario Ca SID BRR O GO A sb, A oo a E 10,3 » Era o are RIA o ada Moss O sds cs 24º » Distancia da sutura naso-frontal 4 espinha nasal. . . 2... cc... 49 » Interyallo orbitario degun dacryonta outro Poa) Comprimento dos ossos proprios do nariz; JE NE sd: 2) DiarieiroMbiquegls Sus Ch fenio og ol EO Taj of Ro) MSIE o, elo TE a RAR Topa qe 12,1 » Ditoibimalars. dia e A e SR a o AS ES SS RE 11,4 » Distancia transversa de um angulo do maxilar inferior a outro. ... 95 » Dita obliqua de um angulo do maxillar inferior ao ponto mentoniano . ... 95 » aAlturardo maxilar inferior na'symphise = dadas SR 3 D Ditviao mivel da apophyseicoronoide UR E 6,5. » memo texcede vinha vertical so ES. 6 mill. CRANEO N.2 (ViD. A Fsr. 1.) — Pertence a um esqueleto de mulher remet- tido para o Museu por ordem do presidente de Minas. FE” um craneo pequeno, bem conservado e sem anomalia nem disformidade alguma. A fronte é baixa e depri- mida, as bossas frontaes pouco apparentes ; as arcadas superciliares niveladas com a glabella ; o inion saliente e alongado lateralmente; o occiput achatado e vertical; as arcadas zygomaticas um tanto delgadas; os malares mais inclinados para fóra do que para diante; a depressão notavel das fossas caninas torna-os mui salientes. Veem-se no maxillar superior 12 alveolos persistentes e 3 obliterados, sendo que estes corres- pondem ao 2º e 3º molar esquerdo e ao 3º molar direito. O maxillar inferior apresenta 11 alveolos persistentes correspondentes aos incisivos, caninos, primeiros molares, ec 3º molar esquerdo; os outros alveolos são substituídos por um bordo cortante na maxilla. O facto da existencia de um só dente do sizo e o estado de integridade das suturas levam-nos a suppôr que o individuo a quem pertencia este craneo tinha na occasião da morte uma idade não superior a 25 annos, supposição que é corroborada pela situação do buraco dentario anterior mais approximado do bordo alveolar do que do bordo inferior da maxilla. As suturas intercoronaria, interparietal, assim como a da apophyse basilar com o sphenoide Caia dn nÃ É Ed Dado pi id A did Rà Cai DD ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 97 e a intermaxillar estão consolidadas. As suturas do malar comecam a consolidar-se, as outras persistim todas e a sua dentficulação é sobretudo muito complicada na parte posterior da sagittal e da Jambdoido. A disposição do ptereon em H ainda que um pouco irregular é bem visivel. O plano do buraco occipital prolongado Yai passar 2 a 3 millimetros acima da base da espinha nasal anterior. As fossas temporaes são um tanto escavadas e a crista temporal dista do seu ponto de pr intersecção com a sutura coronil ao bregma 7 centimetros. A conformação da abobada vista pela norma ocepitalis é ogival, começando a ogiva ao nivel das boscas parietaes. A raiz do nariz é curva e deprimida. A abertura das fossas nasaes tem a disposição de um coração de carta de jogar, um pouco alongado. As cavidades orbilarias são quadrangulares, sendo o bordo inferior dessas cavidades um pouco obliquo. O sulco digastrico é profundo, as apo- physes mastoides volumosas, o buraco occipital pequeno e com a fôrma ovalar. A porção subiniaca do occipital é larga, rugosa, e approxima-se muito do plano horizontal de base do cranco. Dentre os craneos da nossa colleccão este é o que apresenta maior prognathismo da face. Indice cephalico 77.01; indice nasal 48.93; capacidade 1239; angulo facial de Cloquet 64º. MEDIDAS CRANEOMETRIGAS REV A NECLOSPOSTEBLOLE: Nero qo ndo era roger So Mao RDOS 47 to oo cio 17,4 cent. ER OTA TIS VCL SON ANTI O! ie cega pn ice gnireo cons opdala ic Va SADO (a RR ao 13,4 » iaentrc alba cr RR ee ne o mao Ro SUP optado DAS Ccratáne ENRdo a RS Eis E BI 5) ER Domponitonasaliaofophryons RR 2 » 4 (po OphEyonNTa O; DR Ar as re pero ERR 61 o dos fo RS o RS ra 10,8 » = Z Dosbreamarao lara bd RE aspirado 7 ido) ponto: Polar feia 19,085; 5 E Do amparo sinto ue DO o ls DD» SR Do-inionsao opisthiontas E e oq =) o Doo PR SAS O Gn» Circumierenciaiiransyersa Ts RR RR RO E 31 » Cordandessarcurça RO ua, Ea IE NE ERR SR E E ERA RS SO LD» Dame irogmazimo dalirontes o o ES DS hl » Dito ninimondasironite A E ese dano ap onpan e os: SADO co o ir Si» Ditojbiorbitarios es e Aa eu, aÃE an ra TOS o ST MS cp 20 E A ORG» Ditosbimalaresoo cet al e cl a Sto PEA di CÍ SO DO agia ALE a 06 10,8 » Ditombijmo ale eee fera po De A atncoll co Mapa POL RES a Mi do bg O SOR AS a Sa 11 » Comprimentoptotalidasfaceza Ra E a o SRS 10,6 » DitoêminimoRdaltacer o o O q » IinhatdoRbasionFaisuturamasali Enc: 98 » Circumferencia horisontal. . . 2... ... PO So Bd Re A RE ORE rs, Satan 50 » DiametroFocepitalideumiastenontarouiro E 1 » Ditospitemporal maximo 8a Ar ora NR SEARA ton ço o A qo do MS 12,8 » JDM busiroee ds d BS a arQuo Ga] GsbaDO BA ben o Bié o do 12,3 » Dito nbizy conta tico RR a RR 12,5 » Dio sos ONA. quo=s 00 0 a0ro Wo DDD o 0 O 0 obo o 420» Ditosverticalidamorbitas res MSM so ojusciitos sroite jogo] jet 10 EM o fio) Uavbça io! Partras qa SIDI) ErotundidadeRda orbitar RS RS SE RSS SEN Senso 48 » arguraidadaperimra nasal RR O Cedro: «ERP DES 2) Distancia da sutura nasal à base da espinha nasal. . . ....... 4,1 » os. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL To tonvallo + OrDILArIO: » -2)me8 5 Tosa des fre Ro o ER UR SRA O ME 2,1 cent. Distancia de um angulo a outro do maxillar inferior. . +... .... 9,3 » Dita do angulo da maxilla inferior ao ponto mentoniano. . +. .... 8,6 » Altura do masallaranierior na symphises o 43 D Ditarao nivel darapopbysecoronoide FC DDR» O mento excede à linha vertical. . =... 0.0. DR eso rd rolo é 1 » CRANEO N.3 (ViD. A Esr. Il). — Este craneo foi trazido do Mucury e per- tence a um individuo da tribu dos Potós. Tem uma côr enegrecida, talvez devida ao contacto da terra, pois este ecra um dos que estavam mais profundamente collocados na cova, donde foram com elle tirados diversos esqueletos. Em a sua superficie, que está um pouco corroida, vêem-s? placas ou cróstas esbranquiçadas, restos da materia organica, que soffreu o processo de saponificação. E evidentemente um cranso de homem, cuja idade não podia exceder a 49 annos. Notam-se nos maxillares 32 alvealos dentarios; superiormente existem 4 dentes molares, 3 incisivos e | canino; inferiormente e 2 caninos. Todas as suturas acham-se mais ou menos consolidadas, excepto a S; 2 grandes molares, um de cada lado, porção superior da sagittal, cuja consolidação apenas começava. Não offerece anomalia alguma. A fórma do cranco olhado pela norma verticalis, é a de um ovoide; d frente e por traz pyramidal. O vertice é saliente; as paredes lateraes dispostas verticalmente; a fronte baixa e muito descahida para traz; as bossas [rontaes pouco pronunciadas; a glabella proeminente; as arcadas superciliares espessas é arredondadas nos seus bordos. A crista temporal aspera e saliente sóbe muito para cima, approximando-s: do bregma. O inion é saliente e rugoso. A porção sub- iniaca do occipital apresenta numerosas rugosidades e approxima-se muito do plano do buraco occipital; a porção supra-iniaca é achatada, de sorte que o inion fica exactamente no ponto de intersecção de dois planos, que convergem em angulo agudo. O plano do buraco oscipital prolongado vai passar pola base da espinha nasal anterior. O buraco occipital tem a fórma ovalar com uma chanfradura no seu bordo posterior. A espinha nasal anterior é saliente. Os malares são largos, altos, mais projectados para fóra do que para diante; as apophyses zygomaticas muito salientes e arqueadas. As orbitas são quadrangulares e as fossas caninas profundamente escavadas. Os alveolos dentarios correspondentes aos incisivos infe- riores acham-se destruídos at? a base, destruição produzida provavelmente pelo us9 do botoque. A masxilla inferior tem a fórma parabolica. Indie: cephalico 13.09; indice nasal 52.00; capacidad? 1255; angulo facial de Cloquet 64º. MEDIDAS CRANEOMETRICAS LANLero-posterior 13 28. ao te e Ro apos a Rad, Do io ii con RD 17,1 cent. RREO Pa aa TA ER CMOS 8,5 (isa o [RAS OPEN 1 Rr 125 » At E AP e E Srs PP ES re 12,6 » DiaM. pi id ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 59 E DOSDONtoO nasal MO phNyON,S nro a, col detto o] Ron caio oa o 1,5 cent. É (Do OX lonAdão EO opera o ES S/S bio op DR A O Sais Aero Se 1057» S 2.Do presmafao amb a der ass aero Marga oe STO Te Po o Bop Ra Ra Ao Sete RO 12,8 » o ENNIO A O LAP O IDO "Sao o! serra er E Pio sao o “ao DEDO, AR o o 45 » r Ss DoRVLON FORO PIS TOLONE es O eo e a ap Ro o 6 » inhardo basiontitsuturamasalic Era 10 » Circumieten aghonsonia RR ol » DARIA NS els det 8 pr DM AS Po cr ct O o a E SS RS pa o ao ct E 30 » Diane mostcontaltim AXINO RA Rato eo) mom SP e RO a rop RO Ss 99 » DitoRide nona O nro Ao Done co Sed o o pre Ra Porto do, ai a SA o 1) IOiro QatonES La «5,0 a o RA Rário SS ROO PAO e 10,5 » Ditofbiempor Emas o e RE So mo 1 » Dito a Sto Ldia no MENS 407 47.7.) onto o RR PD 66 o RE E a IS» JDiro Jar naldo) o q 00 oMbEG aro ado ti BO CO a ES O EE 1250» Comprimentossimplesidantace nc Dc ECC censo: 6,4.» DitoBtotalidasaceme SD E o o RS rt mes te 9» iiametronstransyersotdadorbita.. see eo jo oblo: ensine =2 57 beim 41 » Ditoaveriicalsdarorb ita gas RR. Coe oral sue o) gelas mca ceu JA URSO jonas sé SL Distancia da sutura nasal à base da espinha nasal. . ....... 5 » Darruratda abeniurainasa RS E o RAD. o) Protundidadezdadorbitad DR E 490» Diametrosbiorbitario; as o o SEO coin Rats e) af po oO oba, TODA a 10,2 » Intervallotorbilatio PLS 2 a TR O aa doe aros PANDA Dto a radio 2 » IDiinguo Jomjull is dio died pd cm) vd rg a Bm soma aro io IDico otinnaro and bn pad RPE o a Ci RD DR LI e» Distancia de um angulo a outro do maxillar inferior +... cc... 94 » Dita do angulo do maxillar ao ponto mentoniano . . .cccsco.. S/D» Altura do maxillar inferior ao nivel da apophyse coronoide . +... O» OBmentofexcederal inha venicali a E. o mil. CRANEO N.4 (Vip. A Est. li). — Destaca-se esto cranco de todos 03 outros pelas suas maiores dimensões, pela saliência mais pronunciada de suas linhas e pelo aspecto mais brutil do seu peril. Perience a um esqueleto, que foi enviado ao Museu por ordem d> presidente de Minas. Acha-se bem conservado e não apresenta deformação alguma congenita ou posthuma. É evidentemente um craneo de homem, cuia idade não podia exceder a 30 annos. Tem 16 alveolos dentarios no maxillar superior e 414 no maxilar inferior, faltando neste os dous ultimos molares. Os parietaes estão integros, sem sutura supplementar; as suturas interma- xtilar, medio-frontal e inierparietal estão inteiramente consolidadas, constituindo cada um desses ossos uma só peça. A disposição denticulada das suluras é em geral, muito simples; quasi linear nas immediações do bregma, ella torna-se mais complicada ni porção posterior da sutura sagittal e da lambdvide. O inion é excessivamente saliente e rugoso, podendo ser representado pelo algarismo 5 na escalla de Broca; a disposição do ptereon é irregularmente em H. O plano do buraco occipital prolongado vai passar pela base dos alveolos superiores. As fossas temporaes são planas e dispostas verticalmente. À crista temporal a principio prolonga-se um pouco para cima, depois toma a direcção horizontal, ficando na distancia de 7 centimetros do bregma. A glabella c as arcadas superciliares são salientes, espessas 60 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL e arredondadas. A fronte é baixa e muito inclinada para traz, offerecendo uma depressão no ponto supraorbitario, como consequencia da saliencia das arcadas superciliares. A conformação da abobada craneana é em tecto. A parte sub-iniaca do occipital é aspera, rugosa, inclinada de traz para diante, de cima para baixo, de modo a formar com a região supra-iniaca um angulo de 100 grãos. O occiput é achatado e vertical; o vertice um pouco saliente ; as apophyses mastoidos excessivamente volumosas e convexas em a sua su- perhcie. E” bem sensivel uma saliencia supra-mastoidiana, que faz seguimento à raiz longitudinal da arcada zygomatica, inclinando-se para cima até encontrar à linha curva do temporal. Os malares são grandes, espessos, rugosos e projectados para fóra. A raiz do nariz é notavelmente deprimida e os ossos proprios do nariz acham-se mais ou menos consolidados. As fossas caninas são largas, escavadas ; o buraco infra-orbitario de um diametro muito maior do que nos craneos europeus. A abertura das fossas nasaes apresenta a fórma de um coração de carta de jogar. A espinha nasal está quebrada. As cavidades orbitarias são profundas, quadrangulares e têm o bordo superior, que é espesso e rugoso, um pouco inclinado para fóra e para baixo. O maxillar inferior têm a fórma hyperbolica. Nota-se um ligeiro prognathismo da face. Indice cephalico 73.06; indice nasal 45.45; capacidade 1515; angulo facial de Cloquet 62º. MEDIDAS CRANEOMETRICAS 5 (6 NUE Sao ao) obmo O Gsa duo do vp Enlne gos dd ac 18,6 cent. Z Eranswerso InaximoR SR DS o oo o 13,8 » EPA pci ta RR RE PRIOR RR O E O RR 14,6 » ER (Dospontonasalisoophryon CR 2 » Í ADiabiigoibregna- e nisi te Pag o foi cabia sita nto o) “of Tai fo RR 12,4 » - z Dobre ma aolambda E E 14 » o PiDo ddmbda:go Nona dessa isao o al SIRER RO 2 o E dia E 6,3 » S Dotiniontao opisihion FR RD» Cireumferenciaitiarisyersa- a a as 35 » COLdASO ESSA CUBA MEM: e os je! (o, e SARRO a OO POR 16» Tintatdopasion 4 suturainasal E CE LSD! ge Cmreumierencia honsontal a E NR o3 » Drametrosivon ivlsupenior: Ro Ra es capas o Ro DR 11,2 » Dio strontaliminimo RR 88 » DitoxoCCIpItalR SR DO e Ro 11,3 » Dito abitempora lEmaximo a CR e 13,2 » Dito Dimas toldian os Sr sc Rs MS Re aa a ape DAR RR DR Re 3 » Dito bizygomatico Soares. = ot papos PR pe o e O OR o cola A MR 14,4 » Comprimento «Simples -da faca ada = is asgaees: go aa o ai Do opa 8 » Dito; totalida face. eso oleiro Soa ano qtas Mi JAR Pope E voa ASR a ER 13 » Diametro transverso da Grbita > sis s usage & sora é eo DR 45 » Dito yerticalzdaLorbiva ssa 4 suite E GE emo ps MS Po rea Da UE RR 8 RR) Distancia da sutura naso-frontal à espinha nasal. . ......... 55 » LATRULA da, abertura nasal. «e irc av ui o qro Upa pao 08 PD o ES 25 » Profundidade: da orbita) = ca «EU AE a de oa ne A OS 53 Db ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 6] Dep DO) Ionoproihuai atos Tejo AR RR E DE DU Rm Re a 19,6 cent. DER UU OUT OD IRES TR) Sao sor doeo neo on ar Moo abro tioa! bg A anta pa OE Lo Sat do AQ» Dino e DS RR a O A re e RR 12,5 » Dinar (ia areia a db to Pt EU 6 De aci CR SPD E Md PÇ 1 aliei dd) , Distancia de um angulo a outro do maxillar inferior. . . cc. cc. o» Distancia do angulo do maxilar inferior ao ponto mentoniano. +... 10,2 » ATuurao masilarinfemor nvisymphise coca. 3,5. » Aura o miyelida apophyselcoronoide- Meco. 6 » AM LO LO RI USA E SOR RR a O cn ND O = RO O Ro ron 1% ORmento esco deBaBhinhasventical e DS isca 4 mil. CRANEO N. 5 (ViD. A Esr. Il). — Distingue-se este craneo de todos os outros por diversos caracteres pouco accentuados, pela maior regularidade e delicadeza de suas linhas e pela [órma quasi circular do buraco occipital. Foi trazido do Rio-Novo (provincia de Minas) pelo naturalista Sehreiner. É sem duvida alguma um craneo de mulher, cuja idade devia medear entre 14 e 16 annos. As arcadas superciliares são pouco vistveis; a glabella quasi imperceptivel; 0 inion achatado e pouco sensivel; as arcadas zygomaticas mui delgadas ; à linha curva do occipital pouco saliente. À sutura nasal está siluada quasi ao nivel da arcada superciliar e as apophyses ascendentes do maxilar superior muito inclinadas para traz, o que conslitue uma anomalia. Existem apenas 28 alveolos dentarios, 14 em cada maxilla. Dos dentes só restam os 4 grandes molares superiores e o segundo grande molar esquerdo inferior. Persiste a sutura da apophyse basilar com o sphenoide. O angulo superior do oceipital é substituido pelo osso epactal. A denticulação das suturas é quasi toda complicada, excepto no ponto correspondente ao bregma onde ella é simples. A disposição do ptereon em H é bem visivel. O plano do buraco occipital prolongado vai passar pela base da orbita. A fronte é um tanto convexa, mas as bossas frontaes pouco proeminentes. O buraco occi- pital é redondo; a conformação da abobada cransana é em testo. As fossas lemporaes são pequenas e pouco apparentes. O achatamento da região occipital é quasi insensivel, descrevendo a parte posterior do cranso uma curva muito regular. Os ma- lares são pequenos, delgados e não offerecem grande projecção para fóra nem para diante. As fossas caninas são mediocres, a espinha nasal muito saliente. As cavidades orbitarias approximam-se mais da fórma circular do que da fórma quadrangular. O seu indice cephalico é 79.86; o seu indice nasal é 38,88; a sua capacidade de 1010; o seu angulo facial de Cloquet 63º,5. MEDIDAS CRAÁNEOMETRICAS E (Enter onidror SPORT ORE SIDIOR 27 TVA re a SEO Prove EO REVER 14,9 cent. te RO ADE SI ES OR ER ODroão Rage o Do Monta CEE SO qa 1 o tra 11,9 » ED ViCrticalisios. arara Era RE ca O A sra rave (o E a 11,9 » ER iDosponto masaliaosophryont RR E 9 mill. a ER DORSO phRyonda o bregiman o 10 cent. e! - E Dolbreemação lambda Ss 4 oo ensaio a SR RO fondo 9 sra 9.488) 2 DORA O NON so DM 6) nsmio De Brenno e ados Tot ca ear DES IA 6:59 1) E ND inioido quado ES Ss Sec AS EO SE ss SAS DD» 62 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Circumferencia transversa é sedes “atos on o qo Sa apro nal Potato sto oo) a a Tio 30,5 cent. Gorda dessa "curva ME rms e ea ein RES re a Dol Ca abro pe a RNA RN E E aee o 10 » Linha tirada: do basionsAssutura nasais vo as RES ERRR So. 8,97 2» Gircumferencia horisontal. = ss so RR E 5 » Diametro frontal superior. Ss o on 10 » Dito dem nin nos Psp o alado no tão. Dotfae So nf co Ea [al E o poa REAR o = 598 0) Dito oceipitalr Sc RR OS Tas fo Po pontos “laio Poe RR RS 99 » Dito bitemporal''maximo 2." 4 made (bg al os al oh gana o E 1 » Dito Dimasto dano”. ME cp sro proa, ei é so? TA CR SR PR =D ORE po RO 10200» Dito :PiZySONnSUICO =; Ses cor axa 670a Pera sogro jo, fo pr aaja ergior Mt RE LO To» Comprimento simples da face. . . ... cc cc cccc scr. 8 » Dito totalrds fatos ES O o oO eo do ea o RR OR SS Jo o). Divinetro transyetso da orbit ES e 5,6 » Dito verticaldasorbita RR PE NA EE 3,9) 0» Distancia da espinha nasal à sutura naso-frontal. . . . cc. co. 34º» Largura da abertura nasal: = sos so esu o clio a Sd peão vi adia! corola De 21 » Prorandidade lda orbita a a SEER 43 » Diane ro RDIOBDILA ELO RS e MO core, oo a o co e oi RD SL» TD Hino o Ape Vea LD OS cad oo Ps nd, EPE) Sp UR IPES 0 SO SDS E 9,6 » 1OHNO lopbp NEN End dp os “o ES SR to eo PER RB 5 do” DS cd OD a 0O sh OS 0) Distancia de um angulo do maxillar inferior a outro . +... cc. s » Dita obliqua de um angulo do maxillar ao ponto mentoniano . +... % » Alturardo maxillar anterior na symphisers cc o O 2 » Ditafao nivel datapophyse coronoides E E 4,6 » O mento excede 4 linha Fyerbicalnd. E SS RR RR 2 mil. CRANEO N.6 (Vip. A Esr. lil). — Foi esto craneo trazido do Mucury (Pro- vincia de Minas) com outros que fazem parte da no:sa colleeção. Pertence a um individuo do sexo masculino, cuia idade na occasião da morte não podia exceder a 30 annos. Pela rudeza de suas fórmas, saliencia de suas linhas e aspecto brutal do seu perhl approxima-so elle do cranco n. 4 mais do que todos os outros. Não apresenta anomalia alguma congenita ou posthuma. A glabella é bem visivel; as arcadas superciliares salionte:; o inion rugoso e largo; a fronte baixa e deprimida; o occiput achatado; as paredes lateraes dispostas verticalmente. Existem nas duas maxillas 32 dentes muito bem conservados, sendo os da maxilla superior um pouco prognathas. Das suluras, umas já estão consolidadas outros comecam a consolidar-se; a fronto-pavietal está unida no lado esquerdo, mas persiste no lado direito; a temporal não está ainda consolidada e a sagittal que comecava a unir-se em pontos differentes, offerece uma denticulação muito complicada O ptereon em é bem visivel. O plano do buraco occipital prolon- gado vai passar pela base da espinha nasal anterior. A linha curva do oscipital é aspera, rugosa e mui apparente; as arcadas zygomaticas delgarlas; 03 malares largos, altos é um pouco projectados para fóra e para diante. À raiz do nariz é convexa; as fossas caninas pouco escavadas; as orbitas quadrangulares; a mandibula larga, pesada e massica; as apophyses mastoides volumosas. O buraco oceipital tem a fórma ovalar e o maxillar superior a fórma parabolica. Indice cephalico 76.47 ; indice nasal ok) 92.08; capacidade 1263; angulo facial de Cloquet 67º. O PD DP PPT A ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 63 MEDIDAS CRANEOMETRICAS É (omtBro posterior E EE ERES 20 QuE O ODOR PO QUE US aa PR RÉ 17 cent. , PAN verso: MAXINOL.S -, o sta! iopfolmelro "on corso RM RD 13 » A RR SR e E Da 3 Pra ie fo, DOS Co RR E 13 » E Dospontomasalao ophryons a E » 4 E Dolophxyontaoibresm an e a 10,5 » ER imosbregma ao: lambda: caem dad ao a toe qu o oo PARRA A nes 12 » & [Do lambda ao inion. .... 2.2.2 cu sicos PEA, apt 6» ER DO MONAÃO OPISTDLONA qu «s sporra cs a CE Ce PP TR od o » Cireumferencia horisontal. 44 0 + e caio EM APCD E rs a dans 48 » Pta ciranS versa so 2) SUS feias ada do as POR ap DS Sra SA o ooo DR 31 » Cordandessas curvas ga Mes sr ra UR crio E EO ae 10,2 » Einhaidosbasioniasuturanasal. = sda + ar agents Pan aa a 10 » Inaimeirorrontali maximo: sm. =. d eguare aro o) o Si 10,7 » Dto trontn nin O 0 5 oe oo RR qua av MED o Pen o so 6 oito 9 » Dito occipital de um asteriona outro. . .. ....ccccccics. 10 » Ptombitemporalimaximo£a = spears o Reis o tono RSA ais coça ar a 12 » Dirorhimastoldianos = o tiro A norte gre E Tn co RS a Ra SR 12200» DO DiZY COM ALCOM ams o comogaar ie Eee Dorsa po ar RR SRS, 13,5 » Comprimento total da face. . .... DENRE es CN SO a SOPA RE 122 » Ditorsimples, dasfate-g. oi ig srados Cu RR ao ES UR o AS Da Cr o 8º » IDiametro transyverso: daForbitar a a 42 » Pitofiverticalida: orbitar. ss. je aqi Mo Bisee E RD UR a 32 » Disiancia da sutura naso-frontal à espinha nasal. . +... ...... 4,8 » Haxeira daMabertura, nasals A 2.4. aeee do el cridra oths SEM po ER MD »D» CrotundidaderdaBorbita-ps code os RE San STS ads SE ade 4,8 » Diametrosbiorbitarior a PS A Sp O a MR 10,2 » tomb Inara oro tes nto Lora de monta ho raia iria SRS RA a RI APR DR Ji» Intervallo orbitario de um dacryon a outro. . cc cc cc cc... 2 » Comprimento dos ossos. proprios do nariz. . . » « 2 = 2 sm ro 160» Dametro bijugali o. ms a e Eta SO Dio op OD, o Brs 1E6 » Distancia de um angulo do maxillar inferior a outro. . .. ...... 94 » Dita do angulo do maxillar inferior ao ponto mentoniano . . . .... 83.» Altura do maxillar inferior na symphise. . . ..... cc cc... 26 » Entasao nivel da apophyse coronoide. 2º. - -. «mo = o ra oe aa 6 » mento excede alinha vertical 50. ss. . as Dus O Mapa RD 3 mil. Rateulordorinaxillar inferior: qmqe = mi crara enero o antio opolio ando o 1200 CRANHO FOSSIL DA LAGOA SANTA N, 7 (ViD. A Esr. IV). — É um cranco relativamente pequeno, encontrado com outros em uma das cavernas da Lagôa Santa, onde existiam tambem ossos fosseis de especies animaes já extinctas. Exteriormente elle offerece um aspecto metallico bronzeado e nas suas superfícies de fractura é bem visivel a transformação calcarea. O seu peso é notavel comparado com o peso de outros craneos que descrevemos. As arcadas zygomalicas estão fracturadas na parte média, as apophyses styloides destruídas. Na região temporal direita vê-se uma solução de continuidade, de fórma quasi elliptica, interessando a porção escamosa do temporal, com 48 millimetros de extensão no seu maior diametro, e 2 centimetros na sua maior largura. O bordo superior dessa solução de continuidade é constituido pela lamina do parietal talhada em bisel, que conserva-se intacta. O aspecto dos bordos da incisão, VoL. I— 12 64 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL que são semelhantes quanto à córe lisura a outras partes do craneo não fracturadas, faz acreditar que tal solução de continuidade não é posthuma como parecem ser as fra- cluras das arcadas zygomaticas, que apresentam um aspecto todo differente. A fórma dessa fractura, sua extensão, a disposição dos seus bordos, levam-nos ainda a suppór que foi ella produzida durante a vida por um instrumento cortante, devendo dessa lesão ter resultado a morte do individuo, attentas as relações existentes entre a região feacturada e a massa cerebral. Falta neste craneo o maxillar inferior e alguns fragmen- tos de mandibula que foram enviados com elle, não obstante offerecerem a mesma côr bronzeada, podemos assegurar que não pertencem a este cranco. À fronte é baixa e inclinada para traz como em quasi todos os craneos da raça americana; a glabella saliente, as arcadas superciliares mui proeminentes, o occiput achatado e quasi verti- cal; a protuberancia occipital externa larga, plana e mui saliente. O plano do buraco occipital prolongado vai passar por uma linha horisontal lirada de uma orbita a outra. Os ossos malares são salientes e mais projectados para diante do que para fora; as ovbitas quadrangulares ; as paredes lateraes do craneo verticaes ; as apophyses mas- toides pouco volumosas ; as bossas parietaes mui salientes. Estão consolidadas quasi todas as suturas e a sua denticulação é pela maior parte simples, excepto na porção posterior da sagittal, onde ella é complicada. Notam-se ainda vestígios de dous 0s50s wormios, situados symetricamente de um e outro lado do craneo, nos pontos corres- pondentes à sutura do parietal com o occipital. No maxillir superior existem 14 alveolos dentarios mais ou menos estragados e fracturados e dos dentes apenas resta 0 segundo molar esquerdo. É de presumir que o individuo a quem pertencia este craneo não tivesse uma idade superior a 30 annos na occasião da morte. Nem se póde con- siderar inadmissivel esta hypothese ante o facto da conselidação das suturas, pois é sabido que as suturas se consolidam mais precocemente nas raças barbaras do que nas civilisadas. A abertura anterior dos fossas nasaes tem a fórma de um coração de carta de jogar muito irregular. As fossas caninas são pouco escavadas e o buraco occipital apresenta a fórma ovalar. O dr. Lund que encontrou este craneo em uma das cavernas da Lagôa Santa, altribue-lhe uma idade superior a 3000 annos. O seu indice cephalico é 69.72; a sua capacidade é de 1388; o seu angulo facial de Cloquet é de 67º. MEDIDAS CRANEOMETRICAS dit SMAVeLO-POSLETIOTS qa BE E Arns + o tado si q O No à DO Ta 18,5 cent. z TTQNSVerso MAXIMO QUE Mede. Re gone doa o a ee NR RR 124,9 » = l vertical ER SD SE are CRS À am APR Li a 14,5 » à (Do ponto nasal SO OPLrGONa. a ju cette mao cj SA RA RE 100) +. Dorophiryon: ao?bresnia; estilista, fo Oo rir Re Poa SRS A 11,5 » E Dor brega O Lambdnoo. = 2, cais água Sae o e 14 » E * Ino TdUda dO EG ás oito sao aca ce eo RR DD, a 5 » O Do ndon-ão opisthida 3 fz. Ds aa A prio DR q » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 65 Linha curva de um buraco auditivo à outro. . ........c... 91 cent. RTAC O SACA. O "rs catia 0 Sai al 6 o pad O Care E O DRE 11,2 » innbardosbasion'á sutura nasal. .. spas io sein ae ão quai e Do a Ed) Etameyrorivontal: maximo. Ma ss e a Ea E Ba 10,7" » oie minimos. o o a Gs quado E OS a 92 » dontio meeo | BAD ra a a Om O RR Itay 6, Rircurnferencia norisontalae es E E e A E 1,0 » Prriprimentominipio da fico: es a a ars Drs a E E 61/05» iiumeiro: Dino ain Mo CR ut, nã A rea DS o a EDS E EO 13» Entotaiyronaiico,! 4 es e a a dar o NR ED O cor cra ágio oo be deralopar [3 8 Ito SBLOrDIEARLO A 5 ae UNA A apl a o SA a DA a da 10,5 » Dito Joias de do ppa a A RR PR CO lo») Intervalo dorbitario A es ts se Se Rh avaria DA se BA ) DiametroAtransyersonda orbita a 4,1 0» DOS VErtLCalR RE SR E ars MA oo o pena abr a O 3,3.» ExotundidadeRdaBorbita RR RR > » Drameiro bitemporal/' mamona: DS) Ditocbimastoldianço. q. otra PD uno) Rope ERRA Ro! o To ane 12,9 » Distancia? da suturainasalia espinha nasal Foda: 45 » WarsuraidasBtossasmasaes E SR 2,4 » CRANEO N. 8 (Vip. A Esr. IV). — Foi este craneo encontrado com outros em uma caverna situada algumas leguas a ceste de Macahé (provincia do Rio de Janeiro). E um craneo mui pequeno, sem anomalia alguma e ao qual falta o maxilar inferior. Tem exteriormente uma côr mui branca como a do osso lavado, O que reunido à sua pequenez falo distinguir logo à primeira vista no meio da nossa colecção. A fronte é baixa, mas relativamente aos outros erancos pouco inclinada para traz; as bossas frontaes são bem apparentes. Persistem quasi todas as suturas inclusive a intermaxillar ec a do sphenoide com a apophyse basilar, e a sua denticulação é, em geral, pouco complicada. Olhado pela norma verticalis, elle tem a fórma triangular. No occiput nota-se o achatamento caracteristico da raça americana. As paredes lateraes são quasi verticaes; as fossas temporaes pouco apparentes ; as apophyses mastoides pequeninas ; o vertice pouco saliente ; as orbitas quadrangulares. Os ossos malares que são pequenos projectam-se mais para fóra do que para diante c as arcadas zygomaticas são extremamente delgadas. O buraco occipital approxima-se muito da fórma circular e o seu plano prolongado vai passar junto à espinha nasal anterior. Contam-se 14 alveolos dentarios na arcada su- perior, onde estão implantados o 2º pequeno molar esquerdo e o 2º grande ao 1º e 2º pequeno malar direito e esquerdo, sendo para notar que estes ul- timos comecavam a irromper do fundo dos alveolos correspondentes. Facto iden- tico se dá em relação molar direito o que torni evidente que o individuo a quem pertencia este craneo tinha entrado no periodo da segunda dentição; a sua idade portanto devia ser de 7 annos pouco mais ou menos. A arcada do maxillar superior é parabolica. O seu indice cephalico é 73.71. O seu indice nasal é 55.55; a sua capacidade é de 1088“; o seu angulo facial de Cloquet é de 73º.5. 66 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL MEDIDAS CRANEOMETRICAS E (Antero-posterior Se e PR RD E RS E eo = E dm ani ade 15,0 cent. 7 Transverso “maximo Sem ci rolronre! elias oi o E ope oil = ato DR no to] Pao NO RR 1L,5 » A (Vertical a ORE RR AS ADO CROSS EE ETR A RIDE O a a 11,5 » E Do ponto nasal ao ophryon . . ...... a ES ND Rot ron fonio molho (e o 120 » < (Do ophryon ao bregma; sa qu fo. » vo va: o Ko jdis uia poa ho pI a ee) abga e e dê 10 » = E Dorbregma ao-lanbda 58 25.0 bode qe sie pe joio ta apo RR ao 5 12 » o E Ino Tama ao InIOno efe ge LAOS ge o REED Ed PR 45 » O eNDoinion 20:0pISthION, Gus po. o 650% tu daieo saia erga o ago Vale mca ops 6 » Linhaddo pasionfsisuturamasglias So RR CRER RS TS 5 Cixcumferenciahonisontalfza o RS 46 » Circumferencia tLansyelsa- Mm. fe MEge o (o) os po ot tos Pa conhe ro Woo Nto Niro 29,5 » Gorda dessafcui yang pes o) o on = foge Uaio RONNIE topo a] (o nono Noto 9 » Diametro frontalimaximo- e CRER RR 10,3 » Drop iron ienhatos — Sos PSA DDS ul a Sm qo ar oc SiS») Comprimento minimo/ida face. =. DJs SR Rn SR 49 » Diameiro bizygomatico E RE 99 » IDT O Ss pus 6 pib O nd GOO DA SS Do ds quo S;90» Dito bijugal: gal ae A cego fo joe o per il ao Jing é ASA o fo ISO ta qo! (o) gaita, je no 8,6 » Intervalo orbitanrio RR RR eo oro) ro Rc nao e Ro [ES » Diametro veriicalida orbitar RR E RS 3 » DITO essas CEO dito a ol OD Do ovo voo bro DS oco vo 3,4 » Protiundidaderda orbita 41 » Diametro bitemporalimazimo RR Rn. 12,2: » Ditoibimastoldiano RS ESSA Poe Soto eres ob too SNL 5) Ditolocerp ita lSR RR RR 97 » Distancia da sutura masal v espmnbamasal aco. 36 » Eareuradyapertura nasal SER 2 » CRANEO N. 9. Além dos oito craneos que descrevemos e que se acham todos representados nas heliogravuras que acompanham este trabalho, julgamos conveniente para completar essa collecção, descrever um outro que temos à mão € que foi encontrado na ilha do Governador, dentro da bahia do Rio de Janeiro, quando se estava alli fazendo uma excavação. Attendendo ao estado das suturas devia elle pertencer a um individuo avançado em annos. Está reduzido quasi totalmente a substancia calcarea, e extremamente friavel; as orbitas, toda a face e grande parte da base foram destruídas. A sua cavidade acha-se cheia de argila dura e compacta, sendo necessario empregar um instrumento ponteagudo para desobstruila. As arcadas superciliares são nimiamente salientes e espessas; a raiz do nariz profundamente deprimida; a fronte mui baixa e incli- nada para traz; as paredes lateraes verlicaes; o occiput achatado; o inion saliente e rugoso; as suluras que se pódem ver estão solidificadas. Olhado pela norma verticalis, este cranco tom a fórma de um ovoide com a mais grossa extremidade voltada para traz. O seu indice cephalico é 76.11, portanto subdolicocephalo. A sua capacidade é de 1355ºº. Eis algumas medidas crancometricas, que nos foi possivel tomar : ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 67 MEDIDAS CRANEOMETRICAS a ER ENNILETO-POSLETLOL/ (6) foip o! oi jo ol ntonto) jo! (o) a) jo! Vo! ja pis vis! 61 6 o p/o fina gs 18 cent. : | ransverso EURO DS To ISS AO OO, Op NE DR ES E q CNS RS ri 13,7. » E) erucal Eos sa o figa ár anfeta o 5 cera jo) sito jo! o o Mol joiim sb pia 13,9 » fas os derumPasterionta outro e E Rs 11,3 » & [Do ponto nasal ao /ophryon a e e 1,9. » a E Do ophryonidosbregmas oo. TER EAE A e te ht » E Dotbrepma nao Lamibdar- ado deaeEciecieina aro, Jana 2a a pia PETS Ce 1 sx & DoplambdafaoFiniont RS E: UT Sp O Circumferencia transy. = «ate sa es eba o ado à ala 0) na o ai 33.» Coragdessadcuryve E RR 12,8 » romero Mell iEbatiMds 4 Es do se do obs oba cao qa E JUL 6 Dio GUIO NO 6 VA SB GNSDE GnA O BLONE Sob GE O O Sn sodo She 10,4 » Inteagelio odiado, 4-0 6206 66 D 0 vb Go quo d 0 DD 6 DD oro BO Ding jotigimdals o» god O DS cho co v vo Lodo que 14 » (Oixeurmferenciaihonsontalt E 51,9 » Drametroihimastoidiano ER ERR IS20 » Não podemos resistir ao desejo de juntar à nossa collecção um fragmento de cranco que possue o Museu, e que é de certo um dos objectos mais curiosos e interessantes que alli existe. O valor desse specimen pareceu lão grande aos olhos do professor Van Beneden quando elle visitou o Museu do Rio de Janeiro, que aquelle distincto zoologista mandou tirar uma photographia desse fragmento de craneo e levou-a comsigo para a Europa como uma preciosidade anthropologica. Foi elle trazido da provincia do Ceará por uma commissão scientifica mandada para alli pelo Governo Imperial, afim de fazer colleeções de plantas e de animaes. CRANEO DO CEARÁ Representa este fragmento uma grande parte da abobada craneana, e é constituido pelo osso frontal e pelos dois parietaes fracturados, como se póde vêr bem na gravura que vai aqui intercalada no texto. Está quasi todo reduzido a pura substancia calcarea, e muito friavel; o seu diploe é muito poroso e à lamina interna fina e cortada de sulcos profundos, correspondentes aos seios venosos, começa a destacar-se com 0 diploe em pontos diferentes. As suturas fronto-parietal e sagittal estão solidificadas. Ha perteita symetria em todos os pontos desse fragmento de craneo e nenhum signal existe de compressão ou deformação artificial. As arcadas superciliares são mui salientes e espessas e logo acima dellas nota-se um sulco profundo, descahindo rapidamente à 68 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL fronte para traz como no celebre craneo do Eguisheim, com o qual elle muito se parece*. A um craneo assim constituido deve ter correspondido um grão de inferioridade intellectual, muito proximo ao dos macacos anthropomorphos. A distancia da linha su- perciliar ao bregma nesse fragmento é de 11,5 centimetros *. A bacia e os ossos longos Passemos aos caracteres descriptivos e osteometricos da bacia e dos ossos longos. As duas bacias que vamos descrever, pertencem a dois esqueletos de Botocudos de sexo differente, cujos craneos foram descriptos sob os ns. 2 e 4. BACIA DE MULHER CORRESPONDENTE AO CRANEO N. 2. (ViD. A Esr. 4).— É uma bacia relativamente pequena, com descahimento para fóra dos iliacos, como é proprio da bacia de mulher. À curvatura do Siliaco é pouco pronunciada e as fossas iliacas nimiamente transparentes, acham-se quasi reduzidas a uma lamina papyracea. O buraco obturador tem a fórma triangular. O sacrum apresenta a sua face interna quasi plana, sem aquella excavação que se nota quasi sempre no sacrum da mulher. Os buracos sacros acham-se dispostos em duas series verticaes; o coccys está destruido. O orifício superior da excavação da bacia é quasi circular e à arcada pubiana tem a fórma ogival. MEDIDAS PELVIMETRICAS Distancia de uma espinha iliaca antero-superior a outra. . ..... 29 cent. Dita do meio de uma crista iliaca à outra, . .. cc cics as » Diametro 'satro-pubiano - Mao a o SS oa 4 » Estr. fim LLANSVeLSO im aa pg ca ui eo Metni] co EaDO a SDS MES Fo 13,5 » Dito jobliguo E Cs a e E e 11,5 » Diametro antero-posterior 0 ae 125 » Bistro Infys- A DILoMODIIQUOS 2 en venrer o! o) ch ch os coBaoO SR o) neuro RO 12 » Dito ibisischaticor” e RR E mt » Altura na espinha iliaca antero-superior. . .....ccccc cl. 12 » 1D)hith Anti des are yo) ovÊSIcDE op PSA DAS ER E COTA O ron DO SD SR POTE 3D » Dramasareada pubianas Pe a co pes SD RR es o DD o » BACIA DE HOMEM CORRESPONDENTE AO CRANEO N. 4 (Vip. A Esr. 4). — Os iliacos são levantados e quasi verlicaes ; as fossas iliacas espessas e escavadas ; 0 buraco obturador tem a fórma ovalar ; o orifício do estreito superior é cuneiforme. A superficie interna do sacrum apresenta uma curvatura sensivel e a abertura da arcada pubiana tem a fórma pyramidal. 1 Vid. Huxley. De la Place de "Homme dans la Nature, pg. 309. 2 Si formos a recompôr este craneo, juntando-lhe o oceipital e os temporaes que faltam, e passarmos depois a comparal-o com o craneo fossil de Lund, cujo desenho vem figurado no T. IV da Revista do Instituto Historico, acharemos entre os dois muitissimos pontos de semelhança. Sómente no craneo de Lund as arcadas superciliares parecem mais salientes e a côr externa é bronzeada como no craneo n. 7 da nossa collecção. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 69 MEDIDAS PELVIMETRICAS Distancia de uma espinha iliaca antero-superior a outra. +. .... al cent. A Titagdo meio: de uma crista iliaca a outra. «. cv. cede .s o. 2 » (Aiametrorsacro-pubiano RE a 10,2 » Ein E supe sj CDIVO, DESDSVOLSO Me, aa o! o lis sin ro) Marat a ciberia o Re 12,2 » (Dito bios ca ars o Boo END DR a 12» Diametrostransyersqrdazescavaçãos. . a 12 » Biol bRischiatico a PEDIR e esçto ao ao tan RD RAR pe 25% Altura na espinha iliaca antero-superior. . . .. cc cc. cacl. 14 » tado Ass phiset ES Reto cas MS plo! erro) Megane ata Tm ne 35 » ita arcada pubiana se A en o rar en 6,5 » OSSOS LONGOS DE MULHER. — Examinando os differentes OS30S, que com- põem o esqueleto de mulher, além dos ja descriptos, achúmos digno de nota o seguinte: a perfuração do humerus na cavidade olecrancana, perfeita em ambos os ossos; grande curvatura do cubitusna parte correspondente ao terço superior desse osso; femur em pilas- tra, disposição esta que se torna aqui mui notavel pela depressão das faces lateraes do osso. MB DEDAS) DOS OSSOS BONGOS omprmentoFabsoluto doem 59 cent. DitordoRibiacomioimalicolonnia SE 32 » Ditoldo ra diusicomfarapophyselstyloide o o: 21 » DivoRdoRcubiius RR Ss RR: 23 » DitoldoRhumerus REC RE ER 28 » Darogda dela vacila RR 14,2 » Dito do calcaneo atraz do bordo articular do tibia. . ........ 3 » AnculoRdo collordo femuricom adiaphyse sa: 1300 » Diametro antero-posterior do tibia tomado proximo ao buraco nutritivo. . 3 » DitoRtransyersoino mesmo ponto Bolo OSSOS LONGOS DE HOMEM. — Examinando os ossos longos do esqueleto de homem, correspondente ao craneo n. 4, notimos tambem o femur em pilastra, isto é, a linha aspera que serve de ponto de inserção aos musculos em vez de offerecer dois bor- dos, apresenta uma columna rugosa e saliente. O humerus não está perfurado na cavi- dade olecraneana ; esta cavidade, porém, apresenta-se muito escavada, e a lamina ossea, que forma o seu fundo não tem mais de 2 millimetros de espessura. À largura da extremi- dade inferior do humerus, tomada da epitrochlea ao epicondylo tem 5,6 centimetros. MEDIDAS DOS OSSOS LONGOS Comprimento absoluiido femuri canoa: 43 cent. Ditordostibia sem o malleoloRinimi e SR: 38 » DitoldorradinsFcomfalapophyselsiyloiden e con. 26 » Dio dO CPIS o SBD 03 Guolo pio qua ond DD o O aro a eos 28 » Dio Gl ADA. 5 0 69 0 DG O quod é O od b o dad E 32 » Dio dd dladaNbo & 206 Buss os ad 00 dass 6 CM asd Omo abp neo DS 16,5 » Dito do calcaneo atraz do bordo articular do tibia. +... cc... 3% »D QUADRO GOMPARATIVO DAS PRINCIPAES MEDIDAS GRANEOMETRIGAS NUMERO DOS CRANEOS 1 > 3 4 5 G rá Ss 9 SEXO E IDADE [H.—40 an. | M.—254n. | H.— 4048. | E. —304n. | M.— 16x. | H.—304n. | H.—304n. | 2— Tan. | H.—504N. | Capacidade do craneo em cent. cub +... 1420 cc 1230 1255 1515 1010 1263 1388 1088 1355 | Diametro antero-posterior.............. 18 17.4 ilrba 18.6 14.4 17 18.5 15.6 18 » VA ar DO DE SUP so RR | 13.5 13.4 12.5 13.8 Los 13 12.9 11.5 13.7 » IVO DICE +. = o ojapuia o Tao oreloTa afeto eo 13.5 13 12.6 14.6 MULA, 13 14.5 11.5 13.9 » foro e: Macedo PLA oo on do 9.8 8.1 9.2 8.8 8.9 9 9.2 8.8 10.4 » frontal maximo 11.3 lilo 9.9 11.2 10 10.7 10.7 10.2 LA: » DIM ALE E sereis clero artate ro to 11.4 10.8 Mlçal 11.8 9.8 Hitçil altas: 8.9 ? » SULA sro rn do ERR ia 11 11.2 12.5 9.6 11.6 11.8 8.6 ? » DIZV PO SDLCO atrito pino ole roedor 13.7 15) 12.5 14.4 10.7 13.5 13 9.9 ? OuryarinTo-frontal bots sao rio 99.1 29.0 29.8 34.7 96.4 30.0 32 Ml 31.9 [ava parto front rss r ori | o 18 12.8 12 14.4 10. 12.5 13 11.2 2.4 [RRDRANITATS vers DIS QUILC 33 al 30 34.5 30.5 dl al 29.5 33 DR DOriSOntal: paso rs 52 50 ol 53 4.3 48 51.5 46 51.9 RALiuUraRÃA TRCO Rs areia ais ro ete ae DTENIA rafe rare E Fe 12.1 10.6 al 18 11.6 12.2 ? ? ? | Comprimento da reg. nasal............ 4.9 4.7 5) 5.5 0.4 4.8 4.5 3.6 z | Largura maxima das narinas........... | 2.4 2.3 2.6 2.5 2.1 2.5 2.4 2 ? Angulo facial de Cloquet............... 690 640 640 620 630.5 670 670 730.5 ? RELAÇÃO Indiceicophalico;. siajafato opala fa pafo afora tata ato 75.00 7.01 73.09 73.06 79.86 76.47 69.72 3. 76.11 DIETA S/s ess sia oro oie ta PORTER MAR eo 48.97 48.93 52.00 49.45 38s.8s 52.08 53.83 b5.59 2? DER VOLLICAL E Die sio crotoge fo :ó o iaeeto ta ae Voto TOM 79.00 Y4.4 3.68 18.49) 79.86 76.47 78.31 3. TT.22 t À cubagem destes craneos foi feita com chumbo. 2 Os algarismos, que estão aqui representando o indice vert. mostram que essa medida não tem o valor que lhe quer dar Wirchow. Os craneos ns. 4. e 7, os mais poe UE DINHO da collecção, tem um indice vert. inferior go craneo n. 5. Essa differença depende aqui do pequeno diam. ant. post. do craneo n. 5, um dos factores do indice. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL il Conclusões Até aqui não temos feito mais do que estudar os caracteres anafomicos e tirar as medidas crancometricas de cada um dos craneos da nossa collecção tomados isolada- mente; agora vamos comparal-os entre si e com os de outras racas da America para desse estudo comparativo concluirmos alguma cousa em relação ás racas indigenas do Brazil. Dividimos os craneos da nossa colleeção em 5 series differentes segundo a sua procedencia : 1º, crancos de Botocudos; 2º, craneo de Macahé; 3º, craneo da Ilha do Governador; 4º, craneo do Lagôa Santa; 5º, craneo do Ceará. ' Os eraneos da primeira serie, em numero de 6, são procedentes da provincia de Minas e em todos elles encontram-se os seguintes caracteres mais ou menos accentuados - fronte baixa e inclinada para traz; paredes lateraes dispostas verticalmente ; occipul achatado ; vertice saliente; orbitas quadrangulares; malares groszos, altos e projectados para fóra; buraco occipital ovalar; mandibula larga, expessa e massiça ; face um pouco prognatha. Desta serie 3 são dolicocephalos, 2 subdolicocephalos e | mesaticephalo ; 9 verdadeiros leptorrhinios c 4 mesorrhinios, ficando os ns. 1 e 2 da serie muito “proximos dos leptorrhinios. A maior capacidade pertence ao craneo n. 4 e é represen- tada por 1:15; a menor ao craneo n. 5 e é representada por 1010. O craneo n. 4 é o que apresenta os caracteres da serie mais pronunciados e 0 craneo n. 5 aquelle que mais se afasta desse grupo por certos caracteres essenciaes : nelle as orbitas não são quadrangulares ; 0 occiput mui pouco achatado descreve uma curva regular; a inclinação da fronte é pouco pronunciada ; o buraco occipital tâm a fórma redonda em vez da fórma ovalar; além disso é elle o unico mesaticephalo da serie, um dos leptorrhinios c o que tem capacidade inferior a todos os outros. O craneo n. 5 representa, pois, um producto de cruzamento mui adiantado. Em nenhum dos crancos desta serie encontramos essas deformações artificiaes que são tão communs na generalidade dos crancos americanos. O predominio da dolicocephalia nesta serie vem trazer mais um argumento valioso para provar que o typo das raças americanas em geral é dolicocephalo ; por outro lado a existencia na serie de alguns subdolicocephalos e de um mesaticephalo parece indicar que o typo primitivo da raça dos Botocudos tende a modificar-se pelo cruzamento com outra raça de typo diferente, e essa presumpção é tanto mais bem fundada, quanto vemos apparecer na mesma seri2 craneos mesorrhinios e leptorrhanios, o que inculca mistura de raças. Pela sua pequena capacidade craneana os Botocudos devem ser collocados a par dos Neo-Caledonios e dos Australianos, isto é, entre as raças mais notaveis pelo seu Vonr el. --15 2 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL grão de inferioridade intellectual. As suas aptidões são, com effeito, muito limitadas e dificil é fazel-os entrar no caminho da civilisação. Em quasi todos os craneos desta serie notimos um caracter que o sr. Broca observou em alguns craneos de Bogota! e que consiste na profundidade da chanfradura submalar como consequencia do grande afastamento dos pomos e ds sua altura. O craneo de Macahe, por ser de creança, não se presta bem a um estudo compa- rativo com os outros craneos, que são de adultos ; apezar disso não se póde deixar de reconhecer que elle apresenta alguns traços de semelhança com os craneos da primeira serio. Assim elle tem 0 occiput vertical e achatado ; as orbitas quadrangulares; mas 0 vertice não é saliente; a fronte pouco inclinada para traz e as fossas temporaes menos deprimidas do que nos craneos da primeira serie. Ha, portanto, caracteres que mostram afinidade entro as duas series ao lado de caracteres que mostram dissemelhança. O sou indice cephalico é 73.71, o que quer dizer que elle é dolicorephalo ; o seu indice nasal é 99.99, 0 que quer dizer que elle é platyrrhinio ; o seu angulo facial de Cloque! é de 13,9, algarismo que não se encontra em nenhum outro cranco da nossa collecção. Este cranco representa, pois, um producto de cruzamento mui adiantado e nell? existem caracteres que indicam um certo grão de superioridade intellectual relativamente aos craneos da primeira serie. Como na entrada da caverna em que foi encontrado este craneo de mistura com outros que o Museu não possue, encontrou-se tambem um fragmento de espada como aquellas de que usavam os antigos portuguezes e que faz parte hoje da colleeção archeologica do Museu, é de presumir que esses crancos foram ahi introduzidos ja nos tempos coloniaes, o que está de accordo com a perfeita conservação do cranco n. 8. Podemos, portanto, suspeitar que o cruzamento aqui se fez com o typo europeu. O craneco da Hha do Governador pertenceu provavelmente a um individuo da tribu dos Tamoyos, indios que habitaram por muito tempo o reconcavo do Rio de Janeiro. E? um cranco subdolicocephalo como alguns da primeira serie e muito antigo, pois elle esta quasi totalmente reduzido a substancia calcarea. Si nelle se encontram certos caracteres que são communs com os craneos dos Boto- cudos, como o occiput achatado, a fronte baixa e inclinada para traz, encontram-se ao mesmo tempo outros que não pertencem aos crancos da primeira serie : tal é o grande desenvolvimento das arcadas superciliares e a depressão profunda da base do nariz, cara- cleres que destacam à primeira vista este craneo no meio da nossa collecção. Os Tamovyos, portanto, a julgar por este specimen, não eram de todo semelhantes aos Boto- cudos e nelles ja se tinha modificado um pouco o typo da raça primitiva. O craneco fossil da Lagõa Santa, uma das preciosidades da nossa collecção, asse- melha-se muito por seus caracteres aos crancos dos Botocudos. O seu indice cephalico 1 Congrés des Américanistes, 1875, T. I pag. 375. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 13 representado por 69.72, indica uma dolicocephalia superior à dos Patagonios e dos Esquimós, as duas racas mais dolicocephalas do mundo. O seu indice nasal representado por 53.33 colloca-o entre os platyrrhinios mui proximos dos mesorrhinios ; a sua capa- cidade de 1388 é superior à de alguns crancos da primeira serie, o que leva-nos a admitlir que no decurso dº muitos seculos a raça dos Botocudos não tem subido um só grão na escalla da intellectualidade ; o seu angulo facial d> Cloquet é de 67º. E um representante da raça prehistorica, contemporanea do cavallo fossil e de outras especies ja extinctas. A sua extrema dolicocephalia induz-nos a suppôr que a raca primitiva do Brazil era dolicocephala, e que só mais tarde a juxtaposição de outras racas emigradas para 0 solo brazileiro fez variar esse typo. E si quizermos entrar em considerações de ordem mais elevada, que largos horizontes não se abrem aqui aos olhos do anthropologista, quando elle procura comparar a extrema dolicocephalia deste craneo fozsil do Brazil com os craneos dos Esquimós e dos Patagonios, encantoados nos dois extremos da America e os mais dolicocephalos do mundo ? O que até bem pouco tempo não passava de uma sim- ples conjectura, parece ir pouco e pouro adquirindo os fóros de verdade -— os Esqui- mós ! e os Patagonios representam talvez o typo autochthono da America como os Bascos e os Finnezes o typo aborigene da Europa. A ausencia de toda a deformação artificial no craneo da Lagôa Santa e em todos os outros que pertencem à nossa collecção, vem tambem provar que o uso dessas deforma- ções, tão introduzido nas antigas racas do Peru, da Bolivia e da Columbia ? era extranho às raças do Brazil. À esta regra se deve abrir apenas uma excepção si acreditarmos no que dizem Acúna e Condamine sobre os antigos Omaguas do Alto Amazonas, entre 03 quaes era usual à deformação dos craneos. As relações mais proximas dessa tribu com as raças da Bolivia e do Perú pódem muito bem explicar esse facto excepcional. Ainda ultimamente disse-nos o professor Hartt que em uma collecção de mais de 20 crancos por elle encontrados nos sambaquis de Santa Catharina nenhum apresentava signaes de deformação artificial. O cranco do Ceará, mais recente que o da Lagôa Santa, apresenta uma incli- nação do frontal tão exagerada que a fronte desapparece totalmente ! Não é isso o resul- tado de uma deformação artificial, porquanto todos os pontos desse fragmento estão em perfeita symetria e nenhum signal existe de compressão em toda a abobada craneana. Essa extrema inclinação da fronte foi tambem observada por Lund em alguns cra- neos fosseis da Lagôa Santa ?, o que leva-nos a admitlir que em tempos mui remotos 1 Les Esquimaux forment une famille qui se rapproche, selon lécole américaine, du type mongol, mais que les travaux de Wilson rattachent au contraire au type american. Dally. art Amérique do Dictionnaire Encyc. des sciences médicales pag. 618. 2 Vid. Congrés des Américanistes, loc. cit. 3 Referindo-se à inclinação da fronte nos craneos da Lagõa Santa, diz Lund em uma das suas car- tas: « Visto o interesse que se liga a estes objectos tomo à liberdade de mandar junto para ser offere- cido ao Instituto o desenho da parte superior de um destes craneos. Os anatomicos sem duvida extra- nharão a sua singular conformação a ponto talvez de duvidarem ser da nossa especie o que nos aconteceu tambem até o ter verificado por um exame circumstanciado. » (Revista do Inst. Hist. T. 4º pag. 86.) 74 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL existiu no Brazil uma raca caracterisada pela extrema depres:ão da fronte, caracter que vemos reproduzir-se ainda hoje, postoque em menor grão, nos craneos dos Boto- cudos. Em resumo, 0 estudo que fizemos nos 10 crancos da nossa collecção induz-nos a estabelecer as seguintes conclusões : Primo. — A raça primitiva do Brazil era dolicocephala. Secundo. — As raças indigenas acluaes representam a mistura dº dois typos diferentes. Tertio. — Das raças por nós estudadas a que mais se approxima da raça primi- tiva é a dos Botocudos. Quarto — Existiu em tempos remotos no Brazil uma raça caracterisada pola extrema depressão da fronte. Quinto. — O uso das deformações artificiaos do craneo ecra extranho à maior parte das racas indigenas do Brazil. Ao estudo das raças indigenas da Amerira, como bem diz o sr. Dally, ligam-se os problemas mais importantes e transcendentes da anthropologia. Com os poucos elementos, porém, de que dispõe hoje a sciencia, julgamos arris- cada qualquer conclusão positiva sobre a origem dos povos americanos. Os factos in- vocados pela escola de Morton” para provar a unidade ethnica das raças da America não se prestam ainda a incutir uma convicção no espirito daquelles que querem esme- rilhar essas questões; por outro lado a craniologia, a linguistica” e a propria geologia” propondo-se a rasgar as espessas sombras que envolvem o berço desses povos, não tem feito mais do que accumular hypotheses umas outras, e esse enigma secular que está constantemente a desafiar a curiosidade dos homens da sciencia, ainda não achou o Edipo que hade decifral-o. Se é verdade que a formação do novo continente pre-edeua formação do velho mundo, como quer Lund, fundado nas suas observações geologicas sobre 0 plateau central do Brazil”; si é exacto, como diz Morton, que as mesmas crencas, 0s mesmos costumes, os mesmos ritos e até a mesma lingua se encontram com pequenas differencas em todos OS povos esparsos no immenso territorio da America, não será talvez arrojada a propo- siçãao de Simonin * quando diz que 0 Indio americano é um producto do solo americano ! 1 Vid. artigo Amérique in loc. cit., pag. 616. 2 Vid. Morton-Inquiry into Aboriginal Races of America 1844 e Nott e Gliddon-Types of Mankind. 3 Vid. Fidel Lopez. Races aryennes du Perou. Couto de Magalhães. O Selvagem. Baptista Caetano Ensaios de Sciencia. * Vid. Lyell e Bennett Dowler sobre a antiguidade do Mississipe in Types of Mankind. 5 Lund, em uma de suas cartas publicadas na Revista trimensal do Instituto Historico Geographico Brazileiro, diz: « A natureza geologica do plateau central do Brazil demonstra que já existia como um extenso continente a parte central do Brazil quando as mais partes do mundo estavam ainda submergidas no seio do oceano universal ou surgiam apenas como umas ilhas insignificantes, tocando assim ao Brazil o titulo de ser o mais antigo continente do nosso planeta. » 8 S.monin LV Homme Américain. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL To Contra taes asserções, porém, oppoem-se innumeros factos e argumentos de valor, e quando objecções sérias e bem fundadas não vem abalar algumas dessas conclusões, pelo menos acha-se sempre uma hypothese mais ou menos provavel em logar do facto demonstrado que deve constituir lei em sciencia. Seja-nos, pois, lícito declarar que a respeito de taes questões não temos opinião formada, e quando no circulo das hypotheses provaveis houvessemos de aceitar alguna, seriamos polygenista com Agassiz. E possivel que a America fósse um dos centros da creação e que mais tarde povos emigrados da Asia ou de outros pontos do globo, mais proximos, viessem fundir-se com a raça primitiva, produzindo a raça actual. Tal é um dos grandes problemas propostos à sciencia do presente e que talvez a sciencia do futuro. chegue a demonstrar. CONTRIBUIÇÕES para o estudo anthropologico das raças indigenas do Brazil NOTA SOBRE A CONFORMAÇÃO DOS DENTES PELO DB. LALBADA PLhio CADA ——— me E pa Na distribuição das materias que formaram modernamente o vasto programma da anthropologia, o espirito humano mostrou-se logico procurando cathegorisar, segundo a sua importancia relativa, os variadissimos assumptos que entendem de perto ou de longe com o estudo das raças humanas. As questões fundamentaes collocadas no primeiro plano, apenas começam agora a assentar as suas balisas, convocando os esforços de numerosos obreiros empenhados em erguer um grande edificio à sciencia deste seculo. A anatomia comparada já concorreu com um notavel con- tingente, graças aos importantes trabalhos de Gratiolet, Broca c Pruner-Bey; a paleontologia humana abrio caminho com Lartet, seu fundador, e vae dilatando cada vez mais os seus dominios com as laboriosas investigações de Hamy e Quatre- fages; a archeologia estampa todos os dias as suas descobertas e tem para inter- pretal-as homens competentes como Evans e Mortillet; emfim em todas as pro- vincias dessa grande confederação scientifica surgem incessantemente trabalhos importantes e aptidões reconhecidas, que tendem a constituir um novo corpo de Voc. IV— FF. 14. 18 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL doutrina para a sciencia do homem considerado em relação à sua origem e às suas diferenças elhnicas. Entretanto, apezar dos valiosos documentos que se tem conseguido até hoje reunir para dar a demonstração de certas verdades duvidosas ou contestadas, não se póde deixar de reconhecer que o pesquizador empenhado em devassar os numerosos segredos dessa sciencia complexa, tem ainda diante de si um mundo desconhecido, cujos descobrimentos não se poderão realisar em toda a sua amplitude senão pelo trabalho de muitas gerações de sabios. Ainda bem que os primeiros sulcos estão traçados e tudo quanto de ora avante pudermos obter com a applicação dos nossos meios, será sempre um precioso legado para o futuro. Cada seculo tem a sua missão a cumprir como cada individuo o seu papel a representar no theatro da vida ou na communhão social; a do seculo actual é ——universalisar a sciencia e confraternisar os povos. Quando do outro lado do Atlantico os espiritos, ainda os mais positivos, se abalançam a discutir os dilliceis problemas relativos à origem e à descendencia do homem, quando do seio de todas as corporações sabias partem vozes, animando ao trabalho e à indagação scientifica como o mais seguro meio de achar uma solução para esses problemas, fôra um acto de criminosa indiferença cerrar os ouvidos a taes reclamos. Aqui na immensa vastidão deste mundo novo estão encerrados segredos que a sciencia precisa desvendar, thesouros occultos que a mão do homem não poude ainda tocar. Entretanto, as questões referentes à ethnologia e à antiguidade do homem na America não passaram sequer pelas primeiras provas; o que quer dizer que lhes tem faltado até aqui o apoio de grande numero de factos, unico pedestal solido sobre o qual se póde levantar uma doutrina scientifica. Mais tarde ou mais cedo, porém, o movimento imprimido aos espiritos la na outra banda do Atlantico ha de chegar até nós, inspirando-nos o dever de contri- buir por nosso proprio esforço para o esclarecimento de todas quantas questões interessem à sciencia do homem na America. Morton, Nott e Gliddon, Bancroft deram já o exemplo, assentando as bases de um codice anthropologico, applicado às racas indigenas do Novo-Mundo ; im- mensas, porém, são as lacunas que ficaram por preencher naquella obra empre- hendida sob um plano tão vasto. O Brazil não poude ter alli representação con- digna dos seus fóros de nação culta e adiantada, parecendo que na carreira das indagações scientificas a America do Sul segue mui distanciada a sua companheira do Norte. E” tempo, pois, de abrir caminho a esses commettimentos, explorando as nossas riquezas nos dominios anthropologicos e juntando-as aos thesouros já accumulados pela sciencia do velho mundo. As investigações que ora publicamos sobre a conformação dos dentes nas raças indigenas da America são mais uma prova do quanto desejaramos ser uti] a sciencia nesse ponto. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL + o H Uria ou outra observação destacada sem significação precisa nem importancia real para o estudo comparativo das raças humanas, eis tudo quanto se tem feito até agora sobre os caracteres dos dentes. No emtanto, o assumpto vale bem um estudo rellectido e minucioso, quando não seja por outra razão mais ponderosa, ao menos pelo valor que tem nas classificações zoologicas o conhecimento desses caracteres. Accresce ainda que esses orgãos formam, por assim dizer, appondices do esqueleto, e como taes devem acompanhar de alguma sorte as variedades ethnicas hoje reconhecidas e demonstradas em relação ao arcabouço osseo. São estes os motivos de ordem sºientifica que n)3 levaram a emprehender taes investigações tomando para objecto particular dellas as raças americanas. Examinando-se na nossa collesção de crancos indigenas os dentes que restam implantados nas duas arcadas alveolares, chega-se facilmente a descobrir nelles certos caracteres morphologicos, que pel sua constanciy e universalidade, pódem ser considerados caracteres de raça. Esses caracteres, porém, não são exclusivos das raças indigenas do Brazil, clles pertencem a quasi todas as raças da Ame- rica, como teremos occasião de provar no decurso deste trabalho. O primeiro facto que fere a attenção, olhando-se para as arcadas alveolares dos craneos indigenas do Brazil, são as fórmas pesadas, grosseiras c massiças dos dentes que orlam a arcada dentaria superior. Os incisivos apresentam-se largos com a sua Jamina um tanto envergada, e riscados na fac> anterior por dois sulcos longi- tudinaes quasi perpendiculares ao bordo livre; o gume é liso, embotado, mais disposto à feição de um instrumento triturante do que de um instrumento cortante. Na superficie do bordo livre desenha-se um pequeno sulco transverso formado pela disjuneção das laminas d> esmalte, em cujo fundo vê-s2 o marfim descoberto. Esses cara- cteres morphologicos «dos incisivos superiores achal-o-hemos mais accentuados ainda nos dentes bolivianos. (Vid. a fig. 5). E bem curioso que já nos dentes que guarnecem a entrada da cavidade oral comece a denun-iar-se esse apagamento ds linhas e de angulos, que veremos mais tarde transformar-se em lisura completa nos dentes molares. Os incisivos estão implantados um pouco obliquamente no bordo alveolar e a sua cravação é tão solida que se torna às vezes difficil arrancal-os da maxila. Os caninos comquanto mui desenvolvidos e munidos de uma longa raiz não offerecem, em geral, a fórma propria de instrumento lacerante. A sua ponta alisada, os seus angulos embotados fal-os approximarem-se da conformação dos pequenos molares. Alguns vimos cuja ponta era substituida por uma superície polida cortada em bisel. À côr desses dentes é, em geral, branca amarellada e d2 uma opacidade que contrasta perfeitamente com o brilho vitreo da camada adamantina na raça caucasica. Em alguns notam-se manchas escuras, disseminadas por pontos differentes da superficie do dente. Essas manchas, porém, parecem-nos devidas á acção do meio tellurico 80 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL em que estiveram mettidososcraneos, e tanto mais provavelse nos afigura esta hypothese quanto encontrámos na superficie dos craneos a que pertencem taes dentes manchas semelhantes. Um facto não menos digno de attenção quando se considera o estado de perfeição dos dentes nas raças indigenas do Brazil é a raridade da carie. Não podendo explical-a pela natureza e qualidade da alimentação, parece-nos tanto mais extraordinario esse facto quanto é certo que a destruição parcial das camadas do esmalte devia predispor os dentes para soffrerem desse mal. Apenas em um craneo da todos quantos formam a nossa colecção do Museu vimos os estragos da carie produzindo à perfuração dos incisivos. Passando dos caninos aos pequenos e grandes molares veremos a natural tandencia à lisura pronunciar-se cada vez mais. (Vid. a fig. 6). À conformação especial desses dentes constitu2 n verdade o caracter mais constante no systema odontographico das antigas e modernas raças di America. Acha-se elle bem representado não só n95 cran2os indigenas do Brazil, mas ainda nos crancos deformados da Bolivia, nos antigos craneos peruanos do Templo do Sol, nos craneos do Mexico, nos do alto Mississipe e do rio Columbia, nos do Tenness22, nos dos Chipeways, dos Charruas e dos Puelchas. As excellentes estampas lithographadas de Morion nos fornsceram os elementos para o estudo comparativo dos dentes nas raças americanas. Eis aqui em que consiste essa conformação : em vez das cuspides ou tuberculos que formam a corôa dos grandes molares nas raças civilisadas de hoje, encontra-se nas raças indigenas do Brazil e da America uma superiicie inteiramente plana, perfeitamente polida, como si fôra produzida por um meio artificial. Em alguns crancos esse polimento vai ao ponto de quasi nivelar a corda do dente com o bordo do alveolo. A camada pro- tectora do esmalte, que aliás é bastante espessa nas faces lateraes do dente, mostra-se totalmente destruida na corda dos grandes molares. Nos dentes da Bolivia, como se verá claramente na estampa que juntâmos a este trabalho, a superíicie lisa deixa algumas vezes de ser plana para apresentar uma pequena concavidade central munida de um bordo formado pelas paredes lateraes do denta; em outros a lisura é um pouco obliqua interessando ao mesmo tempo os dentes correspondentes das duas arcadas. (Vid. a fig. 4). Em alguns craneos do Brazil 03 grandes molares apresentam na superíicie lisa quatro pequenas cavidades situadas nos logares em que deviam existir os tuberculos. Estas pequenas variedades individuaes, porém, estão completamente subordinadas ao facto geral que é a lisura, e como tres não pódem ter senão um valôr secundario. O que carece ficar bem firmado é que tal conformação dos molares nós a observamos em individuos, cuja idade podia ser figurada por uma escala de 25 a AO annos. Nos premolares a lisura não é tão manifesta, mas ahi mesmo 03 tuberculos parecem rudimentarios e oflerecem superfícies mui polidas, em alguns delles chega-se mesmo a ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 81 não encontrar o menor vestigio de tuberculos, apresentando-se a corda inteira- mente plana. Os grandes molares inferiores são munidos de duas grossas raizes € os superiores de tres, muitas vezes unidas entre si. Ainda debaixo deste ponto de vista são numerosas as analogias morphologicas que se notam entre os dentes do Brazil e os da Bolivia. Essas analogias crescem de ponto quando ss examina a conformação dos incisivos bolivianos. Largos, triangulares, nimiamente espessos, riscados na face anterior por dois sulcos longitudinaes quasi perpendiculares ao bordo livre, inteiramente privados de gume, os incisivos bolivianos reproduzem os mesmos caracteres que apontúmos para os incisivos dos indigenas do Brazil. No su bordo livre as laminas do esmalte se separam egualmente para formar um sulco transversal, em cujo fundo está o marfim descoberto. Si alguma diferença é possivel enxergar entre os dentes destas duas raças, ella está apenas no grão de accentuação dos caracteres, que é maior nos incisivos da Bolivia. Comprehende-se bem a que conclus02s ethnologicas pódem levar as analogias odonto- graphicas das duas raças ; a extensa cordilheira dos Andes não podia constituir uma barreira insuperavel entre os territorios do Brazil e da Bolivia e portanto não é destituida do fundamento a opinião de que os povos que habitaram remotamente estas duas partes da America tiveram uma origem identica. À propria historia diz que as cruezas e per- siguições exercidas por Pizarro no Perú fizeram refugiar-se no territorio brazileiro numerosas tribus que viviam submettidas ao imperio dos Incas, provando deste modo a possibilidade da mistura das duas raças em tempos ainda mais remotos. O que se torna sobretudo notavel e ainda mais confirma essa opinião, é o grau de semelhança que se descobre entre os dentes da nossa raça prehistorica, representada pelos craneos fosseis da Lagôa Santa, e os dentes da Bolivia. Lund, o descobridor desses craneos, assim se exprime em uma carta publicada no Volume 5º da Revista do Instituto Historico Brazileiro : « Estes crane9s ao par d> conformidade com o typo da raça americana em geral, que já notei, exhibiram um caracter em que diferem de todas as raças humanas exis- tentes ; a saber na conformação dos dentes incisivos. Estes em vez de terminar por um córte transversal, como é proprio para esta classe de a apresentam uma superficie plana triturante analoga à dos dentes molares. Posto que não possa haver duvida alguma de que esta conformação abnorme provenha do gasto, não merece por isso menos attenção, tanto em razão de sua cons- tancia, sendo observado até nos crancos provindos de individuos novos, como por não se achar nada de semelhante em nação nenhuma moderna, e sim unicamente nas mumias ou corpos embalsamados do antigo Egypto. » À conformação de que falla Lund com referencia aos incisivos dos craneos da Lagôa Santa, não é outra cousa mais do que um grau adiantado da conformação dos incisivos bolivianos. Em presença de um facto tão constante e tão geral, como esse que acabamos de pôr em relevo, não podemos deixar de admiltir na conformação dos dentes molares e 82 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL incisivos mais um caracter distinclivo para as racas do Novo Mundo. Sem querermos contestar a influencia que o attrito possa exercer sobre essa conformação singular dos dentes, temos razões de bom quilate para aflirmar que neste caso a lisura não póde ser simplesmente o effeito de uma causa mecanica ou artificial. A principal dellas é fundada na observação dos dentes molares de dois craneos da nossa collecção, cuja idade é fixada em 7 annos para um, ce em 15 para outro e nos dentes de um craneo peruano de crianca estampado na grande obra de Morton. Nesses craneos, pertencentes a individuos muito novos, os dentes molares offerecem já uma conformação que os approxima muito dos dentes dos adultos. As cuspides pouco desenvolvidas, apresentam-se separadas por uma larga superficie plana em vez de serem por uma linha crucialcomo se vê commum- mente nos craneos europeus. D'ahi resulta que o attrito exercendo-se, durante a mastigação, mais directamente sobre a parte culminante das cuspides, estas se gastam com rapidez e põem-se logo ao nivel da larga supsríicie lisa que os separa. A confor- macão é portanto original, sómente ella se torna cada vez mais pronunciada à medida que o individuo cresce em idade. À causa mecanica representada pelo attrito ou à gastura não póde ser exclusivamente invocada neste caso porque os seus effeitos nos dentes de outras raças só se denunciam em idade muito avancada, constituindo então um caracter de velhice. Estamos longe tambem de admittir que a natureza e qualidade da alimentação do selvagem, consistindo muitas vezes em raizes fibrosasduras e resistentes, seja por si só capaz de explicar a lisura dos molares ; basta lembrar aos que assim julgam, que em diversas tribus, como a dos Botocudos, que se nutrem etelusivamente com os productos da caca e da pesca, se encontra essa conformação dos molares desde os primeiros annos da vida. Todas as outras hypotheses imaginadas para explicar esse facto, fóra de uma disposição natural ou congenita, não pódem resistir a uma analyse séria Encarando agora a questão sob um outro ponto de vista, somos levados a considerar a conformação geral dos dentes nas raças indigenas da America como um caracter de inferioridade ethnica. Percorrendo-se toda collecção de Morton e a nossa, que existe no Museu Nacional descobre-se logo à primeira vista um certo cunho de animalidade impresso na dentadura dos craness americanos. À notavel projecção para diante dos incisivos, a grossura dos molares e o desenvolvimento extraordinario dos caninos, que se observa em alguns Pelles, deve ter para essa raça a mesma significação anthropologica que a perfuração da fossa olecrancana, a depressão excessiva da fronte, e o plactynemismo do tibia. Observam-se nos dentes da Nova Zelandia certos caracteres morphologicos que os tornam um pouco semelhantes aos dentes das raças americanas; si porém submettermol-os à um exame detido e minucioso, veremos que taes semelhanças nao são senão apparentes, À conformação particular destes dentes é evidentemente produzida pelo emprego de um meio artificial. (Vid. as fig. 1.e 2).0 esmalte, que tem a brancura de perola, apresenta-se ali lascado em pontos diferentes, como si houvera soffrido os repetidos choques de um ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 8a instrumento rude qualquer. Nem de outra sorte poderiamos explicar a regularidide perfeita das duas arcadas dentarias, figuradas alli por duas linhas parabolicas superpostas, si não admittissemos a intervenção da limage. O uso do betel deve tambem ter a sua parte nessa conformação dos dentes da Nova Zelandia ; a essa causa são certamente devidas as manchas negras que se notam na face posterior dos incisivos, contrastando com a côr aperolada e o brilho vitreo de esmalte na face anterior. Na estimpa que acompanha este trabalho acham-se bem representados esses caracteres. Em conclusão : da serie de considerações que acabamos de fazer resulta que a conformação geral dos dentes póde servir como caracter distinctivo das raças da America, prestando-se ao mesmo tempo a reforçar as provas já reconhecidas da unidade do typo ethnico para os povos que habitaram antigamente e habitam ainda hoje as vastas regiões do Novo Mundo. soe BREVE NOTICIA SOBRE OS SAMBAQUIS DO PARÁ POR DOMINGOS S, FERREIRA PENNA. Naturalista viajante do Museu Nacional 1CADeas = RA Sm lim. dh. Wineclor Koval Inspirado pelo notorio interesse com que V. S. tem-se occupado do estudo das antiguidades do Brazil e pelo desejo de satisfazer aos meus compromissos, entendi ser conveniente seguir para Salinas, povoação da costa oriental do Pará, afim de ver os Sambaquis que, segundo informações pouco exactas, existiam juncto áquelle logar. Depois de muitas diligencias mal succedidas, consegui partir para alli a bordo de um velho e ronceiro barco à vela, em falta de melhor. Honrou-me com sua companhia nesta viagem o Dr. Orville A. Derby (da commissão Geologica Brasi- leira) que, para não perder os 10 dias, no fim dos quaes devia chegar da Bahia o seu collega Dr. Freitas, quiz ir estudar aquelles Sambaquis. Infelizmente, para o interesse da sciencia, o Sr. Derby vio-se obrigado a regressar à capital a bordo do mesmo barco, no dia seguinte ao da nossa chegada a Salinas, não só por termos perdido 6 dias no mar, mas ainda por que só então soubemos que já não existe Sambaqui algum nas visinhancas daquella povoação. Privado assim do Voc. IV — F. 15. 86 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL concurso das luzes do meu ilustrado amigo e companheiro, fiquei em Salinas onde tive de perder uma semana a espera de uma canôa que me conduzisse. As informações inexactas que m: haviam dado na capital collocaram-me em condicões tão desfavoraveis, que a minha viagem quasi que não passou de uma simples visita aos Sambaquis. Por mesquinhos, porém, que sejam os resultados obtidos, parece-me que será util expôr o que observei, dando uma breve Noticia das loca- lidades, do estado a que se acham reduzidos os Sambaquis, dos objectos que nelles tem sido encontrados, ete. O conhecimento destas e d'outras circumstan- cias terá ao menos o merito de mostrar o caminho aos futuros exploradores e de poupar-lhes muitos dos embaraços e decepções por que tive de passar e por que passam todos os que exploram pela primeira vez logares quasi desconhe- cidos. O littoral maritimo que sc inclina a E. S. E. desde a barra do rio Para ató a do Caitó é o lado-norte de uma Peninsula em fórma de um grande paral- lelogrammo, sendo os outros lados representados a E. e O. por aquelles dois rios e ao 3. pelo Guamá. A fóz deste ultimo, junto à cidade de Belém ca barra do Caitó, no oceano, são os polos da maior diagonal da Peninsula. Na Ponta do Pinheiro, 10 milhas ao N. de Belém, começa um cordão de Furos ou canaes naturaes que, com pequenas interrupções e à pouca distancia da costa, se prolongam até à barra do Cait:, donde ainda continuam até além dos limites orientaes da provincia. E por estes furos que transitam as canôas de pequeno porte que regressam da capital para o Salgado, denominação geral dada a todos os pontos dos Muni- cipios da costa por serem banhados por aguas do mar. A Peninsula é uma vasta planície sulcada de numerosos rios e coberta por uma floresta continua, excepto nas terras baixas do alto Quatipurá e seus aflluen- tes, nas quaes ha extensas campinas que os proprietarios de Bragança aproveitam para criarem gado; nesta Peninsula se acham, além da capital da provincia as cidades de Vigia e Bragança, as villas de S. Caetano, Curuçá, Marapamim, Cintra, Ourem e S. Miguel, e algumas pequenas povoações como Salinas, Quatipuru e S. João. Prescindo de outros pormenores para cingir-me à secção da Bahia de Salinas ao vio Juapirica por ser a que mais interessa agora conhecer. Da bahia de Salinas 5 milha a N. E. da povoação, entra-se por um igarapé, à rumo S. E., e depois de 5 a 6 milhas de navegação passa-se atravez de pantanaes cobertos de mangues, por um furo ou sulco de 2 metros de largura à outro igarapé que é o ramo principal do rio Arapipó. D'esle se vae successivamente, por iguaes vias, aos rios Inajá, Pirabas € Juapirica ; todos (rios, igarapés e furos) alimentados por agua salgada. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Po Posto que estes 4 rios apresentem em suas barras e a algumas milhas para o interior um desenvolvimento consideravel que os converte em verdadeiras bahias, o curso de cada um delles é muito limitado, não excedendo de 15 milhas de extensão; nem o podiam ter mais longo, pois que oulros muito mais caudalo- sos, como o Marapanim, Maracanã, Gualipura, ete., comprehendidos cgualmente dentro da Peninsula, não tem suas fontes senão nas baixas jacentes às proximi- dades da margem direita do Guamá. Entre a bahia de Salinas e a barra do Arapipó está a Ilha do Pharol, elevada do lado do mar, muito baixa e alagadiça do lado opposto. As outras ilhas estão a S E. da do Pharol, ficando a do Marinheiro entre os rios Guatipurá e Juapirica. A das Pirabas eleva-se do lado do mar, como a do Pharol, em collinas ornadas de arvores ramalhudas e de grande numero de palmeiras. Ao sopé da collina que avança para o mar mergulhando para E. 5. E,, achei extraordinaria quantidade de fosseis ou moldes e estampas de moltuscos e de outros animaes inferiores, ! que apparecem tambem, posto que menos frequente- mente, ao pé do Pharol e d'alguns outros pontos das terras altas da costa e até nas barreiras sobre que está a povoação de Salinas. No marne e cimento da Ponta das Pirabas ha uma rica mina a explorar quando tomar a industria na provincia algum desenvolvimento, liberiando-se da rotina que lhe tolhe 05 passos. Com o aspecto gracioso das ilhas, ao lado do mar, contrasta a ante-costa ou a facha de terreno alagadiço e esponjoso que se prolonga entre ellas e o continente; ahi impera quasi absolutamente o Mangue (Rhizophora) que fórma principalmente ao longo dos furos uma singular floresta com suas grandes raizes semi-enternadas no lodo e, com seus troncos às vezes seccos e contusamente cahidos uns sobre outros, ou elevando-se nús até quasi à summidade. E” ordinariamente no meio desta zona pantanosa e sombria que se oceultam os Sambaquis. Vou expôr a situação de cada um e o estado em que os achei, conforme as notas que tomei in situ, conservando o nome vulgar de Mina (de Sernamby) com que são geralmente conhecidos nesta provincia. * Mina do Apicuns—ao pé da boca de um pequeno igarapé que 1 Logo que regressei de Salinas communiquei ao Dr. O. Derby que se achava em Monte-Alegre a descoberta destes fosseis, enviando-lhe algumas amostras. O Sr. Derby achou mnelles os Eneas Cardium, Cardita, Trigonia, etc., entre os Lamellibranchios; Nerinca, Cypreea (2) Buccinum (2), EO entre os Gasteropodes e muitas especies de differentes generos de Bryoszoa, Coraes, etc. AU good Cretaceous forms, como diz a carta do mesmo Sr. Derby. 