THê NEW YORK DOTA.NMCAL CAR9ÍN BRONX, NEW YORK 10458 ^fímil àt $0rtl JORNAL DE HOBTIGIILTDBA FBATIG PREMIADO NA EXPOSIÇÃO HORTÍCOLA DE LISROA DE 1870 E MDE GAIDE 1872 COM IDALHAS DE PRATA PROPRIETÁRIO JOSÉ MARQy[S LOUREIRO EEDACTOR rmr '■WLJums: soão CORRESPONDENTE DA?REAL SOCIEDADE DE AGRICULTURA E BOTÂNICA DE^GÂND E DA ASSOCIAÇÃO DE ARBORICULTURA DA BÉLGICA COLLABORADORES : ^:.:^:;,ê EM PORTUGtAL — Os Snbs. Adolpho Frederico Moller, António Batalha Rsis, António de La Rocque, António José de Oliveira e Silva, Dr- Antonino José Rodrigues Vidal, Augusto Luso da Silva, Dr. Basílio Constantino de Almeida Sampaio, Dr. Bernardino António Gomes, D. J. de Nautet Monteiro, Conselheiro Camillo Aureliano da Silva e Sousa, Dr. Edmond Goeze, Geobge a. Wheelhouse, Dr. Joaquim Augusto Simões de Carvalho, De. Júlio Augusto Henriques, Visconde de Villa Maior. EM FRANÇA — A Dumas. NA BÉLGICA — Jean Veeschaffelt, E. de Coninck. NA RUSSM. — P. WoLKENSTEiN. EM HESFANHA — Esteban Quet, Francisco Gheksi, JuAN Texidor, Jules Meil. no EGYPTO — G. Delchevalebib, VOLUME V— 1874 Redacção, Canno, 6 — Administração, Fogueteiros, 5 — Porto PORTO TTi'P. DIí BARTHOLOMEU H. DE MORAES — RUA DA PICARU 50 A 54 !?74-T5 índice Abelhas — Costumes das , . . , 225 Acido sulfuroso — Do emprego do . 152 Adubo — Applicação do — chimico á horticultura de ornamento 111, 122 Agave americana 151 Agrícola — Progresso 49 Agricultura — Duas palavras sobre. 90 Amoreira (A) e a sua fibra. . . 226 Apparelho para regar arr eivados . 133 Apparelhos para esmagar o bolo ali- mentício de linhaça ou traçar se- mente de algodão para o gado . 94 Aralia Veitchii 201 Armolle 43 Banksia verticillata 221 Beterraba de assucar — Breves ins- trucções sobre a cultura da , . 192 Bibliographia 64, 92, 104, 149, • 167, 182, 230. Biographica — Noticia 108 Bordaduras- — Plantas para . . .168 Bromus Schraderi .... 202, 232 Caracoes — Meio de destruir os. . 24 Cerasus hortensis fl. pi 151 Chronica Horticolo-agricola 14, 35, 55, 76, 95, 115, 135, 155, 175, 195, 211, 235. Cineraria hy brida. . . , . . 95 Clivia nobilis 87 Cravos — Cultura dos 203 Cultura — Quanto pode render o ca- pital empregado na 11 Diospyros coatata ...... 122 Pag Diplacus, , , 125 Divisões — As sete 7, 105 Echeveria Agavoides 173 Essências florestaes — Do solo que convém ás principaes que se culti- vam no paiz. . . . 134, 166, 191 Estufa — A minha 86 Eucalyptus globulus . 29, 46, 70, 142 Farfugium grande s 150 Febre aphtosa (A) no gado bovino. 88 Félix de Avellar Brotero. . . . 162 Fetos e Palmeiras creadas em estu- fa e agora ao ar livre. ... 5 Ficus — Singular desenvolvimento de algumas espécies do género . 173 Floresta (A) do Bussaco . . . .170 Gados — Machinismo para o preparo das comidas para os .... 51 Ingá pulcherrima 165 Jacarandá mimosaefolia . , . . 101 Jardim — O meu 41 Joaquim MaximojLopes de Carvalho . 3 Kalmia latifolia . . , , . .188 Laranjeira Coroa de Rei. . . . 209 Laranjeiras — Algumas palavras so- bre a moléstia das . . . 189, 206 Link e a Universidade de Coimbra 114, 131. Maçã Camoeza de Coura. ... 61 Massiços com plantas annuaes — Composição de seis 228 Mesembrianthemums — Escolha de alguii9 , . , 54 IV índice Pag. Mimulus Moschatiis 201 Morangos — Cultura dos .... 45 Nelumbium speciosum .... 186 Nicotiana Wigandioides . . . .161 Nitreiras — Vantagens e construcção das 84 Nymphaea alba 62 Palestras horticolas 223 Pecego — Primeiro 205 Pêra Angeliquc de Rome. . . . 121 Pêra Bonne-Louise d'Avranche3 . 181 Pcra Domingas 141 Pêra Fondante du Comice . . . 81 Pêra Jacques Chamarei .... 229 Phormium tenax 21 Pinheiros — Definhamento dos . .166 Planta para abrigo 113 Plantas (Das) transportadas de gran- des distancias 227 Plantas que se dão á beira -mar . 10 Quinta modelo — Creação de uma . 126 Pag. Relatório da arborisação do municí- pio de Coimbra durante o biennio de 1872 e 1873 25 Relatório do districto de Faro . . 71 Rhododendrum hybridos. . . . 209 Rudbeckias 22 Ruscus aculeatus 107 Salvia generiaeflora 189 Sanseveria cylindrica 106 Sementeiras — Algumas palavras acerca do modo como se devem fazer e tractar as 109 Synopse chronologica 32, 73, 82, 146, 183, 210. Tecoma jasminoides 25 Trigo sem adubo — Cultura do . . 8 Victoria regia 222 Vinhas americanas 102 Vinhos — O artigo do snr. J. de Torres 53 Yucca aloifolia foi. variegata . . 9 índice da ghroniga OLIVEIRA JÚNIOR JANEIRO Palestra — ^asseio ao bosque de Vincennes — Descripção do bosque de Vin- cennes — O Ailantus glandulosa — «Revista de Portugal e Brazil» — Rótulos de la- tílo — Meio de reconhecer a riqueza saccharina das Beterrabas — Aviso aos agri- cultores que usam guano — A cultura do Tabaco nos Açores — Quinta experimen- tal na serra do Pilar — Marmellada de Ameixas — Selecçíio de seis peras feita pelo Cercle professoral pour le progrès de Tarboriculture en Belgique — A cultura da Macieira na America — Systema de multiplicar as arvores fructiferas por estacas — Um Castanheiro enorme — Comida para os leitões — Transcripção — Superfície dos terrenos a cargo das obras do Mondego — Receita para matar os ratos — Sociedade Agrícola do Porto 14 FEVEREIRO Azeite preparado pelo snr. D. Joaquim de Carvalho Azevedo Mello e Faro — Apparelho hygicnico para mugir vaccas — Trabalho sobre o Eucalyptus globu- lus — Honra conferida a Mr. J. Linden — «Rápida Noticia do estado presente do gado lanigero no Algarve e proposta para o seu melhoramento», pelo snr. Do- mingos Rodrigues Anncs Baganha — «Pharmaccuticos illustres de Hespanha na epocha presente n, pelo snr. José Libertador Magaltães Ferraz — Meio de conservar as peras — «Les Plantes à Feuillage colore» — Tabeliã da composição índice V chimica das diversas forragens — Nomeação do snr. Adolpho Frederico MoUer para inspector do Jardim Botânico de Coimbra — O Relatório sobre a Exposição de Lyon — Nova planta para arrelvados: Convallaria Japonica — Concorrentes ao premio para a melhor Memoria sobre a moléstia das Batatas — Sociedade Agrícola do Porto — Relatório acerca do estado da agricultura em Portugal — Preços por que estão os salários no Novo Mundo — Jornal da Associação Rural de Uruguay — A agricultura em França — A Musa ensete na quinta do snr. visconde de Vií- lar Allen — Carta da Régua — A nova moléstia das vinhas e o premio de 20:000 francos — Exposições em Gand — O «Prodromus» — Trabalhos feitos nas proprie- dades a cargo da direcção das obras do Mondego e Barra da Figueira, em 1872 a 1873 — A arborisação da rua de Camões 35 MARÇO Algumas palavras sobre as Oliveiras — Machina para o aquecimento dos vi- nhos— Cultura dos Ananazes em Ponta Delgada — Considerações do snr. Diogo de Macedo sobre os prejuizos causados pelo Phylloxera — Catálogos dos snrs. Dick Radclyffe & C.° e de Vilmorin & C* — A Agave Verschaffelt — Unguento para curar as feridas das arvores — Correspondência de Murça — «La Culture Economi- que» por Ed. Vianne — A manufactura de essências — Index Seminarii Horti Bo- tanici Academici Conimbricensis, 1874 — As Dahlias arbórea e imperialis — Pro- cesso empregado para a conservação da fructa que se exporta — Premio conferido á «Illustration Horticole» — Preço da cortiça — Explicação á redacção do «Archivo Rural» — Plantação de Eucalyptus — Dimensões dos parques de Londres — Estatís- tica da mortalidade segundo as diversas occupações que exerce o homem — Pro- posta para o melhoramento da navegação do rio Ohio — Plantas adequadas para bordaduras 5õ ABRIL A chegada da primavera — A coUecção de Rosas do snr. José Marques Lou- reiro— Grandes plantações de Eucalyptus globulus, em Alemquer — Unguento para se enxertar sem o auxilio do fogo — Um novo utensílio de jardinagem para dispor vasos na terra — Jardim japonez em Londres — Carta do snr. dr. Basilio Constan- tino de Almeida Sampaio — O «Dictionaire de Pomologie» — O catalogo dos snrs. Charles Huber e C* — A «Violeta odorífera dobrada de Parma», por Mr. A. Du- mas— Meio de conservar a frescura das flores — Venda de cavallos reproductores — A actualidade e o futuro do anno agrícola de 1874: communicação do snr. Azevedo Mello e Faro — Sociedade de aclimação no Rio de Janeiro — Exposições em Gand — A nova moléstia das Batatas — Conclusões tiradas por. Mr. Planchon dos seus estudos na America — Inconvenientes da lavagem das garrafas com chumbo de caça — Analyse do guano chimico de peixe — Preço de peras em Covent Garden — Se- lecção de algumas Azáleas 76 MAIO A «Techonologia Rural» pelo snr. J. I. Ferreira Lapa — Picaduras de ves- pas— Doença do snr. visconde de Villa Maior — Lathyrus tuberosus — Bibliotheca hortícola da camará municipal de Lisboa — A jardinagem em Lisboa — Presente do snr. J. M. Loureiro a El-Rei D. Fernando — Novas publicações da casa Ro- thschild — Maneira de conservar o vinho — A próxima colheita — Mr. Jules Meil — O Jardim Botânico da Ajuda — Catalogo de Mr. Alégatière — Ranúnculo Turban veridiflora — Rhododendrms — A «Illustration Horticole» — Fructificação da Arau- cária excelsa — Prevenções contra o Phylloxera em Hespanha — Exposição Horti- VI ÍNDICE cola cm FloronçA — Aclimação de avo3 uteia — O barão Ferd. von Mueller — Duas plantas textis — Relatório da camará de Arouca no biennio de 1872-1873 — O snr. Augusto Luão 95 JUNHO A exposição vinícola de Londres — Os vinhos portuguezes — Theoria chymica da Oátrumeira — Apicultura — O Jardim Botânico de Madiúd e os seus correspon- dentes— O artigo «Link e a Universidade de Coimbra» — A propósito da Camel- lia D. Pedro V representada na «Illustration Horticole» — Aproveitamento do ca- rolo do Milho — O catalogo das plantas de estufa de Mr. Linden — Abertura da exposição de plantas em Florença — A companhia dos caminhos de ferro e o Phyl- loxera — A jardinagem publica do Porto — Custo de cada arvore que se planta nos boulovards de Pariz — Nova moléstia das vinhas de Torres Vedi*as — Representa- ção ao governo — Rectificação do di'. Edmond Goeze ao artigo do snr. Oliveira e íSilva sobre a Clivia nobilis — Apontamentos sobre a conferencia feita na Real As- sociação Central da Agricultura Portugueza, pelo snr. António Batalha Reis. 115 JULHO aAi'te veterinária ou Tractado dos animaea domésticos» — Despeza que a ci- dade de Pariz faz annualmente com a jardinagem — Longevidade das arvores — Apontamento para a historia da pomologia portugueza — Publicação sobre as Au- rantiaceas — Carta do snr. Diogo de Macedo — Estrume Jauffret — A primeira so- ciedade em Hespanha para promover a cultura de plantas exóticas — Melhor epo- cha para cortar madeiras — A nova moléstia das vinhas — Eschola de horticultura em Clermont-Ferrand — Pepino RollÍ3sons's telegraph — Romã sem sementes — Oa patos na Cochinchina — O bicho da seda e o Ailantus glandulosa — Sulfurador au- tomático— Lista das variedades de peras que foram consideradas de primeira or- dem pelo Congresso promologico de Vienna — Producção de seda em vários paizes — Exposição hortícola em Pariz — Pinus strobus — A propósito dos calores prema- turos— Diminuição da producção da fructa na Escossia — Correspondência de Murçft — Prémios offerecidos pela Sociedade dos Agricultores de França .... 135 AGOSTO Cavalheiros portuguezes nomeados para fazerem parte do jury da exposição de Florença — Communicações de Florença sobre a exposição — Relações entre o Jardim Botânico de Coimbra e o de Madrid — Fecundação da Araucária brasi- liensis do Jardim Botânico de Coimbra — A arborisação da via férrea — O que está fazendo a companhia do caminho de ferro do Pacifico, respeito a arborisação — A ultima exposição de Oand — Emprego do guano ás arvores fructiferas — A estufa do Fetos do Jardim Botânico de Coimbra — Riqueza florestal nos Estados-Unidoa — O artigo sobre o emprego do acido sulfuroso como agente destructivo do Phyl- loxcra e do Oidium — Orçamentos da despeza da jardinagem publica de Lisboa — Meio de combater a moléstia das Laranjeiras — Receita para a conservação das flores : carta do snr. conselheiro Camillo Aureliano da Silva e Sousa — Duas pa- lavras a propósito da bibliotheca publica do Porto— Processo para a conservação da madeira — A sementeira das Calccolarias 155 SETEMBRO Visita ás Caldas de Vizella — O artigo «Desenvolvimento dos Pinheiros» — fManual d' Arboricultura», por Alexandre do Sousa Figueiredo — Exposição da ÍNDICE VII bois gordtra em Braga — Carta de Murça — O Jardim da Cordoaria e o mercado do peixe — Palmeiras ao ar livre — Prejuizo na creação do sirgo — Expositores de vinhos em Londres — Uvas próprias para a mesa — «Breve Noticia da Viticultura Portugueza», pelo snr. conselheiro Rodrigo de Moraes Soares — Estado geral dos cereaes — Formação da estatística da producção do vinho e inventario dos vinhos nacionaes — Logar de agrónomo no districto de Vizeu — «Boletin de Ia Sociedad Protectora de los Animales j las Plantas» — «Memoria historico-discriptiva do Mosteiro e cerca do Bussaco», pelo snr. Augusto Mendes Simões de Castro — A XVIII sessão da Sociedade pomologica de França — Florescência de uma Amaryl- lis, no Jardim Botânico de Pariz — «A gravura de madeira em Portugal», pelo snr. João Pedroso Gomes da Silva — Cammunicações feitas á Sociedade de Hor- ticultura do Herault — Preços correntes de MM. Ch. Huber & C* — «O Club», novo semanário portuense — Os cultivadores de plantas e o bello-sexo. . . 175 OUTUBRO Presente de Orchideas feito ao Jardim Botânico de Coimbra — A colheita agrícola — «La Vendimia» poesia do snr. D. José Viera y Clavijo — Perspectiva agrícola de 1874: communicações do snr. D. Joaquim d'Azevedo Mello e Faro — Relatório apresentado á Junta Geral do districto de Coimbra na sessão ordinária de 1874 — Plantas carnívoras: exposição feita pelo dr. Hooker á British Associa- tion — Restabelecimento do snr. Augusto Luso — «La Republique Cri entale de TUru- guay à TExposition de Vienne», por. Mr. Adolphe Vaillant — Communicações agrícolas de Murça — «Flora Farmacêutica de Espana j Portugal» por D. Juan Texidor y Cos — Fallecimento do nosso coUaborador, o snr. Adrião Pereira Forjaz de Sampaio 195 NOVEMBRO O Meu Jardim — Plantas que se devem dispor agora — Novo estabelecimento hortícola, no Porto — Macieira Leiriôa — «Les Plantes Médicinales et Usuelles de nos Champs, Jardins, Forets», por H. Rudin — Collecção de Dahlias inéditas — - Remessa de folhas para Pariz — Catalogo de Mr. J. Linden — Catalogo do snr. José Marques Loureiro — Resumo de uma noticia sobre a florescência da Victoria regia — Offerta de cartas e de plantas á Eschola Polytechnica de Lisboa — Processo para a conservação das uvas — Exposição em Amsterdam em 1876 — Eucalyptus colos- sea — Traducção das Georgicas, pelo snr. João Félix Pereira — Outro flagello das vinhas — Plantações de Eucalyptus na Califórnia — Eschola vitícola na cerca de S. Bento, em Coimbra — Sementeiras feitas este anno no Jardim Botânico de Coim- bro — «A Vinha e o Vinho em 1872», pelo snr. António Batalha Reis — Observa- ções feitas sobre a influencia das florestas nos climas — Casa filial do estabeleci- mento Loureiro, em Lisboa — Abandono do Jardim da Cordoaria — Carta do snr. António da Cunha e Almeida — Fructa escolhida pelo Congresso pomologico de França — Congressos internacionaes vitícola e sericola, em Montpellier — Conser- vação da fructa— Exposição em Uruguay — O Jardim da praça do Príncipe Real — Remédio contra o pulgão das arvores — Estudo sobre as condições necessárias para a germinação das sementes 211 DEZEMBRO A Videira Moscatel Preto de Hamburgo— Effeito da agua camphorada nos vegetaes — Peste bovina — Experiências de novos processos de poda — Fibra extra- hída da Amoreira — A estufa dos Fetos do Jardim Botânico de Coimbra — As es- cholas do mesmo jardim — Arvores e arbustos apropriados para a beira-mar — Os vm índice vinhos portuguezes no Rio de Janeiro — Catalogo de Mr. Jean Verschaffelt — Pe- reiras novas — Ensaios da cultura do Chá na Itália e na ilha de S. Miguel — Com- municação do visconde de S. Januário — A Thea viridis enxertada na Camellia — Estado da industria pecuária no districto de Braga — Nova publicação agrícola era Portugal — Da arborisação do paiz — Pelargonium Society em Londres — Con- servação do triíío — Relatório apresentado á junta geral do districto de Faro — Offe- recimento de Videiras ao Jardim Botânico de Coimbra — Plantações da estação — A ^Macieira Leiriôa — Inauguração em Lisboa da succursal do estabelecimento do snr. Marques Loureiro — A casa Dick RadclyíFe & C.°, de Londres — Noticias do Congresso sericola e vitícola de Montpellier — Novo estabelecimento hortícola — Agradecimento do Redactor 235 GRAVURAS Pag. Abrigo no lago Charenton ... 17 Apparelho hygienico para mugir vaccas 35 Apparelho para regar arrelvados . 135 Apparelhos para esmagar o bolo ali- menticio de linhaça ou traçar se- mente de algodão para o gado . 94 Aralia Veitchii 201 Banksia verticillata 221 Cerasus hortensis fl. pi 151 Clivia nobilis 87 Diplacus VerschaíFelt 125 Echeveria Agavoides 173 Eucalyptus globulus 47 Fonte do Circo nos Campos Elysios. 67 Ingá pulchcrrima 165 Jacarandá mimosaefolia . . . .101 Jardim— O Meu 41, 213 Joaquim Máximo Lopes de Carva- lho 1 Pag Kalmia latifolia 188 Laranja Coroa de Rei .... 209 Maçã Camoeza de Coura ... 61 Machina Biddel 51 Machina Gardner 51 Machina para esmagar grão. . . 51 Nicotiana Wigandioides .... 161 Pêra Angelique de Rome . . .121 Pêra Bonne-Louise d'Avranches . 181 Pêra Domingas 141 Pêra Fondante du Comice ... 81 Pêra Jacques Chamarei .... 229 Phormium tenax 21 Plantador de vasos 77 Restaurante da Porte Jaune. . . 15 Ruscus aculeatus 107 Tecoma jasminoides 25 Vacca com o apparelho .... 35 Vista do Luxemburgo .... 65 Yucca aloifolia foi. variegata . . 9 TOTAL : 40 GRAVURAS ''^^^^^-^-y-^.^ .^^/n^^T-^i^ ^/e^^íg^^^V ^^/&.^<íl^t^'\^<^iy^u> 1874— YoMniE Y lornul br Siortitulturn '^ntua JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA JOAQUIM MÁXIMO LOPES DE CARVALHO o « Jornal de Horticultura Pratica » , pela sua índole especial, não podia nem devia deixar de consignar nas suas co- lumnas o passamento de um dos agricul- tores mais intelligentes que em Portugal tem havido. Referimo-nos ao snr. Joaquim Máximo Lopes de Carvalho, possuidor de impor- tantes propriedades ruraes, de que fazem parte as quintas de Vai de Zibreiro e do Valle, no logar da Labrugeira, concelho de Aíemquer. Não é nosso intuito escrever a biogra- phia completa de tão prestante cidadão, como acima dêmos a conhecer, porque nem o assumpto comportava limitações de es- paço, nem a nossa audácia é tal que to- mássemos sobre os hombros tarefa tão difficil e árdua. A penna que acceitasse cargo de trabalho tão delicado, requeri am- llie o bom senso e a critica, como indis- pensáveis, competência e habilitações que nos fallecem. Por isso, só nos propomos dar abreviada noticia da sua vida e fazer rápida menção da obra agrícola de mais vulto que o seu talento produz iu. Com tão pouco nos contentamos, e, offerecendo á sua memoria estas linhas, publicamente confessamos a amisade que lhe consagrá- vamos. O snr. Joaquim Máximo Lopes de Car- valho era filho do dr. António Máximo Lopes e de D. Marianna Victoria de Car- valho. Nasceu aos 28 de agosto de 1808, achando-se seus pães no Campo Grande, refugiados da oppressão que Lisboa sof- fria, avergada ao jugo duríssimo do do- mínio francoz. Por morte de seus pães fi- cou sob a tutela desvelada de sua tia D. Lourença Joaquina d'Assumpção, senhora de preclaras virtudes, que lhe deu edu- cação consentânea ao seu nascimento. Completamente habilitado com os pre- paratórios de latim, philosophia, rhetori- ca, etc, tencionou dirigír-se a Coimbra, a fim de obter a formatura, a exemplo de seu pae; o que não pôde conseguir n'esse anno pela desgraçada occorrencia do ataque e morte dos lentes, perto de Coimbra. A irritação d'animos que por esse tempo lavrava a ponto de desenvol- vo!. Y— 1S74. ver a luta fratricida e eleval-a a propor- ções horrorosas, que todos inda hoje de- ploramos, foi causa, que, junta a outras, levou sua tia a demovel-o do seu propó- sito, não consetindo que se expozesse a perigos prováveis e certos. Sequioso, po- rem, de aprender, o snr. Carvalho ma- triculou-se na aula do Commercio e com- pletou o seu curso com distincção. Os acontecimentos da guerra civil obri- garam-no a assentar praça em milícias e chegando a alferes foi presente ao bom- bardeamento do forte de Santa Martha em Cascaes, no dia 1 de julho de 1832 pela esquadra franceza. Por falta de saúde pas- sou para o batalhão do commercio, a ca- vallo, que fazia então a policia da cidade, sendo depois nomeado tenente-coronel da guarda nacional, logar que pouco tempo occupou. Retirando-se para as suas pro- priedades da Labrugeira, dedícou-se in- teiramente á agricultura, em que fez no- táveis progressos. Como o auctor diz no começo da sua obra, teve que estudar a agricultura como scíencía e como arte, e tão lisonjeiros re- sultados alcançou que as suas quintas são modelo a seguir por todos que, não com- prehendendo ainda o alcance d'esta scíen- cía, caminham aíFastados da perfeição e dos resultados que distinguiam os traba- lhos agrícolas do snr. Lopes de Carvalho. Não foi só esse o fructo da sua applícação. Algumas obras que escreveu sobre agri- cultura provam de sobejo que tirou van- tagens do seu aturado trabalho. A mais importante d'ellas e a que o au- ctor chama modestamente «Estudos agrí- colas theoi'icos e práticos adequados ao concelho de Aldeia Grallcga da Merecean- na» appareceu á luz no «Archivo Rural» dos annos de 1859 e 1860. Este trabalho merece especial ainda que abreviada men- ção pela sua importância e utilidade pra- tica. Publicado em separado daria um vo- lume de mais de 200 pag. em oitavo francez. O auctor dividiu a sua obra em XII capítulos em que tracta com a máxima cla- reza e proficiência do seguinte : conheci- mento da terra, sub-sólo, melhoramento N.o 1 — Janeiro. JORXAL DE IIORTICLLTURA TRATICA da terra pelas camadas inferiores, correc- çíto das torras pela cal e pelos maraes e maneira de applicar estes correctivos; es- trumes animacs e vegetacs e modo de os ])reparar e conservar; cultura das forra- gens artlHciaes; afolhamentos; lavouras profundas e culturas superliciaes ; instru- mentos e machinas agricolas; epochas das sementeira, TrifjOj Cevada, Fava, Milho, Feijão, qXq.j qualidade das sementes, pro- fundidade a que devem ser enterradas e modo de as semear; sacha e mais cultu- ras até á sua colheita ; cultura da Bata- tttj Beterraha, Cenoura, TopinamhaB, Lxi- zerna, Sanfeno e Trevos; drainagcm das terras, fabrico dos canos e telhas, direc- ção, distancias e profundidades dos drai- nes, abertura das rigueiras, sua verifica- çito, nivelamentos, etc. Esta obra, conscienciosamente delineada e cscripta, está expurgada de theorias abs- tractas e de preconceitos rotineiros, por- que o auctor, baseando os seus estudos no trabalho de eminentes sábios, tacs como (lasparin. Barrai, Olivierde Serres, Dom- bnsle, Payen, Leconteux, Arthur Young, Pallissy, Boussingaul, \A'altcr, Blight, .lohnston e outms luminares da sciencia agricola e escudado pelas observações e experiências que a sua longa pratica n'es- tas lides lhe ministrou, aponta com exa- ctidíto os methodos melhores e mais segu- ros. Publicando os seus escriptos, prestou um serviço inapreciável á agricultura por- tugueza e de bfianicntc convidamos todos f)S lavradores, nào só do seu concelho, mas de todo o paiz, que ainda não lessem tào proveitosa obra, a fazel-o, pois valiosas noções e esclarecimentos acharão n'esse manancial tão útil de conhecimentos agrí- colas. Durante a permanência do snr. Máxi- mo na Labnígcira foi eleito duas vezes camarista e uma vez nomeado adminis- trador do concelho, nào se utilisando dos emolumentos que o logar rendia e empre- gando-ds em obras do utilidade publica. Se mais vezes a amizade dos seus visi- nhos não se demonstrou, honrando-o com cargos públicos, a razão era (caso notá- vel; que o snr. Lopes de Carvalho em- pregava toda a sua diligencia para conso- g\iir dos seus amigos que o não eleges- sem. Por occasião da revolução de 1846, mais conhecida sob o nomo de 3faria da Fonte, o povo, que reconhecia e amava ha muito no snr. Carvalho um amigo leal, no- meou-o administrador. Elle, porém, não desmentindo então, como nunca, os seus principies o o seu caracter honrado, não acceitou este favor popular, dcsculpan- do-se que não podia acceitar, porque não reconhecia a auctoridade revolucionaria. Em 1840 desposou a snr.* D. Anna Dorothea Perestrello de Andrade Cotta Bandeira, descendente de illustre familia, senhora mui intelligente e de esmeradis- sima educação e prototypo de esposas e mães. D'este matrimonio nasceram sete filhos, cinco dos quaes são vivos. Um d'el- les, o snr. António Máximo Lopes de Car- valho, a quem nos honramos em chamar amigo, é auctor de alguns artigos de zoo- logia e botânica publicados n'este jornal. Os seus vastos conhecimentos da sciencia agricola ou antes de todas as sciencias que a formam e coadjuvam, os seus escriptos favoravelmente apreciados e as visitas de algumas notabilidades agronómicas ás suas propriedades bem dirigidas e por conse- qucncia montadas com todo o esmero de um agricultor progressista, deram em re- sultado ser nomeado o snr. Joaquim Má- ximo pelo governo de sua magestade di- rector da quinta regional, ou Granja mo- delo em Cintra. Tomou posse d'este logar cm 17 de outubro de 18G2 e cinco annos dirigiu este estabelecimento, o primeiro no seu género em Portugal. Os variadíssimos assumptos cm que se dividia a direcção que lhe estava confiada furara sempre at- tendidos por elle com todo o escrúpulo, probidade e cuidado com que tractava to- dos os negócios que lhe eram submetti- dos. Forçado por uma nevralgia cerebral re- tirou-se para Lisboa em janeiro de 1808 o pediu a sua demissão que lho foi dada cm 1S()0. Logo que os seus padecimentos lhe permittii'ani, partiu para a Labrugeira a por-so á testa da direcção das suas pro- priedades, onde esteve até junho do cor- rente anno. Ha longo tempo que um scirro lhe mi- nava a existência tão querida do parentes e amigos e no dia 29 d'agosto do anno findo entregou a sua alma ao Creador, depois de um soffrimento atroz que elle JORNAL DE HOIITICULTUEA PRATICA supportou com a resignação de um chris- tão, que o era, e verdadeiro. Os cuidados, os disvellos, os carinhos, levados ao extremo, de sua esposa e fi- lhos e o auxilio da sciencia empregado com a dedicação de um amigo, que era ao mesmo tempo medico, não lograram salval-o Do caracter honestissimo, de que tenta- mos bosquejar a biographia, que nos resta hoje? A esposa inconsolável a lembrança das suas virtudes. Aos filhos (a quem não precisamos re- commendar que sigam a vereda do de- ver trilhada por seu pae, que foi sempre glorioso exemplo, que coevos e vindouros devem seguir), a reminiscência dos seus feitos em causa tão nobre e sancta como a da agricultura. A seus amigos, que eram todos que o conheciam, a gratidão eterna pela ami- zade desinteressada com que os distinguia. A agricultura o convencimento dos serviços que lhe prestou. A pátria a certeza da perda de um ci- dadão benemérito. E a todos a esperança de que o Altís- simo premiará vida tão exemplar, dando logar no ceo a quem tanto fez por obtel-o. Este jornal, em nome da agricultura portugueza e por intermédio da minha hu- millima penna, perpetua agradecida os ser- viços relevantes que o snr. Joaquim Má- ximo Lopes de Carvalho lhe prestou. Lisboa. J. C. Pereira da Silva. FETOS E PALMEIRAS CREÂDÂS EM ESTUFA E iGORA AO AR LIVRE Ha muitos annos que tinha Fetos e Pal- meiras nas estufas, ainda que não ignora- va que algumas espécies vegetavam bem ao ar livre, mas requeriam muitos cuida- dos. Como já não coubessem nas estufas, umas pelo seu tamanho, outras pelo gran- de numero de exemplares, foram postas ao ar livre, esperando eu que morressem algumas, porém não aconteceu assim. Tenho Palmeiras ha três invernos ex- postas a todo o tempo e estão esplendidas ; portanto podem os amadores ter nos seus jardins estas encantadoras plantas, que bem poucas são ainda as que ha entre nós. Mais abaixo darei a lista das espécies. Ha doze annos que o snr. conselheiro Camillo Aureliano plantou no seu jardim um pequeníssimo exemplar de Chamaerops e hoje mede mais de 2 metros de altura. O tronco é magestoso. Todas as vezes que alli vou, não posso deixar de o admirar. Nunca teve abrigo algum e até está ex- posta ao norte. Ha também dous exempla- res no jardim do snr. Sandeman (Villar), que téem 9 a 10 annos e estão ainda mais esplendidas. Em maio estavam cobertas de cachos de flores amarellas d'um effeito sur- prehendente. É de notar que estas se acham abriga- das do norte e expostas durante o dia a todo o sol. Vejamos agora o que estas Palmeiras bastante rústicas exigem além das con- dições climatéricas, que não são demasia- das, para que se dêem bem entre nós. Eis em poucas palavras as suas exigências. Grrande abundância de agua durante a vegetação e raios directos do sol. Além d' isto será conveniente dar-lhes um solo bastante rico de húmus, mas um tanto argilloso e abrigai -as dos ventos do norte durante o inverno. Em dezembro, março e abril, se leva- rem uma rega com agua, em que se dis- solva excremento de aves, tomarão uma vegetação mais pomposa. Também exigem um certo tempo de repouso e portanto durante esse período é mister dar-lhes a menos agua possível, que vem a ser desde novembro a março. Sendo a cultura das Palmeiras feita debaixo d'estas condições, poderemos go- zar ao ar livre d'este grupo de plantas as mais ornamentaes do reino vegetal. Concluindo, darei uma lista d'algumas espécies e variedades que temos ao ar livre e que recommendamos aos amadores, a saber : Areca Bauerij Astrocarium Mexicanum^ Chamaerops Fortunei, C. excelsa, C. humi- lisj Cocos campestris, C. coronata. D'esta ha um exemplar magnifico no jardim do sr. barão da Roêda, plantado pelo distincto 6 JOIIXAL Dli HORTICULTURA PRATICA amador o snr. António cVAlmeida Cam- pos; mas o qiio mais admira ó ser em S. Joílo da Foz, em logar açoutado de ven- tos do mar. No mesmo jardim ha plantadas outras variedades, que estào magniíicas. Latania horhonica, Levistona australisj (Coryplia aus>traJis). Esta é uma das que que se tem desenvolvido mais no nosso estabelecimento. Pluenix dadylifera (vulgar entre nós), Plioenix reclinata (nova entre nós e os- })l('ndida), Pluenix tenuis, Rhapis jlahel- lifvrmis, Sahal Aãansoni^ Thrinax Mar- tii_, Ci/cas revoluta. Esta Cycas, no meu estabelecimento, não vegeta como se deseja, mas em Lisboa dá-se admiravelmente, e o mesmo snr. Campos possue um exemplar em bom es- tado, devido naturalmente a ser a terra barrenta, condição que todas as Palmei- ras apreciam. Ahophila australis (Feto arbóreo). Re- commcndam os horticultores que se te- nham em estufa e assim os tive muitos annos; no entanto ha três annos plantei um ao ar livre para experiência, o tirei bello resultado. Como os que conservei na estufa tomassem grande desenvolvimento, fui obrigado a coUocal-os ao ar li\T.'e, sem receio todavia que me morressem polo exemplo que tinha. Jíl passaram dous invernos a todo o tem- po 6 nem sequer foram preservados das geadas. Verdade é que se acham um pou- co abrigados do norte. Estão tão frondo- sos c perfeitos como se estivessem ao abri- go da estufa. Toem frondes que medem 2"", 50 de comprimento e 1"',20 de largo, apresentando cada um cerca de 10 a 12 frondes. Estão em caixas, e se estives- sem plantados na terra mais frondosos estariam. Tenho um exposto a todo o sol, o qual não faz diftcrença dos que estão a meia sombra. Embora se diga que os Fe- tos gostam muito da sombra, o que é ver- dade é que os que tinha á sombra esta- vam péssimos c até morreram alguns. Puz depois os f|uo escaj)aram a meio sol e es- trio magniHcos. Portanto querem-sc plan- tados em logar que tenha algum sol o onde não reine vento norte. Nunca devem ter falta d'agua, principalmente desde abril até outubro. Também gostam da roga com agua de excremento d'aves, mas tanto n'um como n'outro caso não devem as re- gas ser fortes de mais. Para os Fetos é preferível o excremento de boi. Também está nas mesmas condições a Alsophila cinnamomea. Estas duas varie- dades de Fetos arbóreos para mim são as mais elegantes, tanto pelas suas grandes frondes bem guarnecidas e bem dispostas, como pelo seu rápido crescimento. Puz em mai-ço ao ar livre um Balan- tium antarticum e ficará para experiência todo o inverno próximo. Outra notável planta d'estufa, que dei- xei ao ar livre em abril de 1872 e assim passou o inverno florescendo e fructifican- do, foi o Phílodenãron pertusum. A sua rica folhagem faz-nos lembrar a luxuosa vegetação americana, que Hum- boldt tão magistralmente descreve. Esta notável planta, tendo florescido e fructifi- cado no meu estabelecimento, levou um anno a amadurecer os seus fructos. O mes- mo tempo gastara nas estufas, mas os fru- ctos eram maiores um pouco, e a flores- cência, que é brilhante, durou mais tempo. Comi d'esses fructos que são magnificos, lembrando seu sabor e aroma uma com- binação de melão e ananaz ; e algumas pessoas que os provaram acharam-nos egualmento deliciosos. Deve ser collocado d'encontro a um rochedo, muro ou arvore, em logar que tenha sol e abrigado do norte. O Phílodenãron pertusum é de fácil cultura, devendo ser conservado em sitios um pouco húmidos, ou que soff'ram regas amiudadas. A terra deve ser bem estru- mada, contendo alguns bocados de lenha grossa, folhas e ató pedaços de vasos par- tidos, etc, para que as raizes adventicias a penetrem facilmente. Quando so quer fazer uma nova planta, corta-se-lhe a cabeça levando algumas rai- zes que tem pelo tronco acima e rebentará immediatamente. Duas circumstancias de grande valor concorrem n'csta planta, a do ser alta- mente ornamental e a do fornecer um ex- cellento fructo. Mais duas plantas de flores lindíssimas, que téom sido desde nuiitos annos cultiva- das nas nossas estufas, o que hoje vivem ao ar livro, téem florescido perfeitamente bem. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA A Franciscea é uma das jilantas de bo- nita folhagem, e de florescência abun- dante que dura muitos mezes. As flores sào de cor azulada ou violeta, passando a branco e tendo algum aroma. Requer ser collocada em sitio abrigado do norte, terra forte e que durante o verão esteja sempre húmida. Rondeletia speciosa, arbusto de uma flo- rescência abundante durante muitos mezes, flores em corymbos terminaes, tubulosos, cor vermelha escarlate por fora e passan- do-a alaranjado. Exige pouca humidade durante o inverno. Estas duas ultimas plantas são dignas de serem cultivadas nos jardins, mas em legares abrigados, ou cultivadas em vasos para durante o inverno serem transporta- das para qualquer abrigo. José Marques Loureiro. AS SETE DIVISÕES Para muitos dos leitores nada de novo vou dizer ; para outros, todavia, que, ape- sar do recreio que lhes dão as plantas, en- caram a botânica como sciencia aridissima, cheia de nomes de diííicil pronuncia, algu- ma cousa haverá que lhes seja novidade. Espero felizmente que hão-de encontrar algum ponto útil, e que o seu espirito se sentirá agradavelmente attrahido, por- quanto esta sciencia é necessária para o adiantamento de todas as outras e para o progresso das artes. O geólogo não pôde dispensar-se da bo- tânica, por lhe ser precisa para fixar cer- tos dados, 6 não só o geólogo, mas o chi- mico, o horticultor, etc. Não se persuada alguém todavia que este conhecimento da botânica se refere tamsómente a uma lista de plantas, ou a uma classificação Linneana, não ; refere-se á physiologia das plantas, á sua anatomia á sua distribuição geographica, ao seu «habitat», ás suas influencias metereolo- gicas, ás suas consequências hygienicas, e finalmente, ás suas relações com o mundo antigo, ou fóssil; e, como natural conse- quência, á sua classificação. Todas estas subdivisões comprehende a botânica, em- bora formando cada uma por si só uma sciencia a estudar, encadeadas umas nas outras, e todas apoiadas nas mais, pois não ha sciencia que se possa estudar com proficuidade abstractamente; sem ir tirar dados a outras não é possível hoje o seu estudo. Quando Linneu apresentou no meiado do século passado, o seu famoso systyma de classificação baseado sobre o numero de estames e estygmas, o mundo ficou ad- mirado. Era então a botânica quasi que ignorada, e limitava-se o seu estudo á clas- sificação secca e destituída de todo al- cance verdadeiramente pratico. Este passo dado por uma celebridade incitou a novas investigações, apparecen- do homens que estudaram a planta no seu systema physico, e publicaram livros de physiologia vegetal. Querendo pôr-se em pratica o systema de Linneu, achou-se cheio de absurdos. Parecia muito bem á primeira vista dizer-se — todas as plantas com dous estames formarão uma tribu, chamada Diandra, e esta dividir-se-ha em secções, conforme o numero de estygmas, que receberão o nome de monogynia, digy- nia, pentogynia, etc, mas indo a juntar praticamente as plantas, via-se que muitas vezes plantas de organisação totalmente diíferente estavam associadas em consorcio monstruoso. O afamado Jussieu apparece em 1789 com uma nova ideia — classificou as plantas conforme suas connexões natu- raes, e tão sabiamente foram arranjadas as suas divisões, e com tanto conhecimen- to pratico das pouquíssimas plantas então conhecidas, que bem raras são as divisões que tenham soífrido alteração. O próprio Linneu, conhecendo a insufficiencia do seu systema, quiz chegar a uma coordenação natural das plantas e escreveu os «Frag- menta», porém não se atreveu a lhes as- signalar caracteres. A «Philosophia Botâ- nica» bem demonstra que este grande ho- mem se tinha compenetrado da ideia de Raius, que no principio do século passado dissera : Nam^ cum natura (ut dici so- lei) non faciat saltus neque ah extremo ad extremum transeat nisi per medhn di- zendo elle Linneu também (í Natura non facit saltus e Plantae omnes nitrem que affinitatem monstrant. Não se persuadam que a classificação por famílias naturase 8 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA fixa rigorosamente os limites de cada uma, de forma tal que se diga: toda a planta com folhas reticuladas, cujo tronco cresce exteriormente, pertence a uma grande fa- milia, e toda a planta com folhas de veios longitudinaes, cujo tronco não cres- ce exteriormente, pertence a outra. Que acontece n'este caso com a Salsaparrilha Synilax e outras? Como Raius disse, nisi ])ei' metUum, assim de facto acontece aqui, na zoologia, (como o dr. Owen bem de- monstra na anatomia comparada), e em todas as mais sciencias naturaes, pois a natureza, nas suas transições, é muito lenta, ficando as sciencias todas tão inti- mamente unidas, como acima levo dito, que o estudante acha-se ás vezes emba- raçado para decidir se um ente é animal, vegetal, ou mineral ! Parecerá estranho, mas assim é, todos nós facilmente distinguimos um boi ou um cavallo, do uma gallinha e de um peixe, sem ser preciso definições. Quem estuda sem reflectir a natureza, não lhe parece haver difficuldade nas defi- nições : por exemplo ; o boi e o cavallo ama- mentam a prole com leite, logo são: mam- mallia, mas a baleia, apesar de peixe na sua forma geral exterior, é uma mammal- lia, porque amamenta os filhos com leite. Os botânicos antigos pouco sabiam da physiologia vegetal, e menos ainda das leis que regulam a organisação das plantas, o que é absolutamente essencial para a sua boa classificação. Accresce a circumstan- cia de que o limitado numero de plantas actuaes e fosseis conhecidas então não da- va a menor ideia da vegetação do uni- verso. Hoje isto está mudado, graças ao espirito investigador, que levou muitos ho- mens a explorar o mundo desconhecido, e ao adiantamento simultâneo das outras sciencias. Foram duas as primeiras divisões feitas no systema natural — uma chamada Mo- nocotylcdonea ou Endógenos, referindo-se o primeiro nome á circumstancia das se- mentes terem um cotyledon, ou folhas em- bryonarias, e o segundo nome referindo-se á circumstancia d'ellas crescerem em gros- sura de dentro loara fora. A outra divi- são cognominou-sc Dicotyledonea ou Exó- genos, baseada no facto das sementes pos- suirem dois cotyledones e no facto de crescerem em grossura pela accumulação de camadas exteriores ; a primeira divisão está bcui demonstrada na Palmeira, a se- eunda no Sobreiro. ^^ .. , » ° r • \ (Continua). Lisboa. ^ ^ D. J. DE Nautet Monteiro. CULTURA DO TRIGO SEM ADURO o lavrador sabe que tem terras, onde o Trigo, não se dá embora os adubos que lho possa deitar. A razão é porque o solo não tem em si os mineraes, que são pró- prios das terras de natureza barrenta. Ao mesmo tempo n'esscs districtos onde o barro predomina, a cultura é exclusiva- mente àcTrig o, c,co\no os estrumes são pou- cos, o lavrador obtém uma producção rachi- tica ou tem de deixar a terra em descanso. Obsta-se a estes inconvenientes por um novo systema de cultura chamado «Lois- Weedoni), o qual tem por base o repetido trabalho do 8800 reis por dia ! Os creados de lavoura exigem durante o tempo das ceifas e debulha os salários que se pagam aos jornaleiros, e se não lh'os dão despedem-se. Isto parece-nos o que se chama na lin- guagem da giria uma grande hota. Com eífeito a America manda-nos algumas de pé grande e portanto deixamos a veraci- dade da noticia em quarentena. — Temos recebido uma publicação que começou a sahir a lume recentemente em Montevideu e que é órgão da Associação Rural de Uruguay. Este jornal tracta com a maior profi- ciência todos os assumptos relativos á agri- cultura e é seu redactor o snr. Juan Ra- mon Gomez. Agradecemos a remessa. — Do «Paiz» extrahimos esta curiosa noticia : Segundo os dados estatísticos que encontramos ri'ura periódico de França, a agricultura d'aquella nação occupa vinte milhões de individues, explora um capital de vinte mil milhões de francos, seus iitensilios importam em cinco milhões, seus aui- maes valem quatro milhões, seus productos repre- ,4entam quatorze mil milhões. Só a vinha faz vi- ver oito milhões de indivíduos e produz mil mi- lhões. 38 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA — Sobre a banca temos uma artística photographia representando um bellissimo exemplar da Musa ensete, que foi plan- tado em 1872 na quinta de Villar d'AlIen, era Campanha, nos subúrbios do Porto. A photographia foi tirada depois da grande tempestade que cahiu sobre esta cidade no mez de outubro ultimo e que tão graves prejuízos causou á jardinagem. D'ella se resentiu a Musa ensete, que apresenta muitas das suas folhas rasgadas, ficando intactas porém grande numero d'ellas. O exemplar, que o snr. visconde de Villar Allen possue, tem folhas que mo- dem 4 metros de comprido por um de largo ! É uma das plantas mais ornamen- taes que possuem os nossos jardins e é de crer, logo que se saiba que ella prospera bem ao ar livre, que seja empregada com profusão. Uma gravura representando esta Mu- sacea sahiu no vol. III, a pag. 79, mas está muito longe de dar uma verdadeira ideia do porte da planta. — Do nosso amigo, o snr. Diogo de Ma- cedo, da Régua, recebemos em data de 19 do janeiro uma carta, em que nos dá algumas noticias agrícolas, c da qual fd,- zemos 08 seguintes extractos: Os trabiilhos agrícolas quasi no3 últimos três mczes se limitaram ás operações da poda e mergu- Ihia. Tem-se procedido a estas operações com regu- laridade e tempo enxuto. A circumstancia do tempo enxuto não favorece porém a agricultura. As chuvas tornam-so preci- sas em beneficio dos suecos e adubos das plantas e das terras. As relvas dos prados estão destruídas pelas geadas, extenua-se a vegetação ordinária dos vinhedos, morrem de sede os campos destinados ás sementeiras e finalmente, com grave prejuízo da navegação, as aguas do rio Douro não sobem do nivel das aguas do estio. Ainda por cima os serviços braçaes attingem nm preço mais subido que os dos annos antei-iores. Cada podador ganha hoje 200 reis diários e o jor- naleiro das mergulhias não vence menos de 210 reis. Para os propugnadores das theorias de Prou- dhon é demasiadamente exigua esta retribuição do trabalho. Como ó que o jornaleiro poderá sustentar sna pessoa o tamilia com a quantia de 200 ou 2 10 reis ? Mas é certo que também o jjroprictario não folga muito cora as riquezas agrícolas dependentes do braço do jornaleiro. Por atiui vende-so ordina- riamente na vindima por 2G:000 reis cada pipa de vinho. O terreno que produz esta quantidade de vinho exige as despezas da mergulhia, da poda, da redra, da enxofração o da colheita. Pelo menos es- tas despezas excedem do 12 a 16:000 reis, segundo a perfoiçào dos prangeios o a natureza do solo. Temos portanto um resultado médio de 12:000 reis por cada pipa de vinho vendido. Applicando a re- sra das proporções, ura lavrador que possa colher 20 pipas percebe, livro de despezas, a retribuição anuual de 240:000 reis : quantia parca e dirainuta se calcularmos o trabalho por elle empregado e o capital dispendido com a compra do terreno. — No concelho da Régua preparam-se algumas amostras do \'inho para a próxima Exposição de Londres. O governo portuguez exige dos expositores mais de 100 litros de vinho por cada amostra, e a nós esta quantidade não nos parece exaggerada por so tornar conveniente que pela prova sejam os nossos productos vinícolas conhecidos das pessoas que visitam a exposição. Adoptamos esta ideia como excellente e ainda com alguns argumentos a defenderíamos agora se argumentos de sobejo os não apresentasse já o sá- bio e respeitável escriptor Ferreira Lapa. Não julgamos razoável, todavia, que o governo convide os expositores portuguezes a apresenta- rem de preferencia amostras de vinho isentos de beneficio e preparo. Os AÍnhos do Douro não podem dispensar a aguardentação. Sem tal beneficio não mostram elles o sabor, a coloração, a grossura e as qualidades li- corosas que o recommendam. Vinho das mesmas vasilhas e diíTerentemente preparado, ó diverso no gosto e na côr. O vinho simples, vinho de mesa ou de ramo, é secco, frio e áspero. Além d'isso não resiste aos calores e ás intempéries : soflTre alterações, ó pre- judicado pelo acre-doce e nunca se conserva em estado de perfeição. Introduzir no mercado inglez o gosto do vinho chamado de consumo, acredite-se que é commetti- mento impossível. Ao clima da veneranda Albion repugna o nosso vinho simples : dizem os inglezes com a sua proverbial fleugma que é "bebida fria". — A baga de sabugueiro alcançou nos mezes de setembro e outubro de 4:000 a 4:200 reis por cada raza. Tornou-so então muito procurada por motivo de avultadas encommendas de Hespanha e França. Mas depois foi pouco a pouco embarete- cendo o hoje não a favorece grande procura. Está regulando a raza por 2:800 reis. De vinhos velhos e beneficiados não se effectuam transacções. Dos de consumo ha abundância e ba- rateza. Fazem-se algumas compras de 22:500 a 25:000 reis. De aguardente não so conhece abundância e ha bastante procura. Alguns commerciantes manda- ramn-a fabricar em Pinhel e outros sítios na es- perança de lhe ficar em mais favorável conta. Ef- fecti vãmente não deve importar, posta no cães da Régua ou do Pínlião, por mais de 115:000 reis. Ne- gocio lisongeiro, porque nas feiras de Favaios e nos diversos mercados custa a apparecer aguar- dente por menos de 130:000 reis cada pipa. — Vae começando a apanlia da azeitona. A pro- ducção ó insignificante. O fructo das Oliveiras sem- pre costuma ser incerto e precário; mas este ul- timo anno princípalmonre correu de uma escassez total. — Os laranjaes não mostrara abundância tam- bém. O verão correu-lhes esquerdo e adverso a modo devingarem jjoucos pomos. Podemos dizer, fin:ilmciite, que expirou o anno de 1873 sem legar fartuia do tractos ao novo e cor- rente anno de 1874. De Y. etc. Drooo i)E M/vrEno. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 39 — Ainda não está resolvida a questão da nova moléstia das vinhas e o mal con- tinua batendo-se contra as Videiras. Vemos por um decreto do ministro de agricidtura e eommercio de França que o premio de 20:000 francos destinado ao descobridor do processo para debellar o Phylloxera não será conferido antes de dezembro de 1874. Prova evidentíssima de que todos os remédios experimentados até aqui não téem provado sufíicientemen- te á evidencia a sua efficacia. — Informa-nos o conselho administra- tivo da Eeal Sociedade de Agricultura e Botânica de Gand que se realisará no dia 28 de junho a abertura de uma exposição de plantas, e que no dia 5 de abril pro- moverá uma exposição especial de plantas novas. — Noticia a «Belgique Horticole» que se acha terminada a celebre publicaçíio que Pyrame De Candolle havia princi- piado em 1818, o «Prodromus». A obra compõe-se de 13:194 paginas: 5:950 foram escriptas por Pyrame, Al- phonse e Casimir De Candolle; 1:475 pe- los conservadores do Herbario de De Can- dolle e 5:769 por auctores differentes. — Durante o anno económico de 1872 a 1873 fizeram-se nas propriedades a car- go da direcção das obras do Mondego e Barra da Figueira, os seguintes traba- lhos: Na matta do Choupal — Plantaram-se difinitivamente na matta as seguintes ar- vores : Casuarinas 3, Cujpressus 50, Cry- ptomerias 20, Pinus 30, Acers 76, Ailan- tus 134, Acácias 132, Arundo 7:575, Broussonetia 12, Ceitis 258, Cereis 38^ Citriis 215, EucaJyptus 353, Fraxinus 97, Fagus 20, Grevillea 3, Gleditschia 241, JiKjlans 193, Melias 67, Morus 620, Pyrus 65, Populus 10:086, Paulmania 2, Platanus 515, Rohinias 133, Salix 21:009, Sambucus 3:967, Tílias 6, Ul- miis 15. Total 45:941. No pinhal de VaUe de Cannas — Arauca- ria 1, Casiiarinas 79, Ciipressus 1:311, Cedrus 2, Pinus 12, Taxodium 15, Thuya Ib, Acácia 44, Betida 50, Euccdyjytus 150, Fagus 87, (jrevilleas 48, Gledits- chias 6, Podocarpus 3. Total 1:883. Na matta das Kemolhas — Juglans 80, Populus 768, Salix 7:441. Total 8:289. Nos Camalhões — Populus 2:909, Salix 22:452. Total 25:361. Na motta do Rio Mondego — Salix 26:260. Nas margens do Rio Velho — Salix 12:547. Na motta da valia do Norte — Cupres- sus 100, Pinus 27, Acácias 3, Eucalyptus 208, Fraxinus 20, Juglans 9, Melia 23, Populus 2:226, Salix 276:682. Total 279:298. Nas margens da valia de Pereira — Fra- xinus 62, Melias 113, Salix 174:074. Total 174:249. Na motta da valia do Foja — Salix 1:806. Nas margens da Vagem Grande — Sa- lix 62:075. Total geral 637:709. Nos viveiros plantaram-se: Nos viveiros do Choupal — Acers 1:088, Ailantus 3:152, Ceitis 624, Cereis 62, Gleditschia 691, Juglans 198, Fraxinus 738, Populus 1:839, Platanus 792, Pyrus 207, Paidotonias 5, Melias 612, Moras 5:491, Rohinias 850, Ulmus 137. Total 16:486. Nos viveiros de Valle de Cannas — Acá- cias 221, Shinus 50, EucaJyptus 6:250, Grevillea 50, Hakea 69, Madura 26, Ro- hinias 12, Ahies 18, Casuar ina 190, Pi- nics 50, Wellingtonia 23. Total 6:959. Total geral 23:445. Ficaram existindo nos viveiros no dia 30 de junho de 1873, 24:524 plantas, cujo valor é de 1:928*^560 reis. D'estas 13:086 pertencem aos viveiros do Choupal e 11:438 aos viveiros de Valle de Cannas. Nos viveiros fizeram-se as seguintes se- menteiras : Nos viveiros do Choupal — Alnus 25 grammas, Acers 70 gr., Fraxinus 25 gr., Gleditschias 100 gr., Juglans 4:500^gr., Morus 600 gr., Paidoumia 50 gr., Rohi- nia 100 gr. Total 5:470 grammas Nos viveiros de Valle,de Cannas— ^ites 70 gr., Cedrus bO gr. j Cupressus 110 gr.. Casuar ina 25 gr., Pinus 50 gr., Sidishu- ria 10 gr., Sequoia 25 gr., Thuya 25 gr., Wellingtonia 15 gr., Arhiitus^^^2ò gr.. Acácia 100 gr., Dyospiros 25 gr., Euca- lyptus 400.gr., Hakea 50 gr., Ikx 50 gr., Liriodmdron 25 gr.. Madura. 25 gr., Tilia 25 gr., Cryptomeria 25 gr. Total 1:120 gi^ammas. 40 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Na niatta do Choupal fizeram-se, além de muitos outros, mais os seguintes traba- lhos : Abriram-sc r):lSO metros de ruas e ca- minhos, aonde se construiram aterros cujo volume foi de 1:446 metros cúbicos, e fez-se calçada em alguns sitios como por exemplo nas avenidas das pontes que oc- cupam uma supei-ficie de 000 reis. A receita foi a seguinte: CHOUPAL Em dinheiro 975:800 De productos fornecidos gratuitamente a differentes estabelecimentos publi- cos e empregados em diversas obras da direcção 902:985 TotaL . . 1.968:785 YALLE DE CANNAS Em dinheiro 4:330 De productos fornecidos gratuitamente a differentes estabelecimentos públi- cos o empregados em diversas obras da direcção 2W:7lO Total. . . 219:070 REMOLHAS Em dinheiro 81:875 De productos fornecidos gratuitamente a differentes estabelecimentos públi- cos o empregados em diversas obras da direcção 52:19." Total. , . 131:370 GERIA De productos fornecidos gratuitamente a differentes estabelecimentos públi- cos o empregados om diversas obras da direcção 50:000 VIVEIROS DO CHOUPAL E VALLE DE c.\:n'nas Plantas vendidas 651:485 Plantas sabidas gratuitamente . . . 565:360 Total. . . 1.216:845 Derara-se para differentes estabeleci- mentos públicos 7:817 plantas. CAilALHÒES Em dinheiro 286:000 De productos sabidos para diversas obras da direcção 586:480 Total. . . 872:480 As forragens e fachina das mottas dos rios e valias rendeu 227:020 Ficaram existindo nos annazens do Choupal madeiras apparelhadas no valor de 445í>090 reis, e outros productos no va- lor de 5?S000 reis. — Na primavera do anno findo passá- vamos pela rua de Camões com um nosso amigo com quem trocávamos o seguinte dialogo : — «Que lhe parece d'esta rua? — Esta rua, quando aqui se passa, es- quece-se a gente de que está no Porto e pensa que está em terra onde se presa e cuida da arborisação. — Isso é verdade; é a única rua bem arborisada que temos e a sua largueza excepcional permitte que se deixe tomar ás arvores todo o seu desenvolvimento. Como ha de ser bonito d' aqui a alguns annos ! >> Ha approximadamente seis mezes que diziamos isto, mas hoje passando pelo mes- mo sitio ouvimos um dialogo bem diffe- rente a respeito do mesmo assumpto. As pessoas a que nos referiamos censu- ravam acremente o ter -se mandado cortar uma grande parte das arvores desfiguran- do assim aquella bonita alea, que um dia formaria copada abobada de verdura. Qual foi o motivo que originou simi- Ihanto operação ? De certo que se quiz satisfazer o capricho d'algum visinho, sa- crificando-se assim mais uma vez o bom gosto. ]\Ias para que nos havemos de admirar, se isto no Porto é tao vulgar? O que nos resta é exclamar com um dos individues que estavam dialogando na rua de Ca- mões : Les sotSj depuis Adam, sont en ma- Jorité ! Oliveira Júnior. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 41 O MEU JARDIM Será pretencioso, será immodesto o ti- tulo d'este pequeno artigo? Diz Garrett que a modéstia na mulher é sempre virtude, mas que no homem pode ser quasi defeito completo. Ora nós não queremos brigar com tal mestre ; se ha peccado, pequemos com o grande poeta e conservemos a epigraphe. Mas agora reparamos, leitor. Não é pro- priamente do nosso jardimsinho que lhe Fig. 9 — o meu jardim vamos fallar. É do seu, é do que pertence ao nosso amigo Esteves de Mendonça, é emfim do de todas as pessoas que vivem na cidade e que apenas possuem alguns palmos quadrados de terra para dar lar- gas á sua paixão pelas flores. Quem vive na cidade ouve todos os dias dizer : O meu jardim ó pequeníssimo ; o Yol. V— 1874. meu jardim não tem agua; o meu jardim é sombrio ; o meu jardim é muito açoutado pelo vento. Com eíFeito os quintaes de barreiras a dentro teem innumeros defeitos, porém al- guns d'elles remedeiam-se facilmente. Tu- do está no savoir faire. Quando, por exemplo, o jardim é som- N." 3— Maiço. 42 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA brio, plantam-se arbustos que não care- çam de muito sol como a Camellia, SjJÍ- raeaSj Senecios, ViolttaSj Bellis jperennis, Agaves, Fetos, Canna indicaj Aucubas, Acanthus lusííanicinn, Cinerarias, Fu- chsias, Rhododendrons, Evonimus, Azá- leas, etc, etc. Se é açoutado pelo vento e tem sol, plantar- se-hao Xeriums, Escallonias, Acá- cias, Pittosporums, Centáureas, Ahutilons, Coni feras, Gynerium, e muitos outros que seria longo ennumerar, e cuja selecção ca- bo ao jardineiro. O que é mais vulgar nas cidades c en- contrar pequenos jardins, com bastante extensão, mas tendo apenas a largura da casa, e se o artista pode desenvolver os recursos do seu saber quando delineia um grande parque, não é menos verdade que uma d'estas tiras de terreno oíferece gran- des difficuldades ao architecto que só as resolve bem, dizendo : Necessitas non habet legem. Debalde perguntará elle ao proprietá- rio — quer um jardim irregular á ingleza? quer um jardim de linhas rectas, á le- Nôtre ? Ou lhe respondam sim ou não, em qualquer dos casos, o architecto não fica menos embaraçado. Para fazer um jardim irregular, que é o que pede a moda e mes- mo o bom gosto, não ha espaço ; para um jardim regular, apenas o haverá para duas ou três figuras. Isto já succedeu comnosco. Estávamos para habitar uma casa que tinha, para desenfado das horas de trabalho, um pe- queno jardim, que apenas media 6 metros de largura, e portanto claro está que es- casseavam os recursos para quem quizes- se fazer obra que sahisse do vulgar e que tivesse cunho de bom gosto. Que havemos de fazer aqui? pergun- tavamo-nos a nós mesmo. Emfim vejamos. Lançamos mão do lápis e escudados com a divisa la simplicitê cest 1'art, traçamos n'uma tira do papel as figuras que acom- panham estas linhas. Ficara assim, den- tro de breves momentos, delineado o que a nossa liumildo pessoa chamara: «O meu Jardim». Em seguida mandamos preparar o ter- reno o depois de desenhadas as figuras a Buxo demos a seguinte disposição ás plan- tas: na figura A. 1 — Roseira no centro e Centáurea maritima em volta. 2 — Mas- siço de Pelargonium Luna e Mistfess Pol- lock. 3 — Massiço de Pelargonium Itália Unita. õ — Yucca aloefoUa varegata. 6 — Massiço de Eanuncidus formando cír- culos de difi^erentes cores a começar pela circumferencia do oval pela ordem que segue — 1.''' preta, 2.^ amarella-clara, 3.* vermelha-clara. No terreno circumscripto pela figura B, disposemos as seguintes plantas: 1 — Gazania splendens. 2 — Ciyptome- rea elegans, de dous annos. 3 — Semper- vivums diffbrentes. A figura C contém as plantas que va- mos notar : 1 — Massiço de Fuchsias com Jacinthos na circumferencia. 2 — Dracaena indivisa. 3 — Gladiolus. 4 — Centáureas. Estas figuras são desenhadas em arrel- vados o que concorre muito para as plan- tas se destacarem. Dos lados, ao longo dos muros, forma- mos um canteiro de vinte centímetros de largo em que dispozemos algumas trepa- deiras taes como Tacsonias, Clematis, Lo- niceras : na frente d'estas plantas acham- se Roseiras de diversas variedades em pé franco. No lado direito, ao longo do muro, plan- tamos Roseiras de haste elevada e na frente Gardénia jiorida flore pleno, diffe- rentes Azáleas, Geraniums, Statice ma- crophylla e outras. Por algumas das plantas que mencio- namos facilmente se deprehende que o jardim foi executado no inverno: nas ou- tras estações tem de ser convenientemente substituídas. Mal passem os frios, ha os Coleiís, Iresi- nes, Alternantheras, Centáureas, Stachys lanata, Clirysanthemum sensation e muitas outras plantas de pequeno porto, com que se podem formar bellissimos massiços. A intclligencia e a pratica serão recur- sos que fartem para que o leitor possa transformar os seus cinco palmos de ter- reno em attractivo jardim. Se o espaço não pormitte que se tenha alli uma pan- carpia, haverá pelo menos flores sufficien- tos para que a esposa querida possa ornar aos sabbados as taças dos aposentos. Isto no caso do amigo leitor não ser ce- libatário como o auctor d'esta8 linhas. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 43 Não ha passatempo mais proveitoso para a saúde- do que tractar de um jardim. De facto que haverá mais agradável e hygienico do que gastar uma pequena parte do tempo entre plantas ? ! O seguir semana a semana o seu desenvolvimento, observando ao mesmo tempo o desabro- char das flores de dia para dia, obriga a cuidados, por assim dizer maternaes, dá vida e mobilidade ao corpo, afeiçoa-nos a alma aos prazeres simples e delicados, dá emfim uma alegria ao espirito que nenhum dissabor vem perturbar. Depois, vendo as flores nas jarras de porcellana, vem-nos logo á lembrança que Scão filhas dos nossos cuidados, e não tri- plica então o nosso contentamento? Oliveira Júnior. ARMOLLE Persuadido de quanto o desenvolvimen- to dos conhecimentos agrícolas, em qual- quer de seus variados ramos, interessa ao nosso paiz, e certo de que muitas vezes observações e descobertas, aliás feitas por pessoas intelligentes, ficam na obscurida- de, sem serem conhecidas mais do que por essas próprias pessoas, pela simples razão de não darem conhecimento d'ellas, o que não pouco tem concorrido para o atrazo, em que actualmente, pela maior parte, nos vemos; e desejando por minha parte con- correr para o bem do nosso paiz, vou hoje publicar o resultado de observações mi- nhas, das quaes julgo se poderá tirar al- gum proveito. São ellas no ramo horticul- tura. É fora de duvida que são tantas as con- dições particulares, que influem nas cpo- chas e modos das sementeiras e plantações, o nos methodos do tractamento das plan- tas, que quasi para cada província nossa, não digo só para cada província, mas até para cada districto e para cada concelho, se deveriam estudar essas condições, para d'ellas tirar as regras apropriadas áquel- les efíeitos. Além d'isso nem todas as plantas se dão do mesmo modo em todos os climas dentro do nosso próprio paiz, postoque de tão limitada arca, nem em todos os terrenos; antes, por assim dizer, cada espécie tem sua Índole particular, e requer tractamen- to e cuidados especiaes. E d'aqui nasce a necessidade de se estudar quaes as pró- prias para cada localidade, ou pelo menos para cada circumscripção, em que varie notavelmente o clima ou a natureza do terreno. Isto não se tem feito. E encontramos nos poucos livros portuguezes, que sobre assumptos taes se tem escripto, regras, que como geraes se não podem appliear senão com muita prudência, que ainda maiores devem ser quando se faça obra pelç que se lê nos livros estrangeiros. E também sabido que ha plantas que, sendo aliás de grande utilidade, e podendo applicar-se não só a usos culinários, mas também a outros de interesse do cultiva- dor, são ainda desconhecidas no nosso paiz, ou em muitas localidades d'elle; o que em parte é devido ao pouco que se tem pro- curado divulgar os conhecimentos e prati- cas, que alguns observadores vão colhendo em diversos pontos do nosso paiz, e o que muito conviria que se fizesse, principal- mente quando se presumisse interesse pu- blico n'essa divulgação. Todas estas razões mais me animam a publicar o que vou referir, filho de minha observação e cuidados. Tractarei de uma planta, usada na ci- dade da Guarda para caldos chamada caldos mollesj, a qual denominam Armolle. Esta planta, que nem no Minho, Traz- os-Montes e Douro, nem em qualquer ou- tra parte do nosso paiz fora da Guarda tenho conhecido, merece bem ser vulgari- sada, pois que, em verdade, presta bas- tante interesse á arte culinária, e pôde, segundo penso, prestal-o a outros misteres do agricultor. O Armolle é excellente para os chama- dos caldos mollesj ou só ou misturado com outras hortaliças mimosas, como a Nabiça, a Alface, a Acelga, a Borragem, a Mos- tarda, o Espinafre, a Beterraba, etc, é da mesma sorte bom para espernegado, e é ainda óptimo para guizar com a Hervi- IJia de quebrar, porque lhos dá um agra- dável sabor e as atenra muito. Não ó, porém, somente para os usos culinários que o Armolle é prestadio. As 44 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA suas sementes sào comidas com gosto pelos pombos, servindo-lhes ao mesmo tempo de entretenimento, porque lhes leva tempo a desprender o grào do involocro que o çn- cerra ; e sendo de uma abundância ex- traordinária, nào pôde haver duvida na utilidade do Armolle para este fim. Não devem, porém, ser sacudidas as sementes, mas sim ministradas ainda pegadas á planta. As suas palhas, que também são muito abundantes, pois que chegam a tomar a altura de dous metros e a sua haste prin- cipal se veste de muitos ramos lateraes, podem mui bem utilisar-se para as camas dos gados, principalmente do vaccum e suino; e, alóm d'isso, são comidas com gosto pelo gado caprino. São pois incontestáveis as vantagens d'esta planta. Quanto á sua cultura direi o que a observação e a experiência mo teem ensinado. Os Armolles podem começar a semear- se, na Guarda, em principies de fevereiro, em terrenos abrigados ; e convém conti- nuar as sementeiras de 15 em lõ dias, pouco mais ou menos, e até fins de maio, para os haver cedo e tarde. Sementeira, porém, de junho não presta, porque espi- gam em breve. E bom cavar com antecipação a terra : pode cavar-sc já em janeiro, quando o tempo o penuitta, ou mesmo em novembro antes das neves e geadas; e em fevereiro ir começando a arrazar a terra, estrumar e semear. Em abril e maio já pode haver Armolles em termos de se comerem. Na Guarda só se usa o Armolle no pró- prio alfobre, em que é semeado, e d'ahi os vão utilisando, arrancando-os, e des- presando a raiz e a parte dura do talo. Não necessitam ficar muito ralos, por isso que se vão desbastando, ficando mais á vontade, c também porque no alfobre dis- pensam as sachas; pois que amonda fre- quente as supre, sendo todavia útil picar a terra de dias a dias. O Armolle, porém, é susceptível de ser transplantado, posto que esmoreça muito com esse acto e leve muito tempo a pren- der, softrendo por conseguinte um grande atrazo em seu crescimento, em compara- ção dos que se criam no alfobre ; mas, se a plantação é feita cm terreno apropriado, e com 03 cuidados que esta planta exige, o Armolle recupera, depois de certo tem- po, o que perdeu até ahi, e compensa lar- gamente os cuidados havidos. O Armolle, para ser transplantado, re- geita quasi completamente terreno areiento e solto : em terreno tal, por maiores que sejam os cuidados, são quasi inteiramente perdidos, e apenas se conseguirá, quando muito, indivíduos infesados, que pouco prestam. A sua raiz, a principio quasi úni- ca, com quanto bastante comprida, mas despida de radiculas e, além d'isso, muito diu-a, é devida a difficuldade de prender, ao contrario de outras plantas, como por exemplo a Alface, que, tendo uma raiz branda e acompanhada de uma como teia de pequenas raizes, prende com extrema facilidade o nada estranha a transplanta- ção. Exige o Armolle, quando se queira transplantar, terra substancial e funda. Requer que a terra seja fresca, ou boa rega na occasião de plantação e dias seguintes, não só até ter prendido, mas ainda até mostrar algum desenvolvimento, sendo de notar que ainda assim o Armolle se con- serva muito tempo como amuado, pela dif- ficuldade de se lhe crearem novas raizes. Depois é ainda necessário não largar de todo a rega, se a terra não é de natureza fresca; nem desprezar as sachas. O calor forte é um implacável inimigo do Armolle transplantado, nos primeiros tempos, se não ha o devido cuidado com as regas. Os Armolles, porém, tractados nas con- dições referidas, dão