2 No Pará dá-se geralmente aos Sambaquis o nome de Mina de Sernamby. Nunca ouvi chamar Casqueiros e muito menos Ostreiras, nomes que certamente serião inapplicaveis aos Sambaquis desta provincia nos quaes nunca encontrei conchas de ostras senão em sua superficie AO podendo-se afirmar que ellas foram para alli levadas por alguns carregadores de Sernamby- 88 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL entra na margem direita do Arapipó e sobre terreno pedregoso que fórma alli uma especie de ilha com 3 metros de altura sobre o nivel do rio. Não medi a extensão do terreno por não poder romper o mato que o cobre ; mas o guia asseverou-me que a ilha acabava alli perto, no meio do Mangal. Este Sambaqui está completamente exhausto e ha já muito tempo foi aban- donado pelos exportadores de conchas; as que restam destas estão misturadas com terra preta, pedras e fortemente incrustadas, A vegetação aqui tem um vigor notavel; além d> muitas orchideaceas que cres- ciam por entre as conchas distinguia-se entre as arvores uma Carica de fructos pequenos e de folhas profundamente recortadas que apresentava proporções relati- vamente gigantescas; e bem perto della estava a grande touceira de uma Brome- liacea, — o Coroatá —, cujas folhas, enormemente longas se dobravam ao seu proprio peso, tendo perto de 6 metros de extensão. | Mina do “Tijolo — situada numa pequena ilha do Furo que communica o rio Inaja com o Pirabas. Está completamente extincto este antigo Sambaqui. Mina de S. João —em terra firme, à margem direita do Igarapé Axindêua e quasi na juncção deste com o rio Pirabas. E um Sambaqui extincto. Sobre elle e à custa delle se elevou, ha 2 annos, a pequena povoação de S. João, composta de uma capellinha e 12 casas, em grande parte dispersas e algumas fóra da área do Sambaqui. Ha annos acharam-se aqui varios ossos humanos; procurei descobrir alguns, mas reconheci que só por acaso é possivel achal-os, como se exprimiram as pes- soas do lugar. O tenente Mattos Muniz, principal morador de S. João, e homem muito ho- nesto, disse-me, perante diversas testemunhas que, numa restinga, perto da povoação, achára, ha mais de um anno, alguns ossos, inclusive «um craneo ainda com cabellos que, disse elle, já estavam vermelhos de tão velhos que eram» ; e acrescentou que ao pegar no craneo este se desfez quasi em pó. A restinga alludida tem sido invadida pelas ondas do rio, de sorte que a maré de enchente quasi totalmente a cobre. Tudo alli induz a crer que ella foi parte integrante da ponta do continente em que se acha o Sambaqui. i Cortando na base uma folha achei que ella media em EX TONSÃO. cre jo joio) tato sh fala fo o po fedor o as SRo oo: a te e ear to BARATO rara EAR om,725 Largura, à 1 metro-acima=da -“baso: Shea siso matei aiatoio O0m,081 » » » abaixo da pontas. caso. vierenio 0,045 Espessura, no lugar do -tórtesv.s..cbs. cscsaiscbiives tao 0,006 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 89 Mina do Vianna — quasi defronte da de S. João, ni oulra margem do Axindéua e em cima de uma collina pedregosa e muito arvorejada, que se eleva cerca de 15 metros acima do nivel do rio. Pertence a um particular que tem alli perto uma casa. O Sambaqui occupa na collina um espaço que não medi, mas que se póde calcular seguramente em 809) metros quadrados. Tem sido muito trabalhado e explorado; as camadas de conchas restantes estão- muito perturbadis e não se elevam já a mais de 1”,20 acima da superficio da collina, se é licito assim julgar pelo que observei em dous pequenos córies que consegui fizer em logares differentes. Os unicos objectos que aqui colhi foram fragmentos de louça grossa dos antigos indigenas. Mina da Corõda-Nova — no centro da ilha que fica entre os rios Guapirica e Pirabas ; este Sambaqui assenta sobre um terreno que foi outrora uma corda de arêa e que hoje os Mangues rodeam por todos os lados, menos pelo de N. E. em que a vegetação é diferente. E” de dominio publico, e como tal tem sido e continúa ainda a ser explorada, e arrasada pelos carrregadores de Sernamby. Segundo o testemunho de pessoas conspi- cuas, este Sambaqui formava uma collina tão alta que dominava as mais altas arvores da ilha, e da sua summidade se avistava perfeitamente o mar e os dois rios vizinhos ; agora o seu horizonte circumscreve-se aos troncos de Mangue, e sua altura sobre 0 nivel do Igarapé que alli vae ter, não excede de 6 metros. A collina de conchas cobria mais ou menos uma extensão de 80 metros sobre 60 de largura; o que resta deste antigo Sambaqui occupa ainda mais de metade da- quella área. As conchas estão nas mesmas condições das do Sambaqui do Vianna, tendo, porém, maior espessura as camadas ainda não muito perturbadas. O terreno em que se assentam esti em geral descortinado, e esta circumstancia tem concorrido para que as conchas se tenhão incrustado de modo a offerecer alguma resistencia às excavações, resistencia porém que desapparece completamente a alguns centimetros abaixo da superficie. Neste Sambaqui achei á pequena profundidade, algumas tenazes de carangueijo, fragmentos de louca grossa, e, á 40 centimetros de profundidade, já sobre a arêa, uma vertebra lombar humana e parte d'uma maxilla superior (objectos que se perderam na occasião do embarque) ; e em outra excavação achei, perto da superficie, uma especie de mó de granito muito polida e discoide, fragmentos de craneo, de um tíbia, etc. Testemunhas de conceito me informaram que ha alguns annos acharam-se neste Sambaqui dous esqueletos humanos inteiros, de bruços, ao lado um do outro e muito 90 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL unidos; mas infelizmente os ossos se abateram cahindo em miudos fragmentos no momento de se removel-os do seu jazigo. Mina Nova — situada no meio de um escuro Mangal e quasi à beira de um estreito igarapé que desemboca na margem esquerda do Juapirica. E” de dominio publico, e a mais pobree a menos interessante de todas as Minas de Sernamby que tem sido exploradas. O Sambaqui descanca sobre uma corda de arêa e de terra com 14 metros de extensão e quasi egual largura; as camadas de suas conchas não tem mais de 17,59 de altura mesmo nos poucos logares ainda não trabalhados. Não encontrei aqui objectos de interesse. Mina do Capitão Clarindo — no meio da ilha do Marinheiro, sobre terreno em tudo igual ao da Corôa-Nova. — E” propriedade particular do Ca- pitão Clarindo Pinheiro, que tem alli caza e um bom forno onde prepara a cal de que se suppre a Cidade de Bragança. O Sambaqui começa à beira do Mangal e acaba em terras enchutas que avançam muito para a margem do Qualipurá; sua extensão não é superior a 60 metros com uma largura de 4) a 45, e a aliura maxima, comprehendida a do terreno sobre que descança, é aproximadamente de 8 metros. A espessura das camadas de conchas nos pontos em que fiz à pressa alguns córtes, variou de 0,m40 a 2,m30, encontrando sempre no fundo aria mais ou menos misturada com terra um tanto escura. A falta de adherencia das conchas entre si foi a unica dificuldade que offere- ciam os córtes, pois que bastava tocal-as com um simples terçado ou faca para que descessem correndo como seixos rolados sobre um piano inclinado. Em dous córtes as conchas se mostraram dispostas em camadas regulares separadas por uma delgada cinta de terra escura de 3 a 4 millimetros de espessura. De todos os Sambaquis que visitei é este o que está menos destruido, tendo ainda muitas camadas intactas. Achei aqui algumas phalanges, uma maxilla inferior com 9 dentes, fragmentos de cranco, ete., e pequenos pedaços de louca. E” procedente deste lugar uma tosca mó dº quartz descoberta por um morador do Juapirica que m'a ofereceu. Em 1875 os trabalhadores do Sambaqui acharam um esqueleto humano dentro (fum grosseiro vaso de barro que estava soterrado no meio das conchas. O Capitão Ularindo mandou guardal-o ; passado: muitos dias o Vigario de Bragança tendo conhe- cimento do facto, foi ao lugar, arrecadou os ossos e regressando, mandou enterral-os no cemiterio publico. Poucos mezes antes da minha viagem, descobrio-se tambem neste Sambaqui ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 91 outros 03505 humanos entre os quaes femur, humerus e crancos de dimensões ex- traordinarias, segundo afíirmou-mo o Capitão Clarindo e foi-me confirmado pelo Dr. em sciencias naturaes R. A. Monteiro que os vio em Braganca na casa de um Inglez“que alli reside. Entre os fragmentos de craneo que com outros objectos ora remetto ao Museu, vae o de um parietal que encontrei no mesmo Sambaqui e cuja parede é tambem duma espessura fóra do commum. Não é só na ante-costa maritima que existem ou existiram grandes depositos de conchas, Sambaquis ou Minas d> Sernamby; apparecem tambem em muitos pontos do interior desta Provincia, principalmente à beira do Lago Grande das Campinas, perto da Costa meridional do Amazonas, quasi em frente de Obidos, e nas vizinhanças da costa oceidental do Tocantins, em diferentes districtos da Cidade de Cameti. Visitei ultimamente dous destes Sambaquis, o de Curuçá, perto da Cidade, e o de Jassapetuba a 10 milhas distante e ao Norte della. Ambos estão situados na extensa varzea em que se acham Cametá e todas as povoações banhadas pelas aguas do rio Pará. Explorados ha muito mais de um seculo e arrasados pelos fabricantes de cal, os dous Sambaquis estão ainda mais destruídos do que os da costa maritima; nem um d'elles se eleva hoje sensivelmenie acima do terreno circumvisinho. No de Curaçá que cecupa um espaço de cerca de 1,690 metros quadrados, man- dei fazer excavações em tres pontos e depois de remover-se de terra frouxa da superficie, cortando-se as numerosas raizes que embaraçavam esta operação, descobrio-se à pro- fundidade maxima de um metro, uma pequena camada de conchas, cuja espessura era de 24 centimetros. As conchas, todas d'agua doce, estavam geralmente deterio- radas, mormente as da camada mais baixa, que em grande parte se apresentavam como deluidas e quasi reduzidas a uma informe massa de brilho perolino que con- trastava singularmente com a côr negra da terra desmontada. Fazendo alargar um pouco a excavação notei que a camada de conchas conservava mais ou menos a mesma espessura. Um dos trabalhadores definio bem aquella camada dizendo: «i” uma toalha de prata. » As conchas principaes que alli encontrei pertencem aos generos Castaha e Hyria muito abundantes nos rios d'esta Provincia, Anodonta, Umio (apenas alguns frag- mentos) e outras bivalvas. A terra que se removia estava por toda a parte obstruida por pequenos Gasteropodes turriculiformes de boca não inteira / Melanopsis ?) Acima, quasi em contacto com a camada de conchas bivalvas, appareceram fragmentos da maxilla inferior dum grande mammifero carniceiro, provavelmente um Jaguara ou um Tigre, segundo indicam os dentes mollares encontrados no mesmo logar e um delles ainda inserto n'uma parte d'aquelte osso. Um humeros que tambem appareceu deve pertencer ao mesmo animal carniceiro. Não achei outros ossos. 92 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL O unico instrumento de pedra encontrado na excavação fui a metade (talvez) dum disco de grez compacto cuja utilidade não sei determinar por estar incompleto esse instrumento que póde ter sido um alisador de louça ou um martello, ou immersor de rede. D: louça encontrei tambem miudos fragmentos. O Sambaqui do Jassapetuba está em terreno de propriedade do tenente-coronel Valente Doce que, seguindo o exemplo dos seus antecessores, tratou de aproveitar o resto das conchas do Sambaqui para convertel-as em cal; como porém eram poucas e ja muito misturadas de terra, teve de abandonar essa industria por impro- ductiva. As escavações alli feitas deram resultado tão mesquinho, que a seu respeito me limito a dizer poucas palavras. A área que este extincto Sambaqui occupava era muito grande, talvez 3 ou 4 vezes maior do que à do Curuçá. Não a medi. A 30 centimetros abaixo da superficie, a escavação mostrou uma camada de conchas com menor espessura e no mesmo estado de deterioração das do Curuçá; ellas, porém, são geralmente bivalvas mui tenues, fracas e pequenas (Cyprina? ). Abundam egualmente aqui as pequenas conchas turriculiformes. As Castalias e Anodontas são menos frequentes, e desapparecem as Ampularias que m'aquelle outro Sambaqui abundam no meio da terra frouxa. Nos dous Sambaquis, as conchas, em todos os pontos que observei, repousam sobre um leito humido de argilla pallida e lodo, um pouco escurecido por detri- tos vegetaes, c é essa humidade permanente que mais ha concorrido para a de- | terioração das conchas. O terreno tornou-se fertilissimo e está coberto de viçosos cacaueiros, cafeei- ros e outras plantas uteis; e por entre estas e nas circumvisinhanças, as arvores silvestres modernas tomam um vigor e desenvolvimento que as tornam bem pouco differentes das das mais antigas da floresta. Nestas mesmas varzeas que formam a margem occidental do baixo Tocan- tins, ha, segundo informações exactas, outros Sambaquis formando um extenso cordão que começa 8 milha; ao S. e termina vinte e quatro milhas ao N, de Cameta, todos no mesmo estado e condições dos dous já descriptos. |” faril comprehender como e porque se acham os Sambaquis devastados e em total ruina, lembrando que ha mais de um seculo as suas conchas têm sido consumidas nas fabricas de cal. Concluo esta Jigeira notícia transcrevendo os dous seguintes trechos do Ro- tevro de Viagem, escripto em 1768 pelo erudito Arcypreste Dr. Monteiro de No- ronha, trechos que confirmam em grande parte as informações que me foram ministradas. * À Roteiro de Viagem da cidade do Pará aos ultimos dominios portuguezes no Amazonas, etc., ia Collecção de Noticias para a Historia e Geographia das Nações ultramarinas. Vol. 6 isboa—1856. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 93 « Entre à Villa-Viçosa ! e o canal do Limoeiro se acham dilatadas minas de Bribigões e as conchas marinhas * a que dão o nome de Sernamby, de que se faz consideravel quantidade de cal, que é outro ramo do commercio d'aquella Villa. « Das mesmas conchas ha tambem grandes minas no rio Canaticú da Ilha de Marajó e nos rios Maracanã e Merapanim. » De regresso à capital, recebendo o 1º n. dos Archivos do Museu Nacional em que vem transcripto o relatorio do Sr. Professor €. Wiener sobre os Sambaquis de Santa Catharina, li com o maior interesse este trabalho que, além de ter sahido da mão de um homem tão distincto no mundo scientifico, não podia chegar-me mais a proposito; e eu o tomaria por guia e modelo, si possuisse elementos sulflicientes para dar ao meu eseripto um caraster scientifico, em vez de encerral-o, como força é fazel-o, nos limites de uma simples Noticia. Lendo a descripção topographica dos Sambaquis de Santa Catharina, pare- ceu-me estar o Sr. Wiener a descrever a maior parte dos lugares que eu acabava de visitar, não differindo muito as suas das notas que tomei. Esta coincidencia de factos e circumstancias topographicas, à respeito de Sam- baquis situados em latitudes tão differentes, leva-me a pensar que as causas que produziram os do Sul foram em grande parte, as mesmas que deram origem aos do Norte. Ha, comtudo, alguns pontos em que os factos observados em Santa Catharina não coincidem bem com os observados no Para. Sem discutir estas differenças que podem ser muito reduzidas após investigações que aqui se fizerem de um modo com- pleto, exporei simplesmente o que pude observar, adoptando para maior clareza alguns dos capitulos do Relatorio do Sr. Wiener. Os Sambaquis marinhos ou costeiros estão geralmente reduzidos a pequenas, e, as vezes, mesquinhas proporções em relação ao que eram ha perto de 2 secu- los, em consequencia da grande exportação que desde então se tem feito de suas conchas para alimentar as fabricas de cal da capital. * Com excepção dos de S. Joio e do Vianna, todos se acham no meio dos Mangaes e 2 até 5 milhas distantes do mar. 1! E' hoje cidade de Cametá. 2 As conchas não são marinhas, mas sim fluviateis, havendo muitas terrestres. 3 Contei 8 barcos nos rios Pirabas e Juapirica, occupados em carregar Sernamby, e a de que mais 4 tinham partido carregados para a capital. O pan desses barcos tem capacidade ara 600 alqueires de Sernamby e o menor não carrega mais de 60. di e E E O anti posto na brita é pago a 500 rs. por alqueire e cada barco, tiradas as ei gd i e c Ti à e: H! >; Ú S á Ss bb deixa ao dono o lucro liquido de 10 a 308000, em cada viagem, não entrando na conta os Juros capital empregado e a despeza de reparos e de conservação do navio. À: E VoL IV — P.16. 94 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Quanto às suas fórmas é impossivel hoje determinal-as com alguma certeza, por se acharem muito derruidos e como que deslocados. As conchas que compõem os Sambaquis marinhos pertencem quasi unicamente ao genero Venus; alguns especimens de Arca e de Cardium e um de Terebra- tula, foram as unicas excepções que achei. E” certo que nas Minas da Corôa-Nova, do Clarindo, coutras, appareciam, à superficie, restos de ostras, Pholas, Trochus, Bullimus, ete.; mas eu as não considerei como fazendo parte dos Sambaquis; tendo sido muito provavelmente para alli levadas pelos lripolantes das canôas. No mesmo caso estão as tenazes de carangueijos, os ossos de Peixe-Boi e de Antaços de Urutinga, Pescadas e outros peixes muito estimados que constituem, com a farinha, a principal e, às vezes, unica alimentação dos habitantes da costa. Não encontrei vestigios de ignição nos Sambaquis, pois que considero estra- nho a estes um ou outro pequeno pedaço de carvão que achei em incrustações de conchas com restos de crustaceos, como se vê da amostra que tambem faço hoje seguir. Entretanto é bem possivel e mesmo provavel que taes vestígios se des- cubram em alguns córtes e excavações que para o futuro forem feitas. Objectos colhidos nos Sambaquis. = Já os mencionei na parte descriptiva, e estão relacionados em notas que os acompanham. Alguns dos objectos seguem no mesmo estado em que se achavam nos Sambaquis, para mostrarem a sua cór local. “e ynthese. — As observações que tenho de fazer sobre alguns pontos da Synthese com que o Sr. Wiener concluio o seu relatorio devem ser entendi- das unicamente com applicação aos Sambaquis do Pará. Examinando e analysando a construcção dos Sambaquis por todas as suas faces, peca por peça, o insigne Naturalista, além das conclusões a que chegou, emitlio as seguintes proposições : 1.º Que corpos humanos nunca foram depositados inteiros nos Sambaquis ; 2º que elles são tambem restos de refeições dos Indios e que a carne humana era provavelmente mais apreciada do que qualquer outro alimento; 3º que os Indios dos Sambaquis eram um povo que só via no seu semelhante um objecto de alimentação. Estas proposições não me parecem applicaveis aos Sambaquis do Pará. Contra a 1º temos o facto, testemunhado por pessoas de conceito, de se ter ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 95 encontrado, como já ficou referido, na Mina da Corda-Nova, dous esqueletos humanos inteiros e unidos um ao outro,e ni do Clarindo, — outro não só inteiro mas encerrado em uma urna, à guisa das dos Aruans de Marajó e do Maraçá, na Guyana Brasileira. Quanta à 2º e 3º creio estar bom averiguado que os Indios (ao menos do Pará e Amazonas) ainda os mais anthropophagos, não comiam carne human como quem come mariscos c peixes, nem mesmo para satisfazerem a fome, e segura- mente nenhum delles júmais vio no seu semelhante 10n simples objecto de alimen- tação! Os mais ferozes comiam, sim, a carne humana, mas só a dos seus wumigos e não a comiam sinão para satisfazerem ao seu excessivo odio e extraor- dinario espirito de vingança. Edade dos Sambaquis. — O Sr. Wiener estudando com seu cos- tumado criterio os Sambaquis de Santa Catharina, calculou a sua edade em 2 a » seculos. Resta examinar si este calculo é egualmente applicavel aos do Pará, ou por oulras palavras, si estes são originariamente contemporaneos dos dº Santa Calharina. Eis um problema de dificil solução, para cuja discussão não estou preparado, por faltarem quasi absolutamente os dados indispensaveis. Vejamos, porém, si com o recurso de alguns factos e de hypotheses, póde-se achar alguma luz que nos guie no meio das trevas em que tão interessante assumpto se acha en- volvido. Visitando os Sambaquis notei que a maior parte dos da Costa estavam as- sentados sobre corôas de arida e lodo, actualmente cercadas de mangues até al- gumas milhas distantes do mar. Notei egualmente que os fluviaes ou os de Cametá, hoje cobertos e rodeados de grandes arvores, repousavam sobre um leito de argila escurecida por detrictos vegetaes, — fórma ordinaria dos depositos alluviaes que, com 03 nomes de Praias ou Baixos, apparecem no meio do leito ou à beira do Tocantins, do baixo Amazonas, e outros grandes rios do Para. Não se podendo admittir que os selvagens fossem exercer sua glutonaria no meio das maltas de Cametá ou do; mangres da Costa, pois não achariam lá os mariscos que procuravam, parece que sº deve concluir que elles começaram a acampar-se alli nr épocha em que aquellis corôas e praias acabavam de se elevar do seio das aguas, privadas ainda de qualquer especie de plants. Não é isto levar muito longe a edade dos Sambaquis. Nestes climas equi- noxiaes as condições hydrographicas são sujeitas a tantas variações e mudanças acceleradas quanto é extraordinario o desenvolvimento da vida vegetal. As provas abundam por toda a parte e os numerosos phenomenos desta ordem se repetem com uma variação admiravel em cada anno. 96 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Quanto ao povo que deu origem aos Sambaquis, é força convir que deviam ser selvagens sem noção alguma de agricultura, vivendo da caça, habitando parte do anno as terras enchutas ou altas, onde abundavam animaes de cuja carne se nutriam; que as suas malocas no começo do verão, acompanhando o movimento decrescente das aguas e a emigração dos animaes, desciam para o littoral ou para as planicies onde cada uma levantava sua tenda sobre uma collina, corda de arta ou praia abandonada pelas aguas, e ahi passavam a estação vernal, nutrin- do-se principalmente de molluscos, cujas conchas vasias eram atiradas a esmo em torno das tendas, do mesmo modo que os ossos de animaes e todos os restos de cosinha. Si durante a estação fallecia algum destes Malacophagos, seu corpo, na forma do costume geral dos selvagens, era sepultado alli mesmo, no meio das conchas amontoadas e o mais perto possivel da rede em que dormia o pae, mai, irmão filho ou mulher do fallecido. Esto é repugnante, como observa o sr. Wiener, mas era um costume geral que ainda hoje subsiste e que conslituia uma demonstração de veneração e ami- zade ao fallecido de quem os parentes não se queriam separar. Estas scenas da vida selvagem se reproduziam em cada verão e, à marci dellas, cresciam e avultavam os materiaes que constituiram os Sambaquis. Não ha elementos para se dizer quaes foram 03 selvagens que formaram os Sambaquis marinhos do Pará; e, pois, nada direi sobre elles. Quanto aos fluviaes ou os de Cameta, pódem-se enunciar algumas idéas ou hypotheses com o soccorro alguns, ainda que raros, dados historicos que possuimos. E” claro que os Sambaquis do Pará nada devem aos Tupinambás ; e penso tambem que não se póde attribuil-os aos Tupinaes, pois que, não obstante a opinião muito respeitavel do autor da Noticia do Brazil, parece não haver pro- babilidade de terem elles estendido seu dominio até o Pará. Tem-se averiguado que grande numero de tribus selvagens do Perú emigraram para as regiões orientaes, fugindo ao contacto da civilisação que os Incas conquis- tadores tinham introduzido e propagavam, mesmo a ponta de espada. Mallocas de rebeldes, vencidos e perseguidos, atravessando montanhas e florestas, ou seguindo os valles dos rios, chegaram à planície e acamparam onde melhor lhes convi- nha ; umas postaram-se nas margens do Amazonas superior e outras desceram até à confluencia do Madeira e Tapajós e mesmo até perto do occeano. Entre outros povos emigrados do Perú contam-se os Muras, os Mundurucis (Muturucú) e os Tapajós ou Tapayós. Os Nhengaibas que habitavam as mattas e ilhas da Costa O. e S. O. da Ilha de Marajó não podiam deixar de ser uma tribu de nação dos Muras com os quaes se confundiam, tanto por seus costumes grosseiros e brutaes e caracter ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 9 audacioso, como pela sua admiravel pericia na navegação especial dos furos, iga- rapés e lagos, a cujas margens tinham suas tendas volantes à guisa dos Muras. Eis aqui povos peruanos acampados longos annos quasi ao pé da barra do Pará! | E este facto nos faz crer que outras tribus, apossando-se das terras ba- nhadas pelo Tocantins, nellas acamparam e deram origem aos Sambaquis de Ca- metá. No lado occidental da Provincia foi Dem conhecida a tribu Tapayós que os- cupava as margens do rio deste nome. Parece que a estes Indios se póde attri- buir os sambaquis que existem no territorio que elles habitavam ou que ficava sob sua influencia, como os da Fazenda Taperinha, à E. de Santarem; os das Campinas do Lago Grande; e emfim um outro muito proximo à margem direita do Amazonas e quasi em frente à cidade de Obidos. Assim, bem que na ausencia quasi completa de dados indispensaveis, seja presentemente impossivel determinar com alguma certeza a idade destes Samba- quis, creio que se poderá admitir que elles começaram a formar-se numa épocha correspondente ao estabelecimento ou consolidação da Monarchia dos Incas no Perú. Faço votos para que a hypothese aqui registrada tenha o merito de chamar a attenção dos homens scientificos, convidando-os a discutirem este assumpto, ainda muito obscuro, mas de um alto interesse para o nosso paiz. “Vou terminar com um Aviso — aos futuros exploradores dos logares por mim visitados. Eu disse no começo deste escripto que informações innexactas collocaram-me em condições as mais desvantajosas para bem desempenhar a minha missão à costa do Pará. Tinham-me efectivamente affirmado, na capital, que a viagem à Salinas não excederia de 60 horas — 2 a 2 e meio dias : gastâmos 148 horas, ou 6 dias. Affirmavam que em Salinas havia montanhas de Sernamby e que eu acharia tudo em abundancia : viveres, canôas, trabalhadores, etc. À primeira noticia que em Salinas achamos foi que já não havia minas de Sernamby senão muito longe d'alli. Tive de ficar uma semana inteira naquella povoação, esperando que appa- recesse uma canôa para levar-me ás minas de Sernamby. Nesse interim procurei 1 Entre as tribus de Marajó, a unica que se achava em contacto com o occeano era à dos Aruáns Não alludo aqui a estes indios, que não considero originarios do Perú, e que eram superiores a todos os outros do Brazil por certo gráu de progresso a que tinham chegado, especiais arte ceramica, como o attestam os seus artefactos de que o Museu Nacional possue copiosos e bellos exemplares. 1 98 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL em vão contractar dous ou tres trabalhadores para fazer excavações nas minas ; apezar da offerta de vantajosos salarios não obtive nem um, nem mesmo dentre vs rapazes que passavam as tardes a jogar a peteca no largo da povoação. Chegou afinal uma canôa e freteia. A tripolação constava do dono da canôa e de um filho deste. Nenhum delles sabendo cosinhar, o meu criado supprio esta falta e arvo- rou-se em mestre cosinheiro, arte que elle exerceu pela primeira vez na sua vida. Comprei para a viagem todo o mantimento que achei à venda; isto é: 1 kilogr. de arroz pilado, 1 gallo e 2 paneiros de farinha, unico genero que havia em abundancia. O dono da canda obrigou-se a levar um pote cheio de agua potavel. Mas no primeiro dia de viagem fomos assaltados pela sêde durante 4 horas, por ter-se esgotado a agua que levavamos. Não achamos caça em parte alguma, com excepção dos Guarás que eram muito esquivos. Em compensação os peixes eram tão abundantes naquela estação que os pes- cadores se admiravam da generosidade com que eu lhes pagava meia duzia de ex- cellentes pescadas por um bilhete de 500 reis. (Quem tiver de transitar pelos Furos para evitar os perigos e encommodos do mar, deve antes de partir fazer uma grande provisão de paciencia para supportar esta enfadonha viagem. Tem de atravessar extensos pantanaes, escuros e desertos, onde não ha outros viventes além dos caranguejos, Aratús (Sesarma) que com a maré cheia se abrigam nos troncos e raizes dos mangues, e de uma chusma de Maroins que começam sua campanha às 6 horas da tarde e acabam às 7 horas da manhã se- suinte. Tera frequentemente de precipitar ou abandonar o seu servico, embarcar e remar a toda pressa para não perder a maré e ficar encalhado no lodo dos Mangaes ou em seco sobre cordas de ara em plena bahia, exposto a ventos rijos e a alagações quasi infalliveis. Nos furos, a regra é parar a cada momento, à espera da enchente para que a canda possa sahir dos atoleiros. Tera emfim de experimentar toda a sorte de decepções e privações, às vezes mesmo sêde e fome, si da capital não levar comsigo e ás suas ordens um pessoal suficiente, ferramentas, viveres, tudo emfim quanto é necessario 20s tra- balhos projectados e à alimentação quotidiana. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL E istes pormenores podem parecer superíluos à maior parte dos homens, ainda aos mais doutos que não estiverem familiarisados com os costumes e condições dos habitantes e com as disposições physicas dos lugares tão pouco povoados; pa- recerão” mesmo triviaes e enfadonhos aquelles que só tem viajado de cidade em cidade, à bordo de vapores, com todas as commodidades e boa companhia. Nunca, porém, serão demais para 03 homens scientificos que a nobre ambição do saber obriga tantas vezes a longas e penosas viagens. Belém do Pará — Outubro de 1876. D. TJ. Herrera Eenna - E us [a b COMPUTO GERAL das collecções zoologicas existentes no Museu Nacional Ordem Quadrumanos. » » MAMMALOGIA Familia Catarrhinos. Platyrhinos. » » » » Genero Gen. Pithecus. » Hilobates. Cercopithecus. » Lagothrix. Cebus. » Pithecia. » » Especies (Satyrus Geoffr.) Troglodytes » Lar (Il.) Petaurista (Cuv.) Cephus » Aethiops » fuliginosus » mona » rubrus » niger (Kuhl.) seniculus » ursinus » marginatus (Geoffr.) paniscus » arachnoides — » hypoxanthus (Kuhl.) cana (Geoffr.) fatuellus (Pr. max) robustus » Satanaz (Geoffr.) leucocephala » rufiventer » monachus » inusta (Spix.) dubia (Mus.) Borneo. Guiné. India. Guiné. » Abyssinia. Africa. » » Amazonas. » St. Catharina. Pará. » Rio de Janr.º. » Pará. Rio de Jane.º. » Pará. Matto Grosso, Vot. IP. lí. 102 ordem Quadrumanos. » » » Insectivoros. » v » Familia Platyrhinos. Espinhosos. » Musaranhos. » Genero Brachiurus. D» Nietipithecus. » » Callithrix. » » » Chrysotrix. Hapale. Lemur. Pteropus. » Molossus. » » Phylostoma. » » » » Noctilio. » Diclidurus. Glossophaga. » » Pteroderma. Desmodus. » Vespertilio. » Centetes. Erinaceus. Sorex. Talpa. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Isspcecies rubicundus (Geoffr.) calvus » felinus (Spix.) vociferans » Oseryi (Geoffr.) torquata » nigrifrons (Spix.) donacophilus » cuprea » caligata (Wagr.) Gigot (Spix.) dubia (:) sciuria (Wagr.) labiata (Georffr.) pileata » bicolor (Wagr.) Devillei » Ursula |» Rosalia (Pr. max.) Chrysopyga (Wagr.) pennicillata (Kuhl) melanura . » catta (Greoffr) Keraudren (Nat.) Edwardsi (Geoftr.) obscurus (Cuv.) acuticaudatus (Desm.) ferrugineus (?) hastatum (Pr.. max.) supersiliatum » lineata » lilium (Geoffr.) infundibulum (Geoflr) cirrhosum (Spix.) crenulatum (Georffa.) dubium (?) dorsatus (Geoffr.) leporinus » albus (Pr. max.) soricina (Geoffr.) écaudata » amplexicauda (Georll.) perspicillatum |» rufus (Orb.) dubius (.) polytherix dubius (2) ecaudatus (Illig.) europeus (Lin.) vulgaris » europea . » Amazonas. » Maranhão. Pará. Perú. Pará. Bahia. Amazonas. Pará. Amazonas. Esp. Santo. Pará. » Amazonas. » » Pará. » Bahia. S. Paulo. Rio de Janr.º. Pará. Madagascar. Australia. Madagascar. Brasil. » Ceará. Brasil. » » » Paraguay. Pará. Ceará. » Brasil. » Madagascar. Europa. » » Ordem Carnivoros. » » Marsupios. Familia Felinos. » » Caninos. » » » Viverrinos. » » Mustelinos. » » » » Utrsinos. » » Phytophagos. » » Sarcophagos. » » » Genero Felis. » Canis. » Viverra. Paradoxurus. Erpestes. Lutra. » Enhydris. Gulo. Mustela. » » Galictis. » Mephitis. Meles. Cercoleptes. Nasua. » » Procyon. Ursus. » » Macropus. » Halmaturus. Phalangista. » Didelphis. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL domestica » onça » niger (Var.) pardalis (Lin.) macroura (Pr. max.) Yaguarundi concolor Eiyra leo (Lin.) familiaris. (Lin.) lupus » jubatus (Desm.) brasiliensis (Burm.) Azarae magellanicus (2) Vulpes (Lin.) griseus (Gray.) geneta (Lin.) musanga (Gray.) Ichneumon (Wagr.) brasiliensis (Pr. max.) vulgaris (Lin.) marina (Fl.) arcticus (Desm.) putorios (Lin.) zibellinus » martes » Erminia » vulgaris » lutreola » barbara (Wagr.) vittata (Burm.) suffocans (Lichts.) vulgaris (Desm.) caudivolvolus (TIL) socialis (Pr. max.) rufa (Desm.) solitaria (Pr. max.) cancrivorus (Desm.) aretos (Lin.) tibetanus (Cuv.) americanus (Pall.) giganteus (Gm.) nalabatus (Gould.) brachyurus vulpina (Desm.) Cooki (Dum.) palmata (Burm.) aurita (Pr. max.) albiventris (Lund.) Quica (Tem.) Iispecies Europa. Brasil. » » Africa. » Europa. Brasil. » »n Pará. Europa. Brasil. Europa. Australia. Africa. Brasil. Europa. » D » » Brasil. » » Europa. Minas. Brasil. Europa. Azia. Est.-Unid. Australia. » Brasil. 103 104 ordem Marsupios, » » Desdentados. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Yamíilia Sarcophagos » Ouricos. » Muriformes. » » Murinos. Monotremados. Vermilingues. Cavadores. » Gencro Didelphis. » » Perameles. Dasyurus. Lepus. » Cavia. » kerodon. Hydrochoerus. Coelogenys. Dasyprocta. » » Cercolabes. » Myopotamus. Echinomys. Spalacopus. Mus. » » Octodon. Myodes. Arv'cola. » Castor. Spermophilus. Sciurus. » Ornithorhynchus Manis. Myrmecophaga. » » Dasypus. » » » » Iispecies nudicaudata. (Desm.) aflinis (Wagr.) tristriata. (Huhl.) cancrivora (Burm.) domestica (Wagr) tricolor » myosurus. (Wagr.) viverrinus (Geoffr.) timiens (Lin.) variabilis (Pall.) brasiliensis (Pr. max.) cuniculus (Lin.) cobaya (margq ) apereá (Erxl.) rupestris (Wagr.) capybara (Erxl.) paca (Reng) Aguti (Lin) Azarae (Lichets.) Acuchy (Desm) villosus (Waterh ) prehensilis (Bradr ) coypus (Geoffr.) hispitus (Desm.) Paeppigi (Wagl.) Tectorum. musculus (Lin.) sylvaticus » ratus (vaz. albinus.) Gumingii (Tsch.) lemnus (Pal.) terrestris (Lin.) arvalis » fiber » citillus (Bl.) vulgaris (Geoffr.) varius » aestuans (Pr. max.) palmarum (Briss.) Igniventris (Wagr.) bothae () paradoxus (Blumb.) javanica (Desm.) jubatata (Lin.) Tetradactyla (Lin.) didactyla » sexcintus » novemeinctus » gymnurus (Hl) trcinctus (L.) gigas (Cuv.) Brasil. » Amazonas. Australia. » Europa. » Brasil. Europa. America. Brasil. » » Amazonas. Brasil. » » » Chili. Brasil. » Europa. » Perú. Russia. Europa. » America do N. Europa, » » Brasil. Africa. Amazonas. California. Australa, Asia. Brasih. » » » ordem Desdentados. » Multungulados. » » Ungulados. » » » P.n'pedos. » » Crtaceos. » » Ordem Rapaces diurnos » » Familia Tardigrados. » Suinos. » » Bisulcos. Tylopodes. Phocaceos Sirenios. IRAN EAST O LEG A: Familia Vulturideos. » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Genero Bradypus. » » Chaloepus. Dicotyles. » Tapirus. Catoblepas. Ovis. Antilope. Capra. Cervus. » Auchenia. Phoca. » » Deiphínus. » Manatus. Gencro Vultar. » sarcoramphus. » Cathartes. » Neophron. Gypaétus. Polyborus. Ibieter. » Buteco. » Iospecies tridactylus (Cuv) torquatus (Olf,) cuculiger (Wagl.) didactylus (Illig.) labiatus (Cuv.) torquatus » americanus (Lin.) taurina (Sm.th.) domesticus » spinigera (Tem.) hireus (Lin.) rufus (Cuv.) capreolus (Lin.) tarandus — » Dama » Antisiensis (D'Orb.) Paco (Desm.) annellata (L |) barbata (miil.) pusilla (Lin) rostratus (Cuv.) delphis (Lin.) australis (L'n.) Espccics fulvus (Lin.) cinereus (Lin') Papa (Dnm.) Gryphus (Dnm.) foetens (Pr. max.) aura » percnopterus (Sav.) barbatus (Storr.) Caracará (Spix.) Leucogaster (Vieil.) chimango (Spix.) vulgaris (Lin.) lagopus » 105 Braz ]. by » Guyana. Brasil. » » Africa. » » Europa. Brasil. Europa. » » Perú. Bolivia. Europa. Brasil. » Europa. » Bras. Amer. do Sul. Rio de Janr.º. » Africa. Europa. Brasil. » » Europa. » 106 Ordem Rapaces diurnos Familia Falconideos. » » Falconideos. » » » » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Genero Buteco. » Morphnus. » Spizaétus. » » Aquila. » Haliactus. Pandion. Harpya Herpetotheres. Falco. » Harpagus. Ietinia. Rostrhamus. Gymindis. » » Permis. Milvus. » Elanus. Mauclerus. Astur. Micrastur. Accipiter. » » » Isspecies skotopterus (Pr. max.) busarellus » rutilans (Lichts.) Pterocles (Tem.) poecilonotus (Cuv.) tricolor (Orb.) guianensis (Burms.) Urubitinga. ornatus (Burms.) atricapillus (Cuv.) tyrannus (Tem.) heliaca (Sav.) chrysactus (Cuv.) albicilla (Selby) Quvialis (Vieil.) destructor (Burm.) cachinnans (Vieil.) peregrinus (Lin.) oesalon (Temm.) tinunculus (Lin ) aurantius » sparverius » deiroleucus (Tem.) rufipes (Bechst ) tinunculoides (Nat.) subbuteo (Lin.) rufifrons (Pr. max.) fringillarins (Drap.) femoralis (Tem.) berigora (Nilo.) diodon (Tem ) plumbea (Burm.) hamatus (Hlig.) unicinatus » cayennensis (Tem.) vitticaudus (Pr. max.) apivorus (Lin.) regalis (Bris.) niger » melanopterus (Dand.) furcatus (Vig.) palumbarius (Lin.) magnirostris (Pr. max.) musicus (Dand.) ater (Vieil.) hemidactylus (Tem.) brachypterus (Hlig.) vulgars (Cuv.) graciliis (Tem ) xantho thorax ((Tem.) minor ? » Brasil. » Europa. » » Brasil. » » Europa. » » Brasil. Asia. Brasil. Australia. Brasil. Europa. » » Brasil. » Europa. Brasil. Africa. Brasil. » » Europa. Brasil. » » ordem Rapaces diurnos. » Rapaces noctur. » Zygodactylos. » Familia Falconideos. » D» ) Strigidae. » » » » » » » » » » » » » » » » » » » » » Psittacideos (Pa- pagaios.) » » » » » » » » » » » » » » » » » » » » » » » «enero Circus. » Surnia. » Athene. Noctua. Bubo. » » Ephialtes. » Otus. Strix. » Ara. Maracaná. » Cacatua. » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL lispecies rufus (Br.s.) cyaneus (Meyer) palustris (Pr. max.) cineraceus (Meyer) funerea (Gould) nictea » uralencis » aluco », pulsatrix (Pr. max.) cunicularia (Say.) passerina (Gould) minutissina (Pr. max.) ferruginea » Tengmalmi (Gould.) passerinoides (Tem.) maximuns (Bonap.) virginianus (Briss.) magellanicus (Cuv.) zorca (Key.) brasiliana (Pr. max.) vulgaris (Bonap.) brachyotus (Gem.) maculatus (Pr. max.) virgatus (2) flammea “Lin.) perlata (Lichts.) macao (Lin.) ararauua (Lin.) Hyacinthina (Lath.) severa (Lin.) Nligeri (Kuhl.) primoli (Bonap.) nobilis (Lin.) guianensis (Lin.) auriacapillus (IIJ.) lutea (Spix) melanura (Spix.) canicularis (Lin.) guarnba (Kuhl.) flaviventris (Splx.( cruentata (Pr. max.) ninus (Spix.) undulata » viridissima (Pr. max.) leucoptera (2?) xantoptera (Spix.) chrysocephala » versicolor (Lath.) patagonicus (Vieil.) galerita » cristata » Europa. » Brasil Europa Brasil. » Europa. Brasil. » Europa. Brasil. Europa. America. » Europa. Brasil. Europa. » Brasil. » Europa. Brasil. Australia. » 107 108 Ordem Zygodactylos. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Familia Psittacideos. Picidae (Picapãos) » » Gencro Iispecies Calyptorhynchrus funeçeus (Gould) » Aprosmictus. Platycercus. » » Euphema. » Melopsittacus. Nymphicus. Lathamus. Trichoglossus. » Palaeornis. Nestor. Pjonus. » » Tríclaria. Ps ttacus. » » Dryopicos. Picus. » » » Picoides. Micropicos. Celeopicos. Leachii » scapulatus » Pennantii » eximius » flaviventris » aurantia » elegans » undulatus » Novae-Hollandiae (Wagl.) d.scolor (Gould.) Swainsonii » concinnus (Vig.) pusillus JGould.) arimanon (Lev.) dubius (2) Alexandri (Lin.) Novae-Zelandiae (Lath.) flavirostris (Spix.) menstruus (Lin.) purpureus (Burm.) cyanogastra » erithacus (Lin.( pulverulentas (Pr. max.) amazonicus » vinaceus » Pettrei (Lev.) diadema (Spix.) festivus (Lin.) xanthops (Spix.) aestivus (Lin.) leucogaster (Kuhl.) maipouri (Lev.) Barrabandi (Leo.) chrysaeura (Swaius ) melanota (Lichts.) passerina (Lin.) rubricollis (Lco.) mitrata (Pr. max) robustus » lineatus » albirostris (Vieil.) rubricollis (Lin.) martius: » major » leuconotus (Wolf.) medius (Lin ) minor » tridactylus. (Laccep.) dubius (?) flavescens (Pr. max.) Australia. » Africa. Australia. Brasil. Africa. Brasil. » » Mexico. » Pará. Brasil. » » Africa. Brasil. » Rio de Janr º. Ordem Zygodactylos. » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Familia Picide (Picapãos) » Yungineos cicollos.) » (Tor- Cuculideos (Cucos) » Ramphastideos Genero Celeopicos. B)) Dendropicos. Chloropicos. » » Chrysopicos. » Leucopicos. Melanopicos. » » Zebrapicos. Geopicos. » » Picumnus. Yunx. Indicator. Cuculus. Edolius. Chrysococeyx. » » Dromococeyx. Cultrides. Diplopterus. » Phaenicophaeus. Rhinothera. Centropus. » Zanglostomus. Crotophaga. » Guira. Iispecies Nlavescens (Lath.) jumana (Spix.) Hartlaubii (Malh.) viridis (Lin.) canus (Gem.) erythrops (Vieil.) aurulentos (Tem.) capensis (Lin.) melanochloros (Lin. passerinus » dominicanus (Vieil.) flavifrons (Spix.) hirundinaceus (Spix. erythrocephalus (Gem.) carolinus (Lin.) auratus » campestris (Pr. max.) labrator (Lev.) minutissimus (Tem.) torquilla (Lin.) minor (Lev.) canorus (Lin.) cineraceus (Vig.) honoratus (Lin.) flabelliformis (Lath.) serratus (Spaz.) lucidus (Gould.) cupreus (Lin.) Klaasi (Cuv.) auratus (Lin.) seniculus (Pr. max.) erythrophtalmus. melanorhynchus. cajana (Lin.) rutila (Vieil.) brachyptera (Less.) fazianellus (Pr. max.) Geoffroyi (Tem.) naevius (Pr. max.) punctatus (Vieil.) viridirufus (Vieil.) dubia (2) nigrorufus (Cuv.) senegalensis (Lin.) sumatranus (Rafll.) major (Lin.) ani » piririguá (Vieil.) 109 Pará. » Africa. Europa. » Brasil. Pará. Africa. Brasil. fsts.-Unids. America. Amer. Sept. » Africa. Brasil. Europa. Africa. Europa. Australia. Azia. Africa. » Australia. Africa. » » Rio de Janr.º. » » Brasil. » » Ceará. Brasil. » » Azia. Africa. Azia. Brasil. » » VoL. I— F. 18 10 Ordem Zygodactylos. (Zygodaetylos.) Duvidosos, » » » Familia Tucanos.) Bucconideos. » » Galbulideos. » Galbulideos. Musophagineos. » » » » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Gencro Ramphastos. Pteroglossus. Pogonorhamphus Laimodon. » » Bucco. » Calorhamphus. Micropogon. Capito. » » » Monosa. » » Chelidoptera. Galbula. » Jacamaralcyon. Galbaleyrhynchus Jacamerops. Trogon. » Turacus. Toco (Gould.) Cuvieri (Wagl.) Ariel (Vig.) vitellinus (Ilig. (Gould.) dicolorus Humboldti inscriptus Beauharnaisi bitorquatus Azarae maculirostris Gouldi Langsdorffi nigriróstris Bailloni (Wagl dubins (Gem.) niger » Chrisopogon (Tem.) philippensio (Gem) Lathami (Cuv.) cayennensis (Lin.) macrorhynchus (Lin.) melanotis (Sipix.) melanoleucus (Gem.) maculatus ) » ) albifrons (Spix.) nigrifrons » tranquilla (Vieil.) fusca Pr. (max.) phaioleuca (Tem.) tenebrosa (Pal.) viridis (Pr. max.) paradisea (Lath.) albirostris » Tombacca (Spix.) mansuela (Nal.) melanura (7) (Mus.) tridactyla (Vieil.) brevirostris (?) leucotins (O. des m.) grandis (Germel.) collaris )Vieil.) variegatus (Spix.) atricollis (Vieil.) melanopterus (Swairs ) ) aurantius (Spix surucura (Vieil nigricaudata (Swairs.) resplendens (Gould.) persa (Lin.) Paulina (Tem.) ) Especies Brasil. » Africa. » Azia. » » Pará. Brasil. » » Africa. » Ra Ordem Duvidosos. » » “ Passeres. » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Familia Genero Musophagineos. Turacus. » Schizhoris. » Musophaga. Syndactylos (lon- girostres). Momotus. » » » » » » Coracideos. Euristomus. » Coracias. » » » » Buceratincos. Buceros. » » » » » » » Tockus. Meropineos. Merops. » » » » » » » Melittophagus. » » Halcedinideos. Ceryle. » » » » » » » » » » » Alcedo. » » » » » Dacelo. » Halcyon. » » » » » » » » » » » Todiramphus. Manakinideos. Manacus. » » » » » » » » » » » » » » » » » » » » lispecies cristatus (2) africanus (Groy.) violacea (lurt.) cuficapillus (Pr. max.) brasiliensis » ? var de ruficapillus. mexicanus*(Swairs.) orientalis (Gem.) garrula (Lin.) Abyssinica (Gem,) Bengalensis » rhinoceros (Lev) sylvestris (Vieil.) javanicus (Cuv.) coronatus » erythrorhynchus (Less |) apiaster (Lin.) Cuvieri (Vieil.) nubicus » superciliosus (Lin.) Bullockii (Vieil.) viridis (Lath.) torquata (Lath.) aleyon » amazona » americana (Pr. max.) bicolor (Lath.) supercilaris (Burm.) ispida (Lin.) cristata » rudis » gigantea (Lath.) fuscicapilla (Harll.) chlorocephala (Lath.) collaris » senegalensis » cinereicephala (Buf.) cinnamominus (Swairs.) divinus (Less.) gutturosus (Lin.) rubrocapillatus (Bris.) strigilatus (Pr. max.) pareolus (Less.) erythrocephalus (Less.) leucocapillus » aureolus » eyanocapillus (?) longicaudautus (Pr. max.) militaris (Burm.) filicaudatus (?) ml Africa. » » Brasil. » Azia. Europa. Africa. India. Azia. » Arica: Europa. Africa. Azia. Amazonas. Amer. Sept. Brasil. » Pará. » Europa. Australia. Africa. Australia. Azia. Africa. Azia. Africa. Azia. Australia. » Brasil. 112 ordem Passeres. » Deodactylos (fis- sirostres. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Familia Manckinideo. » Eurilamideos. Capriumigidac. » » Caprimulgideos Nyctibius. » » » Hirundinideos. » » Trochilideos. » Gencro Manacus. » Piprides. Metopia. Pardalotus. » » Phoenicireus. Rupicola. Cymbirhynchus. Podargus. Nyetidromus. » Caprimulgus. Hydropsalis. » » Chordeiles. » Podager, Steatornis. Cypselus. » » Acanthyils. Collocalia. » Hirndo. Chelidon. » Procne. » Phaetornis. » » Pygmornis. » Grypus. Glaucis, » Eospecies Laplacii (D'orb.) serenas (Lath.) pileata (Tem.) galeata (Burm.) cristatus (Tem.) punctatus (Gould.) striatus » carnifex (Lin.) aurantia (Steph.) macrorhynchus (Vig. Cuvieri » guianensis (Pr. max.) ruficollis (Tem.) europaeus (Lin.) forcipatus (Beske.) psalurus (Tem.) fuscus (2) semitorquatus (Lin.) Nattereri (Tem.) nacuuda (Vieil.) grand's (Gem ) aethereus (Pr. max.) cornutus (Burm.) caripensis (Humb.) Apus (Lin.) mella » (minimus ?) callaris (Tem.) esculenta » n'ger (2) rustica (Lin.) daourica (Lath.) leucoptera (Pr. max.) jugularis » minuta » melanoleuca » leucomelas (2) urbica (Lin) arborea (Gould.) domestica (Az.) Eurynome (Less.) Guyi (Gould.) intermedius (Gould.) Longuemareus » rufigaster » naevius (Spix.) hirsuta (Gould.) Dohrni » Brasil. » Australia. » Brasil. Amazonas. Azia. Australia. Brasil. » Europa. Brasil. es Brasil. » » » Europa. » Brasil. » Asia. » Europa. Asia. Brasil. Europa. Australia. Brasil. Ordem Tenuirostres. » Familia Trovhilideos. Genero Eupetomena. Campilopterus. » Aphantochroa. Lampornis. » Heliomaster. Leucippus. Thaumatias. Polytmus. » Amazilia. » Erythronota. Hylocharis. » » Chrysuronia. Eucephala. » » Chlorostilbon. » » Saphironia. Topaza, Florisuga. » Oreotrochillus. Petasophorus. » Patagona. Thalurania. » » Eustephanus. Chrysotampis. Helisothrix. Clytolaema. Docimactes. Pterophanes. Helianthea. » Coeligena. Burcieria. Lafresnaya. Eriocnemis. » Panoplites. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL hirundinacea latipennis obscurus cirrochloris grammincus mango mesoleucus albicollis brevirostris albiventris Linnaei viridissima virescens viridicaudus buryllina pristina elegans saphirina cyanea lactea Oenone caerulea mauguei cyanogenys prasinus Aliciae Portmanni Gaudoti pella atra mellivora leucopleurus anais serrirostris gigas Eryphille furcata glaucopis galeritus moschitus aurita rubinea ensiterus Temminckii typica Bonapartei Prunelli torquata flavicaudata cupreiventris vestitus flavescens Juspecies Gould.) 113 Brasil. N. Granada. Brasil. Antilhas. Brasil. 4 Ordem Tenuirostres. » Familia Trochilideos. Genero Heliangelus. Heliotrypha. Augastes. Metallura. Adelomya. Ramphom'cron. » Oxipogon. Cephalepsis. Lophornis. Polemistria. Gould a. Discura. Spathura. Lesbia. » Cynanthus. Rhodopis. Calliphos. Selasphorus. Heliactis. Thaumastura. Drepanis. Promerops. Nectarina. » » » Dicacum. Caecreba. » » » Certhiola. Daenys. Ptilotis. » » » Acanthorhynchus Melithreptus. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Clarissae. Parzudaki scutatus tyriantina maculata microrhynchus dubjus Gerrini Delalandii magnificus chalybea Langsdorfh longicauda peruana amaryllis gracilis cyanurus vespera amethystina rufus cornuta cora occinea (Gem ) caffer (Lin.) aurifrons (Vieil.) Isspecies » » senegalensis (Lin.) chalybea (Vieil.) violacea » Hasseltii » famosa » pulchella (Lin.) splendida (Vieil.) sperata (Lin.) rubrater (Less.) sanguinca » madagascarensis (Vieil.) ornata metallica dubia (2) hirundinaceum (Lath.) cyanca (Pr. max.) caerulea » spiza » cyanomelas » (2) flaveola (Pr. max.) cyanocephalus (Cuv.) leucotis auricomis » penicillatus » chrysops » tenuirostris » lumulatus » (Gould.) » » Brasil. » » » » Perú. Brasil. » » Perú. Brasil. California. Brasil. » Oceania. Africa. » » Oceania. Africa. » » » Brasil. » » Australia. » » Ordem Tenuirostres. (trepadores.) » Familia Neectarincos. » » Meomorphineos. Paradiscideos. Certhiideos. » » Anabatidae. » » » » Furnariideos. » » Genero Melithreptus. Meliphaga. » » Creadion. » Phyllornis. Anthornis. Acanthogenys. Prosthemadua. Tropidorhynchus. Enthomyza. Myzautha. Callaeas. Paradisea. » Selencitis. Rhinopomaster. Dendrocolaptes. Xiphorhynchus. Nasica. Sittasomus. Picolaptes. » Dendroplex. Ticho-droma. Sitta. Sitella. » Xenops. » Anabates. » Tinactor. Oxiramphus. Synallaxis. » » Furnarius. » » » Lochmias. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL lispecies gularis » Novae-Hollandiae Gould.) sericea » australiana » lunulata » carunculata » malabaricus (Gem.) melanura (Vig.) rufogullaris » Novae-Zelandiae (Gould.) corniculatus » Cyanotis (Swairs.) garrula (Vig.) cinerea (Toreter.) Apoda (L.) rubra » alba » cyanomelas (L.) decumanus (Spix.) procurvus (Tem.) longirostris (Lichts.) olivaceus (Pr. max.) tenuirostris (Lichets.) rufus (Pr. max.) picus » muraria (Lin.) europaea » crythrops (Gould.) chrysoptera » striolata (Spix.) anabatoides (Spix.) cristatus (Spix.) leucophthalmus (Pr. max.) ruficollis (Spix.) rufus (Vleil.) superciliosus (2) rufosuperciliatus (?) atricapillus (Pr. max.) fuscus » flammiceps (Tem.) max.) cinerus » rutilans (Tem.) pallidus (Pr. max.) albescens (Tem.) Tibicens » rufus (Vieil.) ruficaudus (Pr. max.) albogullaris (Spix.) fuliginosus (Less.) nematura (Lchts.) caudacutus (Pr. Australia. » Asia. » Australia. Europa. Australia. Brasil. » » » Africa. Brasil. » » 5 116 ordem (trepadores.) » » Deodactylos Den- tirostres. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Familia Furnariideos. Upupincos. Alaudideos. » = (e) — o [e ta [= [= o o Pp De » Cinclineos. Formicarideos, » Genero Upucerthia. » Upupa. Geositta. » Certhilauda. Alanda. » » Galerita. » Melanocroypha. Pyrrhulauda. Otornis. Macronyx. Anthus. Motacilla. » Cinclus. Formicarius. Pitta. Cinclosoma. Grallaria. » Megalonyx. Conopophaga. » Pithys. Merulaxis. Seytalopus. Myrmotherula. Formicivora. » TFerenura. Herpsilochmus. » » » Isspecies Dumetoria (Gorffs.) vulgaris (Orb.) epops (Lin.) Chii (Pr. max.) correndera (Vieil.) fulva (Drap.) pectoralis (?) bifasciata (Lchts.) arvensis (Lin.) brachydactyla (Lin) deserti (Tem.) cristata (Lin.) arborea » calandra (Boié.) melanocephala (Tem.) penicillatus » Ameliae (Tar.) pratensis (Bechst.) aquaticus » rufogullaris (Tem.) rufescens » australis » alba (Lin.) barula (Gould.) flava » Yarelli » neglecta » aquaticus (Lin.) ruficeps (Spix) brachiura (Gould) punctatum (Vig.) Rex (Pr. max) marginata (Pr. max.) megapodius (Kings.) aurita (Vieil.) perspicillata (Lafr.) leucophris (Spix.) ater (Tem.) albiventris (Lafr ) gularis (Spix.) melanogaster (Spix.) cinereiventris » polbbocephala (Pr. max.) malura (mat) squamata (Lichts.) maculata (Pr. max.) pileatus (Lichts.) leucophrys (2) ferrugineus (Tem.) ater (2) Chili. Brasil. Europa. Brasil. » Europa. » Nubia. Europa. » Australia. Europa. Brasil. Australia. » Brasil. Ordem Deodactylos Den- tirostres. Yamilia Formicarideos. » » Vireonineos. Thamnophilineos. » » » » » » » » » » » » » » » » » » » » » » 1] » Turdineos. » » » » » » » » » » » » » » » » » » » Gencro Myothera Myrmecisa » Menura Vireosylvia Thamnophilus » » Thamnomanes Cyclorhis » Fluvicola » Machetornis Tacnioptera » Lichenops Pycnonotus » Turdus » Merula » Mimus » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Isspccies domicella (Pr. Max.) loricata (Lichts.) Ssquamosa » Lyra (Lin.) agilis (Lichts.) major (Vieil.) guttatus » Leachi (Such.) doliatus (Pr. Max.) scalaris » nigricans » palliatus (Pr. Max.) Swainsoni (Lichts.) lineatus » dubius (2) caesius (Lichts.) Wiedii (Pelz.) Guianensis (Gem.) mystacea (Pr. Max.) bicolor (Gem.) rixosus (Vieil.) Nengeta (Bonap.) velata (Lichts.) moesta » dominicana (Vieil.) icterophrys — » macroptera (2) perspicillata (Gmm.) fuscater (Lev.) chrysorrhaeus (Tem.) viscivorus (Lin.) musicus » iliacus » pilaris » migratorius » rufiventris (Pr. Max.) crotopezus » albiventris (Spix.) albicolls » carbonarius (Pr. Max.) collaris (Lev.) reclamator (Lev.) pileatus » ferrugineus (Pr. Max.) pallidus » harmonicus (Gould.) vulgaris (Lin.) torquata (Gesn.) lividus (Pr. Max.) saturninus » IB! Brasil. y Australia. Brasil, »H u » Africa. » Europa. » Brasil. » » Africa. » Brasil. » Siberia. Australia. Europa. » Brasil. » VoL- Ro 9 118 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ordem Yamilia Gencro Isspecies Deodactylos Den- tirostres. Turdineos. Mimus brasiliensis (Pr. Max.) Brasil. » » » cinereus (?) Est.-Unid. » Saxicolineos. Petrocincla saxatilis (Vig ) » » » » tyanea » » » » Bessonornis pheenicurus (Vig.) » » » Saxicola acnanthe (Lin.) » » » » rubicola » » » » » rubetra » 2) » » » leucomelas (Gould.) » » » » Arsinoê » » » » » leucura (Berl.) Africa. » » » cachinans (Gould.) Europa. » » » macroura (2) Africa. » » » incomta (Borl.) » » » Accentor modulares (Lin.) Europa. » » Syalia Wilsonii (Swain) America do N. » » Sericornis osculans (Gould.) » » » Phoenicura ruticilla (Swain.) Europa, » » Rubecula erythaca (Lin.) » » » Cyanecula suecica (Br.) » » Troglodytineos. | Tatare otaitensis (Less.) Australia, + » Troglodytes europeus (Cuv.) Europa. » » Thryothorus platensis (Pr. Max.) Brazil. á » » striolatus » » » » » minor (2) » » » » albescens (2) » » » Ramphocenus gladiator (Pr. Max.) » » » Malurus cyaneus, (Lath.) Australia. » » » Lamberti (Vig.) » » » » melanocephalus (Vig.) » » » Stip'turus malachurus (Lep.) » » » Cysticola exilis (Gould.) ) » » Cincloramphus rufescens » » » » Bombycilla garrula (Lin.) Europa. » » » americana (Wils.) America. » » Parus major (Lin.) Europa. » » » atricapilus (Lin.) » » » » ceruleus » y » » » niger (Lev.) Africa. » » Mecistura caudata (Leach.) Europa. » » Panurus biarmicus (Koch) » » » Parvoides pendulinus (Lin.) » » Syloiideos. Syloicola icterocephala (Lath ) Amer. Sept. » » canadensis » » » » » estiva (Gmm.) » » » » speciosa (Pr. Max.) Brasil. » » » venusta » » » » Mnyotilta varia (Lin.) Amer. Sept. » » Trichas marylandica (Lin.) » » » » canicapilla (Pr. Max.) Brasil. Ordem Deodactylos Den- tirostres. » Familia Syloiideos. Psarideos. » » » Tyrannideos. » Muscicapiadeos. » » » » » Goecncro Hylophilus » » » » Zosterops Jora Acanthyza » » Phyllopneustes » Regulus » Salicaria » » » Aedon Calliope Curuca » » Muscicapa Bathmidurus » » Pachyramphus » » Psaris » » Scaphorhynchus » Attila » Saurophagus Tyrannos » » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Isspecies ruficeps (Pr. Max.) guira » melanoxanthus » auricoma (?) dubius (?) » thoracicus » pecilonotus — » dorsalis (Gould.) Ceilandica » nana » lineata » chrysorhaa » trochilus (Lin.) rufus (Bonap.) ignicapillus (Lichts.) vulgaris (Cuv.) olivetorum (Strikl.) palustris (Gould ) phragmitis » arundinacea » rubiginosus (Meyer.) Lathamii (Gould.) orphea » atricapilla — » cinerea » grisola (Lin.) albicollis » multicolor » phenicea (Gould.) australis » macroptera » miniata (Lev.) aurantia » melanoleucus (Cab.) marginatus (Lichts.) variegatus (Spix.) nigriceps (Lichts.) validus » mitratus » brasiliensis (Swain.) semifasciatus (Spix.) guianensis (Burm.) Pitangua (Lin.) audax (Gm.) cinereus (Pr. Max.) uropygialis (Cab.) sulphuratus (Lin.) furcatus (Pr. Max.) albogullaris (Burm.) rufinus (Spix.) Brasil. Australia. » » Europa. Asia. Australia. » » Africa. » Brasil. n9 120 ordem Deodactylos Den- tirostres. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Yamilia Muscicapiadeos. » » » Genero Tyrannos Milonlus Myiarchus Elenea » » Myionectes » Tyraunulus » Seisura Muscipeta » » » Drymophila Rhipidura » Euscarthmus » » » Triccus D » Platyrhynchus » » Myiobius Cyelorhynchus Megalophus Muscivora Copurus Gubernetes Alecturus » Arundinicola Cnipolegus » Ilspecies violentus (Vieil.) vetula (Lichts.) rusticus » ferox (Gm.) sibilans (Lichts.) erinitus (Gm.) cinereus (Cab.) miles (Lichts.) coronata (Pr. Max.) pagana (Lichts.) spadicca (Cab ) brevirostris (Spix.) aibicollis (Vieil.) rivularis (Pr. Max.) obsoleta (Tem.) rufiventris (Cab.) oleagineus — » elatus (Vieil.) omnicolor (Swain.) inquieta (Gray.) chrysoceps (Pr. Max.) fuscata » Paradisii (Lev.) mutata » alecte (Tem.) albiscapa (Gould.) flabellifera (Gm.) nigricans (Vieil) stenurus (Cab.) ferrugineus (2) amaurocephalus (Cab.) ventralis (Nat.) cinereus (Strickl.) poLocephalus (Pr. Max.) gularis (Nat.) auricularis (Vieil.) cancroma (Lichts.) rostratus (Vieil.) rubeculo des (Vieil.) barbatus (Pr. Max.) flaviventer (Spix) regius (Swains.) ferruginea (Lin.) felicauda (Spix.) Yiperu (Lichts.) psalurus (Tem.) tricolor (Vieil.) leucocephala (Pal.) comatus (Lichts.) carbonarius (Pr. Max.) Brasil. » » » » Australia. Brasil. » Africa. » » Australia. » Brasil. » Asia. Brasil. Ordem Deodactylos Den- tirostres. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Familia Muscicapiadeos. » Querulineos. » » Tanagrideos. » » » Goncro Cnipolegus Bachycephala » Artamus » Philochloris » » Culicivora Querula Lipangus » Coracina Cephalopterus Gymnoderus Chasmorhynchus » Ampelis Ampelidon » Phibalura Proenias Chlorophone Euphone » » Caliste » » » Iispcecies cyam'rostris (Vieil.) glaucura (Gould) pectoralis » rufiventer » sordidus » arcuatus (Swains.) remigialis (Eresn.) chrysoptera (Lichts.) leucogastra (Pr. Max.) rubricolls (Tem.) cineraceus (Cab.) sibilatrix (Pr. max.) scutata (Tem.) ornatus (Geoflr.) foctidus » nudicollis (Tem.) variegatus » purpurea (Lichts.) Pompadora (Lin.) lamelipenis (Lafr.) (Lin.) mayana » cayana cotinga » cincta (Gray.) albiventris (7) cuprea (2) cucullatus (Cab.) melanocephalus (Cab.) flavirostris (Vieil.) ventralis (Illig.) viridis (Vieil.) chlorotica (Lin.) violacea (Pr. Max,) musica (Lichts ) rufiventris » laniirostris (Orb.) Lichtensteinii (Cab.) cyanocephala (2) rubricollis (Tem.) punctata (Lin) yeni (Orb.) tatao (Gm.) citrinella (Tem.) flava (Lin.) gyrola » cayana (Gim.) psttacina (Spix.) ruficapilla (2) viridis (.) brasiliensis (Lin.) Brasil. Australia. » India. Australia. Brasil. » » 12] 122 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ordem Família Genero Isspecies Deodactylos Den- tirostres. Tanagrideos. Caliste vittata (Lin.) Brasil. » » Cypsnagra ruficollis (Less.) » » » Tanagra sayaca (Lin.) » » » » cpiscopus » » » » » palmarum » » » » » flammicrps (Pr. Max.) » » » Saltator similis (Orb.) » » » » nigrifasciatus (?) » » » Dicopis fasciata (Lichts.) » » » Aremon silens (Pr. Max.) » » » Ramphocelus nigrogularis (Spix.) » » » » jacapa (Gm.) » » » » coccineus (Vieil.) » » » Orthogenys viridis (Spix.) » » » Orchesticus capistratus (Pr. max.) » » » » atra (Lin.) » » » Pyranga missisipensis (Gm.) » » » Tachyphonus cristatus » » » » » nigerrimus (Pr. Max.) » » » » flavocristatus (?) » v » » archiepiscopus (Pr. max.) » » » » gularis » » » Tanagrella cyanomelas » » » » elegantissima » » » Lamprotes ruficollis (Spix.) » » » Nemosia Rourii (Cab.) » » » » pileata (Bodin.) » » » Pyrchocoma ruficeps (Strickl.) » » » » thoracica » » » Oriolideos. Oriolus galbula (Lin.) Europa. » » » nigriceps (2) Azia. » Laneiideos. Campephaga fimbricata (Lev.) India. » » » virescens » » » » Laniarius senegalensis » Africa. » » » zeilonicus » Azia. » » » ferrugineus (Viell.) Africa. » » Lanius excubitor (Lin.) Europa. » » » rufus (Namn.) » » » » minor » » » » » collurio (Gm.) » » » Falcunculus frontatus (Gould.) Australia. » » Vanga destructor (Cuv.) » » » Barita leuconota (Gould. » » » » organicum » , » » Strepera anaphonensis » » Conirostres. Coroideos. Chrypsirhina varians (Vieil.) Azia. » » Temnurus vagabundus (Gould.) » » » tilonorhynchus | holosericeus (Huhl.) » » » Garrulus glandarius (Lin.) Europa. » » Cyanocorax cristatus » Est. Unid. Ordem Conirostres. » » Familia Coroideos. » » Sturnineos. Icterideos. » » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL zenoro Cyanocorax » » Pica Nucifraga Corous » » » » Pyrrhocorax Gracula Gymnops Buphaga Lamprotornis » Pastor » Acridotheres Sturnus Quiscalus Psarocolius Scaphidurus Ostinops » » Cassiculus Molothrus » » » Sturnella Trupialis Amblyrhamphus Agelaius Iuspecies erythrorhynchus (Gould.) Gubernatrix (Tem.) cyanomelas (Cuv.) cayanus » azureus » Stelleri (Lev.) Bechii (Vig.) californicus (2) cristatellus (Cuv.) pileatus (Illig.) cyanopogon (Pr. Max.) hyacinthinus (Cab.) vulgaris (Lin.) caryocatactes (Lin.) frugilegus » monedula » corone » cornix » corax » vulgaris (Cuv.) religiosa (Lin.) calva » africana (Lev.) metallicus » morio (Cab.) aurata (Lev.) aethiops » roseus (Lin.) pagodarum (Lath.) tristis (Vieil.) vulgaris (L.) lugubris (Cab.) unicolor (Pr. Max.) ater » cristatus » bifasciatus (Spix.) angustifrons » viridis » persicus (Lin.) hemorrhous (Lin.) diadematus (Tem.) ater » albirostris (Burm.) violaceus (Pr. Max.) fringilarius » ruficapillus (Vieil.) atroolivaceus (Pr. Max.) Ludoviciana (Lin.) militaris » ruber (Gm.) predatorius (Bartm.) 1253 Azia. Mexico. S. Paulo. Pará. Rio Grd. do S. Africa. California. » S. Paulo. » Ceará. S. Paulo. Europa. Azia. » Africa. » » Europa. Brasil. » » Mexico. Brasil. » » Amer. Sept. Chili. Brasil. Amer. Sept. 124 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Ordem Familia Genero Iuspecies Conirostres. lcterideos. Leistes anticus (Licht.) Brasil. » » » auriventer (2) » » » » superciliares (Nat.) » » » » erythrothorax » » » » Ieterus Jamacaii (Pr. Max.) » » » » auratus (2) » » » » communis (Gm.) Mexico. » » » femoralis (Lin.) Brasil. » » » humeralis (Museo Nacional.) » » » » cayennensis (Lin.) » » » Yphantes Baltimore (Vieil.) Amer. Sept. » » Gymnomystax citrinus (Spix.) Brasil. » Plocideos. Ploceus bicolor (Vieil.) Africa. » » » aurifrons (Tem.) » » » » velatus (Vieil.) » » » » striolatus (Mus. de Berl.) » » » » personatus (Tem.) » » » Passer domestica (Lin.) Europa. » » » montana — » » » » » petronia » ) » » Quelea sanguinirostris (Lin.) Africa. » Viduineos. Vidua longicauda (Lath.) » » » » paradisca (Cuv,) » p » » serena » » » » Enplectes ignicolor (Vieil.) » » » » majanoides (Tem.) Azia. » Estreldineos. Estrelda Astrildii (Lath.) Africa. » » » rufibarbi (Licth.) » » » » trochlouytes (Lath.) » » » » senegala (Lichts.) » » » » cyanosternum (?) » » » » sanguinolenta (Tem.) » » » » temporalis (Astr.) Australia. » » Loxigilla nitens (Lichts ) » Do » Amadina cantans (Cuv.) Azia, » » » gultata (2) ») » » » nisoria (Cuv.) Africa. » » » elegans» » » » Erythrura quatricolor (Gould) Australia. » Tringillideos Emberizincos. Plectophanes nivalis (Lin.) Europa. » » » arborea (Wils.) Est. -Unid. » » » grisconucha (2) » » » Cenchramus schaeniculus (Lin.) Europa. » » » pyrrholoides (Pal.) » » » » rusticus » » » » Emberiza eitrinella (Lin.) » » » » cirlus » » » » » aureola (Pal.) » » » » miliaria (Cuv.) » » » » hortulana (Lin.) » Ordem Conirostres. Familia Fringillideos Emberizincos. Genero Fringillaria Dolichonyx Embernagra Emberizoides Gubernatrix Poospiza » » Phrygilus Zonotrichia » » » Volatinia Cyanospiza Coturniculus Pipilo » Coccothraustineos. Paroaria Fringillineos. » » » » » » Cardinalis Guiraca » Oryzoborus » » Pitylus » Coccothraustes “Fringilla » » Spermophila Tiaris Coryphospingus Chlorospiza Carduelis Chrysomitris » » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Iispecies flaviventres (Swains.) oryzivorus (Lin.) platensis (Gm.) marginata (Tem) cristatella » cinereorufa (?) Cabanisi (Benap.) thoracica (Burm.) melancolicus (Gm.) matutina (Pr. Max.) canadensis (Vils.) albicollis » nigrogularis (2) Jacarina (Rehb.) cyanella (Spar.) manimbe (Azara.) erythrophthalmus (Wils. peccoris (Wils.) cucullata (Pr. Max.) cristata (Lin) gularis (Pr. Max.) virginianus (Lin.) cyanea » viridis (Pr. Max.) crassirostris (Gm.) unicolor (2) nasutus (Spix.) gnatho (Pr. Max.) roseus (Wils.) vulgaris (Lin.) corlebs » montifringilla (Lin) rufa (Bechst.) plumbea (Pr. Max.) lincola » pileata (2) melanocephala (Pr. Max.) caboclinho » castaneiventris » leucopogon » gullaris (2) cinereola (Tem.) collaria (Lin.) ornata (Pr. Max.) pileatus » chloris (Lin.) vulgaris » icterica (Licht.) tristis (Wils.) spinus (Lin.) 125 Africa. Amer. Scpt. Rio Grd. do S. Brasil. » bu Chili. Brasil. Amer. Sept. » » Brasil. » » Amer. Sept. »y Brasil. » » Amer. Sept. Brasil. » Amer. Sept. Europa. Brasil. » Rio Grd. do S. Brasil. » Europa. » Brasil. Amer. Sept. Europa. VoL. I— F. 20. 126 Ordem Conirostres. » Columbeos. » » » Gallinaceos. ramilia Fringillincos. » Caliideos. » » Treronineos. Columbineos. Gourineos. Meleagrideos. Argideos. Cracideos. » » » » » » » <«encro Citrinella Serinus Linota » Sycalis » Linacanthis Pyrrhula Corythus Loxia » Psithirostra Colius » » Treron Kurukurú Carpophaga Columba » Crossophthalmus Lepidocwenas Chloranas » » Turtur » Oena Columbula » Cha:maepelia » Scadafella Peristera » Leptoptila » Oreopeleia Zenoida Phaps » Numidia Argus Opisthocomus Crax » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Especies alpina (Lin.) canaria » canabina (L.) bella » brasiliensis (Pr. Max.) minor (Cab.) linaria (Tem.) vulgaris (Briss.) enucleator (Lin. curvirostra » pytiopsithacus (Lichst.) psittacea (Lath ) leuconotus » striatus (Lichst.) indicus » nudirostris (Swains.) purpurata (Tem.) spadicea » palumbus (Lin.) livia » cenas » domestica » gymnophthalmus (Tem.) speciosa (Gm.) plumbea (Vieil.) rufina (Tem.) fusca (?) auritus (Ray.) risorius (Tem.) capensis » campestris (Spix.) picui (Tem.) talpacoti (Tem.) passerina » minuta » rufa (2) squamosa (Tem.) cinerea » G coffroyi » rufaxilla (Pr. Max.) frontalis (Tem ) montana (Pr. Max.) aurita (Tem.) elegans » javanica » meleagris (Lin.) giganteus (Tem.) cristatus (Lin.) globulosa (Spix.) fasciata » Europa. » » Nubia. Brasil. » Europa. » Australia. Africa. » India. Africa. Ilhas Marian. Oceania. Europa. » Chili. Europa. Africa. » Pará. Chili. Brasil. » Ceará. Brasil. Oceania. » Africa. Azia, Pará. » » Ordem túallinaceos. » Família Cracideos. » Penelopineos. » » » Penelopineos. Pavonineos. » Gallineos. » » Phasianinecos. » » » » » » Tetraonideos Francolineos. » » » » Perdicincos. » » Odontophorineos. » » Thinocorineos. Pteroclineos. Tetraonineos. » » » » » Tinamideos. » » Gencro Crax Ourax Penelope Ortalia Pavo Lophophorus Gallies » » Nycthemerus Phasianus » Pucrasia Francolinus » Cryptonyx » » Caceabis Perdix » Odontophorus » Ortyx Callipepla Cothurnix Turnix » » Thinocorus Pterocles Tetrao » Bonasia Lagopus » » Tinamus » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Iispecies Blumenbachii (Spix.) mitú (Lin.) Jacutinga (Spix.) ochrogaster (Nat.) nigricapilla (Gray.) superciliaris (II.) aracuan (Spix.) cristatus (L.) refulgens (Tem,) domesticus (L.) Sonnerati » Bankiva (Tem ) argentatus (Swains.) pictus (Lin.) Staceii (Gould.) albocristatus (Gould.) colchicus (Lin.) albus (varicd.) macrolopha (Gould.) vulgaris. (Lin.) perlatus (Tem.) coronatus » niger (Vig.) Dussumierii (Tem.) petrosa » cinerea (Lin.) rubra (Tem.) dentatus » guianensis (Gm.) Sonnini (Tem.) Gambelli (Nat.) vulgaris (Lin.) pugnax (Tem.) varius (Gould.) Gibraltarius (Cuv.) Orbignianus » quatricinctus (Tem.) urogallus (Lin.) tetrix » europea (Gould.) mutus (Leach.) rupestris » saliceti (Swains.) Tao (Tem.) brasiliensis (Pr. Max.) serratus (Spix.) undulatus (Tem.) guttatus (Nat.) obsoletus » tataupa (Tem.) 127 Pará. Brasil. India. » Ázia. Europa. » Azia. Europa. Africa. Malaca. » » Africa. Europa. » Brasil. Amazonas. Pará. Mexico. Europa. » Occeania. Europa. Amer. Merid. Africa. Enropa. 128 Ordem Gallinacei. Grallatores. » ramiíilia Tinamideos. » » » Carinideos. Charadrineos. Genero Tinamus Rhynchotus Nothura Dicholophus Vanellus » Lobivanellus Squatarola Charadrius » Pluvianellus Oedicnemies Dromas Scolopacideos Trin- gineos. Hematopineos. » Seolopacinecos. » Totanus » » Cal.dris Limosa » » Fringloides Philomachus Tringa » » Phalaropus Orcophilus Arenaria Haematopus » Himantopus Recurvirostra ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Ilspecies noctivagus (Pr. Max.) rufescens (Tem.) major (Spix.) media » nana (Tem.) boraquira (Spix.) minor cristatus cristatus » (Lin.) » cayennensis (Gm.) lobatus (Gould.) cinerea pluvialis spinosus » (Lin.) (Tem.) Azarae (Lichts.) sem:palmatus (Kaup.) hiaticula (Lin.) morinellus (Gould.) minor nebulosa » (Less. ?) sociabilis (L.) crepitans (Gould.) ardeola (Lin.) fuscus (Gould.) glatis ochropus glareola » » » macularius (Wils.) melanoleucus » macropterns (Spix.) himantopus (Bonap.) arenaria (Bech.) melanura (Gould.) rufa » Hudsonica (Lath.) Bartramia (Wils.) pugnax (Lin.) subarcuata (Tem.) variabilis (Gould.) Schinzii (Bonap.) Temminckii (Leisl.) canuta (Briss.) rufescens (Vieil.) hyperboreus (Lath.) ' totanirostris (Jardine.) interpres (Lath.) ostralega (Lin) pallidus (Tem.) nigricollis (Vieil.) rubricollis (Gould.) Brasil. R.Grd. do Sul. Brasil. » Europa. Brasil. Australia. Amer. Sept. Europa. Brasil. » » Europa. Australia. Europa. Brasil. » Europa. Africa. Europa. Matto Grosso. Amer. Sept. Brasil. Amer. Sept. Europa. » » Brasil. » Europa. Africa. Europa. Brasil. Europa. Amer. Sept. Brasil. S. Paulo (2) Chili. Est-Unid. Europa. Brasil. » Australia. Ordem Grallatores. » » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Familia Scolopacineos. » » Ardeideos Tamtalineos. » » » Ciconineos. » » Ardeineos. Cancromineos. » Gruineos. » » » Genero Scolopax Gallinago Rhynchyaea Numenius » » Ib.s » Gerontius » Tantalus Ciconia Mycteria Leptoptilos Ardea » » Botaurus » Tigrisoma » Buphus » » Seopus Nycticorax Cancroma Platalea Eurypyga Grus Balearica Psophia Iispecies rusticola (Lin.) gallinula » vulgaris (Less.) major (Gould.) frenata (Pr. Max.) Hilaerea (Vallenc.) brevirostris (Licht.) arcuatus (Lin.) pheopus (Lat.) ruber (Lin.) falcinellus (Lin.) albicoll s » plumbea (Tem) cayennensis (Geml.) infuscatus Licht.) oxycercus (Spix.) loculator (Lin.) maguari (Gm.) americana (Lin.) argala » Cocoi (Lin.) egretta (Gm.) candidisssma (Gm.) cerulea Lin.) cinerea » sibilatrix (Tem.) agami (Lin.) Jugularis (Forster.) purpurca (Lin.) pileata (Pr. Max.) Nova-Hollandie (Gould.) commata (Gm.) stellaris (Steph.) pinnatus (Licht.) undulatum (Gm.) brasiliensis (Lin.) minutus » scapularis (Pr. Max.) pusillus Gould.) umbretta (Lin.) cayennensis (Gm.) europeus (Lin.) caledonicus (Gould.) (dubius.) Gardeni (Gm.) cochlearia (Lin.) Ajaja » helias (Pal.) cinerea (Lin.) regulorum » leucoptera (Burm.) 129 Europa. » » » Brasil. » » Europa. » Brasil. Europa. Brasil. » Pará. » » India. Brasil. Europa. Brasil. » » Europa. Brasil. Australia. Europa. » Brasil. » » Europa. Brasil. Ceará. Africa. Brasil. Europa. Australia. Brasil. » » Pará. Europa. Africa. Brasil. 130 ordem trrallatores. Familia Rallideos Palame- deneos. » Jacaneineos. » Rallincos. » » » » Rallideos. » » » » » Gallinulincos. » » » » » Polymbideos Po- dicipineos, Colymbineos. » » Pelecanideos Plo- tineos. Pelecanineos, » Genero Palamedea » Parra » Aramus Rallus » » Aramides » » Porphyrio » » Gallinula Tulica » Podiceps Podilymbus Colymbus » » Plotus Sula » Pelecanus Tachypetes Grauculus ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Isspecies chavaria (Burm.) cornuta » Jaçana (Lin.) Sinensis (Gould.) scolopaceus (Gm.) nigricans (Vieil.) (Pr. aquaticus (Lin.) Levinii (Gould.) gigas (Spix.) saracura (Spix.) ruficeps (Gm.) mangle (Spix.) marmorata (2) Crex (Lin.) pusilla (Steph.) porzana (Gould.) castanea (Nat.) lateralis (Pr. Max.) albicollis (Burm.) cayennensis (Gm.) pectoralis (Gould.) immaculata (2?) nigriceps (?) minuta (Burm,) martinicus (Lin.) smaragdinus (Tem.) melanotus (Gould.) galeata (Lichts.) atra (Lin.) leucopyga (Lichts.) dominicus (Spix.) cristatus (Tem.) minor » rubricollis » Rolandi (N.) Kaliparcus (Lin.) grisegena (Lath.) podiceps (Lin.) glacialis » arcticus » septentrionalis (Lin.) Anhiga » fusca (Vieil.) bassana (Tem.) onocrotalus (Tem) aquilus (Lin.) brasilianus (Gm.) niger (Cuv.) Max.) Brasil. » » Azia. Brasil. » Europa. Australia. Brasil. » Europa. » » Brasil. Australia. Brasil. » “Australia. Brasil. Europa. Brasil. » Europa. » » » Chili. Europa. Brasil. Europa. » » Brasil. » Europa. Australia. Brasil. » Ih. Malouinas Ordem Natatores. rFamilia Pelecamineos. Procellarineos. » Lariideos. » » Alcineos. » Anatideos. D» «enero Grauculus Diomedia » Procellaria Prion Buffinus » Stercorarius Larus Rhynchops » Uria » » » Fratercula » Phaleris Arctica Alca Phenicopterus Anser » » » » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Iispecies carbo (Lin.) exulans » melanoptera (!) capensis (Lin.) vittatus » cinereus (Gm.) brevicaudus » parasiticus . » fuscus (Lin.) ridibundus (Lin.) minutus » canus » argentatus » melanocephalus (Lin. marinus Jamesomi tridactylus stolida minuta arctica Dougalli (Moul.) cantiaca (Gm.) caspia (Pal.) inca (Mus. Brit.) magnirostrisS (Lichst.) flavirostris (Nat.) alba » Wilsonii (Bonap.) nigra (Lin.) cinerescens (Spix.) Brunckii (Sab.) Troile (Lin.) grylle (Lath.) atra » glacialis (Lin.) cirrhata (Tem.) cristatella » » microrhynchus (Pal.) psittacula (Lath.) antigua (2) alle (Cuv.) torda (Liv.) iguipalliatus (Geoffr.) ferus (Lin.) leucopis (Lichst.) albifrons (Lin) egyptiacus » magellanicus (Lin.) berniclus (Melb.) madagascarensis (Cuv.) dubius (2) 131 Europa. » (2) Africa. Oceania. Europa. Oceania. Europa. Brasil. Europa. Chili. Brasil. Australia. Europa. Perú. Brasil. » Oceania. Brasil. Pará. » Europa. » » Groelandia. Europa. Brasil. » Australia. Africa. » 132 Ordem Natatores, » » » Currentes, Familia Anatideos. Spheniscideos, » Struthionideos. ARCHIVOS DO MUSE Genero Chenalopex Sarkicliornis Cygnus Dendrocygna » » Anas » » » » » Somatria Merganetta Mergus » » Erysmatura » Spheniscus » Rhea — ese. U NACIONAL Isspcecies jubatus (Spix.) regia (Mol.) olor (Gm.) atratus (Tem.) nigricollis (Eath.) canditus (Drap.) viduata (Lin.) fulva » autumalis » melanocephala (Vieil.) peposaca » casarca (Melb.) cayennensis (Buff.) tadorna (Lin.) Penelope » clypacta » bochas » querquedula (Lin.) strepera » nigra » clangula » histrionica » glacialis » acuta » brasiliensis (Briss.) erythrophthalma (Pr. Max.) arborea (Lin.) sponsa » perspicilata (Lin.) discors » mochata » arcuata (Horsf.) ferina (Lin.) leucophthalma (Steph.) cristata » Dispar » marlia (Lin.) albeola » spectabilis (Leach.) armata » albellus (Gould.) serrator » merganser (Tem.) dominica (Lin.) spinicauda » demersus » minor » americana (Lath.) » Oceania. America. Europa. » » » Brasil. » Maranhão. Amer. Sept. Europa. Amer. Sept. Brasil. » Europa. » » » » Amer. Sept. » Brasil. Europa. » » Brasil. Chili. Africa. Oceania. Brasil. ESTUDOS Sobre a evolução morphologica dos tecidos-nos caules sarmentosos PELO DR. IES DESA TE NEETO (CONTINUAÇÃO DA PAGINA 30) Indaguemos, antes de entrar em quaesquer apreciações phytotomicas, qual a causa primordial dessa quasi unicidade de crescimento dos caules sarmentosos. De meus estudos comparativos sobre o maximo desenvolvimento destes vegetaes e em particular sobre o numero de merithallos produzidos pelos que d'entre elles mais se distinguem nas familias das Sapindaceas, das Malpighiaceas, das Dillemiaceas, das Big- noncaceas, das Leguminosas, das Curcubitascas e das Synanthereas, tenho inferido que mais aos vegetaes arbustivos que aos arborescentes os devemos equiparar. E effec- tivamente os sarmentos são plantas que deviam ter Lido primitivamente proporções eguaos às dos mais vigorosos e desenvolvidos arbusculos hoje conhecidos, e que habitando as florestas sombrias e compartas das primeiras edades da flóra actual, onde não lhes era possivel o gozo da luz directa do sol, distenderam-se por uma constante e aturada evo- lução de todos os tecidos do caule para o só crescimento longitudinal, até que dado lhes foi attingir a cópa do arvoredo e expôr com as delle suas folhas e vergonteas à elaboração da seiva de que são agenies immediatos os raios solares. Força é confessar que não ha, no reino vegetal, nem vitalidade mais notavel, nem mais eloquente exemplificação da adaptação cumulativa; ce accrescentarei que nenhum outro facto mais saliente que este, ou egual siquer a elle se nos depara, como prova da lucta pela vida, entre as plantas. | A propria fórma dos caules sarmentosos parece que isso mesmo nos denuncia, apresentando-nos, nas innumeras transformações que foram experimentando, os instru- mentos ou os meios ellicientes de que se soccorreram para a obtenção daquele fim, Voir 1 Bai. 134 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Assim é que todos quantos, por uma que eu chamarei insufliciencia crganica, não po- deram serpentear desde logo em helice* ao longo dos troncos das arvoros mais pro- ximas, transformaram em gavinhas* ou unhas recurvadas, uns as folhas inteiras, outros o3 peciolos ou algum foliolo, muitos, emfim, os pedunculos floraes, as estipulas, ou umas raizes adventicias de especial natureza, e armados desses apparelhos apprenensores ten- taram e conseguiram escalar, de par com as trepadeiras voluveis, as grandes arvores à cuja sombra tinham succumbido, luctando, milhares de gerações d> sous ante- passados. O que seja a subtileza da tactilidade destes singulares apparelhos só a póde apreciar quem se consagrou ao exame dos movimentos revolutivos das gavinhas, movimentos, tão de accordo com as mecessidades do vegetal e tão em relação com o seu apêgo aos objectos circumvizinhos que, estudados cuidadosamente na sua, algumas vezes, cólere cirecumvolução, dir-se-hia haver ahi secreta inteligencia por cujo influxo é dirigido tão perfeito e, na apparencia, tão consciencioso orga- nismo. A gavinha, assim como o caule voluvel, cujo movimento e sensibilidad: ella possue em gráu muito mais elevado, executa, ao começar a sua incurvação para o corpo que lhe deve servir de tutor, uma mutação at? certo ponto semelhante ao movimento curvilinco e por assim dizer de tacteamento que faria com a cabeça um animal am- blyope à procura de um alimento que elle houvesse vagamente presentido mais pelo olfato do que pela vista. : A diferença é que na planta, o movimento é muito mais lento e como que depen- dente da acção da luz ou de qualquer outra causa com effectiva ascendencia na cir- culação do caule. Dizer em quanto tempo chega ao seu termo o cyclo de formação de uma ga- vinha, o mesmo fóra enumerar centenas de especies oilerecendo todos os graus de cir- cumvoluções, desde as mais retardatarias, que exigem para se fixarem 2, 3 e mais dias, at; as mais precipites que se executam em 20 e 25 minutos, conforme a natureza da planta, a uberdade do sólo e os elementos climatericos da localidade. Seja, entretanto, qual fôr a causa physiologica e primordial d'essa nutação espiral, não parece ser outra a sua causa physica e immediata sinão o desenvolvimento inequilateral do orgão incurvado, desenvolvimento que se effectúa com maior energia e mais rapida- * Carlos Darwin acredita terem sido primitivamente voluveis todas as plantas trepadeiras, sendo transformações desse typo original as que possuem actualmente o só movimento revolutivo nos orgãos fo- leaceos e axillares mais ou menos modificados. Segundo os argumentos da doctrina evolutiva não ha difi- culdade em se admittir que assim fosse; mas baseando-me nas minhas observações in natura sobre tantas centenas de especies de caules sarmentosos, força é confessar que si vejo, de accordo com a opinião do ilustre naturalista, nessa incompleta ou imperfeita volubilidade dos caules erectos, vestígios de sua franca espiralisação, nada me faz recusar, antes mais promptamente acceitar a hypothese de que, por inaptidão organica ou por wma especie de idiosyncerasia, si tal expressão me é permittida, não se poderam de todo submetter estes caules à fôrma helicoidal dos outros, fazendo-o unicamente os orgãos de taes plantas que mais facilmente se poderam transformar em gavinhas e isso exageradamente, por uma lei compensadora e naturalissima nos preceitos da evolução. * Nas será esta palavra uma corrupcão do diminutivo de gafa (do gr. kamptô: entortar) significando pequeno gancho de que usavam os antigos bésteiros? ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 135 mente em toda a região opposta ao lado concavo do caule do que para sobre esse lado. De modo que estudada minuciosamente à natureza das plantas trepadeiras, com- parados 03 tecidos de seu caule com os dos outros caules, observados os seus habitos, suas ingeniaes impulsões, seu progredimento ou desalento em relação ao sólo e ao clima em que vivem, não ha negar-lhes, como base ou elemento promotor de sua sin- gular desenvolução, o concurso de dous phenomenos que-por alguns physiclogistas serão chamados simplesmente casos teratologicos, mas que para mim se me afiguram opulen- tissimos exemplos de adaptação cumulativa ou, si tanto, monstruosa, tendo por base uma herança de successivas transformações. Estes dous phenomenos são os seguintes: 1º À distenção excessiva dos tecidos no só sentido do eixo do caule, em detri- mento de sua diametral ou transversal ampliação ; 2º A desenvolução helicoidal, e por tanto inequilateral do phloema e do xylema, geral no caule das trepadeiras voluveis, e limitada às gavinhas das que o não são, sendo para notar-se que nenhuma destas ultimas ainda vi que não apresentasse uma tal ou qual torsão, ou como vestígio de sua primitiva natureza, admittida que seja a hypothese de €. Darwin, ou como denunciamento excepcional de sua tal ou qual refractariedade ao desenvolvimento revolutivo completo e natural em outro ponto que não nas gavinhas. Do primeiro destes phenomenos e principalmente do segundo é que se originaram Lodas as irregularidades e anomalias dos caules das Sapindaceas, das Malpighiaceas, das Bigno- niaceas, das Menispermaceas e de algumas outras familias representadas por grande numero de plantas enredicas. Estas anomalias consistem, em sua maior parte, na subdivisão do systema fibro-vascular em corpos lenhosos, distinctos no meio dos tecidos corticaes (Sapindaceas), ou em laminas justapostas e apenas separadas por delgadis- simas camudas de tecido conjunctivo (Menispermaceas), ou ainda n'uma segmentação radial mais ou menos profunda de tedo o cylindro lenhoso, às vezes exteriormente denunciada pela canicularisação externa da casca (Bignoniaceas, Malpighiaceas, etc.) Entretanto, em qualquer dos tres supramencionados modos de anormal constructura dos caules sarmentosos, nenhuma outra causa se-me-ha deparado, nem supponho existir, sinão uma tendencia de retorno atavico do proprio organismo ou, si é preferivel, uma especie de retardamento correctivo ao excesso de crescimento longitudinal do caule, mas que só parcial, irregular c insolitamente o consegue, à semelhança dessas medidas coer- civas empregadas irreflectidamente na ordem social contra abusos de longos annos arrai- gados e que, sem conseguir extirpal-os ou tolher-lhes de todo o passo, pouco mais fazem do que trazerem em si mesmas novas irregularidades e quantas vezes mais descom- munaes dislates ! De minhas observações, durante perto de quinze annos sobre taes anomalias morpho- logicas, ouso inferir que estão ellas geralmente em relação com as trepadeiras mais ra- malhudas, e que, por tanto, maior numero de folhas offerecem à elaboração da seiva sob a acção da luz. Dever-se-ha, dahi, concluir que ha mais vitalidade nestas plantas do que nas de caule regular? Temeridade fóra, sinão sem-razão, assim pensar. Demais, convêm 136 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ponderar que os sarmentos de caule anomalo por mais ramosos e folhudos que se apre- sentem não atlingem nunca o mesmo comprimento dos de caule regular. Dir-se-hia at? que à estes ultimos, na sua rapida tensão, mal lhes chega a seiva nutritiva para a manutenção dos longos merithallos e de alguns ramos filiformes arro- jados às grimpas mais altas do arvoredo como esses fios de sida, tenues mas resistentes, que vemos às vezes distensos pelas aranhas domesticas nos intercolumneos dos edifícios. Do que tenho exposto, ha sim uma illação irrecusavel e que de modo algum deve ser aqui esquecida : é a que fixa com muitos indícios de acerto a anterioridade dos sar- mentos normaes aos de estructura irregular, os quaes parecem ter sido o resultado de uma certa modificação reversiva mas incompleta,e monstruosa, ao typo normal, effectuada em progressiva adaptação, ou sob a influencia de maior insolação, ou no meio de florestas menos compactas, ou em climas mais seccos, ou, emfim, noutras circumstancias d egual eflicacia. Como assumpto correlactivo aos destes confrontos, seja-me dado acerescentar que pouquissimos são 03 caules de estructura anormal que se mostram francamente voluveis, sendo que esses mesmos não pertencem à classe das anomalias constituídas pelos corpos lenhosos independentes ; farto este de si curioso e ainda mais para se considerar detida- mente por parecer uma prova confirmativa da hypothese de €. Darwin acerca da pre- cessão evolutiva dos sarmentos voluveis sobre os outros. É porque me não desvie da ordem inductiva que adoptei nas considerações desta introducção,onde me vou esforçando por enfeixar em breve synthese todas as minhas pas- sadas e presentes invesligações, as quaes só no corpo destes Estudos com mais lenteza procurarei explanar, não proseguirei sem tractar, ainda que ao de leve, da variabilidade retrograda, mas de atavismo natural, porque é de suppôr teriam de passar quasi todas as plantas trepadeiras voluveis ou crectas, <«i sobre ellas actuasse por muitos seculos influencia contraria ao seu caracter anomalo. Para os physiologistas que se hão consagrado ao estudo da variabilidade dependente de causas externas e auxiliadas por uma grande vitalidade de herança progressiva, não é desconhe-ida a impulsão que tomam certos organismos para à reivindicação de seus primilivos caracteres, si chegam a cessar de todo essas causas e, mais ainda, si nos mesmos organismos conservou-se como em força ou potencia latente uma certa predis- posicao ao moivmento reversivo, —primeiro indício de seu mais ou menos remoto, porém infallivel atavismo. St, como supponho e é, a todo; os respeitos, mais que muito provaval, foi causa bastante, no excesso da desenvolução longitudinal dos caule: sarmentosos, a necessidade | que tiveram do se distenderem at? as franças das malas que lhes roubavam, com a vida, a luz do sol, parece: de natural consequencia que desapparecendo esta causa, cesse para 03 sarmentos a unicidade de seu singular crescimento. E boa razão me estão desde já a assºgurar, na manutenção desta hypothese, as trepadeiras de constructura anormal a que ainda ha psuco me referi (pag. 35), as quaes, por se haverem afastado do ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 137 interior das florestas virgens, apresentam elfetivamento, a meu ver, uma primeira phase da reversão ao typo normal das dicolyledonos, si bem que por emquanto essa primeira impulsão de atavismo mostre-se com caraclar de ainda maior de:pauterio morphologico . Entretanto, é mister adverir que, em opposição a estes sarmentos, tão [uciimente predispostos a volverem-se ao typo de seus antepassado:, outros, e em muito maior numero, tenho visto qu: se mostram compleiamente refeactarios ao mesmo incitamento de retorno. Nao se arharao neste caso 0 Lupulo (Humulus Lupulus L.) e as numerosas especios dos generos: Pisum, Faba, Phaseolus, Doltchos e culras muitas trepudeiras alimentícias de hi tanto; se ulo: cultivadas na Asia e na Europa, sem que se lhes haja alterado notavelmente o caule sarmentoso? Ou haverá, como estou disposto a erer, para estas plantas enrediça; de proporções diminutas, outras leis e outras causas regu- ladoras? A esto respeito tenho registrado numerosas observações que, por doscabidas nestas notas do simples introdução, não pódem ter aqui lugar; algumas, comtudo, referirei por mais adupiadas ao assumpto ou antês por se me affigurarem exceltontes Jusliicaçãõe; de tão adver as e inexpliraveis preponderancias. Sirvam de exemplo a Pitangueira (Stnocalya Micheli, Berg.), o Cajuciro (Anacardium oceidentale, L.), a Jaqueira (Árto- carpus integrifolia) e outras plantas indigenas ou de ha muito aselimadas no sólo bra- zileiro, as quaes si, pela mão do homem ou pela deje-ção das aves e dos mammiferos, chegam a nascer no meio das florestas, logo se lhes apruma e adeigaça o caute, alon- gam-se-lhes 03 merithallos, diminúe-so-lhes o numero de folhas c ainda mais o do ramos, e tão demudadas ficam que mal a: conheceria quem lhes não conhecesse a prompta e ingenita variabilidade. Si, porém, são por este lado dignas de attenção estas arvores, menos o não são pela facilidade com que se volvem, em campo aberto, à facies propria e individual do sua espe-ie, tomando de prompto 05 caracteros exteriores de plantas das planuras, como realmente o são. O nome popular ds Cajuciro e de Pitangueira da mata, de que usam em algumas provincias, não têm outra origem e indicam ao mesmo tempo que se trata de madeiras que dão traves d> dimensões muitas vezes surprendentos *. Entretanto outras plantas ha na flóra brazileira que parecom refractarias à esta prompta adapiação. Entre estas basta-me citar o Jacatirão (Lastandra), que, assim fóra 1 As especies do genero Serjania, que offerecem na estructura do caule os caracteres anomalos de que dei parcial e incompletamente noticia nos Comptes Rendus da Academia das Seiencias e nos Annales des Sciences Naturelles, acham-se nas raias dos matos rarefeitos cujo aspecto indicam terreno ha muito tempo desmoutado de sua primitiva vegetação; nas mesmas localidades tenho encontrado a Thinouia ventricosa que é o mais bello typo das anomalias do caule das Sapindaceas. 2 Na provincia de Santa Catharina encontrei Pitangueiras com 12 metros de altura, e com os troncos tão rectos que só assim comprehendi que delles se fizessem portaes e traves de 8 metros de extensão, como d'antes m'o haviam assegurado. 133 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL como dentro das florestas, conserva constantemente sua haste em linha recta, desenvol- vendo unicamente um pouco mais 0 raio da cópa com o alongamento de seus ramos, quando vive fóra dos bosques. O mais natural exemplo, desta contumacia apresentam-n'o as Eucalyptus, plantas exotiras mas destinadas pela sua prompla arclimação, entre nós, a povoar, dentro em pouco, todas as nossas charnecas atagadiças e insalubres, logo que fór comprehendida a sua exigencia hereditaria e artificialmente satisfeita por meio da cultura colectiva. Habituadas a viver socialmente em extensas florestas, nada houve que as fizesse acceitar a adaptação ao viver solitario, ou porque se lhes opponha uma herança nimia- mente conservadora, em virtude da qual sº lhes fixou e consubstanciou por milhares de annos essa mesma sociabilidade, ou porque só de pouco tempo a esta parte tenham sido deslocadas de seu ha muito radicado elemento e não baste o lapso de tempo decorrido para combater caracteres que só por aturada evolução poderam ser conquistados. Como quer que seja, este vegetal não se desenvolve sinão como si estivera em plena e espessa floresta, e porque não seja muito facil dar ao seu caule esguio e fragil um tutor que o proteja eficazmente numa altura de 12. a 15 metros, quebra-se-lhe a ex- tremidade da haste à menor lufada, e desapparece deste modo o seu caracteristico desenvolvimento longitudinal. São vegetaes que por esta particularidade parecem ter seguido até certo ponto a evolução das Coniferas mais elevadas e das grandes monoco- tyledones de que nos dão bellos exemplos os maiores representantes das Musaceas, das Gramincas, das Cyperaceas e muitas de nossas palmeiras. E effectivamente as florestas de Eucalyptus, na Australia, bem como as mais espessas matas intertropicaes, devem dar uma idéia de que foram os bosques das épochas devonianna e carbonifera, constituidos, em boa parte, de monocotyledones e de dicotyledones gymnospermeas, pois que muito tambem lembram os matagaes de Taquara-assú (Bambusa), tão communs nas fraldas das serras dos Orgãos e da Mantiqueira, os palmares formados por especies nimiamente sociaes, pertencentes principalmente aos generos Attalea, Mauritia, Astrocaryum, ete., e finalmente os vastos coutos de Araucaria braziliensis, caracleristicos das altiplanuras do sul do Brazil. Estes apontamentos não são tão extranhos quanto poderiam acaso parecer à desenvolução anormal das trepadeiras, pois que em todas as plantas florestaes e ni- miamente sociaes, à que me acabo de referir, é mister reconhecer que houve a necessidade de um desenvolvimento de identica, posto que muito menor, anomalia. Quanto aos vegetaes sarmentosos onde esta irregularidade de estructura altingiu tamanhas proporções, deprehende-se naturalmente do que expendi acerca de sua longa e progressiva transformação, que são de origem posterior não só ás monocotyledones e dicotyledones gymnospermeas, sinão ainda tambem ás mesmas angiospermeas, das quaes conslituem, a meu ver, as mais modernas transformações e os typos da mais notavel variabilidade. Si no corpo principal destes estudos houver de me approximar ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 139 alguma vez das vaias de um lão importante assumpto, qual este me parece ser, para então me aperceberei com mais avultada cópia de provas e com maior acerto ou cabimento de razões, Devo agora accrescentar, ao que acima explanei, no tocante à evolução das varias fórmas de plintas sarmentosas e particularmente com relação à precedencia que supponão existir do caule regular sobre o de anormal estructura, que do sar- mento eresto, mantido por unhas curvas em que se transformaram, ou ramos atro- phiados, ou antes, (3 esse é o geral dos casos) raizes adventicias, se crigingu provavelmente uma singularissima fórma de caules at? certo ponto intermediariys entre os sarmentos não voluveis e as plantas parasitas epiphytas. Destes typos vegetres semi-epiphytas lembro por notavel exemplo os caules de algumas especies dos generos Maregravia, Clusia, Ficus, Urostygqma e até o caule serpontante da Hereda helix, aindr que, sob o aspecto de minhas obser- Vações, menos apreciavel seja que os primeiros. Os caules daquellis vegetaes, desenvolvendo-so a principio cylindricos e depoi: justapostos e achatados gradualmente até tomarem a fórma de bainhas semi-abar- cante: dos troncos que lhes são tutores, acontecendo muitas vezes estrangulal-os na ompressão, representam, a meu ver, o mais alto grau de desenvolução das trepadeiras, pois que, precisando, como acima figurei, de elevar-s: ao nivel da cumiada do arvoredo, serviram-se das unhas curvas, depois cingiram-se estreitamente aos troncos tutores e por tal mod) se adaptaram à necessidade desta união que levando-a ao exagero à que lhes davam azo a robustez de sua organisação e as leis naturaes da evolução, attingiram a fórma notavel de que lhes veiu a fatal propriedade de estran- guladores a cujas consequencias devem o nome vulgar de Mata-páu. O que é muito para notar-se é que estes caules como o da Maregravia umbel- lata e da M. dubia, desenvolvendo-se como acima expuz, tomam, ao chegar à altura da copa da arvore que lhes deu apoio, a fórma cylindrica normal e produzem uma folhagem em tudo diferente da folhagem produzida pela parte achatada e inferior do caule. Estes factos perspicuamente mencionados por C. Darwin * é ainda uma prova de meu asserto sobre o unico fim que parece querer alcançar o sarmento de expandir sua folhagem sob à influição dos raios solares, agentes eflicazes da elabo- ração dos liquidos nutrictivos da vegetação. Não devo, porém, proseguir nestas cogitações, nem leval-as além do que foi aqui registrado em prova das idias que me serviram de fito nesta introducção. Por agora limito-me a estas simples notas à que ponho aqui termo para volver-me 1 On the movements and habits of climbing plants (Jouraal of the Linnean Society, Botany, 111. London, 1855. 140 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL de todo ao exime da evolução morphologica dos tecidos dos caules dos eipós com que comecei de occupar-me na primeira parte deste trabalho. * BE Em continuação ao que à pag. 30 deste volume tinha eu começado de expender acerca do canal medular, com relação ao crescimento longitudinal dos caules sar- mentoso:, cabe-me dizer que supponho livre de duvida que seja a medulla d> taes caules pelo extraordinario desenvolvimento lateral que apresenta, não menos que pela pressão hydrostatica ou turgescencia das cellulas “que a constituem, nas primeiras ampliações do merithallo, a causa immediata da prompta e pujante distenção dos caules sarmentosos. Aceresce que nessa tenra edade do merithallo ou entre-nó, os tecidos do dermatogenco, do periblema e do pleroma posto que adiantadamente differenciados e já em certo grão constituídos em epiderme, camadas externas corticaes e feixes fibro-vasculares, são nimiamente extensiveis, e como a tensão do estojo medullar é de facto admiravel relativamente à dos demais tecidos adjacentes, como o provam as investigações dos pro- fessores Kraus" e Sachs”, o desenvolvimento longitudinal do caule effectua-se com celo- ridade, tanto maior quanto mais dilatada é a medulla e mais abundante seiva circula endosmosicamente em seu amplo e poderoso tecido. Este rapido e singular crescimento, porém, tem seu termo logo que mais avolu- mudos e sobretudo mais rijos os estojos da casca e do lenho pela culicularisação das camadas do dermatogeneo e ligaificação dos feixes vibro-vasculares principiam a perder o seu primitivo clasterio e a antepôr uma tal ou qual resistencia à tracção sobre elles exercida Jongitudinalmente pela medulla. Neste crescimento antagonista em que é potencia positiva o canal medullar e potencia negativa o conjuncto dos tecidos externos, todas as vantagens são por muito tempo em favor dos caules sarmentosos. E” uma lucta, porém, essa em que só em taes caule; tem primazia a medula ; em quasi todas as demais plantas de rapido crescimento mal os tecidos corticaes entram a influir no crescimento diametral do caule e, portanto, a exercer uma tracção toda lateral ou dia- metral sobre o parenchyma da medula, este já depauperado pela fragmentação progressiva e simultanea de suas cellulas internas, agora vasias ou com insignificante vitalidade, rasga-se, divide-se e, arrebatado por uma forca centripeta de grande energia deixa em seu local um vacuo fistuloso cujo diametro mostra-se tanto maior quanto mais vehemente houver sido a tracção effestuada pela casca e lenho sobre o eixo do caule. Dão bim exemplo deste phenomeno, nas monocotyledones *, as gramineas de caule listuloso e nas dicotyledones, todas as plantas em geral de rapido crescimento, mas não ! Die Gewebespannung des Stammes und ihre Folzen (Botanische Zeitung, 1867). * Handbuch der experimental Physiologie, 1865. “Comquanto não haja nestes vegetaes o estojo medullar das plantas dicotyledones circumscripto pelos vasos espiraes, deve-se-lhes reconhecer, comtudo, uma medulla nesse parenchyma central do caule de ordinario isento de feixes vibro-vasculares. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL I41 sarmentosas. Dentre os mesmos sarmentos alguns se mostram, é verdade, francamente fistulosos, como o caule da Thumbergia lawrifolia, do Stizophyllum perforatum e do Petastoma formosus, por exemplo, cujos 'merithallos desenvolvem-se perfeita- mente depois de formada a cavidade medular; mas neste caule, como no das gramineas de mais rapido crescimento, a parte fendida e inutilisada da medulla é sómente o tecido central, conservando-se no parenchyma peripherico toda a vita- lidade e turgidez de egual tecido n'um caule massiço. E de facto um quarto pelo menos de espessura da parede do caule da Thumbergia lawrifolia é constituido pelo tecido me- dullar que, em virtud? das faculdades absorventes e da pressão hydroslatica inherentes às suas cellulis, não póde deixar de actuar efficazmente sobre os tecidos lenhosos e corticaes adjacentes. Facto este muito digno de reparo por deixar em bastante evidencia que só ao tecido exterior da medulla, e não tambem à parte central della, se deve attribuir toda a acção do estojo medullar, assim neste como em qualquer outro pheno- meno, no caracter de organismo importante da vida vegetal. Quanto à singular distensão dos caules sarmentosos, originada, como se vê do que fica exposto, na especial disposição do canal medular, não só mais largo como tam- bem mais aclivo nestas plantas do que nos outros vegetaes, não ha duvida que a ella se deve a irregularidade dos caules cujo systema fibro-vascular so acha dividido ou segmentado pelo parenchyma cortical. | Como uma predisposição atavica apresentei cu esta segmentação do lenho; ede facto o é, principalmente para as Menispermaccas ec para a Thinowia ventricosa! em cujo parenchyma cortical, depois de constituídos os tecidos do caule, forma-se o meris- tema secundario, fonte organogenica dos novos feixes fibro-vastulares ; meristema que me parece ter origem na camada interna do phelogeneo, visto como é entre este tecido, em alto grao gerador ou cambial, e o phelloderma, que tal formação se apresenta. No tocante as relações entre os corpos lenhosos externos e o eylindro fibro-vascular interior dos caules anormaes, tão característicos dos generos Serjamia, Paullinea, Ur- villea e Thinowia, si bem que de taes relações me haja naturalmente de occupar quando entrar nas minucias mais importantes do assumpto, não posso, comtudo, deixar de expôr syntheticamente algumas palavras a respeito, pois que me parecem ser a base de todos os phenomenos physiologicos dos caules anormaes. Os corpos lenhosos externos, ou sejão d: formação simultanca com o cylindro lenhoso central, como nas Serjanias de caule triangular, por mim descriptas em 1863, ou sejam de formação ulterior, como na Thinowia ventricosa, todos elles têm particulares analogias com o phenomeno por mim descripto e desenhado perante a Sociedade Bota- 1 Esta planta que cu descrevi como uma especie do genero Serjania, na minha segunda classe de fórmas anormaes, e que como tal foi antes de mim figurada por Gaudichaud (Recherches générales sur VOrganogra- phie, la Physiologie et VOrganogenie des Végétaus, Estamp. XVIII fig. 14) é indubitavelmente a Thinouia ventricosa de Radlkofer. Dju-me pressa em rectificar este equivoco, actualmente reproduzido nos « Elements de Botanique » d) professor Duchartre, fig. 83, afim de que em uma nova edição daquelle excelente livro de ensino corrija o seu autor este engano. Vo. I—F.22 142 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL nica de França n1 sessão de 24 de Fevereiro de 1865 e pouco depois men-ionado pelo professor Duchariro (Elements de Botamique, 1866), mas não tratado na memoria que à Sociedade Botanica da França inserio em seus Bulletins como a expressão daquela minha exposição *. E” em summa 0 mesmo phenomeno que o professsr Rodlkofer expjz ni quiri anomalia por elle descripta perante o congresso botanico de Florença, a 18 de Maio de ESTA (Sopra i cari tipi delle anomalie dei tronchi nelle sapindacee) , pare"endo não ter conhecimento do que eu a respeito do mesmo assumpto já havia dito na r.ferida sessão da Sociedade Botanica de França, porquanto a tado o mais de minhas anteriores inves- ligações lealmente se refere naquell: seu trabalho. O que de taes anomalias, sem fallar das mais singelas modificações anatomicas, devemos inferir para explicação physiologica de sua presença nos caul?s sarmentosos ? Ser-nos-ha licito e, até por ventura de forçosa consequencia, admitir, com o Sr. Rodlkofer que, por demasiado fragu, o cylindrolenhoso central rodeou-se de cordões lateraes, como se a natureza quizesse para dar-lhe 0 necessario apoio fazer neste caso applicação da theoria do cabo de fio de ferro, segundo a propria expressão daquelle autor ? Ou devemos antes aceitar a antiga hypothese, preconisada finalmente por Schacht, de que são taes cordões externos nada mais do que ramos sahidos do caul: (cylindro lenhoso central), sem comtudo emergirem do tecido cortical, desde logo commam à este e áquelles corpos lenhosos externos ? Nenhuma destas hypotheses, como se póde ja comprehender, coaduna-se rigoro- sament: com as idas que acima desenvolvi e que me pareceram de mais natural har- monia com as observações referidas no que fica anteriormente consignado. A justa com os factos que resultam de taes observações, devo e quero acreditar que só por um começo de reversão ao typo dicotyledone normal, isto é, de duplo e re- gular crescimento, se teriam produzido essas anomalias. Nos vegetaes que nol-as apresentam e cujos suecos nutritivos mal parecem bastar ao crescimento longitudinal do caule, a seiva, porque assim o digamos, vitalisada em verdadeiro blastema que dir-se-hia deshabituada do trabalho de ampliar methodica e regularmente, por meio da zona cam- bial, o systema Inhoso do caule, predispõe-se a desviar do canal que Jhe é traçado uma porção de seu ja exiguo volume, e, trasvasando-o externamente no tecid) phelloge- nico, dóptado por seu lado de todas as propriedades de um perfeito tecido gerador, como o é de Licto na qualidade de cambio suberoso, produz immediatament: ahi um ' Devo fazer bem patente que toda à exposição verbal que fiz perante a Sociedade Botanica de França versou sobre investigações nunca até então por mim publicadas, mas que não havendo enviad» ao secretario geral daquella sociedade arespectiva memoria escripta até o dia que para isso elleme designára, pela boa e sim- ples razão de que me parecia aquelle meu trabalho muito incompleto eimperfeito, entendeu o mesmo secretario que o mesmo era transcrever nos Bulletins da Sociedade a memoria que dous annos antes fóra publicada nos “Annales des Sciences Naturelles. D'ahi a razão pela qual fez menção o professor Duchartre, nos seus Ele- ments de Botanique, de factos por mim então descriptos, mas que não figuram no supposto relatorio daquella exposição , d'ahi tambem o citar-me elle como occupando me deste assumpto apóz identicos trabalhos da pars do professor Nigeli, sendo que ao contrario me cabe a precedencia de um anno sobre o illustre pro- essor de Munich em tal materia. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 143 meristema secundario d'onde pouco depois são engendrados os corpos lenhosos sesun- darios no tecido" cortical. Na precedencia ou subsequencia da producção destes cordões externos é que ha apparentemente uma tal ou qual disparidade de um para outro vegetal, visto como n'uns caules o seu apparecimento é simultanco com o do cylyndro central, n'outros, formam-se posteriormente à completa organisação deste. Esta disparidade, todavia, não existe sinão em: apparencia, como o disse, porque nestes, assim como naquelles caules, os corpos lenhosos exteriores offerecem a maior anlogia entre si, já quanto à sua morphologia, ju no tocante às suas funcções. Destas é certamente mais notavel o dever que lhes incumbe de prover parcial ou totalmente, mas alternadamente e com uma regularidade às vezes -surprehendente, por meio dys seus proprios feixes vibro-fasculares, o cylindro central do caule com o qual se anastomosam, um a um, cada vez que a este cabe a missão de produzir folha e ramo perfeito. O corpo lenhoso externo nada mais me parece ser, portanto, do que um fragmento do cylindro fibro-vascular central, extrahido: do vorpo deste afim de consti- tuir-se um corpo filial, alternativamente tributario e independente, delle, conforme lh'o requerem ou lh” permittem as necessidades e organização da planta. Esta hypothese, que mais parece applicavel aos caules cujos cordões lenhosos exteriores organisam-se posteriormente ao apparecimento do cylindro lenhoso central, tem tambem estreita relação com os de formação simultanca. O que esta ultima apresenta de mais notavel por diversidade morphologica é o facto de que sendo nella, subdividido desde tod) o principio meristema primitivo em mais de um es- bôco de corpos lenhosos, para sobre estes nucleos de formação fibro-vascular afllue promiscuamente a seiva nutritiva, anticipando deste modo um phenomeno que na outra especie de formação só mais tarde se effectua. Todas as de mais funcções subsequentes ou consequentes desta pluralidade de centros de organisação, seguem mais ou menos o mesmo cyclo e a mesma evo- lução. Eis syntheticamente a geneso das anomalias morphologicas mais notaveis dos caules sarmentosos. Ao perlustraros innumeros factos que ahi deixo inscriptos em apoio das naturaes illações desta nota preliminar, ninguem haverá, cuido eu, que possa nela entrever uma diagnosis indicadora de outros desvios anatomicos, nos sarmentosos anomalos, que não 03 de que fiz aqui especial, si menos detida, menção. É provavel que para os escrupulosos e timidos registradores de factos, para os meticulosos pejes dr amalyse, pareça eu demasiado aventuroso nas minha hypo- theses, ou victima de exagero de inducção. Antes assim; appraz-me que em tal conta esses taes me tenham, por que raras vezes fez-se verbo em labios de homem, sentença mais profunda do que a 144 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL de Gethe, o celebre precursor da theoria evolutiva, na Allemanha, quadro que, no orbo da sciencia, mais vale mofina hypothese do que nenhuma hypothese. Aceresce que de minha pouca soffreguidão de auctoria creio ter dado sobejamente arrhas no silencio em que deixei por tanto tempo envolvidas minhas observações sobre um assumpto que ness: mesmo tempo muitos phytotomistas hão tentado es- o tudar. ; E que vacilo e hesito perante 0, a muitos respeitos, baseado receio de não ter assaz estudado esta materia à que se ligam lantos problemas da morphologia vegatal. Si razão me assiste para tamanhos escrupulos, melhor d) que o presumo, dil-o-hão 03 especialistas a quem ulteriormente virei offerecer por extenso, nesta m3sma revista, e em continuação ao3 preseates preliminares, o conjuncto da minhas passada e actuaes investigações. FIM DA INTRODUCÇÃO ERA A Ps Na pagina 65, onde se 1ê :— « Contam-se 14 alveolos dentários na arcada superior, onde estão implantados o 2º pequeno molar esquerdo co 2º grande ao 1º e 2º pequeno molar direito e esquerdo, sendo para notar que estes ultimos começavam a irromper d) fundo dos alveslos corre:pondentes », leia-se : « Contam-se 14 alveólos dentarios na arcada superior, ond: estão implantados o 2º pequeno molar esquerdo e o 2º grand? molar direito e esquerdo, sendo para notar, EC., lc. » Na mesma pagina, onde se lê: « Facto identico se dá em relação molar direito » leia-se: « Facto identico se di em relação ao 1º e 2º pequeno molar direito e esquerdo. » | No quadro comparativo das principae: medidas crancometricas, pag. 70, columna do craneo n. 4, ond: se vê — indice cephalico 73,06, ve'a-se 74,19. As Estampas 9, 10, 11 e 12 achão-se com os n.º 1, 2,3 e 4. OBSERVAÇÕES A continuação do (Computo geral das colecções zoologicas do Museu será publicada no ultimo fasciculo dos volumes subsequentes. INDICE DAS ESTAMPAS Le ll Artefactos indigenas encontrados nos Sambaquis. . .....cc.c... 30 Mi IV,E V Tangas de barro cosido . .... RR Re a 30 VI Batrachychthys . +... 76 Vil e VII Machadostderpedras el za tac a Siad UE 1 a 76 IX, X, XI E XII Crancos de Botucudos . .. E APR RE MRE corda RIOT PESO Ae 76 XI Conformaciodosadentes Fe ess Sp E o as Ra EO 6 eq 146 EG an ESA EC Quadro do pessoal eflectivo e dos membros correspondentes do Museu +... cc. XH Decreto e Regulamento da reorganisação do Museu . SEM ATE Rr era da ag SA 5. Eientenciapelo Dr.) Ladislâus NeitO seas us; Pis o ago Sopa a aja 5 Colrgalrço Papa NA co ga XHI Estudos sobre os Sambaquis do sul do Brazil por Carlos Wiener : BRR siucções as Co apVoeneripelor Dr. Ladashtims INEO «aja Mai ga toiMiar pa foi alisa Tora l 1 Situação topographica, fórma e dimensões dos sambaquis . . cc cce. 5) IR Das materias: de. ques se compõem 08 sambliguês. “a joy ss a 05% jogo soja eo 10 HI Da disposição interior dos sambaquis . . ... dg bs DE, CESAR pat 13 IV Breve descripção dos objectos colhidos pelos mEminos dê opogitdo: ENE SR 15 Sete scr e On CLS O pa aires SR e RR o” CR OU RR A a o 21 Estudos sobre a evolução morphologica dos tecidos nos caules sarmentosos, Introducção pelo Dr: Ladislãu Netto . «sc. E Sr DSR RE A DES PER DR E > 27 e 133 Nota descriptiva de um pequeno animal extremamente curioso e ne indo Patathyo chiysepelo: Dr Pizarro: ss esa sa ss 7. 1d COP RR RD Ra TO id 31 Acção physiologica do Urari pelo Dr. Lacerda filho . EO Rs ponta Das adaga Ce à 37 INDICE DOS ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Descripção dos objectos de pedra de origem indigena, conservados no Museu por Carlos F. Hartt. « +... Contribuições para o estudo anthropologico Es raças indigenas do Brazil pelos Drs. Lacerda filho «e; Ródlrigues Peixoto .*. sn grs Sola gana NR Contribuições para o estudo anthropologico das raças indigenas do Brazil. — Nota ares a conformação dos dentes pelo Dr. Lacerda filho . ....<.cccccc.. Breve noticia sobre os sambaquis do Pará por Domingos S. Ferreira Penna. . Compnto geral das collecções zoologicas existentes no Museu. . .....ccc.. cs. Mamona MRE ros DE Toiedam ar rs Cear ATOS RR o Pa OrnihOlOgtl ma Serão na é cursa a E o O A ENS ce O GS E a ds RD FIM DO 1 VOLUME — O OS O— 45 497 a so 101 101 105 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Qu cus ama ES ER ER Nr Se ESTUDOS SOBRE.OS SAMBAQUIS do Sul do Brazil ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ESTAMPA ..I] ARCA na ainda Sa Ie A E e an ESTUDOS SOBRE.OS SAMBAQUIS do Sul do Brazil “ HH ESTAMPA ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Leth: A. Agostini Jó Mara ( Camoanho motuwcl ) TANGA DE BARRO COSIDO EE ad Ta | ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ESTAMPA. IV CEHartt. Photo TANGAS DE BARRO COSIDO Marajó dg » P Ea . “ “ + , ? Lá Dor Ea a - “ £ LA . + P Obs o ' . ve | - Pr = a ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ESTAMPA V CEHart Photo: Jirh:a Vavor. Angelo k Rot fe premulen 4 A Agostini. Lith TANGAS DE BARRO COSIDO Marajó a é x b Rr a: : ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ] ESTAMPA VI TithcaVaporArgelo &Robir R.d Assemblea 43. A Agostin ti del: BATRACHYCHTHYS ST ARCHIVO DO MUSEU NACIONAL Estampa VII Mbento Henaschalo Noligraner MACHADOS DE PEDRA ESTAMPA VII ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ÁÃ. Agostim Liúthca FaporAngelo &Robin Fd Assenbleo 44 MACHADOS DE PEDRA ARCHIVO BB MUSEU NACIONAL CRANEOS DE BOTOCUDOS Estampa 1X ARCHIVO DO U NACIONAL CGRANEOS DE BOTOCUDOS A Estampa FSB; e Haley tera 4 ARCHIVO DO e 7/7 elo Horacheb Ho ogra nura S UDO G CRANEOS DE BOTO ARCHIVO DO MUSEU NACIONAL Estampa XI Qu : E RES L CRANEO FOSSIL o CRANEO DE MACAHE BACIA DE HOMEM asp me «Alerts Hlenachel MH elcograva ra ESTAMPA XII. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL quelisf 4 VoL. 1º, 2º, Be E do TRIMESTRES 1877 ma meire rt rm mi | “ARCHIVOS S DO RIO DE JANEIRO Nunquam aliud natura, aliud sapientia dici DEE In silvis academi querere rerum. Quamquam Socraticis madet sermonibus, H, TEXTO: — Quanro DO PESSOAL EFFECTIVO E DOS MEMBROS CORRESPONDENTES DO MUSEU. — INVES- TIGAÇÕES EXPERIMENTAES SOBRE A ACÇÃO DO VENENO DA BOTTROPS JARARACA, PELO DR. LACERDA Firmo. — ADDITAMENTOS ÁS INVESTIGAÇÕES PRECEDENTES, PELO Dr. LacERDA FILHO. — A. CORRE- LAÇÃO DiS FLORES VERSICOLORES E DOS INSECTOS PRONUBOS, PELO DR. rEDERICO MULLER.— Os onGaos | ODORIFEROS DAS ESP. EPICALIA ACONTIUS E MYSCELIA ORSIS, PELO DR. IREDERICO MULLER. — Os ORGÃOS ODORIFEROS N$S PERNAS DE CERTOS LEPIDOPTEROS, PELO Dr. FREDERICO MULLER. — APONTA- MENTOS SOBRE OS CERAMIOS DO PARÁ, POR Domingos S. FERREIRA PENNA. — APPENDICE. — URNAS DO MARAGÁ. — CONTRIBUIÇÕES PARA A GEOLOGIA DA REGIÃO DO PAIXO-ÂMAZONAS, PELO PROFESSOR O. A, DrrBy. — APONTAMENTOS SOBRE 05 TEMBETAS PA COLLECÇÃO ARCIEOLGGICA DO Museu NA- CIONAL, PELO DR. Laristau Netto. — RESUMO DO CURSO DE ANTHROPOLOGIA DO Museu NACIONAL, PROFESSADO PuLo Di. IAcERDA JiLHO. — BIBLIGGRAPHTA, — INDICE GERAL DO VOLUME II. ESTAMPAS : — 1. INVESTIGAÇÕES SUBRE A ACÇÃO DO VENENO DA BOTEROPS Jararaca. — IT À. ExaME CuIMICO DO VENENO DA BOTHRUPS JARARAÇA. — JT. MAcuLAS SEXUAIS. — 11], IV, V, Oncãos oporirerROS. — VI, VII. URrn4s DOS CnRAMIOS DO ParÃ, — VHE, IX. TempeETÁs, E E za VOLUME IT RiO DE JANEIRO INPSENSA INDUSTRIAL — RUA DA AJUDA N. 75 1879 pu DES (ES ta bt A ar E tz EA RECTIVOS DO MUSEU NACION DO RIO DE JANEIRO Nunquam aliud natura, aliud sapientia dici J. 14. 321. In silvis academi quarere rerum. Quamquam Socraticis madet sermonibus. Je VOTEM E: EI RIO DE JANEIRO IMPRENSA INDUSTRIAL —75 RUA DA AJUDA N 75 1877 COMMISSÃO DE REDACÇAO Ladislau Netto O W Tartt TJ. B. de Lacerda Filho Quabro do pessoal Museu Nacional do Rio de Janeiro DIRECTOR GERAL Dr. Ladislau de Souza Mello e Netto. SECRETARIO Dr. João Joaquim Pizarro. BIBLIOTHECARIO Manoel da Motta Teixeira. AMANUENSE João da Motta Teixeira. PRIMEIRA SECÇÃO ANTHROFOLOGIA, ZOOLOGIA GERAL E APPLICADA E PALEONTOLOGIA DIRECTOR Dr. João Joaquim Pizarro. SUB-DIRECTOR Dr. João Baptista de Lacerda Filho. PRATICANTES Manoel da Motta Teixeira. Daniel d'Oliveira Barros d'Almeida. PREPARADOR Eduardo Teixeira de Siqueira. SEGUNDA SECÇÃO BOTANICA GERAL E APPLICADA E PALEONTOLOGIA VEGETAL DIRECTOR Dr. Ladislau de Souza Mello e Netto. SUB-DIRECTOR Dr. Nicolau Joaquim Moreira. PRATICANTES João da Motta Teixeira. Lourenço José Ribeiro da Cruz Rangel. PREPARADOR Vicente Alves Ribeiro. TERCEIRA SECÇÃO SCIENCIAS PHYSICAS: MINERALOGIA, GEOLOGIA E PALEONTOLOGIA GERAL DIRECTOR SUB-DIRECTOR Bacharel Carlos Luiz de Saules Junior. PRATICANTES Antonio de Souza Mello e Netto. Antonio Teixeira da Rocha. PREPARADO; Carlos Leopoldo Cesar Rurlamaqui. NATURALISTAS VIAJANTES Dr. Frederico Miller. Domingos Soares Ferreira Penna. Carlos Sehreiner. Guilherme Schwake. DESENHADORES Engenheiro civil Theodoro Fernandes de Sampaio. Antonio Avé Lallemant. CCNSERVADOR DA SECÇÃO ANNEXA Luiz Ferreira Lagos. PORTEIAO Carlos Leopoldo Cesar Burlamaqui., CONTINUO João Goncalves Pereira Gareia. MEMBROS CORRESPONDENTES DO MUSEU NACIONAL Agardh (G. H.) Baillon (Henrique) Barbosa du Boscage (J. V.) Beaurepaire Rohan (Ienrique de) Beneden (Ed. Van) Bentham (Jorge) Bom Retiro (Visconde de) Bureau (Eduardo) Candolle (Affonso de) Coelho d'Almeida (Thomaz J.) Darwin (Carlos) Decaisne (José) Delpino (F.) Duchartre (Pedro) Eichler (A. W.) Exner (Mauricio) Fenzl (Ed. ) Ferreira Penna (D. S.) Fries (Elias) Glaziou (A. F.) Gorceix (Henrique) Hooker (José Dalton) Jobert (Clemente) Latino Coelho (J. M.) Moll (Hugo von) Morren (Ed.) Naudin (Carlos) Philippi (R. A.) Pringsheim (N.) Quatrefages (A. de) Radlkofer (L.) Regnell (André) Reichenbach (L. H. G.) Reichardt (H. W.) Tulasne (L. R.) Warming (Eugenio) Wiesner (J.) Wiener (€.) Virchow Zimmerman Gollheim cs ql o ou é ; Do A a. E tado o Pr. ss - T = Suit = 24 a b q. q a o Rs - voe “ ] . . VERARY INVESTIGAÇÕES EXPERIMENTAES Sobre a acção do veneno da Bothrops jararaca / Serpent fer de lance du Brésil. ) Trabalho executado no Laboratorio do Museu Nacional PELO DR. UNDARIA PLA A importancia capital que tem esta ordem de estudos, quér se os considere pelo lado da toxicologia, ainda hoje tão atrazada no tocante aos venenos de origem animal, quór se os considere em relação à pratica medica, tantas vezes embaraçada nà escolha dos meios mais convenientes para combater os efeitos dessa especie de envenenamento, devêra ter constituido desde ha muito, um pode- ros9 incentivo para os observadores competentes entrarem no exame das ques- tões relativas à acção do veneno dos ophidios do Brazil. A dificuldade, porém» de obter estes animaes vivos, tão grande é o terror que sõôe infundir a sua pre- senca, por outro lado, a falta de meios praticos e de conhecimentos especiaes nos viajantes que têm percorrido o interior do paiz, fazendo colleeções de his- toria natural, explicam suficientemente porque até hoje este estudo interessante e util não pôde ser começado entre nós. As recentes applicações do melhodo experimental à solução dos problemas V.II — 2 2 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL toxicologicos impõem actualmente ao experimentador o rigoroso dever de per- serutar a acção intima dos venenos; de tal sorte que, tomando por ponto de par- tida as alterações imprimidas a um ou mais elementos do organismo, elle possa depois explicar, segundo as leis physiologicas, as consequencias dynamicas que dahi derivam e que se traduzem por uma serie de desordens funccionaes dependentes das modificações secundarias de outros elementos ou systemas orga- nicos. E" facto já demonstrado que os agentes toxicos que mais rapidamente ata- cam as fontes da vida, são justamente aquelles que exercem a sua acção espe- cial sobre o systema sanguíneo, sobre o systema nervoso ou sobre o systema mus- cular. É tambem hoje principio assentado em physiologia que os venenos exer- cem a sua acção antes sobre os grandes systemas organicos do que sobre os orgãos, ficando asssim invalidada a opinião de Bichat, que sustentava o principio contrario. Sabe-se, depois das curiosas e pacientes investigações de Claude Bernard, como actua o oxydo de carbone sobre os globulos vermelhos do sangue; como mata a strychnina, exaltando o poder reflexo da medulla spinal; como supprime a vida o urari, paralysando os nervos motores. E escusado é uizer que estas verdades demonstradas com um rigor scientifico que honra a sciencia deste seculo, foram conquistas realisadas principalmente com o auxilio do methodo experimental applicado à solução dos problemas toxicologicos. Não fallando das investigações de Fontana, que perdem muito do seo valor por terem sido feitas em uma épocha em que a sciencia experimental ensaiava ainda os seus primeiros passos, a historia physiologica do veneno dos ophídios registra apenas algumas pesquizas serias, posto que incompletas, de Claude Bernard, tendentes a reconhecer si os effeitos produzidos pela inocula- cão do veneno da vibora podiam ser comparados aos effeitos resultantes da absorp- cao do wrari. Afóra estas investigações, que não tiveram outro merito sinão provar, contra a asserção de muitos viajantes, que na acção desse veneno sobre o organismo não entra por fórma alguma o veneno dos ophidios, nenhum outro estudo mais particularisado tem sido feito na Europa sobre este assumpto. As observações dos viajantes que tem percorrido os sertões do Brazil e dos medicos que exercem a profissão no interior do paiz forneceram, é certo, os ele- mentos indispensaveis para traçar o quadro symptomatologico do envensnamento consecutivo à picada dos ophidios; a acção intima, porém, do veneno sobre o sangue nunca passou até hoje de uma hypothese provavel, que carecia para ser demonstrada da sancção plena da sciencia experimental. Para attingir este desideratum emprehendemos algumas experiencias no labo- ratorio do Museu Nacional, cujos resultados vamos apresentar sem a pretenção de haver resolvido todas as questões que se prendem a este assumpto importante. As nossas pesquizas, por forca das circumstancias, foram limitadas apenas ao veneno de ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL La ÉS uma especie (Bothrops-jararaca), talvez a mais commum de todas quantas exis- tem no Brazil; conviria entretanto examinar comparativamente a acção do agente toxico de outras especies que gozam da reputação de mais venenosas, como são, por exemplo, o Crotalus horridus e as especies do genero Lachesis, tão abun- dantes no interior das nossas matas como nos vastos sertões das provincias de Minas e do Ceará. Verdade é que a semelhança das desordens funccionaes produzidas pela inoculação do veneno pertencente a especies differerites faz presumir identidade de acção para todas ellas quanto à especialisação do elemento histologico atacado ; podendo-se então explicar as differenças, que alguns dizem ter notado na mani- festação e successão dos phenomenos toxicos, simplesmente pelas differencas na intensidade da acção do veneno segundo as especies. Esta presumpção, porém, não obstante a somma de probabilidades que tem em seu favor, não podera passar à categoria dos factos demonstrados sinão depois de ter sido submettida à sanc- cão da analyse experimental. Aguardemos, pois, a occasião opportuna de interrogar a natureza viva nesse sentido, unico meio de reconhecer o valor real ou fictício desta hypothese. Por ora nos limitaremos apenas a considerar os resultados obtidos nas experiencias que fizemos com a Bothrops-jararaca. - O ophidio que servio para as nossas experiencias media 82 centimetros de comprimento sobre 4 centimetros de largura na parte mais grossa do corpo. A cabeça triangular e achatada no vertice, tinha a fórma d: uma ponta de lança; a partir da cabeça o pescoço estreitava-se bruscamente, offerecendo um diametro menor que o do corpo; as pupillas eram lineares e fendidas perpendi- cularmente; a cauda terminava em ponta aguçada. A escamação, que era de um escuro carregado, e toda imbricada, apresentava nos flancos, de espaco em espaço, finas tarjas de um amarello desmaiado. Na parte superior da cabeca notavam-se duas filas de escamas amarelladas, dispostas em duas series de cada lado e prolongando-se do pescoço até junto ás orbitas. Entre estas duas filas de escamas existiam duas linhas de pintas esbranquicadas, dirigidas a principio paral- lelamente, divergindo depois na base da cabeça. As presas cobertas em parte por uma larga prega da mucosa, eram finas, canaliculadas, incurvadas, e terminavam em ponta muito aguda. Este ophidio, que foi trazido do Jardim Botanico e que conservámos preso por muito tempo em uma gaiola especialmente destinada a esse fim, apresentava no mais elevado grão aquelles habitos de indolencia que caracterisam a sua especie. (Quando, porém, era provocado ou excitado pela presença ou approximação de algum animal, desenrodilhava-se e punha-se em attitude de lhe dar o ataque. Experimentámos successivamente a acção do seu veneno em porquinhos da India, gallinhas, pombos e rans. 4 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Experiencia EM |º DE JUNHO DE 1877. — Com as cautelas indispensaveis foi intro- duzido na gaiola um porquinho da India. Depois de algumas hesitações, a Bothrops atirou-lho o primeiro bote na côxa, em seguida outro junto à palpebra, e um terceiro no dorso. Retirado o animal, notamos nelle certa prostração e abatimento que formavam um perfeito contraste com a vivacidade anterior. Alguns minu- tos depois, a face nos pontos circumvizinhos ao ferimento começou a entumescer ; os pellos ericaram-se; successivas contracções fibrillares appareceram nos musculos cutancos da cabeca e da face; essas contracções foram-se generalisando até attir- eirem os musculos do tronco. Um quarto de hora depois de ter sofírido as pi- cadas, o animal cahio de flanco; verdadeiras convulsões clonicas sacudiram-lhe repetidas vezes os membro: anteriores e posteriores, e passados 5 minutos, o animal succumbio. O exame microscopico, feito comparativamente no sangue extrahido do animal, antes de ser mordido e no sangue extrahido depois que os symptomas do envenena- mento se manifestaram, demonstrou, neste ultimo caso, 0 seguinte : globulos do sangue encarquilhados e dispersos na lamina da preparação; alguns transparentes, outros opacos e mui deformados. Em alguns pontos da preparação, notavam-se largas manchas vermelhas, sem fórma regular, devidas à materia corante do sangue diffun- dida no plasma. (Vid. fig. 2 da Est.) Experiexcia EM 6 DE JUNHO DE 1877. — Foi introduzido na gaiola um porquinho da Índia. A Bothrops irritada armou-se e lançou-lho o primeiro bot: no dorso, 0 segundo no focinho. Retirada a victima, encolheu-se e ficou immovel, gri- tando do espaço a epaço, como si fôra atormentada por uma dôr intensa. Duas gotinhas de sangue appireceram no fosinão, Justamente nos pontos em que tinham peneirad) as presas do ophídio. Esta parte começou a inchar mui rapida- mente; os pºllos ericaram-se, a tumelacção foi se estendendo pouco e pouco ao lado esquerdo da face. As pupilas pareciam mais dilatadas. — OMTerezendo-se-lhe um pouco d'agua, o animal bebeu parte della, sem revelar o minimo embaraço na deglutição. Passados 10 minutos, appareceram contracções fibrillaros nos musculos cutaneos da face; já então o animal dava signaes d> um abatimento profundo, As pancadas do coração tornaram-se mais frequentes c a respiração mais difficil. A temperatura da boca não excedia a 38º centigrados c à porção posterior do tronco resfriava-se sensivelmente. Não tardou muito que elle fosse accommeitido de convulsões clonicas, predominando, ora de um, ora de ouiro lado, porém sempre mais fortes e duradouras nos membros anteriores. Quando por momentos cessavam as convulsões, via-se o animal fazer um esforço inutil para levantar-se, apoiando-s? sobre as patas anteriores; em vez, porém, da locomoção, ell3 chegava apenas a executar um movimento de rotação, tendo por eixo fixo as patas posteriores paralysadas. Após esse movimento, estendia-se sobre o decubito lateral esquerdo, e quando o faziamos cahir sobre O lado opposto, voltava immediatamente a occupar a posição primitiva. Este pho- ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL o nomeno parecia indicar uma paralysia unilateral direita. A respiração foi se emba- racando cada vez mais; o coração pulsava com tanta frequencia, que por fim tornou-se impossivel contar as suas pancadas. Os intervallos das convulsões foram tambem se tornando cada vez menores até que uma mais forte e mais duradoura veio fechar a scena com a morte do animal 40 minutos depois de mordido. Pouco antes de succumbir, as pancadas do coração enfraqueceram-se ao ponto de produzirem-se paradas intermiltentes desse orgão, seguidas de syncope. O cadaver do pequeno animal conservava os membros anteriores distendiãos e rios; pela abertura das narinas escorria um liquido espumoso, levemente tinto de vermelho. Esse liquido levado ao microscopico não apresentou nem um só dos caracteres do sangue normal. FExaminando as visceras, chamou-nos logo a atenção uma notavel difluencia do sangue, cuja coloração e excessiva Íluidez faziam-no assemelhar-se a uma solução de xarop: de groscilhas. Os orgãos parenchymatosos, como o figado, os pulmões, e os rins achavam-se imbebidos de sangue e tinham uma côr vermelho-escura. Nos pontos em que haviam pene- trado as presas do ophidio viam-se por baixo da pelle duas manchas negras. Uma porção do sangue, estendido sobre laminas de vidro e examinado com uma bôa lente, offereceu-nos o seguinte phenomeno curioso: na superficie do liquido surgiam numerosas bolhinhas gazozas, apparecendo a principio como pontinhos brilhantes, crescendo depois lentamente até attingirem o tamanho de cabeças de alfinete. Não se podendo attribuir taes bolhinhas gazozas à penetração do ar n9 sangue, lícito era conjecturar que ellas tinham a sua origem no desprendimento dos gazes contidos nesse liquido. Novos factos semelhantes virão d'entro em pouco dar maior somma de proba- hilidades a esta hypo these. O exam: microscopico feito sobre o sangue? extrahido de pontos diiferentes, demonstrou o seguinte: os globulos vermelhos deformados, opacos, parecendo antes granulações do que globulos; muitos d'elles apresentavam-se totalmente des- corados. (Vid. a fig. 4 da Est.) Em algumas das preparações notâmos tambem manchas vermelhas devidas à difusão da materia corants do sangue. ExpERIENCIA EM 8 DE JuxHo DE 1877. — Introduzida na gaiola uma gallinha, a Bothrops atirou-lhe dois botes successivos, ferindo-a primeiro ao lado do sternon, depois na cabeca. No fim do 10 minutos a gallinha agachou-se; linha o bico aberto e a respiração curta. Passados 6 minutos deixou pender a cabeça, as azas abateram-se e ella ficou immovel. O coração batia então com extrema rapidez e, de instante a instante, notava-se uma paradi nas contraeções desse orgão. A respiração foi se embaraçando cada vez mais; os olhos fecharam-se e o pescoço, agitado por uma violenta contracção tonica, envergou ats tocar com O bico no sternon. Uma fortissima convulsão geral veio em seguida annunciar à morte 35 minutos depois da picada, 6 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Antes de apparecerem as convulsões, quando os phenomenos toxicos já estavam bem patentes, picâmos com uma agulha diversos pontos do tegumento externo e vimos que a sensibilidade cutanea estava inteiramente abolida. O exame dos orgãos internos revelou grande hyperemia dos pulmões e do figado. Uma gota de sangue, extrahida dos pontos em que haviam penetrado “as presas do ophidio e examinada no microscopico, deixou ver o seguinte: notavel alteração na fórma dos giobulos; muitos elles tinham perdido a sua fórma elliptica normal; outros apresentavam-se sob o aspecto de granulações opacas. No sangue extrahido das cavidades a alteração não era, porém, tão sensivel ; ahi existiam ainda muitos globulos com os seus caracteres normaes. Examinado em massa, 0 sangue oferecia uma coloração vermelho-arroxeada; e estendido em camada mui fina, a côr do tijolo desmaiada. Conservado em provetes durante 3 horas nenhum vestígio apresentou de coagulação ; apenas a côr mudou um pouco, tirando mais para o escuro. Experiexcia em 9 DE guxHo DE 1877.— Um porquinho da India foi intro- duzido na gaiola e apezar de repetidas e energicas provocações, a Bothrops re- cusou-se a dar-lhe o bote. Quando já principiavamos a duvidar do bom exito desta tentativa, o ophidio atirou-se, de subito, sobre o pequeno animal e ferio-o na cabeça. Uma tumefacção bem sensivel começou a apparecer nas vizinhanças do ponto ferido; os pellos levantaram-se e o animal abatido conservou-se immo- vel no logar em que o tinhamos deixado. Os phenomenos toxicos tiveram uma evolução mui lenta; só no fim de 30 minutos comecámos a notar que elle movia com dificuldade os membros posteriores. Os phenomenos paralyticos foram, porém, se incrementando pouco e pouco até que a marcha tornou-se impossivel; elle fazia esforços para andar, mas apenas conseguia arrastar os membros para- lysados, cahindo de flanco a cada movimento. Os batimentos cardiacos augmen- taram de frequencia; a respiração tornou-se curta e embaraçada. Nesta occasião applicimos no animal os rheophoros de um apparelho de inducção e sob a in- fluencia da electricidade vimol-o reanimar-se e executar alguns movimentos de locomoção, que antes não podia executar. Contracções fibrillares espontaneas appareceram nos musculos cutaneos do pescoço e na cabeça. Injectando nessa occasião um pouco d'agua na boca, no- tamos que o animal não a podia deglutir, sahindo grande parte della pelas na- rinas. Pouco e pouco os phenomenos paralyticos foram se estendendo aos membros anteriores, que ficaram immobilisados; ligeiras convulsões geraes vieram por fim annunciar a morte 76 minutos depois de inoculado o veneno. Ao expirar houve a ejaculação de uma certa quantidade de liquido seminal, cujos caracteres foram por nós reconhecidos no microscopio, Chamou-nos particularmente a altenção, neste caso, a pouca intensidade dos phenomenos toxicos e a lentidão com que se desenvolveram, vindo a causar a morte 76 minutos depois da picada. Não menos nos sorprendeu tambem as ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL | constantes recusas do ophidio em dar o bote, o que só fez após repetidas e energi- cas provocações, nas quaes consumimos para mais de 10 minutos. Este facto póde ter uma unica explicação plausivel, que é esta: a provisão do veneno se tinha -quasi esgotado nos dias antecedentes com as experiencias consecutivas que fizemos, e o ophidio achava-se abatido por um jejum prolongado; a peçonha, por- tanto, que elle tinha de reserva na vesicula devêra ser em diminuta quantidade e talvez enfraquecida nas suas propriedades toxicas. Si o animal empregado na experien- cia fôra de outro porte e vigór, a morte provavelmente não se teria dado em virtude das condições especiaes, em que se achava o ophídio. Nem de outra sorte se podem explicar esses factos citados por alguns viajantes da inocuidade da picada da Bothrops, sinão appellando para o estado de vacuidade da vesicula que contém o veneno. Por isso mesmo que o liquido segregado pela glandula toxicogenica constitue apenas uma arma de aggressão e defeza ec não intervem em acto algum physio- logico do ser que o produz, a sua secreção se faz aos poucos e espaçadamente, resultando dahi que uma vez gasto todo o producto toxico na lucta pela exis- tencia, fica o reptil durante algum tempo privado da sua arma defensiva e aggressiva e, portanto, a picada por elle produzida isenta de perigo. Nesta experiencia notamos que a irritabilidade muscular desapparecia rapida- mente. Logo depois que o animal succumbio descobrimos os musculos da cabeça e os masseterinos e sobre elles applicimos os rheophoros do apparelho de in- ducção com uma corrente pouco intensa. Ao principio as contracções se fizeram com certa energia; 5 minutos depois enfraqueceram-se, deixando por fim o musculo de obedecer à excitação electrica. O sangue conservado dentro de um provete no fim de 48 horas ainda não havia coagulado; viam-se apenas no fundo do provete raros filamentos de fibrina esparsos. ExpERIENCIA EM 15 DE JUNHO DE 1877.— No intuito de estudar a acção do alcohol como contraveneno, injectâmos no papo de uma gallinha 10 centimetros cubicos de aguardente e, depois que tivemos plena certeza da absorpção do alcohol pela mani- festação dos phenomenos proprios da embriaguez, puzemos a gallinha em presença da Bothrops. Esta, irritada, armou-se e deu-lhe tres botes successivos, sendo os dous pri- meiros no tronco junto às azas e o terceiro no pescoço. Deixada em liberdade a ave, nenhum outro phenomeno apresentou além d'aquelles que pertencem à em- briaguez alcoholica. Passadas duas horas, estes phenomenos mesmos se dissiparam e a gallinha voltou às suas condições anteriores. Para contraprova da acção neutralisante do alcohol sobre o veneno da Bothrops, procedemos no dia seguinte à nova experiencia, empregando nella a mesma gallinha ; mas desta vez sem alcoholisal-a previamente, como haviamos feito na experiencia pre- cedente. A ave foi picada na parte superior do pescoço junto à cabeça. Tres mi- nutos depois começaram a arripiar-se-lhe as pennas do pescoço ; pouco a pouco à 3 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL sallinha foi se deixando cahir de lado ; a respiração tornou-se curta ; os olhos fecha- ram-se. Nesta occasião, quando já estavam bem patentes os effeitos do veneno, 10 cen- timetros cubicos de aguardente foram injectados no papo. Após a injecção da ultima porção, sobreveio uma contracção fortissima no pescoço, fazendo-o envergar como um arco; em seguida houve a regurgitação de uma parte da aguardente, de mistura com mucosidades ; as azas e as pernas foram sacudidas durante alguns instantes por uma violenta convulsão, à qual succedeu a morte. Cumpre notar, que nesta ultima experiencia as presas do ophidio penetraram em uma região muito rica de vasos, bastando esta circumstancia para explicar a evolução rapida que tiveram os phenomenos toxicos, de sorte a produzirem a morte no curto espaço de 10 minutos. Nos pontos correspondentes às feridas produzidas pelos dentes do ophidio existiam, por baixo da pelle, duas manchas negras bom salientes. O sangue apre- sentava todos os carecteres de anormalidade que notâmos nas experiencias precedentes, isto é: extrema fluidez, colorisação de groseilha e coagulação dificil. Examinado no microscopio, observáâmos descoramento completo de grande porção de globulos ; muitos d'elles estavam deformados ou destruídos; existiam, além disso, granulações amorphas e crystaes dc hemoglobina com a sua côr e fórma caracteristicas. (Vid. fig. Ida Est.). Um facto prendeu-nos aqui principalmente a attenção, sendo esta a segunda vez, que tivemos occasião de observal-o nas nossas experiencias; vem a ser: o appareci- mento de bolhinhas gazozas no meio do sangue estendido sobre laminas de vidro. A principio figurando pontinhos brilhantes, vimol-as depois augmentarem pouco e pouco de volume, agrupando-se aqui e acolá à semelhança dessas pequeninas bólhas que surdem na superficic de um liquido quando no seio delle se está operando um trabalho de fermentação. Este facto foi verificado pelos meos ajudantes de laboratorio, ficando, além disso provado, que tal phenomeno tornava-se sobretudo apparente no sangue extrahido dos pontos mais proximos à picada. O mesmo phenomeno deu-se em um pombo, cuja morte causada pela Bothrops, teve logar no fim de 15 minutos. Por baixo da pelle da cabeça, justamente onde os dentes do ophidio tinham penetrado, ex- istiam duas manchas negras, cobertas de numerosas bolhinhas gazosas, que irrompiam de pontos diferentes, dando aos tecidos macerados dessa região o aspecto emphy- sematoso. A frequente repetição deste facto vinha de alguma sorte fortalecer a hypothese por nós já formulada — de que em taes casos dá-se um desprendimento dos gazes con- tidos no sangue. Mais adiante adduziremos algumas considerações physiologicas em ordem a explicar o mecanismo desse phenomeno. As experiencias que fizemos em rans foram pouco concludentes. Nada revelava exteriormente que a acção do veneno se estava exercendo sobre a economia desses animaes ; apenas notâmos um certo entorpecimento depois da picada, e sem que se ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 9 manifestassem phenomenos de outra ordem, a vida do animal extinguia-se de uma ma- neira lenta e silenciosa. Antes da morte, examinando a circulação da lingua, nas rans, vimos os capillares deste orgão como finas strias vermelhas, apresentando em alguns pontos de seu trajecto pequenos extravasados sanguincos ; havia, além disso, parada da circulação no interior desses vasos. No intuito de acompanhar as differentes phases de alteração dos globulos, procu- rámos extrahir algumas gotas da substancia toxica afim de juntal-a depois a uma prepa- ração de sangue normal e observar os elfeitos. Para chegar a esse resultado come- câmos por submetter o ophidio à acção do chloroformio e quando conseguimos entorpecel-o inteiramente, fizemos retiral-o da gaiola com todo o cuidado, collo- cando-o depois em condições de servir à experiencia. Por meio de uma leve compressão exercida sobre o ponto: de inserção dos dentes, obtivemos uma gota do veneno, que foi depositado em uma capsula de vidro. Era um liquido perfeitamente transparente, de consistencia gommosa, seccando com rapidez ao ar livre e deixando nas paredes da capsula uma materia esbranquiçada um pouco semelhante à vaccina. Juntando uma pequenissima porção desse liquido a uma preparação feita com o sangue de um dos meus ajudantes, vimos immediatamente os globulos dissolverem-se, deixando em seu logar extensas manchas diffusas, onde não era possivel descobrir a minima apparencia elobular. Em um dos angulos da preparação destacava-se uma larga mancha ver- melha, constituida pela materia corante do sangue envolvendo numerosos globulos deformados. (Vid. fig. 5 da Est.) Destes factos experimentaes podemos inferir algumas conclusões de valor quanto ao modo por que exerce a sua acção no organismo o veneno da Bothops-gararaca ? Primeiro que tudo, é incontestavel que o sangue é o systema atacado pelo contacto desse agente toxico—assim o demonstram as observações microscopicas que fizemos, e as modificações de côr e de fluidez que apresentou constantemente esse liquido após à inoculação do veneno. Mas, dizer que a acção localisa-se sobre o sangue, sem determi- nar qual o elemento atacado desse liquido complexo, é apenas restringir mais os limites da questão physiologica sem entretanto resolvel-a satisfactoriamente. Entram na com- posição do sangue elementos morphologicos differentes e substancias plasticas dotadas de propriedades physico-chimicas diversas; para ser, portanto, completa, neste caso, a analyse experimental, torna-se necessario reduzir a localisação do veneno a termos mais precisos; isto é, cumpre determinar, com a interpre- tação rigorosa dos factos experimentaes, sobre que elementos do sangue actúa o veneno e qual o modo por que sc exerce a sua acção. Em todas as experiencias que fizemos, acomvanhadas do exame do sangue, um facto constante se revelou à observação microscopica — foi a destruição do elemento globular com desagregação e subsequente diffusão da materia corante no seio do plasma. (Comprehende-se, à primeira vista, qual a importancia physiolo- gica que se deve ligar a este facto e que deducções se podem tirar delle para a explicação das desordens funccionaes produzidas pela inoculação do veneno. E VII —3 10 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL A dissolução do elemento—globulo, trazendo, como consequencia fatal e necassa- ria, a perda dos seus attributos physologicos, não será dificil explicar neste caso como é que o funccionalismo dos orgãos se perturba ao ponto de dar em resul- tado a cessação da vida. Parecendo-nos, porém, incontestavel que tal destruição globular é o effeito de uma acção chimica, devemos admiltir que aqui o agente toxico defórma e dis- solve os globulos porque altera a constituição molecular da materia que fórma o stroma desse elemento, o que é o mesmo que dizer que o veneno da Bothrops- jararaca aclúa sobre a—globulina. E” esta uma hypolhese fundada em factos, que não póde exigir demonstração mais rigorosa por ser dificil tal demonstração com os meios analyticos de que dispõe actualmente a Sciencia. Uma vez atacada à globulina e dissolvidos os globulos, a materia corante destaca-se e vai constituir com o deliquio do elemento globular essas manchas vermelhas que observámos constantemente nas preparações micros- copicas. (Que significação, porém, se deve dar a essas bôlhinhas gazosas que vimos desprendendo-se do liquido sanguineo e que tanto attrahiram a nossa atten- cão? Sem termos provas irrecusaveis para invocar em favor da nossa hypothese, podemos entretanto conjecturar, fundado em boas razões, que taes bólhinhas gazo- sas são devidas ao desprendimento dos gazes contidos no sangue. A destruição do elobulo, trazendo tambem a dissolução da hemoglobina, parte integrante e essen- cial d'aquelle elemento, porque não admittir que o oxigeneo, fixado normalmente à hemoglobina por uma combinação instavel, se aparta dessa combinação, tor- nando-se livre no sangue, quando ao mesmo tempo a materia a que elle estava reunido se tem desagregado? A amalyse spectral mostrando o spectro da hemo- globina reduzida podia vir aqui prestar um valioso apoio a esta hypothese ; mfelizmente, porém, um concurso de circumstancias especiaes inhibiu-nos de re- correr a esse meio demonstrativo. Em todo o caso, o facto foi verificado pela simples observação ; o que falta é determinar rigorosamente as condições e a natureza do phenomeno. Outro facto constante que se revelou à simples inspecção foi a incoagulabi- lidade do sangue. Este facto está de perfeito accordo com a hypothese da acção do veneno sobre a globulina, Os trabalhos hematologicos de Schmidt deixaram fóra de duvida que a fibrina, a cuja presença deve o sangue a propriedade de coagular, não preexiste nesse liquido; ella é formada pela acção de duas substancias differentes—a fibrino-plas- tica (paraglobulina) e a fibrinogenica: a primeira existente sobretudo nos globulos, a segunda pertencente ao plasma. Ora, sendo pelo contacto do veneno destruida a globulina, falta este elemento gerador da fibrina no sangue e este perde 1pso- facto a propriedade de coagular. ? 1 Tem-se contestado o valor dos trabalhos de Schmidt, pr parecerem pouco | demonstrativas as suas experiencias e muito hypotheticas as suas conclusões. reciso é, porém, não esquecer que a ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 1 O accordo existente entre os principios physiologicos, applicados a estes fac- tos, é a hypothese da Jocalisação do veneno sobre a globulina vem dar mais valor ainda a esta hypothese. “Que o veneno actua sobre o sangue por uma acção chimica, nos parece isso incontestavel; que tal acção pertence à ordem das acções de catalyse, nos parece tambem provavel. O que é tal veneno sinão uma saliva toxica? As analyses chimicas de Luciano Bonaparte sobre o veneno da vibora chegaram a separar uma substancia azotada muito analoga à ptiyalina e que deve ser considerada como a substancia activa desse veneno. A analogia leva-nos, portanto, a admittir aqui a existencia de um fermento especial que obra por uma acção de contacto sobre o sangue da mesma maneira que a ptyalina da saliva obra sobre o amido. Neste pre- supposto, explicar-se-hiam as differenças na intensidade do veneno, segundo as especies, pela maior ou menor força catalytica do fermento; isto é, dar-se-hia aqui um phenomeno analogo áquelle que se observa em relação à saliva dos mamiferos que não obra sempre com a mesma rapidez sobre o amido: no cão e no gato ella exige um certo lapso de tempo para operar a transformação da substancia amy- lacea, ao passo que no porco da India a transformação é instantanea. As pica- das do Crotalus horridus e da Naja tripudians (cobra de capello) não seriam, pois, mais perigosas sinão porque essas duas especies produziriam um fermento dotado de maior força catalytica, isto é, um fermento capaz de destruir mais rapidamente a globulina. Esta supposição, fundada em analogias physiologicas, care: e entretanto ser provada experimentalmente. 1 Vejamos agora como se deve explicar o mecanismo da morte produzida pela acção desse veneno. O complexo dos phenomenos geraes que succedem á picada e que se reproduziram com uma notavel semelhança em todos os animaes que ser- viram às nossas experiencias, induzem-nos a admitir que a morte se dá nesses casos por um mecanismo analogo ao de uma grande hemorrhagia. A diferença biologia do sangue apesar dos progressos modernamente realisados na histochimica, lucta e luctará ainda muito tempo com a hypothese, emquanto processos e instrumentos mais aperfeiçoados não vierem imprimir um cunho mais positivo às investigações hematologicas. + Em uma communicação feita à Sociedade Real de Londres os Drs. Lamber Bruton e Fayrer apresentaram os resultados das suas intvestisações sobre o veneno da Naja tripudians (cobra de capello), Bem pouco positivas, porém, são as conclusões a que chegaram esses dous observadores rela- tivamente à maneira de obrar desse veneno. Dizendo que tal agente toxico actúa essencialmente sobre os centros nervosos, elles reconhecem, entretanto, que é dificil determinar si a sua acção limita-se apenas a perturbar as funcções desses centros e em particular da medulla spinal; ou, si ao contrario ella estende-se aos nervos periphericos, aos musculos e ao sangue. Quanto ao mecanismo da morte, ella seria produzida, na opinião desses auctores, por uma asphyxia consecutiva á paralysia dos musculos respiratorios, offerecendo sob este ponto de vista analogias com o urari. (Vid. Revue Scienti- fique T. XIII da colecção; 1874, p. 1120). Que taes conclusões estão em opposição com os principios fundamentaes da physiologia toxicologica, é cousa facil de provar. Até onde tem podido chegar a analyse experimental está ainda por descobrir- se um veneno que actúe indistinctamente sobre o systema nervoso, sobre os musculos e sobre o sangue. O systema atacado é um só; as desordens dos outros systemas são apenas o resultado desse consensus physiologico que une tão estreitamente entre si as grandes funcções da vida, de sorte que a perturba- ção introduzida nas funcções de um systema traz necessariamente a perturbação dos outros. Resta, por- tanto, saber si nos casos de picadas produzidas pela Naja tripudians a acção do veneno não se loca- lisa primitivamente sobre o sangue, como se dá com a Bothrops-jararaca, devendo então explicar-se as desordens funccionaes do systema nervoso como uma consequencia da alteração rapida e profunda desse liquido nutritivo. Sobre este ponto de vista ha carencia completa de factos experimentaes nas investi- gações de Lamber Bruton e Fayrer. 12 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL consiste apenas no seguinte: é que no primeiro caso Os globulos são destruídos dentro dos proprios vasos, emquanto que no segundo elles sahem illesos por uma solução de continuidade do vaso;—no fim o resultado é sempre o mesmo: os orgãos privados do seu excitante normal-—o oxigeneo, que transita no sangue com os globulos, sofírem uma perturbação nas suas funcções, começando pelo systema nervoso, cuja normalidade funccional está mais directamente dependente da norma- lidade do sangue. Considerada na ordem de successão dos grandes systemas organicos, a morte comeca pelo globulo do sangue e acaba pelo musculo, cuja irritabilidade persiste ainda alguns minutos depois da parada completa e definitiva das grandes funcções da vida. As pseudo-hemorrhagias produzidas pela exosmose do sóro sanguineo atravez das paredes dos vasos é um symptoma frequentemente observado nos individuos que soffrem picadas de ophidios venenosos. Dá-se então um phenomeno pura- mente physico de exosmose devido ás modificações moleculares do plasma, cuja subs- tancia fibrino-plastica é destruida pelo veneno. O que sahe pelas aberturas na- turaes e pelas mucosas não é o sangue em natureza, é simplesmente o sôóro tinto de vermelho pela hematina. Em uma das nossas experiencias verificamos este facto com o auxilio do microcopio. ? Paralysias e convulsões, taes foram os dois symptomas dominantes; elles exprimem perturbações na actividade funccional do systema nervoso, devidas à impressão anormal que sobre elle exerce o sangue privado de seu elemento prin- cipal— o globulo vermelho. Si estes e outros phenomenos objectivos, unicos que podem ser apreciados no animal submettido à experiencia, estão de accordo com a explicação que demos do mecanismo da morte, os phenomenos subjectivos, como as perturbações da visão, vertigens, cephalalgia intensa, nauseas, lipothy- mias observados muitas vezes nos individuos mordidos pela Bothrops-jararaca, não o estão menos. * Paraque a morte se dê nesses casos não é preciso que todos os globulos sejam destruídos, da mesma maneira que para morrer um animal de hemorrhagia não é preciso que se escôe todo o sangue contido nos vasos; ha aqui um limite além do qual as condições anormaes do sangue se tornam incom- pativeis com a continuação dos phenomenos vitaes. Sob este ponto de vista varia muito a resistencia oferecida pelos differentes animaes à acção do veneno; e ! A falsa hematuria é um phenomeno frequentemente observado nos individuos picados pela cascavel. 2? Na minuciosa observação referida por Sigaud no seu livro. — Du Climat et des maladies du Brésil de um morphetico que se deixou picar por um crotalus na esperança de ficar curado da sua he- dionda enfermidade, os principaes symptomas apresentados desde o momento da picada até a occasião da morte foram os seguintes: rapida tumefacção da mão, que tinha sido ferida pelos dentes do ophidio entre a articulação do dedo minimo e o annular com o metacarpo, resfriamento dessa região e conse- cutivamente dos membros inferiores, sêde, sensação de tumefacção aos lados do pescoço, torpor geral, prostração de forças ; espasmo do pharynge com difflculdade de deglutir, dores atrozes nos membros superiores, grande anciedade, epistaxis, respiração difficil, pulso frequente, chegando no fim de algu- mas horas o dar 119 pancadas por minuto. Augmento de TER secreções, como a da saliva, de suor, e das ourinas. Estas tornaram-se para o fim sanguinolentas. Movimentos convulsivos na maxilla e nas extremidades inferiores, pulso intermittente, morte no fim de 24 horas. Lividez e inchação enorme do cadaver, decomposição rapida. 5 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 13 comprende-se bem que esta resistencia deve guardar uma certa relação com o volume total do sangue que circula em cada um delles, assim como com a acti- vidade maior ou menor da combustão respiratoria que se effectúa na intimidade dos seus tecidos. Por isso os pequenos mamiferos succumbem mais rapidamente do que os animaes de grande porte; e as aves, que são dotadas de funcções mais activas, em geral resistem menos do que os mamiferos. Isto quanto ao sujeito que soffre a acção do veneno; agora quanto ao animal que o produz, occorrem tambem muitas circumstancias que podem- influir sobre a actividade do veneno. (Como todo o producto de secreção, a saliva toxica dos ophidios póde medificar-se em sua quantidade e qualidade por influencia de causas diversas, muitas vezes inapreciaveis. A observação tem mostrado que nas épochas que coincidem com os grandes calores, na muda ec no cio, o veneno adquire uma grande energia: é esse um facto verificado pela observação, o qual devemos admit- tir como certo, embora não possamos explical-o. Em resumo : a. —- O veneno da Bothrops-jararaca actua sobre o sangue, destruindo a globulina. b. — Elle parece obrar à maneira de um fermento soluvel. c. — A morte effectua-se por um mecanismo analogo ao de uma grande hemorrhagia. Em uma das nossas experiencias a acção do alcohol, como contraveneno, parece ter ficado plenamente provada. E” este ainda um vasto campo para explorar na sciencia toxicologica e no qual pretendemos entrar brevemente, encetando outra serie de investigações. Explicação da Estampa. Fic. I. — Preparação microscopica do sangue de uma gallinha, picada pela Bothrops- jararaca, e que morreu 10 minutos depois. Veem-se os globulos deformaãos; granulações opacas, resultantes de destruição dos mesmos globulos e crystaes de hemoglobina. (?) ' Relativamente a este facto cumpre notar o seguinte: que sendo a peçonha do Crotalus uma das mais activas que se conhece, pois que ella causa a morte muitas vezes dentro de alguns minutos, ainda mesmo quando o animal picado é de grande porte como o boi ou o cavallo, parece extranhavel que no caso referido por Sigaud a morte só tivesse tido logar 24 horas depois da inoculação do veneno. Entretanto con- vem lembrar que as condições especialissimas em que se achava esse individuo, affectado de uma moles- tia que tende a modificar profundamente a sensibilidade da pelle, assim como a faculdade absorvente do tecido subjacente, poderia bem ter concorrido para que não fosse absorvida sinão uma parte minima da peçonha inoculada. Ora, é sabido que nas picadas dos ophidios a maior ou menor intensidade dos phenomenos toxicos depende não só da qualidade sinão tambem da quantidade do veneno absorvido. Ha casos de picadas do Crotalus bem authenticos, em que a morte teve logar no fim de alguns se- gundos. A peconha desse ophidio produz, portanto, em certas circumstancias, efreitos toxicos quasi ful- minantes ; ella mata tão depressa como a nicotina, o acido prussico e o urari, venenos dos mais violen- tos que se conhecem. 