muito maior proveito do que cultivados no alfobre, porque, uti- lisando-lhes primeiramente a haste princi- pal, nasccm-lhes logo ramos lateraes, que, cortados por sua vez, dão ainda logar a novas ramificações e essas a outras, que todas se utilisam. Isto não se pôde fazer no alfobre, porque apontariam uns aos ou- tros. Além d'esta grande vantagem, pôde acontecer que o horticultor não tenha terra disponível para a sementeira senão em pe- queno ponto, em quanto que a tenha com largueza para a plantação. Ainda mais. No alfobre não tomam os Armolles, que se queiram deixar para se- mente, tão grande desenvolvimento como JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 45 os transplantados, a não ser que desde principio estejam muito ralos. No anno próximo passado, em que só os tive transplantados, alguns pés, dos que deixei desde logo para semente, chegaram a tomar a altura de dous metros, e no cor- rente anno também os tive, que attingi- ram egual altura. Fica pois evidente que o Armolle trans- plantado (o que na Guarda se não usa), se o é nas devidas condições, dá muito maiores productos do que no alfobre. Os pés que se deixam para semente co- brem-se prodigiosamente d'ellas, a ponto de, quando estão em seu pleno desenvol- vimento, quasi nada se ver de suas folhas, offerecendo por essa occasião o mais lindo aspecto, tendo a principio uma cor verde- gaio muito pronunciada e tomando depois, quando as sementes estão maduras, uma côr de passa, que lhes dá um outro aspe- cto, também muito interessante. *A colheita das sementes de Armolle na Guarda é bastante serôdia: só se faz no fim de setembro ou principies de outubro e mais tarde; e as chuvas, que já n'este tempo costuma Liver, prejudicam muito as sementes, se não houver as necessárias cautelas. Que a publicação d'esta noticia possa aproveitar aos horticultores é o que muito desejo; e desde já me promptifico a dar- Ihes qualquer esclarecimento, que sobre o assumpto me peçam. Guarda. V. DE M. C. Almeida d'Eça. CULTURA DOS MORANGOS Já no primeiro volume d'este jornal se publicaram algumas instrucções acerca do cultivo d'estas plantas, mas como algumas pessoas se nos tenham queixado de resul- tado negativo, accrescentaremos agora no- vas explicações. Uma das primeiras queixas dos nossos freguezes é que os Morangueiros lhes ren- dem muito pouco e dão fructo pequeno. Não sabemos como isto possa dar-se, a não ser por falta de boa cultura, porque cul- tivamos mais de 60 variedades no nosso estabelecimento e não ha que desmerecer nem na qualidade nem na quantidade. Os Morangos querem- se plantados em terreno delgado, solto e secco e ainda me- lhor no que for saibrento. Na occasião da plantação estrumar-se-ha bem o solo. De- vem-se dispor as plantas á distancia de 25 centímetros. Não se escolham logares assombrados, nem se deixem crear hervas, que podem fazer sombra ás plantas. Antes da plantação, o terreno deve ser cavado fundo, para que venha á superfí- cie a terra que ainda não foi cultivada o de que os Morangos gostam muito. Plan- tam-se de outubro a meiados de novem- bro, para que se enraízem antes das gran- des geadas e já dêem alguns fructos no primeiro anno. Não se lhes devem conservar os braços que deitam até aos fins de Julho, pois é es^te um dos motivos mais fortes por que não sahem.os fructos na quantidade e qua- lidade que era de esperar. Sendo neces- sária a reprodução, bastará deixar ficar os braços, que deitam desde fins de julho a outubro, porquanto n'esta epocha já não prejudicam a fructificação. Não sendo ne- cessário reproduzir, n'este caso será me- lhor cortal-os todos. Durante a florescên- cia e a fructificação, as regas devem ser pelo menos de oito em oito dias. Os Morangos precisam de ser renova- dos de três em três annos, ou de quatro em quatro. Para isto dividem-se as anti- gas toucas, cortam-se parte das raizes ve- lhas, e plantam-se mais fundo para darem novas raizes no olho. Seria mais conve- niente fazer a plantação em outra parte. Em todo o caso serve o mesmo terreno, contanto que seja bem estrumado. O que de novo recommendamos é que haja todo o cuidado em se cortar os bra- ços. Não se fazendo assim, trabalho per- dido e esperanças baldadas. A variedade portuense ou de Santo André, uma das que nós conhecemos que dá maiores fru- ctos, se lhe não fizerem a operação que indicamos, nada produzirá. José Marques Loureiro, 46 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA EUCáLYPTUS GLOBULUS 1 n Vamos entrar na descripção e historia natural dos Eucalyptiis e especialmente do E. glohulus -. Julgamos que este tra- balho não ficaria completo para muitos dos nossos leitores, sem uma diagnose da família e género a que pertencem os Eu- calyptus : é por isso que consagramos al- guns paragraphos a este assumpto. Enu- meraremos também todas as espécies e variedades até hoje conhecidas, abstendo- nos todavia da sua descripção pelo muito espaço que nos tomava. O leitor, que qui- zer ver essas descripções, pode recorrer a Floras -^ e trabalhos especiaes. Os Eucalyptus pertencem á vasta fa- niilia das Myrtaceas quasi toda exótica e composta de plantas ornamentaes, posto que algumas espécies sejam vegetaes de grande valor económico e industrial. É formada de arvores ou arbustos, de folhas oppostas, sem estipulas, simples, inteiras, penninervadas, coriaceas. Insidias, con- tendo na espessura do seu parenchima glândulas cheias de óleos essenciaes muito aroinaticos. As flores são geralmente regu- lares, tetrameras ou pentameras; o cálice é campanulado, mais ou menos soldado ao ovário; as pétalas são arredondadas, os estamos em numero indifinido, inseridos do roda do ovário sob as bordas do tubo calicinal, outras vezes livres e indepen- dentes uns dos outros, ou soldados, na maior parte dos seus filetes, em quatro ou cinco fasciculos. O ovário é adherente ou scmi-adherento, algumas vjzes coberto por um disco glanduloso, outras unilocular, mas ordinariamente de quatro a cinco lo- jas e coroado por um estylete simples o estigma indiviso. Transforma-se n'uma cú- pula mais ou menos coriacea, dehiscente ou indehiscente, ou em frueto carnoso 1 Virlo J. 11. P., vol. Y, pa,^^ 29. 2 A gravura, que acompanha oste artit^o, devi- da aos (lelicadoa lai)is c huiil do MM. W. H. Frec- iiiaii c A. Hisson, é extrahida da pi-eciosa obra de Mr. HcniM Lccoq "1^0 ^íoiido dos Floiirs". A arvore, fine e-nú no jirimpiro plano da fjravu- ra, representa o Eucalyptus (ilohulus ainda novo c a quo PC aclia mais atraz representa um exem- plar de dons annos. 3 Vide "Flora australicnsis" do Bentham. maliforme ou baciforme, contendo geral- mente numerosas sementes privadas de albumen. Esta familia é quasi toda natural dos paizes quentes inira ou extra tropicaes. Encontra-se na America do Sul, nas ín- dias orientaes, e na Africa. A Nova Hol- landa assim como as ilhas do mar do Sul, são pátria d'um considerável numero de espécies. As numerosas espécies d'esta familia (4G géneros e quasi 1:300 espécies), por causa da grande diversidade de flores e fructos, foram divididas em muitas tribus, que, segundo a opinião de alguns botâni- cos, passam por verdadeiras familias. São estas divisões ou tribus: as Cha- melaiicias (estamos em numero difinido, capsula monosperma), Leptospermeas (es- tamos em numero indefinido ; frueto ca- psular loculicida, ou septicida) ; Myrteas (estamos livres cm numero indifinido ; fru- eto carnoso em forma de baga, coroado pelo limbo do cálice, de lojas polyspermas ou monospcrmas) ; Barriíujtonias (estames indifinidos, eguaes, dispostos em muitas séries, soldados na base; frueto baccifor- me, pluricellular, cotyledones grandes e carnudos) ; Lecythideas (estames indefini- dos, monadelphos ; frueto secco pluricellu- lar). Algumas d'estas grandes séries ou divisões reúnem arvores muito importan- tes, como por exemplo o Cravo^ Cmryophyl- lus, aromaticus, cujas flores muito aromá- ticas são colhidas antes de desabrocharem, seccas e entregues ao commercio debaixo do nome de cravo de esjMciaria. Outras tornam-se notáveis pelos seus enormes fructos lenhosos, comestíveis, co- nhecidos no seu paiz com o nome de mar- mitas de macaco. O género Eucalyptus pertence á secçEo das Leptospermeas, e é um dos mais con- sideráveis, já pela importância que tem como arvores florostaes, já pelo grande mmiero das suas espécies. «O Euccdyptus glohulus é uma arvore muito alta, de ramos tetragonos no vérti- ce. As folhas mais novas são sub-cordifor- mes, oppostas; as outras alternas, diver- samente pecioladas, coriaceas, unicolores, JORNAL DE ITOnTirULTURA PRATICA 47 como que envernisadas, agudas e muitas vezes um pouco contornadas desde a base em forma de fouce, ou estreitamente lan- ceoladas, alongadas, mucronadas e cober- tas por nervuras pennadas sallientes: as nervuras da circumferencia sào affastadas das margens. As flores são axillares, ge- minadas ou tornadas, sesseis ou munidas d'um pedúnculo curto, largo, comprimido. Os botões floraes são esbranquiçados, vcr- Fig. 10 — Eucalyptus globulus rucosos, engilhados ou quasi lisos, de du- plo opercido. O tubo do cálice é muitas vezes hemispherico ou pyramidal, turbi- nado anguloso ou de poucos lados, egua- lando quasi o tamanho do operculo in- terior, hemispherico, ou deprimido subita- mente em forma de escudo desde o cen- tro. Os filetes dos estames são compridos, as antheras subovoaes. Os fructos grandes são muitas vezes hemisphericos ou depri- midos, turbinados. Tem 3, 4 e 5 lojas. O vértice da capsula é elevado e um pouco convexo. Válvulas deltóides, sementes sem azas. Esta arvore cresce nos valles e nas en- costas húmidas das montanhas, desde o 48 JORNAL L'E HORTICULTURA PRATICA golfo cie Apollo-Bay até além do cabo Wil- son, cstcndcndo-se por toda a parte em massiços, até perto das montanhas de Buf- falo-Rangc. Segundo LaLillardicre eleva- se a alturas mais frias nas partes austraes da Tasmania (Ilha de Flinders). No nosso paiz, o Eucahjptus glohulus parece pros- perar, principalmente nas terras favorá- veis ao desenvolvimento do Sovereiro, nas dunas, nos terrenos graníticos, schistosos e silico-calcareos. Esta arvore d'uma notável rapidez de crescimento, é conhecida agora, cm toda a parte, debaixo do nome de gomeiro azul da Tasmania (hlue gum treej; é digna de sor contada entre os colossos do reino ve- getal ; pois que attinge frequentemente 60 a 70 metros e ás vezes 100 de altura. Encontra-se nas collinas pedregosas, ás veses expostas a todo o furor das tempes- tades, sobretudo no cabo AVilson. Forma também lindos arbustos copados carregados de flores e fructos. O tronco, cujas camadas corticaes ex- teriores (como no Plátano) são muitas vezes destacadas, é liso, acinzentado, e algumas vezes guarnecido na base por velha casca fibrosa. A sua madeira é pe- sada, dura, e muito útil. As folhas são mais ou menos patentes, do 10 a 20 centímetros de comprimento, excedendo raras vezes O™, 33; são obli- quas na base, quasi agudas ou levemente obtusas, tendo de largura 0™,03 a 0'",G; mais ordinariamente imperfuradas, do que providas de pontos transparentes; termi- nadas em ponta aguda, que as mais das vezes é bruscamente destruída. «As folhas mais novas são amplexicau- les na base, apiculadas no ápice, ou cur- tamente acuminadas, esbranquiçadas sobre as duas faces do limbo, muitas vezes pon- tuadas, transparentes em quanto novas, deO'",00 de largura. Bracteas muito cadu- cas, coriaceas, compostas de duas partes ovacs acuminadas, semi-soldadas, abra- çando a nova flor, arruivadas, lisas de O", 12 a O'", 18 de comprimento. O tubo do cálice é de 0"',009 a 0'",024 de comprimento. O operculo exterior (se- gundo Oldficld) é caduco, frágil, fino, glanduloso, um pouco reticulado, venoso, egual em largura ao operculo interior. Este . ultimo é coriaceo. Tem 0"',00G a ©"^OIS de comprimento e 0"',01õ a 0'",020 de largura. Os filetes dos estamos de cor amarello-pallida, capillares, e filiformes teem 0"',01õ de comprimento e 0"',0024 de largura. As antheras, de O, "'001 de compri- mento, são versáteis e munidas de uma grande glândula. Estylete pouco espesso, filiforme; estigma convexo, um pouco mais espesso "do que o estylete. Os fructos são muitas vezes largos de 0"\03 pouco mais ou monos, algumas vezes muito pequenos. As sementes estéreis escuras, clarifonnes e filiformes ao mesmo tempo, tendo de comprimento 0'",002 a 0'",003. Outras, mais curtas, são rhomboides ou trapezoi- des. As férteis são ovaes ou arredondadas, pretas, opacas, e apresentando 0"\003 de comprimento. Poucas plantas apresentam um fácies tão característico como estas ; vistas uma vez jamais esquecem. Eraquanto nova, af- fecta sempre a forma pyriforme ; todavia, com a edade, toma todas as formas que se lhe queira dar. Umas vezes o Eucalyptus enfeita-se desde a base de ramos vigorosos e bem folhados que pendem d'um modo gracioso para o solo; outras, completamente des- pido de ramos no ti-onco, desenvolve-se superiormente n'uma magestosa cúpula de folhagem que a menor briza faz ondular graciosamente, pro luzindo suaves emana- ções que se fazem sentir a grandes dis- tancias. Está em continuo estado de vegetação; rebenta indistinctamente em todas as es- tações e é debaixo dos gelos do inverno e açoutado pelos vendavaes que elle des- abrocha as suas notáveis flores. A vegetação do Eucalyptus é d'uma notável rapidez; são immensamente conhe- cidos de todos os factos cm abono d'esta opinião. Individues plantados em péssimas condições de terreno e exposição sentem-se crescer a olhos vistos, quanto mais os que são plantados em solo fértil e abrigado. E, cousa notável, não obstante a rapidez do seu crescimento, a qualidade da ma- deira é excellente; além da regularidade das fibras e da finura do grão, é d'uma rijeza a toda a prova. Debaixo d'este ponto de vista só a madeira do Tawn e da Tech é que se podem considerar rivaes. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 49 D'uina clui'cação extrema, devida talvez aos óleos e resinas de que o seu lenho está impregnado, são provas d'isto as construc- ções navaes que na Austrália téem sido feitas com esta madeira. Cães, diques, pontilhões, etc., são exe- cutados com esta arvore, que resiste per- feitamente á agua do mar. Em Hobart- Town, tem-se construído navios com a madeira do Gommeiro azul que gosam de uma grande reputação de solidez e dura- ção. Na índia, as travessas do caminho de ferro são de esta mesma madeira. O Euccdyptus é inatacável pelos inse- ctos, preciosa qualidade que vem ainda em abono d'esta notável arvore. A propriedade que tem de se desenvol- ver d'um modo prodigioso é devida ao notável poder de absorpção das raizes. Mr. Trottier mostrou evidentemente este facto pelas experiências seguintes : Em junho de 1867, collocou um ramo de Eucalyptus n'um vaso cheio d'agua, debaixo d'uma redoma; cinco dias depois a agua tinha desapparecido e as folhas tinham murchado. Repetiu a experiência em 20 de julho de 1868, ao ar livre. As 6 horas da manhã, collocou um ramo de Eucalyptus n'um vaso de 30 centimetros de profundidade e de 16 de largura na bocca. Este ramo, posto ao sol, pesava pela manhã 800 grammas ; ás 6 horas da tarde a agua tinha perdido 2 kil. 600 grammas e o ramo pesava 825 grammas. N'este dia tinha havido 43 graus de temperatura, de sorte que o calor tinha contribuido para a perda da agua. Um segundo vaso do mesmo tamanho e da mesma forma do primeiro, submettido só á evaporação perdeu no mesmo espaço de tempo 208 grammas. De modo que o Eucalyptus absorveu, em duas horas, três vezes o seu peso de agua, e eliminou rapidamente uma grande parte. Mr. Regulas Carlotti, de Ajacio, poz 25 kilos de folhas de Eucalyptus em ma- ceração em 22 litros d'agua. Vinte e qua- tro horas depois, o liquido tinha augmen- tado litro e meio. As folhas tinham-se pois despojado d'uma parte da sua agua de hydyatação i. Estas notáveis propriedades tem sido aproveitadas pela sciencia medica onde o Eucalyptus principia a representar impor- tantes papeis. (Continua). A. J. DE Oliveira e Silva. 1 "O Eucalyptus globulus e a sua importância em agricultm'a" pelo clr. Gimbert. PROGRESSO agrícola BASE PRINCIPAL DA RIQUEZA DO NOSSO PAIZ S'il est rne profession qui, par son antiquité, son ntili- té, et son innocence, mérite Testime genorale cies hom- mes , c'est incontestable- ment Tagriculture. Toute la nationqu' eleve sapuissancc sur toute autre base, qne celle des procluctions de son sol, n'a qu'une existence d'ttn moment. "Essai sur Tetat present de Tagriculture des Isles Britanniques". A grandeza e prosperidade das nações allia-se com o estado opulento da sua agri- cultura. Do solo a industria do agricultor diligente extrae as abundantes messes e magníficos fructos cora que se alimentam os homens e os animaes; das plantas ex- trae as matérias primas, que, transforma- das pela intelligencia do fabricante, vão ser elemento de riqueza commercial; fi- nalmente da terra tiramos essas immensas riquezas florestaes, com que o rico cons- truo palácios, o pobre choupanas, e a na- ção potentes esquadras. Os povos, que abandonam a cultura do seu solo, ou que, por condições climatéricas, não produ- zem os fructos de que se alimentam, são considerados pobres, ainda que a sua in- dustria fabril esteja na maior prosperi- dade, porque todos os seus lucros e inte- resses são despendidos na importação dos productos de alimentação e compra das 50 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA matérias primas necessárias a essas in- dustrias; c toda a nação, por mais pode- rosa que seja, em que o estado da sua agricultura vae decadente, sendo-lhc ne- cessário importar géneros para a sua ali- mcntaçào, será vencida facilmente. Blo- queados os seus portos por forças navaes, o guarnecidas as suas fronteiras por exér- citos que lhes vedem a importação, a queda c inevitável, e, ainda que possua immensas sommas monetárias, será con- quistada como uma praça de guerra que se rende á fome. Vemos pela historia que todos os go- vernos sábios e dedicados á prosperidade c riqueza dos povos prestam decidido apoio á agricultura ; o povo romano ligou a sua existência politica á prosperidade da cultura do solo, a sua riqueza agricola contribuiu fortemente para a conquista e domínio das nações, que subjugou ; a Fran- ça, Inglaterra, Bélgica, e Estados-Unidos prestam a maior attenção e cuidados á sua agricultura e á prosperidade d'esta devem em grande parte a sua força, pre- ponderância e riqueza. O nosso paiz, posto que tenha avançado na senda da prosperidade agricola, está longe de chegar á emminencia que deve oc- cupar, como uma das nações agi'icolas do- tada de magnificas condições climatéricas c excellente solo. Já outr'ora no reinado de D. Diniz — o Lavrador — e no tempo de D. Fernando, em que sabias leis agrárias protegeram a agricultura, a producção era abundantissima, que não só chegava para consumo do paiz e para o abastecimento das nossas poderosas esquadras, mas tam- bém para exportarmos ; hoje infelizmente importamos grandes porções de cereaes para alimentação do paiz, exportando quantias avidtadissimas de numerário para compra dos géneros, que nos vêem supprir o deficit da producção. E isto vergonhoso para uma nação agricola como o nosso Portugal, por isso os homens, que amam sinceramente a gloria do paiz, e que pu- gnam pela riqueza e prosperidade nacio- nal, se devem associar arvorando o pen- dão do progresso agricola. Duas são as causas que téem contra- riado o desenvolvimento da nossa agricul- tura ; uma a politica, a outra a ignorância da sciencia agricola. A politica inconstante o ambiciosa dos diversos grupos, que se gladiam para subir aos principaes postos e rendosos empregos, põe de parte tudo o que c realmente de utilidade geral, e pro- midga quasi sempre leis mal pensadas, que julgam beneficio, mas saem ruina, como algumas que podia indicar. E a tal politica que seduz muitos homens e lhes faz esquecer que melhor e mais útil para si próprios e para o paiz seria cuidarem da cultura dos seus campos. A politica é causa de muitas vezes go- vernarem a nação homens, que, pela sua posição, nada pugnam pelos melhoramen- tos da agricultura, porque a desconhecem, e pouco lhos importa a sua prosperidade. Finalmente, a politica anormal com que os partidos tem governado o paiz, dictada pelos clubs, affasta muitos homens probos o sábios, que relevantissimos serviços po- deriam prestar á nação. A ignorância da sciencia agricola é tam- bém causa do nosso atraso ; custa a acredi- tar, mas é uma verdade, que ainda não ha muitos annos os proprietários se en- vergonhavam de ensinar aos creados e ca- seiros os melhores processos agricolas. O nobre julgava manchar seus brazões se fallasse sobre a agricultura. Hoje feliz- mente esta louca mania passou, e tenho a convicção, que todos os proprietários vão reconhecendo as vantagens e interes- ses que tem em estudar a sciencia agrico- la, theorica e praticamente, porque esta sciencia sem o exercício pratico conduz quasi sempre a graves erros. Já felizmen- te possuímos um magnifico instituto e es- cholas aonde se ensina praticamente a mais aperfeiçoada cultura, comtudo estas escholas ainda são insufficientes. Reconhe- cida esta verdade, é urgente que o go- verno estabeleça uma eschola agricola, e quinta modelo e experimental em cada districto do reino ; e o governo, que decre- tar a creação d'cstas escholas, faz um grande serviço ao paiz, c os povos reco- nhecidos lhe hão-de levantar um padrão de etei-no reconhecimento. Casa da Soenga. J. C. A. Mello e Faro. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 51 MÀCUINISMO PARA. O PREPARO DAS COMIDAS PARA OS GADOS Em seguida damos a descripção de al- gumas das machinas mais apropriadas ao preparo das varias comidas que o lavra- dor tem de dar ao gado de trabalho ou de engorda, e escreveremos o que nos fôr sug- gerindo a tal respeito. A experiência do lavrador é também altamente requisitada para a escolha dos Macliina Biddel Fig. 12 — Macliina Garclner animaes que deseja engordar se quizer i vendo uns que engordam com abundância como é de suppor criar carne económica- de comidas ordinárias e perderiam com mente, assim como para a escolha da co- as comidas ricas, mida segundo os hábitos dos mesmos, ha- \ Se o lavrador tem experiência ou co- Fig. 13— Machina Biddel nhecimento de causa, pelo qual lhe soja possível fazer escolha dos animaes que tem de meter na engorda, deve preferir sem- pre aquelles que mostram uma tendência a uma precoce maturação com comidas ricas, que se lhe dao em abundância, ar puro, cama secca, nem frio nem calor em excesso, o que tudo é preciso para se obter em pouco tempo a carne com economia. Fig. 1 1 — Machina para esmagar grão Machina de Biddel para cortar raízes — Já tivemos occasião de fallar sobre as co- midas preparadas para o gado ; é este um assumpto sobre o qual chamamos a atten ção dos nossos lavradores, especialmente d' aquelles que procuram tirar bons inte- resses na creação e engorda de gado, fa- zendo-lhes ver que é necessário utilisar todos os productos vegetaes provenientes 5â JORNAL DE IIORTICULTUEA PRATICA das suas ciiltaras, c procurar os meios mais conducentes ao seu preparo para que o ga- do utilise convenientemente todos os prin- cípios nutritivos que ellcs possam conter. A machina de Biddel c construída com o fim de reduzir a raiz a uma massa, em cujo estado cila p(klo mais facilmente fer- mentar e misturar-se bem com a palha cortada; ficando assim preparada uma co- mida muito nutritiva. Machina de Gardener para cortar na- bos— As machinas de Gardener (fig. 12) sSo construídas para cortar raízes para os bois e carneiros; fazem-se com o corte singelo ou duplo, e de tamanho menor para gado pequeno, ou maior para bois etc, contendo maior ou menor numero do facas conforme o fim a que sào applicadas. Na Inglaterra sao muito usadas no ou- tomno, inverno e primavera, epochas estas em que as comidas são cozidas a vapor e utilisadas as palhas seccas dos trigos, cen- teios e cevadas. No preparo das raízes são estas primeiro lavadas n'uma machina de cylíndro rotati- vo inclinado, 'meio mergulhado em agua, onde as raízes largam toda a terra que lhe tiver adherido; em seguida são cortadas por qualquer d'estas machinas em pedaços, fatias ou em massa. Dos nabos, beterrabas e batatas, pôde, querendo-se, extrahir ál- cool,servindo os resíduos da destíllaçãopara alimento do gado. Como este porém perdeu as partes sacharinas é preciso ajuntar-se- Ihe favas, ervilhas ou outro quaíquer pro- ducto tendente a restabelecer o equilíbrio transtornado pela extracção do álcool. Machina patente de Biddel — Esta ma- china (fig. 13) serve para o mesmo fim da antecedente, porém é mais perfeita no serviço de cortar as raízes, por isso que tem as facas dispostas a entrar ou sahir promptamente do serviço de corte duplo ou transversal. As substancias alimentícias destinadas ao gado, depois de cosidas e preparadas, tem não só o duplo fim de fazer destacar os componentes n'cllas contidas, em cujo estado o estômago do animal as recebe de prompto na sua totalidade, mas também de as tornar mais agradáveis ao paladar, do que resulta poder o gado comer maiores porções que serão reduzidas a carne. Ainda quo sem conhecimentos technicos que nos auctoriscm a emittir a nossa opinião res- peito ao funccíonalísmo do estômago dos animaes, diremos o que nos pai'ece com relação a comidas. Quanto maior fur a variedade de comi- das, mais suave ou menos violenta será a reacção proveniente do contacto e mistura dos componentes principaes de cada uma d'ellas, e por conseguinte estes se desta- carão com as suas affinidades naturaes e com a necessária actividade para serem convenientemente utilisadas na sua trans- formação. As comidas de um só género não são por este principio tão alimentícias embora mais agradáveis ao paladar, e são, quando haja excesso, muito mais indigestas do que o excesso de comidas muito variadas. j\[achina para esmagar grão, inclusive linhaça — Por meio de dous tambores de ferro que se aproximam mais ou menos com o auxilio de um registo pode-se es- magar toda a qualidade de grào que se pretenda dar ao gado; já atraz dissemos as vantagens que se tiram de traçar o grão com relação ao estômago fraco de alguns animaes que o projectam inteiro. A linha- ça, por ser um grão oleoso, não pode ser esmagada em outro traçador ou moinho quo não seja d'esta forma. A cultura do linho em Portugual tem tomado grandes proporções, o que de certo não tardará a convidar o lavrador a fazer a extracção do óleo em sua casa por meio d'esta machina e de uma imprensa, por isso que do óleo pode elle dispor facil- mente e os resíduos servír-lhe-hão para a engorda do seu próprio gado. Como as colheitas, que cada lavrador tem, não são bastantes para auctorisar a compra d'este machinísmo, só podemos aconselhar os mesmos para fazer a sua acquísíção em commum, como já o fizemos com respeito a muitas outras machinas agrícolas, no que convém associarem-se para todos terem as vantagens correspon- dentes ás grandes industrias. O espirito de associação e de brio na classe da lavoura, seria, a nosso ver, a ac- ção mais poderosa e benéfica para o des- envolvimento que todos desejam ver appa- recer em pouco tempo. Sem estes elementos, tarde e muito tarde se eíFectuará a nossa regeneração agrí- cola. A. DE La Rocque. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 53 O ARTIGO «YINHOS« DO SNR. J. DE TORRES Em uma das minhas «Revistas agrico- las» publicadas no «Commercio do Porto», transcrevi da «Revista Agrícola do «Im- perial Instituto Fluminense do Agricul- tura» uma noticia, em que este periódico dá uma ideia do grande desenvolvimento que vae tomando na America do Norte a cultura da vinha e o fabrico dos vinhos. Esta noticia cita algumas fortunas colos- saes feitas com aquella cultura em poucos annos por alguns vinhateiros americanos, entre outras a de 7:000 contos de reis arranjada pelo snr. Longworth de Cinci- natti, no espaço de lõ annos. Por ultimo, a noticia, a que alludo, calcula o produ- eto das uvas o vinhos produzidos em 1870 nos Estados Unidos em mais de 1:000 mi- lhões de dollars, somma equivalente a quasi metade da divida publica d'aquelle paiz. Acreditei, e acredito ainda na ve- racidade d'esta noticia, porque o periódico que a deu me merece toda a confiança, e porque, apesar da enormidade d'estas som- mas, não ha nada mais possível e reali- savel. E uma questão de grande propriedade e de grande plantação de vinha, e todos sabem antes da «Revista Agrícola Flu- minense» o noticiar, que são immensos os terrenos virgens da America mettídos de vinha n'estes últimos annos, e que grande numero de proprietários contam os seus domínios allí por centenas e por milhares de hectares. O snr. J. de Torres, da Régua, em um artigo intitulado «Vinhos» publicado no n.° 12 de 1873 d'este jornal, tracta de fa- bulosa esta noticia, attríbuíndo-a ao en- thusiasmo americano, e a sua crente trans- cripção, á minha hoa fé. Ora se o snr. J. Torres demonstrasse, que a noticia era simplesmente falsa, com documentos irrecusáveis, eu nada tinha a dizer. A minha boa fé tinha sido surpre- hendida, como a de muitos outros. Tira- ria lição para o futuro, d'este engano. Mas o snr. J. de Torres pretende in- validar aquella noticia por meras aprecia- ções, e como estas apreciações são, umas d'ellas vagas e gratuitas e outras redon- damente falsas, assiste-me o direito de zelar a minha boa fé, em quanto se não provar que a noticia da «Revista Agrícola Fluminense» é inteiramente mentirosa. Estabelece o snr. J. de Torres uma hy- pothese (absurda me parece ella) em que uma extensa plantação de vinhos dá logo no primeiro anno 5 pipas de vinho, e do- brando a producção de anno para anno até ao 10.", produz do 10.° anno até ao lõ.° e em cada anno o que produziu no 10.° anno, o que faz de producção final 29:110 pipas ! E como esta producção está longe de render e até de valer 7:000 con- tos de reis, conclue que esta decantada fortuna é uma peta ! Em vez d'esta hypothese, que a final não se comprehende o que é, imagine o snr. J. de Torres a seguinte, mais pra- tica e racional. Uma plantação de 10:000 hectares de vinha. Produzindo annualmente desde o õ.° anno até ao 15.°, 6 pipas de 500 litros por hectare ou em 10 annos 600:000 pi- pas. Taxe-se o preço de venda do vinho em 30í$>000 reis a pipa. O valor total da producção será de 18:000 contos de reis no fim de 15 an- nos. Tire-se para despezas de fundação e juros do capital nos primeiros 5 annos a quarta parte d'aquelle producto illiquido, ou 4:500 contos. Deduza-se do restante 45 p. c. para as despezas de grangeio e de fabrico, fi- cará um lucro liquido de 7:425 contos de reis. Aonde está aqui a impossibilidade de facto, para se dar a noticia d'elle como fabulosa ? O snr. J. de Torres, poderá responder- me que tudo isto é assim. Mas que o snr. Longworth de Cincinatti é um mytho e não uma realidade. É então que fará o favor de provar com dados certos, e não com appreciações. É uma questão de probidade que tei'á a deslindar com a redacção da «Revista Agrícola Fluminense.» Eu não defendo a eftectívídade do facto, sustento a sua pos- 54 JORNAL DE IIORTICCLTURA rRATICA sibiliclacle, e zelo portanto a minha boa fé, que ficaria por ahi com outro nome menos agradável, se deixasse correr á re- velia as apreciações pouco estudadas do snr. J. do Torres. Tambom o snr. José de Torres duvida que os Estados Unidos produzam 5 mi- lhões de pipas de vinho, oppondo como única razào da sua duvida, que esta quan- tidade do vinho talvez a Europa a não produza. xsào sendo o argumento directo tirado das cstatisticas como lhe cumpria apresen- tal-o, mas puramente comparativo, dir- Ihe-hci que está em completo erro. Eu não sei qual é hoje a producção do vinho norte-americano, mas o que sei de fonte certa, é que a Europa produz muito mais que aquella miséria. Basta que saiba, que só a França produz an- nualmente de 45.000:000 a 50.000:000 de hectolitros de vinho ; isto é : 9 a 10 milhões de pipas de 500 litros. Desculpe- me o snr. J. de Torres. Tenho toda a def- ferencia pelas suas opiniões. Respeito a sua intelligencia e conhecimentos. Esta- mos até de accordo no fundo principal da questão, em que aquella noticia me serviu de tópico, mas eu tinha a accudir antes de tudo á boa fé dos meus traslados, con- tra uns modos de ver erróneos, que ten- diam a exauctoral-a muito carinhosamente. Lisboa. J. I. Ferreira Lapa. ESCOLHA DE ALGUNS MESEMBRIANTHEMUMS PARA BORDADURAS OU PEQENOS GRUPOS Em poucas familias foi a natureza tão pródiga cm formas diversas e exquisitas, de colorido brilhante o vivo como n'esta. É notável o brilho de algumas espécies e o esplendido efieito que produzem n'um jardim á hora do meio dia, momento em que geralmente costumam patentear os seus thesouros. Esta família é muito abundante em es- pécies e variedades, e bastará citar em abono do que deixamos dito o principe de Salm Dik, enthusiasta e intelligentc amador de plantas gordas, que cita para cima de Cõsecç es, todas bera justificada- mente divididas. De Candolle, no seu Pro- dromiis, escreve 31G espécies divididas em G4 secções. Deixando a familia, citemos algumas espécies do género Mtsemlrian- thonuni tomadas ao acaso : 1.* — Mcí^onhrianthonum densum. Fo- lhas semi-cilindricas, cobertas do pellos hispidos. Grandes flores vermelhas. Curio- sa o interessante planta, alguma cousa rara os jardins. 2." — M. spextahilc. Pertence á secção dos Graciosos, é admirável pelas suas bcl- las flores grandes do cOr de rosa viva e do cheiro suavissimo. 3.° — M. Maxinmm. Da secção dos Fal- cados, a que esta espécie pertence, é o mais bcllo; folhas glaucas em forma do cres- cente. 4.° — M. spinosum. Espinhos converti- dos em ramos; forma original e única. 5.° — M. acinaciforme. A secção a que este Mesenhrianthemum pertence está bera difinida no nome especifico do que descre- vemos; são muito notáveis todas as espé- cies, mas esta, de flores enormes, magni- ficas, é surprehcndente. 6.° — 31. sarmentosum. Pequenas mi- niaturas de rosas encantadoras, brilhan- tes. 7." — M. minidum. Secção dos Sphe- roides. Pequenas espheras do tamanho de uma ervilha, produzindo cada qual uma enorme flor rosada. 8."^ — 31. erminunij, tigrinum, mustelli- niim, ete. Secção dos Êiginos? Que ex- centricidade de formas, que brilho de flo- res, que aromas ! Esta secção reuno talvez as mais esplendidas espécies do género. Deixamos descriptas oito espécies, mas quantas não merecem ainda serem recom- mendadas, se não receiassemos estender indefinidamente a lista V A. J. DE Oliveira e Silva. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 55 CHRONICA HORTICOLO-ÁGRICOLA A província de Traz-os-Montes era em tempos passados g-rande productora do azeite, mas, quando appareceu a moléstia, muitos proprietários fizeram substituir as Oliveiras pela vinha. Veio, todavia, pouco depois o oidium^ e isto fez com que os lavradores se voltassem de novo para os olivedos, alguns dos quaes, felizmente, ti- nham escapado á mão destruidora do ho- mem. Hoje a producção de azeite em todo o paiz, mesmo em annos abundantissimos, é muito mais reduzida, havendo para isso dous motivos poderosos: Primeiro o estar a maior parte dos olivaes velhos e decré- pitos e em segundo logar não se haver feito plantações em escala sufíiciente que reparassem o erro dos nossos antepassa- dos, homens pouco investigadores da na- tureza e pouco familiarisados com a scien- cia. Faça-se uma viagem até Traz-os-Mon- tes ou percorra-se a via férrea que liga o Porto á metrópole e ver-se-hão extensís- simos olivedos em que não ha indicios nem de tractamento das arvores existen- tes nem tam pouco rastos de se haverem feito recentes plantações. São todas ai'vo- res seculares, cobertas de musgo e outros parasitas que as definham de dia para dia até que chegue um dado momento em que a producção do azeite será riscada da lista das nossas culturas. E coratudo a multiplicação da Oliveira é fácil, não é dispendiosa ; a planta fructifica em pouco tempo e a cultura é das mais indemnisa- doras porquanto não requer cuidados dis- pendiosos. Em proveito, pois, da prosperidade do paiz que não é mais do que o bera estar de cada um em particular, levantemos brado em favor das Oliveiras. Bosc, occupando-se da sua multiplica- ção, dizia ha mais de meio século o que se vae ler e que poderá aproveitar a mui- tos : «A Oliveira gosa da vantagem de se poder multiplicar por todos os meios pos- síveis. O melhor, porém, é aquelle de que se faz menos uso — isto é, a sementeira. Já se pensou que as sementes não ger- minavam, mas esta risivel opinião é des- mentida a cada passo pela experiência. Nos legares onde se cultivam as Oliveiras^ os pássaros consomem os fructos e vão deixar os caroços nos campos e estes ca- roços produzem numerosas Oliveiras bra- vas. O facto é que todo o caroço de uma azeitona perfeitamente madura, lançado á terra logo depois da colheita, produzirá (embora ás vezes succeda o contrario, co- mo com todas as outras sementes, das quaes muitas não germinam), no primeiro ou segundo anno, uma Oliveira^ que não pro- duzirá fructo antes de doze ou quinze an- nos, emquanto que as que forem prove- nientes de rebentões, mergulhias, estacas, etc, produzirão no sexto ou mesmo no quinto anno. Além d'isso ousarei dizer que este mesmo pé será talvez uma va- riedade distincta, quer superior ou infe- rior áquella d'onde sahiu. Não se multiplicam, portanto, as Oli- veiras por semente, porque é preciso es- perar muito tempo por ellas e a sua na- tureza ser incerta. Unicamente por isto. Comtudo, está provado por milhares de observações que as arvores que são pro- venientes de sementes são melhores que as reproduzidas por outros modos, ou em outros termos, que as arvores degeneram ao menos quanto á sua força vegetativa, quando não se levam de tempos a tempos á sua essência natural por meio da fecun- dação. Comquanto na Provença não se semeiem azeitonas para se obterem reproducções, sabe-se, comtudo, quando se quer formar um olival, ir procurar nos campos aquel- las que nasceram espontaneamente.» O celebre agricultor da era actual, P. Joigncaux, reconhece que a sementeira é o único meio de reproducção irreprehen- sivel, o único que restabelece as raças degeneradas, e cria novas variedades. Talvez que, usando-se d'esto meio de multiplicação, as Oliveiras fossem menos sensíveis aos rigores do clima, o menos sujeitas ás doenças o aos ataques dos in- sectos. Para se realisar isto era mister que o 56 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA governo se oceupassc d'este assumpto e mandasse estabelecer viveiros em diver- sos pontos do paiz, porque da iniciativa particular nunca se pode esperar que este meio de multiplicação se venha a reali- sar cm razào dos muitos annos que de- manda. Como a matéria oleosa que impregna 08 caroços de azeitona se oppue ao accesso da humidade do solo até á amêndoa, o que attraza muito a germinação, dever- se-ha maceral-os durante dous ou três dias em uma lixivia extremamente alcalina; d'cste modo ficarão aptos para se semea- rem. Mr. de Gasparin obteve o mesmo re- sultado em 1822 tirando a amêndoa do seu invólucro lenhoso. Quando as amêndoas estão fora do ca- roço, embcbem-se n'uma massa liquida composta de excremento de vacca e de torra argillosa, ficando como uma «imendoa coberta. Semeiam-se em linhas distante umas das outras O'", 25 e as sementes collocam- sc a 0'",03. A reproducção da Oliveira por meio de estacas é a mais fácil possivel. Os ra- mos, sejam pequenos, sejam grandes, pe- gam com a mesma facilidade; todavia as melhores reproducções são as que se fa- zem com os ramos de dous ou três annos e a que chamamos ladrões. Fazem- se de 0"',30 ou de 0'^35, ha- vendo a precaução de lhes cortar os ra- músculos, e plantam-se com distancia de 1 metro e na profundidade de O"', 15 a U'",20, segundo os terrenos. Nos terrenos seccos a 0"\20 e nos hú- midos a O"', 15. Esta operação deve fazer-se no fim do inverno. (Quinze ou vinte annos depois da sua formação comiílcta, as arvores, que são submettidas a uma poda annual e regu- lar, tomara-se menos productivas e é pre- ciso portanto renoval-as. Para se obter essa renovação é mister cortar aproxima- damente um terço do eomj)rimcnto dos ramos princípaes o assim a seiva, concen- trando-sc n'um espaço mais pequeno, faz desenvolver novos ramos do fructo. N'essc anno estrumam-so as Oliveiras mais abundantemente que do costumo. Haverá cuidado em supprimir os ladrões, que nascem nos pés das arvores e mesmo nos ramos principaes. Por occasião da poda seguinte, cortar- se-ha grande numero de ramos de fructo, que, debaixo da influencia da operação precedente, se multiplicaram demasiada- mente. Depois do renovadas assim por varias vezes, as Oliveiras acabam por ser ata- cadas pela carie. Esta doença alcança o coração da planta, que se vem a tornar completamente oca e a producção quasi fica reduzida a zero. Em logar, porém, de se arrancar o tronco velho para se fazer nova planta- ção, será preferivel substituil-o por uma haste nova dos rebentos que se deixarão desenvolver no collo da raiz. Alguns annos antes das Oliveiras te- rem chegado ao ultimo estado de decre- pitude, reservam-se no pé e o mais perto possivel do solo três ou quatro rebentões. No anno seguinte, só se deixará ficar o que se mostrar mais vigoroso e que esti- ver mais perto da terra e logo que tenha attingido uma altura conveniente, impe- de-se-lhe o crescimento e procede-se á for- mação do caule e da cabeça, até que o velho tronco, estando quasi infructifcro, seja supprimido. Muitos dos nossos agricultores teem o preconceito de que as Oliveiras não dão fructo na mesma quantidade dous annos a seguir. Com effeito ellcs fundam-se na experiência, mas não investigam o moti- vo e não se lembram que o castigo que lhes dão por occasião da colheita é a cau- sa de não fructificarem consecutivamente. Os botões floraes, que já se estavam pre- parando para a fructicação do anno se- guinte, são arremessados ao chão com o Ímpeto das barbaras pancadas dadas nos ramos para que larguem as suas drupas. N'uma Memoria sobro as Oliveiras, publicada ha mais de um século pelo dr. João António Dalla-Bella e hoje bastan- te rara;, já o seu auctor fazia menção da utilidade que havia em podar as Olivei- ras regularmente para fructificarem to- dos os annos e depois accrescentava : «E um erro antigo o crer, em que aquelle anno, cm que a Oliveira não se carrega de azeitona, seja o seu anno do descanço. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 57 Isto c mais depressa um signal da fra- queza, a que se reduz a Oliveira^ quan- do se deixa passar o anno sem podal-a. » Ora o erro persiste. As nossas Olivei- ras raras vezes soífrem a poda, mas não deixam de soíírer o varejo. Deixam cres- cer as arvores ao Deus dará, e por isso attingem uma altura desproporcionada, de modo que a colheita não se pode rea- lisar á mão. Desejáramos ver as planta- ções educadas (permittam-nos a phrase) de modo que não tomassem altura a que a mão não chegasse e assim formar-se- liiam arbustosinhos tufosos e mais produ- ctivos do que essas arvores disformes, a que na provincia de Traz-os-Montes dão o nome de candieirões e que pouco ou nada produzem relativamente ao que po- deriam dar. Desejáramos que os nossos agricultores visitassem as propriedades dos snrs. conde de Sobral e visconde de Carnide, pois, teriam uma propicia occasiao para ver a maneira racional como aquelles dous ca- valheiros tractam as Oliveiras. As suas propriedades são nas proximidades de Lis- boa e tornam-se dignas de ser visitadas, porque tanto n'uma como n'outra preside a boa intelligencia e a sã applicação dos principies agrícolas. AUi não ha rotina, ha a experiência bem feita e a prova de que o progresso tão evidente nas outras artes não é uma utopia na mais antiga e pres- timosa de todas — a agricultura. — Está exposta n'uma das salas da Real Associação Central de Agricultura Portu- gueza uma machina destinada ao aqueci- mento dos^ vinhos pelo systema de Mr. Pasteur. E o primeiro apparelho d'este género que nos consta ter apparecido em Portugal, 6 deve-se esta introducção ao snr. António Batalha Reis. Este apparelho foi premiado nas expo- sições de Lyon em 1872 e Vienna em 1873, com medalhas d'ouro. A sua invenção pertence a Mr. Ferrei des Chénes, e é considerado pelo próprio Mr. Pasteur como o mais perfeito que até agora se tem construido. — Uma companhia organisada em Pon- ta Delgada para se entregar á cultura dos Ananazesj empregou um capital de reis 1õO:OOOí:$iOOO, pouco mais ou menos, na compra de estufas. — De uma carta que tomos presente, rubricada pelo nosso amigo, o snr. Diogo de Macedo, da Régua, extrahimos alguns curiosos paragraphos em que se tracta da questão Phylloxera. Eil-os : Haverá um anno que o Phylloxera se tornou objecto das mais vivas preocciípuvt^^ e todos os viticultores se preparavam para o combater a todo o trance ; mas agora felizmente pouco se falia já em tão devastadora moléstia. Não tem progredido. Posto que o estado das vi- nhas não pareça em demasia lisongeiro, por em- qnanto o Phylloxera não nos causa proporcional- mente os e3tiM;;()s (jUe vai produzindo na França. Apresentaremos um calculo mais ou menos se- guro. O rendimento médio e annual da vinha eleva-se nos departamentos da França a 1:500 milhões, re- presentando um capital de 20:000 milhões de fran- cos. Aproducçâo agricola élouvada em 9:000 milhões segundo uns e em 11:000 milhões segundo outros. Consoante os cálculos feitos no"Messager agricole' ' por Ernest Borde de Tempest, admittamos dez : é poiè sensivelmente uma sétima parte da producção agricola o rendimento médio e annual da vinha. Sabe- se também que o Phylloxera destroe alli a decima sexta parte dos térrea;).; ^•in!colas : por isso não será exaggero calcularmos os prejuízos em ci- fra não inferior á quantia annual de 950:000 fran- cos. Favorecerá o Phylloxera estas graves propor- ções nos terrenos A-.nicola:^ de Portugal ? Calculemos que cada hectare possa entre nós, pelo menos, produzir 4 pipas de vinho : aos dous districtos de Villa Real e Bragança daremos 45:000 hectares de vinha. O valor aproximado de cada hectare não é infe- rior a 800:000 reis : logo o valor total dos vinhe- dos transmontanos será, termo médio, de 36:000 contos. D'esta stiperficie de vinha ainda não está sujeita ás devastações da nova moléstia a quadragésima quinta parte. Calculemos, em harmonia com as nossas observações e os dados obtidos até hoje, invadida uma suiDerficie de 900 hectares no valor de 720 contos : quando muito resulta, dando-se de rendimento 5 por cento ao capital empregado, um desfalque de 36 contos na producção annual. Observando porém, que o Phylloxera apenas te- rá destruído a sexta parte ou isonco mais da pro- ducção nos terrenos atacados, depressa se chega á conclusão de que os estragos annuaes nos dous districtos de Villa Real e Bragança não excedem á quantia de 6 a 10 contos de reis. Estes dados nao parecem plenamente lisongei- ros ; mas servem para se fazer um calculo, senão exacto, pelo menos aproximado de que as circums- tanc^as mórbidas dos nossos vinhedos estão longe de causar desesperos e terrores. — Temos a annunciar a recepção de dous catálogos : um da casa Dick Radclyf- fe & C.° de Londres, e outro da casa de Vilmorin de Pariz. E' bem conhecida a casa dos snrs. Dick Radclyífe para que a recommendemos aos amadores de horticultura. Este catalogo, que é o primeiro d'este anno, vem re- 58 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA pleto do desenhos de instrumentos e ap- parelhos para todos os misteres da arte hortícola. A collecçíío de vasos, caixas, aquariuras e jardimsinhos para jancllas é do mais apurado gosto, e oíferece certa novidade, quo não encontramos em outros desenhos do mesmo género apresentados por outras casas. Os nossos leitores que desejarem algumas d'estas cousas, podem dirigir-se áquellcs snrs. na certeza de que difficilmente encontrarão outra casa que tanta variedade lhes oíFereça em gosto e preço. Os snrs. Vilmorin publicaram também o seu catalogo de sementes que é o mais completo que se publica em França. Quem desconhece os importantes trabalhos sobre plantas annuaes publicados pela casa Vil- morin ? Com o catalogo geral do sementes vem uma lista de novidades. D'entre ellas des- tacam-se algumas variedades de Tomates, uma esplendida coUccção de Cocurbita- ceas e algumas Batatas. De plantas annuaes apparecem tam- bém algumas variedades que deixamos de ennumerar por falta de espaço, recom- mendando a acquisiç">o do catalogo aos nossos leitores. — Deve-se recordar o leitor da estam- pa que sahiu no vol. I, d'este jornal, da A(jave Verschaffelt. Cultivada então em vaso, estava longe de se poder apreciar o seu justo valor. Decorreram quatro annos e hoje ve- mol-a com grande desenvolvimento e como que em toda a sua belleza. Mr. Charles Lemaire, que lho dava 25 centi metros de altura e um diâmetro fo- liar de 30 centimetros, surprehender-se-hia do ver um exemplar que está plantado no chão, no horto do snr. Marques Lou- reiro, o cujo diâmetro foliar ó do G5 cen- timetros ! Maravilhou-nos esta planta, que no es- trangeiro tão apreciada é. — Para curar as feridas das arvores in- dica o snr. Oliveira e Silva um unguen- to, quo é auctorisado pela experiência do longos annos, produzindo sempre cxcol- lontes resultados. Compõe-80 unicamente de carvão re- duzido a pó muito fino e misturado com alcatrão. Applica-sc n'uma pequena ca- mada ; cobrindo esta depois, com terra bem secca. Esto unguento não somente protege per- feitamente a ferida, mas até a garante contra a podi-idão, por causa da creosota que existe no alcatrão, e que, como é sa- bido, é um antiseptico poderoso. — A carta quo em seguida publicamos é do nosso collaborador, de Murça, o snr. Basilio Sampaio. E datada de 9 de fevereiro. Tem sido grande a plantação de baccllo feita n'este inverno por estes sities, e na margem do Douro. O preço dos vinhos convida os proprietários a desenvolver a plantação, e as novas estradas aber- tas, e o caminho de ferro do Porto ao Pinhão, de- vem também, activando o commercio, animar a producção. Parece-nos que a vinha em Portugal tem deante de si ura brilhante futuro. A seccura do inverno tem sido muito prejudicial aos prados, que não vicejam, e aos gados que não tem onde pascer. Os campos estão apresentando um triste aspe- cto ; a falta de humidade estorva-lhes a germina- ção da semente, e o desenvolvimento do gramíneo mais crescido. As a,rvores{Coniferas) não indicam signal algum da proximidade da primavera. Foi pequena a safara da azeitona; e onde não houve grande escassez, produziu a azeitona muito pouco azeite. O horisoute agrícola annuvia-se, continuando este tempo secco ; porque ha grande necessidade de agua, mas Deus super omnia. Está concluída a sementeira das batatas e doa grãos de bico. Perderam-se quasi todos as linhos mouriscos, trevos, e nabaes, e os que téem resistido á acção do tempo, são mofinos. Os serviços estão muito adiantados ; porque a seccura do tempo não tem dado feriados aos agri- cultores. O Douro leva muito pouca agua ; o que estorva muito a navegação ; e é talvez esta a causa do pre- ço da aguardente não ter siibido. O alto d'esta província está quasi esgotado de vinho, bom como muitas outras povoações d'esta3 circumvisinhanças. Os vinhos brancos são em pequena quantidade nas adegas dos lavradores da terra quente que ó a zona territorial d'esta província, onde so pro- duzem os famigerados pinhos brancos do paiz. Ha, porém, pouca procura d'estes vinhos, pela actual dirticuldade de conducção para o Porto, pelo Douro, quo tom sido o vehiculo da civilisaçào e do commercio d'esta província e da Beira Alta, estar pouco navegável. O centeio está a 500 reis o alqueire, o trigo 650 reis, o feijão fradinho a 600, e o branco a 700, o azeito a 4:800 o almude, e o vinho a 20:000 reis a pipa. O thermomotro tem marcado hoje 11 graus cen- tígrados, á sombra, o desde as 10 ató ás 2 horas da tardo. — «La Culturo Economique» ó o titulo de um volumesinho do 350 paginas apro- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 59 ximadamente, escripto por Mr. Ed. Vian- ne, redactor do «Journal d'Agricultur6 Progressive», e ornado com 204 gravuras que illustram o texto. Este livro é o verdadeiro livro do agri- cultor: nenhum homem do campo deveria deixar de o possuir. Escripto sem preten- ções scientificas, está á altura das mais modestas intelligencias. O emprego das charruas, rolos, extirpa- dores, e o de muitos outros instrumentos agrícolas indispensáveis na grande cultura, mereceram particularmente a attenção do auctor, que não se esqueceu todavia de dar noticia desenvolvida dos diversos pro- cessos de fabricar manteiga, cidra, etc, apresentando grande numero de conside- rações sobre todos os ramos da agricultura. Esta obra editorada por Mr. J. Roth- schild, de Pariz, já passou pela segunda edição, circiimstancia que bastaria para a tornar recommendavel. Agradecemos o exemplar com que nos mimosearam. — O dr. Schomburgk, no seu relatório do Jardim Botânico de Adelaide, reputa a manufactura das essências como uma das mais importantes. Só a índia ingleza e a Europa conso- mem annualmente cerca de 150:000 ga- lons de essência para lenço. A renda para o thesouro das essências importadas para a Inglaterra, é calculada na somma fabulo- sa de 225.000:000 reis por anno. Por esta cifra poder-se-ha ajuizar da quantidade de flores que se empregam, muitas das quaes desabrocham perfeitamente entre nós taes como : Jasmim, Verbena, Rosa, Acá- cia Farnesiana, Heliotrojpium, Violeta, La- ranjeira e muitas outras. Para demonstrar a vantagem que ha- veria na manufactura de essências no nos- so paiz basta a eloquência dos algarismos que se vão lêr. Cada hectare de terreno com Jasmim produz annualmente 1.250:000 reis; com Roseiras 3.375:000 reis; com Laranjeiras 225:000 reis ; Violetas 720:000 reis ; Acá- cia Farnesiana 405:000 reis e Pelar go- nium odoratissimum 900:000 reis. — Recebemos e agradecemos o «Index Seminarii Horti Botanici Academici Co- nimbricensis, 1874» — Mutuae commuta- tioni oblatus. — O snr. Joaquim António da Silva Martins, da Certa, escrevia-nos em data de 5 de dezembro as linhas que em se- guida inserimos a propósito das Dahlias imperialis e arboo-ea: Ha já 10 dias que fico maravilhado, quando, da janella do quarto onde durmo, aos primeiros raios do astro brilhante, contemplo tão encantador ar- busto ! Tão lindo, tão bello, e tã.o admirável no corrente raez de dezembro ! Admiro como humilde caraponez d'estes montes ; e ainda espero receber maior admiração com a florescência das duas Duh- lias arbóreas, que já me deixam ver alguns peque, nos botões, apesar da geada que por aqui cahe e continua a cahir. Será possível que n'este nosso cantinho luzita- no exista ainda jardim, quinta, quintal ou horta, que não tenha a Dahlia imperialis, tão cheia ou repleta de flores no frio mez de dezembro ? Julgo que não será possível tal desleixo ! E se assim é, infelizes terrenos são estes nossos! Eu pela minha parte não tenho senão que contem- plar e admirar a Dahlia imperialis, tão florida e tão encantadora ! Por mais de uma vez recommendamos, n'este jornal, as duas Dahlias a que allu- de o snr. Silva Martins. Um dos princi- paes predicados que téem estas plantas é florescerem n'uma epocha em que as flo- res são escassas e resistirem bera aos frios do nosso paiz. A D. imjjerialis começa a florescer em outubro e termina em dezem- bro ou janeiro e a D. arbórea começa a dar flores em dezembro e prolonga-se até fins de janeiro ou meiado de fevereiro. Devemos recordar que o estabelecimen- to horticola do snr. Marques Loureiro tem numerosas reproducções d'estas plantas, que poderão ser pedidas em qualquer epo- cha do anno. — Um cultivador de fructas de New- York apresentou, na primavera passada, um processo que emprega para a sua ex- portação para a Europa e que as conser- va muito bem. Mr. Emile Rodigas diz que o systema de que usa o tal horticultor consiste em limpar bem a fructa da humidade e dis- pol-a depois ás camadas sobre gesso pul- verisado. Os intervallos deverão também ser cheios com o gesso de modo que os fructos não estejam em contacto directo uns com os outros. — A celebre publicação belga, que já conta vinte annos de existência, a «Illus- tration Horticole», foi premiada com a medalha de mérito na Exposição Univer- sal de Vienna. E' uma distincção bem cabida. m JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA — A cortiça tem subido consideravel- mente do preço em consequência da muita procura que tem tido para Inglaterra. — Devemos uma explicação aos nossos collegas do «Arcliivo llural». Já estava parte d'este numero impresso quando recebemos o fasciculo correspon- dente ao mez de fevereiro do «Archivo Rural» e n'elle deparamos com um artigo sobro a cultura do Armolle devido á pen- na do snr. V. de M. Coutinho Ahneida d'Eça. Este cavalheiro havia-nos endereçado também esto artigo e portanto não deve- mos callar esta circumstancia. Apontamol-a, pois, para que os nossos illustrados collogas, ignorando este facto, não se persuadissem que faziamos uma transcripção sem indicar a sua procedên- cia como nos cumpria. — O nosso amigo, o snr. commondador José Joaquim Pereira Lima, está proce- dendo a uma plantação de cerca de três mil pés de Eucalyjytus, n'uma proprie- dade que possue ás portas da cidade. Congratulamo-nos por ver que os nos- sos desejos, de ver o Êucalyptus com pro- fusão no paiz, se vão realisando e felicita- mos ao mesmo tempo o snr. Pereira Lima, que d'aqui a pouco tempo terá parte dos terrenos escalvados da sua propriedade transforaiados em espessa e productiva matta. — Eis as dimensSes dos parques de Lon- dres : St. James's Park, IIG hectares; Green Park, 120 hectares; Hyde Park, 772 hectares; Kensington Gardons, 490 hectares; Kegent's Park, 812 hectares; Victoria Park, 44G hectares; Southwark Park, 126 hectares ; Kennington Park, 38 hectares; Battersea Park, 398 hecta- res; Greenwich Pa k, 380 hectares. Estes dez parques teem 3:G98 hectares o acham-se dentro dos limites da divisão designada por «Londres», mas além d'es- tes ainda ha os seguintes que também fazem parte d'aquelle districto : Richmond Park, 4:U3<) hu tares; Kew Gardons, (544 hectares; Old Deer Park, 714; Bushey Park, l:98f3 hectares; líampton Court Park, 1:152 hectares ou 8:r)2(5 hectares que juntos aos que estão dentro dos limi- tes da grande cidade, produzem nada me- nos (pio a somma do 12:224 hectares! — N'uma memoria lida ao Instituto of Actuaries of Great Britain apresentou-se uma estatistica da mortalidade segundo as diversas occupações que exerce o ho- mem. De 2Õ a 60 annos morrem : jardi- neiros 10.4 por mil ; negociantes de cer- veja 21.5 ; negociantes do vinhos e bebi- das espirituosas 24; creados de hospeda- ria 27. E entre as edades de 45 e 65 morrem 32.2 por mil de creados de hos- pedarias e 14.5 de jardineiros. — Segundo diz o «Garden», o professor Shaler acaba de propor um meio para me- lhorar a navegação do rio Ohio, que é um dos mais importantes dos Estados-Unidos. Este projecto não deixa de ser interes- sante e evitará os enormes | rejuizos cau- sados pelas cheias nas propriedades con- tiguas ás margens d'aquellc rio. Pensa Mr. Shaler que, revestindo-se as margens do Salgueiros^ se obterá o re- sidtado desejado. Baseia-se a sua ideia n'este facto e vem a ser que onde exis- tem plantações d'estas arvores, a terra ííxa-se e as raizes accumulam aquella que por ventura venha na corrente. D 'aqui resulta que, crescendo as mar- gens, profunda-se mais o leito o assim o rio se torna de mais fácil navegação. — A quantidade de plantas adequadas para bordaduras é innumeravel, sendo que umas convéem para os conteiros, outras pa a os massiços de flores, outras emfim para os massiços do arbustos. O «Gardener's Chronicle» rejeita in li- mine todas as plantas de flor, por causa da sua irregularidade e do pouco que dura a florescência, e em seu logar recommen- da algumas Gramineas, taes como a Fes- tuca ovina, que resiste ás maiores seccas e que por isso nos deve convir. Por outro lado, Mr. Bouché, do Insti- tuto Hortícola de Berlim, dá preferencia á Festiica hettrophyUa, que se agrada dos legares sombrios e que, pela sua natui'eza, é a mais própria para as bordaduras onde haja falta d'ar e do sol. N()s aconselhamos que se variem as bor- daduras quanto possível e que não se ex- cluam as plantas de flores por causa das Gravxineas. As plantas vivazes, de flores, prestam - se muito a esto fim. Oliveira Júnior. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 61 MACi CAMOEZA DE COURA Ha entre nós geralmente ura precon- ceito contra as Macieiras extrangeiras. A muitos amadores, aliás pessoas intelligon- teS; tenho ouvido dizer que nào prestam, mas não reparam que muitas d' essas Ma- cieiras, que cultivam proveitosamente, são talvez de fora do paiz. Perdeu-se a tra- dição da sua origem e os primeiras que as importaram ou os seus descendentes trocaram-lhes os nomes, robaptisando-as a seu modo. É de crer que este facto se desse com uma maçã vulgarmente denominada Ca- moeza de Coiiraj, mas quer seja extrangei- ra, quer tenha legítimos foros de naciona- lidade, o que é fora de toda a duvida é que merece e deve ser cultivada em gran- de escala, porque é fructo delicioso. Seja-me permittido contar a maneira como a conheci e sirvam estas linhas de ligeiro apontamento para a historia da Camoeza de Coura. Y\^. 15 — Maçã Camoeza de Coura Era janeiro de 1873, enviou-me o re- verendo cónego Peixoto dous pomos da Camoeza de Coura, que logo pela sua ap- parencia denunciavam a bondade de que mais tarde deram excellente prova. Em fevereiro vi que ura d'elles principiava a apodrecer e dei-rae pressa era o partir. Fiquei realmente surprehendido ao sabo- real-o. Era magnifico. Escrevi logo áquelle cavalheiro, rogan- do-lhe o obsequio de me dar algumas in- formações acerca da procedência d'aquelle fructo. Para que não podesse haver equi- voco, enviei-lhe a metade do que havia partido. Respondeu-me immediatamente, dizon- Vol. V— 1874, do-me que recebera aquellas maçãs d'um parente que o presenteara e que d'elle es- perava saber o que me interessava. Effe- ctivamente a resposta não se demorou e por ella vim a saber que o fructo que tanto me deliciou era conhecido na loca- lidade pelo nome de Camoeza de Coura, sendo oriundo da quinta de Barreiros, fre- guezia de Canelhão, Ponte do Lima. Esta propriedade pertence ao dr. Gaspar Ma- lheiro Pereira Peixoto. Ha 50 annos que a Camoeza de Coura é conhecida por este nome n' aquellas im- mediaçõcs e até a dizem alli nascida. E difficil, como se vê, prescrutar a sua ge- nealogia. Jí." 4^ Abril, 62 JORNAL t'E HORTICULTURA PRATICA Tractei de obter garfos, alcançando as- sim para o meu estabelecimento uma nova arvoro de tructo, que considerei como uma preciosidade, tanto pelo aruma e linura da polpa, como pela sua duração. Em lins d'abril veio ao meu estabele- cimento o reverendo cónego Peixoto e me trouxe ainda um Iructo, perfeitamente conservado, o qual serviu para o desenho representado na^gravura. Os fructos são de bonita apparencia, cor amarollada, com um toque de rosa do lado exposto ao sol. A forma é arredon- dada e um pouco achatada. Amadurece de novembro a maio. Sabor doce. A Ca- vioeza de Coura reúne finalmente os pre- dicados que constituem um pomo do pri- meira ordem. José IMarques Loureiro. NYMPHÀEi ALBA As NymphaeaSj ou Nenuphar dos ára- bes, é ura género do plantas da Polyandria Monogynia de Linneu, classificadas por alguns auctores na familia natural das Eanunculaceas, e por outros na das Ht/- drocharides. Foi no meado do século ul- timo, que Linneu nos citou apenas quatro espécies do género "que estabeleceu sob o nome de Xymphaeas, duas do nosso clima, 6 duas dos paizes quentes. O género citado por Linneu é hoje uma familia que comprehende três géneros, a saber: &^Kym])haea lufea Linneu, o Ne- lumhium em que se colloca a Nymphaea nclumhium Linneu, planta da Judeia, de grandes o lindas flores rosadas, que foi outr'ora commum no Egypto, e onde des- appareceu, cujos grãos, similhantes a avel- lãs, se comem; e a Nymphaea propria- mente_]^dita. As espécies Nymphaea alha^ ou Golfão branco, (Lyrio dos charcos) e Nymphaea lutea ou Golfão amarello, são vulgares no nosso paiz ; nos arrabaldes de Coimbra as temos visto, sendo mais com- mum o Golfão branco. Encontram-se em Condeixa, nas ribeiras, e mesmo nos tan- ques que contúem aguas prezas. Em ]\Iaior- ca também estas plantas vegetam, e são muit ) vulgares; as primeiras que tivemos occasião de ver o observar foi nas valias dos campos^do Mondego. A Nymphaea alba, assim como a lutea, flori scem no verão, técm a raiz da gros- sura de um braço e mais, em forma cy- lindrica, bastante esponjosa, parcnchynia carnoso, esbranquiçado, e compridos })e- dunculos. De perto do vinte espécies que os géneros Nymphaeas comprchendem no actual estado da sciencia, duas crescem no Nilo e foram figuradas pelo snr. De- lile na grande obra do Egypto, a sa- ber : as Nymphaeas cerúlea o lótus. A primeira, pouco mais pequena do que a outra, tem raizes bolbosas, as folhas em forma de coração ; de bordos inteiros, com- pletamente nodulados, e as flores da mais bella cor azul. Tanto uma como outra es- pécie foram ha annos descobertas nas aguas do Senegambia. A segunda é mais celebre : a raiz, similhante á precedente, em quanto á forma, come-se ainda hoje no Cairo; as suas folhas téem as extre- midades denteadas, ou antes crenuladas; as flores são vastas e brancas, similhantes quasi ás da espécie vulgar. O fructo, que lhe suecede, similha-se a uma grossa capsula de Papoula, e contém uma multidão de grãos, que os antigos re- duziam a farinha para formar uma espécie de pão, hoje desusado. Fizeram desappa- recer estes grosseiros alimentos, os cereaes que os substituiram. Em 1828, o snr. Al- cides de Orbigny descobriu e colheu, no logar de Corrientes, no meio dos numero- sos canaes da provincia de Moxos, na re- publica de Bolivia, flores, folhas e fructos d'uma planta, que é, na verdade, um co- losso vegetal, e que se julga pertencer á familia das Nymphaeas. Eis-aqui como este viajante refeie, na sua viajem á America do Sul, a desco- berta de tão admirável planta. «Descendo rapidamente o Guaraná, ahi vi uma plan- ta, que é, sem duvida, uma das mais belhis da America. Esta planta, que pa- rece pertencer á familia das Nymphaeas, mas com dimensões gigantescas, é conhe- nhecida dos guaranis pelo nome de YriL- pé, nome que deve á sua situação habi- tual, e á analogia da forma de suas folhas, com a da cobertura de certas canastras grandes e redondas, fabricadas no paiz JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 63 para guardar os grãos. Figure-se uma ex- tensão de perto de um quarto de légua coberta de folhas redondas da largura de quatro a oito palmos, fluctuando á super- fície d'agua; no meio d'esta vasta plani- cie verde, se vêem brilhar flores de dous palmos de comprimento, umas brancas, outras cor de rosa ou violeta, sempre do- bradas, e exhalando delicioso perfume. Estas flores produzem fructos redondos da grandeza da cabeça de um homem, os quaes, na