14 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Na parte inferior da preparação a destruição do elemento globulo é total. Fic. Il. — Preparação microscopica do sangue de um porco da India, picado pela Bothrops. Innumeras granulações resultantes de globulos de- formados; materia corante diffundida; globulos de gordura e crys- taes de hemoglobina. Fio. WI. — Extremidade cephalica da Bothrops-jararaca. (tamanho natural). Fic, IV. — Preparação microscopica do sangue de um porco da India, picado pela Bothrops. Veem-se grupos de globulos inteiramente descorados. Fra. V. — Preparação microscopica do sangue humano, a que se juntou uma pequenissima quantidade do veneno da Bothrops. Globulos totalmente destruídos e em um dos lados da preparação uma larga mancha vermelha, constituida pela materia corante do sangue destacada e agglomerada, envolvendo numerosos globulos defor- mados. j ADDITA MEN'TO ÁS INVESTIGAÇÕES EXPERIMENTAES Sobre a acção do veneno da Bothrops jararaca Exame chimico é microscopico do veneno PELO PBRMEACERDA FISH Ja ia entrar no prélo o nosso trabalho, quando recebemos do Dr. Glasl, actual Director do Jardim Botanico, uma Bothrops viva, de maiores dimensões do que aquella outra que tinha servido às nossas primeiras experiencias. Infeliz- mente ella trazia ainda bem visíveis os signaes das pancadas que recebera na cabeça e no dorso, e das quaes lhe resultou a morte no fim de dois dias. Não po- dendo contar muito com o seu auxilio para uma serie de experiencias tendentes a reconhecer a eflicacia de certos suppostos contravenenos, resolvemos aproveital-a ao menos para o estudo mais particularisado dos caracteres physico-chimicos do veneno, preenchendo nesta parte uma lacuna importante e sensivel do nosso trabalho. Extrahimos o veneno pelo processo já conhecido da compressão exercida sobre a base dos dentes, estando o animal chloroformisado. O veneno assim obtido apresentava os seguintes caracteres physicos: 16 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Liquido viscoso, transparente, com o aspecto de gomma, seccando rapida- damente ao ar livre, ficando no fundo da capsula onde elle tinha sido depositado, uma materia opaca, esbranquicada que se partia em laminasinhas, quando ras- pavamos o fundo da mesma capsula com a ponta de um escalpello. Estas la- minasinhas, comprimidas ou attritadas, reduziam-se a uma substancia pulverulenta, soluvel n'agua na temperatura ordinaria. Uma gotta desta solução posta em con- tacto com uma gotta de sangue e examinada a preparação no microscopio, Tepro- duzia exactamente aquellas alterações de côr e de fórma que observamos no sangue dos animaes submettidos à experiencia. A mesma solução tratada pelo acido acetico e examinada no microscopio, deixou | vêr numerosos corpusculos, alguns arredondados, quasi sphericos, outros fusifor- mes, dispostos em series lineares, approximando-se muito, quanto á fórma, do eryptococeus cerevisie, ou fermento alcoholico, segundo as interessantes demonstra- cões de Pasteur. Da extremidade de alguns desses corpusculos via-se sahir dis- tinctamente um pequeno prolongamento filiforme, como é facil de verificar na figura que acompanha esta nota. Em outros observava-se a reproducção por segmentação destacando-se um corpusculo de outro. Tendo succumbido o animal no fim de dois dias, disseccâmos cuidadosamente a glandula toxicogenica e fendendo a vesicula venenifera, derramou-se logo bôa porção de um liquido nimiamente viscoso, de um amarello esverdeado, asseme- lhando-se mais á bDilis do que à saliva. Depositado em uma capsula de vidro, vimos que ello adheria perfeitamente ás paredes da capsula, donde só era possi- vel tiral-o com a ponta de um escalpello. Deixado ao ar livre, seccava rapidamente ficando uma substancia amarellada no fundo da capsula. Tratada esta substancia pelo acido azotico, ella dissolvia-se em parte, sem apresentar a minima modifi- cação de côr; tratada, porém, pelo acido sulfurico, tornou-se um pouco mais es- cura. Uma porção de veneno diluido em acido sulfurico e aquecido sobre uma lampada de alcohol, carbonisou-se immediatamente, desprendendo vapores com o cheiro activo das substancias corneas carbonisadas. O exame microscopico feito sobre uma pequenina quantidade desse veneno, sem a juncção de acido acetico, denunciou a existencia de globulos de muco e de mumerosos corpusculos arredondados e fusiformes, semelhantes áquelles que ti- nhamos observado no veneno extrahido do animal vivo, sómente mais reduzidos de volume. Não obstante haverem decorrido algumas horas depois da morte da Bothrops, todavia o veneno extrahido post-mortem conservava ainda toda sua acti- vidade e energia. Posto em contacto com o sangue elle alterou rapidamente a fór- ma dos globulos sanguíneos, destacando-se ao mesmo tempo a materia corante que se agglomerou em certos pontos da preparação. Uma porção desse veneno, tal qual tinha sido extrahido da vesicula, foi inoculado na face interna da coxa de um cãosinho e na cabeça de uma gallinha. No primeiro elle limitou-se a produzir dôr e uma pequena tumefacção nas circum- ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 17 vizinhanças do ponto inoculado; na gallinha houve completa ausencia de pheno- menos toxicos. Este facto não podia, de certo, ser attribuido à pouca actividade do veneno empregado ; porquanto, como vimos, este, posto em contacto com o san- gue, alterava-o rapidamente. E” mais razoavel suppôr-se quo, neste caso, a ex- trema viscosidade do veneno impediu a sua absorpção, exercendo-se apenas a acção local sem a manifestação dos phenomenos geraes. As differenças de coloração que apresentou aqui o veneno extrahido do mesmo individuo, em circumstancias diversas, levam-nos a admittir, contra a opinião de alguns observadores, que a coloração não é propriedade para servir de caracteris- tico aos venenos da Bothrops, do Crotalus e da Naja: extrahido da Bothrops viva, elle era transparente, limpido, incolor; algumas horas depois da morte, amarelo esverdeado; sendo, além disso, para notar que estas differenças na côr em nada influiram sobre as manifestações da actividade do veneno. A presença d'aquelles corpusculos fusiformes na preparação microscopica faz nascerem certas duvidas quanto ao modo de considerar a natureza do veneno. Será, com effeito, um fermento soluvel, como a principio nos pareceu, ou, pelo contrario, um fermento figurado? Serão ou não taes corpusculos verdadeiras cellulas organisadas, que se multiplicam e se reproduzem no seu meio proprio, operando, quando em contacto com o sangue, desdobramentos e alterações moleculares, que modificam profundamente a constitutuição intima daquelle meio organico? Por outras palavras, serão os corpusculos fusiformes os verdadeiros e unicos agentes da decomposição do sangue nos casos de picadas feitas pela Bothrops? Haverá algum parentesco entre os ditos corpusculos e os corpusculos da saliva humana, que Rouget acredita serem os verdadeiros agentes da transformação glycosica do amido ? Ha certamente alguma cousa para investigar nesse sentido e estas hypo- theses aqui formuladas carecem de ser acompanhadas de uma demonstração . Juntamos a esta nota uma estampa, com duas preparações microscopicas representando os corpusculos fusiformes do veneno da Bothrops. As figuras desta estampa foram desenhadas à vista da preparação microscopica pelo habil desenhista do Museu, o sr. Lallemant, que as gravou depois sobre a pedra. Podemos assegurar que ellas reproduzem fielmente o que mostrou o microscopio. V. —4 A CORRELAÇÃO E DOS INSECTOS PRONUBOS PELO DR: FREDERICO MULLER Naturalista Viajante do Museu Nacional Muito escassas são até agora as observações que possam elucidar a signi- ficação biologica das flores versicolores ou de côr mudavel. Ainda hoje, como, ha perto já de um seculo disse Brotero 2, a côr das co- rollas é ordinariamente desprezada pelos botanicos modernos. Ha compendios de botanica, aliás excellentes, que nem uma linha dedicam à côr das flores. Só Delpino ? trata amplamente deste interessante assumpto e a elle tambem são devidas as unicas observações que possuimos, relativas à funcção das flores versicolores. O distincto professor da universidade de Genova observou os ip- sectos, que visitavam as flores do Ribes aureum e da Caragana arborescens. Em ambas essas plantas as petalas, amarelas a principio, tomam depois uma viva côr alaranjada, e são ambas mellitophilas, isto é, visitadas e fecundadas por hy- menopteros apiarios. Ora, Delpino notou que no Ribes aureum, sinão todos os ! Felio Avellar Brotero, Compendio de Botanica. 1788. Tomo IT. pag. 144. É da Delpino, Ulteriori observazioni sulla dicogamia nel regno vegetal. Parte II fascet. pag. 629. Do 20 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL apiarios, ao menos a Anthophorapilipes evitava visivelmente as flores alaranja- das, e que da mesma sorte na Caragana arborescens os apiarios, que a frequen- tavam, reservavam quasi exclusivamente as suas visitas às flores amarellas. Elle julga que d'ahi se póde concluir que, em certos casos, a variação das côres nas plantas versicolores, estão em correlação causal com os insectos pronubos, aos quaes denuncia assim o momento propício para uma visita efficaz das flores. 1 Ha pouco offereceu-se-me uma excellente occasião para, em outra planta de flores versicolores, fazer uma serie de observações, que confirmam inteiramente a opinião de Delpino. Estava e ainda está florescendo perto de minha casa um pequeno arbusto de uma especie de Lantana, cujos capitulos de flores se acham na altura de um metro até metro e meio, a mais commoda possivel para observações desta natureza. As flores duram tres dias, sendo amarellas (côr de gemma de ovo) no primeiro, de côr approximada à de laranja, no segundo; rôxas ou purpureas, no terceiro; as córes, pois, são tão diferentes, que é impossivel confundil-as. Emfim, o arbusto é facilmente accessivel por todos os lados, podendo-se escolher sempre o logar mais commodo para observar os insectos visitantes, sem os in- quietar ou afugentar. Não devia deixar passar, sem aproveital-a, occasião tão op- purtuna. Fui pois collocar-me de vigia, para espreitar o que haviam de fazer os insectos que viessem visitar as flores da referida Lantana. Pela estreiteza do tubo da corolla, e pelo seu comprimento, de cerca de um centimetro, facil era de prever que os insectos pronubos seriam lepidopteros, sendo estes os unicos capazes de, com a sua tromba delgada e comprida, sugarem o mel no fundo de semelhante corolla. Com efleito só uma unica vez vi uma Augochlora graminea, Sm., hyme- noptero da familia das Andrenideas, examinar varias flores, tanto rôxas, como amarelas, sem dellas poder tirar nem mel, nem pollen. De individuos pertencentes aos Lepidopteros vi nas flores desta Lantana 12 differentes especies, a saber: a Danais Erippus, Cram.; 0 Heliconius Apseudes, Hiúbn.; a Colaenis Dido, L.; a Colaenis Julia, Tabr.; a Dione Juno, Cram.; a Hesperocharis Augustia God. ; a Eurema Leuce, Boisd.; a Pieris Elodia, Boisd.; (ou P. Aripa, Boisd.? ) a Daptonoura Lycimnia, Cram.; a Callidryas Apris, Tabr.; o Papilio Thoas, L. e uma pequena especie da familia das Hesperideas, cujo nome ignoro. O Papilio Thoas e a Colaenis Dido foram vistas só uma vez, mas fugiram ao approximar-me ; da mesma sorte fugiram a maior parte das outras borboletas, sem que eu pudesse vêr a quantidade de flores que visitavam. Felizmente pude observar à vontade, de 14 de Outubro até 7 de No- vembro, perto de 40 individuos das outras dez especies, principalmente (ou por menos medrosas ou por mais absortas no seu trabalho, e por isso as que me- lhor se prestavam à observação) o Heliconius Apseudes e a Daptonoura Lycimnia. As observações que pude fazer sobre estas dez especies acham-se reunidas nas notas seguintes : | Delpino, — 1. C. pag. 29. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 21 1— Heliconius Apseudes. Observei 7 individuos desta especie, por mais ou menos tempo; vi alguns delles visitarem de 20 para 30 e mais flores. E nem siquer uma só vez tocaram uma flor rôxa ou alaranjada, sugando exclusivamento nas flores amarellas ou do primeiro dia. Quanto ao mais, havia certas diffe- renças no modo de proceder dos quatro individuos que pude vigiar por mais tempo no seu trabalho. O primeiro costumava chupar de duas até quatro flores amarellas em cada capitulo, voando depois a outro. O segundo chu- pava sempre todas as flores amarellas de cada. capitulo, cujo numero raras vezes excede a seis; o mesmo fazia quasi sempre o terceiro, nunca enfiando a tromba mais de uma vez na mesma flor; fiquei muito admirado de vêr que até em um capitulo composto de nove flores frescas, misturadas com as do segundo e do terceiro dias, nem se esqueceu de nenhuma, nem visitou duas vezes a mesma flor. Pelo contrario, o quarto varias vezes tornou a chupar em flores que já tinha visitado, e isso em capitulo cujo numero de flores frescas não excedia a tres ou quatro. As flores desta Lantana não desabrocham sinão pelas oito ou nove horas da manhã, segundo se mostra mais claro ou escuro 0 dia; ora, não é raro vir o Heliconius Apseudes visitar a planta antes deste tempo, quando só ha flores do segundo e terceiro dias; neste caso, conserva-se a pairar e a voltear, li- brando-se nas azas em cima de um ou de outro capitulo, sem nunca pousar. 2º— Daptonoura Lycimma. Pude observar de perto 13 individuos. Nunca chuparam sinão flores amarelas. Uma unica vez vi uma borboleta desta especie pousar num capitulo, em que só havia flores alaranjadas e róxas; porém, sem chupar e sem se demorar, abandonou-o, procurando outro com flores novas. Esta especie tambem costuma sugar todas as flores amarellas do capitulo que visita, sem inserir mais de uma vez a sua tromba na mesma flor. Não é muito raro ver a Daptonoura Eycimnia voltar duas e até tres vezes ao mesmo capitulo, immergindo, de cada vez, a tromba em todas as flores do primeiro dia, o que não me lembra ter observado no Heliconius Apseudes. 3º— 7º) Da especie Colaenis Julia, que não era muito rara na Lantana, apenas tres individuos não fugiram antes de me approximar, e sómente estes visitaram as flores amarellas; da mesma sorte dous individuos de Dione Juno, um de Hesperocharis Augustia, um de Eurema Leuce e um de Callidryas Cipris sempre evitavam as flores alaranjadas e róxas. 8º— Paeris Elodia. Esta especie, muito mais abundante - aqui nesta primavera do que costuma ser em outros annos, tambem não é rara na nossa Lantana ; mas sendo muito espantadiça, só pude observar tres individuos. O primeiro enfiou a tromba indifferentemente em flores amarellas e alaranjadas, isto é do primeiro e do segundo dia. Os outros dous, porém, só visitavam as flores amarelas; um delles, que observei por muito tempo, nem sempre soube evitar as flores cujo mel já tinha sorvido. Assim é que havendo na circunferencia de certo capitulo sete flores, seis amarellas e uma alaranjada, elle chupou a flor que estava à direita 22 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL da alaranjada ; depois, rodeando o capitulo, passowa chupar a segunda,a terceira e assim por diante até a sextr; evitou a septima, que era a alaranjada, metteu “a tromba oulra vez na primeira e na segunda, passando em seguida para outro capitulo. 9— Danais Erppus. E esta uma especie que se não póds bem observar sem afugental-a. Observei quatro individuos. Um chupava só flores amarel- las, evitando as alaranjadas e as rôxas ; os outros tres davam preferencia inequivoca às flores amarellis, pois que não deixaram d> metter a tromba tambem em algumas das alaranjadas e at; — uma unica vez — em uma das rôxas. Em 28 de Outubro vi um inlividuo desta especie pousado nas flores da Lantana antes que houvessem desabrochado as flores róxas; por isso só podia procurar mel, mas sem achar, nas flores do segundo dia. A Danais Erippus tem o costume de enfiar a tromba duas, tres e até quairo vezes em seguida na mesma flor da Lantana, porém não em todas; provavelmente só naquellas em cujo fundo encontra mel; nunca -vi-o im- mergir a tromba mais dº uma vez em flor alaraniada. 10º— Finalmente, observei tres vezes uma pequena borboleta da familia das Hesperideas; não sei si os tres individuos eram da mesma especie, visto como pertenciam a certas especies, numerosissimas nesta familia, que não se podem distin- guir à primeira vista. Duas destas Hesperideas, que, entretanto, não observei por mui- to tempo, só chupavam em flores amarellas; a terceira foi, de todas as borboletas por mim observadas na Lantana, a unica, que não pareceu importar-se com a cór das flores, mettendo indifferentemente a tromba em flores amarellas, alaranjadas e rôxas. Às observações que acabo de referir provam sobejamente a funcção que coube às flores versicolores da Lantana. (Como nas especies observadas por Delpino, a mudança de côr indica aos insectos pronubos as flores que elles devem visitar para se proverem de mel, e que são justamente as mesmas que precisam de suas visitas para serem fecundadas. E” evidente o beneficio que d'ahi colhe a planta. Si as flores cahissem no fim do primeiro dia, ficava reduzido à terça parte o numero dellas; seriam pois muito menos vistosos os capitulos, e muito menos proprios para prender a attenção das borboletas, Si as flores durassem, tres dias, sem mudarem de côr, os insectos pronubos perderiam o melhor de seu tempo em visitas inuteis a flores que por estarem já fecundadas, não precisavam mais dessas visitas. As flores do segando e teresiro dia, destinguindo-se pala sua côr alaranjada ou rôxa, das flores amarelladas do pri- meiro dia, continuam a contribuir essencialmente para attrahir os insectos indis- pensaveis à fecundação, sem comtudo seduzil-os a visitas desnecessarias. Mas porque motivo as borboletas são levadas a visitaram só as flores do primeiro dia? Será por algum instincto, por algum habito hereditario e congenito, em virtude do qual ellas evitam as flores alaranjadas e rôxas, visitando unicamente as amarellas? Ou deverá cada individuo aprender por si mesmo, pela sua propria ex- E E E NT RR DO e o a EDS PP UR ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 23 periencia, que sómente as flores amarellas retribuem com doce nectar o importante ser- viço que elle lhes presta transferindo o pollen de uma para o estigma de outra? As differenças individuaes observaveis entre borboletas da mesma especie parecem favorecer esta segunda hypothese. Porém as poucas observações que fiz são ainda “muito insuficientes para auctorisarem sobre tal assumpto, resposta definitiva. O Brazil é assaz rico em plantas de flores versicolores. Bastará citar varias especies de Lantana e de Combretum, diversas especies de Pleroma (v. g. Pleroma Sellowianum e o magnifi- co « Jaguaritão » da ilha de 5. Francisco), de Strychnos, de Amphilophiwmn, de Epi- dendrum, entre outros, o Ep. connabarwmun), etc. As flores de todas as especies do genero Lantana e do Epidendrum cinnaba- rinum são provavelmente fecundadas por borboletas; as dos generos Pleroma e Amphi- lophium por apiarios e as do genero Combretum por beija-flores. Conviria verificar por meio de observações directas si em todas essas plantas a mudança das córes tem a mesria significação que lhe attribuia Delpino. DOS Individuos masculinos das Especies IDEAIS ERAS RED IGESIPOIUS PELO Na exposição que di dos caracteres genericos dos Danais, diz Doubleday! o seguinte a respeito das differenças sexuaes que se encontram nas azas dessas borboletas : «os machos do primeiro grupo ( comprehendendo especies africanas que hoje formam o genero Amauris ?) têm uma certa macula formada de escamas muito bastas e de fórma peculiar, situada na nervura submédia das azas pos- teriores, perto do angulo anal. No segundo grupo (ao qual pertencem todas as especies americanas ), a macula sexual «sexual spot» acha-se no primeiro ramo da nervura media. No terceiro grupo, a macula sexual existe ou neste mesmo ramo ou na nervura submédia:; toma às vezes a fórma de um verda- deiro bolso, que se abre na superficie superior da aza e em cujo fundo, ao 1 Doubleday, Westwood, Iewitson, Genera of diurnal Lepidoptera, pag. 89. 2 Kirby, a dynonymit Catalogue of diurnal Lepidoptera, 1871. pag. 8. 26 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL menos em exemplares seccos, acha-se um pó de cór parda. Nas especies do quarto grupo (que hoje formam o genero Ideopsis !) falta a macula sexual das azas posteriores ). Tendo-se descoberto recentemente ? que as maculas sexuaes das azas, caracteris- ticas dos machos de muitas borboletas, são orgãos cdoriferos que exhalam um cheiro às vezes bastante forte, certamente agradavel às femeas das res- peclivas especies, procedi ao exame dessas maculas sexuaes egualmente nas nossas duas especies de Danais ( Danais Erippus, Cram. e D. Gilippus, Cram. ) e achei-lhe: uma estructura muito interessante ec que me parece merecer des- cripção circumstanciada. A macula sexual (conservo provisoriamente o nome de Doubleday até ser definitivamente estabelecida a sua funcção ) é situada, nos machos do Danais Erippus e do D. Gilippus entre a nervura submédia e o pri- meiro ramo da média da aza posterior, sendo separada do dito ramo unicamente por um intervallo muito estreito que no D. Erippus não eguala e no D. Gilippus pouco excede o diametro do mesmo ramo (Fig. 1,2, 7e8). Ella é visivel em ambas as superfícies, superior e inferior, da aza, formando uma pequena intu- mescencia preta, mais proeminente na superficie superior. A côr preta não é devida sómente às escamas de fórma ordinaria que a cobrem, porque subsiste depois de removidas essas escamas, mas à mesma membrana da aza que s2 acha escurecida e ao mesmo tempo um pouco endurecida neste Jogar. A fórma da macula sexual approxima-se da elliptica, sendo o eixo maior paral- lelo à nervura. Esta macula é muito maior na especie menor, que é o D. Gilippus, tendo perto de 4 millimetros de comprimento sobre 1,5 até perto de 2 millimetros de largura, emquanto que no Erippus raras vezes excede a 2 millimetros de comprimento sobre 6 de largura. — A macula sexual é óca e fórma, como Doubleday o vio em algumas especies do seu terceiro grupo do genero Danmis, uma especie de bolsa aberta na superficie superior da aza, ond? exists, na margem posterior da maculr, uma fenda estreita occupando a metade pouco mais ou menos do ambito. A parede inferior dessa bolsa ou cavidade é formada pela propria membrana da aza; a parede superior separa-se da inferior, a pouca distancia da nervura, sob um an- gulo muito agudo; a margem livre ou posterior desta parede curva-se ou en- rola-se para o interior da cavidade, como é bem visivel em secções transversaes hRig. 3 09): Cumpre notar que no animal vivo a margem livre da parede superior applica-se perfeitamente à parede inferior, ficando assim a cavidade fechada por todos os lados; é porém facil introduzir pela fenda, que separa as paredes, qual- quer objecto delgado; o que sem mais explicação comprehender-se-ha à vista das figuras 3 e 9.— A membrana das azas dos insectos compõe-se, como se sabe, 1 Kirby, L. C. pag. 2. 2 Pritz Muller, no Kosmos, Zeitschrift, 1Si7. 1 pag. 391. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 21 de duas laminas quasi sempre conglutinadas. Estas duas laminas existem tambem nas paredes da macula, ou, para melhor dizer, da cavidade sexual, mas se- param-se com muita facilidade, costumando haver, nos exemplares frescos, muito sangue entre ellas. A lamina externa, como já disse, é dura, quasi preta, co- berta de escamas ordinarias. A lamina interna é muito mais delgada e offerece um aspecto assaz diffo- rente nas duas especies. No D. Erippus (Fig. 4) vêm-se pequenos circulos um pouco mais trans- parentes do que o resto da membrana, de cerca de O"",0L de diametro, de cujo centro eleva-se um pello recto de cerca de 077,06 de comprimento. Esses circulos são dispostos em fileiras regulares, e distam uns dos outros de do 0"",03 até O"",06. Alternando com as fileiras dos circulos, acham-se implantadas escamas pardas, opacas, muito menores do que as escamas ordinarias, das quaes se distinguem egualmente pela fórma. No D. Gilippus (Vig. 10) os circulos são muito mais approximados entre si e chegam até às vezes quasi a locar-se; elles são mais transparentes e o resto da membrana mais opaca do que no D. Eripus. Faltam-lhes os pellos, porém ainda se vê no centro um pontinho, ultimo vestigio c prova de sua existencia em tempos passados. As escamas são muito menores do que as do D. Erip- pus, tendo apenas 0"",04 de comprimento, o qual é de cerca de 0"",08 no D. Erippus. Provavelmente eram escaminhas destas o « pó de côr parda » que Doubleday viu em certas outras especies de Danais. Não pud: percebar cheiro que fosse exhalado pelas azas dos machos de uma ou outra das duas especies catharinen- ses, porém antes de passar a discutir a significação biologica que possam Ler as maculas sexuaes, convem descrever ainda succintamente outro orgão peculiar ao sexo masculino e que pareco ter escapado até agora à attenção dos entomolo- gos. Comprimindo-se fortemente o abdomen, sahe de cada lado do ultimo seg- mento um tubo membranoso digitiforme ( Fig. 6e 12), fechado na extremidade, que se acha coberta de cabellos escuros os quaes se vão eriçando ao passo que o tubo sahe do abdomen, exhalando, ao mesmo tempo, um cheiro bastante forte no D. Gi- hppus, e menos forte, sem deixar de ser bem distinsto, no D. Erippus; diferença esta que depende evidentemente da circumstancia de serem muito mais numerosos, bastos e compridos os pellos naquella primeira especie. Ao recolher-se no abdo- men, o tubo vira-se ou inverte-se de modo que a superficie que era externa vem a ser interna, formando uma bainha ou estojo ao redor dos pellos, que parecem nascer, em fórma de pincel, no fundo do tubo. Eis os factos. Resta discutil-os. Havendo nas azas de numerosas especies de borboletas, e unicamente no sexo masculino, escamas de fórma peculiar, muitas vezes reunidas em maculas bem circumseriptas e em certos casos recolhidas em sulcos ou pregas da aza — escamas e maculas que indubitavelmente funccionam como orgãos odoriferos — parece muito provavel que as escamas modificadas, encerradas 28 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL na cavidade da macula sexual dos D. Erippus e Gilippus tenham ou tiveram a mesma funcção. Talvez seja possivel encontrar ainda nas differentes especies de Danais as fórmas intermediarias que liguem as bolsas das nossas especies às macu- las que se acham patentes nas azas posteriores dos machos do genero Amauris. De mais, não sómente não se percebe cheiro algum exhalado pelas azas de D. Erippus ou Gilippus, do sexo masculino como tambem parece summamente impropria para semelhante fun:ção uma cavidade que só communica com o ar por meio de uma fenda estreita e além disso fechada, sem haver na aza, ao que parece, mechanismo algum para abrila. E como existem na extremidade do abdomen orgãos de cuja funcção odorifera não se póde duvidar, era natural a conjectura de serem as macu- las sexuaies dos D. Erippus e Gilippus orgãos odoriferos em estado rudimentario, reduzidos a esta fórma pelo desenvolvimento de outros orgãos na extremidade do abdomen, os quaes melhor desempenhavam a mesma funcção. Podiamos citar em apoio dessa conjectura certos factos analogos, que se dão em outras familias de borboletas. Comtudo a afiluencsia de sangue para as maculas sexuaes, em grão pouco commum nas azas destes insectos, parece vedar o consideral-as como orgãos rudimentares; pois a ser assim devia tambem suppôr-se que o desenvolvimento dos orgaos das azas estivesse na razão inversa do dos orgãos do abdomen e que aquelles fossem tanto mais rudimentares quanto mais desenvolvidos se mostrassem estes. Ora é justamente o contrario do que se dá. No D. Gilippus, os orgãos, tanto das azas, como do abdomen, são muilo maiores do que os do D. Erippus, não obstante ser esta ultima especie a maior das duas. Como em casos de duvida convem não deixar passar desapercebida circums- tancia alguma, por mais insignificante que possa parecer, vou mencionar ainda O facto de ter achado, em alguns machos do D. Erippus, aliás incolumes, comple- tamente descamada uma muito pequena parie da aza junto da fenda da macula se- xual, como si as escamas livessem sido levadas dalli por algum objecto introdu- zido repetidas vezes na mesma fenda. Não seria possivel que alguma” materia odorosa fosse produzida no interior da macula sexual, e que os pellos dos orgãos odoriferos do abdomen, introduzidos na cavidads dessa macula, alli s? inpreguassem daquella materia? A posição das maculas sexuaes é de fórma tal, que a extremidade do abdomen facilmente se lhes póde appiicar, e como os pellos dos orgãos odoriferos, ao sa- hirem do abdomen, acham-se unidos em fórma de pincel, não parecs impossivel, nem mesmo muito dificil, a sua introducção na fenda das maculas. Confesso, contudo, francamente que esta idia não me parece ainda estar bem assentada. Só um estudo comparativo das numerosas especies do genero7 Danais poderá dar soluçao definitiva à tão interessante questão. —— St ,-53-— — ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 29 Hxplicação das figuras da estampa 2.º As figuras 1 at? 6 referem-se à Danais Erippus (sexo masculino ), as figuras Taté 12 a Danais Gilippus (sexo masculino ). Fig. 1e7.—Aza posterior, vista de cima, tamanho natural. Os numeros das nervuras são os usados por Herrich Schagffer, sendo ma nomenclatura de Doubledar. 1º nervura interna. à « — submédia. 2 primeiro) 3 segundo ramos da nervura média. h terceiro ) o nervura discoidal. 6 segundo primeiro S nervura dorsal. p » — predorsal. s macula sexual (« sexual spot » Doubledayy). Fig. 2 e 8&-—Macula sexual, augmentada cinco vezes. n primeiro ramo da nervura média. s macula sexual. Fig. 3 e 9-Secção transversal da mesma macula, augmentada 15 vezes. n primeiro ramo da nervura média. 1 parede inferior) d s parede superior) Fig. 4 e 10-Parte da membrana interna da cavidade da macula sexual, aug- mentada 180 vezes, a pontos de inserção das escamas. b uma das escamas. c pontos de inserção de pellos, que faltão no D. Gilippus, restando comtudo 03 pontos de inserção. Fig. 5 e 11-—Escamas ordinarias da superficie superior das azas posteriores, augmentadas 180 vezes. a escamas subjacentes ou inferiores, b escamas superiores. Fig. 4, b—As mesmas escamas na sua posição natural. Fig. 6 e 12-Orgãos odoriferos, vistos de cima, augmentados duas vezes. q ultimo segmento do abdomen. b orgãos odoriferos. ramo da nervura subdorsal. a cavidade da macula sexual. € tu á = E E 3 q h » E E te 2 EE l : pr - Rd pa 1 na SA E Ay - o no ss » & DA a nd A) o , A, As , E: E mA ) e Ame 1 “ ” o - o . “ = o = ya 1 “ a R R Ras: RA: Y ” E o né aa A aj E Fiaa, da E . . ê * á Gr 2 Ed a “aa : É e . aee “Css ; : , ba , E e = de y a ” sia 1 q4oy Er. . 3 ' ' Rr, ea tra OS ODORIFEROS = us O —- do ORGASS GA OMAN O) DAS ESPECIES Epicalia Acontius, Lin. e de Myscelia Orsis, Dru. PELO Dr, Brederico Muller Naturalista viajante do Museu Nacional O genero Epicalia, Westw. (ou Catonephele, Hubn. ) tem adquirido certa fama 1 pela differença extraordinaria que exibem no colorido das azas os dous sexos de varias especies suas representantes. Si v. g. compararmos a Epicalia Numilia, Cram. com a Eprcalia Acontius, Linn, veremos que as femeas das duas especies, e da mesma sorte os machos, são muito mais semelhantes entre si do que cada uma das femeas ao seu proprio macho. (Os machos de ambas estas especies são ornados com gran- des e esplendidas maculas côr de laranja em fundo preto avelludado, havendo tres maculas ellipticas separadas (duas na aza anterior e uma na posterior) na Epialia Numilia, emgquanto que na Epicalia Acontius ( Antiochus, Fabr. ) ha uma só macula na aza anterior, confluindo com a da aza posterior em uma fita ou banda larga, commum ás duas azas. Nas femeas, as maculas das azas são de um ama- rello côr de enxofre, e de fórma inteiramente diferente da que se vê no sexe opposto; na Epicalia Acontius ( Medea, Fabr. ) ellas formam tres fileiras parallelas, 1 Darwin, Descent of man, 1871. Vol. 1 pag. 388. 22 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL sondo Dastante numerosas. Com eleito, a diferença, entre 03 dous sexos, é tão erande que Westwood. os collosou em ganeros diferentes, denominando Mysce- lia Media à femea da Epicalia Acontwus. As duas especios que acabo de mencionar e que são as unicas Eprcalias que até agora encontrei na provincia de Santa Catharina, são muito interessantes tambem pela notavel diferença que mostram os machos, aliás tão semelhantes, no tocante aos orgãos odoriferos. Nos machos da Epicalia Numilia não me foi possivel achar vestigio algum de semelhantes orgãos; parece que faltam inteiramente nestes insectos. Nos machos da Epicalia Acontius, pelo contrario, elles tomam um desenvolvimento pouco commum e exhalam um cheiro fortissimo. Estes orgãos odoriferos acham-se escondidos entre as azas anteriores e posteriores, ocupando a superficie superior destas, e a inferior d'aquellas. Nas azas posteriores vê-se (Fig. 11), contígua à macula alaranjada, (!) outra macula maior (m) de côr parda, e que não tem a apparencia avelludada do resto da aza, e pódo antes comparar-se a uma especie de feltro. Essa macula feltrada («Filzleck» Herrick-Schaeffer), é limitada pelas nervuras dorsal (8) e discoidal (5) e por uma recta que do ponto de separação das nervuras dorsal e subdorsal vai ao ponto em que a nervura discocellular inferior parte da discoidal; ella accompanha a nervura dorsal em cerca de 2/5 de seu compri- mento, ec a discoidal até um ponto equidistante da margem da aza e do ponto de separação das nervuras dorsal e subdorsal. A sua aria é pouco mais ou menos a oitava parte da aza inteira. A macula não differe muito de um semi-circulo de [2 millimetros, nem a aza de um circulo de 24 millimetros de diametro. Ordinariamente esta macula é coberta pela aza anterior, a qual na superficie inferior é provida (Fig. 11, m') de uma macula opposta à da aza posterior e quasi identica a esta pela sua apparencia feltrada, cór, fórma, e dimensões, porém menos visivel, não só por contrastar "pouco a sua côr com a superficie ambiente, como tambem por ser inteiramente coberta por uma crina de pellos pretos in- seridos ao longo da nervura interna (1). Esta macula felivada das azas ante- riores estende-se da mervura interna (1) até ao angulo formado pelo segundo e terceiro ramos (3 e 4) da neryvura mediana; como na macula das azas posterio- re: só uma parte insignificante cte dentro da cellula media. A crina, à que acabo de alludir, nasce da margem posterior da macula, ou, o que é o mesmo, da margem anterior da nervura interna, dividindo-se esta em cinco partes eguaes. A segunda e terceira destas partes, a contar da base da aza, são oscupadas pela crina, composta de bellos pellos pretos de “ums sete millimetros de comprimento. Esta crina cobre exacta e inteiramente a macula feltrada da das azas anteriores, separando-a ao mesmo tempo da das posteriores. As escamas das maculas felpudas ou odoriferas (fig. 13) distinguem-se das es- camas ordinarias (fig. 12): ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 33 “4º; pela sua fórma, principalmente por ser a sua extremidado desdentada. 2*; pelas suas dimensões. Das escamas ordinarias da superficio superior das azas, as superiores (fig. 12,5) têm cerca de 0"",14 de comprimento sobre 0"",06 de largura; as inferiores ou sub- jacentes (fig. 12,2) cerca de 0"",1 de comprimento sobre 0"",08 de largura. Das escamas odoriferas, as superiores (fig. 13,s) tem cerca de 0"",33 de comprimento sobre 0"",1 de largura, e as inferiores (fig. 13, 1) cerca de 0r",24 de comprimento sobre 0"",11 de largura. 3º; por serem muito mais opacas e apparentemente privadas das linhas lon- giludinaes tão visiveis nas escamas ordinarias. 4º; por serem implantadas mais firmemente na membrana das azas, de modo que passando um pequeno pincel por cima das azas, podem-se remover as escamas ordinarias, ficando quasi incolumes as maculas felpudas. Todas essas differenças entre escamas crdinarias e odoriferas existem tambem em quasi todas as especies, cujas azas são dotadas de maculas odoriferas. Os ca- recteristicos que distinguem a Epralia Acontius de muitas outras especies são os seguintes : 1º; a differença que se observa tambem nas maculas odoriferas eutro as es- camas superiores e inferiores; porque em geral as escamas odoriferas costumam ser todas da mesma fórma, sem distincção de superiores e inferiores. 2º: a circumstancia de guardarem quasi a mesma distancia nas maculas odo- riferas (fig. 15) e no resto das azas (fig. 14) as covinhas ou alveolos, em que as escamas se acham implantadas, visto como em geral as escamas odoriferas cos- tumam ser muito mais unidas do que as ordinarias. Os alveolos das escamas odoriferas (fig. 15), além de serem maiúres, são cer- cados de uma área escura, elliptica ou circular, o que frequentemente se observa tambem em outros casos. Ainda é digna de se notar a modificação consideravel da fórma das azas que têm acompanhado o desenvolvimento das maculas odoriferas. A margem interna (ou posterior) das azas anteriores é quasi rectilinea nas femcas da Epicaha Ácon- nus (fig. 10) e em ambos os sexos da Epicaha Numiha (fig. 9), emquanto que nos machos da Epicalia Acontius (fig. 11), é muito arqueada, podendo desta sorte cobrir uma parte muito maior das azas posteriores. Da mesma maneira acha-se ampliada a fimbria anterior das margens posteriores. Dahi resulta que a femea da Epicalia Acontius (fig. 10), quanto à fórma das azas, approxima-se mais do macho da Epicalia Numiha (fig. 9), do que do macho de sua propria especie (fig. 11). Intimamente alliado ao genero Epicalia é o genoro Myscelia, representado na provincia de Santa Catharina pela Myscelia Orsis, Dru. Já antes de ter podido examinar o macho desta especie, eu soube por Herrich Schaefer, * que elle pos- t Prodrom system. lepidopt. I 1864 pag. 27, n.º 79. V. II — 6 34 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL sue uma « macula feltrada » (Filzileck) na superficie superior das azas posteriores (fig. 1, m), entre as nervuras quinta e septima, isto é, entre a nervura discoidal e o primeiro ramo da subdorsal. Ha pouco pude convencer-me de que a referida macula exhala um cheiro fortissimo, o qual tem, como a da Epicalia Acontius, (sexo masc.) certa semelhança com o de almiscar. À macula, que occupa cerca de 1/9 (36 millimetros quadrados) da superficie da aza (315 millimetros quadrados ) ainda ultra- passa um pouco as duas nervuras que Herrich-Schaeffer lhe dá por limites ; é de côr in- teiramente preta, sendo pardacenta a parte circumvizinha da aza que, como a macula, é coberta pela aza anterior, e de um azul brilhante o disco da aza. A estruclura da ma- cula pouco differe da da Epicalia Acontius é por isso não carece de descripção circums- tanciada; sómente as escamas odoriferas não excedem tanto as dimensões das ordinarias. As azas anteriores são destituidas de orgãos cdoriferos Deste modo, no lLocante às maculas felpudas, o macho da Myscelia Orsis 0c- cupa uma posição intermedia entre a Eprala Numilia, que carece de semelhantes maculas, e a Epicalia Acontius, que as possue tambem nas azas anteriores. Ávista deste facto, é permittido duvidar sobre si os limites entre os dous generos já se acham devida e definitivamente estabelecidos. Sabe-se que as femeas da Myscelia Orsis e da Epicalia Acontius concordam tambem perfeitamente no arranjo das ma- culas das azas, as quaes são, amarellas nesta, e brancas naquella especie, differindo bastante a este respeito da femea da Epicalia Numilia; facto este que muito de- vera contribuir para reforçar aquella duvida. ———S =2*2>O———— Explicação das figuras da estampa 3.º As figuras 1, 9, 10 e 11 são de tamanho natural; as mais são augmentadas 180 vezes. As figuras 1 até 8 referem-se a Myscela Orsis ( sexo masculino ). Fig. 1. —Aza posterior de Myscelia Orsis, (sexo masculino) —m— macula fel- trada ou odorifera. Fig. 2.—Escamas da superficie inferior das azas. Fig. 3.—Ditas do disco da superficie superior. Fig 4.—Ditas da margem posterior da superficie superior das azas posteriores. Fig. 5—Ditas da macula feltrada —s — escamas superiores —1 — ditas inferiores ou subjacentes. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 35 Fig. 6—Alveolos das escamas da superficie inferior das azas posteriores. Como em muitissimas outras especies os alveolos da superiicio inferior distinguem-se dos da superior por serem ligados os da mesma fileira transversal por uma linha. Vig. 7—Alveolos das estamas ordinarias da superíicio superior das azas pos- teriores. Fig, 8—Ditos das escamas odoriferas. Fig. 9—Contornos das azas de Epicaha Numa, Gram. (sexo masculino ). Fig. 10—Ditas de Epicalia Acontius Linn (sexo feminino ), (Medea Fabr.) Fig: 11-—Ditas de Epralia Acontius Linn (sexo masculino ), (Antiochus, Fabr.) | —macula alaranjada das azas posteriores. m — macula feltrada das mesmas azas. m' — macula feltrada da swperficic inferior das azas anteriores, cobertas de uma crina de cabellos pretos. Fig. 12-—Escamas ordinarias da superficie superior do disco das azas poste- riores de Epicalia Acontius ( sexo masculino ). Fig. 13—Ditas da macula feltrada das mesmas azas. Fig. 14—Alveolos das escamas ordinarias das mesmas azas. Fig. 15—bDitos das escamas odoriferas da macula feltrada das mesmas azas. OS ORGÃOS ODORIFEROS NAS Pernas de certos Lepidopteres PELO pe crEeLreErRCO MBB EE: Naturalista Viajante do Museu Nacional « Em todas as ordens, disse Darwin, fallando da selecção sexual e dos « caracteres sexuaes secundarios dos insectos, ! os sexos de muitas especies « apresentam differenças, cuja significação não se conhece... Casos destes abun- « dão nos Lepidopteros. Um dos mais extraordinarios é o de terem os machos « de certas borboletas as pernas dianteiras mais ou menos atrophiadas. As azas « differem tambem muitas vezes nos dous sexos pelas nervuras c às vezes con- « sideravelmente pela figura, como no Aricoris epitus. Os machos de certas bor- boletas da America do Sul têm pinceis de cabellos nas margens das azas e « excrescencias corneas no disco das azas posteriores. Em certas borboletas da « Inglaterra só os machos, como mostrou Mr. Wonfor, são parcialmente cober- « tos de escamas peculiares. a 1 Darwin, Descent of man 1871. vol 1. pag. 344. 38 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Hoje, quasi todas essas differenças sexuaes dos Lepidopteros, completamente inexplicaveis ainda ha poucos annos, tornaram-se claras e intelligiveis depois que se descobrio que ellas se referem, directa ou indirectamente, á producção ou difusão dº um cheiro particular que, de certo, daverá agradar às respectivas femeas. Pertencem u esta categoria os «pinceis» ou crinas que sº encon- tram frequentemente na margem anterior das azas posteriores, e cujo cheiro é muito intenso na Callidryas Cipris, bem sensivel e muito agradavel na Direenna Xantho e moutras especies, e as escamas peculiares de. fórmas muito variadas, que existem nas azas dos machos em muitas especies de Satyrinas, Heliconinas, Nymphalinas, Picrinas, ete., às equaes Bernard Deschamps ! deu o nome de plumulas, como tambem as «excrescencias corneas» ou «maculas sexuaes » que existem no disco das azas posteriores dos machos das Danas Erip- pus e Guippus * Quanto às diferenças -que ha na disposição das nervuras das azas, tambem estas em muitos, sinio em todos os casos, são devidas à existencia, nos machos, de um orgão odorifero, pelo qual foram deslocadas certas nervuras, como facil- mente se póds verificar nos generos Dircenna, Mechamitis, Thecla (v. g. Thecla Aemon ), entre as borboletas diurnas, ou no genero Rhamplidium entre as noc- turmas. A figura das azas acha-se tambem frequentemente mais ou menos modi- ficada pelos orgãos odoriferos. Entretanto estes orgãos odoriferos dos machos e as differenças sexuaes que delles resultam, não se limitam às czas: em numerosas especies, mórmente de borboletas nocturnas, elles oceupam o abdomen; emquanto que, em algumas outras, desenvolvem-se nas pernas. São orgãos abdominaes estes que, por se acharem, no estado de repouso, quasi sempre recolhidos, ou no interior ou entre as escamas do abdomen, escaparam inteiramente à attenção dos lepidopterologos. A unica no- tícia que encontrei a respeito delles refere-se ao genero Lycorea em que os ma- chos, segundo Douwbleday «têm um grando feixe de pellos de cada lado do ultimo segmento, capaz de sr recolhido em grande parte no interior d> abdo- men » ?. Como nas Lycoreas ce Itunas, assim tambem nos machos das Danars, dos Morphos, das (Glaucopideas, das Cryptolecha e de varias outras borboletas noc- urnas 03 orgãos odoriferos estão situados na extremidade do abdomen, tomando ora a fórma de pinceis, ora a d> protuberancias mamilliformes ou digitiformes, ora a de tubos filiformes muito compridos e exhalando em quasi todos os casos um cheiro t Annales des Sc. nat. 1837, Février, Mars — citado em Chénu, Encyclopédie d'hist. nat. Papillons Tome I, pag. 8 2 No vol. XI da Jenaische Zeitschrift fur naturwissenchaft. 1877 publicou-se um resumo de quanto achei nos varios autores, que pude consultar, sobre os orgãos odoriferos nas azas das borboletas, e o primeiro ensaio que apresentei para mostrar a funcção dos ditos orgãos, 3 Doubleday, Westwood, Iewitson. — Genera of diurnal lepidoptera, pag. 196. — Os mesmos feixes de pellos apparecem (Tab. XVí. Fig. 1. da mesma obra) na figura da Ituna Phenarete sem que o texto os mencione. Nos machos de Ituna Ilione eu tambem os vi. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 39 forlissimo. E” muito mais raro estarem collocados os ditos orgãos no lado dorsal, como se vê na Didonis Biblis, ou no lado ventral do abdomen, como acontece na familia das Sphingileas. Si, em muitos outros casos, os orgãos odoriferos eram de ha muito conhecidos, ignorando-se a sua funcção, o contrario se da com as Sphingideas; já deslo muitos annos sabia-se que os machos de certas especies exhalam um cheiro activo de almiscar ; mas não se tinha achado, c talvez nem mesmo procurado o lugar d'onde emanava este cheiro. Emana elle de dous pinceis situados na base do ablomen e que podem ser recolhidos em uma especie de sulcos formado: pelas escamas dos dous primeiros segmentos abdominaes, Quanto, emfim, aos pinceis e apparelhos analogos, que existem nas pernas de certos lepidopteros, e só no sexo masculino, ninguem até hoje, que cu saiba, fallou na funeção que elles possam exercer. Entre as borboletas diurnas parecem estes orgãos limitar-se à familia das Iesperideas, na qual se apresentam sob duas fórmas differentes. Nos machos de uma especie da JHha de Java, a Ismene Oedipodea, Swains, as tibias do terceiro par de pernas são, segundo Westwood 1, de uma grossura exlraordinaria c cobertas do densos pellos; em varias outras especies da familia, as mesmas tibias são dotadas, nos machos, de um pincel de pellos compridos. Estes pinceis das tibias (« Schienen pincel ») jaserviram a Herrich- Schaefer e outros autores, para caraclerisar certos generos das Hesperideas, como Achlyodes, Antigonus ce outros. Desde que vi em uma Hesperidea, pertencente, pelos caracteres indicados por Herrich-Schacfer, ao genero Antigonus, que os pinceis das tibias podem ser recolhidos em ama especie de sulco formado pelas escamas do abdomen, não duvidei de que os ditos pinceis tambem fossem orgãos odorife- ros, visto que participam de um dos característicos mais frisantes desses orgãos, que consistem em serem elles de uma outra maneira protegidos, no estado de re- pouso, contra a evaporação de seu aroma. E, com cfífeito, ha pouco live a satis- facção de encontrar uma borboleta nocturna, cujas tibias emittiam um cheiro sin- gular, que, sem ser muito forte, não deixava comtudo ds ser perfeitamente per- ceptivel tambem a n5s, cujo olfacto é sem duvida muito inferior ao de muitos lepidopteros. Era uma das maiores especies da familia das Erebideas, tendo com as azas abertas 02,19 de largura, especie essa cujo nome ainda ignoro. Nas femeas dessa Erebidea as libias do terceiro par de pernas ( Fig. 10) têm a fórma delgada, que costumam ter nos lepidopteros, sendo a sua grossura intermediaria à do femur e à do tarso. Nos machos pelo contrario (Fig. 11 ec 12) as mesmas tibias são excessivament: largas, de sorte que a largura (4 "") é egual à terça parte do comprimento (0””, 12). A superficic externa é um pouco convexa; no lado interno existe um sulco longitudinal principiando a 3 ou 4 millimetros da base e aprofundando-se ao passo que se approxima da ex- tremidade tarsal da tibia, como melhor se vê em secções transversaes (Fig. 14). ! Doubleday-Westwood, Heroitson, Genera of diurnal lepidoptera, pag. 574. 10 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Toda a superficie interna, exceptuando apenas a exiremidade tarsal e parte do «sulco, é coberta de pellos de 4a 6 millimetros de comprimento, sendo os mais curtos os da margem superior (Fig. 13). Esses pellos são capazes de eriçarem-se, for- mando uma especie de escova muito densa, e é meste estado de eriçamento que se percebe o cheiro que desprendem. Voltando ao estado de repouso, os do meio deitam-se no sulco lon- gitudinal parallelos ao eixo da tibia, sendo cobsrtos por nma espessa camada dos pellos lateraes da tibia; em cima destes ainda se applicam os densos pellos da margem inferior do femur, que tambem se acham muito mais desenvolvidos no sexo masculino. Desta maneira os pellos inferiores e mórmente os deitados no sulco longitudinal da tibia, acham-se suficientemente protegidos pela superposição dos pellos marginaes, e dos do femur contra a perda por evaporação de qual- quer substancia odorifera, de que elles se possam impreguar no estado de repouso, emquanto que ericando-se, exhibem uma superficie enorme, e que deve causar uma evaporação correspondente da substancia odorosa. (Convem notar que já Linneu deu a uma especie de Erebideas o nome de Noctua odora; é provavel que tenha cheiro bastante fort>; si esse odor é peculiar ao sexo masculino e produzido pelas tibias, não sei dizel-o. Hana mesma familia outras especies, cujos machos têm tibias, de fór- ma normal, sem a cabelladura desproporcionada da nossa primeira especie, sendo a delles munida só de um pincel .de pellos compridos procedente do lado interior da base. Ha ainda outras especies de Erebideas que parecem ser destituidas de orgãos odo- riferos nas pernas. Assim como certos generos de Hesperideas são caracterisados pelos pinceis que os machos têm nas fibias posteriores, assim tambem os machos do genero Hermima (que alguns entomologos incluem na familia das Pyralideas outros como Speyer, entre as Noclwinas), costumam ser munidos de pinceis nas libias mais ou menos largas; mas, neste caso, as libias dianteiras são as que apresentam o distinctivo do sexo masculino. 1 Na familia das Geometrideas um bello e insteuctivo exemplo de pinceis nas pernas posteriores é offerecido pela Pantherodes pardalaria, Hiibn, borboleta que parece habitar todo o Brazil, desde o Equador, até além do tropico do Capricornio. Spix e Martius trouxeram-n'a do Rio Negro ? sendo tambem, ao menos em certos an- nos, frequentissima na provincia de Santa Catharina. Nesta especie as tibias do 3.º par de pernas são egualmente muito mais grossas nos machos ( Fig. 2º 4) do que nas femeas (Fig. 1), sem comtudo attingirem naquelles a dimensões extraordi- narias. A superficio interna é cortada por um sulco longitudinal (Fig. 3b) e neste sulco acha-se escondido um pincel de pellos finos e compridos, implan- tados nm base da tibia (Fig. 3, a); o diametro destes pellos é de 0"",00% até ! «Tibia élargi et garni de pinceaux de poils extensibles » Chenu, Encyclopédie d'hist. nat. Pa- pillons. Tome II, pag. 215. * Perty, Delectus animalium articulatorum. 1830, pag. 163. Tab. XXXII Fig. 11.— Perty lhe dá o nome de Phalaena perspicillum. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 41 0,”"01 e o seu comprimento egual à da mesma tibia. A côr do pincel varia um pouco nos diversos individuos; os pellos são, uns baios-claros, outros pardos-escuros, e até pretos; predominam geralmente aquelles, ás vezes porém dá-se o contrario. Ao longo das margens do sulco nascem escamas ( Fig. 9), que pelas suas dimensões muito maiores, pela fórma e pela côr distinguem-se das que cobrem o resto da tibia ( Fig. 8). Aquellas chegam às vezes a ler quasi 0,”"001 de comprimento, estas raras vezes excedem à terça parte desse compri- mento; aquellas são asymetricas, imitando mais ou menos a fórma da lua crescente, estas são symetricas, de lados parallelos, com 3 ou 2 dentes na extremidade; emfim as escamas maiores das margens do sulco são pallidas, côr de palha; as menores do resto da tibia são pardas, mais ou menos escuras. Inclinando-se para o lado do sulco, as escamas maiores formam so- bre elle uma especie de tecto ( Fig. 6, c e d), achando-se as da mar- sem inferior cobertas parcialmente pelas da margem superior. Assim fica realisada neste caso, por meios differentes, porém egualmente eficazes, uma cobertura que previne a perda de qualquer aroma que o pincel possa conter. Estendendo-se a tibia, o pincel começa a sahir do seu escondrijo ea ericar-se, distendendo para todos os lados os seus pellos, mas sem desenvolver cheiro perceptivel ao olphato humano ou pelo menos ao meu. Sem duvida que no vastissimo grupo das borbole- tas nocturnas, de que ainda não examinei senão um numero muitissimo insigni- ficante de especies, devem existir numerosos outros casos de apparelhos odorife- ros tanto nas pernas, como nas azas e n'outras partes do corpo. O fim destas linhas não era, nem podia ser, elucidar perfeitamente o assumpto de que fallei aqui; e sim unicamente apontar aos jovens naturalistas do Brazil mais um campo vasto, inex- plorado e que promette uma colheita de factos novos e interessantes. Explicação da Figura da Estampa 5.º As figuras 1 até 9 referem-se a Pantherodes pardalaria. Fig. 1. — Perna esquerda do 3.º pár da fémea. Fig. 2.— A mesma do macho. Fig. 3.— A mesma quebrada no meio da tibia. a.— Parte superior com o pincel que nasce da base da tibia, vista do lado externo. B.— Parte inferior com o sulco em que se recolhe o dito pincel, vista do lado interno. Vil 42 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Fiz. 4. — A mesma com o pincel ericado, visto do lado externo. As figuras 1 e 4 são augmentadas 3 vezes. Fig. 5. — Secção transversal da tibia da femea. Fig. 6. — Secções transversaes da libia do macho, em 4 differentes alturas, indicadas na fig. 2.º (margem superior — superficie externa ). As figuras 5 e 6 são augmentadas 15 vezes. Fig. 7.— Escamas da superficie superior das azas anteriores. a.— Escamas superiores. B.— Escamas subjacentes ou inferiores. Fig. 8. — Escamas da superficie externa da tibia. Fig. 9.— Escamas das margens do sulco no lado interno da tibia. As fi- guras 7 e 9) augmentadas 90 vezes. As figuras 10 e 14 referem-se a uma Erebidea, de 19 centimetros de largu- ra, com as azas abertas Fig. 10. — Perna esquerda do 3.º par de pernas, da femea. Fig. 11. — A mesma do macho, vista do lado externo. Fig. 12. — Perna direita, do 3.º par de pernas, do macho, vista do Jado interno. Fig. 13. — Articulação da tibia com o femur, vista de cima, com os pel- los da tibia ericados. s.— Pellos da margem superior da tibia. 1. — Ditos da margem inferior. As figuras 10 e 13 são augmentadas duas vezes. Fig. 14. — Secções transversaes da tibia do macho em tres differentes al- turas, indicadas na figuras 11.º, augmentadas 4 vezes. OS ORGÃOS ODORIFEROS NAS Pernas de certos Lepidoptores (SUPPLEMENTO) PELO DE FREDERICO MUBEER Naturalista Viajante do Museu Nacional Conclui a noticia sobre os orgãos odoriferos, que distinguem o sexo masculino de varias borboletas, dizendo que este assumpto promettia uma colheita riquis- sima de factos novos e interessantes. Parece-me com effeito ser essa uma mina inexhaurivel. Mal se tinham passado quinze dias, quando pude, às fórmas desses orgãos descriptas naquella noticia, ajuntar outras duas das mais singulares que en- contrei nos machos de duas especies de Erebideas. Uma dellas é um anão nesta familia de gigantes, cuja largura, com as azas abertas, não excede a 4 centimetros. Em certas especies da mesma familia, como em varias Hesperideas / Achlyodes, Antigonus etc., ) os orgãos odoriferos consti- tuem um pincel de pellos compridos implantado na base das tibias posteriores ; a fórma que se reproduz neste caso é a mesma, porém não são as tibias posteriores, mas sim as anteriores, de cuja base nasce o pincel odorifero. 44 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Compõe-se este pincel de pellos pretos, cujo comprimento ( 4 millimetros ) excede tanto o da tibia (2 millimetros) como o do femur (3 millimetros ). Emquanto em certas Hesperideas o pincel odorifero das pernas posteriores esconde-se entre as côxas posteriores e a base do abdomen, na Erebidea em questão elle se recolhe ao longo do lado inferior do femur cujas margens são bordadas de pellos louros, formando uma especie de estojo para o pincel, (Fig. 1). A tibia anterior não sómente póde estender-se, à maneira do que se observa em outros Lepidopteros, até formar uma linha recta com o femur, mas tambem póde vir além (Fig. 2); e é por meio desta extensão excessiva que elle se desembainha ou sahe de seu estojo, ericando-se ao mesmo tempo o pincel odorifero. Na segunda especie, que tem cerca de seis centime- tros de largura com as azas abertas, os orgãos odoriferos occupam o femur do segundo par de pernas ou das pernas médias. Não é tanto pela sua situação insolita, como pelas suas dimensões que estes orgãos se tornam mais interessantes, pelas suas proporções verdadeiramente mons- truosas, formando uma especie de pélla, um corpo globuloso ou ellipsoide, cujo diametro é quasi egual ao comprimento do femur (Fig, 5, 6e 7). Nem as per- nas anteriores, nem as posteriores, (Fig. 3) mostram differença alguma nos dous sexos desta especie; as pernas médias do macho, além do femur profundamente modificado pelo desenvolvimento do orgão odorifero, tambem se distinguem das da femea ( Fig. 4) pelo maior comprimento do primeiro articulo do tarso. O femur tem 6 millimetros de comprimento na femea, 7 millimetros no macho, a tibia 5 millimetros em ambos os se- xos, 0 primeiro artículo do tarso 3 millimetros na femea, 4 e 1/2 millimetros no macho, os demais articulos do tarso 4 e 1/2 millimetros em ambos os sexos. Achando-se evidentemente muito tolhida a mobilidade do femur pelo orgão odorifero, este excesso de comprimento do primeiro articulo do tarso talvez sirva para compensar aquelle defeito. O femur dos machos ( Fig. 5) tem uma largura de 2 e 1/2 millimetros, a qual excede um pouco à terça parte do comprimento (7 millimetros ), e ao mesmo tempo é summamente achatado, de sorte que as paredes dorsal e ventral quasi que chegam a tocar-se (Fig. 9). A superficie ventral é um pouco convexa, a dorsal concava. O orgão odorifero, que-occupa esta superficie concava do femur, compõe-se de uma parte interior, especialmente odorifera, e de outra exterior, protectora. Aquella consiste em um sem-numero de escamas odoriferas vastissimas (Fig. 9,Db; Fig. 11), que cobrem toda a superficie dorsal do femur ; estas escamas têm a fórma de uma fita estreita de cerca de 0,703 de largura e de 2 até 3 millimetros de comprimento, sendo mais compridas pelo lado da margem anterior ou superior do femur ; a sua ex- tremidade é um pouco mais ou menos larga e de fórma oval (com 0,2206 de largura sobre 0,""25 de comprimento ). Sendo muito unidas as escamas odoriferas, por causa do alargamento termi- nal, a superficie da massa compacta em que se acham reunidas é necessariamente maior do que a sua base, isto é, do que a superficie do femur, donde nascem ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 45 (Fig. 9). Extrabidas do femur, as escamas odoriferas têm a apparencia da paina, e, como certas painas separadas das respectivas capsulas, formam uma massa fófa de di- mensões incriveis; parece impossivel que volume tão grande possa caber. em espaço tão limitado. As escamas odoriferas são protegidas de todos os lados e co- bertas por uma orladura de escamas largas e de pellos, inseridos ao redor e nas margens do femur. As escamas interiores dessa orladura, as que immediatamente se applicam às odoriferas (Fig. 12,a) são ovaes, geralmente com 1,""5 até 2mm de comprimento sobre 0,726 ató 1,”"2 de largura; mais para fóra a sua base prolonga-se em uma especie de peciolo (Fig. 12,b) e, ficando este peciolo cada vez mais comprido e delgado ao passo que a lamina torna-se cada vez mais estreita (Fig. 12,c), as escamas transformam-se insensivelmente em pellos (Fig. 12, d) (ue não poucas vezes mostram a sua origem pela fórma da sua extremidade um pouco alargada. Estes peilos, que compõem a camada externa do involucro das escamas odoriferas (Fig.9,d), são mais compridos na margem anterior ou superior do femur, e mórmente na base desta margem, onde o seu comprimento excede ao do proprio femur. Ha pois na familia das Erebideas, certas especies cujos machos são providos de orgãos odoriferos nas tibias das pernas posteriores ; ha outras em que os mes- mos orgãos acham-se nas tibias das pernas anteriores, outros que os possuem no femur das pernas médias, e outras ainda em cujas pernas não se vê apparelho algum que sirva de orgão odorifero. Póde-se concluir dahi que os ditos orgãos não foram herdados do progenitor commum da familia, mas sim adquiridos poste- riormente pelas varias especies que hoje gozam destes attractivos sexuaes. Hxplicação das Figuras da Estampa 4.º Fig. 1. — Perna anterior do macho de uma pequena Erebidea, augmentada 5 vezes — a — pellos louros guarnecendo a margem do femur — b — pincel de pellos pretos implantados na base da tibia, recolhido na gotteira formada pelos pellos do femur. Fig. 2.— A mesma perna com o pincel odorifero eriçado. As figuras 3 até 12 referem-se a outra especie de Erebideas. Fig. 3.— Perna posterior direita do macho. Fig. 4. — Perna média esquerda da femea. Fig. 5.— Perna média esquerda do macho, vista do lado ventral. Fig. 6.— A mesma, vista do lado dorsal. 46 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Fig. 7. — A mesma, vista da margem anterior ou superior do femur — d — lado dorsal — y — lado ventral. Fig. 8. — Perna média direita do macho, vista do lado dorsal, depois de removidas as escamas odoriferas — a -— escamas — b — pellos que guarnecem as margens do femur, protegendo e abrindo as escamas odoriferas. As figuras 3 até 8 são augmentadas 2 vezes. Fig. 9. — Secção transversal do orgão odorifero, augmentada 5 vezes. — a — femur — b — escamas odoriferas — c — escamas protectoras — d — pellos. Fig. 10. — Escamas pillosas do femur das pernas médias da femea. Fig. 11. — Escamas odoriferas, cobrindo o lado dorsal do femur das pernas médias no sexo masculino. Fig. 12.— a — escamas interiores ovaes — b — escamas pecioladas — c — escamas pillosas — d — pellos da orladura que protege as escamas odoriferas. As figuras 10 até 12 são augmentadas 15 vezes. APONTAMEN'TOS SOBRE OS CERAMIOS DO PARÁ POR Domingos Soares Ferreira Penna Membro correspondente e Naturalista viajante do Museu Nacional CARTA AO SR. DR. LADISLÁU NETTO Director geral do mesmo Museu Cabe-me segunda vez a honra de apresentar à V. S. e de submetter ao seu muito auctorizado juizo algumas notas sobre antiguidades indigenas do Pará. O titulo que lhes ponho póde talvez passar por pouco modesto, mas outro agora não se me depara que menos pretencioso me pareça ; e porque se póde estranhar a palavra «Ceramio, » peço permissão para, antes de tudo, explicar os motivos porque a emprego nesta carta. Na margem esquerda do Amazonas propriamente dito, ha certas localidades em que se encontram muitas e antigas obras de fino barro, taes como idolos, urnas funerarias, louça, etc., fabricadas por tribus indigenas ha longo tempo extinctas. 48 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Ao principal e mais extenso deposito destes artefactos deram os Tupinambás, quando por acaso os descobriram, o nome de Miracan-uêra que, segundo os interpretes, significa — Ossada de gente antiga. Não se lhe conhece nome em por- luguez. A” sombra de pequenas lapas nas proximidades do pequeno rio Maracá, na nossa (Guayana existiam urnas contendo esqueletos humanos. Tambem não se lhe conhece nome em portuguez. Nos campos da Ilha de Marajó ha grandes depositos de toda a sorte de obras do mesmo genero : As que se acham em pequenas eminencias ou collinas artificiaes, como no Pacoval e nos Camutins, tem os mais entendidos dado o nome de Aterros e Aterros sepul- chraes, — palavra e expressão que só podem significar um pantano, uma baixa ou um valle que se nivelou, entupindo-o com terra e cadaveres humanos. Quando, porém se lhes mostra, na Ilha de Caviana ou na mesma Ilha de Marajó, no meio de uma vasta planície, por toda a parte egual, depositos semelhantes, sem que haja ahi o menor signal de aterro, nem de elevação, nem de depressão de terreno, não lhes occorre um nome que a isto possam applicar. O Dr. Couto de Magalhães, no seu instructivo e importante livro «O Selvagem» refere que em Marajó, na Fazenda Cajueiros, do Dr. J. J. d'Assis, ha uma es- pecie de Forte construido pelos Aruans 2, — Forte que provavelmente conterá artefactos de barro, e restos humanos. A” isto dão os Norte Americanos o nome de Mound, quér no seu material exista ou não pedra, a qual aliás não figura em nenhum dos nossos. ... Ceramios, Vê-se do exposto, que não temos um nome com que se possa designar, de um modo geral, os diferentes depositos dos objectos em questão, e é claro que se deve procurar um que satisfaça a todas as exigencias da Sciencia. Os antigos Athenienses tinham, fóra dos muros de sua cidade, uma olaria a que chamavam, segundo a fórma latina, Ceramicus ; a olaria foi removida para dar lugar a um edifício especial reservado a receber os corpos dos bravos que morriam na guerra em defeza da patria. Foi removida a olaria, mas o logar conservou e o edifício adoptou o primitivo nome «Ceramicus ». - FE esta palavra «Ceramicus» que eu emprego, modificando-a em sua termi- nação, para adaptal-a ao genio da nossa lingua. Ceramio, com efeito, exprime, por sua etymologia, um local em que abundam artefactos de barro, como Pacoval, Santa Izabel, (Camutins, Maracá, etc., e por sua applicação entre os Gregos, —jazigos onde repousam os ossos ou cinzas de homens distinctos por seus serviços. Ainda neste ultimo sentido o nome Ceramio é plena- mente applicavel aos chamados Aterros sepulchraes, pois não resta duvida que as t Pretendo partir brevemente para Cajueiros afim de estudar este Forte que não tive occasião de ver quando alli estive ha 3 annos. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 49 urnas mortuarias que nestes se tem encontrado, pertenciam unicamente á pessoas que, por qualquer principio, gozavam de certas honras e distineções entre as popu- lações indigenas. Ainda mais; este nome tem a vantagem da generalidade, isto é, abrange em sua significação toda a sorte de depositos de urnas, louca e mais utensis de argilla, qualquer que seja sua situação, sem distinguir si o terreno é alto ou baixo, natural ou artificial, planície ou montanha, caverna ou aterro, floresta ou campo aberto. Mas seja bem ou mal escolhido, cu o emprego provisoriamente e pela neces- sidade de poupar palavras que, para maior clareza do assumpto, teriam de ser mil vezes repetidas. Depois desta explicação, devo fazer uma declaração, e é que nesta carta não trato de todos os Ceramios do Pará sinão daquelles que tenho visitado, cingindo- me mais particularmente ao do Pacoval. A Ilha de Marajó Penso que não se me levará a mal dar aqui uma idéa geral da situação e de outras disposições physicas da Ilha de Marajó, onde se acham os principaes cera- mios. Para isso basta fazer um resumo bem condensado do relatorio geral que em 1876 apresentei ao Governo da Provincia sobre essa mesma ilha. A Ilha de Marajó acha-se entre o Oceano Atlantico e os rios Para e Ama- zonas, sendo ao S. O. separada do continente por furos ou canaes naturaes pelos quaes se communicam as aguas daquelles dous rios. Extensão E. à O. 142 mi- lhas. Largura N. a S. 86. E uma vasta planicie cuja superficie não se eleva sensivelmente acima das aguas que a rodeam, sinão na facha oriental, unico lado em que se encontram pedras. Não tem montes nem collinas, e por conseguinte faltam-lhe vertentes e valles, e seus rios não tem fontes sinão na precipitação das nuvens e nas mesmas aguas do Pará, do Amazonas e do mar. No verão fica enchuta e secca, excepto em alguns lagos e no immenso pan- tanal chamado Mondongos, vasto dominio de repteis monstruosos constantemente coberto de plantas palustres, e as vezes, de arvores mais ou menos altas. Os campos ou, antes, as campinas occupam quasi toda a parte oriental e septentrional, e as matas, as outras duas partes, a occidental e a meridional. Nestas estão os siringaes ou as arvores com cujo succo se fabrica a borracha ; e não ha ahi outra industria. Os campos contém mais de 250 fazendas de criação de gado que abastecem de carne verde a Capital. tgp Sd 50 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Nas matas reinam febres intermiltentes e um calor intenso. A população é fraca, doentia e pouco civilisada ao passo que nos campos 05 ventos correm livres, o clima é salubre, reina a alegria, a actividade, à energia e a robustez. Esta differença nas duas secções da Ilha exercia tambem nos tempos antigos quasi a mesma influencia no caracter, costumes € civilisação dos gentios. E” assim que os Aruans, habitantes e senhores dos campos, apresentaram sempre uma consideravel superioridade sobre os Nheengaybas e outras tribus do mato ou selvagens. No centro dos campos está o Lago Arary, com 12 milhas de extensão no rumo N.8S.e 2a3 de E. a O; seu fundo, conforme a estação é de 1 a 6 metros. Sua unica ilha, chamada Mai Joaquina, fica na parte septentrional defronte da boca do Igarapé Apihy. A” margem oriental do lago e junto à boca do Igarapé das Almas está 0 Ceramio do Pacoval, mais conhecido com o nome de Ilha * do Pacoval. Situação dos ceramios Amazonas. — Ha alguns mezes tive occasião de visitar dous Ceramios da margem esquerda do Amazonas em terrenos de alluvião; um delles é o Miracan-uera que fica mais ou menos na mesma longitude da foz do Madeira, 14 milhas acima de Serpa e dilata-se por uma extensão de 5 milhas; mas os artefactos de barro que encerra acham-se isolados uns dos outros ; o seu material é uma argilla fina, levemento co- rada ; contém diversos ornatos e na parte externa são revestidos por uma camada de tinta branco-alvaiade que lhes dá uma apparencia de porcelana simplesmente po- lida. | O outro Ceramio está acima da foz do Trombetas, districto de Obidos, esten- dendo-se por uma distancia de 2 milhas ao longo da costa chamada do Pará. E” menor do que o antecedente, egualmente abundante de vasos de barro fino, porém mais ricos de ornato. Delle deu uma noticia acompanhada de estampas o Sr. João Bar- bosa Rodrigues que, antes de mim, havia visitado esta localidade. Maracá. — Visitei duas vezes este Ceramio que constava do tres grupos, es- tando um delles à grande distancia dos outros; acham-se todos nos terrenos montuosos, banhados pelas aguas de um braço do pequeno rio Maracã na Guayana Brazileira. Não contém sinão urnas, — umas de fórmas tubulares representando corpos humanos, e outras em fórma de Jabotis, Tartarugas terrestres. Bem que seu mate- rial, como a mão dobra, seja grosseiro ; as urnas offerecem grande interesse tanto por Em Marajó dá-se e Le nome q o q 4 , o a o] ste ome de Nha a u ul ucr rup ) d e ue appa l p . e arvores (o) rece no meio dos campos E ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL o] suas fórmas, como pelo facto de conterem ossos humanos, e as vezes esqueletos com- pletos. Santa-Izabel. — Visitei em 1873 este Ceramio situado nos campos de Marajó a N. O. do Lago Arary, é dificil sem um guia, achar este logar por estarem os artefactos so- terrados em chão plano e nivelado, como toda a campina vizinha. Bem que inferior, em extensão e numero de artefactos, ao do Pacoval, é todavia o unico que póde riva- lisar com este na escolha do material e na perfeição dos desenhos, relevos e pinturas dos vasos que encerra. Foi aqui que achei pela primeira vez algumas Tinteiras, utensis indispensaveis aos pintores indigenas, todas ellas ornadas de elegantes e delicados relevos; e uma contendo boa porção de argilla em massa, muito fina, e de côr vermelha, conser- vando ainda muita humidade devida provavelmente a algum succo vegetal que en- trara em sua composição. Duas destas Tinteiras, segundo uma observação do Dr. Director Geral do Museu Nacional, a quem as remetti com outros artefactos da mesma procedencia, assemelham-se singularmente a certas candêas que se tem descoberto nas ruinas de Pompéa. Pacoval. — E” este o principal e o mais importante dos Ceramios do Pará. E” elle que fórma o que se chama Ilha do Pacoval, cuja situação já [oi des- cripta em outro logar. Entretanto por isso mesmo que é o principal, antes de passar a descrever os artefactos cujas figuras serão achadas em seu devido logar, devo dar a seu respeito uma idéa mais particular. O Ceramio do Pacoval é o que se póde chamar uma pequena collina baixa e artificial, formada por series de urnas e de outros vasos, separados irregular- mente em seus interstícios por camadas de terra trazida dos campos vizinhos; é pela maior parte coberto de arvores de mediana grandeza e de outras plantas, entre as quaes alguns pés de pacoveiras (bananeiras) de cujo fruclo lhe veio o nome. Suas dimensões tomadas approximadamente são : Altura sobre o nivel do lago... 3,"504 8” (conforme a estação ) Largura” maxima sa -o esa e ExionsÃos ce to nar, dee 80 à 100” A" egual distancia das suas extremidades ha uma interrupção no Ceramio, formando uma baixa na qual não achei vaso algum, o que indica ou terem sido removidos para outra parte os que existiam, pelos pescadores que alli vão annual- mente fazer suas salgas de peixes, ou que os constructores do Ceramio o tinham originariamente formado em dous geupos desiguaes; esta ultima hypothese parece a mais aceitavel. Desses dous grupos o que ainda se mostra tal como foi construido, é o do 2 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Norte, o do Sul quasi totalmente extincto não é mais do que um montão de cacos de vasos que encobrem totalmente o solo. Maior quantidade destes fragmentos cobrem as vizinhanças do grupo de Norte e, invadindo a praia, immergem-se no lago; e tamanha é a sua abundancia que quasi não ha alli ponto em que se ponha o pé sem pisar sobre os des- troços de uma urna que havia guardado restos humanos, de um idolo decepado ou de um vaso mais ou menos enriquecido de ornatos; dir-se-hia que alli se rea- lisára uma dessas scenas barbaras dos primeiros seculos do christianismo em que os Iconoclastras desenvolveram todas as loucuras inherentes ao fanatismo religioso . A” respeito da primeira noticia e das explorações deste Ceramio o Sr. Pro- fessor Marit que por duas vezes em 1870 e 1871 executou fecundos trabalhos geologicos e elhnologicos no Pará, publicou no American Naturalist de ASTI, volume V, e nos Archivos do Museu Nacional (1.º trimestre de 1876) tudo quanto interessa saber, bastando agora sómente acrescentar que no corrente anno os Drs. Derby, Cl. Joberte W. Schwacke exploraram, — estes o Ceramio do Pacoval e aquelle o dos Camutins que pela primeira vez recebeu a visita de um scientista. O re- sultado dos trabalhos destes exploradores ainda não foi publicado. A minha primeira visita ao Ceramio do Pacoval foi precedida pela do Dr. Steere. Este Naturalista me havia communicado que distinguira no Pacoval tres secções ou camadas de vasos, sobrepostas umas ás outras e apresentando cada uma artefactos sensivelmente dillerentes quanto aos desenhos e outros ornatos, contendo a secção inferior os mais perfeitos exemplares e a superior os menos importantes. Este facto pareceu-me de grande interesse e na minha visita ao Pacoval live a satisfação de vê-lo confirmado, posto que me parecesse haver alli duas secções intermedias em vez de uma só, circumstancia que attribuo ou a pouca ordem em que as urnas do meio foram dispostas, de modo a não formarem verdadei- ras camadas, ou porque não me fosse possivel fazer no Ceramio um exame bastante regular e satisfactorio. Para melhor conhecer o facto alludido, logo que cheguei ao Pacoval, comecei por fazer abater o mato miudo que cobria a parte superior do Ceramio e, sem muita demora, começaram a apparecer varios circulos que nada menos eram do que bocas de urnas alli soterradas e sem cobertas ou tampos. Eram todas de barro grosso, escuro e sem outros ornatos além de alguns traços quasi extinclos de tinta branca, e de fórmas angulares. Estavam quebradas e cheias de terra, de seus proprios fragmentos e dos de alguns pequenos vasos que originariamente foram nellas encerrados. Numa destas appareceu um cachimbo pequeno que, não obstante ser muito grosseiro, não deixa de ter interesse por ser o unico que tenho achado nos Ceramios do Pará. Numa das faces do Ceramio, desbarrancadas durante o inverno pela acção das aguas do lago, as excavações que mandei fazer, mostraram duas urnas, uma ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 59 pintada de amarello e vermelho em campo acinzentado e outra com alguns relevos e pinturas de côr azul e encarnada. Emquanto se procedia a esta excavação, reparando nas grandes raizes de um robusto cajaseiro que cahira com o desbarrancamento do terreno, vi uma urna grande, bellamente pintada e com alguns relevos ni parte superior e inferior. Algumas raizes da arvore tinham penetrado no bojo da urna fazendo-a estalar e a sua queda acabou de quebral-a. Os trabalhos na secção inferior custaram muito tempo ce fadigas a mim e aos meus dous trabalhadores; o solo estava como petrificado pelos miudos frag- mentos de louça que penetrando um pouco para o fundo formára com a argilla um grosseiro mosaico. O resultado destes esforços, si não foi muito satisfactorio por não ter eu encontrado nem um vaso inteiro, deu-me, em numerosos fragmentos, exemplares notaveis pelos ornatos e pela escolha do material nelles empregado. E" exclusivamente, creio eu, nesta secção que se tem descoberto os singulares artefactos triangulares, hoje conhecidos com o nome de Tangas * de que o Museu Nacional possue os mais ricos exemplares. Do exame, embora imperfeito, que fiz deste Ceramio, cheguei ao conheci- mento de effectivamente haver alli, pelo menos tres secções ou ordens de vasos, contendo a inferior os mais perfeitos e a superior os mais grosseiros, conforme o Sr. Steere, antes de mim havia notado. Deste facto, caso elle se verifique, póde-se, sem muito receio de erro, tirar a se- guinte conclusão : Que as tres camadas de vasos tão distinctos entre si, por seus ornatos, repre- sentam outras tantas phases de uma civilisação decrescente. Esta conclusão póde ser logicamente convertida nesta outra : Houve em Marajó um povo que, chegado a um importante grão de civilisa- ção, achou-se inopinadamente em circumstancias tão difficeis, que não só foi cons- trangido a parar no caminho do progresso, mas a retroceder gradual e talvez rapi- damente até recahir nos dominios da barbaria. No Ceramio do Pacoval, como em outros de Marajó, todas as urnas, idolos, tangas, tinteiros, jarras, tigellas, pratos, etc., são de argilla mais ou menos fina com pouca ou nenhuma arêa, não se tendo encontrado nehum em que à pedra entre como seu material. Egual observação cabe aos Ceramios da Caviana, Amazonas e Maracá. Quanto, porém, a instrumentos de trabalhos e a certos artigos que se poderiam chamar ornatos ou symbolo de distincção de classes, não succede exactamente x o mesmo; é assim que nos (Ceramios do Amazonas, Pacoval e Santa Izabel 1 O Professor Hartt adimittiu esta palavra para designar o artefacto de que aqui fallo. Si attendidas as duvidas da Commissão de Redacção dos Archivos do Museu quizessemos aceitar a verdadeira denomi- nação deste objecto poderia o nome tanga ser substituido perfeitamente bem pela palavra Babat com que os Aruans designavam o mesmo objecto que na sua lingua exprime a idéa de um avental. E. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL tenho encontrado machadinhos de diorito, alisadores de vasos, immersores de redes de pesca, etc., feitos de diferentes pedras mais ou menos duras, pedaços de silex, de argillite e mesmo de escorias volcanicas, sendo estas duas ultimas sómente achadas nos do Amazonas. Dentro de uma urna encravada na secção infro-intermedia do Ceramio do Pacoval, encontrei em 1873, entre outros objectos, um desses talismans de pedra verde—pallido, conhecido no Mexico pelo nome de Chalchahuwitl ou Esmeralda baja, como a qualificou Molina em seu Vocabalario Mexicano, citado por Squier!; é a Nephrite como a chamavam na Europa, a Pedra de raio dos Gregos, a Pedra sagrada dos Chins, o Muirakitan dos Indios do Pará e do Amazonas, e é talvez u mesma pedra verda que se tem encontrado entre os Indios do Sul, centro e Norte do Brazil, e em muitas partes das duas grandes peninsulas americanas e nas Antilhas. * Descripção dos vasos Figura 1.º ( Estampa VI) — Uma urna que no corpo, pescoço e pés, representa a fórma de uma Tartaruga terrestre ou Jaboti. E” procedente do Ceramio do Maraca. O corpo, todo concavo, continha alguns ossos longos de uma criança pouco desenvolvida. No dorso está a boca da urna por onde foram introduzidos os ossos e sobre a qual se vê um operculo discoide ou tampa que a fechava. Dos pés, que se perderam, só resta um dos anteriores e esse mesmo destacou-se da urna, mas está estampado ao lado da figura, mostrando os seus cinco dedos. No pescoço vê-se certos ornatos turriculiformes que, me parecem, ter uma significação muito natural de que trato em outro logar. Até aqui todas as fórmas da figura são as de um Jaboti, não succede porém o mesmo quanto ao rosto que é evidentemente de fórma humana, parecendo sym- bolisar o sol. Posto esteja muito obliterada uma especie de orla que cinge o rosto, é facil distinguir em sua parte superior uma serie de recortes angulares que signi- ficariam um diadema regio ou (o que é mais provavel) a configuração dos raios do sol. Não tendo bases suficientes para formar um juizo seguro sobre a significação symbolica desta singular urna, limito-me simplesmente a descreve-la e figura-la. ! Observations on a collection of Chalchihuitls from Mexico and Central America. By E. G. Squier American Naturalist 1870 vol. IV n. 8. * Possuo 8 destas pedras achadas nos Ceramios do Pacoval, do Miracan-uera, da Costa do Parú, (Amazonas), e uma que, moldada como um chapéo de copa alta e abas reviradas, me foi offerecida pelo Sr. J. J Collares que a achou na Serra Grande, limites do Ceará com Piauhy. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 55 O material empregado nesta urna como em todos as outras da mesma pro- cedencia, é argilla bastante grossa cimentada, segundo parece, com um pouco de oxydo de ferro que lhe dá uma côr especial escurecida pela acção do calor do fogo. Figura. 2.º (Estampa VI) — Urna representando um infante, tendo os braços com os cotovellos voltados para cima, e as mãos apoiadas sobre os joelhos. Serve-lhe de cadeira, um jaboli, ou antes, um banquinho representando a fórma deste animal, da qual só diflere por ler um rosto semelhante ao da Fig. 1.º e uma cauda retorcida para a parte superior, o que não é proprio delle; pare- ce-nos mais aceitavel a hypothese do banco, porque é sabido que os indigenas do Pará os fabricavam com a configuração de certos animaes, como se vê no Museu Nacional onde existe um daquella procedencia, representando com muita approximação a figura de um jacaré. A figura do infante tem as pernas tubulares, demasiadamente grossas na parte inferior e pés egualmente volumosos. Na parte superior dos joelhos, observam-se em ambas as pernas dous orifícios de 0",01 de diametro proximamente, que pela sua regularidade e symetrica disposição, dando, às pernas a apparencia de dous recipientes, não podem deixar de despertar à curiosidade do obsevador, e se attendermos ainda para o cuidado com que os pre- paradores vedavam a entrada do ar e humidade nas urnas, obstruindo-lhes os in- tersticios deixados pelas tampas, por meio de um cimento branco de que usavam, mais singulares acharemos esses orifícios, que collocados na parte superior das bojudas pernas, dão-lhes o aspecto de dous — vasos appendices. Qual seria o fim desses orifícios ? Com que interesse seriam elles feitos quando sabemos que todo o cuidado era empregado em vedar a entrada do ar no interior da urna ? Os preparadores servir-se-hiam por acaso desses vasos para nelles depositarem substancias que influissem na conservação dos cbjestos contidos na urna, com os quaes se poriam, em contacto pelas côxas tubulares, em communicação directa com o inte- rior ? Esses orifícios seriam ou não obstruidos pelo cimento ja citado depois de concluida a preparação ? São estas as conjecturas que de momento nos occorrem e para as quaes, com franqueza o confessamos, não se nos depara solução satisfactoria. A boca da urna occupa o logar do pescoço, e o operculo ou tampa é a ca- beça que ahi se vê toda envolta numa touca que só deixa descoberto o rosto com os olhos horizontaes e o longo nariz do antigo typo mexicano. A parte superior da cabeça parece coberta com um simples disco sobre o qual estão figurados turriculos iguaes aos que se vê no pescoço do Jaboti, Fig. 1.º, mas este disco, quasi se póde affirmar, nada é menos do que a representação de uma Umbrelia. 56 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Isto recordaria um costume dos antigos Floridanos, cujos maguatas, segundo o Dr. J. Jones, ? eram, como os Mexicanos, conduzidos em liteiras por seus subditos, ao mesmo tempo que a cabeca era abrigada do sol por umbrellas de plumas ou de pelles de côres esplendidas. Diversos orifícios mui pequenos davam passagem a um cordão fino, mas muito forte que ligava as duas pecas da urna, o corpo e a tampa. No rosto mui pouco abaixo da boca, e no alto do peito apparecem dous desses orifícios. O cordão apertava as duas peças e no ponto da juncção destas era applicado o cimento já citado que fechava perfeitamente a urna e preservava do ar e da humidade os ossos que ella continha. Nesta urna como em uma outra do mesmo caracter e estylo, porém muito maior, estava no logar devido o distinctivo sexual masculino que fracturou-se ; vê-se porém ,ainda uma escura mancha ou cicatriz indicando o ponto donde se destacou aquelle objecto. A urna mede : LO qe e RD ts Ro Re E REM DA | pe ds Diametro-na baga ses = ay RO À gi Espessura na boca. ..... ERR IS a 02,005 A base é rectangular, com as dimensões... 07,19 x 0,13 Osservações. — As duas urnas acima descriptas são procedentes do territorio do Maraca (Guayana Brazileira), d'onde eu as trouxe com outras representando vasos tubulares terminados na parte inferior por um pequeno banco, e na supe- rior por uma tampa imitando cabeças humanas mais ou menos semelhantes à da figura 2.º Os ossos nestas urnas tubulares são arranjados com muita ordem: os chatos no centro e parte no fundo, os pequenos sobre estes, os longos encostados às pa- redes do vaso e por cima de todos os craneos apoiando-se em parte sobre as ca- becas do femur e humerus. Esta disposição dos ossos era tambem mais ou menos observada nos Mownds do Tennessee e alguns outros do Sul dos Estados-Unidos, onde em épocas remotas tinham-se estabelecido os Caraibas. No rosto distingue-se, as vezes, duas côres emblematicas separadas pela linha naso-perpendicular; numa face a côr vermelha que é a da realeza, e na outra a côr amarella que é a do sol, Sobre a umbrella que cobre a cabeca nota-se um numero variavel de tur- riculos a que já alludi, dispostos ordinariamente em fileiras mais ou menos regu- lares, dupleces e tripleces, sendo uma dellas quasi sempre mais curta ou como que apenas comecada. * The aboriginal Mound builders of Tennessee (American Naturalist, vol. III, 1869, pag. 65). PR, qua ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 57 A incontinuidade desta ultima fileira de turriculos e a sua diminuta quan- tidado em urnas que, por seu pequeno tamanho e pequenez dos ossos longos, eram evidentemente de individuos que morreram antes de sahirem da infancia, fazem crer que, em vez de simples ornatos, eram uma enumeração dos annos que contava o fallecido. Figura 3.º Estampa VIT — Urna do Ceramio do Pacoval. E” uma das mais notaveis e curiosas que se têm descoberto no Pará, não tanto por seus ornatos como porcertas particularidades que serão aqui descriptas. A urna representa uma mulher cujo corpo inteiro parece velado ou enco- berto por um vestido, profusamente ornamentado com ligeiros relevos que o artista realçou com tinta rósea ou quasi vermelha que em alguns pontos ainda se dis- tingue. Falta-lhe a tampa e tem na boca algumas fracturas. As suas dimen- sões são estas : JM AU e o O 0",65 Diametro na boca....... 0",19 Diametro na base. ...... A To Espessura. ........ oa QD O rosto é tambem abundante de ornatos, no meio dos quaes distinguem-se bem os olhos que são horizontaes; a boca confunde-se com a ponta do queixo que se curva muito para cima, formando como que uma voluta; e o nariz fórma com as sobrancelhas uma figura que se assemelha à lettra Y. O pescoço, muito curto, é cingido por uma estreita facha côr de rosa que se assemelha à uma simples fita, cujas pontas reunidas na parte superior do peito, descem até a altura dos seios; e estes, ao passo que são representados exteriormente por dous mammiculos, apparecem, como que a seu pezar, nas intu- mescencias, disfarçados pelo vestido que envolve todo o corpo e os membros inferiores. Esta apparencia do vestido recordaria o costume, seguido pelos antigos Gregos, de cobrirem de riquissimas vestes os corpos dos mortos que pertenciam às altas classes da sociedade, — costume provavelmente imitado dos antigos Egypcios. Os membros superiores e inferiores não são representados sinão : — estes pelas pontas dos pés que se veem na base da urna; —e aquelles apenas por cabeças de um animal que não sei bem definir, mas que parece pertencer ao genero Tes- tudo; uma destas cabeças falta por se ter quebrado. De cada uma das espaduas desce uma estreita facha até a cintura, d'onde to- ma uma direcção horizontal, indo as suas extremidades terminar, sem se tocarem, exactamente defronte do umbigo. Esta facha cujas pontas terminam quasi em fórma de cruz, é tambem ornada de relevos e traços de tinta encarnada. v.ILI—S9 os ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Na base, á egual distancia dos dous pés, vê-se uma Tanga, ornato de que só usavam, em certas circumstancias, as mulheres casadas e as jovens que tocavam à idade nubil. O caracter, porém, mais notavel que distingue esta urna e egualmente à represen- tada na figura 4.º, é a sua dupla face ou, em outros termos, é ter ella duas fren- tes,—a que a figura aqui exhibe e a outra que lhe fica do lado opposto, sendo cada uma perfeitamente egual a outra em fórma, ornatos, estylo, côres, em tudo, finalmente. Esta urna foi extrahida do Ceramio do Pacoval e acha-se no Museu Nacio- nal, para onde a remetti com outros artefactos. Figura 4.º (Estampa VII) — Uma urna procedente do Ceramio do Pacoval e, como a antecedente, é de face dupla ou de duas frentes. Falta-lhe tambem a tampa e as bordas da boca estão quebradas de um lado. | Está no Museu de Maceió para onde ha mais de 2 annos foi remettida pelo Dr. Jonas Montenegro. As suas dimensões são as seguintes : AURA. ren senso Meo tá é 0,729 Diametro na boca. ..... Oia Diametro na base..... | RR o Espessura das paredes. . o UM Em ornatos é muito inferior à Figura 3.º, posto que o artista lhe tenha dado, em geral, o mesmo caracter e um estylo quasi semelhante. O nariz dema- siado curto e muito grosso fórma com as sobrancelhas um TT. O rosto é menos sobrecarregado de ornatos. O corpo que parece egualmente envolto em um vestido, é coberto de ornatos simples que consistem geralmente em linhas quebradas, as quaes se incluem for- mando o que se póde chamar espiraes quadrangulares, que tambem ornam o corpo da urna antecedente, Fig. 3.º As espiraes deste genero recordam as do Mexico, segundo uma observação do Sr. Hartt na sua descripção de artefactos do Pacoval. Os membros superiores não estão figurados e os inferiores são representado . apenas pelas pontas dos pés. cs RA Na base, entre duas espiraes angulares e à egual distancia dos pés, vê-seos distinctivo do sexo feminino que não é aqui encoberto, como na Figura 3.º, por uma Tanga, porque a urna representa uma menina e não uma mulher. E” muito provaveimente por esta ultima razão que na urna não apparece 0 menor signal de seios. ; | ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 59 As duas urnas (Figura 3.º e 4.º) que acabo de descrever, conforme as ligeiras notas tomadas em devido tempo, appareceram figuradas com leves faltas, mas descriptas de um modo muito incorrecto, em um artigo que com a epigraphe Antiguidades do Amozonas, foi escripto pelo Sr. João Barbosa Rodrigues e impreso na revista — Ensaios de Sciencia — que se publicou na Córte. Para não desviar-me do assumpto principal, reservo para o Appendice que se achara no logar competente, as observações que tenho de fazer sobre esta parte do citado artigo. Figura 5.º (Estampa VII) — E” uma uma do Ceramio de Miracan-uéra, districto de Serpa. Seu material é argilla pardo-avermelhada, sem arêa e mal queimada como quasi todas as urnas do Amazonas. Suas dimensões são : Altura, tomada do lado interno... uso Diamoiços nas bota. essi sopagebo cuida OVAs Diametro (maior) na base...... 07,26 Espessura das paredes na boca.. 0,005 A urna representa uma pessoa assentada. Na altura do peito ha, de um lado, dous pequenos mammiculos que indicariam pertencer ella à uma mulher. Os membros superiores e inferiores são demasiadamente toscos, e a figura os exhibe de modo tão claro que não precisa de outra descripção ; basta dizer que uns e outros imitam muito menos ao natural do que a esquadros de madeira ou de metal usados em oflicinas de marceneiros e de outros artistas. O umbigo é representado por uma pequena marca circular concava, no logar natural. Na base da urna e à egual distancia dos pés está o distinctivo sexual, mas de tal sorte obliterado que não deixa conhecer com certeza qual o sexo ahi representado, sendo que, em qualquer dos casos houve imperfeição original na configuração do objecto. Esta urna, segundo referiu-me a pessoa que a encontrou, estava cheia de ossos humanos, mas tão arruinados que não se podia tocal-os sem se quebrarem logo. (Quando foi descoberta, ella conservava ainda muitos traços de tinta encar- nada, quasi todos em linha recta, e a côr branca de tabatinga com que os oleiros cobriam sempre os seus artefactos; e quando passou ás minhas mãos estava servindo de vaso de flóres, havia já 6 mezes, em casa de uma senhora que teve a bondade de m'a offerecer. — A urna, aqui figurada, não é certamente um artefacto que dê idéa exacta do grao de adiantamento da arte ceramica em Miracan-utra , onde, pelo con- trátio, têm apparecido outros vasos que, embora conservando mais ou menos o mesmo caracter, são mais bem acabados e enriquecidos de ornatos, às vezes 60 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL elegantes; mas esses vasos achavam-se tão quebrados que nem um delles estava em circumstancia de ser descripto. Por qualquer lado que se considere ou se compare os artefactos de Miracan- uéra, chega-se sempre a esta conclusão que elies são inferiores aos da Costa do Parú, assim como estes são muito inferiores aos de Marajó; e accrescento que aos vasos daquelles dous ceramios do Amazonas falta o aspecto grave e quasi imponente dos de Maracá, a despeito mesmo da singeleza nos ornatos destes e do seu material grosseiro. Osservações. — Os limites desta carta e, sobretudo, a perda de uma parte de minhas notas, não me permittem descrever as urnas tubulares do Maracá que existiam no Museu Paraense, tendo apenas dado dellas uma ligeira noticia; os homens, porém, que se interessam por assumptos deste genero, encontrarão no American Naturalist (vol., VI) um artigo muito interessante em que o professor Hartt descreveu magistral- mente e figurou uma urna do mesmo caracter e semelhante áquellas, a qual existia tambem no Museu Paraense. Do final desse artigo se deprehende que o seu autor tinha em mãos um novo tra- balho sobre artefactos colleccionados no Pacoval pelo Sr. Dr. Derby, seu distincto collaborador e antigo alumno. Lamento não ter ainda visto esse novo trabalho por- que eu o teria tomado por guia para evitar as lacunas e imperfeições que provavel- mente hão de apparecer na parte por mim descripta. Não conheço o processo empregado pelos constructores dos (Ceramios no preparo da sua mais fina louça; mas o que se vê bem patente é que esta, nos mais bellos exemplares, era sempre composta de duas partes : a armação, corpo ou peça principal, e a cobertura com os ornatos. O corpo era de argilla entrefina com pouca ou ne- nhuma arêa; depois de formado era exposto por algum tempo ao ar ou mesmo ao sol para enshugar um pouco e então receber certas partes accessorias, como alças ou orelhas, e depois a cobertura e os ornatos. A argilla para estas ultimas partes era finissima, muito pura, extrahida imme- diatamente, segundo parece, de uma rocha deste material, muito compacta e reduzida a pó muito fino. Este pó humedecido, talvez, com algum succo vegetal, formava a massa que devia cobrir a superficie do vaso, e tão fina e tão egual era esta camada superlicial que a sua espessura pouco excedia às vezes a de uma folha de papel em- pregado para estampas de livros. Era sobre a superficie assim preparada que o artista applicava as córes e relevos mais ou menos elegantes que lhe aprazia inventar. Tenho frequentes vezes encontrado fragmentos de louça fina que pouco mais pesam do que pedaços de cascas de madeira de iguaes dimensões; o que induz a pensar que o seu material principal era a pedra pomes /(Pomex). A grande quan- tidade destas que apparecem fluctuando nas aguas do Amazonas ou dispersas pelas praias deste rio, sobretudo na contra-costa de Marajó, justifica essa supposição, cumprindo-me, porém, notar que nos Ceramios nunca achei esse material. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 61 Os ossos são raros no Pacoval, como antes de mim o havia notado o professor Hartt na descripção que fez de diversos artefactos collecionados alli pelo seu ajudante o Dr. Bamard. Achei apenas tres ou quatro fragmentos de ossos longos dentro duma urna da secção média do ceramio, e esses mesmos desfaziam-se em migalhas, por estarem totalmente arruinados. Dentro de outra urna muito quebrada que havia na secção inferior, achei residuos de ossos em pó, de côr pardacenta com algumas manchas amareladas, num logar d'onde escaparam rapidamente 5 ou 6 myriapodes do genero Geophilus, fugindo através das fendas deixadas pelos fragmentos da propria urna. Pareceu-me ver nestes residuos o resultado de uma incineração de ossos, e a ausencia ou raridade destes no ceramio teria assim uma explicação natural, apresentando ao mesmo tempo mais um ponto de semelhança de costumes entre os constructores dos ceramios de Ma- rajó, e os dos Mounds dos Estados-Unidos. Quanto ao destino dos Ceramios de Marajó, não me parece diflicil dizer qual fôra. — No meio de uma planície immensa que se inunda quasi totalmente durante o inverno, a creação de uma ou mais collinas qu e servisse de abrigo, ao menos, às familias principaes e a seus chefes, era obra aconselhada pela necessidade ; esta necessidade reunida à veneração que os Indigenas tributavam aos mortos deram sem duvida origem às collinas artificiaes do Pacoval,dos Camutys e a outras menores que apparecem nas campinas da Ilha. A grande quantidade de vasos, de uso domestico, como panellas, alguidares, am- phoras, pratos, tigelas, etc., e até uma especie de bandeja, todos mais ou menos re- duzidos a cacos, deixa bem ver que o logar em que se acham, fóra uma Aldêa ou Maloca dos antigos habitantes. O Ceramio de Santa Izabel e alguns outros onde não ha o menor vestigio de elevação de solo ou de collina artificial, podem ser considerados como ald3as em começo que deixaram de progredir ou foram aban donadas, por causa das continuas guerras que aos habitantes desses logares faziam as tribus selvagens que existiam nas matas vizinhas da ilha ou que, immigradas de outras regiões, tentaram invadil-a. Assim o destino dos Ceramios era, ao mesmo tempo, servir de residencia aos vivos e de jasigo aos mortos, não para toda a tribu ou nação, mas unicamente para os chefes e para as pessoas de sua familia ou que com elles se achavam relacionadas por parentescos ; pois tudo indica que na republica destes povos a classe superior não se confundia jamais com a inferior, nem mesmo depois da morte, ou no si- lencio dos sepulchros. 62 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Os constructores dos Ceramios Tão limitado tem sido o estudo dos Ceramios do Pará que presentemente a unica resposta que, sem o menor receio de erro, se póde dar à questão — qual o povo que os construio — é que elles nada devem à industria, nem mesmo à mais simples in- fluencia de qualquer raça extra-americana. Em questões tão complexas, como é a da origem, ainda não discutida, destes pequenos monumentos indigenas, as hypotheses entram sempre como elementos necessarios á investigação da verdade, do mesmo modo que às vezes em certos problemas um primeiro erro é a chave da sua solução. Sob este ponto de vista espero que me será relevada a liberdade de figurar como convertida em verdade historica, embora, muito longe disso ainda esteja, a opinião enunciada pelo anthropologista J. W. Foster ! relativa aos constructores dos Mounds dos Estados-Unidos, opinião equivalente a ter sido a America povoada, não por Asiaticos ou qualquer outro povo do Velho Mundo, mas por uma raça pu- ramente americana, autochthona do planalto central de Minas Geraes, — O mais antigo torrão do Globo, — segundo a auetoridade do Veneravel Lund, o patriarcha da anthropologia brazileira. Sabe-se que este naturalista, que ha perto de meio seculo reside em Minas (reraes, reconheceu que os crancos, por elle alli descobertos, pertenciam a mesma raca que os Portuguezes acharam no Brazil e que esta, pela depressão muito pro- nunciada da testa que as vezes chega a desapparecer totalmente, se differençava da mongolica com a qual se lem pretendido confundil-a; caracter ou typo que reapparece nos idolos de Marajó descriptos pelo Professor Hartt, e nos craneos hu- manos que tem sido encontrados nos Sambaquis da costa maritima, nos Ceramios do Maracá, (Guayana, nos chulpas dos Aymaras, nos Mounds dos Estados-Unidos e, como observa Lund, nas figuras humanas esculpidas nos monumentos antigos do Mexico. A opinião de Foster basta-se tambem sobre as idéas do douto archeolo- gista Squier que estudando os chulpas peruanos diz que « monumentalmente ao menos, a civilisação do Perú era indigena, tendo sido gradualmente desenvolvida mas não introduzida de fóra; » e acrescenta que essas construcções « foram obra dos povos que occupavam o paiz no tempo da conquista e cujos derradeiros t « Instead of seeking to establish ethnic relations between the Mound-builders and any of the races of the Old World, founded on the apparent similarity of manners and customs I would 100k rather for their origin to that race who», in times far remote, flourished in Brazil, some of whose crania are found in the bone-caves of Minas Geraes, in connection with Mammalian bones belonging to genera and species now extinct. EA NA Pre-historic races ofth>2 Unit l States ofAmerica. by J. W. Foster. L. L. D. Chicago 1873 chap. X. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 63 monumentos não são sinão as fórmas desenvolvidas dos que foram construidos por seus antepassados. » ! A mesma grande idia, emfim, parece apoiada, sob certas reservas, pelos Srs. Drs. Lacerda Filho e Rodrigues Peixoto que applicando as conclusões dos seus estudos craneologicos à questão da raça primitiva do Brazil, pensam que « não sera talvez arrojada a proposição de Simonin quando diz que «O Indio americano é um producto do solo americano. ? Ê Da raça primitiva do Brazil, talvez mais biblica do que a dos Asiaticos, sahio a que os Europêos acharam neste paiz fallando uma lingua à que deram o nome de Lingua Geral porque «nenhuma lingua primitiva do mundo (diz o Dr. Couto de Magalhães) nem o proprio Sanskrito, occupou tão grande extensão geographica como o Tupi e seus dialectos ». * Esta proposição toma ainda maior amplitude em Garneau; este historiador assevera que « existia entre todas as linguas americanas, desde a Bahia d'Hudson até o Estreito de Magalhães uma analogia que merece ser estudada; é uma disparidade total nas palavras ao lado de uma grande semelhança na estructura ; eram como materias diferentes revestidas de fórmas analogas » e pensa com Gallatin, por elle citado, que todas estas linguas devem ter tido uma origem commum. “ Em suas investigações linguisticas o Dr. Baptista Caetano” demonstrou que a lingua geral e a dos Caraibas com a qual Ale. d'Orbigny a identifica, deixaram vestigios incontestaveis de sua existencia e influencia em todo o nosso continente. Esta uniformidade de caracter na estructura e nas fórmas grammaticars dé todas as linguas do Novo Mundo, combinada com a quasi conformidade craneo- graphica reconhecida em povos antigos que habitavam em regiões tão afastadas umas das outras, robustece sobre modo a idéa de Foster. Mas eu me abstenho de entrar nesta questão em que apenas toquei para melhor encaminhar o meu assumpto. Fallemos dos Caribas e Aruans. Creio que não me afasto da exacção dizendo que as investigações do autor do Abancenga vieram illuminar um dos pontos mais obscuros da Historia do Brazil, podendo-se hoje quasi affirmar, em vista desse trabalho, que os Caribas são oriundos do Brazil, e que Tupis, Guaranis e Caribas, podem ser considerados 1 The primeval monuments of Perú, by E. G. Squeir. M. A. (V. American Naturalist. vol. IV. 1870. pag. 2 e 14. 2 Contribuições para o estudo anthropologistico das raças indigenas do Brazil. Archivos do Muzeu Nacional. Rio de Janeiro, 2.º e 3.º trimestre de 1876. 3 O Selvagem, pelo Dr. Couto de Magalhães. Rio 1376. Introduccão; pag. XXXV. + Histoire du Canada, par F.X. Garneau. 3me; edition. Quebec 1859. vol. I pag. 110. 5 Apontamentos sobre o Abancenga ou lingua gera! dos Brasis. Ensaios de Sciencia. Rio 1876..F.I. 4 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL povos irmãos, sahidos do mesmo tronco ou raça autocthona que teve seu berço no planalto Central de Minas Geraes. A nação dos Caribas foi a mais numerosa, a mais energica e a mais em- prehendedora da America; pois vemo-la nas narrações de varios historiadores, estendendo seu nome e sobretudo sua dominação por differentes pontos do nosso continente, desde o Sul do Brazil até o extremo norte dos Montes Aleghanes facto curioso de que póde ser complemento a analogia, notada por Garneau, e a uniformidade de estructura que existiam entre todas as linguas americanas, desde o Estreito de Magalhães, até a Bahia d'Hudson. Qual foi, porém, o caminho e marcha dos Caribas em suas transmigrações ? Aqui entra-se de novo em terreno quasi desconhecido, e em um mundo de conjecturas donde não ha esperança de colher-se um resultado satisfactorio. O facto, porém a que já alludi, referido por alguns historiadores de terem os Ca- ribas dominado a Costa Sul do Brazil, póde aqui servir de guia. Partamos deste ponto, prescindindo do destino que seguiram outras tribus da mesma origem, em direcções diferentes. Alcançando as praias do Atlantico, os Caribas provavelmente seguiram para o Norte e lançando enxames sobre enxames, povoaram successivamente a costa, a fóz do Amazonas, toda a (ruayana, as Antilhas e entrando na Peninsula sep- tentrional não pararam sinão nas Montanhas dos Aleghanes ou Apalachos. E” destas montanhas e de suas proximidades que o Abbade Brasseur de Bourbourg, ! seguindo suas proprias investigações e a auctoridade dos antigos Historiadores, faz partir colonias que com os nomes de Nahuas, Apalachitas, Caribas ou Cofachitas, Flatuicas, etc. (que são, talvez todas da mesma nação dos Caribas), vão estabelecer-se na Florida e Valle do Mississipi, donde mais tarde se passam para a America Central e Mexico, edificam grandes cidades e intro- duzem seus costumes, seus deuses e sua civilisação. E” tambsm das mesmas montanhas e da Florida que Irving, seguindo os mesmos historiadores que se guiaram por tradições achadas no Maity, faz partir os Caribas que não só occuparam a maior parte das Antilhas, mas a Guayana, e a Amazonia ou o baixo Amazonas, parecendo mesmo terem «levado suas emprezas às praias do Oceano Austral ond: entre os aborigenas do Brazil alguns havia que se denominaram Caribas e se distinguiam das tribus vizinhas por sua superior intrepidaz, sagacidade e espirito emprehendedor ». ? -* Monumens anciens du Mexique et Recherches sur les ruines de Palenque et d'Ocozingo. Paris 1869. Chap. III, pag. 38. * A History of the life and voyages of Chistopher Columbus, by Washington Irving, Francfort 1835. Book Vi. Chap. LI. ça Ê 4 Ê : ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 65 Da exposição deste ultimo historiador parece resultar uma opposição á linha de marcha seguida de Sul a Norte pelos Caribas, como a figurei; mas não houve, creio eu, sinão uma contra-marcha desses povos que, depois de residirem alguns seculos nos Apalachos, movidos por dissensões religiosas, como o explica o Abbade Br. de Bourbourg (loc. c.), separaram-se, tomando algumas tribus o destino já indicado. Em qualquer, porém, dos dous casos, fica sempre estabelecido o facto de que os Caribas, em épocas remotas, dominavam “a foz do Amazonas e prova- velmente todo o baixo Amazonas. Nesta foz estão duas grandes ilhas fronteando o mar:— a Caviana, que ao tempo da vinda dos Portuguezes era como as campinas de Marajó, occupada pela tribu dos Aruans,— e a Mixiana occupada pelos Alexianos, como os cha- mavam os Missionarios Franciscanos. Estes Alexianos entretinham relações frequentes com os Caribas da Cavyena, seus parentes e instigados por estes e insuflados pelos colonos francezes, faziam crua guerra aos Aruans, tambem seus parentes mas que delles se tinham sepa- rado por motivos diversos. Os Aruans não tem, é verdade, uma origem conhecida na historia, mas certos factos revelam que elles não podiam deixar de pertencer à nação dos Caribas. As campinas de Marajó, por exemplo, assim como as duas grandes ilhas da foz do Amazonas, estavam no caminho das transmigrações e dispersões destes famosos conquistadores que, por seu genio bellicoso, por sua altivez e pela superioridade de sua raça, estavam preparados para domarem e dominarem tudo e todos os outros povos que por ventura apparecessem e ousassem oppór-lhes qualquer resistencia. Os Aruans eram parentes dos Alixianos, caribas de origem, segundo os Mis- sionarios Franciscanos, e parece que o eram tambem dos Tocujas, que tinham a mesma origem e occupavam as terras da (Guayana, desde o Cajary e Maraca até o oceano, e sabe-se que era com o concurso destes dous povos irmãos que os Hollandezes e Inglezes pretenderam diversas vezes formar feitorias e colonias no baixo Amazonas. A lngua dos Aruans si não era a mesma dos Tucujúus era, pelo menos, perfeitamente comprehendida por estes, ao passo que differe consideravelmente da que fallavam os Tupinambás, embora grande numero de palavras desta se introduzissem na dos Aruans. Eu creio poder concluir destes factos, que os Aruans eram um resto da antiga raça cariba. Mas estes antigos senhores das campinas de Marajó seriam os cons- truclores dos ceramios desta Ilha ? Para responder a esta questão é preciso recordar a existencia, no Ceramio V. II— 10 06 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL do Pacoval, de tres camadas de urnas muito differentes em ornatos e estylo indicando outros tantos gráos de civilisação retrocedente. Não ha notícia alguma de ter apportado à costa oriental da America meriodional qualquer povo, familia ou individuo estrangeiro antes da descoberta do Novo Mundo. Consequentemente, não se podendo attribuir à qualquer povo extra-ame- ricano a construcção dos Ceramios do Pará, é claro que deviam ser obra da raça mais nobre e mais emprehendedora da America; e, como os caribas estavam neste caso e tinham sem duvida habitado em Marajó, à estes deve ser attri- buido o fabrico dos mais ricos exemplares de louca, idolos, vasos e urnas que formam a camada inferior daquelle Ceramio. Os seus descendentes immediatos foram provavelmente os continuadores desse monumento, cabendo aos Aruans, ultimos representantes dessa raça, a secção supe- rior cujos artefactos são ja bastante grosseiros. Assim (eu adopto aqui uma bella proposição de Foster, já citado), as gera- cões que se succediam, mas degenerando gradualmente de seus antepassados, impri- miam sobre os artefactos de cada secção as feições caracteristicas de sua civili- sação. (Quanto aos Ceramios do Maraca e da Costa do Parú e de Miracan-uera, em- bora sejam seus artefactos inferiores aos do Marajó, não vejo um motivo sério para não attribui-los aos Caribas ; creio até que outros monumentos deste genero que forem descobertos ao longo dos rios Solimões, Rio Negro e Rio Branco hão de trazer novas provas da origem Cariba dos Ceramios desta parte do Brazil. Em verdade, quando se lê com toda a altenção a descripção que os antigos escriptores fizeram das tribus que outrora povoaram as margens daquelles rios, crê-se estar vendo o Cariba dos Apalachos e da Florida na philosophia imperfeita do Passé, o das Antilhas e do Orinoco no genio altivo e bellicoso dos Manãos no tempo de Ajurúcuba, e emfim o de muitos outros pontos da America na confor- mação do craneo do Cambeua. E”, entretanto, impossivel desconhecer que este objecto de tanto interesse para a historia do Brazil exige muito tempo e um estudo muito minucioso de todos os Ceramios que existem e dos que forem descobertos nestas regiões. E” uma tarefa que está reservada aos anthropologistas. Minha missão aqui, escusado seria dize-lo, não é esta, eu a cumpri, como me foi possivel descrevendo algumas urnas encontradas nos Ceramios para serem melhor conhecidas e estudadas. Si excedi os limites desta missão na exhibição de certos factos geraes rela- tivos à questão da raça americana, é que fui á isso compellido pela necessidade de firmar melles a minha these sobre oo Ceramios do Pará. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 67 Muito ha de haver de erros e defeitos no trabalho que apresento, e acho mesmo impossivel não os haver; pois eu escrevo em um paiz onde não ha mes- tres em sciencias e nem livros especiaes. - Abi está, Sr. Director Geral, quanto me propuz a escrever sobre os Cera- mios do Pará e sobre seus constructores, esperando merecer de V. S. toda a in- dulgencia. Belém do Pará, 1877. D. S. Ferreira PeENNA. APPENDICK URNAS DO MARAC Á Em Janeiro de 1872 o Governo da Provincia, então sob a administração de S. Ex. o Sr. Dr. Abel Graça, expediu-me instrucções para continuar os meus estudos sobre a Geographia, Estatistica e Historia da Provincia, pondo para este fim à minha disposição o pequeno vapor Pará, commandado pelo meu particular amigo 1º Tenente M. Ribeiro Lisboa. Parti logo a cumprir esta missão com a firme resolução de subir o rio Maracá afim de descobrir o logar em que se achavam certas urnas mortuarias de fórma humana de que eu tivera exacta noticia por uma que o illustrado Dr. F. da Silva Castro havia, pouco antes, offerecido ao Museu Paraense, então sob minha administração. Depois de vencer diversas dificuldades e até certas repugnancias ou objec- cões, cujas causas eu cera aliás o primeiro a respeitar, vi emfim plenamente satisfeitos os meus desejos, trazendo dalli para a Capital uma porção de urnas de differentes fórmas, e quasi todas cheias de ossos. Desembarcadas e recolhidas à casa de minha residencia, coloquei as que representavam corpos humanos na posição que guardavam nos seus velhos jazigos, —em fileiras e em pé. 70 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Nesta attitude, vistas a certa distancia, ellas apresentavam um aspecto singular. A sua côr cupreo-escura, suas fórmas tubullares, e as cabeças envoltas em toucas ou turbantes, deixando só apparecer o rosto, as vezes bicolorido, fize- ram-me recordar as figuras imponentes dos caribas, tão bellamente descriptas por Humboldt, cujos corpos altos, tintos de urucu, meio cobertos até uma das espa- duas por um panno azul escuro, assemelhavam-se à estatuas de bronze que se erguiam ao céo no meio dos steppes. Uma segunda visita ás florestas do Maracã em Outubro de 1872 forneceu- me ainda algumas urnas que encontrei, mas ja quebradas, debaixo de lJapas de grês muito compacto que as abrigavam do tempo, mas não dos grandes mammi- feros os quaes procuravam tambem este abrigo, lançando por terra as urnas para melhor se accommodarem. E digno de nota o esmero com que os olleiros indigenas figuravam em relevo os orgãos genitaes tanto das pessoas adultas como das menores e tanto de um como de outro sexo, podendo-se quasi aflirmar que era nesta particularidade que elles mais se esforçavam para imitarem a natureza. Eu creio que desta circumstancia se não póde concluir cousa alguma contra os costumes do povo a quem pertenciam aquellas urnas, pois que para os nossos indigenas nunca a nudez do corpo e a plena exhibição de qualquer das suas partes, foi objecto mais contrario a decencia do que para nossos primeiros pais no Paraizo terreal. No final do relatorio que apresentei ao Governo Provincial, em resultado da minha missão, consignei um trecho que peço permissão para transcrever aqui, posto que seja um assumpto pessoal. E” o seguinte : « A minha ultima palavra aqui é para o meu joven e illustrado amigo e ama- vel companheiro de viagem, o 1º Tenente M. Ribeiro Lisboa, commandante do vapor Para. « Este distincto e bravo Official da Marinha Imperial não se mostrou sómente zeloso e economico no commando do seu navio, foi tambem um muito valioso auxiliar que encontrei. E” assim, por exemplo, que elle espontaneamente encar- regou-se de determinar a posição geographica de varios pontos importantes que eu tinha de visitar durante a viagem. « Accedendo ao meu pedido, fez-me o Sr. Lisboa, o importante serviço, quando chegamos ao Maracá, de adiantar-se com um guia e com a maior parte dos trabalhadores em duas montarias, para fazer extrahir as urnas funerarias a que alludi em outro logar, —trabalho que elle dirigio com tanta intelligencia e de modo tão completo que ninguem certamente o faria melhor. » Pouco depois do nosso regresso o Sr. Lisboa escreveu e fez publicar no Diario do Gram-Pará um excelente artigo dando uma noticia geral da nossa viagem e ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL qu! daquellas urnas, artigo em que, semo pretender exhibiu abundantes provas de seu talento e de uma intelligencia cultivada com esmero. O assumpto era aliás proprio para excitar o entlhusiasmo de um mancebo, como este, que no curso da vida humana não procura sómente os gosos materiaes, mas, guiado por sentimentos mais nobres, busca de preferencia os deleites reaes e inesgotaveis, reservados unicamente aos espiritos escolhidos que constituem a unica aristocracia que Deus estima e que o homem deve respeitar: —a Aristocracia da intelligencia. OBSERVAÇÕES Duas urnas (Fig. 35.2 e 4.2) descriptas e figuradas pelo Sr. João Barbosa Rodri- ques em seu artigo — Antiguidades do Amazonas, inserto na Revista — Ensaios de Sciencia. Em principio de 1874 cheguei ao Pacoval do Arary no momento em que acabava de ser tirada deste Ceramio a urna representada pela Figura 3.º, cujo descobridor a mandou de presente ao Sr. Dr. Ferreira Campos, distincto Paraense que então exercia habilmente o cargo de Inspector da Thesouraria de Fazenda, a quem, logo depois do meu regresso, pedi o favor de ceder-me aquella uma; eo Sr. Campos teve a beniguidade de attender ao meu pedido. Passado algum tempo outro illustrado Paraense o Dr. Tocantins trouxe do mesmo Ceramio a urna menor (Figura 4.º) que eu, com sua permissão, levei, juntamente com a outra urna, à oficina photographica do Sr. J. Th. Sabino que as photographou juntas em uma só chapa; e pagos os exemplares ajustados, e seguindo as instrucções do Dr. Tocantins mandei entregar a uma que lhe pertencia ao Dr. Jonas Montenegro que logo a remettau para o Museu do Maceió. A outra urna ficou alguns mezes em casa do Sr. Sabino onde o Sr. Barbosa que acabava de regressar do Amazonas procurou vela, sem todavia o conseguir po y estar ella guardada no interior da casa, como communicou-me o dono do estabe - lecimento. Eu tinha, pouco tempo antes disto, dado a um cavalheiro, amigo do Sr. Bar. bosa e meu, um exemplar da photographia das urnas, e tive depois a satisfação de saber que este senhor apreciando-a, tirára della uma cópia para si. V. II— 11 q ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Mais tarde appareceram as duas urnas estampadas nas Antiguidades do Ama- zonas, não juntas como estavam na photographia, mas já separadas e com uma al- teracão na Figura 4.º Até aqui só havia motivos para louvar ao Sr. Barbosa pois que desta deli- gencia sua resultava-lho a vantagem de ser o primeiro a dar conhecimento da existencia dos dous importantes artefactos. Lendo, porém, a descripção que faz das urnas, live o pezar de ver que nesta parte não foi elle bastante exacto, certamente por ter-se guiado só pelo que mostrava a photographia. Foi para sanar estas incorrecções que cu dei uma descripção circumstanciada das duas urnas, servindo-me para isto das notas que tomei em devido tempo. Para maior clareza addiciono aqui ainda algumas observações. A urna maior (Figura 3.º) não é pintada de preto, —côr que diflicilmente ou rarissimas vezes se achará em artefactos dos antigos Indios; as unicas córes que esse vaso mostrava quando sahio do Pacoval (e não dos Camutys, como diz o autor, eram a vermelha ou rosca e a cinzenta ou pardo-claro. Esta urna tinha de altura 0”, 65 e não 0”, 80 como diz o Sr. Rodrigues assim como de diametro (na boca) 0”, 19 e não 0”, 45. A menor (Fig. 4.º) não pertencia ao sexo masculino, como aflirma o Sr. Bar- bosa, mas ao sexo feminino. Esta particularidad: não está muito clara na photo- eraphia e é só a isto que se póde attribuir semelhante equivoco. Na figura em que o autor das Antiguidades do Amazonas representa esta urna apparece uma novidade digna de nota. Tanto no original como na photographia a urna mostra uma grande fractura na boca; mas na figura pintada pelo autor, essa fractura desapparece totalmente de modo que a figura se apresenta inteira mesmo nos logares em que o original esta quebrado ! Assim o autor desvirtuou o seu desenho com o que os artistas chamam uma restauração, que na maior parte dos casos é, pelo menos, uma falta irreparavel. Descrevendo as duas urnas mostrei que cada uma exhibia duas faces em lados oppostos, caracter que as distingue de todas as outras que tenho conhecido. Si o Sr. Barbosa Rodrigues tivesse visto as urnas que descreveu e figurou, certamente não escaparia à sua perspicacia este caracter de primeira ordem e tão importante que falta gravissima seria omittil-o em qualquer descripção por mais laconica que esta fosse. Para não prolongar muito estas observações, transcrevo aqui, ipsis verbis, a deseriprão dada pelo Sr. Barbosa, griphando algumas expressões que reputo in- correctas e ajuntando-lhes ligeiras notas. A urna maior (Fig. 3.º) foi assim descripta por elle : « Figura 2º — Representa uma das igasauas do aterro sepulchral da Ilha dos « Comutys, no Rio Anajás, na Ilha de Marajós. No estylo afasta-se inteiramente « das que se encontram nos cemiterios antigos. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 7 « E de argila cinzenta muito bem trabalhada, delicadamente pintada de « vermelho e preto, sobre um fundo branco ornada com relevos que indicam não só « os olhos, boca e nariz, como os bracos, p:s, seios, umbigo e sexo. Pertencia « ao sexo feminino. Sua fórma e delicadeza da pintura, prova o alto grão de adian- « tamento que tinha a industria entre os Nheengahybas. » « Servia para a 035303, mede de altura 0,80, de diametro 0,45, e de « espessura 0,01. « Esta no di Paraense. » Esta urna não está e nunca esteve n3 Museu pa não é pintada de preto ; não é procedente dos Camutins, e sim do Pacoval, A urna menor (Fig. 4.º) foi descripta nestes termos : « Figura 1.º— E uma outra encontrada na mesma localidade ( Camutins), do « mesmo estylo porém com fórmas differentes, indicando tambem, os orgãos dos « Eos os p:s, o umbigo e o sexo. Periencia ao sexo masculino, e pelo seu tamanho creio que guardava 03 ossos de algum Curumy. « E toda ornada de caprichosos desenhos em espiraes, pintados de vermelho « sobre um fundo branco. A tinta vermelha empregada julgo ser caragiri ( Bignonia « checa) e a branca, a tabatinga desmanchada com leite de sorva. « Esta no Museu Paraense e mede a metade do tamanho da precedente. » Esta urna não está e munca esteve no Museu Paraense; não pertencia ao sexo masculino, mas, sim, a9 feminino; não é procedente dos Camutins, mas, sim, do ZA = Pacoval. E quanto às medidas d> ambas, veja-s2 0 que a este respeito se acha na des- cripção que dei dessas urnas. Lamento ter oscasião de fazer esta retificação ao escripto, aliás em muitos outros pontos estimavel, de um meu compatriota que, cheio de ardor e amador da Sciencia, se esforça para distinguir-se publicando os trabalhos de que foi encar- regado e o mais que estudou ou de que teve informação; mas desde que tenho plena convicção da insxacção com que descreveu as duas urnas em questão, à mim que as conhecia sulfficientemente, corria o dever de fazer a devida rectifi- cação para evitar que outros homens estudiosos não venham a cahir nos mesmos erros em que cahio o autor das Antiguidades do Amazonas. Em materias de Sciencia, mais do que na vida pratica, a pressa foi e ha de ser sempre inimiga da perfeição; e desta vez a pressa, aliás de todo o ponto in- fundada, arrancou ao Sr. B. Rodrigues uma particula do merito do seu escripto. Em um paiz, como o Brazil, ond: os principaes monumentos dos povos indi- cenas consistem simplesmente em artefactos d3 barro, mais ou menos habilmente trabalhados, é indispensavel para o interesse da Sciencia, para o proprio credito dos escriptores e até certo ponto, para os brios da nossa nacionalidade, que na des- cripção de cada um desses mudos testemunhos de uma civilisação exlincta, haja sempre, além de um estudo aturado e paciente, o maior criterio e a mais escrupo- 76 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL losa exacção, para que os Anthropologista, nacionaes e estrangeiros que não live- ram opportunidade de estudal-os nos proprios originaes, aceitem com inteira con- fiança os resultados dos nossos trabalhos, com a certeza de não serem illudidos em seus juizos e conclusões. E nisto, para ser coherente ha de sem duvida convir o Sr. Barbosa Rodrigues por isso mesmo que, por motivos que não conheco, repelle como humilhante para nós o concurso dos Sabios estrangeiros nas investigações da natureza no Brazil,—o estrangeirismo ! como elle qualifica esse concurso, aliás tão valioso, tão fecundo e tão util para nós ainda mais do que o é e tem sido para outros povos que, não obstante o alto grao de progresso a que tâm attingido nas Sciencias, attrahem, aco- lhem e rodêam de todas as garantias e vantagens os Sabios de todas as partes do mundo. ! Vid. Revista de Horticultura. Rio de Janeiro de 1876. n. 1. Pag. 5.º Linhas 39 a 41. ad CONTRIBUIÇÕES v PARA A heologia da Região do Baixo Amazonas PELO PROFESSOR ORVILLE A DERBY M 8. 1 Na memoria que ora dou ao lume da publicidade nos Archivos do Museu Nacional esforcei-me por apresentar em fórma resumida os resultados mais impor- tantes dos estudos executados sobre a interessante região amazonica, pelo sempre chorado professor Carlos Frederico Hartt e por seus ajudantes. Estes resultados são pela maior parte extrahidos e condensados de um extenso relatorio preparado pelo professor Hartl e pelos membros da Commissão Geologica do Imperio, da qual era elle chefe, relatorio cuja publicação tem sido demorada em virtude das con- dições financeiras do paiz, e pela infausta morte daquelle professor. Num resumo tal, nem sempre me foi possivel mencionar a auctoria de cada observação, convindo, por isso, dar aqui a historia das explorações e indicar a parte da região pela qual é responsavel cada um dos exploradores. Em 1870 o professor Hartt, acompanhado por uma turma de estudantes entre os quaes tive o prazer de achar-me, t A memoria que aqui se acha exarada é um conjuncto de observações intimamente ligadas às colleeções da Commissão Geologica de que foi chefe o illustrado finado Carlos F. Hartt e distincto collaborador o Sr. professor Derby. Estas collecções incorporadas actualmente à 3.2 Secção do Museu Nacional são os mais ricos thesouros até hoje arrancados à contextura geologica do Imperio do Brazil ; ellas representam, porém, uma obra não completa em relação ao vasto horizonte que tinha em vista a Commissão Geologica, e para serem comprehendidas careciam que o mesmo Sr. Derby viesse illumi- pacas com uma particula siquer do trabalho que a mão da morte havia interrompido ainda em esboço. O Sr. Derby veiu pôr a nosssa disposição o seu concurso e a directoria do Museu aceitando-lh'o com alacridade viu nelle o continuador de Carlos Hartt, ainda ha pouco, auxiliar conspicuo do Museu Nacional, na qualidade de professor que aqui foi dessa mesma materia. Corre-nos 0 dever de declarar, em relação à data da redacção deste trabalho, bem como do que se lhe segue, que sendo-nos elles apresentados em Junho do corrente anno (1878) e não havendo sido até então impresso o resto do volume de 1877 por circumstancia: alheias à nossa vontade, deliberamos inseril-os neste volume, mas, desde logo, resolvidos a fazer a presente declaração, 4 Nora DA REDACÇÃO - 75 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL e mais tarde, em 1871, por mim somente, fez a expensas suas, uma exploração do Tocantins atS a cachoeira da Guariba e do Tapajós até a cachoeira do Apuim, bem como das regiões de Santarém, do Ereré, e da serra de Parauáquára. As noticias dos resultados geologicos destas explorações foram por elle dadas à publicidade no American Journal of Science vol. I, 1871, e vol. IV, 1872; no Journal of the Amerean Geographical Society of New York, vol. II, 1872; no Bulletin of the Buffalo Society of Natural Science, Jan. 1874 e no Bulletin ofº the Cornell University, vol. |, LISTA. Estas explorações deram tanta luz sobre a estructura geologica do Brazil que o professor Hartt, quando assumiu a direcção da Commissão (Geologica do Imperio, resolveu continual-as, e por não poder ir pessoalmente, contractou com o Sr. Herbert H. Smith, um de seus companheiros d? [870 e habil geologo, que então se achava no Amazo- nas, à continuação dessas explorações, enviando-me depois, com o Dr. Francisco José de Vreitas, no intuito de estudarmos à mesma região. Em companhia destes dous senhores fiz um novo e minucioso exame da região montanhosa do Ereré e subi o rio Máecurú, im- propriamente chamado, Gurupatuba, nas cartas, até a cachoeira denominada Pancada Grande ; mais tarde, com o Dr. Freitas, subi o rio Trombetas até a foz do rio Cachorro, indo só à ilha de Marajó que tinha visitado em ASTI. O Sr. Smith, que havia dado começo a um exame da região occidental do Máecurú,na vizinhança da villa de Alenquer, proseguiu neste trabalho, em seguida à viagem no Máecurú, e subiu o rio Curuá de Alenquer at? a cachoeira Bemfica, visitando depois o baixo Tapajós. Os fosseis devonianos colhidos nestas explorações, quér pela Commissão (Geologica, quér pelos naturalistas supra-mencionados, foram estudados pelo Sr. Richard Rathbun, ajudante da Commissão, encarregando-me eu dos fosseis carboniferos e silurianos. O presente trabalho, no tocante à fórma, é todo meu, no que diz respeito, porém, às conclusões que ahi se acham, confesso que sómente em parte me pertence. Estas, tendo sido em grande parte anticipadas pelo meu illustre e estimado mestre, o professor Hartt, nas publicações já citadas ou em sua obra intitulada The Geology and Physical Geography of Brazil, ou desenvolvidas nas discussões que juntos mantivemos, resentem-se de suas idéas, e suas idéas acham-se tão ligadas com as minhas, neste particular, que não sei na verdade o que exclusivamente me pertence de todas us inducções a que aqui cheguei. Muito fica por fazer no estudo da Geologia do Amazonas, porque muitos problemas relativos à geologia da America do Sul existem ainda que podem ser resolvidos muito mais satisfactoriamente naquella bacia do que em qualquer outra parte. Os primeiros trabalhos efectuados em uma região tão vasta e de tão difficil exame não podem deixar de ser muito defeituosos, e pois-espero que as imperfeições desta tentativa que aqui apresento, no intuito de resolver alguns dos grandes problemas da Geologia do Amazonas, serão julgadas com indulgencia. EX Como acontecs com muitos outros rios, observa-se relativamente ao Amazonas que o rio assim chamado pelos geographos, tem entre os habitantes da região por elle percorrida, diversas designações applicadas às differentes partes de seu curso. Maranon, Solimões e Amazonas são os nomes que se ouvem nas margens do grande caudal, e como estas distincções populares correspondem muito approximadamente às tres sec- cões do valle, bem distinctas por caracteres physicos, e que têm uma historia geologica mui diversa, cada uma em comparação às duas outras, podem ser aquellos distincções conservadas com vantagem na Sciencia. As differenças que se observam nestas secções são devidas às relações do valte do Amazonas com as partes componentes do continente da America do Sul, de modo tal que para comprehender a estructura daquelle valle é preciso ter em mente as feições geraes, desde muito tempo reconhecidas, do nosso continente. Este é constituido por tres distinctas regiões montanhosas, mais ou menos ligadas por planicies elevadas, em que se acham cavadas as depressões occupadas pelos grandes systemas fluviaes do Orénoco, do Amazonas e do Prata. Os Andes formam uma longa, estreita e altissima faxa ao longo da costa occidental; as montanhas do Brazil e da Guyanna, menos altas que os Andes, occupam uma extensa área nas paragens oriental e septentrional do continente. O espaço entre estas tres Te- giões ou nucleos do continente é occupado por vastas planícies de menos de mi metros de elevação, com excepção de uma estreita zona entre as do Brazil e da Guyanna, onde a continuidade é inteiramente interrompida pelo valle inferior do Ame- zonas. Nota-se tambem que entre as duas regiões montanhosas da parte oriental do continente e os Andes, a continuidade da planicie acha-se quasi destruida peles grandes cortes feitos pelos rios Paraguay e Madeira ao sul, e pelos rios Negro Orénoco ao norte; sendo certo que uma depressão continental relativamente pequera é quanto basta para separar totalmente estas regiões. Já pela existencia daquelie phenomeno geographico denominado rio Cassiquiari, a Guyanna póde ser considerada uma ilha. Diferente do Orénoco e do Prata, o Amazonas tem relações com todas as tres altas regiões acima indicadas. A parte superior ou Maranon pertence aos Andes, a parte média ou Solimões está na região intermediaria entre os Andes e as paragens so ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL elevadas do Brazile da Guyanna, e o Baixo Amazonas, da foz do rio Negro até o mar, está entre essas mesmas paragens. Sob o aspecto puramente geographico, o Baixo Amazonas e o Solimões podem ser reunidos em uma só secção, porque a differença que hoje ha entre ambos é muito menor que a differença entre o Maranon e o resto do grande rio. Porém considerando tambem a estructura geologica e especialmente as condi- cões que a geologia nos ensina haverem existido em épocas anteriores à actual, vê-se, como espero provar, que esta divisão do valle, em tres secções existe real- mente na natureza. Examinando a hydrographia da bacia na sua totalidade, as differenças nas tres secções tornam-se mais notaveis do que no valle particular do rio. O Maranon e os seus grandes tributarios do sul na região andina: o Huallaga e o Ucayale, descem de grandes alturas nas Cordilheiras e correm para o norte, na direcção geral destas, até o ponto em que se libertam do dominio das monta- nhas, dirigindo-se então o Maranon immediatamente para leste, ao contrario do Ucayale que, posto que já na baixada, conserva a primitiva direcção, como si tivesse de marginar a região montanhosa. Os tributarios do lado do Norte até o Napo que desagua quasi defronte do Ucayale, descem dos Andes do Equador, na direcção sudoeste, dirigidos pelo declive das montanhas. A área de que estes rios são os escoadores é muito comprida na direcção Norte-Sul, mas estreita-se na direcção E. O. Na região do Solimões, pelo contrario, a área esgotada ao norte tem a fórma de um rectangulo cujo maior eixo acompanha o rio, sendo para notar que os seus tributarios, entre os quaes se acha o rio Negro, correm em valles pouco ele- vados, para E. quasi parallelos ao Solimões, como si fossem repellidos ao sul e dirigidos por uma linha de terrenos altos, estendendo-se de E para O entre as montanhas da (Guyanna e os Andes. A área do sul, comprehendida entre o Ucayale, o Madeira e o prolonga- mento oriental dos Andes da Bolivia, é de fórma triangular. Os numerosos tribu- tarios, que percorrem esta área, nascem no planalto a E. dos Andes, em altitudes moderadas (as cabeceiras do Purús têm, conforme Chandless, a elevação de 1088 pés inglezes ou 331 metros acima do nivel do mar), e são notaveis, como o seu celebre explorador Chandless já o fez vêr, por correrem, em seus cursos superiores, na direcção geral de O E como se fossem dirigidos por um declive imperceptivel partindo dos Andes. Na região do Baixo-Amazonas as montanhas da Guyanna são relativamente vouco afastadas do rio, e em virtude disso, os tributarios do norte são pequenos e correm com uma ligeira deflexão para leste, em direcção ao mesmo rio. Do lado do sul, pelo contrario, o vasto planalto do Brazil central estende-se desde perto do Amazonas até as cabeceiras do Paraguay e as montanhas de Goyaz. Os grandes tributarios: Tapajós, Xingu e Tocantins atravessam esta alti- planura, na direcção geral de Norte, e descem para o nivel do Amazonas n'um ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 81 declive rapido que começa pouco acima de suas respectivas boccas. Tenho de proposito deixado de mencionar o Madeira, porque este rio relaciona-se com todas as tres secções da bacia geral. Um de seus tributarios, o (Guaporé, nasce na parte culminante da planície central do Brazil e parece marginal-a até unir-se com o Mamoré que, como o Beni e o Madre de Deus, desce dos altos Andes da Bolivia, rodeando, porém, a grande saliencia de Santa Cruz de la Sierra. O baixo Madeira, que fórma a divisão entre a região do Solimões e do Baixo- Amazonas, corre a N E n'uma direcção quasi parallela à dos grandes accidentes do solo do Brazil oriental, isto é, ás cadeias de montanhas da costa e de Minas-(reraes, e aos valles do alto S. Francisco e do alto Paraná. Mais adiante terei de fallar da significação deste facto. Passemos agora a considerar mais detidamente os caracteres physicos e geologicos da região do Baixo-Amazonas as quaes constituem o assumpto principal desta memoria. Ao viajante que se acha no Amazonas, o que mais impressiona, depois da enorme extensão, largura e volume do grande rio, do labyrintho ds suas ramificações lateraes, o da riqueza de sua flora, é a grande extensão da varzea ou terreno baixo, sujeito às innundações annuaes, a qual, monotona como o mar, acompanha o rio n'uma zona larga de ambos os lados, desde a foz até o sopé dos Andes. Sendo esta varzea geralmente bem arborisada, as florestas dão-lhe uma apparencia de terra firme, de tal modo enganadora que quem não sahir do leito do rio não poderá ter idéa exacta nem da sua largura nem da sua importancia. Para isto é necessario subir à alguma das poucas eminencias existentes nas margens do Amazonas, como as de Monte Alegre, Santarém e Obydos. Destas elevações, com effeito, avista-se uma grande planicie paludosa, quasi ao nivel do rio, semeada de lagos e ilhas de arvoredo, e cortada por innumeros e interlaçados canaes lateraes, furos ou parandmerins ; planicie que se estende por muitas milhas até a terra firme do lado opposto, vizivel em longinquo horizonte. Nesta immensa planura o rio, grande como é, parece uma estreita fita de agua, quasi perdida na immensidade de seu antigo leito, porque à varzea não póde ser considerada sinão como uma parte obstruida do leito original ou, melhor, do estuario que elle substitue actualmente. Nesta grande baixada o rio curva-se de um para o outro lado, ora approximando-se desta, ora daquella margem, porém chegando raras vezes a tocar a terra firme, como todavia acontece em certos pontos, na vizi- nhança de Santarém e Obydos. Da foz do Xingú para baixo, a varzea que fórma, com raras interrupções, não sómente as margens do rio, como tambem as suas innumeras ilhas, facto este de que é excepção unica a do Marajó, em sua parte oriental, é coberta de densa mata em que abundam as seringueiras. Do mesmo ponto para cima, até Manãos, a varzea é na sua maior parte des- pida de arvoredo, mas coberta de relva e de plantas paludaes. Em certas paragens, como defronte de Santarém e de Obydos, a sua altura, nas margens dos canaes, é tal que lhe permitte conservar-se sempre fóra do alcance das innundações ordinarias 82 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Nestes logares ha algumas fazendas de cacau e de criação, sendo que mais geral- mente é um deserto, apenas povoado, pelo tempo do fabrico da seringa, nas regiões das matas, e, pela estação secca, nas regiões dos campos, quando os rebanhos descem da terra firme para aproveitarem a pastagem. Além de marginar o Amazonas, a varzea estende innumeros braços em cada quebrada produzida nas margens da terra firme pelos valles dos confluentes, de modo tal que tornam muitas vezes dificil a determinação dos pontos onde os proprios valles destes tri- butarios acabam e onde começa o do Amazonas. A terra firme é muito variavel em caracter e elevação, consistindo em planicies, ora mais baixas, ora mais altas, e em terrenos accidentados ou montanhosos. As primeiras, que têm apenas alguns metros de elevação sobre a varzea, são pouco desenvolvidas na região do Baixo Amazonas acima da foz do Xingu, mas, dahi para baixo, têm consideravel importancia, formando as campinas de Marajó « uma zona de matas de cada lado do rio, a qual, na vizinhança da cidade do Pará, estemde-se consideravelmente para o sul. As planícies elevadas dilatam-se para aquelle mesmo lado, por trás dos terrenos baixos do Pará, approximando-se mais e mais do rio em sua extensão para Oeste até apparecerem na margem um pouco abaixo de Santarém, nas barreiras de Cuçury assim como depois, na serra dos Parintintins, perto de Villa Bella. Ellas formam ao norte uma linha de taboleiros elevados, um pouco afastados do rio, os quaes, com os nomes de serras Almeirim, Parú, Velha Pobre e Parauaquára começam quasi defronte da bocca do Xingu e estendem-se para Oeste, por trás de Monte Alegre até o rio Trombetas, ou mesmo além, apparecendo tambem nas alturas de Monte Alegre e Obydos. Não havendo sofírido grande desnudação, estas planícies apresentam-se em taboleiros, mais altos ao norte do rio, onde aquelles de que acabo de fazer menção têm a altura de 300 metros pouco mais ou menos, emquanto que os de Santarém e outros do lado do sul apenas têm a metade desta elevação. Em muitas regiões, a desnudação tem reduzido estas planícies a terrenos mais baixos, ligeira- mente accidentados e ondulados, como os da Prainha, Monte Alegre, Obydos e Santarém, no meio dos quaes, apparece, de vez em quando, um pico de fórma conica ou de mesa, para altestar a altura e fórma da planicie original e a importancia da desnudação. Os taboleiros e suas encostas são geralmente cobertos de matas mais ou menos densas, ao passo que as partes mais baixas e ondu- ladas, são campos agrestes, com um solo de areia solta. Para o interior estas planices parecem elevar-se mais e mais até ficarem unidas com as planicies mais elevadas da Guyanna e do Brazil. A ultima divisão da terra firme, a de terreno accidentado ou montanhoso, é representada, na margem septentrional do Amazonas, por um grupo isolado de montanhas na vizinhança de Monte Alegre e Ereré. Estas levantam-se abrupta- mente no meio de uma planicic, á uma altura de 300 metros, e são em geral ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 83 rochosas, aronosas e estereis. Associada a ellas e tendo a mesma estructura geolo- gica, ha um campo baixo e pedregoso. Percorrendo rio acima os tributarios do Amazonas, tanto do lado do sul como do norte, encontram-se, nas secções enca- choeiradas, a uma distancia de 50 a 200 milhas do rio, regiões accidentadas cujos pontos elevados são, em geral, menos altos do que as serras de Ereré. Estas regiões accidentadas são em geral bem arborisadas, possuindo muitas madeiras de lei entro as quaes nota-se o castanheiro e a sapucaia. A estas regiões succedem, ao sul, as planícies do Brazil central e ao norte as montanhas altas da Guyanna. As differenças notadas nas diversas regiões da terra firme dependem da estructura seologica do valle, e antes de descrever minuciosamente as differentes formações alli encontradas, convem apresentar um esboço geral da geologia desta parte do mesmo valle, e indicar as relações das regiões acima descriptas, antecipando assim as conclu- sões que se deduzem das observações efectuadas para depois apresental-as de um modo mais claro e conciso. O professor Hartt descreveu magistralmente esta estructura no seguinte trecho : ! « O valle do Amazonas, ao principio, appareceu como um largo canal entre duas ilhas ou grupos de ilhas, das quaes uma constituiu a base e o nucleo do planalto brazi- leiro, e a outra ao norte, do planalto da Guyanna. Estas ilhas appareceram no prin- cipio da edade siluriana ou um pouco depois delle. Naquella época os Andes não existiam ainda. » Neste canal foi depositada uma serie de camadas representando os terrenos silu- riano superior, devoniano, carbonifero e cretaceo, as quaes appareceram successi- vamente de um e outro lado, em terra firme, estreitando assim a passagem entre as duas ilhas. O levantamento dos Andes é posterior á deposição destas camadas. « Antes da apparição dos Andes, continúa o professor Hartt, o valle do Amazonas consistia simplesmente em dous golphos unidos por um estreito canal. Os Andes irromperam na entrada do golpho de Oeste, convertendo-o em uma verdadeira bacia, posto que com sahidas tanto ao norte como ao sul. Todo o continente foi depois deprimido, de modo tal que as aguas cobriram amplamente os planaltos da Guyanna e do Brazil, e as camadas terciarias foram ahi depositadas, variando em expessura e constructura, conforme as condições em que foram formadas. « E ds suppôr que estas camadas se tivessem adaptado, em nivel, com o fundo sobre que tenham sido depositadas, conservando-se mais altas nas mais baixas margens da bacia e immergindo das margens para o centro. « Quando o continente surgiu outra vez sobre as aguas, primeiramente levanta- ram-se os planaltos nivelados por sua nova acquisição de depositos; porém, logo depois, os actuaes divisores das aguas, ligando os grandes planaltos com os ! Journal of the American Geographical Society of New York. Vol., III, pag. 231. 84 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Andes vieram acima da agua e o valle do Amazonas tornou-se um mediterraneo, communicando a leste com o Atlantico por um apertado canal. As camadas terciarias da provincia do Pará, sendo pouco coherentes, foram rapidamente desnudadas pela acção do mar, durante o levantamento do continente. Provavelmente emquanto a Guyanna existiu como uma ilha, o Amazonas sentiu a acção da corrente equatorial que muito devia ter influido no transporte dos detrictos da desnudação. No fim, as camadas terciarias foram varridas sobre uma immensa extensão de territorio, conser- vando-se a serra de Parú e as montanhas semelhantes ao Norte como monumentos de sua existencia. Em Monte Alegre, em Santarém e perto de Altar do chão (no Tapajós) os monticulos largos, arenosos e arredondados parezem representar hoje nada menos que restos das collinas terciarias que foram derrocadas e em parte reestratificadas, até que appareceram como enormes bancos de arêa. Emquanto o manto terciario se desnudava, as correntes das terras altas foram rasgando por si mesmas numerosos valles através das camadas, e estes formando estuarios, dilataram-se em maior extensão do que teria sido possivel fazel-o às proprias correntes. Durante esta época de desnudação, foram deixados varios depositos não só no fundo do mar nterior porém tambem no golpho em que abria-se a leste. « Continuando a sublevação, o mar interior, agora pouco fundo em virtude da deposição de muito sedimento, e ao mesmo tempo salobro pelo tributo de milha- res de correntes, estreitou-se rapidamente, quanto a sua área, e o rio Amazonas que antes desaguava cm um lago, ao pé dos Andes, começou a estender o seu curso, seguindo as aguas que se retiravam. Por fim, o canal que communicava com a bacia interior foi se estreitado entre a linha de montes que se estende de Obydos a Almeirim, e os altos do lado de Santarém, em uma distancia de não menos de trinta ou quarenta milhas. Este ponto foi o que mais se estreitou. Devo acres- centar que o curso do rio acha-se apertado presentemente em Obydos pela exten- são das planícies alluviaes no lado do sul. » Esta exposição explica claramente a formação da varzea, das planicies baixas do Pará, e das planícies altas do interior da provincia. Resta dizer que os terrenos accidentados são devidos ao apparecimento, em virtude da desnudação das camadas terciarias, das camadas inclinadas das formações mais antigas do que a terciaria, incluindo a cretacea, a palxozoica e a archcana. As rochas das antigas ilhas, primeiras terras emergidas no oceano, que oecu- pava a área em que o continente se formava, têm sido profundamente meta- morphoscadas, sendo convertidas em granito, gneiss, quartzito e schisto metamorphico, e por isto podemos facilmente determinar approximadamente a extensão daquelas ilhas, estudando a distribuição das rochas metamorphicas. As do norte appare- cem nas altas montanhas que formam o limite politico entre a Guyanna e o Brazil, e, abaixando-se para o sul, estendem-se até uma linha que partindo de um ponto perto do Atlantico e da foz do Amazonas quasi em latitude 1º N corre para o oeste, declinando um pouco para o sul até encontrar o rio Negro na ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 83 confluencia do rio Branco entre as latitudes 1.º e 2.º S. Nesta linha que representa a antiga costa, as rochas metamorphicas em geral só apparecem à superficie nos valles dos rios, em virtude da desnudação das camadas sobrepostas. A Oeste da bocca do rio Branco as rochas metamorphicas parecem estender-se até ou além do alto rio Negro. No lado do Brazil, as rochas metamorphicas só formam montanhas altas nas regiões muito longinquas do Amazonas, porém são encontradas em baixo das outras formações na maior parte, sinão em todo o territorio elevado do Brazil. Na região do Amazonas ellas formam as cachoeiras dos rios Tocantins, Xingu, Tapajós e Madeira, a linha de emersão, passando o Tocantins entreo 3º eo 4, de latitude austral, o Tapajós entre 4º e 5º e o Madeira nas cachoeiras de S. Antonio entre 8º e 9º. O baixo Madeira parece marcar approximadamente o limite occidental dos terrenos metamorphicos porque no Purús, o rio mais proximo a Oeste, Chandless na sua accurada exploração não encontrou as rochas de que estamos tratando. Já tem sido notado o parallelismo do curso do baixo Madeira com os grandes accidentes da superficie do Brazil oriental onde as rochas metamorphicas são elevadas em dobras correndo na direcção do Nordeste. Parece possivel que o curso do Madeira seja dirigido por uma destas do- bras ou, o que é mais provavel, pela margem da região metamorphica, que alli devia ter aquella direcção. E” possivel que o Guaporé tambem marque uma outra margem desta mesma região que, sendo transversa à orientação das dobras, não segue a mesma direcção que ellas. O que é certo é que na região do Guaporé, havia um canal entre a re- gião metamorphica do Brazil e uma semelhante na Bolivia, comparavel ao es- treito entre as ilhas do Brazil e da Guyanna, hoje occupado pelo Amazonas. Como no Brazil oriental e central, as rochas metamorphicas na região ama- zonica dividem-se naturalmente em duas series bem distinctas, uma das quaes a mais antiga, consiste em rochas crystallinas incluindo gneiss, gneis-granito e sye- nito, e a outra, mais moderna, de rochas alteradas, porém em geral não erystal- linas, consistindo em quartzito, schisto metamorphico e calcareo crystallino. A serie mais antiga corresponde em caracter e edade geologica à da serra do Mar e da serra da Mantiqueira, nas provincias do Rio de Janeiro e Minas Geraes, que o Professor Hartt referiu à edade archeana, comparando-a com a serie laurentiana da America do Norte. Esta serie tem sido pouco estudada na região amazonica. Castelnau falla do gneiss cinzento no Tocantins, um pouco acima das primeiras cachoeiras, e Chandless encontrou gneiss em uma posição semelhante no Tapajós; o Sr. Ferreira Penna informou-me que as cachoeiras do Xingu são formadas de gneiss e diorito, e obsequiosamente mostrou-me amostras do primeiro que consistem em feldspatho côr de carne e quartzo com uma pequena proporção de mica preta, a rocha em pequenas amostras apresentando uma estructura massiça e granitoide ; não tenho visto amostras ou descripção do gneiss das cachoeiras do Madeira. E ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL No lado do norte o gneiss foi encontrado pelo mesmo Sr. Ferreira Penna, an situ nas cachoeiras do Araguary, pequeno rio que desagua no Atlantico, um pouco ao norte, da foz do Amazonas, e seixos da mesma rocha foram encontrados nas explorações da Commissão Geologica, nos rios Máecurú, Curuá e Trombetas. O engenheiro Coutinho informa-me que, no rio Branco, o gneiss é a rocha predominante salvo na foz do mesmo rio onde encontrou syenito rôxo. Este ultimo achei eu tambem em uma zona de cerca de meia milha de largura, na segunda cachoeira do Trombetas e vi seixos do mesmo no Máecurá vindo de cima do ponto a que cheguei. Não pude determinar, no curto tempo de que dispunha, si a massa é estratificada ou não, sendo possivel que seja de origem eruptiva. A rocha consiste principalmente em feldspatho bem crystallisado, côr de carne, com uma pequena mistura de hornblenda e pequenas manchas esparsas de um mineral verde decomposto cujo caracter não pude determinar; o quartzo falta inteiramente. As rochas da segunda serie são bem expostas no Tocantins formando as primeiras cachoeiras, onde foram examinadas até a cachoeira de Guariba pelo professor Harit, em 1870. As seguintes notas são tomadas de seus manuscriptos. Subindo o Tocantins o rio é, no principio, marginado por barreiras de arêas e argillas terciarias que, à medida que se approximam das cachoeiras, afastam-se do rioe comecam a apparecer as rochas metamorphicas. A primeira d'entre estas exposta é « um quartzito granular muito duro e com fractura saccharina, sendo a rocha muito atravessada por vieiros de quartzo. A estratificação é muito escura » a rocha parece ter uma especie de estructura schistosa. Em certos logares * muito compacta e azulada, semelhante ao potrosilex sendo tão recortada de pequenos vieiros que, na sua decomposição, lhe dão uma superficie alveolor. Depois apparese na Ponta do Noberto uma rocha talcosa muito decomposta, porém tendo apparentemente uma inclinação a Este; acima desta ha uma camada de quartzito compacto avermelhado. Da Praia dos Mortos estende-se uma linha extonsa de rochas semelhantes com inclinação a E. Em Jequirapuí achei a seguinte secção, dada em ordem ascendente. « 4 Gres schistoso. « 2 Gres branco, compacto, de grão um pouco fino, tendo a granulação dis- tincta. Exposto ao tempo torna-se pardo e é atravessado por vieiros de quartzo. « 3 Uma camada delgada d3 schisto de côr purpurea e estratificação obscura por causa de falhas e deslocamentos obliquos. « 4 Camadi possante de schisto ferruginoso muito decomposto. « > Camada de quartzito muito compacto, matizado de azul, branco e vermelho. « 6 Schisto vermelho muito atravessado por pequenos vieiros. « Pouco acima de Alcobaça observei um quarizito com inclinação a nordeste. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 87 « Em Alcobaça ha camadas possantes de quartzito azulado, muito duro e apre- sentando superficies polidas pelo rio. ». Quartzitos compactos, pardos e azulados foram observados em varios pontos acima de Alcobaça, sendo bem distincta a inclinação ao nordeste, em um an- gulo de cerea de 40º. « Abaixo da cachoeira Tapanhunaquára, ha rochas schistosas, esverdeadas, inclinando-se a leste, junto com muito diorito. Nos schistos achei amiantho e serpentina. As rochas que estreitam orio e formam a cachoeira são, quanto pude determinar, uma serie de quartzitos pardos interstratificados com camadas finas de schisto bem laminado. A extremidade da alta ilha das Pacas é com- posta de uma massa de quartzito duro, azulado e avermelhado, de apparencia vitrea, atravessado por numerosos vieiros pequenos de quartzo. Ao lado esquerdo ha recifes de rocha schistosa fortemente inclinados a E. As ilhas de Janaúquára são massas nuas de uma rocha dura, silicosa (cherty) cuja relação com as outras rochas não determinei. « Na Porta de Braga, elevada projecção na margem esquerda do rio, a praia está coberta de massas grandes de minerio de ferro, em parte hematite mammilar. As rochas da vizinhança consistindo em quarlzito e gres tem uma forte inclinação ao E. Segundo me lembro, o deposito parece ser superficial e duvido que haja valor economico. « Opposta à Praia Grande ha uma linha comprida e estreita de rochas es- tendendo-se ao sul, alguns grãos para leste ce marginada de rochas schistosas que alli apresentam a inclinação ordinaria para leste. A linha de rochas é formada por uma emersão estreita de diorito que supponho formar um dique. Perto desta localidade as rochas schistosas reapparecem com as rochas. sili- cosas (cherty) sobrepostas, apparentemente com estratificação diversa. Estas ul- timas podem portanto ser de origem muito mais moderna. Em um logar, creio ter observado signaes de estratificação horizontal. Perto da extremidade de um enorme banco de areia, chamado Praia Grande, as rochas schistosas apparecem outra vez, sendo a orientação N 30º Oe a inclinação 27º E. « A cachoeira de Guariba é formada pela emersão de uma serie de rochas metamorphicas, alternação de schistos, quartzitos e calcareos que se estendem atravez do rio formando uma especie de repreza. A orientação é ahi um pouco irregular, porém geralmente tende para N, alguns gráos para O, sendo a incli- nação a E em angulo moderado. » « Não pude subir além da cachoeira de Guariba tanto por falta de tempo como por não ter uma embarcação propria. Pelo que pude julgar, as camadas metamorphicas deviam estender-se muito rio acima, e seria importante tel-as exa- minado. Si toda a serie, que vi, pertence ou não ao mesmo horizonte geolo- gico, não pude determinal-o pela falta de fosseis, porém depois de meus estudos ss ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL dos terrenos carboniferos e devonianos do Amazonas, creiu que pouca duvida haverá de que a serie seja siluriana. « E” interessante observar a inclinação destas rochas que é quasi constan- temente a E, sendo a orientação notavelmente para oN. O facto da apparição de diques de trapp é tambem importante. Não vi porphyros semelhantes aos das cachoeiras do Tapajós e sou levado a crêr que as camadas do Tocantins, acima descriptas, são mais modernas do que as do Tapajós. » As rochas metamorphicas das primeiras cachoeiras do Tapajós foram des- criptas pelo professor Hartt no « Bulletin of the Cornell University. » Consistem ellas em quartzitos e outras rochas semelhantes, porém sem granulação apparente e com as camadas atravessadas por diques enormes de porphyro e diorito. Todas são muito compactas de côr roxa ou de chocolate frequentamente manchadas de pe- quenos pontos verdes, provenientes de algum mineral indeterminavel em dezomposição. im amostras as rochas amorphas parecem ser de origem ignea, em virtude de raros crystaes de feldspatho, que dão-lhe uma apparencia de porphyro, porém vista em massa as superfícies lavradas pelas aguas mostram distinctamente linhas de lami- nação, e até linhas da estructura produzida em sedimentos moveis pela acção de ondas e correntes, provando assim conclusivamente a origem sedimentaria da rocha. As camadas são inclinadas de 15º — 20º ao S E, com orientação de N 30º —40º E. O porphyro dos diques, que é evidentemente eruptivo, consiste em uma massa compacta amorpha, feldspathica, de côr escura de chocolate onde se acham espalhados crystaes de feldspatho roxo, pequenos grãos arredondados de quartzo e do mineral verde. Nota-se tambem nas cachoeiras duas emersões de rochas crystallinas que parecem formar diques; porém este caracter não foi bem determinado; uma dellas é de grão fino e côr escura, a outra consiste em feldspatho roxo-claro com grãos de quartzo. Achamos no rio Trombetas uma serie muito semelhante a uma parte da do Tapajós. E exposta na terceira cachoeira denominada Quebra-potes e no curso inferior do rio Cachorro, que entra no Trombetas logo acima daquella ca- choeira. A rocha varia em côr, tem camadas coradas de roxo-escuro, outras de purpureo, e, como a do Tapajós, é marcada de pontos verdes. A massa é amorpha, feldspathica, e as vezes com pequenos grãos de quartzo podendo-se ckassifical-a como felsito ou eurito. A estratificação é muito distincta, a lami- nação e a estructura, produzidas pelo embate de ondas e correntes, mostram-se tão claramente como em qualquer gces moderno, ou não metamorphoseado. As camadas de felsito repousam sobre o syenito já descripto (tambem marcado pelo mineral verde), e inclinam-se 20º a NE com a orientação N 30º O. Sobrepostas a esta serie, acham-se com estratificação diversa camadas de gres contendo fosseis da edade siluriana superior. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 89 Esta ultima observação é da maior importancia porque prova que o meta- morphismo das rochas e a deslocação das camadas deviam referir-se a uma época anterior à siluriana superior, isto é, à siluriana inferior ou à archeana. istou persuadido de que esta conclusão não se limita à região do rio Trombetas onde o facto foi observado, mas póde, sem receio de engano, ser estendida muito mais Jonge. A semelhança em caracteres lithologicos entre as rochas do Trombetas e as do Tapajós é tal, que não se póde duvidar de que a, formação seja a mesma nas duas localidades, podendo-se admittir em um só systema de deslocação a differença que se nota na orientação das camadas de N N O, no Trombetasa N N E, no Tapajós. A este mesmo systema podem-se referir as deslocações do Tocantins, onde as camadas orientam-se na direcção de N ou N N O. Cumpre, porém notar, que, emquanto os quartzitos compactos do Tocantins assemelham-se às rochas do Tapajós e do Trombetas, o resto da serie, consistindo em quartzitos granulares, schistos talcosos e calcareo, faz lembrar as rochas do rio Araguay, do alto Tocantins e das montanhas de Goyaz e Minas Geraes. E facto desde muito tempo reconhecido que as rochas metamorphicas do Brazil da Guyanna e da Venezuela são em geral orientadas na direcção de NE ou E N E, variando porém em um quadrante até N O. Parece provavel portanto que o systema de deslocação que se observa no Amazonas é egualmente o do Brazil oriental c da Guyanna, e portanto podemos attribuir a elevação das montanhas destas ultimas regiões a uma época anterior ao deposito no Trombetas, das camadas da siluriana superior. A pouca evidencia que a este respeito se póde colher nas outras regiões do Brazil, não desmente esta generalisação, porém, devo confessar que não é ainda bas- tante completa para inteiramente confirmal-a. Nas Provincias da Bahia e Sergipe ha uma serie de camadas cuja edade não é ainda determinada mas que é mais antiga do que a edade cretacea e mais moderna do que o gneiss sobre que ella jaz com estrati- ficação discordante e que por consequencia é provavelmente palozoica. Esta serie sem ser metamorphoseada acha-se deslocada em um systema differente do das rochas crystallinas, provando queo metamorphismo e deslocação destas era anterior ao deposito da serie que me parece ser da edade devoniana ou carbonifera. Nas provincias do sul temos prova mais concludente. Em Santa Catharina e no Rio Grande do Sul ha, em posição horizontal, acima das camadas metamorphicas inclinadas, outras camadas cuja edade carbonifera parece bem provada. Estas camadas carboniferas parecem estender-se atravez da provincia do Paraná até ao sul da provincia de S. Paulo. Perto da Ponta Grossa, no Paraná, foram encontradas pelo Sr. Wagoner, ajudante da Commissão Geologica, fosseis devonianos em camadas in- feriores às que contém carvão de pedra, mostrando-se como estas, em estratificação horizontal. Naquella região, portanto, a deslocação e o metamorphismo precederam a edade devoniana e provavelmente, como no Amazonas, a edade siluriana superior. V. II— 90 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Temos visto que entre as rochas metamorphicas destacam-se duas series distinctas das quaes : uma crystallina, foi com toda a probabilidade referida à primeira divisão da edade archeana, isto é, à laurenciana. E" provavel que esta serie houvesse sido metamorphoseada e deslocada antes do deposito da segunda serie não-crystallina. E” ver- dade que as duas series parecem concordar em estratificação, é, porém, pouco provavel que a concordancia seja perfeita e que a serie mais antiga não tenha sofrido movi- mentos (talvez na mesma direcção), antes do movimento gigantesco que caracterisou toda a região melamorphica. A respeito da edade da segunda serie metamorphica, a dos quartzitos, felsitos e schistos, temol-a, pela eliminação das edades anteriores e posteriores, limitado às duas intermediarias entre a siluriana superior e a laurenciana, isto é, a siluriana inferior e a archeana superior ou huroniana dos geologos canadenses. E” provavel que ambas sejam representadas, e aceitando a supposição do professor Harlt de que as rochas do Tapajós são mais antigas que as do Tocantins, podemos provisoriamente referir aquelas (com os felsitos do Trombetas), à cdade huroniana e estas à siluriana inferior, referencia esta que se harmonisa alias com uma outra opinião do illustre professor, isto é, que os quartzitos granulares (itacolumitos) e schistos talcosos de Minas Geraes pertencem à edade siluriana inferior. Terminados estes movimentos de sublevação e deslocação, durante a mesma edade siluriana inferior ou pelo fim della, as duas ilhas do Brazil e da Guyanna ficaram com addições enormes às suas rispectivas superficies e chegaram a obter os limites já indi- cados, deixando entre si um canal de tres ou quatro grãos, em latitude, de largura, na parte mais estreita, começando desds então a desenvolver-se o valle do Amazonas. Neste canal depositou-se durante um longo periodo, estendendo-se, desde a edade siluriana superior até a edade cr3tacea, uma serig de camadas levemente inclinadas de cada lado para o centro, sem grandes oscillações de nivel nem deslocações compa- raveis com as que perturbavam a serie metamorphica. Houve, entretanto, antes do deposito das camadas terciarias, erupções consideraveis de trapp e de diorito, bem como deslocações em pelo menos, uma região, a do Ereré, situada quasi à margem do rio, na vizinhança de Monte Alegre. Esta região é tão importante, no estudo da geologia do Amazonas, que merece descripção especial. Cerca de duas lJeguas, a Oeste da villa de Monte Alegre e à margem da varzea, existe um grupo isolado de montanhas consistindo em pequenas serras monoclinaes, muito numerosas, destacadas umas das outras e dispostas em ellipse ao redor de uma pla- nicie central cuja elevação é de alguns metros apenas acima do nivel do Amazonas. O eixo maior desta ellipse é de tres ou quatro leguas de comprimento e corre na di- recção E O. A serra principal, chamada Tajuri que mede 350 metros de elevação, fica a Nordeste da elipse; dalli estende-se uma linha curva de serras baixas até encontrar, pelo sul, a serra do Ereré, que é a segunda em altura, pois tem 250 metros de elevação ; em seguida vêm as serras menores de Aroxi, Maxirá, Paraizo, Julião e Urucury, sendo a ultima situada na extremidade occidental da ellipse; entre esta e ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 91 Tajurí ha um numero consideravel de serras baixas sem nome, as quacs não foram exploradas. Todas as serras apresentam uma encosta abrupta ao lado da planície central e um declive lento, seguindo a inclinação das camadas do lado opposto. - Esta inclinação que é de 10º a 20º varia em todos os pontos da bussola, sendo de N NE em Tajurí, de É nas serras intermediarias entre Tajuri e Ereré, deS nesta ultima e de O em Urucury. Esta variação prova que aquella linha de serras é um pequeno resto de uma vasta elevação anticlinal cuja parte central e maior foi des- truida pela desnudação. Vem apoiar esta opinião, a respeito da estruclura daquella região montanhosa, a serra baixa do Paituna, situada fóra da elipse, algumas tres ou quatro milhas ao sul da serra do Ereré, e parallela a esta. O Paituna tem a estructura synclinal, inclinando-se as camadas de cada lado para o centro, como era de esperar, considerando-s? a sua posição em relação às outras serras do systema. E” possivel que ao norte de Tajuri haja outras serras de estructura semelhante à do Paituna. Ainda não se tem reconhecido, em outras partes do valle, elevações cor- respondentes às do Ereré, porém tenho razões para crer que a serra de Curu- mú, e talvez a de Cunury, na vizinhança de Obydos, são de estructura semelhante e pertencem ao mesmo systema de deslocação. Perto da margem, da região me- tamorphica, pelo menos, do lado da Guyanna, as camadas palzozoicas são ligei- ramente inclinadas em um angulo de 5º a 15º, mas geralmente parecem ser horizontaes. O primeiro membro na serie paleozoica do Amazonas é o terreno siluriano superior cujas rochas apparecem do lado da Guyanna numa zona de poucas milhas de largura, e que se estende na direcção E O por uma distancia consi- deravel e provavelmente ao longo da maior parte da margem austral da região metamorphica da Guyanna. As rochas desta edade foram reconhecidas no Trom- betas, Curuá e Maecurú, e à vista de amostras trazidas pelo Sr. Ferreira Penna, do Maracá, pequeno rio quasi fronteiro à extremidade occidental da ilha de Ma- rajó, julgo que se estendem quasi at? o Atlantico. E no rio Trombetas que as rochas desta edade tem sido mais bem estu- dadas. Alli se apresentam, em uma extensão de quatro ou cinco milhas, for- mando a primeira cachoeira e parte da segunda. São ainda observadas em um morro de cerca de 100 metros de elevação chamado Oiteiro do Cachorro, situa- do na margem direita do rio do mesmo nome, um pouco acima da sua desem- bocadura no Trombetas. A parte inferior deste morro é composta de felsito acima do qual apresentam-se as camadas silurianas, formando um magnifico despenha- deiro. Na parte inferior da segunda cachocira, chamada Vira Mundo, estas rochas repousam sobre o syenito. A inclinação das camadas é approximadamente de 5º para SS O, com a orientação N 65º O Julgo que a espessura total da serio é de cerca de 300 metros. O caracter das camadas é notavelmente uniforme. Estas compocem-se quasi 92 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL exclusivamente de gres duro, argilloso e micaceo, disposto em lages finas de poucos centimetros de espessura, porém com algumas camadas massiças de gres puro. A côr deste gres varia muito, sendo ora branco, ora amarello, vermelho e purpureo, predominando, porém, um tom avermelhado mais ou menos listrado e matizado. Os calcareos faltam inteiramente e os schistos são raros e pouco im- portantes, relativamente à sua espessura, porém, interesssantes por seus caracteres especiaes. Acha-se um grupo de schistos ou antes de uma rocha silicosa (cherty) e schistosa, de cinco ou seis metros de espessura, junto ao syenito na base da serie. Esta rocha parece ter soffrido alguma alteração e faz suppôr que o syenito é de origem eruptiva c mais moderno do que as rochas metamorphi- cas da mesma localidade, isto é, do que os felsitos; como porém notei que são justamente as lages inferiores e por consequencia as mais vizinhas do syenito que mostram menos signaes de alteração, ligo muito pouco importancia a esta suppo- sição, pelo menos, no que diz respeito à sua ultima parte. Um outro schisto de espessura indeterminada apresenta-se junto à parle ingreme da face do Outeiro do Cachorro e consiste em argilla pura empregnada de alumen que apparece tambem abundantemente em crystaes livres. Ao pé da cachoeira Vira Mundo e acima da rocha silicosa ha uma ca- mada de gres amarellado de grão fino, contendo alguns fosseis, dos quaes conseguimos colleccionar quanto nos era bastante a determinar a edade da formação. Estes fosseis, que estão todos no estado de impressões, pertencem ao ramo dos Molluscos, com excepção de uma especie de Beyrechia e um fragmento que parece ser de Trilobito. Os mais abundantes são, um Cephalopode, especie de Orthoceras, e diversas especies de Brachiopodes pertencentes aos generos Rhynchonella, Pholilops, Orthis, Chonetes, Strophodonta e Lingula. Dos Gasteropodes ha especies de Bel- lerophon (Bucania) e Conularia, e dos Lamellibranchios, especies de Ctenodonta. Entre estas especies distinguem-se, a Orthis hybrida, Sowerby, a Lingula cuneata, Conrad e a Bucamia trilobata, Conrad, que são caracteristicas da parte inferior do terreno silu- riano superior da America do Norte. No outeiro do Cachorro existem em certas lages restos de plantas maritimas Fucoides ou Algas, entre as quaes pude reconhecer uma especie norte-americana, a Arthrophycus Harlani de Conrad. Estes fosseis indicam uma correspondencia notavel com o gres de Medina (Medina sandstone), subdivisão do periodo do Niagara, dos geologos americanos. Nas camadas do gres avermelhado superior a este gres fossilifero, só encontramos tubos de vermes e esses em abundancia. A mesma serie de camadas encontra-se nos rios Curuã e Maecurú, com caracte- res identicos, aos já descriptos. Não nos foi possivel chegar até a base da serie onde encontram-se as camadas fossiliferas, por não dispôr de força bastante para transpor as altas cachoeiras formadas por estas rochas, nos ditos rios, pelo que só achamos fosseis indeterminaveis, como tubos de vermes e Algas mal conservadas. O terreno siluriano superior ainda não foi reconhecido neste valle, na parte ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 93 meridional, porém, como são muito incompletas as secções estudadas daquelle lado, não podemos afirmar que não exista elle alli. E” possivel que as camadas silicosas de que falla o Professor Hartt, em sua descripção das rochas do Tocan- lins, pertençam à este terreno, como, porém, existem tambem no devoniano e no carbonifero camadas da mesma natureza, é impossivel, na falta de amostras, dizer à qual dos tres terrenos ellas podem, com mais probabilidade, ser referidas. O terreno devoniano destaca-se melhor no lado septentrional do valle, onde margina a zona siluriana, em uma outra mais larga, desapparecendo debaixo do terreno carbonifero para reapparecer outra vez mais ao sul pela elevação do an- ticlinal do Ereré. As camadas deste terreno são bastante variadas em caracteres, e podem ser divididas, pelas differenças das rochas e dos fosseis, em tres series ou grupos subordinados, que acho conveniente denominar, segundo a localidade em que cada um foi melhor estudado, o do Maecurú, o do Ereré e o do Curuá. Cumpre entretanto, observar que estes nomes não são exclusivos, porque nas tres localidades supramencionadas apresenta-se cada um destes grupos. O primeiro grupo, o do Maecurú, consiste em algumas raras camadas de gres grosso, branco ou amarellado, tendo, no Maecurú e no Curuá, a espessura de 10 metros. Elle é bem representado neste rio, com inclinação de perto de 5º ao S S O, sendo a rocha dura em algumas camadas, friavel em outras, e altamente fossilifera. No Trombetas este mesmo grupo é representado por uma camada de gres tão friavel que é quasi um banco de areia, apparecendo no Ereré sómente na superficie da camada superior. Os fosseis existem todos em estado de impressões coradas por oxido de ferro, e são tão abundantes que em poucas horas fizemos, no Maecurú, uma collecção enorme, contendo cerca de 75 especies. Dos Trilobitos, ha especies dos generos Homalonotus, Dalmania, Phacops e Proetus ; dos Gasteropodos, especies de Bellerophon, de Platyceras e de Holopea ; dos Lamellibranchios, encontra-se um grande numero de especies representando os generos Modiomorpha, Limoptera, Edmondia, Grammnysia e outros. Os fosseis mais interessantes são os Brachiopodes cuidadosamente estu- dados pelo Sr. Rathbun, ajudante da Commissão Geologica, o qual descreve 21 especies provenientes do Maecurú, 15 das quaes foram encontradas tambem no Curuá, em camadas semelhantes, 9, nas camadas subrejacentes do Ereré, e 6, no devoniano inferior e medio dos Estados Unidos. Das especies communs a este grupo e ao do Ereré, as que são muito abundantes em um, são geralmentente raras no outro, o que dá, com as especies limitadas a um ou ao outro, uma expressão especial à fauna de cada um delles, justificando a sua separação. As especies mais abundantes e caracteristicas no gres do Maecurú são a Amphigenia elongata, Hall, a Spirifera duodenaria, Hall, a Strophodonta perplana, Hall, a Rhynchonella dotis, Hall, o Tropidoleptus carinatus, Hall, a Vitulina pustulosa, Hall, a Streptorhynchus Agassizik, Hartt, e especies novas de Chonetes e Orthus. As duas primeiras e as ultimas novas não foram encontradas em Ereré. Das 94 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL seis especies communs aos Estados Unidos e ao Brazil, duas, a Amphigenia elongata e a Spirifera duodenaria, são limitadas ao devoniano inferior ou Corniferous Group, o qual aliás se acha na mesma relação estratigraphica e palxontologica com o sobrejacente devoniano médio ou Hamilton Group, em que o grupo do Maecurú está com o de Ereré. Estes ultimos podem, por tanto, ser considerados os equivalentes brazileiros das formações norte-americanas. O grupo de Ereré occupa uma area consideravel, na planície central, entre as montanhas de Ereré, mas tão subdivido, desnudado e perturbado por deslocações e erupções dº trapp, que offerece grandes difliculdades ao estudo, dificuldades estas, porém, que foram vencidas com admiravel perspicacia pelo Sr. Smith que, em 1876, conseguia fazer uma secção geologica completa e, por meio de fosseis, provar a uni- dade do grupo. O Sr. Smith calculou a espessura total em 59 a 69 metros, dividida entre treze camadas distinctas, a maior parte das quaes consiste em gres micaceo, de grão fino, disposto em leitos folheados ou schistosos, com camadas subordinadas de schisto argilloso preto. O gres é geralmente branco, ou amarellado ; cumpre, porém, notar que, exposto ao tempo, torna-se avermelhado, e o schisto do mesmo modo torna-se branco. Algumas camadas, na base do grupo, são muito compactas e de caracter silicoso (cherty), quebrando-s: com muita regularidade em massas de fórma cubica. Em todas as camadas, os fosseis são mais ou menos abundantes, sendo os do schisto differentes dos do gres. Encontram-se as mesmas camadas no Maecurú e Curuá, porém, com menor numero de subdivisões e de fosseis, e sem os schistos. A espessura do grupo, no Curuá, é tambem menos consideravel. A fauna é semelhante à já descripta do grupo do Maecurú, porém, salvo na classe dos Brachiopodes, menos rica em especies e individuos que aquella. Foi descripta pelo Sr. Rathbun ! que descreveu 24 especies de Brachiopodes, 2 de Trilobitos, 10 de Lamellibranchos e 6 de Gasteropodes. Das primeiras algumas já foram por mim mencionadas; 13 são limitadas a este grupo do qual as mais abun- dantes e caracteristicas são a Retzia Jamesiana, Hartt,? a Reta Wardiana, Harlt ca Discina lodensis, Hall. A Spirifera Pedroana, Hartt, apesar de apparecer rara- mente no grupo de Maecurá, é pela sua abundancia, uma das mais caracteris- ticas especies deste grupo. O terceiro grupo, o do Curuá, consiste quasi exclusi- vamente em schistos pretos e avermelhados passando às vezes ao gres schistoso. Estas camadas formam paredes no Maecurú e Curuá que marginam os rios por uma distancia dº muitos kilometros, jazendo quasi horizontaes, salvo as perturba- cões devidas aos numerosos diques de diorito. No Trombetas, o schisto preto fórma um ou outro paredão à margem do rio, e o schisto avermelhado é mal exposto ! Bulletin of the Buffalo Society of Natural Science 1874; Annals of the Lyceum of Natural Histo- ry of New-York, vol. XI. * E' de justiça declarar que aquelle a quem foi dedicada esta especie tem, mais do que qualquer outro que se não haja dedicado especialmente à Sciencia, contribuido para o progresso da Geologia, para não dizer da Sciencia em geral, no Brazil. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 95 num lago proximo. Em Ereró estas rochas são expostas na parte oriental da planicie, e tambem na base das serras, mormente em Tajurí cuja face é por ellas constituida. . O schisto preto fórma a camada inferior, cuja espessura é calculada pelo Sr. Smith em 100 metros no Curuá. E” bem laminado, tendo quasi a estruc. tura da ardosia, e na parte inferior numerosas e grandes concreções calcareas e arenosas. As primeiras, do calcareo azulado quasi preto, têm a estructura a que os inglezes chamam cone-in-cone bem desenvolvida e exhalam depois da uma martellada, um forte cheiro de petroleo. O schisto amarellado jaz acima nb do preto, tendo mais ou menos a mesma espessura. E” geralmente de côr do chocolate matizado de côr mais escura c listrado, parallelo à estratificação de branco, amarello ou preto. Consiste em argilla misturada com porção consideravel de mica e arêa fina, formando a ultima, às vezes, lages de gres branco de alguns centime- tros de espessura. Raramente encontram-se camadas de argilla pura de côr amarella. Os unicos fosseis achados nestes schistos são algas do genero Spirophyton e pequenos corpos de natureza desconhecida que parecem ser fructos do tamanho e da estructura de uma groselha achatada, consistindo em uma pellicula delgada, que involve de dous a seis pequenos grãos ou sementes. Estes parecem ser identicos aos Spirophytons deseriptos pelo Professor Hall procedentes do Hamilton Group de New-York. São fosseis que foram achados em todas as localidades, em ambos os schistos, perto de sua juncção. No Curuá e Maecurú ha entre as camadas fossiliferas das edades devonianas, e carboniferas, camadas de gres grosso cuja espessura é calculada pelo Sr. Smith no primeiro destes rios, em 16 metros, pelo menos. Não foi possivel determinar a qual das duas formações, p:riencem estas nem, tão pouco, si são identicas às camadas de gres que se encontram acima dos schistos, nas montanhas do Erere. Quanto à extensão da serie devoniana é quasi certo que as camadas de gres e schisto mencionadas pelo Sr. Rodrigues no Uatumá (pequeno rio entre o 'Trombetas e Negro) pertencem a esta serio. No Tapajós certos schistos contendo Spiroplyton e concreções calcareas referidos provisoriamente ao terreno carbonifero pelo Professor Hartt parecem-me ser devonianos, e refiro à mesma edado os schistos pretos encontrados no Xingú pelo Sr. Ferreira Penna. De todos os depositos palxozoicos do Amazonas os do Carbonifero parecem ter a maior extensão e apresentam as maiores difficuldades ao estudo !. Sendo 1 O primeiro descobridor dos terrenos carboniferos foi o engenheiro Silva Coutinho que em 1863 colheu fosseis em Itaituba no Tapajós, facto notado pelo Professor Agassiz em sua obra. « À Journey in Brazil» publicada em 1869. Chandless pouco depois descobriu fosseis no Mauheassú de que deu noticia no Journal of the Royal Geographical Society of London no volume de 1870, tendo os irmãos Keller an- teriormente, em 1868, publicado uma nota sobre a collecção de Chandless n'um relatorio ao Ministro da Agricultura. A edade carbonifera destes fosseis não foi definitivamente estabelecida por nenhuma destas 96 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL compostos pela maior parte de camadas molles, soffreram uma grande desnudação, tanto antes como depois do deposito das possantes camadas terciarias, debaixo das quaes elles jazem escondidos sobre grandes áreas, revelados aqui e acolá pela desnudação destas camadas. Em virtude dessa destruição, as emersões são pequenas e tão separadas umas das outras que torna-se muito dificil a deter- minação da relação das diferentes camadas, e a extensão vertical da serie. O Sr. Smith, que mais tem estudado estes depositos, é de opinião que a espessura total da serie não póde ter menos de 600 metros, e apesar de serem muito deficientes os dados deste calculo não posso dizer que seja exagerado. A extensão horizontal é mais facil de determinar. No Tapajós as rochas desta serie apparecem por intervalos, desde pouco abaixo das cachoeiras até perto da villa de Aveiros, na distancia de perto de 80 milhas. EF” possivel que se en- contrem ainda mais para o norte, a uma distancia de duas leguas da cidade de Santarém onde me informaram acham-se um calcareo provavelmente da edade carbonifera ; facto este que não consegui verificar. Ao oeste, estendem-se, ao menos até o Mauheassi e provavelmente além daquelle rio, e a leste, tenho informa- cões que me fazem crer que existem no Xingú, sinão ainda mais para o oriente. Ao norte do valle apparecem muito proximo do Amazonas na região de Alenquer estendendo-se uma distancia consideravel para o norte, e no sentido longitudinal para ao oeste, ao menos até o Uatumã, e a leste até o Jauary perto de Prainha, sinão mais longe. As rochas consistem em gres molle, schisto, e calcareo o ultimo dos quaes, apesar do sua pouca espessura, é o mais importante, tanto por seu valor economico como scientifico, porque tendo resistido mais que as outras rochas à desnundação e sendo altamente fossilifero fornece indício admiravel no estudo da serie carbo- nifera. A melhor exposição do calcareo é no Tapajós tanto acima como abaixo da villa de Itaituba, onde é extrahido para o fabrico de cal. A formação tem a espessura de 8 metros e consiste em varias camadas, umas de calcareo muito puro de côr azulada, ou pardo clara, outras de côr escura proveniente da mistura de argilla e areia. Os fosseis, sendo silicificados, e mais duraveis do que a rocha em que são enterrados deslocam-se naturalmente pela dissolução desta, apresentando-se soltos, como acontece na praia fronteira à Itaituba. Massas de silex (chert) existem publicações. Em 187071, o Professor Hartt examinou as camadas carboniferas do Tapajós e descobriu o calcareo de Tajuri; estava, porém, reservado ao Sr. Brown, em 1872, e a mim em 1876, encontrar os fosseis que estabeleceram a sua posição geologica. As observações do Professor Hartt foram publicadas em 1874, no Bulletin of the Cornell University acompanhadas da descripção dos fosseis brachiopodes por mim redigida, em que annunciei pela primeira vez a existencia destes terrenos no lado do norte do valle no rio Trombetas. O Sr. Rodrigues, em 1872 ou 1873, achou fosseis carboniferos no Jamundá e Uatumá dos quaes deu noticia num relatorio publicado, si não me engano, em 1875; foi porém reservado ao Sr. Herbert H, Smith descobrir em 1876 a grande extensão e importancia destes terrenos do lado septentrional, na vizinhança de Alenquer e fazer um estudo minucioso delles. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 9 espalhadas no calcareo; outras de natureza diferente, que em decomposição tomam a côr e apparencia de giz, encontram-se soltas na praia perto de Itaituba, provenientes, na opinião do Sr. Smith, de uma camada de schisto sobreja- cente ao caleareo; ainda uma outra variedade de silex ou rocha silicosa que, quando decomposta, tem a apparencia de gres esponjoso, acha-se em grandes massas arredondadas em frente de Itaituba, provavelmente procedentes de alguma camada desconhecida superior ao calcarco. O silex encontra-se destacadamente em toda a região carbonifera do Tapajós, não tendo sido, porém, ainda determinadas rigorosamente as camadas donde elle procede. Acima do mesmo calcareo, no Tapajós, ha camadas d3 gres molle de côr parda e schistos cuja extensão é desconhecida. Em baixo ha uma extensa serie de schistos verdes pretos e avermelhados cujas relações não tem sido bastante estudadas. Uma parte delles pertence sem duvida ao terreno carbonifero, emquanto uma outra parte contendo Spirophyton é provavelmente do devoniano. Das exposições do terreno carbonifero, no Mauheasst, só temos noticia do calcareo cujos caracteres são identicos aos do de Tapajós. Passando agora ao lado do norte do Amazonas, encontramos uma camada espessa de calcareo ao pé da serra de Tajurí, apparentemente identica à de Tapajós e associado com camadas de gres duro ama- rellado que serve de pedra ds amolar mas cuja emersão é de tal maneira equivoca que não mc foi possivel determinar as suas relações com as outras camadas inferiores ou superiores. Na região comprehendida entre o Maecurú e o Curuá ha uma extensa área onde se acha exposta uma variedade de camadas que o Sr. Smith tentou dispôr em secção, a qual, apesar de defeituosa, como elle mesmo confessa, não deixa de ser valiosa. No Curuá, logo depois das camadas cuja edade devoniana está bem determi- nada, o Sr. Smith achou, na Praia Grande, fosseis silicificados e soltos, identicos aos de Itaituba, que accusam a presença de uma camada calcarea. Acima desta camada ha uma serie que parece ter cerca de 200 metros de espessura, composta de alternações de camadas molles de gres e de schistos arenosos, eminentemente fossi- liferas, especialmente em certos leitos da parte superior, no logar chamado Pacoval. No lago de Cujubim, perto do rio Maecurú, a secção mostra primeiro, inferiormente camadas massiças de gres amarellado de espessura indeterminada e uma camada de meio metro de espessura de gres duro; vem depois um leito de metro e meio de cal- careo impuro, silicoso, fossilifero, separado por tres metros de gres e schisto de uma camada superior de egual espessura de calcareo puro, contendo fosseis identicos aos de Itaituba; em cima veem-se alguns metros de gres e schisto molle averme- lhado ou pardo com fosseis identicos aos de Pacoval, no Curuá. Em varias outras localidades, na vizinhança de Alenquer, o Sr. Smith encontrou emersões de camadas de gres e schisto de caracteres muito variaveis, algumas das quaes são fossi- liferas e parecem ser superiores às de Cujubim e equivalentes, à serie de gres e schisto do rio Curuá. Como muito bem observa o mesmo Sr. Smith, a variação no v II— lá 98 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL caracter das camadas, tanto na sua extensão vertical como horizontal, indica que foram depositadis em agua de pequena profundidade durante um movimento gradual de submersão. O calcareo encontra-se perto da base da serie. As emersões das rochas carboniferas, no rio Trombetas, são pouco satisfacto- rias, e provam apenas que existem camadas de gres, schisto, e calcareo com fosseis identicos aos das outras localidades, sem darem luz alguma sobre as demais correlações. A fauna carbonifera do Amazonas é riquissima, constando de mais de cem espe- cies de Brachiopodes, Lamellibranchios, (rasteropodes, Coraes, Bryozoarios, Trilobitos Echinodermes e Peixes sendo estas tres ultimas classes comparativamente raras. Destes fosseis já tenho esboçado as respectivas descripções; porém só se acham publicadas as dos Brachiopodes do Tapajós. 1 Comparada com as faunas successivas das divisões da edade carbonifera dos Estados Unidos, nota-se uma coincidencia notavel entro à do Amazonas e a do Carbonifero superior (Coal Measures), tão largamente desenvolvida naquelle paiz, no valle do Mississippi, desde Ohio até as Montanhas Rochosas, e de Nebraska até o Texas. Mais de metade das especies brazileiras são identicas às Norte-Ameri- canas e as outras novas são estreitamente relacionadas com outras caracteristicas dos depositos dos Estados Unidos. As unicas especies brazileiras que têm sido alli reconhecidas nos depositos subjacentes, os da edade sub-carbonifera, constituem fórmas notaveis por sua distribuição vertical, sendo communs áquella edade e à carbonifera propriamente dita, ou Coal Measures. E” de notar que a fauna carbonifera boliviana, e peruviana, como o provei no trabalho citado, tambem pertença ao mesmo horizonte geologico, sendo ainda des- conhecido, no continente da America do Sul, o equivalente da extensa serie da edade sub-carbonifera do valle do Mississippi, o Mountam Limestone da Europa. Comparadas com os depositos europeos os do Brazil são, pelos seus fosseis, mais relacionados com os da edade permiana do que com os da edade sub- carbonifera ou Mountain Limestone. ? ! Bulletin of the Cornell University vol. I. E * As seguintes especies são communs aos depositos carboniferos brazileiros, bolivianos e norte- americanos. Spirifera camerata, Morton (S. Condor D'Orb). Retzia Mormonii, Marcou (R. punctulifera, Shumard). Athyris subtilita, Hall. Productus Cora, D'Orbigny. Productus semireticulatus, Martin. Chontes glabra, Geinitz. Destas especies as duas primeiras encontram-se tambem no Perú, no rio Pechis, afluente do Pachetea. As seguintes constituem algumas das mais importantes especies communs ao Braril e aos Estados Unidos. Spirifera rockymontana, Marcou. Spirifera planoconvexa, Shumard, Spirifera perplexa, Mc Chesney. Myalina Kansasensis; Shumard. Allorisma suvcuneata, Meek & Hayden. Aviculopecten occidentalis, Shumard, Aviculopecten carbonaria, Stevens Schizodus Wheeleri, Swallow. Lima retifera, Shumard. Entolium aviculatum, Swallow. Belilerophon carbonarius, Cox. Rhombopora lepidodendroides, Meek. Synocladia biserialis, Swallow, ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 99 Si os depositos carboniferos tâm realmente a espessura calculada pelo Sr. smith, é de suppôr que possam ser divididos em diversos grupos subordinados, porém na falta de secções completas, não nos foi possivel estabelecer subdi- visões bascadas sobre os caracteres lithologicos e estraligraphicos. As camadas fossiliferas achadas nas varias localidades parecem pertencer ao mesmo horizonte limitado, caracterisado por calcareos com camadas sobrejacentos de gres e schistos, as quaes apresentam-se sempre com os mesmos fosseis, salvo certas camadas de gres achadas pelo Sr. Smith em Curumú e Curucaca, perto de Alenquer, cujos fosseis tem um aspecto diferente dos das outras localidades, porém acham-se tão mal conservados que é impossivel tirar delles conclusões bem fundadas. Uma classificação das camadas por meio dos fosseis que tentei fazer era tambem pouco salisfactoria. E” verdade que os fosseis das camadas calcareas são bastante differentes dos do gres e de schisto. São os Brachiopodes e Coraes mais abundantes naquellas, ec os Lamellibranchios nestas, porém ha muitas es- pecies em commum e as differenças parecem ser devidas mais ao caracter dos sedimentos que a uma differença em horizonte geologico. Entretanto, para dar expressão a estas diferenças, quanto aos fosseis, podem-se considerar provisoriamente os calcareos como uma subdivisão inferior e as rochas arenosas, silicosas e argillosas, subdivisão superior. Na consideração de uma bacia carbonifera, n'uma região tão vasta e que promette tanta riqueza para o futuro, como o valle do Amazonas, é natural per- cuntar, quaes são os productos economicos desta bacia, e especialmente si é o carvão de pedra um delles? O unico já conhecido e aproveitado é a cal, fabricada em quantidade consideravel e de boa qualidade de calcareo; um mineral de ferro, o limonito, é muito commum, sendo proveniente da alteração e decomposição das rochas; porém o que tenho examinado é muito argilloso e não parece ter grande valor. A respeito do carvão de pedra, não se tem encontrado indício algum deste mineral, porém a exploração tem sido exccutada em muito pequena escala e é tão defeituosa que fôra dificil formar idéa definitiva sobre a sua existencia. A formação, tanto pela sua edade geologica como pelas condições em que foi depos:- tada é das mais proprias para conter depositos de carvão. A” vista porém do desapparecimento da formação carbonifera, abaixo dos depositos posteriores sobre a maior parte da bacia, e da desnudação que esta tem sofírido quér antes do de- posito da capa terciaria, quir depois, em todos os logares em que esta capa tem sido destruida, é pouco provavel encontrar-se carvão na superficie, ainda que elle exista. E” sómente pelo exame muito minucioso da região inteira e por meio de pocos ou perfurações nos logares mais favoraveis, que se póde esperar resolver “esta questão de tanta importancia no desenvolvimento do valle do Amazonas. Emquanto foram-se depositando na região amazonica os sedimentos paleozoicos, 'é de suppôr que as outras margens das ilhas archeanas, e silurianas recebessem a sua quota, e de facto, ao sul da primitiva ilha do Brazil, nas regiões que hoje constituem as 100 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL provincias do Rio Grande, Santa Catharina, Paraná e uma parte de S. Paulo, forma- ram-se depositos enormes tanto da e lade devoniana como da edade carbonifera. Consta tambem que nas provincias do Maranhão, e de Mato Grosso, no (Guaporé e Alto Paraguay existem rochas carboniferas, mas não sei si é facto verificado. A região andina tambem recebeu depositos enormes durante os tempos silurianos inferior e superior, devoniano e carbonifero, apparecendo hoje as camadas do ultimo na parte central das cordilheiras, no lago Titicaca, na provincia do Arque, e na parte oriental, em Cochabamba, e Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia e no Alto Pachetea, no Perú. As camadas que tenho referido ao (Cretacco só tem sido reconhecidas com certeza nas montanhas de Ereré. Temos visto que os schistos do Curuá, da serie devoniana, formam em geral a base das serras, A estes schistos seguem em Tajuri os calcareos carboniferos, porém, em geral estes faltam, encontrando-se acima dos schistos, camadas espessas de gres duro e grosso. Em uma secção feita em um morro, entre Tajurí e Ereré, ha tres camadas distinctas de gres separadas por camadas de schistos arenosos e micaceos, tendo a serie inteira cerca de cem metros de espessura. Das tres camadas de gres, a superior ou a média ou ambas reunidas, apparecem nas serras do Ereré e Paituna. Na primeira destas serras encontraram-se, em 1871, amostras de madeira fossilisada que, submettidas ao exame do distincto Dr. Dawson foram classificadas na divisão das plantas dicotyledones. Em Paituna, encontramos na ultima viagem, uma pequena camada de gres argilloso intercallada entre ca- madas de gres grosso, em que ha abundancia de folhas fossilisadas pertencentes a varios generos do mesmo grupo de plantas. As folhas e a estructura lenhosa das plantas tropicaes têm sido tão pouco estudadas que será dificil sinão impossivel determinar as especies e até os generos a que estas plantas pertencem, com quanto, para determinar a edade da formação, isto seja pouco importante. E como não hajam sido ainda reconhecidas as plantas dicotyledones, em terrenos anteriores ao Cretaceo, é muito pouco provavel que estas sejam mais antigas, e pois que se acham em camadas perturbadas, subjacentes aos depositos horizontaes referidos à edade terciaria, é tambem pouco provavel que sejam mais modernas. E” verdade que se encontram em Tonantins, no Solimões; em Uatapucará, no Tapajós; c em Prainha, no Baixo Amazonas; folhas muito semelhantes em camadas que parecem ser terciarias ou ainda mais modernas ; mas até que se prove por exames comparativos que as folhas destas localidades sejam identicas, em especies, às do Paituna, parece-me mais razoavel consideral-as distinctas e pertencentes a diffe- rentes horizontes geologicos. E” para notar que as folhas se achem na Prainha em camadas de argilla e de conglomerato ligeiramente inclinadas, parecendo bem possivel, apesar de sua apparencia moderna, que ellas pertençam á edade cretacea, Achando-se as folhas na camada superior do gres, a edade das camadas inferiores da mesma rocha, como a dos schistos arenosos, fica indeterminada podendo ellas ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 101 pertencer aos terrenos intermedios entre o cretaceo e o devoniano ou alé a este ultimo. Creio porém, que a vista da semelhança de caracteres lilhologicos, deviam ser referidas à mesma edade da camada fossilifera. O que fica bem provado é que a sublevação do anticlinal do Ereré effectuou-se durante ou depois da edade cretacea. Nesta connexão posso acrescentar que as camadas das numerosas bacias cretaceas, ao longo da costa oriental do Brazil, são sempre mais ou menos perturbadas e inclinadas, porém em muito menor escala do que as do Ereré. Perto da foz do Trombetas encontramos camadas inclinadas de gres contendo seixos de schisto que me parecem ser provenientes das camadas devonianas ou carboniferas existentes ao norte e no mesmo rio. Na mesma região ha uma serra alta de gres duro, chamada (Curumú cujas camadas parecem ser tambem incli- nadas e sou levado a crer que a serie cretacea do Ereré é alli representada. Ao sul da foz do Amazonas, entre Salinas e Bragança, o Sr. Ferreira Penna achou ultimamente camadas de calcareo, cheias de fosseis maritimos, semelhantes aos da bacia cretacea da costa de Pernambuco e Sergipe. Na região do Solimões o mesmo terreno é largamente desenvolvido, conforme as observações de Chan- dless e Coutinho, no rio Purús, sendo ahi caracterisado pelos restos de Mososaurus e de tartarugas. As perturbações e deslocações que as camadas de todos os terrenos acima descriptos têm sofírido, foram acompanhadas de erupções de rochas igneas. Na região metamorphica os syenitos e talvez uma parte dos granitos podem pertencer a esta categoria, o que só póde ser determinado com mais estudo. Na mesma região e na região paleozoica, o diorito é muito commum, formando diques enormes, e as vezes, parecendo ter sahido dos planos de estratificação, tomando a apparencia de camadas interstratificadas nas camadas sedimentarias. Uma outra rocha eruptiva, que, na falta de conhecimento de seus verda- deiros caracteres, póde receber a designação um pouco vaga de trapp, fórma um grande numero de diques estreitos nas regiões de Ereré, Cujubim e Curumú ( perto de Alenquer ), atravessando tanto as camadas palozoicas como as cretaceas. A superficie apresenta-se sempre decomposta, tendo uma apparencia escoriacea e encerrando crystaes de quartzo e fragmentos mais ou menos alterados das rochas sedimentarias cujas camadas são interrompidas pelos diques. Estes fragmentos conservam ás vezes ainda os seus fosseis ce o metamorphismo produzido pelos diques nas rochas de cada lado é muito parcial e tem apenas de extensão um ou dous metros. As camadas terciarias têm sido tantas vezes mencionadas no decorrer desta memoria, que pouco fica a dizer a respeito da sua distribuição e caracteres. Ellas distinguem-se das outras formações pela sua posição horizontal, e pela ausencia tanto de fosseis como de rochas eruptivas. Constam de gres e argilla de cores vivas e 102 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL variadas, como a branca (tabalinga) a rôxa, a amarella ec a azul, as quaes de ordinario se combinam para produzirem um efeito brilhante nas barreiras, mui raras na margem do Amazonas, porém muito frequentes ao longo de seus tributa- rios. As rochas são em geral pouco coherentes, salvo uma ou outra camada consolidada de uma maneira irregular com oxido de ferro, produzindo o gres grosso ferrugi- noso, que, sendo muito resistonte à acção do tempo, acha-se espalhado na superfície de toda a região da terra firme amazonica. A serie terciaria é mais bem apresentada nas serras conhecidas pelo nome de serras do Para que se avistam do rio, desde Almeirim até perto da Prainha. Estas serras são taboleiros ou montanhas de cireumdesnudação, perfeitamente niveladas e com 300 a 350 metros de altura. A serra mais proxima da Prainha chamada Parauá- quira foi visitada pelo Professor Hartt que lhe achou bem manifesta a estructura em sua encosta, a qual é muito ingreme e quasi despida de vegetação. As camadas cuja espessura corresponde muito de perto à elevação da serra, consistem em camadas de argillas e gres de diversas cores, dispostas em nove divisões distinctas. Não foi pos- sivel achar fossil algum, que servisse para determinar de uma maneira exacta a época desta formação. De Parauáquára para Oeste, os taboleiros prolongam-se ainda, porém, muito afastados do rio. No Máecurú julguei observar, à distancia, um ou outro ponto arredondado, acima do nivel geral do taboleiro, e que me pareceu ser de alguma formação mais antiga, a qual constituia provavelmente uma ilha no mar onde as camadas dos taboleiros foram depositadas. Na chapada situada entre a cidade da Cachocira e a Feira de Sany Anna, na provincia da Bahia, observei uma dessas ilhas, constituida de gneiss, e encravada n'um mar de gres. Na vizinhança do Monte Alegre ha depositos apparentemente identicos aos de Parauáquára, cuja formação é evidentemente posterior a sublevação das serras. Estes depositos, como os de Santarém e Obydos, mostram ter sofrido muitas desnudações, que reduziram consideravelmente a sua altura primitiva, a qual é de suppôr que nunca houvesse attingido a das serras de Pari, pé As camadas terciarias, ao lado do sul do valle, acham-se em um nivel consi- deravelmente mais baixo do que o das que formam as serras do Para, facto este que póde ser em parte attribuido às desnudações que ellas tim soffrido e em parte a uma differença primitiva de nivel, devida à inclinação para o sul, do fundo do mar terciario e à menor quantidade de sedimentos que receberam estas regiões mais afas- tadas da margem daquelle mar. Os altos que se estendem por traz da cidade de Santarém têm cerca de 120 metros de elevação e não parecem haver soffrido desnudação que houvesse diminuido a sua altura original. Em uma camada de argilla azulada que se observa na encosta destes altos achei vestigios de tubos de vermes, mas não consegui encontrar fossil algum determinavel. E” digno de reparo que geralmente, ao sul do valle, as camadas terciarias, onde não houve desnudação sensivel formem terrenos cobertos de ricas florestas e ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 103 muito proprios para a “lavoura, emquanto que aonde elles têm sido desnudadas. mostre-se o solo arenoso e esteril. E” tambem muito notavel a falta de fosseis nas camadas de que estamos tratando, não sómente nas do Baixo Amazonas como nas de outras regiões. Em todas as pro- vincias, do Brazil, camadas semelhantes, em caracteres e posição, apresentam-se, occupando uma área enorme, mas até hoje não têm apparecido fosseis que possam servir para classifical-a, sendo ellas referidas à edade terciaria em virtude de sua posição estratigraphica. Os unicos fosseis conhecidos que são indubitavelmente terciarios. são os do Solimões, incluindo as folhas fosseis do Tonantins e os molluscos d'agua doce e salobra, achados em Pebas e em outras localidades no Perú. Este; apparecem em camadas linhitiferas cujas relações com as camadas do Baixo Amazonas e do Brazil oriental não estão ainda determinadas. A unica divisão que se póde fazer presentemente a este respeito é entre as camadas dos taboleiros e as das planicies baixas, proximas ao Pará ce à parte oriental de Marajó. Estas que consistem em alternacões bruscas de gres grosso e fino, geralmente ferruginoso, com argillas coradas, são evidentemente mais modernas do que aquellas e pertencem à ultima parte da edade terciaria ou à quaternaria. Durante a deposição dos terrenos terciarios havia movimentos consideraveis de depressão, e subsequentemente de elevação, porém sem o acompanhamento de per- turbações e deslocações das camadas, como tambem sem erupções igneas, pelo menos em todas as regiões até hoje examinadas. Terminado o movimento de elevação, começou a fazer-se o deposito de alluvião que fórma a varzea e que ainda hoje continúa. Consiste, conforme as circums- tancias e localidades, em argilla ou areia, ou em ambas misturadas, predominando uma argilla amarellada sem estructura, sobre a qual ha frequentamente um de. posito de argilla preta impregnada de materias organicas. Parte deste deposito foi sem duvida formada n'um estuário, emquanto o rio se apoderava do valle ja por elle preparado, porém é agora impossivel distinguir os depositos do estuario dos que são puramente fluviaes. Os caracteres que provam haver sido este valle um estuario encontram-se, não tanto na natureza dos sedimentos depositados, como no alargamento dos valles dos tributários e dos afluentes destes, porque não é raro encontrarem-se pequenos riachos que se dilatam em sua parte inferior em um vasto lago cuja bacia não póde ter sido rasgada na terra firme sinão pela acção dos mares. Com à formação da varzea terminou o desenvolvimento do valle do Amazonas. Não podemos neste logar entrar em considerações sobre os interessantes phenomenos esclarecedores da Geologia e Geographia physica de que aquella varzea foi e ainda é lheatro. Para encarar de perto a operação dos processos de que tratam estas sciencias e que têm dado fórma e caracter à superficie de nosso planeta, não conheço outra região egual ao Amazonas. Entre a agua ca terra, o rio e a varzea, ha uma luta continua, ora vencendo uma, ora a outra. As ilhas formam-se e desapparecem, ou 104 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL “até navegam lentamente, rio abaixo, pelo progresso continuo de destruição e de formação; lagos, furos e paranamirins formam-se para serem obstruidos; os tributarios, ou estendem-se no proprio territorio do rio principal, ou este appro- pria-se por meio de seus canaes lateraes, de uma parte do valle de um tributario. A luta, porém, é desegual, a força do rio, irresistivel como é nas suas maiores manifestações, apresenta-se muito irregularmente e póde ser vencida por uma outra que é constante em sua acção. A vegetação é a arma mais poderosa com que a terra apanha e retem o terreno do seu adversario, terreno que por meio deste vehiculo vai-se estendendo, a pouco e pouco, estreitando-se-lhe de mais em mais o canal. Este processo não póde entretanto modificar radicalmente o valle que, salvo uma ou outra convulsão da natureza, ha de sempre conservar o caracter que presente- mente possue. O que fica exposto póde servir de base ao estudo da parte inferior ou da 3." secção do valle do Amazonas. No tocante às duas outras partes, a superior e a média, pouquissimo dellas se conhece, sendo por isso muito para desejar que trabalhos ulteriores se apresentem a tornalias conhecidas e talvez que como desejo, a justificar o que com referencia aquella região amazonica deixei aqui escripto em fórma de meros apontamentos. APONTAMENTOS TEMBETAS: “(adornos labiaes de pedra) q DA RENI ECCÃO ARCHEOBOGICA DO Museu Nacional PELO - DR. LADISLAU NETTO I A collecção archeologica brazileira, de tão recente fundação neste Museu, porém já de tamanha valia pelas muitas centenas de artefactos que actualmente a constituem, “alguns possuem, entre estes, de cujo valor estão a dar testemunho suas caracteristicas fórmas, seu primoroso lavor e mais que tudo o fim a que se destinavam seus fabri- cantes e proprietarios. Estes estimaveis primores da industria archeologica, ao que supponho, na Europa, e neolithica na America, são adornos labiaes com que se ata- viavam os primitivos senhores deste solo brazileiro, provavelmente em suas inves- tidas de guerra e de caça, ou em seus passeios de solemnes festividades, ou antes em todos os momentos de sua existencia. Chamavam-lhes elles simplesmente Tembetd (pedra do labio), sem suspeitarem, siquer de que nessa denominação, tão singelamente eloquente, envolvia-se-lhes toda a lenda da sua terra natal, toda a genealogia de suas irrequietas e belli- cosas tribus, todo o epilogo da evolução anthrophologica de sua antiga raca. V. II —15 106 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL E pois que já tão raros se mosttam os tembatás pendentes dos labios dos altivos guerreiros, nas rarissimas tribus a quem é dado ainda o demorado lazer para os fabricarem , a necessaria abastanca para os conservarem e mais que tudo o amor às lradições legendarias da patria, para os não cederem ao poder dos es- tranhos, cuidei de chamar tanto sobre estes preciosos monumentos como sobre a significação por mim presumida do uso que lhes davam aquelles filhos primoge- nitos do genero humano, a altenção de todos quantos, compulsando o livro da Creação, onde foi gravada a historia do passado, buscam ahi decifrar, em pa- ginas quasi extinctas hoje, Os vestigios que lá deixaram as gerações que, nos. precederem sobre a Terra. Felizes aquelles a quem, no seu fecundissimo cogitar, allumiar a luz eterna e sempre esplendente da razão, através dos misteriosos recantos de taes arca- nos, sem preconceitos que lhes entorpeçam a intelligencia nem convenções mes- quinhas que lhes assombrem o animo intemeralo. Felizes, sim, que para elles ha o irromper, do seio da terra, de um orbe ignoto, de um mundo organico mil vezes mais maravilhoso que o mundo actual. A esses quebram-lhes a Archeologia e a Paleontoligia os fechos de pedra de: seus ignorados thesouros, porque, novos (OEdipos, illumina-os, muito mais que 0 destino fatal dos oráculos de Thebas, o facho do raciocinio e com este o des- tino muito menos perecedor das sãs doutrinas da verdade. E que mais extenso campo ou que melhor e mais farta mésse ha ahi, para semelhantes investigações, que se compare com esta analyse da humanidade na sua infancia, no seu balbuciar entre monosyllabos gutturaes de brutos e vozes de homens; humanidade em cujo horizonte anthropologico vemos tão à justa adaptarem-se tantos aborigenas desta parte da America ? E si realmente o solo americano, no que diz respeito ao estudo do homem primitivo, melhor que nenhum outro paiz nos deve facultar um tal estudo, mais particularmente parece reservada esta honra à vasta região cisandina, constituida, desde ha milhares de annos, ao Norte, pelas mais densas e antigas florestas do Globo, ao Sul, por planuras mais vastas que os steppes europeus; —regiam em summa admiravelmente esplendida a quem deu à Natureza por limites de gran- diosa e amplissima moldura: os Andes no Poente, o Allantico no Oriente, e ao Norte e ao Sul, os dous gigantes fluviaes do Amazonas e do Prata. Todos os caracteres ethnigenicos e elhnologicos; todos os principaes typos anthropologicos das nações dos demais pontos do (Globo, synthetisam-n'os, com- pendiam-n'os como por encanto, aos povos desta região, sem que, comtudo, as possa allirmar, sinão somente presumir, que tivessem elles commum origem com a daquelles antigos povos, hoje em grande parte extinctas nações. Ao Museu Nacional, tão efficazmente iniciado nos trabalhos transcendentes da ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 107 experimentação, como nas mais elevadas cogitações da philosophia evolucionista, é de crêr que venha a caber, em não mui remoto futuro, a gloriosa missão de quebrar o sigillo que prende e occulta o fecho destes assumptos. “Para aquelles que houverem de travar de tão seductoras quão profundas lucubrações sejam estes rapidos apontamentos um tenue fio da urdidura enge- nhosa de seus futuros Jlavores. Não por querer levar mãos a uma especialidade à que me confesso ox- tranho, sinão para, em proveito da nossa collecção archeologica, tão penosamente por mim adquirida, atear no animo de meus compatriotas o amor a semelhantes problemas, assentei de escrever as presentes notas. Operarios do futuro, peço-vos que pondereis bem estas razões, antes de me haverdes lançado ao rosto a memoravel sentença do poeta : « Infehx operis summa, quia ponere totum Nesciel. » no . JI Nenhuma parte do corpo humano soffreu nunca maiores lesões do que a cabeça é mais particularmente à face entre as nações que em todos os tempos têm -povoado a superficie da terra. Lesões exigidas pela idéa, mais ou menos exagerada, mais ou menos excentrica, de um bello mais que relativo, si é que assim me é dado considsrar essa pratica mutavel para cada povo, infundada tantas vezes e quantas outras absurda, à que chamam habito tradicional e mais modernamente modo, que por ser, ao que parece, tão sem modo, denominou-se finalmente moda. Está a muitos e justos titulos neste caso toda a variedade de lesões, mutilações ou simples disfarces à que vemos sujeita a face humana, por uma usança hereditaria adstricta ao gosto barbaro de barbaros do passado ou de civilisados que se dizem do presente. Ha, com effeito, nas sociedades cultas certos adornos faciaes que nada mais sao do que vestigios de habitos transmittidos pelos nossos semi-selvagens ante- passados, como, entre tantos outros, o uso, que nos foi legado pela China, pelas nações que povoaram a Asia occidental e, em “particular, pelos Israelitas, uso que faziam as mulheres, do pó de arroz e do carmim na face, no pescoço e no collo, dos signaes na face, do colorido artificial, do cabello, tão geralmente empregado pelos povos que habitavam a Europa occidental, sendo que mil vezes peior que tantos e tamanhos dispauterios na apreciação do bello, devemos acre- ditar que seja a perfuração dos lobos das orelhas para brincos e argolas, perfuração que nem mais nem menos é, na sua adstricção actual, a esta parte da cabeça humana, do que a mais aceita, por menos excentrica, das que pratica- vam nossos ascendentes selvagens, europeus e asiaticos, como praticam ainda hoje as nações immersas nas trevas da primitiva barbaria, e, em boa parte, as que já se vão despertando aos primeiros tentamens da civilisação. Nem povo algum houve que na sua phase de barbaria so eximisse desses appa- rentes ou suppostos tributos da vaidade humana; e a America, onde cada um dos povos primitivos do antigo continente parece haver-se radicado em mais ds uma affinidade ethnologica, a todos os venceu neste particular, offerecendo as mais profundas lesões e as mais sorprendentes deformações até hoje registradas nos annaes da anthropologia. 110 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Neste vastissimo continente não praticavam os seus autochthoncs lesões tão sómente nos labios, nas azas e no septo do nariz, nas faces nas orelhas : nações ijuteiras ahi se nos deparam como os Carahibas, Aymaras, os Caluabas, os Uachauas, os Chinucas, os Cambebas, os Amaguas, os Umauás que deformavam o craneo de seus recem-nascido, achataudo-lh'o entre taboinhas ou taliscas de tabócas e dando-lhe a fórma siugular de que temos notavel exemplo do craneo platycephalo da colleeção boliviaua offerecida ha alguns annos ao Muscu Nacional pelo conselheiro Lopes Netto. E” que o sentimento do bello absoluto, como o do justo, tal qual o conce- bemos e o definimos, não poderia ser o apanagio natural da inteligencia inculta, sinão o altributo moral adquerido, a pouco e pouco ampliado e finalmente aper- feicoado pelas numerosas gerações que se lhe adaptaram na rapida evolução psy- chica da civilisação; sentimento na verdade, tão esplendidamente desenvolvido na edade aurea da Grecia que ainda hoje se lhe não equipara o de que se jactam os paizes mais adiantados da Europa occidental. A cabeca deprimida, havida por typo de summa belleza e de perfeição es- thetica entre tantas nações da America,” tal como o foi entre os habitantes prehistori- cos da Europa, muitos dos quaes caracterisados pela mesma platycephalia artifial dos Cambebas americanos, é uma prova de quanto, na sua gradual desenvolução de individuação moral, haviam-se afastado desses americanos ou dos europeus prehistoricos, collocados no mesmo horizonte anthropologico, os povos indo-euro- peus ribeirinhos da parte oriental do Mediterranco. Para ter-se cabal idéa da differenciação a que chegaram, distanciando-se pro- gressivamente, os povos da America dos povos mediterrancanos, bastante fóra que se confrontassem as cabeças esculpidas nos baixo-relevos do palacio de Palenque ou os craneos das mumias dos antigos chefes Aymaras de Titicaca e de algu- mas necropolis andinas com as cabeças das mais bellas estatuas da Grecia. A conformação necanderthaloide e, em certo grau, prognatha dos craneos da- quelles antigos americanos, offerece realmente o amior contraste com o perfil ultra-orthognatha do typo mais perfeito qne sonhara ou idealisára o engenho gre- go, mas que nunca tivéra, para o seu exagêro, modelo eficiente na raca humana. Deste confrontro deduz-se immediatamente que toda a perfeição dos referidos ameri- canos consistia na depressão ou inclinação anterior do craneo, ao passo que a dos hellencos exigia o maior desenvolvimento na região frontal e parietal da caixa crancana. A qual destes dous typos poder-se-ha em rigor conceder a palma da supre- macia? 1 «A cabeça deprimida era considerada entre muitas tribus da Columbia como um signal de nobreza e de independencia. ; Bancroft, The Native Races of The Pacific States of North America. Vol, VI, pag. 180 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 1 Anteriormente ja expendi o que, a meu ver, devia ser o bello absoluto, o ver- dadeiro bello. Consideremos, entretanto, por um momento, sob o ponto de vista elhnologico, o sentimento deste grandioso attributo da Creação e, certo, reconhe- ceremos que o bello é inquestionavelmente relativo ao povo em que o apreciam e de cujo caracter faz essencialmente parte, pois que parece haver em todos os homens uma tal ou qual admiração para os traços caracteriscos que mais par- ticularmente dislinguem os seus antepassados ou antes 05 seus conterraneos, como já o notou Iumboldt, e que por uma lei radical de sympathia e affinidade na- cional não sómente admiram e venceram sobremodo esses caracteres sinão que vão ao ponto de exageral-os por toda a sorte de artifício, ao qual força é accrescen- tar o artifício da selecção sexual, porque natural é que tanto mais facilmente se requestem bellezas typicas dessa plastica relativa quanto maior numero de attri- butos se houverem reunido em um mesmo indivdiuo. A platycephalia americano, por exemplo, à que pouco antes me referi, nada mais deve ser do que a imitação em elevado exagero dos craneos meanderthaloides dos velhos chefes, verdadeiros semi-deuses, figurados na esculptura e na pintura dos monumentos, e representantes das raças primitivas,* assim como a cabeça do Apollo de Belvedere é, como sabemos, o exagêro da face orthognalha daqueles Pelagios de quem deziam os Gregos haverem herdado seus mais nobres caracte- res physicos e moraes. Ninguem ignora que as mulheres da Africa meridional são aos olhos dos ho- mens de seu paiz tanto mais elegantes e graciosas, ou, porque sejamos mais ri- gorosos no sentido de nossa phrase, tanto mais lascivas e Lentadores quanto mais stea- topygas sc manifestam, e que sendo naturalmente essas as que mais se reproduzem porque mais depressa se casam, ? a ampliação adiposa com que sº aprouve a natureza de lhes entufar as nadegas não desapparece de uma a outra geração, mas ao contrario mantem-se perfeitamente e até certo ponto, em virtude das leis da hereditariedade e da transmissão progressiva que dessas leis emana, vai-se em algumas tribus lentamente desenvolvendo. Os kalmukas, os polynesios e sobretudo os americanos que são ordinariamente im- berbes praticam com o mais rigoroso escrupolo a depillação da face, extrahindo os raris- simos pellos que lhes ahi despontam, ou porque seja isso um preceito religioso, transmit- 1 As tribus que povoam Nicaragua consideravam em grande honra o uso da cabeça chata e acre- ditavam que lh'o haviam transmittido os proprios deuses. Bancroft, op. cit. VII pag. 731. ; : * « Burton, que tão particular e minuciosamente occupou-se dos povos africanos, diz que os Somalenses pa escolherem noiva collocam c* candidatas em fileiras e tomam aquella que a tergo apresenta maior saliencia. 112 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL « tido de geração à geração, ou por natural e invencivel repugnancia, * ou talvez para conservar em toda a sua pureza integridade o typo indigena, como mais me inclino a presumir, fundado no que sei dos habitos dos autochthones do norte do Brazil. Entretanto, ao contrario desse preconceito contra o uso da barba, alguns insulares do Pacifico, os Fidjios particularmente, * apreciam sobremaneira a cara abastosamente barbada e empregam, no intento de possuirem abundante barba, quanto artifício lhes cabe em posse para a satisfação dessa vaidade. A maior diversidade de apreciação oude gosto existe egualmente entre as nações barbaras e semibarbaras de todo o Globo, e neste assumpto ainda me sinto inclinado a acreditar no espirito imitativo por vezes exagerada em que as- senta essa sorprendente diversidade De todas as praticas conhecidas, porém, nenhuma parece adaptar-se mais a este meu ponto de vista do que o cabello usado sómente no alto da cabeça, como o trazem algumas nações americanas, especialmente do norte do novo con- tinente e quasi todas as nações indigenas do extremo oriental da Asia. E evidente que essa porção de cabello, quér seja uma trança enrolada em spiral, como a vemos nos chinezes, quér seja uma curta madeixa atada pela base, como a usam os americanos das montanhas rochosas e de grande parte da região NO da America, e ainda muitos africanos da costa occidental, não póde deixar de desenvolver apparentemente a altura da cabeça, exagerando-lhe ao mesmo tempo a fórma pyramidal. A tatuagem, * comquanto saibamos ser modernamente, um adorno e muitas vezes brazão, pergaminho hierarchico ou uma especie de fé de officio de quem a traz inscul- pida na pelle, não deixa de ser tambem, a meu ver, uma prova de apreço tributado ao colorido vigoroso dos antepassados que constituíam natural e provavelmente raças de t « Os Nova-Zelandezes, que em tantos caracteres anthropologicos e ethnologicos assemêlham-se aos nossos aborigenes, tem por habito e quasi que por mandamento irrecusavel a depillação completa da face pratica essa tão antiga e arraigada entre elles que nisso teve naturalmente origem o ditado alli cor- rente : «Em vão porcure mulher Homem que barba tiver. » * As cabelleiras enormissimas dos Fidjios que estes selvagens têm por inveterado costume promover a verdadeiros monumentos capillares, pelo esmero com que as adornam e artificialmente as ampliam, podem reprensentar, ainda sob o mesmo ponto de vista à que me refiro, uma lembrança da grenha hirsuta dos primeiros incolas daquellas ilhas. Pelo que nos informam acreditados viajores ha ainda maior esmero entre algumas nações do norte na Africana composição ou ornamentação da cabelleira sendo nessesario, para DR da feitura de algumas carapinhas, nada menos de 10 annos de constante trabalho e de apurada ervação. - 3 A exemplo do que fizeram outras linguas póde muito discretamente a portugeza nacionalizar esta palavra que tem origem no verbo polynesico tatu que os inglezes escrevem tattoo e que significa exacta e literalmente: acção repetida de gravar ou insculpir a pelle. Os Nova-Zelandezes dão a tatuagem da face o nome especial de moko e o de vacaro à tatuagem do resto do corpo. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 113 cor mais sombria, ou, para que melhor expressão tenha o meu dizer, um disfarce attenuant? para as côres claras que fóram progressivamente adquirindo os povos aclualmente de côr branca ou amarella. Verdade é que a tatuagem é geralmente usada por muitos africanos de côr negra, sem applicação das lintas esturas empregadas na tatuagem daquelles supra-referidos povos, tudo, porém, nos induz a erêr que este singular costume não teve origem n1 Africa, mas no solo asiatico ou na Polynesia donde o tomaram provavelmente os antigos povoadores da Asia occidental e em parti- cular os hebreus, em cujas tribus vemos empregada essa barbara ceremonia, como o attestam muitas passagens do Levitico, de Jeremias e de Isaias. ! Convém notar que si alguns africanos, pela sua côr negra, não empregam as substancias corantes da tatuagem dos povos de tez amarella ou vermelha, usam em compensação, da tatuagem mais bar- bara de quantas são até hoje conhecidas, isto é, da que é feita por incisões profundas com applicação immediata de chlorureto de sodio e de outras substancias irritantes ou causticas, processo singularissimo de que resulta essa especie de crista formada por saliencias mamilliformes que apresentam na testa e no nariz os negros da nação Mu- nhambanha ? tão conhecida entre os nossos escravos africanos. Em tres categorias distinctas poderiamos classificar tão singular e entretanto tão geral usança. A primeira, — de que temos exemplo nos Munhambanhas e que comprehende as incisões mais profundas, acompanhadas da inoculação de substancias irritantes para a formação de protuberancias mamilliformes ; A segunda, — e a mais commum entre os povos barbaros, consistindo na incisão da pelle, simplesmente, ou com a addicção de materias corantes; A terceira, finalmente, a mais simples e a que ainda hoje se observa em muitos mistiços civilisados, descendentes dos primitivos barbaros, comprehendendo a inocu- lação hypodermica de materias corantes. Todas estas especies de tatuagem parecem ser de uso peculiar a todos os povos selvagens ou semi-selvagens que vivem na zona torrida e em latitudes proximas desta zona. Sabemos, porém, que na Siberia tatuam-se pela inoculação hypodermica, de materia corante, além de certas classes de homens, as mulheres ostiacas, nos braços € nas pernas, de modo a simularem os adornos de que usavam as mulheres de uma grande parte da Asia. A tatuagem, na verdade, não é de todo estranha aos costumes do povo europeu que 1 Letivico XIX, 28. — Jeremias XVIII, 37. — Isaias, XVI, 16. ? Rugendas descreve esta nação com o nome de Ignambanha; alguns eseriptores e em particular Balbi que se soccorrem de sua autoridade, neste assumpto, reproduzem este nome com a mesma, ortho- granito; devo declarar que tendo mandado pronunciar a muitos africanos o nome em questão, ouvi-lhes izer claramente Munhambanha e nem uma só vez de qualquer outro modo. de W4 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL a exhibe em pratica mui seguida nas populações maritimas, não pela incisão da pelle, mas pela terceira categoria, si bem que limitada à representação de emblemas de fidelidade e de esperança, de alguns objectos de mera phantasia e mais geralmente das iniciaes do proprio individuo ou de algum ente que lhe seja caro. Mas nenhum povo levou nunca a tatuagem ao grão de supino refinamento à que chegaram os Nova-Zelandezes. O melhodo que ahi empregavam, e devem ainda hoje, empregar alguns fieis seguidores dos antigos usos de seus maiores, é o mais barbaro dos da segunda categoria, porém ao mesmo tempo o mais perfeito de quantos se conhecem, accrescendo que nas pessôas de alta estirpe as curvas reunem à maior elegancia a mais agradavel harmonia. E deste conjuncto de perleição e de significação nobiliarchica são prova as duas cabecas de chefes Nova-Zelandezes que possuimos no Museu Nacional e fôram offere- cidas por Jacques Arago. A quem houver lido o mais espirituoso que exacto auctor dos Souvenirs d'un Aveugle, escuso fôra lembrar o que destes objectos diz elle com exageração e verve de touriste, no tocante à sua estada no Rio de Janeiro. Um costume africano que parece ter tido egual origem, isto é, que supponho ter sido empregado por imitação de certa conformação natural entre remotos ante- passados, é o córte dos dentes incisivos superiores, não separados regularmente uns dos outros, como é de crêr os houvessem os referidos antepassados e como ainda 0: apresentam os modernos africanos por vicio organico hereditario e caracteristico de sua raça essencialmente prognatha," mas dando-se-lhes, com o habitual exagero desses 1 O prognathismo dentario ou alveolar é inquestionavelmente um dos caracteristicos mais notaveis da raca afrieana,. Attesta-nol-o muitas vezes a sua persistencia nos individuos cuja origem africana já nenhum outro caracter osteologico apparentemente a denuncia. Um facto digno de menção e que tem intima correlação com este phenomeno é o da persistencia do pigmento na cavidade buccal e em particular na mucosa da propria arcada alveolar dos individuos em que esta se apresenta refractaria à conformação orthognatha da raça branca. Esta pigmentação é muito mais persistente do que a da mucosa das papers: dos labios, das narinas e até a, em taes casos, tão preconisada, do tecido cellular da base das unhas, e não raro se mostra mui visivel quando a pigmentação destes tecidos já tem de ha muito desanDaROO. Ainda está por escrever-se todo um livro de transcendente valia sobre estas manifestações atavicas anatomico-physiologicas, observadas nos individuos que neste vasto crysolda humanidade, chamado «Ame- rica » dão curso em suas veias à fusão do sangue heterogeneo de quasi todas as raças humanas ou pelo menos de duas dessas raças : a branca e preta on a branca e a vermelha ou a vermelha e a preta ou ainda, e mais geralmente das tres simultaneamente. E” pela épocha da puberdade que em geral mais claro se manifestam os symptomas atavicos nas pes- soas mestiças, muitas vezes já de côr perfeitamente branca e tendo o sangue africano em adiantadissima diminuição nas veias. Neste caso toda a constituição do individuo soffre notavel alteração; além da pigmentação pronun- ciada nas regiões à que acima me referi e que se estende aos mamellões e aos orgãos reproductores de ambos os sexos, nota-se o desenvolvimento dos labios e das narinas, de par com o retrahimento do mento, o appare- cimento do cheiro acre e nauseabundo da transpiração axillar, denominado catinga, o encrespamento do cabello, o colorido mais vigoroso de toda a pelle e quasi sempre uma tal ou qual diminuição do proprio angulo facial. A todas estas modificações accresce pronunciada indolencia, apathia excessiva e profunda abstracção ou antes uma inacção intellectual que lembra muito particularmente a estupida inaptidão do negro. A esse abatimento, entretanto, antepõe-se um quer que seja de Jubrico, e um como desabrochar pujante de ei sensualidade à que só podem contrapór efiiciente dique os liames da mais vigorosa SeAgRO moral. Felizmente este que eu chamarei estado morbid» tem ephemera duração : todos os phenomenos que ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL LI usos imitativos, a fórma ponteaguda dos dentes dos peixes. Este máu e estupido costume foi transmittido ao Brazil, de envolta com tantissimos outros de egual desmerito, ! pelos escravos africanos que por mais de tres seculos nos ensom- braram os horizontes do Oriente donde só nos deveria provir, com os raios do sol desponte, a luz civilizadora da culta Europa; e si em nossas provincias me- ridionaes mui raros exemplos apresentam-se-nos de tão barbara pratica, outro tanto não me é dado dizer a respeito das provincias septentrionaes c especialmente do sertão inteiro daquella parte do Imperio onde o córlio dos dentes incisivos 6 0 principal adorno dos dous sexos. o acompanham vão-se aos poucos modificando, e, ou totalmente desapparecem, ou deixam apenas vislumbre de sua passagem no organismo. Assim é que em muitos individuos que manifestaram entre os 1£ e 16 annos quasi todos estes indícios de atavismo, vemol-os desapparecerem depois dos 20 annos, inclusive o proprio encrespamento e aspereza do cabello, na maior parte dos casos tão tenaz e tão rebelde caracteristico da origem africana. O atavismo nas pessoas de origem indigena é de caracter muito mais fixo e portanto menos su- jeito a esta influição da puberdade, denunciando-se, por assim dizer, desde o berco. Accresce que em taes individuos, manifesta-se, caracterisando-lhes o atavismo, não a féra animalidade dos primeiros, mas quasi sempre uma tal ou qual perfectibilidade de caracter moral e um desenvolvimento intellectual qe vem garantindo desde a mais tenra infancia do joven individuo, o homem laborioso e honesto que ha de dahi sahir para arrimo da familia, para beneficio da patria e para o bem geral da “- humanidade. Este atavismo é o que me parece perfeitamente caracterisado em um dos actuaes e melhores empre- gados do Museu Nacional, o Sr. João da Motta Teixeira, pelo lado paterno, radicado nas mais distinctas “- familias de Minas Geraes, porém descendente por sua avó materna do famoso chefe aborigena dencmi- nado « Tebiriçá, » cujo nome acha-se enlaçado ás primeiras luctas da invasão portugueza no Brazil. No Sr. Motta Teixeira observa-se além da conformação do craneo muito mais indigena que europeu, o colorido vigoroso e característico da pelle, a inclinação dos olhos, a saliencia dos malares e mais que tudo “— o mais notavel dos caracteres do atavismo indigena : o cabello negro, liso e rebelde a qualquer incur- vação. A estas observações acrescentarei uma reflexão à que poderão dar talvez um grande desenvolvimento os anthropologistas que se houverem de occupar de tal materia, e é que, em relação aos mistiços oriundos da raça branca com a preta, mostram-se elles ordinariamente mais intelligentes que os mestiços resultantes da juncção do sangue branco ao sarígue americano, ainda que menos reflectidos, menos methodicos, no que produzem, e, si me é permettido dizel-o, menos equanimes. Notei até por vezes que nas familias mistiças da primeira categoria, em que os caracteres africanos denunciam-se em manifestação atavica, n'um certo individuo, mais do que em seus ermãos ou primos, da-se o interessante phenomeno de ser aquelle individuo o mais intelligente representante da familia, ou de se concentrar na sua individua- lidade qualquer aptidão artistica, imaginação mais ardente, uma, siquer, mais viva e mais prompta percepção. Keliz e providencial compensação para a victima do atavismo que mais o é dos despeitos de seus proprios pais e ermãos cujas pretenções mais ou menos infundadas a uma brancura, ás vezes duvidosa, fóram por aquelle natural phenomeno inteiramente burladas. Quantas suspeitas de infidelidade conjugal, quantas desgraças não evitaria a Sciencia, si houvesse transmittido ao povo conhecimentos relativos a estes assumptos, a tantos respeito, curiosos |! Termino esta nota para sobrea qual chamo a attenção do Dr. Lacerda Filho, o iniciador dos estudos anthropologicos no Museu Nacional, que o mesmo é dizer no Brazil, acrescentando que estes casos de ata- vismo e especialmente de atavismo africano, são muitas vezes provocados pelos casamentos consaguineos, e que é sobre as consequencias dessas uniões, tão frequentes entre nós, que deve elle procurar estudar este importantissimo assumpto em que mal e incompletamente me aconteceu aqui tocar. t Depende ainda de definitiva solução o reconhecer-se a qual das duas raças, á preta e à vermelha, devemos nós maior cópia dos habitos hoje inveterados na população brazileira e mais particularmente na do norte do Imperio. Posto que muita côr local de taes habitos nos tenha sido transmittida pelos autochthones força é confessar que a maior das praticas dos nossos sertanejos é puramente africana e em abono a verdade, confesso que si muitas dellas, si quasi todas, direi, são com efeito deploraveis, algumas feliz- mente, adaptaram-se ás necessidades do nosso povo, atalhando-lhes os effeitos ou dissipando-as inteira- mente. Está neste caso, cuido eu, o uso dos saccos de couros, muito mais perfeitos, que as bruacas, e empre- gados pelos sertanejos do Norte para o transporte de liquidos : azeite, mel, e sobretudo agua, no extenso percurso das aridas e por vezes inhospitas planuras que medêam de suas longinquas fazendas às popu- lações do littoral. ) Este uso foi-lhes transmittido pelos africanos do Sul, onde a manufactura do couro applicada ao vasi- lhame é a industria mais desenvolvida daquellas povoações barbarescas. 