sua madureza, estão cheios de pequenos grãos farináceos, que fizeram dar a esta planta o nome de Milho d' agua (Mais dei agua) pelos hespanhoes estabe- lecidos no paiz, os quaes, segundo parece, recolhem estes grãos, e os assam para co- mer. Eu não podia fartar-me de admirar este collosso dos vegetaes.» Foi mais tarde que o inglez Schom- burgh encontrou, na Guiana ingleza, uma planta, que foi dedicada á rainha Victo- ria e ficou sendo conhecida pelo nome de Victoria Regina. Se considerarmos quan- to são visinhos os paizes em que estas ad- miráveis plantas foram descobertas pelos viajantes inglez e francez, e o quanto são similhantes os caracteres, que ambos lhes reconhecem, a planta conhecida com o nome de Milho d'agua é provavelmente a mesma que foi dedicada á rainha de In- glaterra, ou uma espécie pouco maior d'aquelle mesmo género. Depois de se ler a descripção d'um ve- getal d'esta ordem, nós, os europeus, não podemos deixar de nos encher de admi- ração e espanto, quando em geral estamos acostumados ao espectáculo da vegetação limitada e mediocre do clima da nossa Eu- ropa. As Nymphaeas são conhecidas desde a mais remota antiguidade; as folhas e as flores acham-se representadas nos monu- mentos do velho Egypto, acompanhando muitas vezes a figura de Isis, mãe crea- dora do Universo. Plinio fallava já das Nymphaeas, e deu-lhes uma origem verda- deiramente mythologica, referindo, no ca- pitulo sétimo do seu livro, que uma nym- pha, deixando-se finar d'amor por Hercu- les, insensível á sua ternura, tornou-se por metamorphose a flor rainha das aguas. O nome lotuB foi dado pelos gregos e romanos a muitos outros vegetaes, o que causou grandes debates synonymicos nos tempos em que as sciencias naturaes não eram estudadas segundo a natureza, mas commentando os livros quasi inintelligi- veis dos antigos. Um dos fructos chamados lótus por Ho- mero, que o confundiu cora o Nelumhiuni e com o verdadeiro lótus, provinha d'uma pequena arvore da farailia dos Nerpruns ou RhamnuSj que não tem menos valor do que os Abrunhos de nossos pomares. Era necessário que os companheiros de Uiys- ses fizessem má refeição a bordo do navio do seu grande rei, para terem querido fi- car no paiz dos Lotophagos, que se delei- tavam com similhantes drogas, ou que fossem bem merecedores de serem meta- morphoseados por Circe em animaes co- medores de bolotas. As Nymphaeas são todas de lindo aspecto, e mais particular- mente as flores. Os antigos eram d'esta opinião, e acharam as Nymphaeas do Egy- pso tão bellas, que lhes deram os nomes mais agradáveis, e as consagraram a seus deuses. Heródoto as similhava a Lyrios da mais casta alvura; Theophrasto e Pli- nio á Papoula; são porém mais bellas do que as com que foram comparadas. Os árabes ainda lhes dão a denominação de Esposas dos rios. O snr. Saint-Vincent, naturalista francez, fallando das Nym- phaeasj diz o seguinte: «^Quem, n'uma bella tarde de julho ou agosto, procurando n'um passeio á noute aquella frescura, que só se encontra á borda das aguas, não terá fixado sua vista com satisfação sobre as grandes flores brancas como marfim, de todo abertas, em laços perfumados, que se desabrocham nos interstícios, deixando entre si espessas folhas arredondadas, lu- sidias, e formando á superfície do extenso liquido um tapete da mais bella cor ver- de? São as NymphaeaSj sobre as quaes os poetas, que tantas flores téem celebra- do, não téem dito uma só palavra, que, sob o nome de Nenuphar, passaram uni- camente ao dominio dos pharmaceuticos, que empregam as raizes em seus prepa- rados. E para admirar, que se não tenha feito das Nymphaeas uma planta de ornamento nos tanques, e arroios de nossos jardins. Em parte alguma vi empregar a sua pom- pa suave, como acontece aos Juncos flori- 64 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA do8^ ás Salicarias, o outras plantas gra-j ciosas da borda das aguas, cujos tufos produzem bello effeito nos lagos. Os nos- sos fabricadorcs de parques parecem crer que um lago ou uma fonte nào produzem lindos eíFeitos, senão quando as aguas es- tão desembaraçadas das pequenas hervas, e a sua transparência deixa perceber ao longo de suas margens o betume e arga- massa, que as prendem. Que lindos effei- tos não teriam ahi os encantos das Xym- phaeaslí) Termina, mostrando quanto desejaria ver estas graciosas plantas nos tanques das Tuilleries e sobre as peças d'agua de Saint-Cloud ou de Versailles. As Nym- phaeas téem sido pouco empregadas entre nós nos usos médicos, ainda que se tem attribuido á Nymphaea olha, assim como á Jutea, virtudes medicinaes. As flores são reputadas anodynas, e preparava-se com as pétalas um xarope que passava por anti-aphrodisiaco, pro- priedade que se attribuia geralmente^ a toda a planta, e particularmente á raiz. O snr. Morin de Rouen fez a analyse chimica das raizes d'estas plantas, cujo resultado se pôde ver no « Journ. de Pharm.», tom. VII, pag. 450; por ella sabe-se que contéem muito amido, mu- cilagem, tanino, resina, assucar incry*- tallisavel, matéria azotada, e differentes saes. Foi depois da analyse, que se reconhe- ceu que estes vegetaes não téem as pro- priedades medicas que se julgava terem, e longe de possuírem as virtudes que lhes suppunham produzem effeitos totalmente oppostos. Coimbra. I. L. Magalhães Ferraz. BIBLIOGRAPHIA (LES PROMENADES DE PARIS» PAR A. ALPHAND A França tem ultimamente dado á luz uma grande quantidade de obras illustra- dus, em que o primor e elegância do tra- balho artístico se ajuntam admiravelmente á parte scientiíica e litteraria. Entre essas publicações avultam prin- cipalmente as de sciencias naturaes; e na verdade, em nenhum ramo de sciencia são tão importantes as illustrações e gravuras como n'este. Uma descripção, por muito perfeita que seja, nunca podo dar cabal ideia do obje- cto descripto, como o fará um desenho ainda que de somenos valor. Dizia uma notabilidade scientifica que se aprendia mais folheando uma obra il- lustrada do que lendo um d'esses pesados o grossos volumes dos escriptores antigos. Este pensamento, embora um pouco exag- gerado, dá todavia uma ideia do grande auxilio que os desenhos prestam no estudo das sciencias d'observação. Dos muitos editores, que tem tomado a sou cargo illustrar a sciencia, aprcscn- ta-80 no primeiro plano a casa Rothschild, de Pariz. E nas obras do botânica e horticultura que este senhor mais se distingue; o seu catalogo vem repleto de verdadeiros mo- numentos artísticos e scientificos. Ennumeremos alguns : «Les Fougères», 2 vol. in-8.°, «Les Champignons de la France», 1 vol. in-8.°, «L'Ornitologie du Chasseur», 1 vol. in-8.°, «Le monde des papillons», 1 vol. in-4.°. E finalmente «Les Promenades de Paris», de que nos vamos occupar mais detida- mente. Em quanto ás outras publicações escu- sado será dizer que as illustrações são admiráveis, verdadeiros bijoiís que o sábio e o amador de bons livros devem possuir na sua estante. « Les Promenades do Paris » por A. Alphand, o distincto engenheiro da cidade de Pariz, formam dous bellos volumes in- folio, dos quaes um reúne todo o texto e o outro forma um soberbo álbum com gra- vuras em aço, representando os planos de Pariz e de todos os parques, sqiiares e houlevards; os typos de construcção; ca- sas para guardas, kiosques, neveiras, pa- vilhões, cafés, abrigos ; as pontes, ponti- lhões, bancos, candelabros, gradeamentos, o I ^ © o --tí CO ■1 — r-r^sãig9Sê^^eP^F^fmíW~$M W S es O O o t3 P o JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 69 estufas, fontes, apparelhos de irrigação, etc, etc, assim como excellentes chro- molitographias representando as mais bel- las plantas da flora ornamental pari- siense. Temos visto o que ha de melhor em publicações horticolas; todavia nada nos surprehendeu tanto como esta. Da excellencia e perfeição artística das gravuras podem os leitores avaliar pelos dous espécimens que acompanham este ar- tigo e que representam uma vista d'um dos jparterres do Jardim do Luxemburgo (íig. 16) e a fonte do circo nos Campos Elysios (fig. 17) A perfeição do desenho e o fino do buril tornam estas gravuras d'um primor admirável. Não devemos também deixar de men- cionar a perfeição e nitidez da impressão ; o typo foi fundido especialmente para esta obra, e os impressores foram escolhidos entre os mais hábeis da especialidade. Esta publicação é também enriqueci- da com o desenho de muitas plantas or- namentaes, taes como Coníferas, muitas plantas do género Musa, Canas, etc. As chromolitographias reprentam as se- guintes plantas : Dracaena reginae, Wi- gandia urens, Caladium, um hoiiquet de Verbenas, e muitas outras plantas que se- ria longo ennumerar. A naturalidade e a riqueza do colorido tomam estas estampas d'um valor inna- preciavel e são do mesmo lormato da pu- blicação. « Les Promedades de Paris » não é so- mente uma descripção dos passeios d'a- quella cidade e das obras de architectura que os enobrecem, é também um tractado theorico e pratico da arte dos jardins pú- blicos, ramo especial e ainda novo da hor- ticultura de ornamento, que muito dese- jaríamos ver mais desenvolvido no nosso paiz. Um dos capitules mais interessantes da obra é sem duvida o que tem por titulo «Le fleuriste de la Ville de Paris». Des- creve minuciosamente a organisação ad- ministrativa e financeira dos passeios e plantações, assim como de um grande nu- mero de plantas, arvores e arbustos re- centemente aclimados, e que fazem a admi- ração dos amadores. A introducção apre- senta-nos uma importante monographia da «Arte dos jardins», escripta com intelli- gencia e muita erudição. É uma exposição das leis da esthetica que devem presidir á decoração das cidades e jardins, indi- cando os preceitos relativos ao traçado assim como as regras a observar na exe- cução dos aterros, na disposição das pers- pectivas, e na escolha e distribuição das espécies que são a base da decoração dos parques e jardins : finalmente comprehen- de uma minuciosa analyse e descripção das fabricas e obras hydraulicas, que ser- vem para animal-os e variar-lhes os as- pectos. Eis aqui pois, o summario d'uma obra, que só vista e lida com attenção se po- derá avaliar devidamente. Quando ella appareceu, todos os jornaès políticos, todas as revistas de bellas-artes francezas e extrangeiras lhe dedicaram ar- tigos especiaes pondo em relevo a per- feição e valor artístico e scientifico da obra. A casa Rothschild, que tinha já uma sufficiente reputação pelas suas publica- ções illustradas, veio juntar mais um mo- numento levantado ás artes francezas com a publicação dos seus «Promenades de Pa- ris», e só uma força de vontade e um ver- dadeiro amor pela sciencia é que podiam resolver o seu proprietário a emprehender uma obra tão gigantesca! Ahi fica esboçada a grandes traços a descripção d'uma obra que honraria a es- tante do mais distincto amador de horti- cultura e que não obstante o seu elevado preço, ainda esperamos ver bastante vul- garisada. Em Portugal, que nos conste, só exis- tem 3 exemplares; um na bibliotheca do Porto, que seja dito de passagem já pos- suo uma soberba collecção de publicações sobre horticultura e botânica, e tracta diariamente de obter as que vão sahindo, outro pertencente a S. M. El-Rei o snr. D. Luiz e outro ao snr. Silva Pereira, horticultor em Lisboa. A. J. DE Oliveira e Silva. 70 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA EUC4LYPTUS GLOBULUS i Voltemos porém ao phenomonal desen- volvimento d'esta Myrtacea. Todas as es- pécies de EucaJyptus descnvolvem-so pro- digiosamente ; porém o EucaJyptus glohu- lus excedo os limites das arvores mais gi- gantescas. Um Eucalyptus de dez annos pode sem oxaggeração mostrar desenvolvi- mento egual ao de nm Carvalho de cem, o na Austrália são muito \nilgares os exem- plaras de cincoenta annos com 50 e 60 metros d'altura e 15 a 20 metros de gros- sura. Em sitios abrigados, onde possam des- envolver-se á vontade, encontram- se in- dividues de 60 a 70 metros de altura cora 50 annos de edade. Não é raro mesmo en- contrarem-se alguns com 100 metros e 28 a 30 de circumferencia. Ainda muitas vezes estas dimensões são excedidas, pois que a medida de alguns tem dado em resultado 106 metros d'al- tura ! As exposições de Londres e Pariz tem concorrido taboas de Eucalyptus de di- mensões prodigiosas; em 1851 appareceu na exposição de Londres uma couçoeira de 47 metros de comprido sobre 3"", 50 de largo e 8 centimetros de espessura. Ainda hoje pode ser vista nas collecções perten- centes ao Jardim de Kew. Em 1855 es- teve para vir á exposição um outro exem- plar medindo 51 metros de comprido; a difficuldade de encontrar navio que o trou- xesse impediu que este colosso podesse ser admirado n'aquelle concurso. Veio toda- via uma rodela de um metro de diâmetro, cortada a 59 metros da raiz em uma ar- vore de 97 metros d'alto. Estas notáveis dimensões do Eucaly- ptus toi*nam-o precioso para as construc- ções maritimas; pois que pode oíferecer quilhas completas, o quo até aqui nunca 80 encontrava. Estas proporções parecer-nos-hiam fa- bulosas senão podesscmos corroboral-as pela própria observação do alguns exem- plares no nosso paiz. Em Cintra, nos magnificosjardins que S. M. El-Rei D. Fernando alli possuo, exis- 1 Vide J. II. P., vol. V, pag. 46. tom alguns pés do Eucalyptus que se tcem desenvolvido de 4 a 5 metros por anno. O snr. A. F. MoUer, distincto enge- nheiro florestal e director das mattas do Vallo de Cannas (Coimbra), forneceu-nos 03 seguintes resultados das suas observa- ções sobre os Eucalyptus, que foram plan- tados em maio de 1869. AI.TUBA I DIÂMETRO Metros | Meti-os !5ucalyptus amy,:ídalína .... 4,00 0,05 — pigaiitca 4,50 0,06 — globata 4,50 0,00 — resinifera 4,00 0,07 — risdonii 4,00 0,05 — falcata 3,00 0.03 — globulu.s 0,00 0,08 — marginata (maha- gony) 2.00 0,02 — robusta 3,00 0,03 Plantados no mesmo local em dezembro de 1869 : ALTUKA I Diâmetro Metros | Metros Eucalyptus montana 3,00 0,02 — reciana 5,00 0,02 — occidontalis .... 2,00 0,02 — pêndula 3,50 0,03 — globulus 6,00 0,09 E preciso notar que estas observações foram feitas em janeiro de 1871. Por estas observações, a que podería- mos juntar muitas outras, se vê que o Eucalyptus transportado para longe da pátria não perde nenhuma das suas pre- ciosas qualidades. As observações feitas em todas as par- tes da Europa, onde tem sido ensaiada esta interessante planta, são todas unanimes em conceder aos Eucalyptus um desenvolvi- mento ou crescimento fabuloso. Todos os jornaes hortícolas estão cheios de noticias n'este sentido, distinguindo-se sobre tudo o «Boletim da Sociedade d' Acli- mação». Extractemos d'elle algumas das principaes. «Em Nice, em Hyères, em Toulon, na Córsega, o vigor da vegetação d'esta ar- vore excede todas a previsões. Mr. Richar (do Cantai) comprovou, em uma recente viagem que fez ao Meio dia, que por toda a parte cuidavam em plan- tar Eucalyptus no littoral do mediterrâneo, desde Marselha até Nice. JORNAL DE HOrvTICULTURA rRATICA 71 Em Hyères, via-se em casa do nosso con- sócio Mr. Huber um Eucalyptus glohu- los de onze annos, que media 190 centi- metros de circumferencia na base.» D'outros pontos da França colhera-se eguaes informações. Os exemplares que hoje existem não deixam duvida alguma sobre a rapidez do desenvolvimento e pro- porções gigantescas. Na Hespanha e na Itália contam-se também exemplares muito desenvolvidos. De todas as espécies a que mais se des- envolve 6 a que mais tem sido recommen- dada é sem duvida o E. glohulus ; toda- via ha muitas outras que também devem tomar logar nas florestas e mattas. D'en- tre ellas destaca-se o E. mahagony ou mar- ginata, conhecido vulgarmente na Austrá- lia debaixo do nome de laria ou Djaryl. É uma arvore de desenvolvimento mui- to vigoroso, que attinge grandes propor- ções e fornece uma madeira talvez ainda mais dura do que a do E. gluhulus. É principalmente empregada nas construc- ções marítimas e resiste melhor que qual- quer outra aos terriveis estragos do The- redo navalis. Tábuas d'esta espécie mer- gulhadas durante 17 annos no fundo do mar foram ao cabo d'este tempo encontra- das em perfeito estado de conservação, ao passo que outras em menos tempo estavam completamente furadas pelos Theredos. Além d'estas preciosas qualidades do E. mahagony para construcções navaes e civis, a sua madeira muito rija e compa- cta dá um excellente polido, colorido de lindas veias similhando as do Acaju, po- dendo por isso prestar excellentes servi- ços na marcenaria. A. J. DE Oliveira e Silva. RELiTORÍO DO DISTRÍCTO DE FARO Pelo conselheiro governador civil José de Beires fomos obsequiado com um exem- plar do Relatório, que este cavalheiro apre- sentou á junta geral do districto de Faro. É um grosso volume, em que todas as questões que interessam áquello districto são bem meditadas e em que se revelara acrysolado zelo e desejos de prosperidade. São numerosos e de grande importância os documentos apresentados á junta geral e ao governo pelo chefe do districto. Na primeira parte encontra-se o exame e es- tudo pratico das diversas matérias de ad- ministração e na segunda setenta e três documentos, sendo em grande numero os mappas estatísticos relativos aos diíferen- tes ramos e especialidades de administra- ção geral e local. A agricultura mereceu a particular at- tenção do illustrado funccionario publico e os documentos coUigidos são da máxima importância porque trazem elementos pre- ciosos e essenciaes para estudos futuros. Na segunda secção encontra-se o rela- tório acerca das mattas e florestas e se- gundo Be vê é no concelho de Aljezur aonde a cultura florestal maior cuidado tem merecido ao agricultor. Ha porem ainda grande porção de terreno susceptí- vel de ser coberto de pinhal e d'outras essências florestaes, como o pede no rela- tório a commissão filial d'aquelle conce- lho. Existem também no concelho de Porti- mão algumas dunas aproveitáveis para a sementeira de penisco, devendo este con- celho servir de modelo no tractamento e cultura da Alfarrobeira, que está hoje constituindo uma grande fonte de riqueza agrícola na província do Algarve. Segundo se vê do relatório, estão em eguaes condições para a sementeira do penisco os concelhos de Villa Keal, Tavi- ra, Olhão, Faro, Albufeira, Lagoa, Lagos e Villa do Bispo. Todas as commissoes filiaes d'estes concelhos pedem para lhes ser enviada uma porção de penisco, por isso lembram que se inste cora a repar- tição competente do ministério de obras publicas, para que seja enviada a porção de penisco de que possa dispor, e esta dis- tribuída pelos diíFerentes concelhos, ser- vindo isto de estimulo aos progressos da agricultura, em geral. Deixemos fallar a penna do illustrado relator sobre este assumpto: «Sendo a sementeira do penisco, a que esta secção entende ser de mais instante necessidade, para se aproveitarem desde já a grande porção de areaes que pela sua desnudação são obstáculo aos melho- ramentos agrícolas dos terrenos confinan- 72 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA tes, cabe aqui apontar os processos geral- mente empregados em França para a sementeira do penisco e fixação das dunas e areacs das costas. As areias depositadas pelo mar sobre as costas são, sem cessar, levadas pelos ven- tos dominantes e arrastadas na mesma di- recção d'esses ventos. É pois cliro que para se proceder á sementeira do penisco n'uma dada porção de areal, convém conhecer quaes são ahi 08 ventos dominantes, começando a fixa- ção das areias no limite mais próximo d'estes. Esta primeira zona, estando fixada, ser- virá de abrigo a nova sementeira, e assim successivamente até ao limite opposto. O processo pois de fixação, diz o enge- nheiro Bermontier, pode-se dividir em três classes: 1.^ a zona comprehendida entre a linha de preamar e o pé das dunas ; 2.^ as dunas propriamente ditas; 3.^ as bai- xas entre as dunas e cuja superficie é so- lida e coberta d'uma vegetação herbácea mais ou menos abundante. É pois ai.'' zona á borda do mar que convém fixar desde logo, por isso que sendo estas areias movidas sem cessar pelo mar, são levadas pelos ventos para as du- nas que lhe ficam mais próximas. Semeia-se esta primeira zona, estabele- cendo uma palissada cora sebes, continua e parallela á linha das dunas, e á distan- cia de 15 a 20 metros da linha de prea- mar das mais altas marés; sobre esta es- tabelecem-se outras perpendiculares á di- recção dos ventos dominantes, formando com aquella um triangulo ou rectângulo, conforme as necessidades locaes da zona que houver a semeiar. Para proteger a semente mistura-se com o penisco uma Gramínea que é o Elymxis arenarius, e a Genista scoparia, na pro- porção seguinte: Para um hectare de areal 18 kilogrammas dfí peuisco 6 » de Oenista scoparia 4 » do Elymns arenarius. Os grãos de penisco não devem pesar menos do .50 kilogrammas por hectolitro. Para se reconhecer a sua boa ou má qua- lidade, lançam-se era agua, e são conside- rados maus se sobrenada a quarta parte. A sementeira faz-se espalhando o pe- nisco a lanço, e logo que uma porção está semeada, procede-se á sua fixação. Para tornar bera palpável a grande vantagem do prorapto aproveitamento dos areacs da Costa do Algarve, vamos apre- sentar mn calculo approximado do rendi- mento que deverá dar a costa coberta de pinhal, servindo tarabera este calculo para corroborar a opinião apresentada por esta secção, para que se proceda sem demora á sementeira do penisco. Computando em 10:000 hectares a su- perficie de areaes susceptiveis de serem semeados, calculando um termo raedio de 400 Pinheiros por hectare, teremos o nu- mero total de 4.000:000 de Pinheiros. — Calculando que cada Pinheiro pôde forne- cer a quantidade media de 500 decime- tros cúbicos de madeira para construcçoes ou lenha, teremos que o corte annual, de- pois de 20 ou 30 annos (sendo pela cen- tésima parte) será de 40:000 Pinheiros, que fornecerão 20:000 metros cúbicos de pinho para lenha e construcçoes. Divi- dindo esta quantidade em 8:000 metros cúbicos para construcçoes, e 12:000 para lenha, e como cada metro cubico de pinho produz depois de rachado 1,5 steres de achas approximadamente, tereraos assim a quantidade total de 18:000 steres de achas de pinho resultantes d'um corte annual. 0 numero de 40:000 Pinheiros cortados pode fornecer approximadamente 10:000 carradas de ramada e frança de pinheiro, computando-se em Ij^GOO reis por hectare o valor da caruma e lenhas miúdas apa- nhadas entre os pinhaes. Além d'esta ha também a que resulta da limpeza annual, feita em 4:000 hecta- res de pinhal conservado ; avaliando-se em 6 carradas por hectare o resiJtado da limpeza, teremos 24:000 carradas de ra- mada e frança para juntar á que fica mencionada no corte annual. Recapitulando, temos : 8:000 in:'tro3 cúbicos de madiMra para construcçào a 2Í1000 reis 1 termo médio) 16:000^000 18:000 steres de achas de pinho a 800 reis 14:400,^)00 34:000 carradas de ramada e fran- ça de pinheiro a 200 reis .... 6:800^000 Caruma e lenhas miúdas de 10:000 hectams de pinhal a 1^000 reis por hectare 10:0001000 Somma. . . 47:200^000 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 73 E este o rendimento de 10:000 hectares de pinhal depois do seu desenvolvimento, devendo todavia notar-se que, pelas esta- tisticas que foram consultadas para este calculo, ainda é muito inferior ao rendi- mento produzido pelas nossas principaes mattas». A cifra é, pois, eloquentissima e é in- citamento de sobejo para que não se en- tregue o assumpto nas mãos da incúria e do desmazelo proverbial do nosso paiz. Desejáramos bem que o exemplo do snr. José de Beires encontrasse imitadores que se interessassem egualmente pelos distri- ctos que estão ao seu cargo. O publico não quer, nem o governo deve querer, só funccionarios públicos in nominej que são de tanta utilidade como um relógio com a machina partida, que só para vista é que poderá servir. Oliveira Júnior. SYNOPSE CHRONOLOGICÀ Synopse chronologica das principaes de- liberações e providencias do conselho da faculdade de philosophia sobre o estudo de botânica e agricultura na Universidade de Coimbra, desde 1774 até 1872. 1843 — Em conselho de 18 de janeiro leu-se o relatório e proposta da commissão encarregada do plano das reformas e eco- nomias no expediente do Jardim Botânico, que está registada no livro competente. Approvou-se egualmente a seguinte pro- posta do secretario do conselho : Haverá uma commissão, annualmente nomeada pelo conselho, para inspeccionar os estabe- lecimentos e propor os necessários me- lhoramentos, a qual apresentará no fim de cada trimestre o relatório por escripto dos seus trabalhos. As propostas que os directores dos estabelecimentos houverem de fazer em cada trimestre para obras ex- traordinárias, compra de productos, ma- chinas, instrumentos, etc, etc, serão pri- meiramente examinadas pela commissão inspectora, que dará o seu parecer por es- cripto na Congregação immediata áquella em que forem apresentadas. Em conselho de 10 de março foi aucto- risado o dr. Pedro Norberto para mandar arranjar as etiquetas indispensáveis para ultimar a classificação da eschola botâni- ca. Deliberou-se mais adoptar para com- pendio da aula de agricultura o «Curso elementar de agricultura e de economia rural» de Raspail, traduzido por A. J. de Figueiredo e Silva. Em 30 de junho foi concedida a verba de 60?5»000 reis para gratificar o jardinei- 1 Vide J. H. P., vol. Y, pag. 32. ro do Jardim Botânico pela viagem que devia fazer no corrente anno ao Grerez. Em conselho de 15 de julho resolveu-se que os directores de todos os estabeleci- mentos apresentassem no ultimo mez de cada anno económico o orçamento para o serviço ordinário e conservação dos seus respectivos estabelecimentos, e egualmen- te as propostas documentadas do que fosse mais necessário para o melhoramento e en- grandecimento material e scientifico. Em 16 de novembro foi auctorisado o director do Jardim Botânico para mandar proceder á construcção da porta de ferro da entrada principal do dito estabeleci- mento, pelo preço de 800í$>000 reis. Em 14 de dezembro foram votados agradecimentos ao snr. Manoel António Malheiro, pelos relevantes serviços que prestara ao Jardim Botânico, offerecendo generosamente muitas plantas e sementes. 1844 — Em conselho de 2õ de janeiro recommendou-se que no Jardim Botânico continuassem os trabalhos scientificos d'es- te estabelecimento com toda a assiduidade que era de esperar do zelo do seu actual director. Pediu-se a observância dos esta- tutos quanto aos inventários scientificos de todos os estabelecimentos da Facul- dade, o que foi unanimemente approvado. Em concelho de 26 do mesmo mez fez- se a visita do estabelecimento de agricul- tura, e reconhecendo-se que este ainda se não achava inteirado da parte que lhe pertencia na cerca do extincto convento dos Mariannos, na conformidade da por- taria do ministério da fazenda de 27 de outubro de 1836, como por vezes se tinha solicitado; resolveu-se que se rogasse ao snr. conde reitor para que houvesse de dar as providencias necessárias para que 74 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA a citada portaria tivesse o devido cum- primento. Em congregação de 21 de novembro foi lida a seguinte consulta sobre o estado da cerca de í?. Bento annexa ao Jardim Bo- tânico : « Senhores ! Satisfazendo á obrigação, que me foi imposta, na ultima congregação de julho próximo passado, de vos fazer uma breve exposição sobre o estado actual da cerca do extincto coUegio de S. Bento, e bem assim sobre as vantagens e recursos que ella pode subministrar ao estudo da agricultura pratica, a fim de que o con- selho, considerando devidamente assumpto de tanta importância, possa tomar um al- vitre a este respeito, e na conformidade de elle dirigir uma consulta a Sua Ma- gestade ; tenho a honra de vos apresentar o seguinte : Pela portaria do ministério da fazenda, de 27 de outubro de 1836, houve S. Ma- gcstade por bem mandar que a cerca do extincto collegio dos benedictos, com parte da dos extinctos carmelitas descal- ços, fosse incorporada no Jardim Botânico para plantações de arvores e arbustos, que por falta d'espaço se não podessem acom- modar n'este estabelecimento ; e em cum- primento da referida portaria foi a admi- nistração da cerca commettida ao director do Jardim Botânico. Havendo-se estabe- lecido, porém, n'esta Universidade, no an- no lectivo de 1837 a 1838, uma cadeira especial de agricultura, cujo estudo anda- va annexo ao de botânica, pareceu ao conselho da faculdade que seria mui con- veniente, para melhor administração e fis- cahsaçSo de cada um dos estabelecimentos, separar a direcção da cerca da do Jardim Botânico, ficando aquella a cargo do lente de agricultura. Em conformidade com es- tas ideias o conselho, usando do direito que lhe confere o decreto de 13 do janeiro do 1837, e entendendo ao mesmo tempo que a mento de Sua Magestade fora des- tinar a cêica não 8(5 para os eífeitos men- cionados na portaria, senão também para quaesquer outros conducentes ao ensino, resolveu por unanimidade de votos, em congregação de 18 de janeiro de 1843, que 80 me entregasse a administração da cerca. Foi com grande repugnância quo mo encarreguei d'esta administração ; não só porque o conselho, querendo por ventura evitar censuras, tinha sempre considerado a cerca do extincto collegio de S. Bento como propriedade puramente lucrativa, e n'e3te caso era de nenhuma vantagem, senão perfeitamente ociosa a mudança de director, mas também porque já então en- tendia que a dita propriedade, por extre- mo irregular em seu terreno montanhoso, constando apenas de horta e de vinha com algumas arv^ores fructiferas, e nno tendo além d'isto a extensão sufficiente para abranger os differentes géneros de cultu- ra, jamais podia vir a ser uma quinta exemplar, e muito menos ainda um esta- belecimento agricola. Obrigado porém a acceitar a referida administração, e dese- jando conformar-me com as vistas do con- selho, tomei desde logo a deliberação de não mandar fazer na cerca obra extraor- dinária, ainda que muito útil me pareces- se, a fim de não diminuir, antes augmen- tar, quanto em mim fosse, o saldo da re- ceita sobre a dcspeza; vejo comtudo, com amargo pezar, que não obstante todos os meus esforços e diligencias, nos dous annos em que tenho tido a direcção da cerca, nem esta rendeu para o estado, nem tão pouco aproveitou para o ensino. D'esta maneira, senhores, não pode a cerca con- tinuar a ser administrada, sem que a fa- culdade attraia sobre si grave censura; e para a livrar d'esse d^ísaire, e salvar a sua dignidade, que n'este objecto se acha sobre maneira empenhada, oíFereço á sabedoria do conselho um de dous arbí- trios : ou arrendar toda a pai'te da cerca, que não for iramediatamente necessária para plantação de arvores e arbustos; ou convertel-a, quanto possivel, n'uma quin- ta exemplar, pedindo-se para isto aucto- risação a Sua Magestade, para se empre- gar o rendimento da cerca nas obras e melhoramentos de que ella tanto carece. D'estes dous arbítrios, os únicos por ventura capazes de produzir o eíFeito de- sejado sem que a faculdade perca a posse da cerca, que pôde vir a ser necessária para estender o Jardim Botânico; o pri- meiro é o quo mo parece preferivel, mor- mente no estado actual de finanças do es- tado, em attenção ás grandes despezas, quo seria mister fazer para organisar um JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 75 tal ou qual estabelecimento de agricultu- ra, e ao pouco proveito que para o ensino d'aqui resultaria. O escrúpulo de se rejei- tar uma propriedade que nos foi dada para ensaios agrícolas, é, quanto a mim pouco fundado, porque nem a cerca é in- dispensável para os pequenos ensaios de naturalisaçâo, que se podem fazer em al- guns canteiros do jardim, nem offerece as condições necessárias e o solo próprio para se ensaiarem os diversos methodos de cul- tura. E também, a meu ver, um erro a per- suasão quasi geral, em que se está, de que a agricultura pratica se não pode estudar sem um estabelecimento, onde os que se dedicam áquelle estudo possam observar as differentes praticas agrícolas, porque, sobre não ser possível reunir n'um só es- tabelecimento tudo quanto diz respeito á agiicultura, não se ha mister, para apren- der os preceitos da cultura, vel-os reali- sados. De três maneiras, senhores, não o igno- raes, a agricultura se pode estudar : como officio, como arte e como sciencia. A agri- cultura como officio é uma simples exe- cução, e consiste unicamente na pratica das differentes operações e processos de cultura, e no conhecimento empirico das epochas em que se deve fazer cada uma das operações. A arte consiste na adopção de ideias estranhas e no conhecimento das regras e preceitos da cultura, e na aptidão em pol-as em pratica. A sciencia não fixa re- gra alguma geral, mas ensina a distinguir com precisão o melhor processo possível para cada caso eventual, e desenvolve os motivos ou princípios em que se funda cada uma das operações agrícolas. O agricultor puramente pratico recebe dos outros a ideia do que faz, e segue a regra que lhe tem sido traçada, sem as mais das vezes poder conhecer e indicar os motivos. O agricultor theorico descobre a cada passo novas vias de melhoramento, que tem sempre escapado ao rotineiro, e conhece clara e precisamente aquella, quo o que este n'uma longa pratica, quando muito, tem percebido d'uma maneira vaga e obscura. A arte executa uma lei dada e rece- bida: a sciencia dá a lei. O estudo da agricultura como arte pertence tanto ao agricultor esclarecido, como ao agricultor puramente pratico, porque nem a agricul- tura theorica se pode estudar sem a pra- tica, nem o agricultor propriamente dito pode executar os differentes processos da cultura, sem um conhecimento mais ou menos amplo das regras e preceitos que constituem a arte. Mas da mesma sorte que este pode saber as regras e preceitos de cultura, sem entrar na phílosophia d'es- ses preceitos, assim também aquelle pode estudar a agricultura como sciencia, sem o estudo do trabalho manual. Verdade é que se não pode ser um per- feito agricultor sem reunir a theoria á pra- tica, e a sciencia á execução; e que seria por isso de grande vantagem um estabe- lecimento, onde os que se dedicam ao es- tudo de agronomia podessem ver mano- brar os instrumentos agrários de ultima invenção, examinar as differentes prati- cas de cultura, e observar os resultados de ensaios comparativos. Mas, sem fallar da difficuldade, já de- monstrada, de converter a cerca do ex- tincto collegío de S. Bento n'um estabe- lecimento de simílhante natureza, e das enormes despezas, que para isto seria mis- ter fazer, cumpre ainda advertir que não é no curto espaço d'um anno que se pode adquirir a ínstrucção mechaníca, que aliás cada um pode adquirir por si mesmo, muito principalmente sendo ella procedida da ínstrucção scientífica; haja vista aos numerosos exemplos, que em todas as na- ções se offerecem, de indivíduos, que ha- vendo recebido uma educação inteiramen- te opposta á profissão agrícola, se tem tornado grandes agricultores somente por meio da ínstrucção scientífica, e tem ad- quirido em pouco tempo superioridade so- bre outros, que exerciam esta arte ha longo tempo com o mais feliz successo. As muitas e estreitas relações, que pren- dem a agricultura aos differentes ramos de philosophia natural, não permittindo que o estudo d'aquella sciencia seja em- prehendído senão por pessoas, que téem adquirido um certo grau de ínstrucção e avultados conhecimentos philosophícos, téem feito com que n'este ultimo século se tenham estabelecido cadeiras de agri- cultura em todas as universidades; e de 76 JORNAL DE HORTICULTUEA PRATICA quanta vantagem seja isto para o estado, assas o demonstra a simples consideração de que o gérmen dos mais importantes descobrimentos existo n'uma especulação puramente racional : é somente nas mãos de homens instruídos que qualquer ramo de industria pode progredir e prosperar, é pelos proprietários possuidores de terras d'entre as classes superiores da sociedade, que por suas luzes podem formar planos esclarecidos, e cuja fortuna lhes permitte pol-os em execução, que a classe ordiná- ria dos lavradores pode ser imbuida nos principies de melhoramentos que a arte agrícola vae progressivamense adquirindo. Em todas as nações cultas da Europa, na França, na Bélgica, na Suissa, na Allemanha, etc, existem é verdade al- guns estabelecimentos agrícolas; mas nem os directores d'estes estabelecimentos são os professores de agricultura, nem tampou- co são os alumnos d'estes os que frequentam aquellas escholas, porque uma cousa é uma cadeira de agricultura, outra uma eschola pratica. Esta é especialmente destinada para os homens de classe inferior que es- tudam e devem exercer a agricultura como officio: aquella para os que se dedicam ao estudo das sciencias philosophicas, e tem por íim não tanto um objecto de luxo. para que elles não ignorem o que todo o philosopho deve saber, como habilitar com os conhecimentos necessários os que forem proprietários, ou se propozerem exercer a industria agrícola, para poderem dirigir convenientemente os trabalhos do campo, reformar o melhorar os methodos de cul- tura, aperfeiçoar os instrumentos agrários, seguirem em summa um plano systema- tico e constante de melhoramento. Tal é sem duvida o fim com que foi creada a cadeira de agricultura e econo- mia rural, estabelecida n'esta universidade desde 1837, fim a que ella satisfez cabal- mente sem dependência de quinta exem- plar ou estabelecimento agrícola : — por todas estas razões, ás quaes accresce hoje a grande reducçâo que o governo acaba de fazer na dotação da universidade, pa- rece-me que o arrendamento da quinta é preferível a qualquer outra medida, que nas circumstancias actuaes se possa ado- ptar: pode ser, porem, que outro melhor arbítrio lembre ao conselho, a cujas luzes e elevada circumspecção submetto a mi- nha humilde opinião. — Coimbra, 21 de outubro de 1844. — Dr. António Sanches Groulão». /-n !