116 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Achando-me ultimamente (Dezembro de 1877) sobre o curso inferior do rio S. Francisco, em contacto com mais de quinze mil individuos famintos e andra- josos que o flagello da sêcca para alli arrojára do centro das mais proximas provincias, observei que, de quinze annos para cima, a proporção dos individuos de dentes inteiros para os que se haviam sujeitado ao córte dos incisivos era mais ou menos de um para dez, sinão para mais, tão raras me pareceram as excepções áquelle tão inutil ou tão nocivo ! e inexplicavel costume. Como era e ainda hoje deve ser praticada a operação entre os africanos, não sei eu dizel-o; como a praticam, porém, os nossos sertanejos conhece-o todo o povo e de mais o sabe aquella pobre gente, pois que não ha em tal mister nem officiaes, nem mestres, nem licenciados, que tudo isso são todos elles, n'um tão commum e popular officio. Uma navalha tangida uma chave, eis todo o material em- pregado, eis todo o apparelho profissional e a um tempo todo o seu artifício. Com dous golpes aguça-se um dente; oito golpes, portanto, sós, são bastantes a mutilar para sempre na bocca da graciosa filha do sertão esse fio de perolas com que o Creador se aprouve de lhe aljofrar o candido sorriso e os labios col- larinos. Posto que bem selvagem nos pareça semelhante costume que não só per- tence a uma grande parte da Africa, mas tambem a algumas ilhas polynesicas, por muito mais barbaro reconhecemos o habito que têm algumas nações africanas de arrancarem os mesmos dentes incisivos superiores e mais geralmente os inferiores. Acreditam alguns viajores e naturalistas que ellas assim o fazem para se não assemelharem às féras, em particular à Hyena e ao Chacal, e com quanto isso mesmo o aflirmem os proprios africanos, interpellados acerca de habito tão excentrico, quer me parecer a mim que não tivesse nunca elle semelhante origem, e que unicamente pela natural e profunda ignorancia dos africanos e pela completa carencia em que jazem da sciencia tradiccional de seus antepassados dêm aquelles selvagens uma tal interpretação à ablação que fazem de seus incisivos. Neste particular, assim como em tantos outros assumptos que dizem respeito às Sciencias Naturaes, ha um só methodo de que nos devemos soccorrer, uma só lampada para nos allumiar no caminho tenebroso das incertezas e das duvidas, quando não da completa ignorancia: é o methodo da analogia na funcção ou na acção e o da homologia no orgão e na fórma. Este methodo de tamanha e tantas vezes de tão explendente proficuidade no estudo do mundo organico, autorisam-nol-o ou acon- selham-nol-o os mestres e justificam-nol-o os mais brilhantes exemplos. t Tenho por nocivo o uso do córte dos dentes, tão geralmente admittido no povo do centro e do norte do Brazil, não sómente pelo damno que dahi provém à conservação dos mesmos dentes, pois que lhes inutilisa a maior parte do esmalte, sinão tambem porque a essa deformação artificial é devido o sibilar continuo e portanto inconveniente do fallar datuálie povo. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 119 Ora, si, em virtude de tão util preceito, cogito de achar entre os selvagens americanos, que tão admiravelmente apresentam todos os costumes dos povos primi- tivos do velho mundo, a explicação daquella singularissima deformação artificial, para logo se me depara ella muito aflin ao uso dos ornatos que pendem dos la- bios de algumas tribus americanas e em particular e notabillissimo exemplo, dos Botocudos que destes mesmos ornatos (botoques) receberam a origem de seu ap- pellido. O uso constante do botoque de madeira, dos cylindros de pedra c de resina, e de tantos outros adornos que trazem os nossos aborigenes pendentes dos labios, acaba por destruir as paredes externas dos alvéolos dos incisivos, destruindo tambem por fim a estes proprios. E um facto este ja de ha muito e por muitos viajores observado, accrescendo achar-se até descripto e figurado na Reise an Brazilven do Principe M. de Neuwied. No continente africano o mesmo botoque com todas as variedades de fórma e de substancia é ainda hoje usado e sabemos que muito mais o foi outrora, « pois muito é de crer que alli se tenha dado em vasto exemplo o mesmo caso de deformação. Ponderemos agora que só aos individuos edosos vem a succeder este accidente, e que sendo a velhice entre os povos primitivos, de ordinario, pelo seu caracter patriarchal e auctoritario, 0 modelo e o exemplo apontado e seguido nas praticas da juvenilidade, natural é que fosse aquella deformação imitada e preconisada, a principio, pelo sentimento de respeito, mais tarde e aos poucos, pelo habito, pelas exigencias da moda, pelo sentimento finalmente de um bello relativo, de um bello horroroso e detestavel. E si assim posso eu explicar um tão singular phenomeno, si, no consenso de quantos me houverem lido, parecer ser essa a unica, a verdadeira origem da ablação dos incisivos inferiores, ainda actualmente posta em pratica por alguns africanos, entre os quaes nem sempre se encontra o uso primitivo do botoque ou do tembetá, como lhe chamam os nossos aborigenes, duplo será para mim o prazer que me provém dessa acquiescencia; duplo, porque além da aceitação da hypo- these à que me reporto, mais rigorosa resurge a these que levo em mira nestes apontamentos a cujo principal assumpto ficaria alheiado esse caso relativo à ablação dos incisivos, ou pelo menos só se lhe prendia pela rama e não pela raiz, como agora se lhe prende, explicada do modo por que acima o expuz Na verdade, se o motor unico da deformação da cabeça e mais geralmento da face humana foi, como me parece, a imitação do prognathismo caracteristico do typo primitivo e de alguma sorte pithecoide dos primeiros representantes da humanidade, é evidente que tem cabal e eficiente explicação tudo quanto nas praticas dos povos selvagens exagere o desenvolvimento dos labios, das azas e do septo do nariz, dos lobos das orelhas, da parte inferior da face, em fim, e que, portanto, o re- 118 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL lrahimento das maxillas, em virtude da extracção dos incisivos, achar-se-hia em com- pleto desaccordo com a lei aqui baseada na observação. Mas a explicação acaba de ser dada a tal respeito, e por ella não sómente deixa de haver esse desaccordo sinão que até a supposta excepção submelte-se perfeitamente à referida lei, constituindo-se-lhe uma consequencia immediata e de maxima valia. III Tembetá (de Tembê, labio e ati pedra) parece ser o nome com que era especialmente conhecido entre as nações americanas cisandinas o adorno de pedra, de gomma — resina e (entre os Chiriguanos) de metal, que lhes pendia do labio. A rodella de madeira que usavam e ainda hoje trazem os botocudos, mettida no labio inferior, é chamada, na lingua barbara daquelles selvagens, em grande parte anthropophagos quimua, quimui ou qnima,! e a que lhes pende das orelhas Guimatá. Quasi todas as nações que povoaram a America tinham por adorno usual o tem- betá. Ou fosse de pedra ou de resina e de madeira,? ou o trouxessem simplesmente re- presentado por uma penna de ave, à qualquer titulo estimavel, eilas ligavam a esse adorno o mais alto apreço, e parece que si para algumas tribus era elle o symbolo da virilidade, da força e da bravura, para outras, representava um tal ou qual em- blema tradicional de distincção de raça ou de qualquer caracter à que se associava egual importancia. Unicamente entre algumas tribus da Columbia encontra-se o adorno facial desligado de uma qualquer distincção.? Em Guatemala a perfuração do nariz, do beiço e das proprias orelhas só era permittida aos reis, visto como tinham-se alli por insignias da realeza os ador- nos destas partes da cabeça. Entretanto, tribus haviam e ainda hoje existem para 1 Os botocudos vão abolindo o uso do botoque no labio, sendo actualmente mui raro encontrar este adorno entre as varias tribus que ainda povoam as florestas littoraes da provincia do Espirito Santo e do sul da Bahia. Unicamente em alguns velhos, póde-se ainda observar o labio não sómente rasgado mas até separado em dous fragmentos que elles costumam ligar por meio de um atilho destinado egualmente a suster à rodella de madeira e mais frequentemente a cuia com que a substituem os mais antigos da tribu. Os homens de 30) annos para baixo apresentam apenas o labio fendido, como que indicando pavor lhes chegado já um pouco tarde o influxo da civilisação para impedir que lhes mutilassem a ace. 2 Os Koniagas perfuravam o labio inferior e o septo nazal para adornal-os com varias conchas, nú ri de ambar, botões, pregos, contas e quanto lhes póde servir no contento de um tão caprichoso adorno. : As mulheres especialmente, usando e abusando de tal pratica, não só perfuravam o labio e o septo do nariz mas tambem as proprias faces como o faziam os nossos tamuyas. As mulheres em geral usavam unicamente de dous adornos, mas as que pertenciam ás classes mais elevadas tinham por costume trazel-os em maior numero. Bancroft. Op, cit. Vol. T. pags- Y2— 78. 3 Bancroft Op. cit. Vol. T pag. 159. 120 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL as quaes os adornos do nariz e do labio são verdadeiros mantos de pudicicia, folhas de vinha que lhes exije ou aconselha o pudor.! Fosse, entretanto, qual fosse a idéa que se alliava, entre semelhantes homens ao uso inveterado do tembetá, é certo que nenhuma tradição lhes dava a conhecer pelos sempre tão attendidos quanto autorisados labios de seus tucháuas e payés, a verdadeira origem desses appendices posliços. Os proprios autochthones do Mexico, que tinham alcançado tão elevado grão de civilisação e que tão desligados se mostravam, em muitos pontos, das usanças dos demais americanos, não foram isentos do atavio do tembetá. Elles o empregavam, porém, quasi sempre, com o cylindro de pedra enfiado no septo nazal, e nisso quer me parecer que mais se approximavam dos povos africanos, indiaticos e polynesicos com os qua:s sabemos hoje que por outros lagos ethnologicos egualmeate se prendiam. E, na verdade, muito é para notar-se que, usando primitivamente todos os povos do Globo de adornos que tendiam a desenvolver-lhes a base da cabeça, avolumando- lhes os lóbos das orelhas, as azas do nariz, o labio e a maxilla inferior, houvesse desde todo o principio uma tal ou qual delimitação na selecção de taes adornos entre as nações que povoavam a America cisandina e as do resto do Globo. Assim é que sendo de uso geral o adorno do Jabio entre os selvagens desta parte do continente americano, dos quaes apenas rarassimas tribus traziam-n'o, ou conjunctamente, ou de preferencia ao nariz, nota-se que ao inverso desta predilecção pelos adornos labiaes, serviam-se commummente os povos africanos, indiaticos e polynesicos dos adornos nazaes, constituindo-se umas como excepções ao geral das in- numeras nações daquelles paizes, as tribus em que se encontram individuos com os labios incisos. Resta saber agora si é este um caracter ethnologico de perfeita distincção para os referidos povos. Verificada que seja a delimitação que acertei assim de aven- turar, e attendida ao mesmo tempo a particularidade de se approximarem muito menos, neste ponto, os mexicanos e os seus vizinhos septentrionaes, dos americanos do sul, do que dos povos primitivos da Asia, não teriamos por ventura nessa delimi- ! As mulheres de certas tribus da America do Norte sentem-se offendidas em seu pudor ao apre- sentarem-se sem o tembetá no labio. « This custom is evidently associated in their minds with womanly modesty, for when La Pérouse asked them to remouve their block, some refused; those who complied manifesting the same em- barrssment shown by a European woman who uncovers her bosom. » Bancroft. Op. cit. Vol. 1. pag. 100 - « Trovandomi una volta in mezzo a molti chirignani seminudi offrii, loro del denaro, perchê alcuno di essi mi vendesse la sua tembetá, ma nessuno voleva risolversi a questo sagrifizio. Aumentei Nof- ferta, e finalmente Vaviditi potê piú che il pudore: e uno di essi non senza dolore si tolse la tembetá, coprendosi subito colla manc il foro inverecondo. Tutti ridevano di lui e si vedeva chiaramente che era creduto da tutti i suoi compagni in una posizioni molto ridicola. Uno pid pietoso tolse da una ão un turacciolo di legno e glielo offerse perchê si coprisse V'apertura, ciô ch'egli fece con somma .-» P. Mantegazza. Rio de la Plata e Tenerife. Viagi e etudi. pag. 49. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 121 tação um tal ou qual apoio para acreditarmos na fusão que parece ter havido de elementos asiaticos naquella parte da America ? Não cabe, sei-o eu, e de boa mente o confesso, na orbita desta nota, travar de tão. intricado e subido assumpto qual este é. Aventuro apenas a proposição de que si os Toltecas não fóram, como é de crêr que fossem, individuos emigrados d) extremo Oriente e que invadiram a Cordilheira, depois de se haverem demorado largos annos no continente americano, ao norte do Mexico, parece que com mui vigorosos indícios de probabilidade deviam têl-o sido os Aztecas, invasores ulteriores áquelles e que em suas pinturas e esculpturas, demasiado pesadas pela profusão de complicadissimo lavor, representam muitas vezes individuos com adornos nazaes. O calendario mexicano, por exemplo, esse monstruoso mas engen hosissimo symbolo dos conhecimentos astronomicos dos Aztecas, cuja decifração deu tão im- probo trabalho quão fulgente gloria ao genio investigador de Humboldt, figura no centro do disco zodiacal uma cara imberbe, com a lingua fóra da bocca e pendente, e com um adorno enfiado no septo do nariz. Este adorno parece um cylindro egual aos de que usam alguns polynesios e africanos, cylindro que mais facilmente, do que nas gravuras impressas do referido calendario, póde-se verificar no fac-simile que delle possuimos no Museu Nacional. A fusão que presumo ter havido entre a raça autochthone da America e essa outra invasora, póde a justo titulo basear-se na propria simultaneidade do uso do adorno nazal com o do adorno labial, facto este de que vemos um notavel exemplo nos Mexicanos, como já o disse, nos Koniagas e em muitas tribus da America do Norte. Nas ilhas Aleutas, que parecem ter servido de estação intermediaria aos povos que emigraram do extremo oriental da Asia para o extremo occidental da America, o uso dos adornos faciaes participa ainda desta promiscuidade, mas com uma certa distincção, a distincção sexual. Os homens, daquellas ilhas trazem adornos de osso, mettidos no nariz, e as mulheres nolabio. Na Asia e na Africa não sómente usavam de cylindros enfiados no septo nazal mas tambem de anneis que ainda hoje trazem pendentes do mesmo septo nazal, or- nados de pedras finas, as mulheres de Kattiavar, e ou simplesmente de prata ou de ouro, as da Nubia e as raparigas de Zenzibar, sendo que neste uitimo paiz, pela sig- nificação de seu nome, phélé-iapuca, « annel do naris », bem claro se mostra o destino que ahi lhe dão. Isaias e Ezequiel referem-se, na Biblia, ao uso geralmente seguido, em seu tempoe, dos anneis pendurados ao nariz; e quero crêr que da Asia occidental se houvesse esse costume transportado para a Europa, si é que, como é de presumir, já ahi se não tinha simultanea ou anteriormente estabelecido . De tempos prehistoricos sabemos nós que os selvagens europeus passaram, 122 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL mais ou menos, por todas as phases ethnologicas dos povos primitivos, e que durante a edade megalithica, fabricaram machados e pontas de flexas de pedra, ! em tudo identicos às de todos os mais povos barbaros, prehistoricos ou actuaes. Que na, que é hoje, cultissima Europa desenvolveu o homem primitivo as praticas mais barbaras dos mais barbaros selvagens actuaes, estão de continuo a nol-o denun- ciar os corpos de deliclo encontrados nas cavernas, como noi-o provam, não menos ellicaz e sobejamente, certos habitos ainda hoje conservados na Europa entre o povo rude de algumas das localidades mais esquivas à civilisação das capitaes e das provincias mais adiantadas. , Em caso tal quer me parecer que se acha 0 uso, que poderei denominar actual, da compressão artificial do cranco das crianças, na propria França, com o emprego de meios, si menos barbaros, com certeza, tão eflicazes como ces que são ulilisados na platycephalia dos Cambebas e das outras nações de que já fiz precedentemente menção. Esta pratica singular que pela publicação de A. Foville: Sur Vinfluence des vétements sur les organes et la deformation du crâne» existe no povo rustico da Franca, não é de todo extranha a certo numero de nações civilisadas, ainda que no mesmo gráu de modificação em que alli existe, relativamente ao achatamento pri- mitivo d'onde teve elle origem. E, pois, si tão barbaros eram os homens primitivos do solo europeu como os mais ferozes selvagens actualmente conhecidos, si usavam do achatamento artificial de seus recem-nascidos, si empregavam a tatuagem na sua verdadeira e plena fe- rocidade, si era-lhes vratica habitual o anthropophagismo, por superstição ou espirito de vingança, si tiveram por antepassados individuos proximos parentes do homem de Canstadt, si o typo neanderthaloide, à que se radicavam esses antepassados, era- lhes modêlo de perfeicão e talvez objecto de subida veneração, não parece muito natural que houvessem elles tambem tido os adornos do nariz e do labio, adornos que tão de prompto Jhes davam à face um simulacro do desenvolvimento daquellas cabecas pilhecoides ? Tenho para mim que si forem conduzidas para sobre este terreno as invesli- gações dos archeologos modernos, a quem tão sorprendentes revelações já devemos * Nenhum paiz da Europa deixou ainda de apresentar aos olhos des Geologos e dos Archeologos vestigios dessa antiga e geral industria. As gran des escavações antigas, praticadas nos depositos de giz e tomadas por tumulos primitivos sabemos hoje que as fizeram os selvagens europeus para a extracção do silex necessario ao fabrico de suas pontas de flechas. Este facto, foi não ha muito, averiguado por Mr. Greenwell sobre os suppostos tumulos de Grimes, na visinhança de Brandon, os quaes eram pocos de 20 a 60 pés de diametro e cuja quantidade em numero de 254, attesta, só por si, com bastante eloquencia, a importancia de tal indus- tria. Vide Sir J. Lubbock — O Homem Prehistorico. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 123 a vespeito dos habitantes das cavernas da Europa, coevos do Mamoulh, do Ursus spelous e da Hyena spelea, não tardará muito que se não encontre mais esse fraco de parentesco entre aquelles selvagens e os homens prehistoricos das outras regiões do Globo. Tendo chegado a fallar deste assumpto, permitta-se-me ponderar que os pequenos discos, furados no centro e encontrados nas Ilhas Brilannicas, na Allemanha e na França e que figuram entre os adornos pessoaes das collescões archeologicas de al- guns museus europeus, muito me tentam a acreditar quo nada mais fossem do que enfeites que os homens primitivos daquellas regiões traziam pendentes e presos ao septo nazal, por meio de um atilho de fibras corticaes, do mesmo modo por que ainda hoje se adornam alguns barbaros modernos. Não antecipemos, porém, conclusões à que teremos de chegar sómente con- duzidos pelos descobrimentos da Archeologia. Restrinjamo-nos, por emquanto, na orbita das hypotheses, e desta mesma orbita colhamos apenas o que mais irre- cusavel nos parecer ou nos auctorisar a crer a observação dos habitos, a similitude das inclinações e finalmente a analogia dos caracteres elhnographicos dos selvagens actuaes. No tocante ao tembetá, é claro que nenhum povo levou mais longe o encarecimento de tal adorno do que essa grande nação dos Tupinambás à que se filiavam os Tamuyas e os Goytacazes de que é apenas um resto insignificante a familia denominada hoje dos Botocudos. A rodella de madeira que trazem ao beiço estes selvagens, com o nome de kimua ou qnima, como lhe chamei à pagina 119, é evidentemente um simulacro do tembetá, e não de qualquer tembetá, sinão do das mais graciosas fórmas conhecidas, do da mais bella especie mineral escolhida por homem sel- vagem para seu adorno, e para joia peregrina de sua vaidade, neste ponto, tão humana ! Joia, disse eu, e bem acertada me parece a denominação com que assim classifiquei o tembetá da tribu goytacáz, tamuya, tabayára! ou de qualquer outra que se haja fundido ulterniornante nas familias nomadas que percorrem hoje, aviltadas ou de todo embrutecidas, a feracissima zona florestal, cujo solo banham, do Sul ao Norte, os rios Itapemirim, Doce, S. Matheus, Mucury, Jequitinhonha e e de Contas. 1 Estas tribus que povoaram regiões limitrophes e, muitas vezes, promiscuamente, a mesma região tinham proximo parentesco entre si, como o indicam seus proprios appellidos: Tupy, que se filia ao nome Tupá e significa a tribu mai ou a progenitora; Tamuya, á que se chamou depois « Tamoya » cuja etymologia lembra ancianidade ainda mais remota, pois traz em si mesma os caracteres avoengos que se irrogavam os Tamuyas; Tupinambá, exprimindo, por sua propria natureza, a analogia que tinha aquella tribu com a dos Tupys, e Tabayara ou Tobayara, que com quanto signifique particular- mente « habitante de aldeia »ou « povoador da face da terra », tinha o sentido virtual de « cunhado. » Quanto aos Goytacazes eram descendentes de nações ermãs da dos Tupinambás e dizem alguns autores que faziam parte dessa propria nação. Certo é, porém, que cada qual daquellas tribus pretendia des- cender das mais antigas e mais nobres nações, e disso mostravam-se todas muito occupadas, no qeu são aquelles semi-brutos imitados, em largas proporções, pela maior parte da gente civilisada. 124 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL E que o tembetá à que especialmente aqui me refiro, qualquer que fósse, Ventre as nações supramencionadas, a que o linha por adorno, não era o simples cylindro de quartzo opaco tão usado, com egual fim, pelos indios de Goyaz e de Maito-Grosso ou pelos antigos povoadores do valle do Prata; o tembetá de que trato e de que é grosseiro e imperfeitissimo arremedo, em madeira, o kimua dos botucudos, é um gracioso artefacto de feldspatho de côr verde esmeraldina, com dupla face (Estampa VIII, figura 1, 2, e 3); uma, externa perfeitamente circular e que devia apparecer por fóra do labio, entre este e o mento, simu- lando uma grande medalha de cobre que se houvesse oxidado, outra interna ligeiramente concava, eliptica adaptando-se à arcada alveolar inferior. Este adorno que pelas suas enormes proporções, figuradas na mesma estampa, em tamanho natural, parece haver pertencido a um individuo de alta e larga maxila, era infiado na fenda do labio inferior exactamente como um botão de punho na respectiva casa, distendendo o labio do modo por que o representa a figura xvlographada nesta pagina. Nesta figura tentei reproduzir a alteração que devia offerecer o labio ataviado com tão singular quanto incommodo enfeite. E” o mesmo aspecto apresentado pelo labio dos botocudos adultos, na ma- xima distensão do tecido labial, ornado pelo kimúa, mas estando a bocca fechada. Rugendas e o principe Maximiano de Neuwied, como todos os escriptores que, depois delles, procuraram figurar a face do botocudo, neste mesmo caso, copiaram fielmente o Jabio do botocudo com o kimúa na mesma posição em que este objecto é o verdadeiro e fiel simulacro do precioso tembetá, de cujo estudo aqui me occupo. Em geral qualquer, que fósse a natureza ou fórma do adorno Jabial usado pelos barbaros, começavam os anciãos da tribu por furar o Jlabio inferior aos meninos com um espinho, osso ponteagudo ou dente perfurante de alguns ani- maes, dilatando depois, a pouco e pouco, o pequeno orifício, ao passo que o me- ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 125 - nino ia crescendo. Esta ampliação effectuava-se com o uso de tembetás de varios tamanhos, empregando-os por escolha, em augmento progressivo, desde os mais delgados, para os primeiros annos do neophyto (que assim se me permitta de- nominar a individuação de um verdadeiro baptismo de sangue) até os mais volumosos tembetas, como os traziam os guerreiros, na sua completa virilidade- A perfuração do labio era para algumas tribus verdadeira ceremonia reli- giosa, em alguma cousa ou até em certo ponto, analoga à antiga circumcisão. Praticavam-n'a sobre os meninos que attingiam a edade de 7 à 8 annos,! isto é, na phase tambem, para nós, de iniciação no sacrifício da penitencia, sendo para notar que a mesma seja, essa quadra da vida, entre todos os povos pri- mitivos, a preferida para a iniciação do homem no mundo moral, como si os mais barbaros povos que habitaram o Globo houvessem possuido a presciencia do que veiu a chamar-se depois psychologicamente o sentimento da razão, o conhe- cimento da acção propria ou, em sentido mais claro, a consciencia. «ls font venir le petit enfant (diz Abbeville, descrevendo este uso de nossos autochthones ) aprês lui avoir fait entendre que c'est pour lui percer la levre avec une allégresse et grand contentement: et lors celuy qui est deputé la prend et la perce avec une petite corne ou quelque os bien pointu et y fait un grand trou; que s'il advient que le petit enfant crie (ce qui m'arrivo guêre), ou qu'il jette quelque Jarme pour Ja douleur qu'il ressent, ils disent qwil ne vaudra rien et qu'il ne sera jamais qu'un couard et homme sans courage. Que si au contraire il est ferme et constant (comme ordinairement ils sont) ils en tirent un bon augure et eroient qu'en sa vie il sera grand, brave et vaillant guerrier. » Deste estoicismo extraordinario e quasi sobrehumano para qualquer povo hoje civilisado, sabemos nós quantas outras provas costumavam dar as nações indigenas americanas cada vez que o seu amor proprio era posto em experiencia, ou se lhes exigia o exemplo do sacrificio de seus, muitas vezes, mais caros affectos e, quantas outras, da propria vida ! E que, desde a mais tenra edade, elles recebiam o sentimento desta feróz abnegação, no conselho dos pais, no exemplo dos guerreiros, nos incitamentos das festas religiosas civicas e populares e, finalmente, nas metaphoras poeticas das lendas com que se lhes embalára o berço ou das canções guerreiras que lhes haviam repetido nos mais verdes annos e que elles bem cedo souberam de cór. Um bello engenho, prematuramente roubado às lettras patrias e para quem foi uma especie de culto fervoroso o estudo destas praticas — Gonsalves Dias, assim as descreve, referindo-se ao nascimento : | 4 « Pueris anno setimo aut octavo auriculas perforant uti et inferius Jabium supra mentum ajunt se hac cerimonia illos demum in hominum numero ascircere. » (Quedam a Tapuys ab E. Herckmanno.) 126 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL « Davam ao menino desde logo um pequeno arco e flechas, e quando reuniam-se os amigos e parentes a darem-lhe as prolfacas do acontecido, o pai cantava a canção natalícia, ensinando-lhe como aquellas armas se fabricavam, como deveria usar dellas, como combater e vencer o inimigo; e por fim dizia- lhe qual a consideração que mereciam os fortes; como os homens, as féras, as aves e os mesmos peixes o temiam, e qual a fama do guerreiro, que, succum- bindo aos golpes do inimigo, ainda assim os espantava com a sua constancia e longanimidade. « Por uma antithese philosophica, nas côres de que o pintavam no berço, representavam a guerra e o luto; e si na cova procuravam dar ao cadaver a posição que tinha o feto no utero, contrapondo a sepultura ao berço, assim tambem ao entrar na vida apontavam para o fim que os esperava, como si O grito balbuciante da criança e o ultimo suspiro do moribundo formassem um só hiato, e fosse o primeiro ai da existencia, o primeiro passo para a morte. « Começavam os meninos a vingar, a crescer e a criar forças: educados em toda a liberdade e em clima menos ardente que temperado, desenvolviam-se ra- pidamente e exerciam-se na carreira, natação e na luta, e sobretudo no manejo do arco, seu fiel companheiro que nem na sepultura os abandonava. « Exorcitados pelos velhos, polos guerreiros, por seus pais que sorriam aos seus jogos, applaudindo os mais destros c mais robustos, faziam rapidos e admi- raveis progressos, pungidos pela emulação e desejo de louvor.» Hans Stadt, que foi prisioneiro dos indios que povoavam as costas vizinhas ao Rio de Janeiro e que tão intimamente conviveu com aquelles barbaros de quem soffreu todas as sortes de supplicios, referindo-so às provas de sofrimento por que deviam passar os mancebos antes de receberem suas investiduras de guer- reiros, acrescenta: «Jái vu un chef aller le matin dans toutes les cabanes et faire aux jeunes garçons une entaille à la jambe avec une dent de poisson três tran- chante, afin de leur apprendre à souffrir sans se plaindre. » Demasiado, porém, desviar-me-hia do fito que tenho em vista, nestes apon- tamentos, si continuasse a adduzir maior numero de factos comprobativos da rude energia do selvagem americano. Para a justificação que assentei de dar do sin- gularissimo uso do tembetá e do supplicio da mutilação que d'ahi provinha á face dos que com elle se adornavam, é bastante, cuido eu, o que deixei aqui exposto. Este adorno que, como já o disse, augmentava-se gradualmente com a edade do individuo, si bem que já pareça extraordinario, quanto ao tamanho, no exemplar em tudo fielmente figurado na estampa VIII, attinge um diametro duplo do deste, conforme o que diz, ácerca dos kimúas, o principe Maximiano de Neuwied. Mas convém ponderar, e isso parece haverem omittido os escriptores que trataram de tão descommunaes proporções, que o diametro de quatro pol- legadas não se encontra nos kimúas ou botoques dos individuos que ainda conservam as duas extremidades do labio inferior ligadas pelo tecido da linha media do mesmo ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 127 labio. Estas enormissimas rodellas, que não sei si no seu tamanho são tambem copia ou molde do antigo tembeta, facto este de que duvido, só as costumam trazer os Botocudos cujo labio, fendido até a extremidade e dividido em dous fragmentos hediondos, que lhes pendem dos cantos da bocca, é substituido por um pequeno cordel que exerce o mister de azêlha, prendendo-se-lhe as duas pontas às duas metades do Jabio e podendo assim suster, não somente um grande botoque, mas tambem uma pequena cuia de que se servem os botocudos e, em particular, os que povôam actualmente uma parte dos valles do rio Jequitinhonha e do rio Doce. Não são mui conhecidos, neste ponto, os enfeites de madeira de que usavari algumas tribus da America Central e de que ainda hoje se servem os indigenas da costa occidental da America do Norte; sabemos, porém, que os Thlinkitas, que se adornavam de fragmentos de ossos e de conchas, usavam tambem de ornatos de madeira mui semelhantes aos kimuas, porém mais perfeitos que estes e muito mais proximos da fórma do tembeti representado na Estampa VIII. Ha, entre- tanto, um ponto notabilissimo do similitude entre o botoque dos Thlinkitas e o dos nossos botocudos: é o das enormes proporções de ambos estes adornos ; accrescendo que do botoque daqueles, que é de fórma oval, diz Bancrofi at- tingir, muitas vezes, até 6 pollegadas, no maior diametro e 4 no menor; do que concluo haver com mais sobeja razão para aquelles selvagens do que para os nossos botocudos, a necessidade de atarem a um cordel as duas metades do labio, forçosamente separadas, como nos botocudos, com a excessiva dilatação causada pelo kimua. Que sorprendente afinidade de origem anthropologica, de costumes tradic- cionaes e de sentimentos guerreiros ou religiosos está a relevar-nos esta analogia tão eloquente e cvidendemente tão fecunda ! Demais, como estas duas nações, distanciadas hoje por tantas centenas de eguas, e quem sabe sinão tambem por centenas de annos, * identificam-se, erma- nam-se aos nossos olhos, por essa mesma decadencia de seus antigos haveres, por essa mesma carencia dos primitivos e ricos adornos de pedra de seus maiores, 1! Nenhuma questão anthropologica é actualmente mais espinhosa, nem de mais dificil soluçãe do que essa, sobre qual devêra ter sido a origem ou o berço das tribus tão affins que povoavam esta parte oriental da America do Sul. Para os proprios espiritos que se puderam desprender inteira- mente das idéas monogenicas e que com sobeja razão acreditam que o vastissimo continente americano podia e até devia ter produzido um homem seu, como seus egualmente houve os outros animaes de sua fauna e os innumeros vegetaes de sua flora, não póde deixar de surgir a duvida sobre esta mesma autochthonia do homem americano e com mais ponderosa razão sobre outras correlações anthropologicas. Mister é pois confessarmo-nos adstrictos ás conjecturas mais ou menos firmadas nas observações, mais ou menos guiadas pelas deducções consequentes dos factos. Appellamos, comtudo, si é tempo ainda, para mais accurado estudo das varias linguas dos povos americanos, que talvez desse ultimo recurso, haja plena e satisfactoria sancção nossa ultima esperança, 128 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL e por esse mesmo esforço em substituilos com tão grosseiro simulacro do madeira |! Si, porém, dão azo a estas cogitações o costume do tembetá ou do botoque que, na ausencia daquelle, fôra tão geralmente adotado, — cogitações mais ou menos tendentes à hypothese de que muitas das nações americanas, na épocha do descobrimento da America, decresciam de um estado moral e intellectual relati- vamente adiantado à que haviam chegado seus maiores, outras cogitações me as- saltam que, verdadeiros tropêços contra este desenvolvimentos de idéias, obrigam-me a crêr nunca se houvessem taes povos erguido a um nivel de cultura intellectual mui superior áquelle em que os sorprendeu a civilisação européa. E destas oppostas cogitações são causa efficiente muitos dos proprios carac- teres dos povos americanos, muitos de seus habitos e sentimentos. No uso do mesmo tembeta, por exemplo, força é confessar que se nos patenteia, além de tantas e de tamanhas baldas ou lacunas, na individuação moral dos povos que o empregam, a completa ausencia do gozo do beijo, a ignorancia e a privação de sua voluptuosa sensação ou de sua doce expressão de afecto. E” evidente que individuos habituados a trazerem um fragmento de pedra, de madeira ou de qualquer substancia não menos dura, mettida no labio e em saliência a esse labio, não pódem usar nem gozar do beijo, porque não lhes foi dado comprehendel-o, não lhes foi permittido a fruição deste tacto especialissimo. São como os cegos natos: não formam nenhuma idéa do que seja a luz; ou como os surdos-mudos, não imaginam siquer o que seja o som. E não se supponha que me excedo da justa apreciação, ao dizer que sendo mui commum o emprego dos adornos labiaes e nazaes, muito commum é tambem, e conseguintemente, a privação da sensação do beijo que o uso daquelles adornos não permittiu, no decorrer de tantos seculos de adaptação, se desenvolvesse ou desabro- chasse na evolução physiologica dos povos que tinham os referidos adornos por costume. Basta o dizer-se que dessa privação se resentiam os Taitianos, os Nova-Zelan- dezes, * os Papúas, ? os Australios, os Somalenses ? e os Esquimáus, * povos estes em que o uso do tembetá, e mais ainda do adorno nazal, se havia conservado desde remotissimo passado. Nas tribus de Chittagong, onde o uso do annel e dos cylindros de pedra, enfiados ao nariz, é muito inveterado, não se pede um beijo, com a expressão D. D'Urville, vol. II, pg. 561.— Voyage of tha Novara, vol. TIT, pg. 106. Freycinet, vol. II, pg. 56. | Burton, First footsteps in Africa. Journal de Lyon, pg. 358. om ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 129 propria: «Deijai-me », mas dizendo-se « cheirai-me », — tal é entre aquelles bar- baros a ignorancia do beijo. E” um phenomeno este tão commum quanto natural sob o dominio das cir- cumstancias em que se acham os selvagens que nol-o apresentam; natural, porque nem mais nem menos é do que o resultado da ausencia absoluta de uso ou de adaptação dos labios a esta funcção toda especial em que mais domina a imaginação do que o tacto ou a percepção material; em que é, por si, quasi tudo o sentimento e muito pouco a sensação a elle inteiramente subordinada. Ha inquestionavelmente no mundo moral uma ordem de phenomenos, uma concatenação de factos e uma serie de evoluções muito mais notaveis do que no mundo physico; a esta esphera moral pertence, de certo, o phenomeno referido por Spix e Martius, ácerca dos nossos indigenas que desconheciam egualmente a côr do pêjo e que, só depois de uma longa adaptação às idéas da civilisação, sentiram que lhes subia à face o rubor, cada vez que em seu espirito se lhes desabrochava tambem um sentimento que lhes havia sido até então desconhecido. Da completa privação do beijo entre individuos que nessa privação foram mantidos pelo uso dos adornos da face ou que, por um atrazo deploravel de sua raça, pouco mais eram que brutos, e como taes não se haviam erguido até a faculdade desta manifestação de estima ou de amor ; da privação do beijo, digo, entre creaturas taes, occorre-me aventurar uma proposição de possivel, sinão de provavel verificação, entre algumas tribus das mais selvagens de nossos aborigenas, e é que si O emprego daquelles adornos, retinha os povos que delles faziam uso, na ignorancia absoluta dessa doce manifestação de amor, não pouco devia tambem concorrer, para aquella ignorancia, o modo por que provavelmente se effectuavam as uniões sexuaes em muitos dos povos que tinham por costume o adorno labial. Quér fosse, porém, este modo de união sexual uma causa concomitante, com o uso dos adornos labiaes, para à ausencia do beijo, quér o consideremos antes como o efeito immediato do mesmo adorno, sou induzido a crêr que em povos tão selvagens e tão afastados da altura à que se elevaram as nações civilisadas, a união sexual devia realisar-se ad instar animalium. Assumpto é este de que ainda se não travou no campo da anthropologia, ou que pelo menos não foi, que eu o saiba, convenientemente discutido. Primeiro que tudo, o contacto e até a simples propinquidade da civilisação apagaram, de ha muito, este cunho tão caracteristico de selvagem animalidade, nas tribus em que mais possivel fôra averigual-o. A respeito das tribus que pódem ainda conserval-o, essas vivem arredias do commercio do povo invasor e tão esquivas se mostram que só por simples acaso se lhes sorprenderia qualquer desses caracteres intimos e de tão peculiar individualidade. Ha informações, comtudo, que confirmam esta minha asserção, e dentre ellas é mui positiva a que me foi transmittida pelo naturalista viajante do Museu Nacional, 130 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Guiherme Schwacke, sobre a tribu Kain-an ou Caing-ang, denominada mais geral- mente : Kamé e que Martius diz chamar-se Cai-qui, quando se aldeia. O Sr. Guilherme Schwacke, que foi por mim enviado, ha dous annos, ao sertão da provincia do Paraná, no intuito de colher objectos de Historia natural e, mais espe- cialmente, de examinar os indigenas que alli ainda se encontram, no primilivo estado de selvageria, confirma o que acima aventurei e acrescenta que nem de outro modo submettem-se aquelles aborigenas a tentar a união sexual, causando-lhes, ao que lhe pareceu, grande repuguancia qualquer proposta que neste sentido se lhes faça. Claro é que, para individuos estacionados em tão baixo nivel sensual, não páde servir, como excitante e como transmissor dos sentidos à imaginação, esse contacto subtil, e por assim dizer immaterial, de duas bôccas que reciprocamente se attrahem, que se vinculam nºum só pensamento e que se consubstanciam, por fim, n'um mesmo beijo. Dahi a desnecessidade dos labios para esta especialissima funcção, que, a meu ver, é ja um apanagio de aperfeiçoamento moral. | Qual, porém, das duas praticas, a do enfeite labial ou a da união sexual acima referida, devemos acreditar que fôsse causa ou effeito da outra, problema é este de que não me parece offerecer-se-nos facil solução, como ha pouco já o manifestei. Que o resolvam os anthropologistas, a quem, para isto, mais à feição se apresentar “ste curiosissimo assumpto, emquanto de nossa parte vamos curando especialmente do tembeta. O de que já fiz menção, representado nas tres primeiras figuras da Estampa VIII, é o mais perfeito c o mais interessante de quantos houve ainda noticia ; tem elle, além disso, a particularidade de reproduzir, segundo creio, a fórma particular das mais famosas chalchihwils, * pedras divinas dos Aztecas, e tão preciosas entre elles que sómente aos seus magnates era permittido trazel-as ao labio. O bello e interessante artefacto à que me refiro devia ter pertencido a algum chefe Tupinambá de que eram proximos parentes os Goytacazes povoadores das planicies vizinhas da foz do Parahyba, pois que foi achado em terras da fazenda do Bomfim, à pequena distancia de Macahé. O Tenente Coronel Luiz tromes Amado de Aguiar, proprietario daquella fazenda, offereceu-o ao distincto Sr. Conselheiro Lopes Netto que, incansavel no intento de co- operar para tudo quanto interessa aos estudos que mais se prendem ao desenvolvimento intellectual do Brasil, para logo o destinou às collecções archeologicas do Museu Nacional. Pelo que me informou o Sr. Conselheiro Lopes Netto, um segundo tembeta fôra encontrado de envolta com este, mas essa outra preciosidade deu-a o Tenente Coronel Amado de Aguiar a um viajante estrangeiro. ? Chalchihuitl é ao que parece o verdadeiro nome da pedra verde usada como amuleto entre os ame- ricanos de origem tolteca ou azteca. A terminação desta palavra tem, alem disso, alguma analogia com a do nome dado à faca de obsidianna empregada nos sacrifícios dos Aztecas. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 131 E de crêr que não sejam taes artefactos os unicos deixados pelos antigos Goytacazes, naquelas planuras, onde por longos annos ostentaram as praticas c os caracteres dos famosos Tupinambás cujo principal adorno labial era este tembeti verdo esmeraldino, de fórma tambem circular, na sua face externa, com as mesmas duas arestas na face interna, destinadas a fixarem-se na base do labio. ! Assim creio que tambem eram as pedras dos indigenas do Rio de Janeiro a bascar-me sobre proprias palavras do verídico João de Lery, na descripção que nos deixou diquelles primitivos brasileiros : «... ils appliquent & enchassent ao pertuis de leurs leures vne pierre verte (espece de fausse esmeraude) laquelle aussi retennc dívne arrest par dedans, paroist par le dehors, de la rondeur & largeur deux fois plus espesse q'vn teston: voire il y en a qui en portent aussi longuo & ronde que le doigt: de la quelto dernitre facon 7” en auois apportó yne en France». E não sómente usavam alguns selvagens destas pedras, no labio, sinão que, exa- gerando a jactancia de tão singular adorno, as traziam tambem enfiilas nas faces, exactamente como o faziam os indigenas da America central e, em particular, os Toltecas, antigos representantes daqueilas nações. A estas pedras, especialmente das faces, refere-se ainda Lery, em continuação q descripção que ácima transcrevi dd «Que si au reste, diz elle, quelques fois quand ces pierres sont ostées, nos Tououpinambaoults pour leur plaisir font passer leurs langues par ceste fente de la leure, estant lors aduis à ceux qui les regardent quwils ayent deux bouches: ie vous laisse à penser, s'il les fait bon voir de ceste faço, & si cela les difforme ou non. « Ioint, qu” outre cela, à” ay veu des hommes, lesquels ne se côtentans pas seulement de porter de ces pierres vertes à leurs loures, en auoyent aussi aux deux ioues, lesquelles semblablement ils s'estoyent fait porcer pour cesl effect.» E de crer que estas pedras das faces fôssem muito menores que as do labio, embora com a mesma conformação; e, neste caso, deviam ser uma cópia fiel do tem- betá, ainda actualmente usado, não só no labio mas tambem, nas duas faces, por alguns Esquimaus. O adorno esquimáu que é geralmente conhecido nas collecções ethnographicas sob o nome de «Labret » ? parece com effeito representar a fórma primordial ou mais geralmente aceita do tembetá do primitivo americano.” 1 Existem no museu de Goóttingen tres pedras de côr verde e de forma tal que muito me inclino à crer sejam em tudo semelhantes a este artefacto do Museu Nacional. —H. Fischer. — Mineralogisch- archiiologisch studien. 2 Sir J. Lubock que representa este artefacto por uma figura xylographica, intercalada no texto da sua importante publicação : «O Homem Prehistorico», diz o seguinte : de Seus principaes ornatos são os « labrets » pedaços de pedra ou de osso que trazem ao labio infe- rior ou nas faces. O orifício é feito desde a primeira infancia e a pouco e pouco augmentado por meio de uma serie de «cones», 3 O uso deste adorno, além de haver pertencido aos nossos Tupinambás e aos aborigenas da America Central, é ainda hoje observado, segundo Richardson na região comprehenlida entre o Estreito de Bering e o rio Mackenzia. Richardson, Expedition arctique, vol. 1, pag. 355. 1932 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL E” isso, pelo menos, o que se deprehende do exame comparativo deste arte- facto, representado no Museu Nacional, assim pelo tembetá de que me tenho até aqui occupado, como pelo que se acha lithographado na mesma estampa (fig. 7), o qual me parece haver servido como ornato das faces. Devemol-o ao Sr. Dr. Manoel Bazilio Furtado, credor de nossa mui grata estima pelos innumeros serviços prestados ao Museu Nacional e mais particularmente à nossa collecção archeologica. Este artefacto não foi encontrado na mesma região littoral em que appareceu o outro, muito maior e muito mais bello que elle : acharam-n'o no municipio do Rio Novo, região montanhosa e profundamente accidentada, que pelas suas feições de sel- vatico e dificil accesso, pareceu offerecer mais seguro abrigo áquelles mesmos indo- mitos Goytacazes que, rechaçados, pelos portuguezes, das planicies que lhes fôóram patria, no littoral, internaram-se, valles a dentro, na direcção das altas serranias d'além Parahyba, e ahi, separados por grupos ou familias, para que mais facilmente se podessem occultar à sanha dos invasores, estabeleceram rude e, ainda assim, mal seguro domicilio. Uns fixaram-se nas fraldas das penedias da Leopoldina e do Pomba, outros, nos altos rochedos do Rio Novo! e do Parahybuna ; alguns, finalmente, mais receiosos ou mais zelosos de sua independencia, preferiram o vasto arcabouço da Mantiqueira, em cujas profundas quebradas fóram-se a pouco e pouco extin- guindo, com seus ultimos netos, seus derradeiros vestigios. 1 Ao fidalgo e hospedeiro agasalho do Conselheiro Diogo Velho e da distincta familia Machado Coelho, a quem alliou-se aquelle conspicuo estadista, devo eu o prazer de haver visitado, em Janeiro de 1875, na fazenda de Sant'Anna, perto do Rio Novo, com os Srs. Gorceix, Glaziou e Hartt, uma caverna formada no corpo gneissico do monte denominado Babylonia, e situado à pequena distancia da ha- bitação da mesma fazenda, O gneiss de toda aquella região apresenta uma estratificação tão profundamente encurvada ou atormentada que pontos ha, na rocha, onde as linhas de estratificação, exagerando a inflexão, de ordi- nario, observada no colleamento das camadas de gneiss, unem os dous limites de uma mesma curva, figurando mais ou menos um arco mui teso, cujas extremidades se viessem a tocar pela eliminação da corda. As camadas internas são parallelas á camada externa e formam com ella curvas concentricas e justapostas cujo diametro vai gradualmente diminuindo do exterior para o interior. Dahi resulta ara os mineraes componentes do gneiss: o quartzo, a mica e o feldspatho, já de si naturalmente ragmentados, maior fraccionamento e por isso, rapida decomposição de cada um destes como nodulos de folhas concentricas de gneiss; decomposição à que unicamente se deve a origem da- quella caverna e de muitas outras, existentes, mas apenas indicadas no arcabouço montanhoso que se debruça pelas ribas do Parahyba desde aquellas paragens até cerca de oito leguas a O de Macahé. A caverna da Babylonia, bem como duas mais, ha pouco examinadas, a algumas leguas de Macahé, serviram de crypta funebre aos Goytacazes quando, já forasteiros e rechaçados do seu solo patrio de ribamar, procuravam occultar, à profanação dos invasores, os despojos caros dos que lhes falleciam em meio da longa peregrinação. Eu pude extrahir da caverna da Babylonia alguns craneos daquelles que presumo descendentes dos Goytacazes. Sobre estes craneos que, com outros de nossos indigenas, remetti em Junho, de 1875, aos professores Wirchow e Quatrefages escrevi os seguintes apontamentos destinados aos mesmos pro- fessores : « Crâmes n. 6 et 7 (accompagnés de squelletes), trouvêés dans une caverne naturelle, formée dans le grand massif de Gneiss que Von nomme Babylonia, à la ferme de Sant'Anna ou Agassiz a sejourné, lors de son voyage à Juiz de Fóra. Cette caverne que Von a decouverte à la fin de Yannée derniére, est formée par la décomposition artielle de quelques couches du Gmneiss, dans le flanc NE de la montagne, à 300 metres audessus de a plaine. Vue d'en bas, à une distance de 3 à 4 kilometres, on dirait un trou ouvert dans le pan d'une muraille gigantesque, et il semble impossible de Yatteindre jamais. « On y arrive, pourtant, sans beaucoup de difficultés en s'appuyant aux touífes des Vriesia et des Gesneria attaches à la roche, ou en se tenant aux tiges des lianes qui y croissent. « La caverne a 25 metres de profondeur, sur 15 de largeur. Elle doit avoir plus de 6 metres de hauteur à Vintericur, mais comme les fragments du toit, en tombant, en ont encombré le sol, sa hauteur actuelle n'a que 4 metres, tout au plus. « Telle est la cave funêbre choisie par les indiens appartenant probablement à la tribu des ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 133 Os artefactos de que usavam no littoral; os habitos que alli haviam contra- hido; os costumes tradiccionaes desses antepassados ; todos esses caracteres, emfim, da antiga nação, elles esforçaram-se por trazel-os das planuras da costa para as espessuras das montanhas; mas fvi-lhes demorada, penosa e quasi sempre perse- guida essa dificil migração. Dahi, a perda de muitas de suas preciosidades e Teliquias, a alteração dos costumes inveterados, o descuido forçado e, talvez, o proprio esquecimento das praticas prescriplas nas lendas nacionaes. O pequeno tembetá, representado na figura” 7 (Estampa VII), comquanto tenha, a respeito do grande tembetá da mesma Estampa, as aflinidades da fórma e da substancia, ! afligura-se-me, pela imperfeição de seu lavor, uma prova exuberante deste asserto. ( artezão que lavrou este ornato não possuia evi- dentemente a mesma pericia do artista que burilou aquelle outro; não dis- punha, com certeza, dos utensilios de que aquelle se serviu; não tinha ao seu agrado os longos e tranquillos lazeres em que se apraz, nutre-se e avigora-se 0 labor caprichoso da imaginação, cem que florece e fructifica o imaginoso e phan- tasiador engenho do artista. Os outros tembetás (figuras 4, 5 e 6, Estampa VIII, e figuras 8, 9, 10, 11 e 12 Estampa IX) apresentam à conformação mais commum a estes artefactos: em uns, ha o simile mais ou menos perfeito de um cylindro; em outros, o de um cone; em alguns, mais raros, o da juncção destas duas formas geometricas (figura 10, Estampa IX). O mineral de que, de ordinario, se serviam na fabricação dos tembetás cy- lindricos, era o quartzo compacto, sendo de notar que raras vezes o fabricassem de quartzo hyliano, ou de petrosilex. A figura 11 representa um tembetá, cuja aresta ou extremidade superior, destinada a prender o tembetá ao orifício do labio foi que- brada ; este artefacto é de fórma tão especial que póde ser tido, sem probabilidade de erro, pelo unico até hoje conhecido que a represente, e si, por esse lado, recommenda- se-nos elle, não menos nos attrahe a attenção por haver sido fabricado de gneiss, rocha Coropôs ou plutôt à celle des farouches Goytacazes qui, repoussés de la Côte, il y a environ deux siêcles, par les Portugais, se sontalliés, aux anciens Coropós dont il ont pris quelques habitudes, celle, à ce que je crois, de se couper três ras une partie des cheuveusx. « Poursuivis des colons, jusqu'au fond des forêt, ils cherchaient naturellement à cacher dans les endroits les plus inaccessibles aux mvahisseurs ce qu'ils avaient de plus cher au monde : leurs morts. « Les cadavres, grace à Vextrême et remarquable sécheresse de la caverne S'y sont conservés à demi momifiés, quoique n'ayant subi aucun procedé préservatif, sauf la présence d'une certaine quantité do graines d'une Laurinée odorante: le Cryptocaria moschata que j'ai trouvêes sur le squelletes mais qui y représentaient plutôt le symbole de quelque superstition qu'un moyen de conservation. « On les enterrait, les enfants dans des pôts de terre, ou emmaillotés dans les feuilles de Vriesia et d'une espece de Maranthacée, les adultes dans leurs propres hamacs. « Chaque fosse etait d'ailleurs revetue de fragments d'écorce destinés probablement à preserver le cadavre du contact de la terre. « Sur chaque individu on avait placé des batons croisés et des faisceaux de fibres de Vriesia ayant chacun un noeud au milieu. » 1 O feldspatho verde de que foi feito o tembetá maior é quasio mesmo de que se lavrou o menor: a unica differença consiste na côr do primeiro, a qual é mais densa, mais brilhante e mais vizinha da da esmeralda. 134 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL pouco resistente e tão imprestavel a estas delicadas feituras, que nenhuma hypothese admitte de amoldar-se a trabalhos taes, sinão fôra o processo de que precisou este adorno, — processo de adelgacamento, seguido à feição do artefacto, como tinham por costume trabalhar, nesta especie de industria, todos os povos primitivos. Quanto ao tembetá de quartzo, facil é de imaginar pela dureza deste mineral quão demorado e penoso trabalho deve elle exigir para a gastura dos angulos, das arestas, e de todas as irregularidades do fragmento de rocha primitivo, até con- seguir a fórma regular que apresenta o tembeta. Mas os selvagens americanos afizeram-se a este cançativo e improbo traba- lho: os adornos mais apreciados de algumas tribus do Amazonas são de quartzo fabricados, e si penoso affigura-se-nos o afeiçoamento de lão dura rocha à configuração perfeitamente cylindrica, imagine-se que diffilculdades não será mis- ter vencer para perfurar estes cylindros, não só tranversalmente, como o per- furam de ordinario, sinão que tambem no sentido de eixo, como alguns se obser- vam nas collecções do Museu Nacional. Estes ultimos são, a justo titulo, havidos por enfeites de tão subido valor que sómente aos principaes chefes é dado possuil-os. ! Ao proprio Martius, ouvi dizer que são, às vezes, necessarios tantos annos, para o fabrico e perfuração longitudinal destes cylindros, que a vida de um só homem não basta a pôr termo a semelhante trabalho ; é necessario que o seu successor ou herdeiro conclia a obra comecada na juvenilidade e interrompida na velhice, pela mão inexoravel da morte. Não será, porém, causa de sorpreza semelhante facto, ao ponderarmos que si, para obter a configuração cylindrica deste adorno, o selvagem dispõe de um grs em que o vai aos poucos adaptando a esta fórma, por meio de progressivo desbastamento, egual facilidad: não se lhe offerece para a abertura do orifício central do mesmo adorno, no qual é obrigado a re- correr a especialissimo processo cujos principaes instrumentos são uma folha con- tendo grande abundancia de crystaes de silica, uma porção de arêa fina e agua. De facilimo trabalho é, em compensação, o adorno labial feito ou mais jus- tamente modelado de gomma-resina e usado por alguns dos aborigenas que povôam o interior do Paraná e de Santa Catharina e as fronteiras do Paraguay. Nas figuras 10 e 12, estão representados estes enfeites, sob dous modelos distinctos, um dos quaes, o mais longo, mui commum, entre os referidos aborigenas, é encon- trado frequentemente nas colleeções ethnologicas. Em todas as mais significativas manifestações do homem, até do homem semi-bruto, ha desvios ou hiatos, ha umas como provas negativas, que nada exprimem ou só parcialmente representam o fim para que foram creadas. 1 Wallace, Voyages sur UAmazone ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 135 Neste caso cuido eu ques: acha este longo cylindro cu cone de resina tão usado pelos selvagens da America Meridional, sendo, porém, de crer que seja affim ao uso do Dbotoque de madeira, e que, sómente na carencia de substancias queridas e valiosas, ou na impossibilidade de lavral-as, se servissem da madeira e da resina para estes adornos. O proprio cylindro de quartzo si tem origem, pelo meu talvez desacertado entender, no espirito imitalivo da conformação da cabeca dos antepassados, merece, por isso, lal ou qual justificação, não 'a póde receber quanto à rocha de que é feito, visto como o tembeta representa uma dualidade de idta, ou de crença ou de significação, e esta dualidade só a possue o de côr verde,: qualquer que seja o mineral de que o fabricaram. Possue-a, quanto à fórma, pela tendencia à imitação de um iypo anthropologico extincto na actualidade, facto este sobre o qual forcejei por adduzir, no que precede, argumentos comprobatorios ; possuc-a, quanto à côr verde, porque as rochas assim coloridas parece haverem sido veneradas entre todos os povos primitivos, por imagens da divindade ou symbolos da infinita realeza. O totemismo não é, como o disseram alguns escriptores, uma religião exclu- sivamente americana, pois que o observamos egualmente entre todos os povos barbaros ou semi-barbaros, e apenas, com mais desenvolvimento, entre aquelles que, como os Americanos, pela posição geographica de sua patria, conservaram-se extranhos à evolução moral seguida por quasi todas as nações povoadoras do Orbis veteribus notus. r Ora, a individuação mais geraldo totemismo é inquestionavelmente a pedra !, pela simples e unica razão de que aos primeiros representantes da especie humana, depois que se fizeram caçadores, fóram os fragmentos de rochas, separa- dos e cahidos das montanhas, as primeiras armas à que se soccorreram nas suas caçadas, ou arremessando-as aos animaes que lhes fugiam, a correr e a voar, ou espancando com ellas, à guiza de clavas, aos que, mais ferózes, ousavam investil-os. 1 O culto da pedra a que eu ligo e filio aqui o totemismo americano, com uma pequena tendencia apenas para a idolatria, era observado no antigo continente pelos povos que, depois e mais ousadamente, se adian- taram no estadio da civilisação. « Os Arabes, diz, Lubbock, adoravam uma pedra preta até ao tempo de Mahomet. Os Phenicios adoravam egualmente uma divindade, sob a fórma de uma pedra não lascada. « O deus Heliogabalo era simplesmente uma pedra preta de forma conica. «Os Gregos e os Romanos veneravam as pedras erguidas sob o nome de Hermes ou Mercurio. Os Thespios possuiam uma pedra grosseira que elles consideravam como um deus, e os Beocios, adoravam Hercules sob as mesmas fórmas. Os Laponios tinham tambem montes e rochedos sagrados. « Na Europa occidental, durante a edade média, vemos o culto das pedras, muitas vezes condemnado, o que prova quanto era elle frequente. Assim é que Theodorico, arcebispo de Cantorbery, condemna o culto das pedras no setimo seculo; o mesmo culto acha-se no numero dos actos do paganismo prohibidos pelo rei Edgardo, no X seculo e por Canuto no seculo XT. « Um concilio celebrado em Tours, no anno de 567, ordenou aos padres que recusassem a entrada nas egrejas a todas as pessoas que adorassem as pedras erguidas, e Mahé aíffirma que os registros das sessões de um concilio celebrado em Nantes, no setimo seculo, fallam do culto das pedras entre os Armo- ricanos. » 136 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Não é muito, portanto, de admirar, nem que adorassem os penedos que lhes eram realmente, deste modo, providenciaes, * nem que tamanha abundan- cia de utensilios de pedra se encontre, onde quer que o instrumento de ferro das gerações modernas rasgue esse mesmo solo que os instrumentos de pedra das gerações extinctas ousaram lavrar, ha ja passados milhares de annos. Assim se explica o porque havendo no solo europeu tanto espaço ainda a rotear, contam-se já para cima de cento e cincoenta mil artefactos de pedra extrahidos daquelle solo, possuindo só os museus da Dinamarca trinta mil, metade dos quaes conserva o museu de Stockholmo. E que o instrumento de pedra, em virtude de sua extrema utilidade primitiva, foi aos poucos ampliando a sua serventia, passando de arma de caça, que era, a principio, a ser depois arma de guerra, e, mais tarde, instrumento sagrado dos sacrifícios ou das innumeras ceremonias de caracter mais ou menos religioso. « Chez les antédeluviens, à ce qu'il parait, et chez les peuples du second àge, qui les suivirent de plus prês, tout ce qui, dans les córémonies tenant à la religion devait être soumis à Vaction dum instrument tranchant, aurait été souillé par Vapproche du fer: Vincision ne pouvait être faite quau moyen d'une pierre tranchante. C'était là, sans doute un de ces usages conservés des temps primitifs de la société, ou Part de la métallurgie n'était pas encore connu, usages que la religion avait consacrés. Hérodote nous parle de la pierre tran- chante avec laquelle se faisait sur Je flanc des cadavres Vincision par laquelle on en retirait les entrailles; il nous cite une pierre de même espece avec laquelle les Arabes, dans la cérémonie de la foi jurée, faisaient une incision à Ja main de chacun des contractants; et il parle de sept pierres qu'on frot- tail avec le sang qui sortait de ces plaies. « Moise fait mention de la pierre avec laquelie Séphora circoncit son fils; Josué fit faire des couteaux de pierre pour circoncire tous ceux d'Israel qui ne Vetaient point encore; ce fut avec un couteau de pierre qu'Atys se mutila ; et c'est de la même manitre que les Galles Pimitaient. Un instrument de pierre ! Caso é para tomarmos em muita consideração que no mesmo sentimento de totemismo hajam os homens primitivos da Europa, da Asia e do norte da America, erguido monumentos megalithicos cuja forma geral deixa claramente reconhecer a analogia de indole e a identidade de sentimentos que enla- cavam tão diversos povos, e de tão longuiquas e differentes patrias, num mesmo caracter, n'uma admiravel consubstanciação de pensamento. E não só a disposição dos tumuli e dos menhirs do antigo continente é a mesma observada na constructura dos monumentos anologos dos Americanos, sinão que, tambem entre estes, encontram-se, perfeitamente caracterisados, os circulos de pedra, em tudo, semelhantes aos, ha tanto tempo conhe- cidos da Europa, e aos da Asia e da Africa, recentemente encontrados ou descriptos. Estes circulos de pedra, antigos pra ou cemiterios de nossos antepassados, existem na America do Norte, em varios pontos do paiz dos Esquimaus, foram já observados na Virginia (Lafitau, Mozurs pá Rr agos amer., vol. II, pag. 135), e diz Sequier havel-os achado até no Perú. Amer. nat., vol. IV o a , ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 137 servait aussi, dans la Judée, pour faire les incisions à Varbre doi decoulait le baume. L'usage de ces pierres tranchantes dans certaines circomstances reli- gicuses fut général chez tous les peuples de Pantiquité, tant de Pancien que du nouveau monde, et c'est à cela que tient ce nombre prodigicux de haches en silex, en serpentine, en basalte, depuis un demi-pouce de largeur de tran- chant, jusqu'à six pouces et au de lá, et ces couteaux des mêmes maltiêrs qu'on trouve sur tous les points du globe.» ! Quanto à veneração em que eram tidos esses-machados de pedra, podemos accrescentar que ainda hoje os nossos camponezes, e com elles muitas pessôas cultas, acreditam piamente que hajam cahido do (co, e lhes dão por isso o nome que todo o mundo conhece de pedras de corisco ou de raio. Esta crença, que tão natu- ralmente se allia ao totemismo que teve a pedra por objectivo, póde tambem radicar-se na theogonia da antiga Syria e mais particularmente do Libano onde em tamanha porção appareciam os machados de pedra que o povo os tomava por amuletos provindos do Céo, por isso que, no dizer de Damascius, e de accôrdo com a crença popular, fôra Uranus, o deus mais antigo dentre os outros deuses (sentido figurado em que se deve subentender a representação ou a personificação do homem primi- tivo), quem primeiro os havia observado, ou introduzido entre os homens. Da superabundancia desses artefactos, originada na veneração geral que se lhes tributava, provém evidentemente, com o aperfeiçoamento da fórma, a selecção ou a preferencia da rocha empregada. Desde todo o principio, a superioridade das rochas silicosas, feldspathicas e amphibolicas, sobre as demais rochas, tornou-se notabilissima : as propriedades do silex, mais particularmente o recommendaram. Os seus estilhaços, sobre serem já por si verdadeiras facas, pela dureza propria do mineral e pela fórma de gume ou de lamina que tomam naturalmente ao separarem-se do nodulo, donde é costume extrahil-os, desligam-se-lhe com uma tal facilidade que um só operario, com a só condição de ser pratico nesta especie de industria, póde fabricar de mil a mil e quinhentos estilhaços por dia. ? O silex, além disso, é a pedra de fogo por excellencia, e si tamanhas razões, quaes as que expuz, havia para que o venerassem, como instrumento cortante, homens que não conheciam ainda os metaes, imagine-se porque modo não deveriam adoral-o esses mesmos homens que encaravam nelle o gerador do fogo. Este valor do silex facilmente o comprehenderemos, ao ver as afinidades etymologicas que existem entre as denominações que tinha elle, nas differentes linguas, e a idéa 1 D. M. J. Henry, L'Egypte pharaonique T. 1. pag. 250951. Eae ue Physiche und technische.— Beschreibung der Flintensteine, Vienna, 1782, in-8.º 138 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL da luz, do fogo e de seus beneficios ; aflinidades entre as quaes figura à que lhe achou por meio de engenhosa e habilissima, porém não fundada hypothese, o erudicto Vincent de Beauvais: « Silex est lapis durus, sic dictus ed quod ex eo ignis exiiat.» 1 Mas não admira que houvessem prestado semelhante culto ao silex os pri- mitivos representantes da humanidade, os quaes viviam na carencia absoluta do ferro e das substancias inflammaveis, de que, a tão baixo preço, faz-se hoje acquisição nos pontos mais reconditos da terra; e menos é isso digno de simples reparo, quando ponderamos na grande porção de estilhaços de silex, ha pouco mais de 30 annos, ainda empregada no serviço das espingardas, e o que é mais digno de attenção, quando ainda hoje vemos o uso tão frequente dos isqueiros de que se servem os fumantes e os viajores, nas paragens pouco povoadas dos mais cultos paizes do mundo. É assim como durante o uso ou antes o culto geral da pedra, com tão diversas e importantissimas serventias, foi preferido o silex, sobre as demais rochas, pelas suas propriedades physicas, como arma cortante, ou como rocha pyromatica, ou pedra de fuzil; assim tambem desse mesmo culto, de tamanhas e de tão latas applicações, originou-se a idéa de adornarem-se com pedras. Deste modo, sa- tisfazendo ao duplo preceito de gratidão à pedra, e de respeito aos antepassados, acharam facil pastio à sua propria vaidade, como si desde os primeiros actos do homem, no alvorecer de sua vida psychologica, forcejasse a providencia por acorrental-o, para logo, a essa fatal dualidade, tão engenhosamente figurada na terrivel imagem biblica da sciencia do bem e do mal, — dualidade manifestada entre os homens primitivos, pelo consorcio da mais bella das virtudes, — a gratidão, com o mais negro dos vícios — a soberba. Claro é, portanto, que, no intuito de obterem estes fins, os primeiros selvagens escolheram aquella dentre as pedras que mais bella se lhes affigurou, ou antes, como creio, a que lhes pareceu representar mais justamente pelo colorido, ou o azul do céo, ou o verde do arvoredo, ou melhor ainda a fusão destas duas córes, como as aguas promiscuamente nol-as retratam. (C6o, arvoredo e mar: tres principaes individuações de seu totemismo e que elles tinham na mais supina veneração, pois si do Céo lhes descia, na voz do trovão e no lampejar do raio, 0 temor da divindade que fére e castiga, sorria-lhes das francas do arvoredo, com o doce perfume da flor, o sabor do fructo que nutre e refrigera; e, finalmente, des- tas duas impressões reunidas, era uma como união mysteriosa 0 sentimento que lhes 1 Spec. Naturae, liv. IX, sect. XIII. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 139 produziam as aguas, no seu duplo caracter de furor e bonança, e no seu aspecto de intermediarias, que as suppunham serem, entre a terrace o céo.! Dahi, o uso do tembetá mais ou menos verde, mais ou menos azul. - Dahi o alto apreço, desde à mais remota antiguidade, tributado à turqueza é à esmeralda, bem como às nephrites, às tremolites e às saussurites, conhecidas sob o nome de jade oriental ou jadeite, assim nas collecções de mineralogia, como nas de archeologia. E prova acceitavel de que ao colorido geralmente verde destas pedras? e não somente à sua grande dureza, devemos atlribuir a veneração que lhes tinham, encon- tramol-a no apreco que muitos dos indigenas da America, ou por privados dos amuletos de jade oriental (em cuja categoria se acham os tembetas), de que usavam os seus ascendentes, ou pela mesma inclinação de sentimentos e analogia instinctiva de adaptação, de gosto e de idéas, para logo consagraram às pedras verdes americanas; variedades da orthosia colorida de oxydos de cobre e denominadas impropriamente pedras das Amazonas (Amazonstein € Amazonstone), nas collecções mineralogicas. Estas pedras que supponho existirem em raros veeiros dos terrenos gneissicos de alguns pontos da America meridional e central, mas que são bastante communs nas costas septentrionaes do golfo do Mexico, alguma affinidade tem com à orthosia aventurinada à que se deveria talvez ligar especialmente a formosa va- riedade de que é feito o grande tembetá das colecções archeologicas do Museu Nacional. Nenhuma duvida deve haver de que sejam estas pedras de orthosia, colorida de oxydo de cobre, as que, na ausencia da jade oriental, mais empregaram os antigos Aztecas, ou alguns representantes da famosa nação Nahua, nos seus ornatos de orelhas e nos seus tembetás. Este uso que elles communicaram a toda a America central e à que se prende tão intimamente a ida de uma distincção quasi real e sacerdotal, era, ainda ha pouco, observada no Novo Mexico e na costa do Mosquito, com esta mesma significação. 1 « The prominent colors of Tlaloc were azure and green, thereby symbolizing the various shades of water. »—Brancroft, op. cit. vol. HI pg. 324. 2 Com o nome de jade oriental é conhecido um grande numero de silicatos com caracteres mais ou menos semelhantes; a saber: grande tenacidade, estructura compacta e esquillosa, e córes que variam do verde pallido ao branco leitoso. —Dufrenoy, vol. 4.0, pg. 395. À E = Uh « On rapporte encore à la trêmclite, comme varieté compacte de cette espece, le jade néphrite (ou jade oriental), la pierre de Yu des Chinois, qui nous vient de la Chine, soit en blocs ou galets arrondis, soit sous forme d'objects travaillés avec une delicatesse extrême. Il est tantót d'un blanc verdátre ps (jade blanc), tantôt d'un vert-olive (jade vert)...»—Delafosse, Nouveau Cours de Mineralogie, om. 3.º, pg. 428. 140 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Em Guatemala, seio fecundo das lLradições e das sagradas lendas dos Tol- tecas ou antes dos Mayas, algumas tribus havia em que os nobres, na carencia destas pedras, usavam do adorno facial de pennas, cuja côr verde era significa- tivo indício do primitivo tembeta, —insignia cara de sua alta estirpe. 1 Os Nahuas, a quem já anteriormente me referi, e que poderiamos denominar os Incas americanos, a um tempo conquistadores do paiz e fundadores de suas mais elevadas e mais proficuas instituições, tinham, por sigual de chefatura, uma pedra verde atada ao braço, exactamente do mesmo modo por que os Incas se adornavam com a aurea faxa real à que se deu o nome de pincha e de que o Museu Nacional possue, na collecção Lopes Netto, um explendido exemplar.? A alta valia que davam os Nahuas ou Aztecas às pedras de côr verde não só se deprehende da circumstancia de as haverem admittido como emblema de poder e nobreza, sinão que mais ainda de as suppórem individuações divinas. O Deus supremo dos Aztecas, — Tesclatipoca, era representado, tendo mettido no beiço um crystal de quartzo hyalino, perfurado longitudinalmente, como os cylindros de quartzo opaco dos indigenas do Amazonas, mas contendo neste orifício uma penna azul ou verde, de modo que pela transparencia do crystal lhe podesse ella dar o aspecto de uma grande esmeralda ou de uma extraordinaria turqueza. * Esta mesma divindade, que symbolisava o supremo poder, tinha como insignia mysteriosa, mas que talvez representasse a fecundidade ou a fartura, uma pedra verde engastada sobre o ventre, na região umbilical. Aos seus reis fallecidos e que se lhes afliguravam elevados à transubstanciação divina, lhes faziam os Aztecas a apotheose, collocando-lhes entre os labios uma pedra verde, a qual symbolisava o coração do finado. E como a entidade da nobreza achava-se intimamente ligada, pelos seus predicados e sagrados attributos, ao caracter do sacer- docio, era de rigoroso preceito sacerdotal que os sacrifices Nahuas ou Aztecas, a cujas mãos succumbiam annualmente tantas centenas de victimas humanas, trouxessem por emblema de sua elevada investidura Lheocratica uma turqueza enfiada no labio, à guiza de tembeta. “* As pennas verdes que traziam ao nariz os nobres de algumas tribus de Guatemala serviam a distin- guil-os dos individuos do povo que só podiam trazel-as de côr vermelha. Bancroft, op. cit. vol. I, pg. 717. 2 Os Incas, advindos muito provavelmente de Anahuac, por demorada transmigração até o Amazonas e dahi à Titicaca, depois de talvez secular domicilio ás margens daquelle lago, apresentam neste uso equivoca analogia tanto com os Nahuas, como tambem com os Tartaros e mantchúas. * Bancroft, op cit. vol 2.º pag. 732. e ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 14] Do que precede, parece-nos mais que denunciada a crença que havia sobre à origem divina destas pedras. As chalchihuntis, que assim eram ellas chamadas entre os Aztecas, passavam,na ver- dade, como incarnações ou emissarias da divindade. Varias e curiosissimas lendas exis- tiam que haviam implantado estas crenças no animo do povo, — crenças que em muitos pontos enlaçam-se às Lheogonias do extremo oriental do solo asiatico. Uma dessas lendas conta que Chilmalma, mai de Quetzalcohuatl,* sendo virgem, apanhára, em viagem, uma chalchihuitl, e que, logo depois de tel-a tocado, sentira-se gravida, havendo deste modo concebido aquelle deus. Entre os nossos Tupinambás, povoadores do littoral do Brazil e que usavam da mesma chalchihatl, mettida no labio e nas faces, que a mesma cousa é o tembetá, parece que tambem alguma idéa religiosa havia, que alguma tradicção se conservava, participando desias crenças; mas o dominio europeu, com o cortejo de paixões que lhe são apanagio, irrompendo inexoravel nesta parte da America, si trazia abertos gs olhos, certo, sobre outros assumptos os fitava, que não no exame destes gentios, cu- jos caracteres anthropologicos mutilaram-se, adulteraram-se e finalmente, de todo des-. appareceram, não à luz vivificadora da civilisação, mas ao facho sinistro do extermínio que, em seu nome, empunhava o braço da cobiça e insuflava o sópro da intolerancia. Felizmente, a mutilação dos caracteres nacionaes do povo da costa septen- trional e em particular dos povoadores do valle do Amazonas, não o effectuaram com egual rapidez os ferozes invasores, e alli nas margens abastosamente ensombradas do caudal gigantesco, onde o culto do tembetá ou da chalchihuitl tambem existia, foram encontradas, em abundancia e em ostensiva veneração, as famosas pedras verdes que em tudo lhes correspondiam, verdadeiros amuletos à que se dava o nome de mirakitá. ? 