• \ n • 1 (Continua). Coimbra. ^ -^ J. A. SiMuES DE Carvalho. CHRONICÀ HORTICOLO-AGRICOLA Dos valles o perfume enchia a atmospheral . . . Ninguém soltava aucioso o giúto cVinfelizl . . • Tinha por toda a parte um throno a Primavera, e em volta d'e9se throno um flácido matiz ! São do sympatico poeta portuense e nos- so excellente amigo Sousa Viterbo as li- nhas maviosas que o leitor acaba de per- correr. Invoquem com elle a primavera, e, não ha que duvidar, a primavera está comnosco. Os prados, os montes, ^ as colli- nas, as várzeas, tudo o revela, E a Rosa^ a mais linda e scductora filha dos jardins, que primeiro nos vem annunciar a che gada d'essa quadra viçosa, em que toda a natureza é amor. Infeliz do homem que não tem um coração palpitante que o es- pera, infeliz da planta que não pode em- balar nos seus braços ternamente as coro- las que a seu turno serão o berço de uma progénie numerosa ! Consagremo-nos todavia unicamente ás Eosas e não nos embrenhemos em diva- gações. Fallemos da Mimosa rosa encarnada, Mimosa rosa em botão, E da branca que Tens a candura dos anjos, A belleza é teu condào. Acabamos de chegar do estabelecimen- to hortícola do snr. José Marques Lourei- ro, d'esse sanctuario em que se encontram as imagens verdadeiras de uma religião santa, mas em que os profanos também entram como no templo de Christo. AUi todos téem accesso, christãos e idolatras : o estabelecimento do snr. Marques Lou- reiro tem as portas abertas de par em par o só não entra lá quem não quizer. Não nos c possível callar a agradável sensação que nos causou a preciosa collec- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 77 çào de Rosas que tivemos o ensejo de ver e analysar detidamente e podemos hoje affirmar que é a mais rica da peninsula. Lá fora ha-as melhores; Jamain, por exem- plo, possue uma que pode sor avaluada em alguns contos de reis, mas no paiz, mesmo na Hespanha, decerto que não exis- tem rivaes. A do snr. Marques Loureiro conta para cima de 600 variedades. Não queremos fazer reclame, pedimos simplesmente aos amadores de Eosas que n'um dos bellos dias, que esta quadra nos hade prodigalisar, se tirem dos seus cui^- dados e vão até á quinta das Virtudes. É um passeio agradável, que os deixará gra- ciosamente impressionados. Ás amadoras endereçamos idêntico pe- dido. São as mulheres as Rosas da sociedade, são as Rosas da vida, as Rosas com alma, 6 umas e outras devem-se mutuo amor. Que as gentis portuenses se dirijam á quinta das Virtudes, onde os Fetos arho- reoSj as Bananeiras j as Palmeiras e ou- tras plantas tropicaes e luxuriantes, sau- darão dos massiços e das estufas a elegân- cia e a belleza que passam de mãos da- das. Lá nos encontraremos. — Para o snr. José Alves, administrador da fabrica de papel de Alemquer, foram remettidos do estabelecimento do snr. Mar- ques Loureiro 1:100 Eucalyptus glohu- lus. Para o paiz visinho também téem ido alguns. — Mr. Rademaekers, de Maeseych, aconselha o seguinte unguento para se enxertar sem o auxilio do fogo : GR. Colophonia escura 360 Banta . . ; 60 Álcool de 39 graus ...;.... 80 Derretem-se as duas primeiras substan- cias a um calor brando e quando estive- rem derretidas tira-se o vaso do lume e deita-se o álcool por pequenas porções, mechendo continuamente com uma faca ou espátula. Esta preparação lança-se de- pois n'uma caixa de folha de flandres que deve ficar bem fechada. — Um utensilio de jardinagem assas engenhoso foi inventado ultimamente por Mr. Godfrey e attendendo á sua indispu- tável utilidade estamos certos que se vul- garisará dentro em pouco. Serve este utensilio para enterrar vasos nos alegretes em que se fazem massiços do plantas que, por qualquer motivo, não se queiram ou não se devam plantar no chão. A utilidade do apparelho anda ligada a simplicidade, razão ainda maior para a sua geral adopção. Consiste n'uma peça de ferro cónica o de tamanho que o ori- fício que abre comporta um vaso de dadas dimensões. Essa peça de ferro é munida d'um cabo como as que tem geralmente as pás e de que dá ideia perfeita a figura 18; a qual mostra o modo como fica dis- posto o vaso no buraco. Sendo cónico o ferro com que se opera e tendo o vaso o Fig. 18 — Plantador de vasos fundo chato, é claro que fica um vácuo que receberá as aguas supérfluas da rega ou da chuva e obstará a que as raizes da planta apodreçam o que succede muitas vezes não existindo este receptáculo. Até aqui serviam-se os jardineiros de enchadas, o que era summamente traba- lhoso e não se conseguia ter o vácuo ne- cessário para a boa drainagem, mas agora com este instrumento opera-se com faci- lidade, porque, sendo pozado, basta algu- mas pancadas para o orifício fícar prom- pto para receber as plantas. 78 .lORXAT, lU-^ irORTirULTURA PRATIPA — No Alexandra Park, em Londres, esta-se organisando um jai'dim japonez. Para se proceder a este trabalho vieram expressamente operários d'aquelle impé- rio. — N'uma carta particular que temos presente, occupa-se o snr. dr. Basílio Constantino de Almeida Sampaio, de Mur- ça, de uma questão assas importante para os proprietários vinícolas do certos distri- ctos do Traz-os-Montes. Passamos a transcrever os períodos que se referem a esse objecto e para elles cha- mamos a attençào do nosso governo: Os vinhos brancos estão tendo pouca procura, o que é devido á falta de mercados de consumo; e ao pequeno desenvolvimento dado n'estes sítios ás estradas. O Minho, que é consumidor d'esta espécie de vi- nhos, e que tem portos por onde os exportar, não 08 recebe senào por via d" Amarante ou do Porto, tendo uma estrada muito mais próxima e directa uor Villa Pouca d' Aguiar, e dentro em pouco tem- po provavelmente vae ter duas linhas térreas. Como o interesse do commercio e da agricultura se prende muito directamente com as vias de communicação ; por isso ousamos lembrar aqui á junta geral do districto de Villa Real, que con- sulte, e As camarás municipaes dos concelhos de Alijó, de Murça, e de Villa Pouca d' Aguiar, que representem ao governo de Sua Magestade a gran- de necessidade que ha de ligar Villa Pouca de Aguiar com a estrada que de Villa Real vae para Murça. Esta estrada entroncando no Populo terá pouco mais ou menos 15 kilometros de extensão. — Nas podas das vinhas ultimamente aqui feitas notou-se o phenomeno de as Videiras apresenta- rem um aspecto definhado, e com varas rachiti- cas. Nào 86 sabe a que attribuir este effeito, se ás geadas e nevoeiros frios, que houve em maio o junho do anno passado, se ao esgotamento de solo, se ao Phylloxera vastatrix, que pela primeira vez vem visitar estes vinhedos. — Aciui-su pubiiciídu o IV volume do « iJictionnaire de Pomologie» de que é auetor ^Ir. André Leroy. Como muitos dos leitores sabem, os dous primeiros volumes são consagrados ás Pereiras e o tci-ceiro e quarto ás Ma- cieiras. O quinto volume, que se oecupará das íVuctas de caroço, já está no prelo e íicará concluido brevemente. — Agradecemos aos snrs. Charles Hu- ber & C* a remessa do seu «Catalogue de Vúgétaux», publicado no mez de feve- reiro. Por varias vezes nos temos occupado d 'este importante estabelecimento situado em Hyères (França), e agora novamente n recommendamofi. — Obscquiou-nos o nosso collaborador e director da Eschola-modelo de Gers, Mr. A. Dumas, com um exemplar da pu- blicação que acaba de dar a lume sobre a cultura da Violeta odorífera dobrada de Parma. E um opusculosinho muito interessante e o assumpto é tractado con amore. Me- rece ser lido pelos especialistas. Fallando do producto que alli dào as Violetas^ calcula Mr. Dumas que cada canteiro de 20 metros de comprido com 4 filas de plantas pode produzir 160 a 200 francos por anno. Agradecemos ao nosso amigo o seu obse- quio. — N'uma carta que Mr. Fremont, phar- maceutico, dirigiu á Sociedade de Horti- cultura de França, indica um meio para conservar a Irescura das flores e que se diz ser eííicaz. Consiste em dissolver sal-ammoniaco ou chlorhydrato de ammonia na proporção de õ grammas por cada litro d'agua e intro- duzir n'esta mistura os pés das flores. Mr. Fremont pretende que d'este modo as flores se conservarão muitas vezes por quinze dias. — Foram vendidas ultimamente em lei- lão, no deposito hippico do Instituto geral de agricultura, alguns cavallos reprodu- ctores, incapazes de continuarem no ser- viço de padreação. O snr. conselheiro Rodrigo de j\Ioraes Soares, que dá esta noticia na sua chro- nica do «Archivo liural», accrescenta que no anno findo morreram os dous melhores cavallos do referido deposito além de ou- tros dous que já estavam em estado de serem reformados. Ha poucos dias morreu também um que, na opinião de alguns entendedores, era o mais lindo exemplar do deposito do Instituto. — Do nosso collaborador, o snr. D. Joa- quim de Carvalho Azevedo j\Iello e Faro, recebemos a seguinte communicação em data do 2 de fevereiro e sob a epigraphe de «Actualidade, e o futuro do anno agrí- cola de 1874». Dáo-se condições tão cxcopcionacs e singnla- roH, que presentemente actuam com grande força para u estado deplorável em que se acha a nossa agricultura, nue de certo muito vào influir em to- das ns jirodiicvõos do solo, muito ])i'inripalniente JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 79 nas produoçSes cerealificas ; a perspectiva do qua- dro agrícola actual está esboçado com tantas co- res tâo carroçadas e escuras, que só a mão sabia da Providencia pode colorir e retocar com alegres e brilhantes cores ; a falta de chuvas que deixaram de rir nos mezes de novembro, dezembro e janei- ro, são a causa primordial da miséria e soffi-imento com que lucta a nossa industria pecuária, e agrí- cola; estas tristes condições anormaes da actua- lidade são base segura em que fundamento os meus vaticínios, presentindo um futuro desgraça- do, que hade influir fortemente não só sobre a clas- se ag"cola, mas também sobre as industrias fa- bris, e commerciaes. Só pode avaliar perfeitamente o mal, que no presente e futuro a falta das chuvas causa á agri- cultura, quem tracta praticamente d'esta industria Contrista ver actualmente os campos queimados pelos grandes gelos, que tem cabido, e pelos ven- tos frigidissimos, que tem feito; as hervagens dos lameiros e ijrados tem sido flagelladas por tal for- ma, que não tem fornecido alimentaçâb para os animaes, sendo estes quasi exclusivamente nutri- dos a forragens seccas, as quaes tem subido a um preço excessivo, e por consequência é muito difficil, e dispendiosa aos lavradores a alimentação dos ga- dos. Disse Villeroy, que "sem gados nao ha agri- cultura, e que sem muitos gados não ha boa agri- cultura", é esta uma máxima, que não admitte o ser contestada, porém não é possivel ter gados sem haver abundante alimentação para os mesmos : a falta das chuvas é a causa de se não desenvol- verem as hervagens, e das nascentes estarem mais seccas que no verão, de forma que não ha aguas para a rega dos lameiros e prados. As circumstan- cias anormaes da alimentação dos gados vae pro- duzir uma grande falta de estrumes, por que é n'esta epocha, que os lavradores os preparam em grande escalla para as sementeiras da primavera, falta esta, que vae produzir um grande deficit na producção, por que ha terras, que quasi nada pro- duzem se não forem bem estrumadas. Muito bem disse o cultivador esclarecido do reinado do bom Henrique IV — Oliviers de Serres "que os estrumes regeneram, e fortalecem as ter- ras e que pelas suas virtudes admiramos produc- ções maravilhosas". Se as tristes circumstancias que actuam infelizmente sobre a agricultura não mudarem, é convicção minha que o anno agrícola marcará na historia uma epocha de fome e de mi- séria. A industria agrícola, a menos protegida no nosso paiz, porque sobre ella pezam immensas contribuições, é infelizmente na actualidade des- favorecida pela providencia: ha muitos annos, que não lembra um inverno tão secco, e frio, que gran- des prejtiizos tem já causado aos lavradores. As sementeiras do outomno estão em muitos sitios completamente perdidas, os prados e lameiros queimados pelos ventos e gelos, e as nascentes d'agua quasi seccas. As sementeiras da primavera vão ser feitas em péssimas condições, não só por que tem deixado de ser beneficiados s campos pelas chuvas, mas também porque muitas proprie- dades não podem ser estrumadas pela falta que hade haver dos estrumes, e sobre tudo muitos ter- renos ficarão por semear por não haverem aguas para serem regados. Se as circumstancias anor- maes athmosphericas não mudarem cTe prompto, pode-se calcular, que teremos um anno em que as producções agrícolas não excederão talvez a um terço da producção media annual. J. BE Carvalho Azevedo Mello e Faro. — No Rio de Janeiro fundou-se uma so- ciedade de Aclimação, com o fim de in- troduzir no Brazil animaes e plantas úteis. Os trabalhos sào feitos sob a super- intendência de Mr. Glazion, director dos Jardins públicos do Rio de Janeiro. É presidente o barão de Santa Isabel e primeiro secretario o snr. Joaquim An- tónio de Azevedo. — Temos presente o programma das exposições que se realisarao, nos dias 5 e 6 de abril e 28, 29 e 30 de junho, promovidas pela Real Sociedade de Agri- cultura e de Botânica de Gand. N'estes concursos só poderão ter entra- da como expositores os membros da Real Sociedade. — A «Revue Horticole» diz que os agri- cultores americanos estão atterrados com uma nova moléstia que destroe completa- mente os batataes. Já eram conhecidos vários Cogumelos que flagellavam esta excellente Solanacea, cuja introducção na Europa se deve a Parmantier, mas o novo destruidor não é um Cogumelo: é um insecto a que a scien- cia dá o nome de Doryjphora decempun- ctata. — Mr. Planchon já regressou da Ame- rica, onde tinha ido commissionado pelo governo francez para estudar a questão Phylloxera. As conclusões que tirou dos seus estu- dos são: 1.0 — Que o Phylloxera vinha da Ame- ricaj 2.° — Que a vinha americana resistia n'aquelle paiz ao Phylloxera; 3.° — Que era preciso, por consequência, substituir as nossas \ ideiras por cepas americanas. Mr. H. Trimoulet, que nos communica isto, accrescenta na sua carta : D'este modo, se o insecto vem com as cepas americanas, é claro que a invasão se alargará. De- ver-se-hia portanto fazer enérgica opposição á in- troducção na Europa de vinhas americanas. Além d'isso aquella medida daria causa a que se perdessem os vinhos chamados "de Franpa" e "da Europa". Mr. Trimoulet annuncia-nos a próxima publicação da sua terceira a Memoria» so- bre este objecto que será acompanhada de estampas. — Por diíferentes vezes teem os cenolo- 80 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA gos notado os graves inconvenientes que resultam do se lavarem as gaiTafas com chumbo de caça. A este respeito lemos ultimamente o seguinte no Relatório do conselho do hygiene e salubridade do Sei- ne-Inferieure : Em muitas ocoasiões se tem evidenciado os pe- rigos que resultam do emprego do chumbo em grão na lavagem das garrafas destinadas a conservar o vinho e outras Isebidas. A decomposição do me- tal pelo seu contacto prolongado com bebidas aci- das ou que se tornam acidas, e a formação à'aceta- tos de chumbo, substancias eminentemente vene- nosas, explicam os accidentes saturninos, que tan- tas vezes se dão nas vias digestivas, mas apesar d'isto, a rotina prevalece. E' sobretudo áquelles que pela natureza do seu commercio interessam em que não se dêem esses accidentes, que incumbe vigiar 08 indivíduos encarregados da lavagem, que se pode efifectuar muito melhor com apparelbos es- peciaes de custo módico e que já são conhecidos do publico ou substituindo o chumbo de caça pela limalha do ferro fundido e por fiindir. Sirva isto de aviso aos leitores que teem gan-afeira e a todos áquelles que a possam vir a ter. — Em seguida apresentamos a analyse do guano chimico de peixe, da fabrica da Trafaria, feita no laboratório da Real As- sociação Central de Agricultura Portu- gueza. No est. uat. Em perf. sec Agua hygroscopica . 15,10 00,00 Acido carbónico . . 0,40 0,47 Matéria orgânica e saes amonicaes . . 39,56 46,60 Parte mineral solúvel nos ácidos; Phoaphato de cal. . . 19,62 22,11 Potassa 0,11 0,13 Oxido de ferro, ma- gnesia, eto 7,06 8,31 Parte mineral insolú- vel noB ácidos . . . 18,15 22,38 100,00 100,00 Parte solúvel na agua 44,96 Acido phosphorico 9,08 Azote 7,60 Recebem-se encommendas para o for- necimento d'este adubo no armazém da companhia, na Praia de Santos n." 154, (Aterro da Boa Vista) onde também se dSo as instrucções necessárias. O preço ó do ÕOÕ reis por 15 kilos en- saccados e sellados em volumes de 45 ki- los. A companhia garante que a totalidade das partidas vendidas se approxima da analyse supra e restituo a importância d'elliis quando se prove, justa e legalmen- te, que não estào nas condições indicadas. — Noticia o «Garden» que tem estado á venda, no mercado de Covent Garden, em Londres, peras por dúzia das quaes pedem .£ 20 e i. 21. — O amador, que nào tem conhecimen- to das introducções de plantas, que se fa- zem annualmentc em Portugal, estimaria por certo ter quem lh'as designasse, de modo que se não visse desilludido a cada passo das esperanças que lhe haviam fei- to conceber. Muitas vezes horticultores pouco conscienciosos fazem descripções pomposas, que servem de engodo aos me- nos versados n'este ramo dos conhecimen- tos humanos. E preciso ter toda a cautella com quem tão bem sabe encobrir os espi- nhos com as rosas ! Para que o leitor nos não confunda com os apologistas por interesse das plantas, deixaremos de encarecer a belleza das Azáleas que nos servem de assumpto a esta pequena noticia, passando somente a fazer a sua descripção. Baron de Vrilre. Flores grandes, fun- do rosa, passando ao branco quasi puro desde o meio até aos bordos. O lóbulo su- perior é salpicado de carmezim. Aqui e acolá algumas estrias acarminadas, como n' algumas Azáleas de fundo branco. Alexis Dalliêre. Flores muito grandes de bordos ondulados, salmão metallico, chocolate brilhante. Caiyophylloides . Distinguem-se das suas congéneres hybridas de flores bran- cas maculadas de vermelho, pela folhagem menos estreitamente lanceolada, mas so- bretudo pela delicadeza das suas flores, estriadas de rosa, umas vezes pallido e outras vivo. Alba illustrata. Já a recommendamos por diversas vezes. É tão bella que no- vamente lhe damos um logar de honra na selecção que acabamos de fazer. As flo- res são bastante grandes, brancas e es- triadas de purpura. A Azálea indica c uma das plantas, cuja falta se torna sensivel em qualquer jardim bem cultivado. Para os botânicos actuaes, este grupo não é mais do que uma simples sub-divi- são do grande género Rhododendrmi, mas os horticultores continuam a consideral-o como um género á parte. Oliveira Júnior. 1 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 81 PÊRA FONDANTE DU COMICE As peras, assim como qualquer outro fructo, téem tido em todas as epochas di- versas apreciações, conforme o clima, a exposição, e os terrenos em que são cul- tivadas. Entre nós estamos presenciando a cada passo, que o mesmo fructo varia conside- ravelmente deslocado do clima e terreno que lhe é mais favorável. Assim vemos a Pêra vir gulosa^ por exemplo, considerada em Traz-os-Montes e Beira Alta como uma das melhores cid- Fiíí. ly — Pera Fondante du Comice tivadas no paiz, em quanto que na pro- víncia do Minho, se por ventura salva al- gum fructo, é elle insignificante. A Pera Fondante du Comice, de que hoje nos occupamos, não escapou a estes vaivéns da fortuna. Obtida de semente pelo antigo Comicio d'Angers, deu os seus primeiros fructos em 1849 — passou Vol. V— 1874. as culturas da Bélgica e alli Mr. Bivort re- commendava-a em 1859 aos horticultores, asseverando que a commissão Real de Po- mologia, apreciando as suas qualidades, recommendava a sua cultura; em quanto que no mesmo anno o congresso pomolo- gico, reunido em Bordeaux, a declarava indigna de cultura. Observa porém Mr. A. N." 5— Maio. 82 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Leroy que cVesta sentença se interpoze- ram muitos recursos, e que o dos últimos juizes fora revogado quatro annos depois pelo congresso que a fez figurar o descre- ver no seu catalogo official — «La Pomo- logie de la France.» Esta bella pêra é volumosa, tem a epi- derme cor de palha ligeiramente esver- deada, ponteada, marbrada, e raiada de pardo — a polpa é branca, fina, um pouco granulosa no centro, sueco abundante, as- sucarado, vinhoso, e muito perfumado. Amadurece em outubro e chega a novem- bro. E um fructo de primeira qualidade, digno da cultura dos amadores. Ca:millo Aureliano. SYNOPSE CHRONOLOGICA Synopse chronologica daá' principaes de- liberações e providencias do conselho da faculdade de philosophia sobre o estudo de botânica e agricultura na Universidade de Coimbra, desde 1774 até 4872. 1845 — Em congregação de 18 de ja- neiro leu-se a portaria do snr. conde rei- tor a fim de que no orçamento das des- pezas ordinárias da faculdade, tanto no segundo semestre do actual anno econó- mico, como no seguinte anno, se propo- zessem todas as reformas e economias pos- siveis : resolveu-se que se fixasse a des- peza do expediente ordinário de cada es- tabelecimento para o futuro anno económi- co ; a qual foi para o Jardim Botânico de 450á'000 reis e para o estabelecimento de agricultura de 100^000 reis, arbitrando- so só esta quantia em attenção ao rendi- mento provável do estabelecimento com o qual o respectivo director deveria prover ás mais despezas d'elle. Em conselho de lõ do fevereiro o se- cretario lembrou que se propozesse a Sua Magostado a urgente necessidade das via- gens scientifícas no reino; e foi unanime- mente approvado; resolvendo-se também que n'esta representação, da qual foi encar- regado o dr. Pedro Noberto, se incluisse a proposta e consulta, que n'este conselho apresentou o dv. .Sena sobro o meio de obter productos naturaes de fora do reino. A representação sobi-e viagens scienti- ficas foi apresentada e approvada em 10 do março immcdiato. Em consrJho de 28 de maio foram dis- cutidas e approvada» as instrucções para as viagens scientifícas no reino. 1848 — Em conselho de 22 de julho fez- se ^ visita dos estabelecimentos da facul- 1 Vido.]. H.r., vol. V, pa-. 73. dade, principiando pelo Jardim Botânico, que foi encontrado no melhor arranjo e aceio compativeis com a sua dotação. ís'esta mesma congregação foi auctori- sado o director do Jardim Botânico para mandar o respectivo jardineiro viajar pelo reino a fira de colher as espécies de que houvesse mais falta no estabelecimento. Em 21 de dezembro foi apresentado o parecer da respectiva commissao sobre o destino das cercas annexas ao Jardim Bo- tânico. 1849 — Em congregação de 3 de maio foi lida e approvada a seguinte represen- tação ao governo a respeito do herbario da Flora portugueza, coUigido por um sá- bio estrangeiro, o dr. Welwitsch. «Senhora! O conselho da faculdade de philosophia da Universidade de Coimbra, tendo noticia de que o governo de Vossa Magestade acaba de ser auctorisado para comprar o horbario da Flora portugueza, recolhido por um sábio estrangeiro, falta- ria ao seu dever, se não viesse respeito- samente supplicar a Vossa Magestade a graça de confiar-lhe o deposito e guarda do mesmo herbario. Nos relatórios annuaes, na representa- ção de 23 do dezembro de 1845, e ulti- mamente na inlbrmação de 2 de abril do corrente anno, tem o director do Jardim Botânico successivamonte exposto a ne- cessidade de reformar o antigo herbario do museu, havido antes da separação da cadeira de botânica, o deteriorado pela acção do tempo; a inutilisação d'oste her- bario em consequência da sua collocação o disposição; a impossibilidade de eflfe- ctuar aquella reforma, som os auxilies pe- cuniários indispensáveis para as viagens e peregrinações botânicas; o inconvenien- te, emfim, que resulta da falta d'um her- 1 bário, tanto para o proveito do ensino JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 83 como para credito da faculdade, credito que nâo pode deixar de interessar o lus- tre da Universidade e a grandeza de Vos- sa Magestade como protectora d'esta cor- poração scientiíica. Em março de 1845 representou o con- selho da faculdade de Philosophia a Vos- sa Magestade a conveniência de dar cum- primento á carta regia de 9 de maio de 1806, ordenando as viagens scientificas no reino. Um dos resultados d'essas via- gens devia ser a acquisição de todas as plantas da Flora portugueza, tanto vivas como seccas. Ás perturbações sociaes e aos apuros do thesouro deve sem duvida imputar-se a inutilidade de todas estas representa- ções! E pois que a faculdade de philoso- phia, apesar dos seus bons desejos, e de sua vantajosa posição, se vê constituída na impossibilidade de obter directamente a posse d'um herbario da Flora pátria, ousa ella esperar de Vossa Magestade, dignando-se fazer-lhe a justiça de avaliar devidamente o seu zelo e vei-dadeiro in- teresse pelo bem da sciencia, e attenden- do a que a faculdade faz parte da primeira corporação scientifica do reino, será ser- vida preferir o Jardim Botânico de Coim- bra para n'elle depositar e tornar útil o dito herbario. Deus guarde a Vossa Magestade por muitos annos. Da Universidade de Coimbra em con- selho da faculdade de philosophia de 3 de maio de 1849». Em 27 de julho declarou o dr. No- berto, director do Jardim Botânico, ter mandado para a imprensa o catalogo com- pleto da eschola linneana, e ter organi- sado a collecção de plantas medicinaes segundo a classificação do compendio de matéria medica, actualmente adoptado na faculdade de medicina. O mesmo, pro- fessor oíFereceu á approvação do conse- lho um compendio de botânica, por elle elaborado. Foi nomeada uma commissão para este exame. Resolveu-se que se fi- zesse eíFectiva quanto antes a annexação ao Jardim Botânico da parte superior das duas cercas de S. Bento e S. José pelo modo que fora ordenado em 18 de janeiro de 1843, incorporando-se o resto no esta- belecimento de agricultura. Em 30 de julho foi presente e appro- vada a consulta com as respectivas in- strucções para serem dirigidas ás auctori- dades e agentes consulares no Ultramar, a fim de se obter a remessa de productos para o museu e Jardim Botânico da Uni- versidade. As instrucções para a colheita, preparações, acondicionamento e trans- porte dos productos e exemplares de bo- tânica são do theor seguinte: ARTIGO 2.° Exemplares de botânica Os exemplares de botânica são de três ordens : 1.* Plantas vivas, cebolas e raizes vi- vazesj 2.^ Fructos e sementes ; 3.* Partes de plantas que se tornam notáveis por alguma circumstancia sin- gular. ORDEM I § 1.° As plantas vivas, que podem aturar longas viagens sem carecerem de grande cuidado, são os Cactos e em geral as plantas carnosas. De todas as outras é inútil tentar a remessa, a não ser das nossas ilhas africanas d' aquém do equa- dor. I A maneira de acondicionar umas e outras é envolver-lhes os pés em musgo fino bem enleado e firme: metter depois os feixes em uma caixa de madeira, que tenha no fundo um lastro de musgo; en- cher também de musgo os intervallos dos feixes, e sujeital-os por via de travessas, deixando ficar as extremidades das plan- tas voltadas para o centro da caixa, que para isso deve ser vasia de musgo, e ta- pando finalmente a caixa com uma grade e não com tampo unido. n Para as plantas carnosas o musgo deve ser bem secco : para as outras deve ser húmido; e durante a viagem, sendo mais longa, a humidade entretida por al- guma terra que envolva as raizes. ni Cada planta deve trazer o seu nome vulgar, o uso em que se emprega, o logar do seu nascimento e a natureza do sitio em que vive. § 2.'* As cebolas e raizes vivazes de- 84 JORNAL DE nORTICULTURA PRATICA vem sor bem enxutas o mettidas em boiões ou caixas de papelão ou folha, envolvidas em musgo fino e bem sccco, ou melhor, em algodão em rama; e estes boiões ou latas incluidos cm uma caixa do maden-a ou de lata, e atacadas com aparas de pa- pel, algodão ou estopa. 8e as raizes fo- rem tenras e succosas, como as da Canna do assucar, dos Lyrios etc, convém que sejam embrulhadas em musgo húmido. ORDEM II § 3.° Os fructos devem ser remetti- dos todas as vezes que elles não forem tenros ou succosos, isto é, quando não su- jeitos a apodrecer ou fermentar na via- gem ; e n'este caso ainda todas as vezes ue se poderem empregar os meios de evi- tar a fermentação, que nos fructos se pre- vine do mesmo modo que nas cebolas. I Quando porém os fructos não possam ser remettidos, devem remetter-se as se- mentes. Tanto em um como em outro ca- so, os fructos não devem ser colhidos se- não depois de perfeitamente sazonados; e as sementes não devem ser empapeladas sem estar bem enxutas e seccas. Em cada embrulho de sementes deve declarar-se, além do nome, uso e naturalidade, o tem- po de sua florescência e a epocha de sua sementeira. ORDEM III § 4.° Merecem ser remettidos os fru- ctos das plantas equatoriaes, que n3o po- dem crescer em Portugal, e bem assim parte do tronco, ou ramos de plantas ra- ras ou excepcionaes, folhas e flores exqui- sitas, etc. Também conviria muito que das nossas possessões ultramarinas ou do estrangeiro, fossem remettidas as peças próprias para herbario, isto é, ramos com folhas, flores e fructos espalmados sobre folhas de pa- pelão, depois de terem sido apertadas e seccas entre as folhas de um livro ou en- tre folhas de papel pardo. Em G de outubro fez-se menção hon- rosa do dr. Welwitsch e do jardineiro da eschola medico-cirurgica de Lisboa, pela dadiva de plantas e sementes, que fizeram para o Jardim Botânico. 18Õ0 — Em 23 de janeiro assentou-se que na cerca de S. Bento se fizessem os possíveis melhoramentos, não como escho- la de agricultura, mas como estabeleci- mento de ensaios e de algumas praticas agrícolas, plantio de arvores e arbustos, e estabelecimento de prados artificiaes. Em 30 de julho fez-se a visita ao Jar- dim Botânico e cerca annexa, sendo pre- sente o inventario e catálogos scientificos das respectivas collecções. (Continua). Coimbra. J. A. Simões de Carvalho. VANTAGENS E CONSTRUCCÃO DAS N1TREIR4S Grande parte dos lavradores deixam de estrumar as suas propriedades, por não terem abundância de estrumes, sendo esta falta a causa principal da diminuta pro- ducção das culturas, que são feitas n'estas condicções. Os proprietários e caseiros quasi sempre fazem as sementeira com a terça parto dos estrumes, que deviam em- pregar, porque, cultivando mais terras do c|ue devem comparativamente com os es- trumes d(! que dispõem, por esta razão as culturas são feitas em péssimas cir- cumstancias. O estrumo quasi geral dos nossos lavradores ó preparado nas lojas, aonde recolhem os gados, e por esta roti- na nunca ó possiyel terem ab -ndancia de estrumes ; elles não desconhecem os bene- ficies, que resultam das sementeiras bem estr.imadas, porém o uso e pratica do pae e avu que sempre assim procederam os conduz pelo mesmo caminho, sem se lem- brarem, que podem facilmente ter mais abundância de estrumes para melhorarem as culturas dos seus campos, e obterem maior producção dos mesmos. Poucos pro- prietários e ainda menos lavradores conhe- cem as vantagens e abundância dos estmi- mes, que produzem as nitreiras, quando são construidas em boas condicções. Por julgar que é de muita conveniência e utilidade para a nossa agricultura, não s<) propalar as suas vantagens, mas tam- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 85 bem indicar o methodo da sua çonstruc- ção, eis os motivos, que me instigam a escrever este artigo para o bem redigido «Jornal de Horticultura Pratica». O proprietário ou agricultor deve re- gular a construcção da nitreira conforme a área de terrenos, que cultiva, pois se- ria grande absurdo construir uma grande nitreira, quem tem poucos terrenos para estrumar. O mesmo succederia se construisse ni- treira de pequenas dimensões quem tivesse muitos terrenos a agricultar. Por esta ra- zão indico as medidas, que deve ter uma nitreira para preparar, e produzir de dois em dois mezes trinta carradas de es- trume: por cada lado ou face seis me- tros de largo, e três metros e meio de al- tura. A sua construcção será feita da forma seguinte — Deve ser construída em local apropriado não muito próximo das casas em que se habita, nem exposta aos ven- tos predominantes, que conduzam as ex- halações para as casas, devendo ficar col- locada em circumstancias de lhe correr agua pela parte superior, bem como ter caminhos em boas condições para fácil transporte dos mattos e estrumes. Depois de escolhido o local se abrirá no solo uma cava, que tenha por cada lado ou face, e de altura as medidas já indicadas, sendo o fundo lageado de pedra ou lousa com declive para o lado em que ficar a porta ; todos os quatro lados serão revestidos de parede feita com pedra, de forma que fi- que bem justa ou melhor será revestir as paredes internamente de argamassa para que não penetre o vento e facilite a ex- travasão do calórico, que desenvolve o es- trume em fermentação. A porta deve ficar do lado, que offereça mais facilidade para a extracção dos es- trumes, sendo rasgada a toda a altura da parede, ajustando-se-lhe uma porta feita de madeira grossa de maneira que abra para fora, quando seja necessário tirar os estrumes. Nos ângulos ou cantos se collocam qua- tro pilares de pedra ou ferro, sendo os da frente d'um metro d'altura, e os do lado opposto de dois metros, sobre os quaes se deve collocar a armação feita de madeira, e coberta de telha, ou lousa, com escoante para o lado d'onde fica mais baixa, e de forma que as aguas pluviaes vasem fora da parede, tendo o maior cuidado que a arma- ção seja construida com bastante solidez, e segura com gatos ou presilhas de ferro ás paredes ou esteios para que os ventos fortes a não possam prejudicar. Pelo lado opposto á frente da porta, que é por onde fica mais levantada a armação, é por onde se devem lançar os estrumes para se pre- pararem as camas, que devem ser feitas pela forma seguinte — Lança-se dentro da nitreira uma porção de matto por curtir, sendo bem batido por igual, e que fique com altura de 50 centimetros, sobi'e esta cama deita-se outra de estrume já curtido, porém de menor altura, sobre esta outra de matto, e assim por diante até se en- cher a nitreira ao nivel das paredes, ad- vertindo, que a camada superior será de estrume cortido ; os melhores estrumes cur- tidos para preparar as camas das nitrei- ras são os de cavallo, e gado caprino, e ovino. Toda a porção, que contém a nitreira, fique bem filtrada pela agua até ao pavi- mento; a agua não deve correr só para o centro ou lados do deposito, deve ser distribuída por toda a sua superficie para que tudo fique por igual bem humedecido, o que facilmente se consegue empregando um tubo de folha de flandres, que rece- bendo a agua por uma das extremidades a vasa sobre o centro ou lados á vontade de quem pratica este serviço. Não se deve lançar agua segunda vez na nitreira, por que transtorna e altera a fermentação; é este um gravíssimo erro, que praticam cons- tantemente os nossos lavradores na pre- paração dos estrumes lançando-lhes agua por muitas vezes. Passados 40 a 50 dias, todo o estrume, que encerra a nitreira está perfeitamente curtido, e pode ser empre- gado nas culturas, procedendo -se em se- guida a encher novamente a nitreira. Eis aqui o processo fácil para ter abundância de estrumes tão necessários para a boa cultura dos nossos campos. Casa da Soenga. J. C. A. Mello e Faro. 86 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA A MINHA ESTUFA AO MEU PRESADO AMIGO JOSÉ DUARTE DE OLIVEIRA JÚNIOR 9 "La naturo cst un temple três saint, ou Ton entre pour admirer les statues non tra- vaillées par de mortclles mains". Doparou-sc-me no «Diário Illustrado» o teu admirável artigo intitulado O MEU jar- dim. Deves calcular a anciedade com que li e tornei a ler as inspiradas indicações da tua penna fina e delicada. Es apreciador como eu dos soberbos productos do reino vegetal e da mais mimosa obra da natureza. O teu JARDIM está traçado com esmero e conhecimento, e acho-o á la portée de tout le monde, que possua meia dúzia de palmos de terreno. Somente desejava ac- crcscentar-lhe uma pequena estufa com seis ou oito palmos de comprido por três ou quatro de largo, e ura metro de altura, onde nos rigores do inverno se possam conservar algumas Begónias, Selaginel- las e Fetos. Assim a esposa feliz, a filha dedicada, ou uma criada intelligente po- dem nas horas do descanço empregar al- guns momentos no tractamento das plan- tas, dando-lhes os cuidados tno comple- xos de que cilas necessitam. Não ha mais benéfico emprego das horas de repouso para uma mídher de que esse exercicio trio saudável por meio do qual ella se poe em contacto com a creaçao, e cora a vida na grande natureza vegetal. Creio firme- mente que o amor pelas flores pode ser a origem da completa regeneração do ho- mem, ou pelo menos um poderoso elemen- to na sua educação moral. Um malvado, se o pozerera em com- raunieaçuo diária, estreita, e exclusiva com plantas c flores, se chegar a conver- ter-se em um bom jardineiro, terá ao mes- mo tempo modificado a sua indole, e tor- nar-se-ha a pouco c pouco benévolo, pa- ciente, c justo; finalmente regenerado e rostituido á sociedade. As flores sào a imagem de Deus, c a sua influencia sobro nós é divina c puri- ficadora. Tu que CS amador do coraçào, comprehondes bem o que é este sentinien- tf) que nasce da convivência dos jardins. A mim, as flores, as minhas queridas plantas, prcoccupam-mo inteiramente; con- sagro-lhes as melhores horas da minha vida. Levantando-me de madrugada, en- trando pela manhã cedo no meu jardim, quantas e quantas vezes me não deram as minhas plantas a resignação, o conforto, a consolação, e a felicidade ! De quantos acerbos cuidados, de quan- tos tristes pensamentos não são ellas o re- médio ! Como o coração agradecido encon- tra n'ellas sempre o refugio e o agasalho que lhes pede ! Ellas técm uma physiono- mia e uma linguagem para aquelle que as cultiva. As plantas que o jardineiro viu nascer e que examinou constantemente, desde pequeninas, fazem-lhe confidencias que os outros não entendera e que cons- tituem para elle uma espécie de conver- sação intima com os benéficos espirites vegetaes de que elle é o invocador, o pro- tector e o amigo. E portanto inquestionavelmente a ideia do teu JARDIM uma ideia útil e regene- radora, assim ella seja seguida por todos os que possam realisal-a. Estimo deveras que te occorresse a fe- liz lembrança do teu artigo, pois em Lis- boa ainda ha muito palmo de terreno que, matisado de Violetas, Narcisos, Junqui- Ihos, Anémonas, Amores perfeitos, etc., etc, faria a felicidade de uma família e o paraizo do seu chefe. Segue pois com a nobre alma que pos- sues essas inspirações bem proveitosas não só á horticultura, mas á educação mesma, e favorece-nos mais amiudadas vezes com os teus mimosos escriptos. Adeus. Acceita tornas saudades do so- berbo Anihurium scherzerianum, do admi- rável e fino Anoectochilus argenteus, da mimosa Cattleya lahiafa, e de muitas outras pupillas minhas, que bem desejam ver-te n'este recolhimento d'ellas e meu, onde ha uma parede no alto da qual te- nho cscripto em gordas letras: Re ha céo na terra, Se ventura lia n'ella, K' a viila entre flores. L'm apertado abraço do teu coUega e amigo dedicado. Lisboa. — Luiz de Mello Breyner. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 87 CLIVIA NOBÍLIS Ha poucas famílias que forneçam á hor- ticultura uma collecção tao variada de plantas como a das Liliaceas. O mais bello colorido junto a uma va- riedade de formas e suavidade de aroma são os caracteres mais salientes que as distinguem. Também poucas plantas se prestam mais á ornamentação dos peque- nos jardins pelo pouco logar que occupara. ^ Ha amadores que tem gasto toda a sua vida a colleccionar as variedades de um só género; é notável hoje o furor pelas collecções de AmarylUs, como outr'ora aconteceu com as Tulipas. Já n'este jornal temos dedicado algumas linhas a vários membros desta numerosa familia, hoje occupar-nos-hemos de um, seucão muito conhecido pelo menos muito interessante. Referimo-nos á Clivia nobi- lisj cujo desenho, copiado d' um exemplar vivo existente no horto do snr. Loureiro, acompanha este artigo. A Clivia nobilisj mais conhecida pelo nome de Himantopliyllum miniatum, é uma bella planta acaule, vivace, de folhas disticas quasi de meio metro de comprido, envaginantes, pendentes, formando uma graciosa curva. Fig. 20— Clivia nobilis Do centro d'estas folhas sahe uma gran- de haste floral do mesmo comprimento das folhas terminada por um fasciculo umbel- liforme de flores pendentes, tubulares, de bella cor vermelhão vivíssimo. E d'um eíFeito surprehendente quando ostenta a sua esplendida florescência no meio d'um taboleiro. A nobreza do seu porte, a sua elegância, estão pedindo um íogar distincto no jardim. E por isso que a Clivia nobilis fica perfeitamente n'um vaso de boa forma ou então no centro d' um prado de ver- dura. Não a aconselharíamos para massiços ; é preciso que esteja só para se gosar bem a amplitude e bella forma da sua folha- gem. Esta planta foi introduzida em França em 1832, e, não obstante a sua antigui- dade, é ainda hoje recebida com agrado em qualquer collecção que se apresente. Além d'estas condições, que nós julga- mos mais que sufficientes para a sua ado- pção nos jardins, ha uma outra muito em seu favor, qual é a de viver perfeitamente no nosso clima ao ar livre, com a única condição de se lhe cobrir de palha as raí- zes durante a quadra das neves. A arte hortícola já soube tirar partido d'esta formosa AmarylUclacea crusando-a com o Himantophyllum Aitoni, d'onde 88 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA nasceu um bello hybrido o H. cyrtanthi- jlorinn, do flores côr de laranja, averme- lhadas. Temos dito o bastante para dar ideia da planta, resta-nos fallar da sua cultura que c facillima e em tudo similhante á das outras Amaryllidaceas. A. J. DE Oliveira e Silva. A FEBRE APHTOSÀ NO GADO BOVINO Vários jomaes têem noticiado a appa- riçào d'esta moléstia em diversos pontos do paiz. , O assumpto incumbe particularmente á veterinária ; mas parece-nos sobremodo conveniente que nos occupemos d'elle n'es- te logar, deixando comtudo aos especia- listas o tractarem-n'o cora mais desenvol- vimento e com a proficiência e competên- cia que de direito lhes pertencem. O nome de A. Zundel é vantajosamente conhecido no mundo scientifico e em ques- tões como esta nós ouvimol-o com o res- peito que o mundo inteiro lhe testimunha. Segundo elle, desde o principio d'este século que a febre aphtosa tem atacado numerosas vezes os ^ animaes nos vários paizes da Europa. E monos exacto, po- rém, o que aventa Spinola, Lemaire e outros, isto é, que esta moléstia seja per- manente e reappareça todos os annos. Pela observação rigorosa dos factos vê-se que em certos annos a moléstia tem a sua ori- gem no oriente e caminha a lentos passos para o oeste communicada pelas manadas de bois e sobretudo de porcos. Também se propaga por via dos mer- cadoi'es e por todos os outros meios de contagio. Introduzida a febre aphtosa n'um paiz, tem-se sempre conservado dons e três an- nos, atacando apenas alguns curraes, mas desenvolvendo-se com grande intensidade quando muitas vezes se imagina que está quasi debellada. Eis agora segundo os auctores mais aba- lisados as principaes erupções de febre aphtosa que téem tido logar nos paizes da Europa occidental. Em 1800, depois da moléstia ter atra- vessado a Allcmanha, onde foi assignala- da por Waklinger e Walz, o na Suissa onde a observaram Ancker e Saloz, pe- netrou em França e conservou-se alli até 1812. Foi observada por Huzard Sénior na Normandia; por Girard no Sena; por Gohicr c Grognior no Lyonnais; por De- han nas Ardennes; por Basséra nos Py- reneus-orientaes, etc. Espalhou-se por Itá- lia (Leroy) e por HoUanda (Elraff)* Em 1819 houve uma erupção que pa- rece ter sido muito forte visto que foi as- signalada na Suissa, na Normandia e Al- lemanha (Pouchet, Potelle, Lux, Brosche, Funcke) . Em 1823 houve outra erupção que foi observada na Alsacia (Miltenberger), na Suissa (Rychner) e na Itália (Lamberlichi). Em 1837 novas erupções se manifesta- ram na Bohemia, França e Inglaterra, onde se demorou até 1839-1840, e n'esta occasião estudaram os veterinários a mo- léstia e sobre ella se escreveram varias memorias. Segundo as observações feitas na Rús- sia por Jessen^ Rawitech e outros veteri- nários, notou-se que quando a peste bo- vina se declara n'uma região é muitas vezes precedida alguns mezes pela febre aphtosa. Umas vezes a febre aphtosa é benigna, mas outras mata a quarta parte dos animaes enfermos. No dizer de Zundel, a febre aphtosa póde-se communicar aos cavallos e os ca- sos observados na eschola de veterinária de Turin por Hurtrel d'Arboval, Levrat, Levigney, Villeroy, Dubos, Lafosse, Le- maire, Serres e Stockfleth, não deixam em duvida este facto. O homem também não está completa- mente livre da contagiSo no dizer d'algun8 auctores. E, porém, bastante raro, mas tem se dado alguns casos. Pessoas encarregadas de dar ás vaccas o alimento ou de as mugir, appareceram com empolas na bocca, nos beiços, nas ventas e mesmo algumas vezes entre os dedos (Falke, Fuchs, Adam). Reconheceu-se porém que era mais fá- cil, ainda que bastante raro, o transmittir- se a moléstia ás pessoas que bebem leite proveniente de vaccas aífectadas. Observa comtudo i\ír. Zundel que estes casos só se téem dado com as pessoas que tomam JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 89 muito leite sem ser previamente fervido, porquanto a fervura destroe o virus. O contagio pelo leite foi assignalado em 1764 por Sagar, em 1811 por Bredin, em 1834 por Hertwig, Jacob, Hildebrand e outros veterinários também notaram d'es- tes casos. Parece-nos comtudo que o contagio não é constante e que em certas epizootias nunca se dá (Zundel). Nas suas pesquizas sobre a epizootia de 1862-63-64 nunca observou nenhum mau effoito depois do uso do leite, ao pas- so que, na de 1869, os casos de erupção aphtosa no homem acompanhado de febre e de indisposições não foram raros no dis- tricto de Mulhouse. Familias inteiras es- tiveram indispostas. Observou-se o mesmo no ducado de Bade, em 1869 (Fuchs) e em Franca, em 1872 (H. Bouley). A illação que poderemos tirar dos fa- ctos observados no nosso paiz é que a fe- bre aphtosa não contagia o homem e nem ainda os animaes, fundamentando-nos : Primeiro — Que tem havido numerosos casos de estarem muitos animaes na mes- ma corte em que existe um atacado pela febre aphtosa sem que por isso os outros soíFram ; Segundo — Se a febre aphtosa se podes- se communicar ao homem pelo consumo de leite, já se teria declarado, porquanto a moléstia existe com intensidade n'este districto, desde a segunda quinzena de dezembro do anno findo e os médicos, a quem perguntamos se tinha havido recen- temente alguns casos de febre aphtosa, declararam-nos que não ; Terceiro — Muitos veterinários e médi- cos extrangeiros téem feito inoculação do liquido contido nas vesiculas sem que te- nha produzido a mesma doença. O que se pode concluir do que deixa- mos dito? Que esta febre não é contagiosa. Emquanto ao tractamento, a que se devem submetter os animaes doentes, é o seguinte, segundo o digno veterinário d'este districto, o snr. Domingos José Sal- gado. Logo que um animal apresente sjin- ptomas de doença, deve, havendo possi- bilidade, ser isolado, recolhendo-o n'um curral abrigado, em que não haja accu- mulação de estrumes. Os animaes ataca- dos não devem ser levados ao pasto e é de vantagem amantal-os. Se téem ape- tite, deve dar-se-lhes algumas forragens de boa qualidade, e, se o não téem, con- vém dar-se-lhes apenas agua tépida com farinha, em que se dilua um punhado de sal commum, que pode ser substituido por uma pequena quantidade de vinagre com o fim de tornar a bebida ligeiramente acidulada. Para combater as aphtas ou vesiculas da bocca empregar-se-ha o co- simento de cevada adoçado com mel, mis- turando-se-lhe uma pequena porção de vinagre. Na extremidade de um pau enrola-se um panno, ou, melhor, uma porção de es- topa bem molhada n'aquelle liquido, que repetidas vezes ao dia se introduz na boc- ca do animal, demorando-a sobre as ve- siculas, e serve o mesmo liquido, apenas com maior quantidade de vinagre, para ser applicado sobre as vesiculas que se tenham manifestado no contorno das ven- tas e do focinho. Quando as aphtas se apresentam nas unhas e uberes, é indispensável a maior limpeza nos animaes, não deixando accu- mular os estrumes e renovando as camas frequentemente; convém egualmente os banhos locaes muitas vezes ao dia, com- postos de substancias adstringentes, como a agua vegeto-mineral camphorada ou o cosimento de folhas de nogueira. Se os animaes manquejam muito, o que prova que sentem dores violentas nas unhas, convém applicar sobre ellas cata- plasmas emolientes de farinha de linhaça ou banhal-as com agua de malvas ; e para as feridas, que ás vezes ficam por muito tempo entre as unhas, usa-se com vanta- gem o unguento egypciaco ou oximellite de cobre. A febre aphtosa é geralmente benigna e cede ao tractamento mencionado, mas convém deixal-a percorrer regularmente os seus períodos e não forçar o rompimen- to das vesiculas, o qual deve operar-se espontaneamente . Para tranquillisar os espirites que se te- nham agitado com as noticias que deram alguns joi-naes da cidade sobre o risco que se corria fazendo uso do leite ou da carne 90 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA proveniente tias vaccas affectadas, ainda devemos accrescontar que o Kegnlamento do Matadouro do Lisboa, o qual tem a approvaçiío do Conselho de Saúde Publica e a do Conselho especial de veterinária, pcrmitte que se abatam rezes com esta doença do segundo poriodo cm diante. Nào nos parece portanto que hajam mo- tivos justificáveis para que seja prohibida a venda do leite ou da carne proveniente do aniraaes affectados pela febre aphtosa, e as pessoas mais escrupulosas, para se porem ao abrigo de todo o receio de con- tagio, poderão ferver o leite, porque uma simples ebullição destruiria o virus se por ventura elle existisse. Uma medida que seria summamente conveniente que se tomasse a bem da sa- lubridade dos consumidores de carne, era que nào se abatessem animaes sem terem passado o segundo periodo da febre, como determina o Regulamento do Matadouro de Lisboa. A camará municipal c que cumpre to- mar esta medida, que nao poderá ser pos- ta em pratica sem que haja um veteriná- rio permanente no matadouro publico. No de Lisboa ha dous, que entre si alternam o serviço e aqui não temos siquer um, estando este serviço confiado a emprega- dos que suppomos não terem as habilita- ções que se requerem para exercer simi- Ihante cargo, aliás de grande importância para a hygiene publica. Como se pode comprehender isto, se as camarás municipaes estão auctorisadas pela lei de 29 de dezembro de 1864 a fa- zerem partido a veterinários? Se relancearmos a vista pelo Regula- mento do Matadouro, vemos que é muito defficiente e pouco explicito com relação á qualidade do gado que alli se deve aba- ter. Diz o citado Regulamento que é prohi- bida a matança de rezes doentes, sem es- pecificar as moléstia que tornam os ani- maes incapazes do consumo publico, ha- vendo todavia muitas doenças que não influem cousa alguma nas boas qualidades da carne e outras que, passado certo pe- riodo, permittem que as rezes sejam pró- prias para o consumo. N'este caso está, por exemplo, a febre aphtosa. É bem claro que esta distincção de doenças só pode ser feita por veterinários e por tanto é urgente que se tomem as precisas providencias. A camará municipal, e só a ella, é que cumpre tomar essas providencias, caben- do-lhe a completa responsabilidade de qualquer caso lamentável que por ventu- ra se tenha de registar. Agora, ao levantar mão do assumpto, temos a pedir: Primeiro — Que os médicos, veteriná- rios e emfim todos os homens competen- tes, estudem a questão e tragam á luz o resultado das suas investigações ; Segundo — Que a Junta de Saúde seja convocada para apresentar em publico a sua auctorisada opinião sobre este mo- mentoso assumpto que traz agitado o es- pirito de grande numero de pessoas; Terceiro — Que a exc.'"* camará no- meie immediatamente, como lhe cumpre, um veterinário que inspeccione as rezes que tiverem de ser abatidas no matadou- ro publico. Assim o esperamos para bem da huma- nidade. Oliveira Juxior. DUAS PALAVRAS SOBRE AGRICULTURA Portugal é um paiz essencialmente agrí- cola. Pela diversidade do seu clima e do seu solo presta-se a diftbrentes géneros do cultura. É sem duvida para estes im- portantes trabalhos que devem convergir principalmente a attenção e os esforços dos habitantes d'este paiz. A agricultura, cujo principal fim c a alimentação do homem e o fornecimento das matérias primas, que a industria apro- veita c transforma para satisfazer as mul- típlices necessidades e exigências da vida humana, é a principal e primeira divisão da industria em geral. O ideal da arte agrícola é a creação do máximo valor na mais pequena porção dada de terreno. Longo estão as sociedades de conseguir esse desideratum talvez irrealisavel ; mas cumpro marchar; porque o estacionamento na agriciUtura é o definhamento da so- ciedade, a miséria e o atraso nas artes, o o abatimento da população, que não JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 91 cresce nem medra ; é emfim a mesquinhez em toda a vida social d'um povo; porque todos os phenomenos da vida social se concatenam. O commercio e a industria alentara a agricultura, e vice-versa: a prosperidade da fabrica anima os campos; e a riqueza d'estes fecunda a industria e o commercio; porque ninguém pode com- prar sem ter valores que dê em troca dos objectos comprados. A Inglaterra é exem- plo vivo d 'esta lei económica: ella, que peja os mai'es com os navios do seu com- mercio, é também a pátria das artes ; e tem elevado a agricultura a um grau de adiantamento, pelo immenso consumo que lhe dá, que raros paizes a egualam e ne- nhuns a excedem. A falta de mercados de consumo este- rilisa a agricultura porque sem lucro não ha incitamento, e o poder productivo da agricultura só se desenvolve em proporção do valor venal de suas producções : e con- sequentemente o augraento de consumo, elevando o valor venal, abre na agricul- tura novo incremento para as suas forças productivas. A pequenez do consumo tem sido, entre outras cousas, uma das que tem contribuido immensamente para o estado de definha- mento, em que jaz a agricultura e horticul- tura na Beira Alta e em Traz-os-Montes. Não tendo mercados para onde dirigissem seus géneros, de nada servia produzir quem não tinha quem lhe comprasse. No vinho, que foi o género de maior consumo, houve ahi pasmoso incremento. A Inglaterra procurou o vinho e imme- diatamente as collinas do Douro se povoa- ram com excellentes vinhedos : e em pouco tempo tantas foram as plantações, que não só se satisfazia ás exigências dos consu- midores, mas até a oíferta excedia o pedido. E hoje o vinho, apesar das difíiculda- des com que lucta pela falta de braços, pelos grandes salários, e apesar do fla- gello do oidium tuckevij, e pela pouca pro- tecção que tem nas pautas inglezas, é o ramo de agricultura, que mais alentado e vasto se mostra entre nós. Praticamente se vê n'isto a influencia do consumo. Sc as lãs, os cereaes, as se- das, as fructas, e outros géneros tivessem tido egual consumo ; a agricultura estaria entre nós mais adiantada. As vias de communicação, ainda em bastante atraso ao norte do reino, já des- envolvem mais o consumo, e aproximam os géneros dos mercados onde são neces- sários. Se continuar este esforço do estado e se as municipalidades derem impulso aos caminhos vicinaes, é de crer que a agri- cultura não deíinhará entre nós pela falta de procura de seus géneros. N'estas condições, com o bom regimen sobre a propriedade do nosso Código Civil, com o melhoramento do nosso systema hypothecario, que faculte com menor dis- pêndio ao proprietário achar dinheiro para as explorações e grangeios dos campos, devem os braços ter avultados salários, e condigno emprego, que os convide a vi- ver no solo pátrio ; e a regeitar a tão per- niciosa emigração para o Brazil que dam- nifica em muito a nossa agricultura, ar- rancando braços validos á nossa pátria, roubando-lhe a maior força productiva, que é o homem. E uma mania, que cumpre para bem da pátria fazer cessar. O génio aventuroso da nossa raça scis- ma achar, atravessando o Atlântico, um El-Dorado nas terras de Santa Cruz. Se- ria curiosa, e para desenganos, a estatis- tica fiel, em que se mostrasse o diminuto numero dos portuguezes, que foram feli- zes com a emigração, e o numero dos que seduzidos por uma imaginaria fortuna ou pereceram desgraçados, ou labutaram em vida de ímprobo trabalho, ralados de nos- talgia, achacados pelas enfermidades, que causa um clima tão diffe rente, e sempre privados do conforto, dos carinhos da fa- milia, que desvela. A emigração é boa para os povos de população superabundante: é então pro- videncial escoadouro para o pauperismo, e para braços sem vantajoso emprego na terra natal. Acontece entre nós o contrario: escas- seiam-nos os factores da riqueza — os bra- ços. Temos grandes plainos e enormes tra- ctos de terreno no Alemtejo, que pedem desbravamento e charrua. A Beira Alta é muito inculta. Traz-os-Montes tem mon- tanhas ásperas como o Marão, que re- clamam ser plantadas de florestas, e nas quaes, como nas montanhas da Suissa e da 9Í JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Escossia, o Aheto, o Larix c outras arvores adequadas ao terreno c ao clima vegeta- riam ahi, creando uma grande mina de riqueza florestal, e saneariam o ar, abri- gando as povoações visinhas da intempé- rie das estações, e preparando os meios para a transformação dos solos ingratos. O districto de Bragança é quasi inculto; vêem-se ahi excellentes collinas que exi- gem a vinha ; e em muitos valles são raras as Amoreiras tão adequadas áquelle solo. A riqueza em gados é relativamente pe- quena ao que devera de ser. Ha também geralmente ignorância dos principies mais elementares de agrono- mia, e os processos agrícolas são muito ro- tineiros. Temos no continente terrenos onde po- demos com prosperidade estabelecer coló- nias, sem nos aventurarmos a soífr r os trabalhos e perigos de vida nos mares e em terras extranhas. Pruduzir muito pela applicação racio- nal do trabalho á terra, já escolhendo as melhores e mais productivas sementes, já fazendo plantações das melhores castas vegetaes em solo e em clima adequado, já empregando os melhores adubos na terra, grangeando, pelos processos mais económi- cos e adiantados da arte, o interesse do agricultor e horticultor: eis afelicidade das povoações agrícolas e dos consummidores. A nossa agricultura pódc, pelo bom re- gimen das nossas leis, e pelo desenvolvi- mento das vias de communicação, que au- gmentam os centros do consumo, adquirir a força e vida de que carece, se o agri- cultor ou horticultor for esclarecido nos melhores processos dç agronomia, e no conhecimento perfeito do abençoado torrão da pátria. As exposições agrícolas, as associações, e a imprensa são os melhores pharoes para dissipar as trevas da ignorância; e ensi- nar ao agricultor a vereda, que tem a se- guir, de modo que a rotina fuja espavo- rida. A vida affricola é amena e saudável: enraíza melhor nos povos as graíides tra- dicções nacionaes, que são parte impor- tante da vida moral d'ura povo. Encon- tra-se no campo o remanso, que não dá o bulício das cidades. No seu melhoramento está hoje a feli- cidade da nossa pátria; o que se pode conseguir com a difusão das luzes e co- nhecimentos económicos e agrícolas ; de modo que as nossas granjas sertanejas se- rão em um dia melhor alumiadas; e a agricultura firmada em boas condições económicas prosperará com um accrescimo de população : e o solo regado com o suor do homem compensará seu trabalho, e ali- mentará uma população forte e sadia ca- paz de trabalhar com a charrua, e de servir a pátria em occasião de perigo. A solução do nosso problema financeiro está no desenvolvimento da nossa agricul- tura, que augmentando a renda pode me- lhor supportar o peso dos impostos, dando meios ao estado para continuação e novo emprehendimento de grandes vias de com- municação e melhoramentos dos portos e leitos de rios, em que se empregam des- pezas productivas. Essas obras de arte são necessidade indeclinável, de que não po- demos prescindir, sem abdicar a civili sa- cão actual. Releva que todos contribuam com o seu esforço para o melhoramento da nossa agricultura; porque vai n'isso o bem estar de todos os concidadãos, e a prosperidade da pátria. Foi com esta esperança, que escreve- mos estas breves considerações. Murça. — B. C. DE Almeida Sampaio. BIBLÍOGRÀPHI Diccionario de Botânica Brazileira ou Com- pendio dos Vegetaes do Brazil, coorde- nado e redigido sobre os escriptos do dr. Arruda da Camará por Joaquim de Almeida Pinto. Rio de Janeiro 1873. lia muito tempo que se fazia sentir a falta de uma publicação sobre a botânica do Brazil. Pouco havia escripto depois da monumental obra de Martins, que o seu elevado preço torna desconhecida de mui- tos; e isso que ainda assim havia era do pequena valia, ou dessiminado por varias publicações periódicas. Poucas floras po- rém merecem tanto a attenção dos homens da sciencia como a brazileira; a riqueza JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 93 do solo e a temperatura do clima tornam aquella região d'uma abundância exce- pcional de vegetaes de toda a espécie. As artes, as industrias e a medicina colhem immensos thesouros, que nenhum outro paiz lhes poderá fornecer. As construcções navaes e civis acham alli as soberbas madeiras do peroba, gem- papo, cicopira-assu, pau d'arco, maçaran- duba, pau ferro, guararoba, genipapinho, pau carga, pau pombo, oiticica, etc, etc. A marceneria colhe o excellente vinhatico, o rico pau setim, jacarandá, etc. As industrias tintureiras aproveitam o pau Brazil, tatajuba, campeche, pau ter- ras grandes e pequenas, anil, urucu, etc. A medicina encontra em cada planta um preparado importante; é fabuloso o que se conta de curas feitas por indige- nas com hervas também indígenas. Não é isto unicamente que torna rica a flora brazileira; pelas mattas e campos cres- cem immensas plantas de formas varia- das, que ao mesmo tempo que fazem a admiração do viajante que as vê, são mo- tivo de valiosas explorações industriaes. Citemos para único exemplo as arvores de que se extrahe a borracha para fazer ideia das preciosidades vegetaes que abun- dam n'aquellas paragens. Os fructos são variados e saborosos : apontaremos a ba- nana, o pão do indígena, o coco, etc. As industrias textís encontram também immensas fibras vegetaes, com que se pode substituir o linho e o algodão. Flora tão rica e tão variada pena é que não seja bem conhecida e devidamente estudada. O commercio lucraria muito com o conhe- cimento perfeito de todas as producções vegetaes d'aquelle paiz. Quantas são ain- da desconhecidas e ignoradas por não te- rem sido ainda estudadas ! A vista d'isto é sempre para estimar qualquer trabalho, ainda que muito insignificante, que nos dê a conhecer os vegetaes brazileiros. Foi pois um importante serviço prestado ás sciencias a publicação corrigida e augmen- tada do «Diccionario de Botânica Brazi- leira» do dr. Arruda da Camará, pelo pharmaceutico Almeida Pinto. Arruda da Camará foi um botânico distincto, a quem as sciencias naturaes brazileiras devem muito pelas suas im- portantes descobertas e escriptos. Grande numero d'estes escriptos, ainda inéditos, eram julgados perdidos; no^numero d'es- tes entrava o presente «Diccionario», quando ultimamente, n'uma compra feita aos herdeiros do defunto botânico, vinha entre outros papeis o manuscripto do «Dic- cionario de Botânica Brazileira». Joaquim d'Almelda Pinto, hábil e estudioso phar- maceutico, emprehendeu immediatamente a sua publicação : o «Diccionario», porém, era bastante difficiente e em alguns arti- gos incompleto. Lançou mãos á obra da sua reforma, e rodeando-se das melhores publicações sobre a flora brazileira, deu á luz uma obra senão sua em parte, com- pletamente reformada, consideravelmente augmentada, e escripta em harmonia com os últimos progressos da sciencia. N'esta publicação tomou também parte notável a Sociedade Vellosiana, associação scien- tifica, que muito tem concorrido para o desenvolvimento das sciencias naturaes no Brazil. O «Diccionario de Botânica Brazileira», forma um excellente volume em 4.