1 No proprio nome deste deus, composto de Quetzal e Cohuatl (cobra de pennas verdes) vemos uma, especie de totemismo tendo por objectivo a cobra, reptil muivenerado pelos povos primitivos do Oriente, icom o caracteristico da côr verde de cujo valor muito particularmente se occupam estes Apontamentos. 2 Muito de sciencia uso aqui desta orthographia em vez do nome muirakytan ou antes ibirakytan, porque supponho injustificavel a significação nó de páu que tem esta ultima palavra, applicada à pedra verde facial, emquanto que na significação do nome mirakitá pedra do chefe do povo (com a anteposição usual do genitivo ao nominativo) ficam perfeita e claramente definidas não só a substancia, pedra, de que é constituido o objecto em questão, mas tambem a applicação que tinha como emblema de chefatura. Verdade é que das tres palavras : mira, nação, ki, chefe e itá, pedra, uma, a palavra ki, observo que, sobre ser extranha à lingua geral, póde bem ser apenas parte da palavra quichua primitiva, exprimindo a qualidade de chefe ou de rei ou de principal. Seja porém ki nome completo ou simples particula, é certo que se acha como radical de muitos dos nomes dos reis de Guatemala e, facto singular, do do proprio Japão, além de exprimir na lingua Maya, alli fallada outrora a idéa de supremacia de poder e de alto dominio. A objecção que se me podesse contrapôr de parecer irregular esta enxertia de palavra maya ou quichua entre componentes tupys, haveria eu de responder com os frequentes exemplos de eguaes enxertias cada vez que se trata de nomes referentes a assumptos divinos ou pessôas da mais alta cathegoria, pertencentes à lingua da nação invasora ou da mais forte. São exemplos desta observação as palavras tupys e guaranys em que entram os nomes cruz, egreja, e outros. E bastar-me-hia neste particular apontar Ita-curuçú que significa litteralmente : cruz de pedra, embora se haja alterado a palavra cruz em curuçú. » 142 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Em más horas, porém, a inclinação dos animos daquelles tempos para tudo quanto podia simular maravilhas ; as idéas antecipadas sobre phenomenos nunca dantes conhe- cidos; e, mais que tudo, o espirito dos primeiros exploradores, inteiramente obcecado pela ignorancia que tantas vezes expunge à verdade para engendrar a mentira ; tudo isso alliou-se, consubstanciou-se para o enorme vulto que se deu à lenda relativa às Ama- zonas, recluindo-se na mais completa omissão quanto concernia às pedras verdes de que se dizia serem ellas senhoras. Orellana, a quem a propria má-fé lançára nas aguas do Amazonas, — espirito falsidico e animo desleal, carecia de ataviar com as brilhantes córes do prodigio essa sua peregrinação que se havia iniciado na traição e que devia ser sellada pelo embuste. O episodio das Amazonas vinha, à feição, servir-lhe os intentos, dourando-lh'os de ful- gente exito. Aceitou-o, pois, e, mais ainda fez ; emprestou-lhe um dizer que só devia ageitar-se à verdade ; dizer, entretanto, que não teria recebido tamanha voga si o não precedessem os proprios assertos de Colombo, sobre as Amazonas das Antilhas e, mais tambem si o não houvessem adoptado, por seu, o padre Christovão da Cunha ! e effi- cazmente apoiado as narrativas de Ralegh e de Oviedo. O que eram, na verdade, aquellas guerreiras, dizem-nos Lery com todos os escriptores daquelle mesmo tempo, e em particular Gandavo, em referencia às indias Tupinambás, à cuja nação pertenciam as Amazonas que lhes eram, portanto, affins em seus habitos. Entre estes, notava-se-lhes o de auxiliarem aos homens nos combates, cujos perigos compartiam como si guerreiros fossem. Algumas até daquellas mulheres havia que, exagerando este conviver de guerreiros nas continuas pelejas, offereciam, em certo grau, notavel antithese do que nos des- creveram Herodoto, Apollonio, Hyppocrates, Justino e Dionizio sobre as celebres Amazonas da Scythia e da Lybia: « Alguas Indias, diz Gandavo, referindo-se às Tupinambás do Sul, ha tambem entre ellas que determinam de ser castas: as quaes não conhecem homê algir de nhuã qualidade, nem o consentiram ainda que por isso as matê. « Estas dejixão todo o exercicio de molheres e imitam os homês e seguê seus officios como se não fossem femeas. Trazê os cabellos cortados da mesma ma- neira que os machos, e vão à guerra cô seus arcos e frechas e á caça, perse- verando sempre na companhia dos homês; cada huã tem molher que a serve com que diz que é casada, e assi se communicam e conversam como marido e molher.» Mas não precisamos de mais provas; por que dos labios do mesmo Orellana 1 Nuevo descobrimento del Grã Rio de las Amaz. Madrid, 1641. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 143 ouvem-se palavras que destôam do que lhe dictam suas ulteriores intenções: é elle proprio quem nos diz haver combatido com mulheres que excitavam a velejar os guerreiros desanimados, parecendo assim que sómente mais tarde lhe occorrêra a lembrança de levar mãos a esta ficção, no intento de obter do rei de Hespanha o que, a respeito do Amazonas, lhe devia impetrar ao depois. | Orellana foi para a Hespanha o transmissor da historia fabulosa das Ama- zonas, assim como Ralegh o foi da mesma historia para a Inglaterra. Alguem se fazia esperar que tomasse a investidura de introductor, em França, da famosa, mas algum tanto desacreditada lenda amazonica, e esse alguem apresentou-se, dous seculos e meio depois, na pessôa de La Condamine, mas bem se vê que ja um pouco tarde, e tão fraco sustentador da referida historia que mais pela vaidade de enlaçal-a ao seu caracter de explorador que por amor e-convicção do assumpto acertou de chamar para sobre essas suppostas amazonas as vistas do mundo scientifico. No tocante a Ralegh, movia-o o mesmo pensamento de Orellana : o interesse proprio, e mais o desejo de lisonjear a imaginação da rainha Isabel, que, como tão judiciosamente pondera Humboidt, não deixaria, certo, de acariciar a idéa dessa republica de mulheres, como ella sem marido, e como ella reluctando contra extranhos inimigos. « Confiar em Deus, escreve Ralegh, concluindo a sua expo- sição e amoldando a linguagem aos seus intentos, confiar em Deus, que é o rei dos reis e o senhor dos senhores, que elle porá no animo daquella que é senhora das senhoras a conquista do Eldorado. » Demais, o achar-se no solo do novo mundo a reproducção de quanto haviam escripto os auctores gregos e latinos sobre as maiores singularidades dos antigos povos do Orbis veteribus notus era. a monomania dos que se tinham de referir à America, e desta observação que, a justo titulo, pertence primeiramente a Humboldt, apresenta aquelle sabio, por notaveis provas, os escriptos de Colombo, de Ge- raldini, de Oviedo ec de Pedro Martyr de Anghierri, aos quaes poderiamos acres- centar mais meia duzia de outros escriptores seguramente da melhor nota. Fechemos, porém, os ouvidos a estas demasias da imaginação e encaremos as nossas amazonas na sua verdadeira estatura. O colorido discreto da realidade não tem o brilho nem as côres fulgentes da phan- 1 « F. Orellana tuvo por el rio abajo algunas refriegas, con los indios, moradores de aquella ribeira, que se mostraron mui fieros, donde em algunas partes salieron las mugeres à pelear, juntamente com sus maridos. Por lo qual por engrandecer Orellana su jornada dijo que era tierra de Amaçonas: y assi pedio a S. M. la conquista de ellas.» Garcilazo, Historia General del Perú. 1722. « Entre los disparates que dijo fue affirmar que havia, en esto rio, +mazonas con quien el y sus com- paneros pelearon.» Gomara, Hist. Gener. de las Indias. 144 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL tasia, mas a realidade perdura e a phantasia tem, no clarão do relampago, a sua verdadeira e fiel imagem. Vejamos naquellas filhas do antigo Maranhão, não as heroinas legendarias da Seythia, inimigas dos homens e de seus proprios filhos assassinas, mas as esposas cari- nhosas dos guerreiros Tupinambas,! dedicadas aos seus maridos e filhos ; suas au- xiliares e compartícipes nos trabalhos da vida, e até nas fadigas dos combates, e ainda depois da morte delles, guardas fidelissimas dessas pedras verdes, —talismans sagrados que eram como os penates da familia e que tantas vezes lhes accendraram a elles o amor da patria, relembrando-lhes o exemplo nobre de seus maiores que lh'os haviam legado no ultimo arquejar da vida. Sobre estas mesmas pedras verdes: chalchihuatls, mirakitas ou tembetas, como quer que lhes houvermos de chamar, abriu tambem azas enormes o phantasioso dis- correr dos escriptores. Christovão da “unha, entre outros, tinha levado a similitude destas novas ama- zonas ao ponto de lhes achar os mesmos maridos temporarios, que dizem os histo- riadores gregos haverem tido as amazonas do antigo continente, e mais ainda, assevera elle chamarem-se os novos maridos Guacaras ou (Guacari, como, no dizer de Strabão, denominaram-se (uargari os antigos. Que muito é, pois, que destas pedras verdes dos Tupinambás, cujas briosas esposas bem as podiam guardar, em penhor de affecto de seus finados maridos, dissessem tambem os imaginosos narradores — que as mesmas eram e deviam ser as tão celebres esmeraldas da Seythia ? De mim tenho e creio que fossem as pedras verdes as primeiras causas, e a um tempo, as primeiras provas da lenda amazonica americana, e força é con- virmos que sem examinar miudamente o assumpto, e sobretudo, sem premeditação alguma, as analogias poderiam dar azo à illusão, a quem quer que, além do mais, ignorasse as leis de aflinidade, preceituadas pelo estudo amadurecido dos primitivos representantes da familia humana. As pedras verdes das nossas Amazonas, pois que força é que assim me ex- prima, fóram effectivamente analysadas tambem pela falsa apreciação do juizo côxo, manêta e cégo dos mesmos engenhosos escriptores ou de outros que lhes levavam larga dianteira, no estadio da phantasia. A opinião dos sabios que mais illustraram aquelles trinta annos de fulgor extra- nho, durante os quaes vimos fundirem-se os esforços obscurantistas do ultimo seculo da intolerancia, ao duplo facho da Sciencia e da Liberdade, à luz da qual desabrochou o presente seculo ; a opinião daquelles sabios, ia eua dizer, decidiu que de extranhas terras deviam ter advindo as pedras amazonicas; antes delles, porém, quantos haviam fallado do assumpto tinham-n'as imaginado, jurando nos dizeres dos viajores, como constituidas de uma substancia lodosa do leito do rio ou do fundo de algumas lagõas ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 145 adjacentes, substancia esta que, segundo informa Labat, mal se retira d'agua torna-se para logo tão dura que nem ferro basta a riscal-a. Seyíried, que escrevia em Berlim, sobre este assumpto, no anno de 1747, acredi- tava existir no Amazonas uma terra verde, bastante molle n'agua, mas que com a exposição ao ar, adquire uma dureza, só comparavel à do diamante ; e o proprio Buffon, que discretamente cita aquelle auctor, não se mostra de todo adverso a crer verdadeiro este facto que discute e aprecia com bastante arte, ainda que sem o criterio scientifico exigido, talvez porque Ih'o não podesse ainda ministrar à Sciencia daquelle tempo. Humboldt, entretanto, o luminar da primeira metade deste seculo e o vulto mais portentoso que ainda nos veio alem do Atlantico, a quebrar os sellos dos nossos occultos thezouros e a decifrar os enigmas desta ingente natureza americana,não sómente nega, assim como fizeram outros sabios seus coevos, que sejam taes pedras oriundas do Amazonas, mas ainda estygmatisa a bypothese absurda da origem lodosa, nas se- guintes energicas palavras : «(est une opinion denuée de tout fondement, quoique três —repandue à P Angustura que cette pierre (Saussurite) est tirée dans un état de ra- mollissement pateux, du petit lac Amucu.» A descripção que daquellas pedras amazonicas passa a dar-nos Humboldt, em seguida, prende-nos às suas as nossas convicções sobre o assumpto, e induz-nos à supposição, não só de que não sejam do valle do Amazonas essas pedras, mas que tenham ellas suas jazidas no solo asiatico. São artefactos graciosamente lavrados de jade nephrite (4 que alguns autores as- sociam a saussurite), conhecida sob o nome de pedra de Yu, da China, donde provêm em nodulos ou em artefactos do mais fino lavor. « Ce jade a servi anciennement à faire des amulettes. Il est commun daris Vinde et dans la Chine, ou il est artistement travaillé. Le jade verte est au nombre des pierres sonores dont les Chinois forment des instruments de musique. Dans les iles de la mer du Sad, et dans PAmérique mé- ridionale, il a été employé par les sauvages pour faire des pierres, de haches ou des casse-têtes, ce qui Pa fait designer par les noms de jade axinien ou ascien : c'est le Poenamu de la Nouvelle-Zelande, la Pierre des Amazones des Americains.! » No mesmo nome «jade» somos obrigados a reconhecer etymologia extranha ao solo americano, porque quaesquer que sejam as modificações plausíveis à que se tenha podido submetter esta palavra, em sua evolução glottica, não me parece que rasoavel- mente se ajuste a nenhum vocabulo das linguas falladas na America. - Si ao contrario, tomarmos a hypothese de que tenha sido a jade objecto importado pelas nações Toltecas, Chichimecas, Acolhuas, Tlascaltecas e Aztecas que durante seis ! Delafosse, Nouveau Cours de Mintralogie, pag. 4228-429. V. II— 20 146 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL seculos vieram successivamente, das bandas do Noroeste, a povoar, como dominadoras ou como alliadas, varios pontos da America Central, não nos sera talvez mui difficil acharmos o tronco de que germinou esta palavra. Remontemos, para isso, até as para- gens donde partiram aquelles emigrantes asiaticos. Os seculos expungiram infeliz- mente de sobre a face da terra das costas americanas os vestígios que desse longo peregrinar poderiamos ainda hoje descobrir além do 40º grau de latitude septentrional ; — as praias do mar de Kamtchatka ou do estreito de Berhing e as abras abruptas da pe- ninsula de Alaiska nenhuma pegada nos deixam ver agora da travessia daquellas hordas a quem as guerras asiaticas, arrancando-lhes a patria, destinava o dominio futuro do Mexico, da Columbia e do Perú. Temos, porém, nas aflinidades ethnologicas, nos caracteres anthropologicos e nas similitudes lheogonicas um como fio de Ariadne que nos aponta a extremidade oriental do solo asiatico por patria primitiva dessa corrente humana migradora. | All o nome « jade, » consagrado pela Europa, em muitos de seus idiomas ao talisman famoso, que nos diversos paizes do novo continente recebeu a denomi- nação «de chalchihuitl, tembetá e mirakitá, de caracter tão extranho à sua etymologia, parece que justificada encontrou esta etymologia nas fontes puras donde primeiro devia ter emauvado este, ia quasi dizer, insolito vocabulo. E com effeito, si os chinezes chamam a jade Yu-chi ( pedra de Yu), de- nominam-n'a Gu-Wehhe ( pedra de Gu), os Mantchus orientaes, mais proximos da America; os Mongoss—kKach-Tehilagum, bem como os Oiguras ou Hunigaros—Kach- Djilum (pedra de Kach)? que se mudou facilmente em gache e mais tarde em iach e por fim em vyade, do mesmo modo por que de kasp (montanha ) fez-se o nome yasp de que se originou o hebraico yechpheh e ultimamente a palavra jaspe das linguas latinas. E, pois, evidente que Yu, Gu e Kack são as celebres collinas sagradas donde extrabiram-se as tão celebradas pedras mais ou menos verdes, à cuja influição sub- metteram-se todas as racas primitivas e ainda outras já seu tanto civilisadas. * « Quelques savants ont cru reconnaitre dans ces étrangers des Européens naufragés, oú les descendants de ces Scandinaves qui, depuis Vonziême siêcle, ont visité le Groenland, Terre-Neuve, et peut-être même la Nouvelle-Ecosse; mais, pour peu que Von réfléchisse sur I époque des premiêres migrations toltêques, sur les instituitions monastiques, les symboles du culte, le calendrier et la forme des monuments de Cholula, de Sagamozo et du Couzo, on conçoit que ce n'est pas dans le nord de VEurope que Quetzacoatl, Bochica et Manco—Capac ont puisé leur code de lois. Tout semble nous porter vers VAsie Orientale, vers des peuples qui ont été en contact avec les Tibétains, les Tartares, Shamanistes et les Ainos barbus des iles de Jesso et de Sachalin. » pç Vues des Cordillêres et des Monuments des Peuples Indigênes de VAmérique, vol. 1, pag. 358 — 39. * Entre varios povos da Asia Occidental a jade chama-se Yechm, Yeachm, Yechim e Yechna. Não serão, portanto, afiliados a estes nomes os de Chohim ou Chôhan que dá o Genesis a uma pedra preciosa da Asia? ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 149 Não descaberia talvez agora inquerirmos o porque não conservou na America esta preciosa pedra o mesmo nome de jade que tem na Europa e que tão par- ticularmente denuncia, como acabamos de ver, o primitivo appellido Kache donde recebeu origem aquelle nome. A este respeito, porém, comquanto possamos encontrar inequivocos laivos de paren- tesco entre Jachdipilum e chalchihwal, que na lingua mexicana significa mais ou menos « pedra preciosa » antolha-se-me sobre pósse este assumplo, já pela carencia dos cabedaes que me elle requer para ser elucidado, já tambem e principalmente porque o culto da jade, ao nacionalisar-se na America, parece haver abandonado gradual- mente o primitivo vocabulo desta pedra, ao passo que se foi distanciando de suas fontes. E na verdade, tudo me induz a suppôr que a mesma palavra chalehihutl fosso ja segunda ou terceira modificação do appellido primordial, e assim tambem que tivesse sido esta modificação a ultima havida na America daquele nome com- posto. A transformação que soffrem, de ordinario os costumes e até os caracteres mais peculiares de um povo que emigra de paizes adiantados para regiões incultas, é um dos maiores obstaculos antepostos ulteriormente ao estudo desse povo. Os Aztecas ! que por dissensões civis e religiosas ou pelo temor de alguma grande epidemia das que têm tido por fautor aquelle recipiente das aguas abrasadoras da zona torrida, denominado «Golfo do Mexico », os Aztecas, digo, que, por qualquer destas causas tiveram de abandonar a patria adoptiva de Anahuac para abrirem forasteiros, em alguns pontos da extensa bacia do Amazonas, suas novas tendas de proscripção, nem siquer o nome bastardo de chalchihuiil lograram transmittir às colonias semi-barbaras que ahi deixaram. O divino talisman recebeu da nova geração mistiça do valle do grande rio um nome que nada tem que ver naquelle, mas que vem felizmente justificar mais ainda o caracter distinctivo que anteriormente attribui à este adorno pessoal, Este nome, que está por si proprio a dizer-nos a quem exclusivamente perten- ciam as pedras amazonicas, posto que mui expressivo seja, não o transmittiram os povos daquella região aos povos destas terras meridionaes d'aquem do Amazonas, por entre os quaes, tenho que só muito depois se andou a fundir e a mesclar. ao contrario, de Sul ao Norte, um ramo da corrente immigradora de origem tolteca 1 E' de suppor que os proprios Toltecas bem como algumas familias Mayas muito antes da invasão Azteca no valte do Amazonas, tenham tomado por objectivo de sua perigrinação a região saliente da America em que hoje se acham os Gnyanas e, em particular, a fóz do Amazonas, donde, ao depois, subiram para os Andes ou para o sul, seguindo o curso das bacias do Amazonas e do Prata. 148 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ou azteca. Verdade é que no valle do Amazonas se ficaram, segundo creio, as ver- dadeiras jades, chalchihuitls ou mirakitás, não inteiras todas, quaes as deviam trazer os chefes aztecas, enfiadas ao labio e ao nariz, com a fórma provavelmente das figuras 4, 9 e 6 da Estampa VIII, mas reduzidas, na maior parte, a fragmentos que se con- servavam sem o mesmo uso, porém como relíquias preciosissimas, de geração em geração, até nossos dias, e que, por isso, não podem ter hoje a configuração dos adornos faciaes completos. Houvessem, porém, muito embora passado às tribus do Sul alguns desses fragmentos de mirakitás, como é provavel tenha acontecido, é certo que o adorno facial neste lado da America, povoado pelos que depois chamaram-se Tupys e Guaranys, tomou o nome de tembetá « pedra labial, » como certo é tambem que, pela deficiencia da jade, resolveram os nossos indigenas, a exemplo do que haviam praticado os proprios Toltecas e Aztecas, no golfo do Mexico, talhar da orthosia verde, que tanto na côr e na consistencia se lhe approxima, o adorno labial, caracteristico de seus maiores, ou emblematico de sua nobreza, ou significativo de suas antigas crenças. IV Pretender prescrutar à luz, ainda por ora vacillante da anthropologia e da archeolo- gia qual a origem tão romota quanto obscura dos povos americanos, o mesmo fôra que se tentassemos alumiar, com a lampada mortiça do mineiro, as anfractuosidades das fendas profundas de vaslissima caverna. Estas são o resultado do lento embate das aguas na penedia ou, em rarissimos casos da retracção, ainda mais lenta, da constructura da rocha, sobre cujo vasto ar- cabouço lavrou por longos seculos a acção comburente dos fócos igneos subterraneos, ou do proprio calor solar. Assim tambem na individuação e na consubstanciação do povo de um continente causas innumeras foram intervindo sobre a sua psychica evolução, as quaes ou ergue- ram-n'o ao mais.alto grau de aperfeiçoamento moral, ou aviltaram-n'o ao nivel somenos do bruto, ou ainda, contrabalaçadas as acções de progredimento e de retrogradação, dei- xaram-n'o estacionado nesta asthenia moral em que se ficaram algumas nações do Oriente, —asthenia mil vezes peior que a morte. A Sciencia não basta, com os mais potentes recursos ao seu alcance, a elucidar nenhuma destas duas ordens de phenomenos, physicos em uma, e moraes na outra. As investigações, sobre taes assumptos, limitam-se neste caso ao auxilio da induc- cão fundada na observação das analogias e autorisada pelo estudo do que com as mais ponderosas razões preceitua a Sciencia. Cada um dos povos que successivamente penetraram no solo do antigo Anahuac sabia de cór a historia de sua peregrinação; e si dessas narrativas reunidas nada po- demos ao certo colher, quanto à origem e à patria dos Toltecas, dos Chichimecas dos Acolhuas, dos Tlascaltecas e dos Aztecas, sabemos que professavam o mesmo culto, falavam a mesma lingua, pertenciam à mesma raça e construiam os mesmos templos py- ramidaes, a que chamavam teocallis. E”, portanto, evidente que haviam habitado, sinão as mesmas paragens, ao menos, paizes vizinhos, e pois que davam à sua patria os nomes de Aztlan, de Teocolhuan, de Copalla, de Huehuetlapallan e de Amaquemecan, facil seria o achar-lhes a origem, si possivel fosse descobrir, atravóz do espesso manto dos seculos decorridos, um paiz ao Noroeste da America, ou no Oriente da Asia, que hou- vesse sido assim chamado. 150 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Naquellas regiões, porém, si na ordem physica dormita a natureza sob o sudario quasi eterno dos gelos do Norte, na ordem moral vivem os homens, que escassamente povôam paragens semelhantes, sob a influição da mais crassa ignorancia do que lhes poderiam haver legado os seculos que fôram. Os habitantes de tão inhospitos climas disputam actualmente ao urso-branco do Polo o incerto alimento, e aos gêlos arcticos o arriscado abrigo. Houve tempo, no emtanto, em que a temperatura mais branda permittiu menos rude existencia e até certa cultura intellectual, de que são vestigios as pinturas hieroglyphicas, xylographa- das, dos habitantes ribeirinhos da bahia de Norfolk, mais ao sul. Certo é que nas mesmas latitudes até as proximidades do 60º gráu septen- trional, a temperatura da costa occidental da America é ainda hoje muito mais suave que a da costa contraria, e que 0: habitantes das ilhas Sitkha e do Principe de Galles, assim como os da costa de Norfolk, apresentam caracteres em que facilmente se reco- nhecem as pegadas do desenvolvimento intellectual que por alli transitou. Eu penso, com Humboldt e Marchand, que si aqueles americanos não são os des- cendentes de familias mexicanas ahi refugiadas, com a invasão dos europeus no im- perio de Montezuma, é mui provavel que sejam os netos de alguns dos povos Tolte- cas, Acolhuas ou Aztecas que lá se fixaram em meio do caminho de Aztlan ou de qualquer outro ponto donde houvessem partido para Anahuac. (Que enormes lacunas as que se nos deparam nestes assumptos ? Primeiro que tudo pergunto eu: estarão no continente americano ou no asiatico estes paizes de que eram aborigenas as nações que invadiram pelo Norte as altipla- nuras da America equatorial ? E demais, quanto tempo teria decorrido entre a partida de cada um daquelles povos e a sua chegada à America central? « Un peuple septentrional, mais três policé, diz Humbolt, les Toltêques, parait dans les montagnes d'Anahuac à [est du golfe de Californie: il se dit chassé d'un pays situé au nord-ouest du Rio Gila, et appelé Huehuetlapallan; il porte avec lui des peintures qui indiquent, année par année, les événements de sa migration ; il prétend avoir quitté cette patrie, dont la position nous est totalement inconnue, Vannée 544, à la même cpoque à laquelle la ruine totale de la dynastie des Tsin avait occasioné de grands mouvements parmi les peuples de VAsie orientale .» Ora este povo, a primeira das cinco ou seis nações conhecidas de quantas segui- ram o mesmo itinerario, de Noroeste a Sueste, appareceu na America equinoxinal sómente em 648,! de nossa éra, isto é, 104 annos depois de haver emigrado do Huchuetlapallan. - * Divergem os americanistas, no tocante ás epochas em que os Toltecas sahiram de sua terra natal é effectuaram o seu ingresso no Mexico; quaesquer que sejam, no emtanto, as verdadeiras datas, passa como averiguado que se demoraram em viagem mais do que a vida de uma geração, sendo pois justificado o que pouco adiante direi a respeito do que de visu era impossivel aos Toltecas narrarem sobre Huchuettapallan. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 151 Nenhum, portanto, dos individuos dali sahidos vivia já, e mui raros houve, da segunda geração, que lograram pousar os olhos turvos, pela velhice e pelas fadigas, sobre essa nova lerra da promissão, que lhes seria em breve o leito do ultimo somno. Além disso, algumas circumstancias, e, mais que tudo, a ausencia de qualquer menção, relativa à travessia de um ao outro continente, impellem-me a crer que fosse Huechuellapallan a primeira estação dos Toltecas sobre o solo americano. As conturbações civis e religiosas dos povos asiaticos durante aquelle 6.º seculo, e successivamente nos 4 ou 5 seculos subsequentes, fôram de certo as causas unicas das diversas migrações de que eram como reflexos as diferentes invasões que tiveram a America central e meridional por talvez casual objectivo. A"quellas nações que não habitavam a Asia boreal e que, só pela necessidade de atravessarem o estreito de Berhing, para alli se dirigiram, cra-lhes impossivel o viverem em tão elevadas latitudes. Natural é, portanto, que se apropinquassem, aos poucos e de boamente, do ameno clima do tropico, si o não fizeram recha- cados pelos povos que já encontraram constituidos ao longo da costa, do 60º gráu para o sul, e que, descendentes como elles, de tribus asiaticas anteriormente emi- gradas se lhes haviam energicamente anteposto. Para que, entretanto, semelhantes evoluções se realisassem fóram precisos extensos lapsos de tempo, durante os quaes tornou-se mais vaga a tradição, dis- siparam-se alguns vestigios do passado e muitos padrões desappareceram que relembravam unicos os fastos grandiosos dos tempos mais felizes da patria per- dida. Confiar inteiramente nas narrativas de povos que por tão longo tempo peregrinaram, que viveram vida nomade durante tres largas gerações, fôra correr os riscos da pura phantasia e trocar pela severa restricção da historia as ima- gens ficticias da imaginação. la, comtudo, em casos taes, alguma cousa que perdura. Pos povos de Aztlan ou de Huehuetalpallan, sabemos que conservaram in- tactas as crencas tradiccionaes e todas as idéas concernentes à theogonia de seu primitivo berço. Ja vimos como, e até que ponto, tinham as pedras verdes (afins com a jade oriental) sua individuação nessa velha theogonia. Pelo culto da jade, transportado em todo o seu vigor e bizarria ao Novo Mundo, ficaram bem patentes quaes os laços que nos filiam aos povos do extremo Oriente. Acrescentemos agora as afinidades tambem de crença que existem entre o zodiaco tartaro-mantchú e o dos Aztecas onde encontramos em parallelas significações : o tigre, a lebre, a cobra, o macaco, o cão e o passaro; ponderemos ainda na simi- litude dos signos dos nakchatras indios, com os dos Mexicanos, e teremos, sobre tantas outras solidas bases, argumentos de alta valia que não sómente nos con- vidam, sinão que nos forçam a crêr na commum origem dos dous povos. (Quanto ao culto do tembetá, unica parcella que nos foi trazida da vasta theo- gonia toltera ou azteca, dificil fóra saber si já o conheciam os verdadeiros 152 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL autochthones, isto é, os povos anteriores aos Toltecas ou aos Asiaticos que antes delies para aqui emigraram. E de suppór que sim, porém, não é isso mais que simples hypothese, a qual aventuro bascado unicamente no que deixei exposto sobre a ten- dencia dos homens primitivos, como de todos os animaes, aos mesmos trabalhos, aos mesmos gostos, a eguaes sentimentos e a paixões semelhantes. O de que temos sciencia é que em toda a costa, desde Guatemala até a fóz do Amazonas, costa que serve de antemural ao golfo do Mexico, ao mar das Antilhas e às ondas quentes e precipites do Gulf-stream, parece haver sido doutrinado o culto do tembeta. Terá tido este culto por apostolo o proprio Quelzalcohuall ? À historia mexicana re- conta ter este grande reformador descido até Cholula, donde, depois de haver disei- plinado o povo, proseguiu na direcção de Sueste até as costas do extremo do golfo, e que ahi desapparecêra. Dizer que fosse elle o velho Bochica ou Zué, a quem os habitantes das alti- planuras de Bogota, ou melhor Bacata, devêram a civilisação que 03 elevou a um nivel quasi egual ao dos Azlecas, fóra chamar sobre mim a pecha de exagerado. Força é comtudo confessar que de homens sahidos do planalto do Mexico, talvez chefes importantes mas vencidos nas lutas intestinas de Anahuac, ou ainda, | como ja o disse eu, amedrontados por horriveis epidemias das que flagellam às vezes as cercanias do golfo do Mexico, parece que receberam os Muyscas e os Peruanos as luzes dessa civilisação mais tartara ou egypcia do que grega, e cuja principal séde, na America, foi o Mexico. Um facto se nos depara agora que vem apoiar esta hypothese e, a um tempo, dizer-nos o por que Manco-Capac, em vez de chegar ao Perú pelo lado do Poente ou pelo menos, das regiões do Norte, apparece subitamente das planuras orientaes. Este facto é a exhumação, na ilha de Marajó, a fóz do Amazonas e nas margens do grande rio, em pontos proximos daquella ilha, de vasos anthropomorphos e mais geralmente zoomorphos, bem como de outros artefactos ceramicos de fórma e fabricação tão perfeitas como nunca as imaginaram as tribus selvagens que ora alli se encontram, Dos vasos de granito, achados na costa de Mosquitos diz Humboldt que não só- mente são objectos mui superiores às posses dos barbaros que habitam a mesma loca- lidade e que não sabem siquer lavrar a pedra, como tambem representam grandes ana- logias entre os seus adornos e a ornamentação das ruinas de Mitla. Faço minha esta observação de Humboldt para applical-a aos vasos da fóz do Amazonas em que se me afliguram reminiscencias vagas, mas às vezes notabilis- simas, da ceramica e da esculptura dos Toltecas e Aztecas, além de grandes affi- nidades com os proprios vasos á que allude o illustre auctor do Cosmos. Devemos, pois, crer que, si serviu a fóz do Amazonas de quartel general aos povos emigrados do Mexico, sobre o que ha notaveis probabilidades, maiores ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 153 probabilidades surgem para mim de que dalli partiu a civilisação andina, assim como pelo valle do Orenoco acima é de crer se houvesse encaminhado ás alturas de Bogota a civilisação muysca ou mozca; a primeira conduzida por Manco Capac e.a segunda por Bochica. Estes dous reformadores, discipulos e continuadores do Buddha indiatico, re- presentam, na evolução social dos povos que o acaso submetteu ao seu suave dominio, o mesmo caracter civil e religioso de (Quetzalcohuatt perante os Aztecas. Ambos procuram conciliar, sob as doutrinas mais attrahentes, os antigos habitos e as primitivas crenças de seus novos subditos, provando-nos, desta sorte, que eram effectivamente sacerdotes de Vichnu, perseguidos pela sanha dos sectarios de Siva, de cuja sanguinaria influição recebeu, por ultimo, a população de Anahuac a fe- rocidade dos ultimos seculos de seu culto. A experiencia do que de mais per- nicioso tinham notado entre as facções em que se haviam dividido os povos do Mexico ; o horror que lhes inspiraram os excessos das paixões, dia a dia augmentadas nas classes superiores da população Azteca, bastaram-lhes ao melhoramento da organisação social de sua nova patria adoptiva, de tal modo que eliminados desde logo ficaram todos os habitos civis e ceremoniaes religiosos aztecas que mais acreditaram haverem contribuido aos desmandos do antigo Mexico. Assim os vemos abandonarem, entre muitos outros costumes de seus ermãos mexicanos, a pintura hieroglyphica, talvez por ser, à qualquer titulo, adversa aos pacificos intentos de sua dictadura theocratica, conservando, ao contrario e desen- volvendo até, como respeitando em elevado gráu, o uso do nepohualtzitzin ou quippu, de que se serviam aquelles povos, á maneira dos primitivos Mexicanos, Chinezes, & Egypcios. Desta proposital e premeditada abrogação de tantas antigas praticas, resultam os empêcos que nos são anfepostos ao estudo comparativo entre os Aztecas do Mexico e estes oulros da Columbia e do Perú, accrescendo, sobre isso, os escondimentos que, muito de sciencia, empregaram Manco-Capac e Bochica, rela- tivamente às fontes onde tinham haurido os preceitos de que eram ensinadores, bem como sobre o ponto do Globo que lhes havia sido berço. Difficil é, portanto, o conhecermos si, com effeito, o culto das pedras verdes e azues, em continuação ao da jade, teve nessa colonia Neo-Azteca a mesma latitude que havia recebido no Mexico, no Yucatan, em (Guatemala, nas Honduras, e às margens do Mississipe e do Amazonas. Sabemos apenas que alli existiu este culto, e disso exhibe-nos claro testemunho o calendario lunar dos Muyscas, insculpido em uma pedra verde, si me não engano, “da mesma orthosia do grande tembetá do Museu Nacional. ! 1 Humboldt, Vues des Cordillêres, 2 vol. p. 220. V.I—2 154 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL Sobre uma das cinco faces lateraes desta pedra, vê-se a figura insculpida de um batrachio. Esta particularidade traz-me à memoria a coincidencia de se ha- verem encontrado entre as pedras amazonicas algumas que representam a fórma de uma rã. Não é tão patente nesta individuação de um animal de vida, a principio, aqua- tica a revelação das affinidades que existem entre a veneração das pedras verdes, na America, e o culto das aguas, na Ásia e no proprio Mexico, onde as consideravam representadas nestas mesmas pedras? Certo, que sómente a este ponto da theogonia azteca ou tolteca, transportado ao valle do Amazonas, devemos attribuir a supposta origem lodosa das pedras verdes amazonicas. São equivocos estes mui frequentes entre os povos de cujos ascen- dentes apagou a mão inexoravel do tempo a melhor das tradições, o mais puro das crenças. Tenho até aqui deixado talvez transparecer a idéa de que seja sómente o territorio da Asia oriental a unica jazida da verdadeira jade. Devo, no tocante á este particular, accrescentar que mui provavel é que tambem se encontrem algumas jazidas deste precioso mineral no solo americano, e si a constituição geologica de alguns pontos da America força-me a esta supposição, não menos aconselha-m'a a prodi- giosa quantidade de artefactos de jade, encontrados nas regiões em que primeiro se domiciliaram os Toltecas e os povos da mesma origem, que depois delles para ahi vieram *. « Malgré nos courses longues e frequentes dans les Cordillitres des deux Ameriques, diz Humboldt, nous n'avons jamais pu découvrir le jade en place, et plus cette roche parait rare, plus on est étonné de la grande quantité de haches de jade que Pon trouve presque par tout ou Von creuse la terre dans des licux jadis habités, depuis "Ohio jusqu'aux montagnes du Chili. » Toda a difficuldade está porém, em que primeiro nos definam qual a ver- dadeira jade, pois desde o silex mais ou menos puro, mui proximo parente da opala, até o verdadeiro feldspatho, ha uma serie de gradações tão intimamente affins entre si que, si consagrarmos o nome de jade unicamente a esta ou aquella es- pecie ou variedade, ha eminente risco de exclusões indevidas, si não absurdas, e isso não sómente, quanto à natureza mineralogica destas rochas, mas tambem quanto ao seu variadissimo colorido. ! Não se pode dizer ao certo si a jadeite é ou não peculiar so solo americano. Humboldt paira entre a aflirmativa e a negativa, dando por vezes a entender não ser improvavel a origem americana. . Os Srs. Damour e Fischer que tanto se hão occupado deste assumpto mostram-se dispostos a mesma opinião no seguinte trecho: « D'aprês les documents rapportés par La Condamine, 1745, Buffon, 1749, de Humboldt, 1807, de Martius, 1828, etc., ou doit présumer que la matiêre alors designée, par ces illustres naturalistes sous le mom de pierre des Amazones se rapporte au jade néphrite et qu'elle se trouve dans VAmérique méridionale sur quelque point des bords ou des anciennes alluvions du vaste fleuve des Ama- zones, » ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 155 Salvo grande e arbitrario rigor de classificação, deve haver sem duvida nas collecções archeologicas do Museu Nacional algumas jades saussurites a cujo numero pertencem as tres representadas pelas figuras 4, 5 e 6 da Estampa VIII. No valle do rio Doce, para onde accorreram os restos de algumas tribus Tupinambás, é de crer que existam ainda alguns fragmentos de jades, das que para ahi trouxeram os povos neo-toltecas, na sua transmigração do Sul para o Norte, de que fallarei mais adiante. Existam ou não, porém, ja alli os vemos, a estes fragmentos de mirakitás, com o nome de tembetás. E facto digno de reparo: ao passo que muitas tribus da mesma região tomaram como denominação da rodella de madeira, que subs- tituiu entre ellas o tembetã, o appellido de guimua ou gnima, outras ainda alli conservam o primitivo nome « tembetá », apenas com uma tal ou qual reducção desta palavra à palavra mais simples; facto este de que não são raros os exemplos entre povos que decahem de um estado de cultura intellectual, anteriormente mais desenvolvido entre seus antepassados. Metá ou metó é com todas as probabilidades de acerto, o nome que resultou dessa especie de abreviação. E, a este respeito, cabe-me ponderar que a palavra « metara » applicada ao adorno labial pelo Visconde de Porto Segundo !, a exemplo do que antes delle haviam feito alguns auctores, nenhuma outra mais é que metdá, ou melhor, mbeta, em que facil é reconhecermos a reducção do nome tembetá. São communs estas modificações nas linguas tupy e guarany, e o exemplo de que ora trato conta semelhantes e muitos affins nas alterações: mb do nome Tembiu, alimento; e mbrahau de Tembiaha, escravo. Haverá porém muitas tribus em que mbeti ou metá seja usado em vêz de tembeta? Tenho razão agora para crêr que uma só empregue esta palavra e que esta seja a dos selvagens Botocudos que vivem ao longo do rio Doce, nas vizinhanças do porto de Souza. O Dr. Felippe Rey, ha pouco chegado daquellas paragens, aonde conviveu alguns mezes com os Botocudos que as habitam, informa-me que o botoque de que usam é por elles denominado jameto. O Dr. Rey allienista, distincto a quem auspicio hon- roso e laureado futuro, não curou nunca do estudo das linguas americanas e portanto não se occupou da estructura desta palavra. Para quem quer que se dedique a tal assumpto, ainda que, como eu, muito de levante, é sabido que a leitra a terminal corrompeu-se em muitos vocabulos dos idiomas adulterados do Tupy e 1 V. de Porto Seguro, Historia Geral do Brazil 2.2 edição, vol. 1.º pag. 27. 156 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL do Guarany no som de o, e assim tambem que já é insignificante mas vulgar modificação de cha (nosso), ou de chê (meu). Jametó ou antes Jametá nada mais é, pois, do que chameta ou chemeta (meu metá) do qual natural e gradualmente chegaremos à chembeta, chetembetá, e por eu- phonia, a cherembetá, conforme se deve pronunciar e vejo escripto em alguns ro- tulos que me vieram às mãos, com os tembetás recebidos das provincias do sul, para o Museu Nacional. Quanto à palavra cha ou chê, anteposta a tembetá, evidente é que só por distracção ou ignorancia de quem a ouviu dos labios de indigenas achou-se ella prefixa a este nome. Causa foi provalvelmente de semelhante engano a especifi- cacão ou clareza observada na linguagem de nossos aborigenas. O selvagem, a quem se pergunta o que é ou como se chama um objecto de sua serventia, e mais ainda um adorno exclusivo de seu uso pessoal, tem por habito responder tão explicitamente que, satisfazendo à pergunta, deixa tambem expresso que a elle lhe pertence. Dahi o ché ligado ao nome tembetá e produzindo um equivoco tanto mais lastimavel quanto se vai perpetuando nos escriptos dos viajores que se tem oceu- pado desses adornos de nossos aborigenas. Si investigações mais acuradas fossem feitas sobre os povos que habitaram os Andes, facil nos seria agora, cuido eu, ampliar o estudo dos adornos faciaes até aquelle povo. Infelizmente, o adorno de pedra ao labio ou ao nariz dos chefes» a quem os soldados hespanhões sobrepozeram o jugo das armas, e os jesuitas, 0 da cruz, não lhes attrahiu a attenção porque, em substancia, não bastavam a desper- tar-lhes a cobiça; e si à alguns dos ultimos devemos os quasi expungidos traços da historia dos antigos senhores daquellas terras, a muitos dos primeiros, sobram- nos razões para que os estygmatizemos, que culpa foi só delles, e não de outrem, a perda irreparavel dos monumentos historicos dos dominios incas. Manco Cacap, cujos habitos revelam-nos a cada momento sua origem tartaro- japoneza tinha furadas as orelhas e raspado o cabello, de que só no alto da cabeca conservava a trança caracteristica e que é ainda hoje usada pelos habitantes do extremo oriental da Asia. E” de crêr que mantivesse elle tambem o culto da pedra, sinão trazendo-a ao Jabio ou ao nariz !, ao menos e com muita probabi- lidade, ostentando-a ao braço, a exemplo dos Nahuas seus antepassados, d'onde teve origem a cinta de ouro que no mesmo braço veio apresentar mais tarde o emblema da sua theocratica realeza. adia pias que vieram civilisar o Mexico, a Columbia eo Perú não usavam todos do adorno e o isso que parecer-me que só nas tribus mais selvagens encontravam-se os grandes Pior : que me referi quando fallei do exagêro dos gnimas on guimúas dos nossos Botocudos. » portanto, deste modo explicado o porque era o beijo conhecido de algumas tribus e ignorado por outras, assim daquelles paizes, como deste lado oriental da America. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 157 Aquelle personagem, mysterioso como Bochica e Queztalcohuatl, não habitou provavelmente a fóz do Amazonas, não conviveu alli com a tribu industriosa e culta de cuja presença são vestígios notaveis as collinas zoomorphas de Marajó, os vasos figurados, artisticamente pintados e esculpidos, como os representam as Es- tampas VI e VII; os famosos Tambeés* que são como as folhas de vinha das Evas do Amazonas, e uma infinidade de delicadissimos pequenos vasos das collecções archeologicas do Museu Nacional, dos quaes, talvez em outras folgadas horas, me haverei um dia de occupar. Manco Cacap, porém, descendente, filho ou neto talvez, do chefe da tribu migradora, é o representante da selecção natural de uma raça illustre, e a um tempo a expressão mais eminente dos energicos esforços de todo um povo; e este povo, a quem retemperou por largos e afilictissimos annos o amargor do exilio, que o mesmo é dizer o reluctar ininterrupto pela existencia, é nada menos que o emigrado de Anahuac, o fautor dos ceramios de Marajó e o creador do culto rendido ao tembeta nas umbrosas e opulentas ribas do Amazonas. Cabia agora o inquerirmos quaes as razões por que abandonára aquelle ramo do tronco Maya ou Nahua o fecundo e vastissimo delta que o Amazonas, con- gregando o tributo dos tres reinos de seu amplo estuário, esculpiu em soberbo relevo à sua fóz, como reprêza às vagas do Oceano e unico herdeiro de seu antigo nome. * Talvez que n'isso influenciassem ou as ingentes alluviões primitivas do grande rio, ou as frequentes investidas, à sorpreza, das hordas rapaces das vizinhas costas do Norte, e mui provavelmente estes dous motivos em simultancidade, o que por indiciso e duvidosissimo ainda tenho. Em compensação, antolha-se-me de menos difficil elucidação quanto é referente ao itinerario que seguiram os forasteiros, desde Marajó até as guindadas serra- nias dos Andes. Assumpto é este em que me não arriscára a tocar, si para aqui me não obrigasse a trazel-o o mesmo estudo do tembetá. 1 Esta palavra define muito mais rigorosa e naturalmente o artefacto de que se trata do que as palavras tanga e babal. Salvo, porém, si babal nada mais é, como supponho, do que uma alteração do nome quichua com que se designava este objecto. 2 Marajó, como Maranhão são corrupções do appellido primitivo do Amazonas. O que, pr ao é provavel é que tenha tal nome a etymologia que lhe suppóz Martius: Inclino-me antes a SE que todas as variantes com que se têm, ha já passados tres seculos, denominado este gigante a pao advêm não só da má audição da palavra indigena por parte dos Européos, como tambem E a do no o) por que a pronunciavam os selvagens, abrandando a labial p de paraná em m, e resultando a a nome mbaranã ou antes marana donde procedem as modificações maranon, marayo e por tim marajó. 158 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL E" que muito ha que ver, neste itinerario, o adorno labial e nazal, como indicador, que se me affigura ser, da região percorrida pelos que deviam ter mais tarde, sob seu illimitado dominio, as hordas então selvagens dos Andes e das vertentes do Amazonas, do Prata e do Orenoco. Pouco importa agora sabermos si a tribu ou facção de Manco-Cacap, como as que anterior e citeriormente seguiram o mesmo rumo, de Anahuac para o Sueste, tomou o caminho da costa ou antes o percurso dos rios, subindo o Orenoco e descendo pelas vertentes do Yapurá ou do Rio Negro, ati o valle inferior do Amazonas. Sabemos, e é isto quanto sobre o nosso assumpto nos satisfaz, que até este rio andaram aquelles povos de Noroeste a Sueste, pois que mui pouco desvia-se desta di- recção a linha itineraria por elles seguida, não só de Anahuac para a fóz do Amazo- nas, mas ainda das costas de Kamtchalka até Anahuac. Do valle inferior do Amazonas, porém, de mim tenho que não passaram, pelo menos collectivamente, ás costas meriodinaes, e que, tomando qualquer locomoção fluvial, de tão facil e prompta acquisição, proseguiram pelo leito do Madeira até as abas dos Andes. Dahi seguiram uns para leste, a prepararem no lago Titicaca os primeiros alicerces do imperio dos Incas, e outros, por menos arrojados ou mais provavelmente por adversos à sujeição dos primeiros ensatos da futura theocracia dos senhores de Cusco, alcançando as pri- meiras vertentes do Prata, desceram ao longo de seu curso e, ou povoando os desertos do Pampa, ou assimilando-se aos povos barbaros daquellas planuras, constituiram a nação energica, intelligente e irrequieta dos Guaranys. A estes coube, por sua vez, a missão de povoarem a costa do Brazil do Sul ao Norte e de fecharem no Amazonas a grande curva itineraria que tinham alli iniciado, seus maiores, alguns seculos atraz. Já não pareciam, porém, os descendentes daquelles homens cultos; havia-se-lhes tisnado a pelle, embrutecêra-se-lhes o espirito e alterára- se-lhes a lingua primitiva (fusão já em si de tantas outras) num idioma talvez mais rico, mais opulento e mais em harmonia com as bellezas tropicaes da nova patria, porém de todo o ponto extranha ás noções das pinturas hieroglyphicas dos Aztecas, da archi- tectura grandiosa de Anahuac, da astronomia de seus erudictos sacerdotes e da intricada theogonia dos povos daquella região. Que differença, entretanto, entre estes homens e aquelles seus ermãos a quem a mão do acaso, ou melhor a propria aptidão ao aperfeiçoamento moral, arrastára até as margens de Titicaca. Ao passo que aos primeiros, entorpeciam-se-lhes as idias, esvaeciam-se-lhes os brios nacionaes e avultavam-se-lhes, de momento a momento, os caracteres brutaes da inculta natureza do Pampa, nos ultimos, aperfeiçoava-se a intelligencia, discipli- navam-se as paixões nocivas, e estimulavam-se todos os nobres sentimentos. Digamos, porém, a verdade. Os Guaranys, como os seus descendentes Tupys, entre o pouquissimo que ainda conservavam dos habitos e crença de seus maiores, ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 159 tinham no mais alto apreço o culto do tembeta, do qual, no entanto, apenas alguns vesligios mostravam, na opulencia e na grandeza à que chegaram, aquelles de seus antigos ermãos a quem Bochica e Manco Capac conduziram ao mais alto das serrarias dos Andes e das Cordilheiras. | E como neste uso dos adornos faciaes os Guaranys nada mais faziam do que per- petuarem o habito seguido pelos peregrinos de quem eram descendentes, é natural que o culto do tembetá seja exactamente muito mais desenvolvido na zona percorrida pela cor- vente migradora daquelle povo do que nas regiões para ella mais afastadas. E effectivamente ainda que tenhamos hoje por empêço a estas investigações a natural ampliação que se foi, aos poucos, effectuando do uso do tembetá, ao redor dos nucleos por assim dizer coloniaes deixados pelos viajores, ao longo de seu caminho, a ponto de se não saber, ao certo, donde o recebeu esta ou aquella tribu mais afastada da zona itineraria, póde-se dizer, comtudo, que bastante delimitada ainda se mostra esta zona. Nem mais é preciso do que reflectir que as provincias do Pará, do Amazonas e de Goyaz são, de par com a zona liltoral, as paragens aonde maior numero tem sido achado destes artefactos, e que si dos sertões do Rio Grande do Sul, de Santa Catharina e do Paraná alguns fóram tambem exhumados e outros ainda en- contram-se entre os acluaes aborigenas, ha para isso razão sobeja no contacto im- mediato em que se acharam os dous povos, depois que o ramo dissidente dos invasores resolveu-se a seguir para o Oriente tomando o valle do Prata. Ainda outra prova adduzida. Das provincias de Pernambuco e da Bahia, cujos mais remotos sertões não sup- ponho haverem, recebido das bandas de Oeste o influxo do tembetá, sendo por isso alli este adorno quasi desconhecido, sabe-se que além de alguns tembetás achados no seu littoral apenas vagas noticias possuem os indigenas dos adornos faciaes de pedra. * Assim explico eu, de mim para mim, este tal ou qual desaccordo entre á idéa ligada às pedras verdes do Amazonas e a que se consagra entre os Guaranys e Tupys 1 A razão desta persistencia no uso do tembetá é provavel que não seja outra sinão a do orgulho selvagem caracteristico dos nossos aborigenas ; pois que para elles era o tembetá unicamente a expressão da força bruta ; e si assim é, explica-se naturalmente o porque ligavam elles tanto maior importancia ao tembetá quanto mais ferozes se faziam. 2 Gabriel Soares informa-nos que na Bahia haviam os indigenas por habito extrahirem pedras ver- des a que davam o maior apreço. 160 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ao tembetá ; explica-se egualmente, deste modo, a influição exercida physiologica e philologicamente pelos Guaranys que vieram do Sul, sobre os povos do littoral brasi- leiro, em desaccordo com a crença, dia a dia justificada, de que do Norte e mais espe- cialmente das serras de Oeste (Andes ou Cordilheiras) nos vieram as idéas vagas da divindade e da vida d'além tumulo, com as pallidas noções do Paraiso. Finalmente, parece-me que dahi podemos tambem haurir bem facil explicação à extensão ou ampliação que tomou, no Brazil, a que nós chamamos Lingua geral que dos Guaranys nos proveio e a cujos attractivos, entretanto, conservaram-se quasi de todo extranhas algumas tribus do sertão. Espero que um exame mais acurado de tal assumpto consiga averiguar si aos habitantes destas tribus correspondem as pa- ragens mais longinquas da zona itineraria, justificando ao mesmo tempo o meu asserto. E pois que me aventurei nas adducções de provas que consubstanciem o que tenho até aqui exposto, sobre o vasto circulo que os nossos aventurosos ascendentes parecem ter, como de sciencia, determinado ao redor do solo brasileiro, novo argumento desejo haurir, na lembrança do que já disse a respeito de Manco-Capac, que de Titicaca primeiro sahira para fundar a cidade de Cusco, dizendo provir do Oriente, isto é, das bandas d'onde nasce o Sol, de quem dizia ser filho. Destas mesmas bandas reconta-se tambem que surgira ante os Muyscas o velho Bochica, e dizia a verdade, que ou fósse elle dos emigrados de Marajó, como eram os antepassados dos Incas, ou tivesse subido pelo Orenoco, directamente aos alcantis de Bogotá, é certo que do Oriente provinha para aquelles primitivos americanos, Alguns auctores querem que, não dos extremos da Asia, mas do Egypto ou de qualquer dos paizes ribeirinhos do Mediterraneo, tivesse a America equa- torial recebido a civilisação que lhe deu tamanha estatura moral. Ao envez destes aventuram outros a cujo numero pertence Brasseur de Bourbourg que procedeu ao contrario do vetustissimo sólo de (Guatemala e de Yucatan a cultura intel- lectual do antigo Egypto. Os dous povos tiveram provavelmente commum origem, mas nenhum delles emanou do outro, porque são, nas suas correlações, como dous ramos que bro- taram do mesmo tronco, embora em épochas diferentes, que o mesmo é dizer, com diversos elementos de existencia e sob variadas aptidões physiologicas. ? Brasseur de Bourbourg. Sil existe des Sources de VHistoire Primitive, du Méxvique dans les Monuments Egyptiens. Ei Fes de tantostraços caracteristicos que ermanam os Doras Toltecas ou Aztecas com o do Egypto ntram-se o jubileu secular da festa do sol, no solsticio do inverno, a qual era identica em ambos os Pç construcção dos monumentos pyramidaes, o embalsamamento dos cadaveres por meio de sub- S aromaticas e a veneração da côr verde ou azul das chalchibuitls, em Anabuac, e no Egypto a mesma dos amuletos que eram tambem | Lvi º verdadeiras divindades ou deuse con- fiavam os mortos queridos. nes- penatãs” de quem ao ' ARCAIVOS DO MUSEU NACIONAL 161 E” verdade que os egyptologos que mais insistem nesta origem occidental do povo egypeio acobertam-se com a Atlantida de Platão e com a tradicção do grande povo do Poente sobre quem diziam os sacerdotes de Sais haverem trium- phado os Athenienses. Mas, em consciencia, poderemos nós hoje tomar por firme alicerce de taes proposições essa lenda de Solon? A tradicção da bacia ocedental que assim devem ser traduzidas as palavras hieroglyphicas— Amen Ot (Amenti), referentos ao primitivo berço dos primeiros egypcios, ou mansão divina de seus mortos, não sera talvez uma allusão auto- chthone ao mar do Sahara, onde ainda hoje as arêas daquele vasto deserto deli- mitam aos nossos olhos o dominio de suas antigas aguas ? Pouco importa, porém, que tenha fundamento ou não a segunda hypothese ; sobre a primeira é que de todo, a meu ver, o não possue. Ainda uma vez insisto em dizelio. A origem dos constructores dos teocalis e tenho que tambem dos que, antes delles, edificaram os monumentos de Palenque é, segundo todas as probabilidades, ugaro-japoneza. Os Aínos que vivem actual- mente na ilha de Yeso, parecem pertencer à mesma origem, e si é caracter averi- guado o autochthonemismo presumivel de um povo, em referencia a certo € determinado paiz, de mim supponho que mui poucas nações haverá que possuam este caracter no mesmo gráo em que nol-o mostram os Aínos com relação ao Japão. Ora examincmos estes, hoje doceis e ignaros descendentes dos outrora energicos senhores das extremas abras do Oriente, e veremos quantas semelhancas ha entre elles e os invasores de Anahuac. Destes, reconta-se que eram homens de estatura acima da média, barbados e de cutis clara: taes são justamente os tracos physionomicos pelos quaes destiguem-se actualmente os Ainos, dos Japo- nezes actuaes, senhores do paiz desde os primeiros seculos de nossa era e de origem mais que muito letigiosa, ainda que, por certas affinidades, alguns ethnologos os supponham da raça malaia povoadora das ilhas da Sonda, e outros creiam que da China adviessem antes. De passagem, e a proposito desta ultima probabilidade, ponderarei que coincide exactamente com a queda da dynastia dos Tsins a immigração no Japão dos individuos morenos e de baixa estatura que, desde então até hoje, têm estado por senhores do paiz, em detrimento da população primitiva cujas mais elevadas classes, por se não quererem submetter ao jugo do captiveiro, preferiram correr os riscos da proscripção. Os emigrados seguiram, como é ds crer, para o Oriente, o caminho do que mais tarde teria o nome de Novo Mundo (continente com o qual já mantinham algumas relações), emquanto seus ermãos, ou por menos arrojados, ou por habituados aos rudes labores da gleba, que o eram de facto, predispunham-se à fusão de seu sangue tartaro com o dos novos senhores, —benefica fusão donde devia surgir mais tarde o povo energico dos Neo-Japonezes, — civilisadores do Oriente e propulsores da vitalidade hodierna daquella parte do Globo. V. II —22 162 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL » Acerca da invasão dos Chins em antes dos Tchinas no Japão, acerescentarei que por essa occasião penetraram alli o Buddhismo e a doutrina de Confucius, leis religiosas de cujos preceitos resentem-se as ideas theogonicas dos povos de Anahuac e do Peru. Uma pergunta natural occorre-me, neste ponto em que tantas e tamanhas similitudes resaltam da comparação daquelles povos. Haveria já no Japão primi- tivo o culto da jade, ou só depois lh'o trouxeram os povos invasores ? Que a jade existia entre os Japonezes, supponho que por facto averiguado se póde ter; mas parece que só citeriormente à influição da China e das ideas de Confucius enlaçou-se, no Japão, às pedras de Yu ou de Kotan, a idéa da per- fectibilidade divina de que era imagem a verdadeira jade oriental, à que se deu modernamente o nome de jadeite. Confirma esta hypothese o proprio Confucius que, além de ter em acata- mento divino a pedra de Yu, ensinava aos seus discipulos que os mais antigos philosophos haviam-n'a por assumpto de suas mais profundas cogitações e apre- sentavam-n'a como o symbolo das mais sublimes virtudes. Destas crenças é que adveiu para a America o respeito divino às jades ou ás pedras verdes que, nesta nova patria dos povos orientaes, aos poucos as foram subs- tituindo. Estude-se acuradamente este ponto de analogia entre os povos das duas regiões. Escavem-se a fundo as correlações linguisticas de que podem existir alguns elos salientes nas linguas dos povos da costa Noroeste da America, e mui provavel se me antolha a solução de alguns problemas dos que deixei, no que precede, mal esbocados. Si nenhuma parte do Mundo é, no dizer de Fr. Múller !, proporcionalmente menos povoada, mem olferece, ao observador, mais consideravel numero de linguas ou de grupos de linguas distinclas, é tambem verdade que nenhuma parte do mundo se conhece, que seja menos estudada, e cujas linguas, provavelmente reduziveis a cinco ou seis grupos apenas, sejam menos conhecidas dos ethnologos. Admittida a hypolhese que estabeleco de que a dynastia dos Incas não se domiciliou por largos annos em ponto algum de sua peregrinação, antes de chegar ao Marajó, é provavel que no exame acurado da lingua quichua seja dado en- contrar as raizes do idioma dos antigos Japonezes. Por emquanto, confessemol-o sem rebuço, tudo ainda está por fazer-se, tudo ainda por descobrir-se. Forca é, por- tanto, que, para a elucidação de tão interessantes assumptos, comparem-se as linguas t Fr. Muller, Allgemeine ethnographie, ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 163 dos Mayas e dos Quichuas com a dos Aínos entre si, primeiro, e ao depois com os idiomas ainda hoje fallados pelos povos circumvizinhos do mar de Kamtchalka. ? O grupo das linguas daquella região, no dizer de alguns ethnologos, póde ser considerado como uma especie de elo a que se prendem, de um e outro lado, as linguas do velho continente às do Novo Mundo. Dado este primeiro passo nas trevas que envolvem a historia da immigração dos asiaticos na America, é de crer que tenhamos facil interpretação para os mais arduos assumptos que enthesouram as phases desta mesma immigração. Cusco surgirá aos nossos olhos sob o aspecto de uma cidade da velha Mongolia e a propria dynastia dos Incas, fundada por Manco Capac, mais de perto será radicada nas tradições dos reis do antigo Japão em cujas chronicas miliares encontramos nomes ou titulos reaes como Inga e Mango, de notabilissima aflinidade com os nomes dos poderosos imperadores que do Sol se diziam filhos, irrogando-se ainda, em seme- lhante presumpção, um attributo que somente aos seus antepassados asialicos havia per- tencido. 2 Um exame rigoroso do caracter dos Mundurucús, de sua lingua, de seus habitos e de suas lendas, como de sua industria, collocar-nos-hia na possibilidade, sinão na probabilidade, de reconhecermos na- quelle resto de extranha nação uma colonia tolteca ou azteca, deixada à margem do Amazonas pela nação transmigradora, mas tão solidamente constituida sobre as leis da antiga patria que nem a modificaram os indigenas circumvyizinhos, nem a perverteram os Europeus em tres seculos de destruidor dominio. 166 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL auxilio, e illuminando-se reciprocamente. Separal-as, dando, por conhecidas, noções que era natural suppôrem-se estranhas ao espirito do auditorio, seria querer levantar um edificio sem bases e tornar improficuo todo o ensino. Principiando pelas funcções digestivas, descreveu todos os orgãos que formam o apparelho da digestão e os seus annexos, demorando-se em algumas particula- ridades de structura, quando do conhecimento dellas dependia directamente a explicação de certos actos organicos. Os diferentes processos chimicos e mecanicos da digestão, a acção dos diversos productos secretorios sobre os alimentos, mo- dificando-lhes a constituição intima como condição previa indispensavel à sua absorpção; a acção especial da saliva, do succo gastrico, pancreatico e da bilis sobre os feculentos, albuminoides e as gorduras; o papel do estomago como agente mecanico da digestão e do intestino delgado como principal superficie absorvente ; tudo isso foi devidamente explicado, servindo-se o professor para tornar mais clara e comprehensivel ao auditorio a sua exposição das excellentes es- tampas muraes que possue o Museu. Não admittindo a divisão classica dos alimentos em plasticos e respiratorvos, deu a razão em que se fundava para assim pensar; entrando em seguida em diversas considerações sobre o sentimento da fome e da séde, encarados sob o ponto de vista physiologico, e accidentalmente como capazes de levar à desordem e a ruina ao physico e ao moral do individuo. Factos tirados à historia dessas grandes calamidades, que, tendo assolado em épocas differentes, os povos dos dous continentes, vieram mostrar quão imperiosas são as exigencias da natureza humana, lutando com a falta absoluta de meios de subsistencia. Fallam então mais alto os instinctos da animalidade do que os conselhos da razão, e inteiramente dominado por aqueles o homem não respeita outros direitos que não sejam os da forca, e da violencia: multiplicam-se os crimes e levantam-se as sedições, fazendo retroceder a sociedade aos tempos da barbaria. Abrindo uma larga margem a estas considerações de ordem social, que tão de perto se prendem à questão physiologica, o professor quiz apenas fazer uma referencia ao que se estava passando no Brazil. Entrando depois no estudo da circulação, traçou o desenvolvimento de toda a arvore circulatoria, assignalando as differenças de structura de cada uma das suas partes, e descreveu minuciosamente o coração com suas cavidades, suas valvulas, seus orifícios e seus planos de fibras musculares superpostas. O modo de funccionar dessa especie de bomba aspirante e comprimente, o movimento das suas valvulas, interceptando e restabelecendo alternalivamente a communi- cação entre duas cavidades, o mecanismo da pancada desse orgão, a producção das suas bulhas e as theorias até hoje admittidas para explical-as, foram succes- sivamente o objecto de largas considerações. O curso do sangue nas veias é nas arterias, a sua passagem nos capilares geraes e nos capilares do pulmão ; ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 167 as influencias de ordem mecanica que actuam para apressar ou demorar a circu- lação nesses diversos pontos, vieram depois, como noções complementares, dar uma idéa completa e bastante intelligivel do que é a funcção da circulação e qual o papel que ella representa nos grandes phenomenos da vida. Ao estudo da circulação alliava-se naturalmente o estudo do sangue. Os elementos morphologicos deste principal liquido organico foram objecto d> menção especial, mostrando o professor com o auxilio do microscopio os caracteres distinctivos dos globulos vermelhos e dos globulos brancos, cujo respectivo papel physiologico ficou deter- minado. A importancia das hematias como organitos condensadores do oxigeneo, encarregados de levar esse gaz comburente aos mais reconditos escaninhos do organismo, deu ao professor occasião de fallar nas combustões intersticiaes e na respiração dos tecidos. A significação physiologica que têm as glandulas vasculares sanguincas, as funcções hematopoielicas do figado e do baço, a interferencia do sysiema lym- phatico ganglionario na formação dos leucocytos ministraram materia para nume- rosas e importantes considerações, precedidas de um rapido estudo sobre a structura daquelles orgãos. Não ficou olvidada tambem a questão tão debatida e tão cheia de obscuri- dades da origem dos lymphaticos, a qual continúa ainda a occupar a attenção dos mais abalisados histologistas e a ser motivo de numerosas controversias. As delicadas questões referentes ao automatismo da medulla e à sua in- fluencia na coordenação dos movimentos foram apenas esfloradas. Fallando depois na acção reguladora da medulla sobre as funcções da vida organica, achou o professor ensejo para expôr os atlributos physiologicos dos nervos bulbares. Chegando finalmente à parle mais nobre e mais elevada do systema nervoso, occupou-se com o estudo do cerebro, descrevendo este orgãos com as suas nu- merosas circumvoluções e os seus sulcos principaes; e mostrando o papel phy- siologico que representam as duas substancias que o compõem, discorreu sobre a distribuição dos differentes feixes de fibras da substancia branca, assim como sobre a estratificação das cellulas da substancia cinzenta. A importancia que tem assumido ultimamente a questão dos centros motores encephalicos deu-lhe azo a fazer algumas considerações nesse sentido, estabele- cendo um parallelo entre os ditos centros demarcados no cerebro dos simios e aquellês que lhes deviam corresponder no cerebro humano. (Como complemento ao estudo das funcções do cerebro e para explicar as perturbações intimas que se originam de certos sentimentos d'alma, occupou-se em uma só prelecção com mostrar as influencias que se exercem reciprocamente entre o coração e O cerebro. As conferencias subsequentes foram consagradas exclusivamente ao estudo das questões referentes ao systema nervoso. A importancia capital e o interesse par- 168 ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ticular que se liga ao exame das funcções deste systema, que rege todas as evoluções da grande machina da vida, preseituavam à necessidade de um estudo mais longo e minucioso. Principiando pelos cordões que põem em communicação directa os orgãos periphericos com as massas nervosas centraes, reduziu o filete nervoso, parte componente destes cordões, aos seus elementos primitivos, dos quaes se deve destacar como sendo o verdadeiro fio conductor das impressões sensiveis e das excitações motoras o — cylinder axis. Mostrou como terminavam esses filetes nos musculos e na pelle, como se uniam elles para constituir os cordões nervosos. Em seguida, passou a examinar a structura da medulla; a maneira por que são for- mados os seus cordões; as relações em que se acham estes com a substancia cinzenta central, os prolongamentos anteriores e posteriores desta substancia , a distribuição das cellulas nervosas que entram na sua formação , os caracteres morphologicos especies destas cellulas e as suas ligações com 03 filetes motores e sensiveis. A direcção que seguem as impressões periphericas até attingirem a esphera superior do orgão da recepção e o retorno das mesmas impressões, ja trans- formadas em excitações volitivas até à peripheria, fechando-se assim o arco sen- silivo-motor, foi explanado com toda a clareza mediante o auxilio de desenhos schematicos. Assim tambem o mecanismo das acções reflexas e as leis que governam esses phenomenos. Terminado o estudo da circulação, era logico passar ao exame da respiração, que por tão estreitos vinculos se enlaca áquella outra funeção. A construclura anatomica dos tubos aeriferos, a structura dos pulmões com os seus infinitos al- veolos revestidos de uma tenuissima membrana epithelial, atravez da qual se effectua a permuta dos gazes, sua riquissima rêde capillar, urdida no mesmo parenchyma do orgão, dando-lhe visos de uma esponja ensopada de sangue, en- traram como o primordio anatomico necessario ao estudo das funcções d aquelle orgão, Vieram, em seguida, os actos mecanicos da inspiração e de expiração, sollicitados, o primeiro, pela acção de certos agentes musculares; o segundo, e pela propria elas- ticidade do orgão, preparar o espirito para comprehender a hematosia, essa funcção cuja essencia está na permuta dos gazes da athmosphera com os gazes do sangue e cujo resultado final é a transformação do sangue venoso em sangue arterial. Explicou depois como o sangue assim oxigenado vai servir à respiração dos te- cidos e entreter os phenomenos intimos da combustão organica. A maneira da tor- rente que transporta os sedimentos de certas camadas geologicas e os vai depositar em outras, o sangue no seu continuo gyro não faz mais do que receber do meio athmospherico o oxigeneo necessario à vida e transportal-o na sua onda até os mais afastados limites da organisação. ç Unidos á distancia pelos liames dos vasos e dos nervos, esses dous orgãos ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL 169 são como dous centros de irradiações dynamicas, com os quaes estão introsadas todas as pecas do organismo vivo. A mais pequena interrupção na emissão das suas forças respectivas abala todo o edifício e destróe o equilibrio que natural- mente existe entre elles. Um preside como a entidade mais elevada nos dominios dá vida organica, à regular distribuição dos elementos nutritivos indispensaveis para exercer-se a actividade de todos os orgãos e como tal elle tem em suas mãos a chave da vida; o outro, collocado em uma esphera ainda mais elevada, dirige as mais pequenas evoluções daquelle orgão, apressando ou refreando os seus movimentos mediante a intervenção de certos nervos. Dessa dependencia mutua e reciproca resulta a estabilidade, a ordem, a harmonia em todas as funcções subordinadas mais ou menos directamente á influencia daquelles dous centros. De como as paixões espansivas e deprimentes chegam muitas vezes a des- truir esse equilibrio, transtornando os traços physionomicos do individuo, des- ordenando seus movimentos, embargando-lhe a voz, obscurecendo-lhe a consciencia por uma forte commoção de todo o seu ser; a côr rubra da colera e da ira, o pallôr da tristeza e esses profundos desfallecimentos que succedem a uma nova inexperada, de tudo isso deu o professor as explicações physiologicas, baseando-se no conhecimento das razões reflexas, que existem entre o cerebro e o coração. A ultima preleeção foi preenchida com uma revista geral de todos os factos já explicados, terminando com algumas considerações sobre a morte tomada no ponto de vista physiologico. V. II—23 = E ' . - Ba, = 7d pe y A hd ” Le A - bd “ + + - . “ 2 a R , * “ a ã E Pe i T. 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Rochester........... — Catalogue of Invertebrate Animals for sale at Ward's Natural Science Establishement, 1876. Roma............ 2... .— Bolletino de la Societá Geographica Italiana, 1877, anno II, serie 2 vol. 14, fasc. 7. — Cenni sul Lavoro della Carta Geologica de Italia. Anta ÊM ias ana ae — Baixo Amazonas, 1877. ES CERME CSS sao aro isto ota «..o— Idéa, 1877. COUTO USA sois e. — Bulletin de la Societá d'Histoire Naturelle, 1lmº année 1876 — 97, jer fasc. Vallombrosa....... «— Dimorphismo nel Nace (Jaglans Regia) e Pleiontismo nelle piante, 1874, F. Delpino. Vassouras .....c... — O Municipio, 1877. Vienna d'Austria.— Die Siisswasser-Fische des súdostlichen Braziliens, 1876, Dr. Francisco Steindachner. Washington ........ — Report on the Rocky Mountain Locust, 1877, A. S. Packard. — Destrue- tion of the young or unfledged Locust — No 1, 1877. — The An- cient Fauna of Nebraska. — Contributions to the extinct Verte- brata: Fauna of the Western Territories, Joseph Leidy, 1873 report by F. V. Hayden. — e INDICE ESTAMPA Ss I — Investigações sobre a acção do veneno da Jararaca. IA — Exame chimico do veneno da Bothrops Jararaca, H — Maculas sexuaes. HI,IVeVY — Orgãos odoriferos. VI, VH — Urnas dos Ceramios do Pará. VHI, IX — Tembetás. TEXTO Quadro do pessoal efectivo e dos membros correspondentes do Museu. .............. Investigações experimentaes sobre a acção do veneno da Bothrops Jararaca — pelo Dr. EacerdaBalhoR == ro spas é onmge ie) fepo a a toto fo ooo aaa oa a o] 6 (o dao SAO no o in) ooo O ja o Additamento ás investigações precedentes — pelo Dr. Lacerda Filho................ A correlação das Flores versicolores e dos insectos pronubos — pelo Dr. Frederico Milleni copess e se no DAR aro cora R ER Rego NETO de o o US aa eq = RN joao AO 0/5 aca oo ar often on oro jon ro) shoe As maculas sexuaes dos individuos masculinos das especies Danais Eripus e D. Gilipus E pelo Dr: Eredericos Mullenc o". arc sao srsonst Sho é cepeleioisa ja feta o pnho o EO je io fa jolo ta força ao! alad Os orgãos odoriferos das especies Epicalia Acontius Lin. e de Mycelia Orsis Dry. — pelo Dr. Frederico Muller....... CSPE E PO PR E RNP RT CRC ESA Os orgãos odoriferes nas pernas de cortos Lepidoptores — pelo Dr. Frederico Muller Os orgãos odoriferos nas pernas de certos Lepidoptores ( supplemento)— pelo Dr. Fre- CONGO du DS Sacada cos caso np as SI posnaadCo SELSODA E CLN SL SONA DSO e LG or Apontamentos sobre os Ceramios do Pará — por Domingos Soares Ferreira Penna.. Appendice;— Urnas; do. Maracá — (pelo mesmo)... .«.-cepoescanica o name co sinonaao Observações sobre as duas urnas fig. 3.º e 4.º descriptas e figuradas pelo Sr. João Bar- bosa Rodrigues em seu artigo — Antiguidades do Amazonas, inserto na Revista — EnsaroskidesScIencia aci or setenta joe jeto io Root je do ope ata ro fofo onato o fato po o Pane To faie ao) efe Botao Contribuições para a Geologia da região do Baixo Amazonas—pelo professor Orville A. Apontamentos sobre os Tembetás das collecções Archeologicas do Museu Nacional. — pelo sDr sbadislau Nettocs seen ietarsinia o e siatcjaro clnioiaio a 0 ataio a sjole oo aioio o ole Eco torno ea alfa VIeVil 15 69 dq e. p E Tua! E | es | ] | | | | | | jaga ç Fig. À. | l | ] ] | I | Zuth: Museu Nacional Fig! -ompusenlos fusiformes do veneno extrahido da bothrops viva (tratado pelo acado acctico) Pig 2 Corprsculos fusiformes do veneno extrahido depois da morte da bothrops (sem adjunccao do acido acctico) Archivos do Museu Nacional. Fritz Miller doi. Estampa |||. Archivos do Museu Nacional CE TETE TE Lretz Miller del À Pritx Mealler del e ES EN ae - Ldieller des , Zitizdo MezerNazonal ta ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ESTAMPA V ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ESTAMPA VM. ARCHIVOS DO MUSEU NACIONAL ESTAM PA V +o DO MUSEU NACIONAL ESTAM PA ARCHIVOS es Da a AR Tocas Pd NR Pa NA Di DR E Sa pa RV a A A h ses Art. 19. — O Museu Nacional publicará tremensalmente, pelo menos, uma revista intitulada: Archiros do Museu Narional. Nessa revista dar-se-ha conta de tolas as investigações e trabalhos realisados no estabelecimento, das noticias nacionaes ou estrangeiras que interessarem às sciencias de que se occupa o Museu, do catalogo das colleeções mais importantes, dos donativos, feitos ao estabelecimento, e dos nomes das pessoas a quem seja conferido o titulo de que trata o art. 7º $ 5º. Serão publicados de preferencia os trabalhos originaes do pessoal docente. Ant. 20. — A commissão encarregada da redacção e publicação dos Archivos do Museu Na- cional compor-se-ha do Director Geral, um Director de secção e um Sub-Director. O orçamento da despeza será, porém, organizado pelo Conselho Director, em cada anno, e submettido à approvação do Ministro. Ant. 21. — Será remettida gratuitamente a revista ás bibliothecas e estabelecimentos scient:- ficos e littorarios do Imperio, fundados pelos poderes publicos ou por iniciativa particular, e bem assim ás bibliothecas e estabelecimentos estrangeiros com os quaes mantenha o Museu relações ou convenha estabelecel-as. E PR Egual remessa poderá ser feita ás redacções dos períodicos e revistas nacionaes e estrangeiras, (Do Regulamento do Museu Nacional.) Lc] - toa pa » ar) [=] a ma [o] EO o ao) fe — & = E) [= cas . 144 — pe "a E ca amd [ar o ] no Q Es > q Co tn [42] ”s o [m) Eu cc -3 Ee) so = [o =» » So o po. a E [er] -— o Le Ga [92 os he a E o = [mo] de qu [e Os Archivos do Museu Nacional serão d'stribuidos gratuitamente aos Membros Correspondentes, da mesma sorte às Instituições Setentíicas, em permutação com as suas revistas. 6:090 POR ANNO eva o auço rudes eta nie pm tetra de ante e pasta a pp dd PRB MÃE