°, de 433 paginas, nitidamente impresso. E adornado com 15 bellas lithographias, ou de desenhos do natural representando cerca de 45 plantas raras ou pouco conhe- cidas d' aquella região. Os artigos são escriptos com um cunho scientifico que bem revela os vastos co- nhecimentos botânicos do seu auctor. Prin- cipiam por dar uma descripção completa da planta, o seu emprego e diíferentes de- nominações nas diversas províncias do Império, e as suas propriedades medici- naes e venenosas, e finalmente a sua uti- lidade para as artes e economia domesti- ca. Uma das partes mais importantes, pelo menos aquella que mais apreciamos, pela difficuldade que sempre encontramos em trabalhos de idêntica natureza, é a nomenclatura vulgar que varia sempre d' uma província para outra e ás vezes de logar para logar. Não é nosso intento fazer a critica ao trabalho do pharmaceutico Almeida Pinto, não temos forças bastantes para isso, sir- va por tanto este artigo de simples noti- cia da obra e para aconselhar a sua acqui- sição a todos que se interessem pelo estudo dos vegetaes. 1 A. J. DE Oliveira e Silva. 94 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA APPARELIIOS PARA ESMAGAR O BOLO ALIMENTÍCIO DE LINHAÇA OU TRAÇAR SEMENTE DE ALGODÃO PARA O GADO Os inglezes importam da Itália um re- ' colhido da applicação d'este alimento é siduo, a que chamam bolo de linhaça, e uma boa nutrição do animal, e um estado que costumam dar aos seus gados mistu- j saudável e alegre que muito concorre para rado com a palha. O resultado que teem | uma rápida engorda. Entre nós ainda não 1'--. 21 Fio-. 22 é usado pelo menos que o saibamos; não admira porém, assim como se ignoram as mais elementares operações de cultura ra- cional e económica, não é para notar igno- rância de uma substancia tão importante no prepai'o das comidas para a engorda. ^"Sht ^:^'^^ Fig. 23 Damos em soguida a rápida enumera- ção do machini.smo adoptado para esma- gar o bolo : Fig. 21 — Machina para ser movida por duas pessoas com duas manivelhis appli- Cíidas a esmagar o bolo e traçar toda a qualidade do grão. Fig. 22 — Machina ainda mais forte do que a precedente para ser movida por duas pessoas e com a mesma applicação. Fig. 23 — ^Machina movida a braço sin- gelo, para moer o bolo de linhaça ou se- mente do algodão. A. DE La Rocque. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 95 CINERARIA HYBRIDA É sabido que as Cinerarias, especial- mente as annuaes, se multiplicam por meio das suas numerosas e pequenas se- mentes. Kecommendam os mais notáveis horticultores que deve preferir-se a se- menteira em alfobre em vasos ou em cai- xões, picando depois e transplantando as novas plantas pai-a pequenos vasos, con- servando-as sempre em estufa, sendo este sem duvida o seu melhor cultivo. E esta a regra geral que se deve observar para conseguir plantas frondosas e de flores- cência têmpora. Desejoso todavia de tornar publico o que observei na minha curta pratica e es- cassos conhecimentos, vou dar uma resu- mida ideia do processo, que uso ha annos para a multiplicação das Cinerarias. Em primeiro logar tenho por costume cavar e adubar perfeitamente a terra, di- vidindo-a em pequenos quadros. Lança-se uma camada de terriço puro formado uni- camente de esterco de cavallo. Esta ca- mada deve ter dez a doze centimetros de espessura e deve ser passada pelo crivo. Feito isto em vasos ou era caixas ao ar livre, pois quando fazemos a sementeira em caixas é sem tampas ou outra cobci'- tura, depositamos as sementes no terriço deitando-lhe por cima outra camada do mesmo terriço mas passado por um crivo mais fino. Prefiro fazer as sementeiras ao meio dia ou de manhã. Feita esta operação nos mozes de ju- nho ou julho, deve continuar-se com um bom systema de rega para que não mor- ram os embriões das novas plantas. Além d'isso é preciso ter todo o cuidado com os fortes raios solares, motivo porque cubri- mos os alfobres com esteiras durante as horas de sol ardente, conservando sempre a terra n'uma ligeira humidade. Quando as plantas estão já de tamanho regular transplanto-as para pequenos va- sos, pondo uma só planta em cada vaso e em terriço quasi egual ao das sementeiras, conseguindo por este meio formosas plan- tas e flores têmporas. Os vasos continuam sempre ao ar livre, em sitio abrigado e sombrio, para que es- tejam presei^vados dos ventos fortes, que continuamente reinam n'esta cidade. E isto sufficiente para obter boas plan- tas, que florescem de fins de dezembro a principies de janeiro. Actualmente te- nho-as em flor como se fossem creadas em estufa. Costumo também plantar guarnições, * grupos e bordaduras, que produzem lindo efífeito em toda a primavera e parte do estio. Estes massiços costumam ser mes- clados de Amores perfeitos, Reseda, Pri- maveras e Ranunculos. No nosso clima, que em geral é tão fa- vorável para qualquer classe de vegeta- ção, é vantajoso fazer a sementeira de varias espécies de plantas annuaes em di- versas epochas. Assim pratico, especial- mente com as Cinerarias, que costumo semear desde junho a fevereiro, cobrindo durante a noute as sementeiras feitas em janeiro, do que resulta ter flores em distin- ctas estações. Cadix. Francisco Ghersi. CHRONICA HORTICOLO-AGRICOLA o desenvolvimento de qualquer ramo scientifico n'um paiz, manifesta-so prin- cipalmente pelas publicações especiaes. Não teriamos pois a remontar a muito longe para vermos que a agricultura era completamente descurada até ha bem pou- cos annos em que começou a manifestar- se um certo movimento de publicidade. A Inglaterra ve todos os dias um novo livro de lavoura; a França vê multipli- carem-se os trabalhos sobre a cultura da vinha e a Bélgica — esse paiz das flores - — vê sahir diariamente dos seus prelos os mais importantes trabalhos sobre botânica. No nosso paiz a publicação de um livro de tal ou qual importância sobre agricul- tura é caso para ser noticiado sob a epi- graphe dos acontecimentos e se por ven- tura esse livro consegue passar por uma segunda edição — caso quasi virgem em Portugal — então é mais do que aconteci- mento. 96 JORNAL DE HORTICULTURA TRATICA Alegremo-1108, pois, que a agricultura desenvolve-se e o lavrador já vae conhe- cendo o erro em que laborava tractando as suas terras rotineiramente e hoje não diz como outr'ora : O verdadeiro estudo agrícola é a pratica. Reconheceu que a pratica anda unida por intimo elo á sci- encia e que os livros e o estudo de gabi- nete lhe eram indispensáveis. Entre os nossos escriptores da especia- lidade a que nos dedicamos, ha um que acaba de ver galardoadas as suas horas de assiduo e aturado estudo por maneira bem pouco vulgar. A primeira edição de um livro, embo- ra não tenha merecimento, pode-se fazer, mas para se proceder á sua reimpressão é mister que o publico lhe dê um acolhi- mento unanime. Foi o que succedeu com a «Technologia Rural» do nosso eminente professor, o snr. João Ignacio Ferreira Lapa. A primeira edição feita ainda ha pou- cos annos esgotou-se rápida e completa- mente. O publico entendeu e entendeu bem que à tout seigneur, tout honneur. E é assim que hoje temos o vivo gosto de annunciar a reimpressão de tão estimável obra. O illustrado agrónomo não se limitou, porem, a dar a lume uma reproducção exacta da «Technologia Rural», como o faria outro qualquer auctor mais amigo de mercancias e menos cuidadoso da sua reputação scientifica e dos interesses do povo. Não. O snr. Ferreira Lapa estudou novamente todos os assumptos da sua obra, retocou-os, deu-lhes maior desenvolvimen- to, coordenando tudo o melhor possivel. A primeira parte que é a que temos presente, e que devemos á cordeal amisa- de que nos dispensa o seu auctor, occu- pa-se exclusivamente de productos fer- mentados. Escusado seria portanto dizer- se que é indispensável a todos os vinicul- tores que queiram aperfeiçoar e acreditar 08 seus productos. Um trabalho que sobre modo nos capti- vou e que revela os grandes recursos de que dispõe o snr. Ferreira Lapa, é aquello com que se fecha a obra, e no qual nos ofFereco uma ideia geral da nossa vinicul- tura. Ha aproximadamente dez annos que se deu principio a alguns trabalhos n'e8te sentido. N'esse tempo geria a pasta de mi- nistro das obras publicas o snr. Andrade Corvo. Com a sua sabida do ministério coincidiu interromperem-se os trabalhos já encetados. Esse serviço havia sido confiado ao nosso collaborador e dignissimo reitor da Universidade de Coimbra, o snr. viscon- de de Villa Maior. Os «Estudos prelimi- nares» chegaram a ser impressos e estava o snr. visconde de Villa Maior redigindo a « Ampelographia do paiz vinhateiro do Douro» quando foi suspensa a publicação. Cremos, porem, que apezar da suspensão official, o snr. visconde não levantou com- pletamente a mão do assumpto. Voltemos ao livro do sr. Ferreira Lapa. A ideia geral da vinicultura portugue- za é um estudo tão completo quanto o po- deria ser, n'um paiz em que pouco se tem pensado n'este objecto. O snr. Lapa, con- tudo, estudou e investigou tudo que se tem publicado sobre esta matéria e alliando o seu alto saber e os seus muitos conheci- mentos aos poucos fructos que d'ahi pôde colher, resultou um trabalho novíssimo e de immensa importância pratica. Vemos, pois, que o livro do snr. J. I. Ferreira Lapa não foi escripto só para a estante do agricultor mas sim também para a do negociante que preciza ter co- nhecimento das mui variadas qualidades de vinhos que existem no paiz e dos di- versos tractamentos que é precizo dar-lhes para conservar o cunho do local a que per- tencem. Fallar d'um livro como a «Technologia Rural.» é missão difficil de cumprir porque o seu merecimento e valor estão acima de qualquer critica. — yabe-se desde muito, diz a «Revista de Pharmacia», que o ammoniaco produz bom resultado nas picaduras causadas pe- las vespas, pelas abelhas e pelos besou- ros. O veneno contido no ferrão, que es- tes insectos deixam cravado na parte pi- cada, é neutralisado pelo dito alcali. Como, porém, fora das povoações regu- lares, podo não ser fácil encontrar o so- luto d'ammoniaco para o empregar em ca- sos taes, tornou publico o snr. Dauveme que tem empregado com idêntico resulta- do, não 8Ó em si, mas também era muitas JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 97 outras pessoas, a agua de cal, que facil- mente pode ser preparada nas aldeias, solvendo em agua pequena quantidade de cal auhydra. Ao mesmo tempo que aconselha este seu raethodo, aproveita a occasião para advertir, que o habito geralmente ado- ptado do exercer pressão com um corpo rijo sobre a parte picada é um erro que deve evitar-se, pai'a não introduzir mais profundamente no corpo o ferrão que con- tém o veneno. — Os soffrimentos do snr. visconde de Villa Maior agravaram-se alguma cousa. Desejamos vivamente as suas melhoras. — Da « Correspondência de Coimbra » extractamos a seguinte noticia: BxÍBte em algumas regiões da Lorraine e Bor- gonha, em França, uma planta singular, de raizes tuberosas, que se emprega como alimento da mes- ma forma que a Batata. E' o Lathyrus tuberosus, planta ambulante í' cosmopolita, r|ue nãn tem pátria nem respeita fronteiras. Merece o titulo de judeu errante do reino vegetal, pela forma por que se propaga debaixo da terra. Também é conhecida pelos nomes de Rato e Castanha da terra, pela forma e sabor das suas raizps nogras. Quando a charrua lavra a terra, as creanças acompanhara o arado, colhendo abundantemente o3 tubérculos que vão sendo arrancados, regalan- do-se com elles. Nos mercados da cidade de Lan- gres apparece sempre regular provisão d'esta planta tuberosa. Sendo cultivadas, as suas raizea adquirem dimensões tão consideráveis como a Batata. Os lavradores tem repugnância em culti- var esta planta, porque ella se propaga debaixo da terra por tal forma e em tanta extensão, que invade facilmente os campos visinhos, apresen- tando assim o curioso phenomeno de um verdadei- ro movimento subterrâneo. A esta curiosa noticia temos a accres- centar que Parmentier encontrou n'estes tubérculos grande quantidade de substan- cia amilácea, assucar e uma matéria glu- tinosa; emfim aproximadamente os prin- cípios que contem o froraento e que po- diam entrar no fabrico do pão. Os porcos gostam muito d'estes tubér- culos e elles mesmos se encarregam de extirpal-os do solo. Hoefer faz esta interrogação : Quem sabe até que ponto a cultura do Lathyrus tuberosus poderia ser aperfeiçoada, atten- dendo-se a que debaixo de vários pontos de vista é bem preferível á Batata? A sua introducção em Portugal seria para desejar-se e quando não servisse para o alimento do homem seria óptimo para o dos animaes. — Em Lisboa existe uma bibíiotheca, cuja existência é desconhecida da maior parte das pessoas. Essa bibíiotheca, que ainda se pode considerar em embryão, acha-seinstallada n'um gabinete que ha no passeio publico do Rocio. Ha annos que um dos vereado- res encaiTegado do pelouro da jardinagem teve a feliz ideia de assignar para aquelle gabinete algumas publicações hortícolas. Em seguida tomando posse do mesmo pelouro o snr. Margiochi Júnior, perfilhou aquelle pensamento e tratou de empregar os meios conducentes á realisação dos melhoramentos indispensáveis para que a bibíiotheca não fosse simplesmente uma cousa imaginaria mas sim um recinto de estudo da especialidade a que era desti- nada. E assim que entre outras obras de merecimento se encontram alli algumas Monographias dos principaes géneros e espécies de plantas cultivadas nos jardins, taes como Pelargoniums, Roseiras^ Coní- feras^ Fetos, Orchideas, Palmeiras, etc, etc, reunindo estampas que representam jardins e parques estrangeiros. Um im- portante trabalho que representa a collec- ção completa das plantas topographicas de todos os jardins, squares e alinhamentos de arvores, em Lisboa, está em execução. Andam por setenta e tantos esses planos. Entre outras obras que alli se encon- tram já, poderemos mencionar «Les Co- niferes» de Kirwan, «Les Plantes à feuil- lage ornementale» de Ed. André, «Theorie des Jardins» de B. Ernouf, «Pares et Jardins» de Lefévre e emfim a esplendida obra de Alphand, de que temos fallado por varias vezes n'este jornal — «Les Pro- menades de Paris». — Já que falíamos dos serviços que o snr. Margiochi Júnior está prestando ao desenvolvimento hortícola, proporcionando ao publico um gabinete de leitura espe- cial, não devemos omittir os melhoramen- tos que tem conseguido realisar na jardi- nagem da metrópole. As arvores estão em geral bem cuida- das e não apresentam aquella monstruo- sidade de poda que aqui se vê. Poda â escovinha, como quem corta ca- bello a creanças, só no Porto (vide rua do Triumpho, Batalha, Praça de D. Pe- dro, rua dos Inglezes'etc.). 98 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Os jardins mostram que imi grande passo se tem dado em Lisboa e se elles não estão ainda á altura da importância da cidade nào ha que censurar porque . . . não se vae a Roma n'um dia. Antes isso do que retroceder como estamos vendo na cidade invicta. O Jardim do Príncipe Real, á Patriar- chal Queimada, está na verdade bem soi- giié e lembra-nos já as squares de Londres e os pequenos terrenos junto ao Aterro, na margem do Tejo, estão bem aproveitados e são provas que farte da intelligencia e boa vontade de que dispõe o cavalheiro a cargo de quem está aquelle pelouro, o snr. Francisco Margiochi Júnior. — O snr. José Marques Loureiro offe- receu a Sua Magestade El-Rei o Snr. D. Fernando um exemplar da Musa ensete, que El-Rei se dignou acceitar. Todos sabem que o Snr. D. Fernando é grande apreciador de plantas e que as suas propriedades são dignas de vêr-se debaixo do ponto de vista hortícola. A Musa etisete é uma das mais valio- sas introducções que a horticultura tem feito nos últimos annos. Em Bordéus existe ura exemplar bas- tante forte. O tronco mede 3™, 78 de cir- cumferencia. — A casa Rothschild acaba de editar as seguintes publicações — «Art de Planter», «Le Cheval», «La pluie» e «Aménage- ment». Mais de espaço fallaremos d'esta8 pu- blicações. — Extractamos do «Archivo Rural» a seguinte noticia que deve interessar aos nossos viticultores e que aquella excellente folha publicou no seu fascículo correspon- dente á primeira quinzena de março. Alguns amigos meus toem apreciado muito o vinho palhete que uso, com alguns ânuos, e sem aguardente; ouvindo mesmo dizer, que o snr. An- tónio Batalha Reis a elle se referira para compro- var o bom resultado de fazer passar o vinho pelo oalor: isto animou-me a levar ao conhecimento do "Archivo Rural" o systema que tenho usado, e cujo bom resultado assevero. E' de todos sabido que o vinho deve ser mudado e limpo até fevereiro, o engarrafado só depois do passar por elle o se- gundo janeiro; a limpeza, e sú a aguardente ne- cessária para molhar a madeira da vasilha, para onde se passa, é bastante para o conservar em casa adequada para isto. Engarrafado o vinho, e passado sobre as rolhas um barbante, se mettem as garrafas em agua fria, dentro d"uma vasilha, que ao lume se aquece até 70 graus, e então se tira do lume até arrefecer (para evitar que as garrafas estalem) e se apontam as rolhas, quo a eToluçâo do vinho possa ter expulsado do seu logar. E' ne- cessario que as garrafas fiquem immersas na agua, desviadas do fundo e lado da vasilha, e umas das outras; o que bem se consegue indo dentro d'um cesto, ou de muitos modos. Em 1866 li que o vinho contém certos parasitas vegetaes que corrompem, 6 que extinctos estes pelo calor, o vinho se con- serva puro, e melhora com o tempo, desenvolvendo eguaes qualidades apreciáveis. N'esta operação al- guma garrafa se perde, 2 a 4 por 100; porém uti- líssima descoberta é para quem pretende bom vi- nho, velho e saudável, sem aguardente. Assiru tenho usado desde 1866, e usarei emquanto não apparecer mais fácil e proficuo meio, pois me tem dado os melhores resultados, especialmente nos vinhos da Bairrada, e freguezia de Mogofores, Ar- cos, e Avelãs. E' certo que isto só se pode fazjr para pequenas quantidades; mas bem se pode d'aqui deduzir que a raachina, que dê o mesmo ca- lor a grandes quantidades de vinho, será um gran- de melhoramento. Omitto algumas minuciosidades, por conheci- das, e necessaiúas para obter bom vinho. Entrego isto ao papel, sem pretençâo, e para que se faça d'elle o uso que aprouver. Lisboa, 19 de fevereiro de 1874. J. Caldeira Pinto Albuquerque. — Os ventos lestes que dominaram nos melados do mez passado, causaram algum prejuizo á agricultura. As arvores fructi- feras mostram-se, porém, bem carregadas e se não vier algum contratempo teremos um^ anno abundante em fructas. É prodigioso ver-se a quantidade de fructos que tem os Damasqueiros. Nunca viramos uma fructificação tão abundante. — Por motivos de politica teve o nosso collaborador Mr. Jules Meil de deixar o logar que occupava em Sevilha, de dire- ctor dos passeios públicos. Sentimos. — Disserara-nos que vae ser entregue a el-rei o Jardim Botânico d' Ajuda, pro- priedade da casa real e que tem estado sob a direcção da eschola polytechnica. Também ouvimos dizer que será no- meado para director d'aquelle jardim, o snr. Luiz de Mello Breyner, uma das pessoas que conhecemos maia dedicada ao culto de Flora. A ser assim, é uma acertada nomeação. — Do Mr. Alégatière, horticultor em Montplaisir, Lyon, recebemos um cata- logo exclusivo de Cravvs e de Pelargo- nhnns. Tanto de um género como de outro possuo o snr. Alégatière primorosas col- lecções. Eis o seu endereço: à Montplaisir, Lyon (Rhone), chemin de Sant Priest. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 99 — Aos amadores de plantas menos vul- gares recommendamos o Ranuncido Tur- han veridiflora. É uma das mais recentes introducções do estabelecimento Loureiro. A flor d'este Ranúnculo^ que é grande, tem as primeiras ordens de pétalas ver- melhas com estrias amarellas d'ouro ; es- tas vão alargando de modo que a cor amarella vem substituir a primeira fican- do as pétalas com estreitas estrias de ver- melho. Ao aproximar-se do centro estas cores vão desapparecendo e transforman- do-se as pétalas em verde. No centro for- ma, pois, o que os horticultores chamam olho verde. Ha muitos Ranunculos que teem esta particularidade, mas não conhecemos ne- nhum que a tenha tão bem caracterisada. Tome o leitor nota do nome d'este Ra- núnculo para o pedir na estação pró- pria. — Do BoUetim da Sociedade de Acli- mação extractamos o seguinte : O Rhodo- dendron de Oregon e da Califórnia septen- trional, R. califomicum^ foi introduzido na Inglaterra por 1850 pouco mais ou menos, mas então ninguém lhe prestava grande attenção nem grande estima. Um imminente horticultor de Sumingdabe, Mr. Noble, foi quasi que o único que se serviu d'elle para a hybridação. Dos seus ensaios nasceu uma bella es- pécie de Rhododendron que se pode hoje recommendar e que guarnece muito me- lhor do que o Rhododendron ponticum tão largamente empregado. Além d'isso não dá os rebentões tardios d'este ultimo, que são muitas vezes prejudiciaes á planta; as suas flores são também d'uma cor do rosa mais viva, e é mais vigoroso. Em summa é uma boa acquisição que os nossos jardins devem á America. — A « lllustration Horticole» publica agora uma edição no idioma inglez. — Dous dos exeplares maiores da Arati- caria excelsa, que existem no Jardim Bo- tânico de Coimbra, apresentaram este anno pela primeira vez algumas pinhas. Umas são femininas e outras masculinas e vae-se proceder á fecundação artificial para haver mais probabilidades de se obter um bom numero de sementes que possam germinar. — O Instituto agrícola de Catalan de S. Isidoro, levou á presença do governo da republica uma representação em que se pedia para serem tomadas as medidas precisas a obstar que se importe de Fran- ça cepas, que por ventura poderão ser o meio da introducção do Phylloxera vas- iatrixj em Hespanha. — Está annunciada para o dia 11 do corrente mez a abertura de uma grande exposição internacional de horticultura em Florença. Pelos prémios destinados aos exposito- res poder-se-ha calcular o que deverá ser esta festa. Serão conferidas 100 medalhas de ouro, 221 de prata, 131 de bronze, prémios especiaes para os jardineiros, 5 prémios d'honra do rei de Itália, prémios do ministério d' agricultura, das damas protectoras da província e da cidade de Florença, não esquecendo ainda duas me- dalhas no valor de 500 francos cada uma, offerecidas pelo príncipe Paul Demidoff e outra por Mr. Parlatore para a mais bella coUecção de Nepenthes. — Formou- se ultimamente em Cincin- nati uma Sociedade d' Aclimação que tem por fim principalmente crear aves notá- veis pelo seu canto e preciosos serviços que podem prestar aos lavradores e hor- ticultores. Na primavera passada, a Sociedade gastou nada menos de 25:000 francos para educar cerca de quinze espécies de diffe- rentes aves. Aclimou já também a Ca- lhandra da Europa, que hoje se vê em bandos numerosos nas visinhanças de Cin- cinnati. Actualmente a Sociedade tracta de acli- mar e espalhar o Melharuco, que faz uma destruição notável nos insectos prejudi- ciaes á vegetação. — Congratulemo-nos ! Por uma carta particular recebida de Melbourne, por um nosso amigo, sabemos que o barão Ferd. von Mueller não lar- gara a direcção do Jardim Botânico, como havíamos dito e alguns jornaes estrangei- ros annunciaram. Antes assim. O que é certo, porem, é que o notável botânico tem sido victima de muita pecuinha como geralmente o são todos os homens de talento. E costume não se faz caso. 100 JORNAL DE HORTICULTUrvA PRATICA — j\[r. Frederic Roux apresentou á 8o- ' ciedade helvética das sciencias naturaes, [ na sessão do 1873, amostras de duas plan- 1 tas textis, o Alfa ou títipa tenacíssima^ l G-ramine.a vivace muito abundante na Hes- ' panha e especialmente na Argélia, dando logar desde 1870 a um importante com- mercio e alimentando grandes fabricas de , papel inglezas ; mas é especialmente para ' a Asclepia syriaca, que Mr. Roux pre- tende chamar a attenção dos cultivado- 1 res, pois que poder-se-hia facilmente acli- mar na Suissa, tornando-se uma acquisi- ' (;iío preciosa para a industria. ! Introduzida ha alguns annos em Nyons, na propriedade de Mr. Roux, propagou- ' se mui rapidamente mesmo n'uma grande camada de entulho, apesar dos cuida- 1 dos que se tinham tomado para a extir- ! par. j A A. Syriaca é oriunda da America ' do Norte e não da Syria como o seu no- 1 me^o fez crer. j É uma planta vivace, cujas hastes an- 1 nuaes, herbáceas, crescem até seis pés. I Estas hastes, além de terem a grossura de duas ou três do Canamo, apresentam I uma camada de tecido fibroso proporcio- j nalmente mais forte, e so < stabelecermos um parallelo entre estas duas plantas ve- j remos que a vantagem está do lado da Asclepia. Com eíFeito o Canamo , planta annual, dioica, exige para a sua cultura bom terreno, muitos cuidados e adubos ; produz hastes relativamente delgadas co- bertas d'uma camada de fibras muito del- gadas também, e além d'isso a sua se- mente é nua. A Asclepia, é uma planta vivace, muito rústica, hermaphrodita, desenvolvendo-se quasi sem cuidado de adubos, nos terre- nos pedregosos, impróprios para outras culturas; fornece ura precioso alimento ás abelhas, as suas hastes são cobertas por uma espessa camada de tecido fibroso e finalmente nos corutilhos sedosos das se- mentes proporciona-nos uma excellente e valiosa matéria para encher almofadas e travesseiros. K mais uma cultura a ensaiar no nosso paiz, onde abundam infelizmente tantos terrenos inciUtos. Aos nossos leitores em geral, e especialmente aos que hab tam as províncias do Alemtejo e Algarve, re- commcndamos estas duas plantas, certos de que seria talvez um beneficio para as suas propriedades incultas e áridas, ter- renos que a Asclepia Syriaca e Stipa te- nacíssima parece procurarem de prefe- rencia. A semente é fácil de obter-se em qualquer horticultor francez ou belga. — Recebemos ha dias o Relatório do presidente da camará d'Arouca no bien- nio de 1872-1873. Percorremol-o e vamos dar um pequeno extracto da parte concernente á arbori sa- cão. O viveiro, que começáramos no biénio findo, foi continuado, e já está completamente cheio o ter- reno de que dispúnhamos que infelizmente é pe- queno. N'elle como sabeis, apenas cultivamos a Amoreira: nem a pequena extensão do terreno comportava muitas variedades, nem o nosso fim era cultivar varias espécies d'ars-orea. A preferen- cia que demos á cultura da Amoreira está assas justificada pela importância que esta espécie tem não só como arvore d'ornamento, mas, e muitissi- mo mais, como arvore indispensável para a crea- ção do sirgo, e producção da seda, pois o nosso fim era e ó promover esta industria no concelho, que me parece apropriadíssimo para ella, tanto pela feracidade do solo, como pela posição topo- graphica. Para janeiro poderemos plantar, tirados do vi- veiro, 1:500 a 2:000 pés de Amoreiras. Nâo tem ap- parecido requisições particulares pedindo Amorei- rat para plantar. Portanto devemos empregal-as em orlar os 5:500 metros d' estrada construida, e o resto ou será exposto á venda por módico preço, ou distribuído como á camará melhor parecer. Applaudimos a ideia do digno presi- dente, o sur. Nunes Saldanha, e folgaria- mos em ver o numero das arvores dos viveiros multiplicado por uma cifra bem mais elevada. — E ainda debaixo do mais profundo sentimento, que pegamos na ponna para dar uma triste noticia aos nossos leitores. O nosso estimável collaborador e amigo o snr. A. Luso da Silva, o incansável ex- plorador, que os nossos leitores conhecem pelo seu trabalho sobre o Herbario cry- ptogamico do Porto e seus arrebaldes, acaba de fracturar uma perna. O snr. A. Luso ia para casa d'um seu amigo, onde tencionava passar alguns dias entregue aos seus trabalhos de exploraçíio, quando lhe aconteceu a lamentável desgraça que acabamos de registrar. Que o nosso amigo se restabeleça depressa, e continue no culto d'uma sciencia onde já occupa um logar muito distincto, são os votos que n'esta occasiao sinceramente fazemos. Oliveira Júnior, JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 101 JACARANDÁ MIMOSAEFOLIA o Jacarandá mimosaefoUa é uma ar- vore de mediana grandeza, cujas folhas bipennadas téem todo o mimo e elegância da folhagem da Rabinia. As flores, ino- doras, d'azul violeta, formam paniculas extremamente graciosas. Requer boa es- tufa temperada ou quente e multiplica-se por estaca em terra aquecida. Escreve isto o «Bon Jardinier» do anno de 1868. Direi o que me tem ensinado a expe- riência. Tenho dous exemplares vindos de Inglaterra com altura inferior a um metro, Fiff. 21 — Jacarandá mimosaefoUa — Desenhado no Horto Loureiro ha 18 annos, plantados n'um pequeno jar- dim na rua do Caldeira, um com expo- sição ao norte, e o outro ao sul, e flores- ceram ambos ha 10 annos. O segundo tem 9 metros e meio d'altura, e o primeiro pouco mais de 8; a circumferencia do tronco do segundo é de meio metro ; a copa d'ambos tem dous terços da altura. VoL V— 1874. Tenho um terceiro exemplar, vindo do Porto, do snr. Loureiro, ha 7 annos, tam- bém inferior a um metro, já tem 7 metros e meio d' altura, e também dous terços da altura na circumferencia da copa ; o tron- co ainda é pouco robusto e carece d'am- paro. Floresceu ha 4 annos, e no mesmo anno deu semente em largas capsulas, que jS^.o 6 — Junho. 102 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA nasceu abundantemente nas minhas estu- fas, nas do snr. José Martinho de Luce- na, nas do snr. duque do Loulé, e, se- gundo me consta, na dos snrs. duques de Palmella, cujo jardineiro, Mr. Jacob, me pediu uma das capsulas da semente, que mandou para Pariz, como primeira obtida ao ar livre na Europa. Aquelles dous ro- bustos exemplares do Jacarandá^ que hoje téem 18 annos, e florescem ha 10, somente ha 3 annos apresentaram as sementes, que est'outro já dava no anno anterior. Esta precocidade parece-me que só podo attri- buir-se á melhor posição do terreno em que está plantado inteiramente abrigado do norte. Tenho distribuído alguns exemplares, nascidos ha 2 e 3 annos ao snr. Palha, para a quinta do Dafundo; ao snr. con- selheiro Moraes Soares, para o Bussaco; ao snr. Loureiro, para o Porto; ao snr. conselheiro Fernandes Coelho, para a Fi- gueira; ao snr. José Ignacio Machado, para S. Miguel ; ao snr. visconde de Sea- bra, para a Bairrada, e ao snr. Joaquim Júlio Pereira do Carvalho, para Coimbra. Ignoro se tem prosperado. Entendo que, sendo abrigados do norte, hão de trium- phar da estação fria. Inquestionavelmente o Jacarandá é uma das mais lindas e graciosas arvores que se conhecem; quasi todo o anno conserva a bellissima folha- gem, floresce na primavera abundante- mente o algumas vezes no outomno. Não irei mais por diante e o que escre- vo digo-o como posso, porque desconheço todas as noções da sciencia a que per- tence este objecto, da qual sou meramente amador. Lisboa. J. J. DOS Reis Vasconcellos. YmHÀS AMERICANAS No primeiro do corrente anno teve lo- gar era Nimes, na sociedade de agricul- tura do Gard, uma interessante conferen- cia sobre as Videiras americanas, para as quaes, no meio dia da França, muitos olham como sendo a única esperança de salvação da viticultura d'aquella, ainda ha pouco, tão prospera região, o hoje tão atribulada pelos estragos que nas suas Vi- nhas se manifestam, e que muitos attri- buem á invasão do Phylloxera. Foi conferente o snr. Lehardy de Beau- lieu, proprietário viticultor em Augusta (Geórgia) no sul dos Estados Unidus, e como tal muito habilitado para discorrer sobre este assumpto. Parecendo-me que os leitores do «Jor- nal do Horticultura Pratica», que se inte- ressam por tudo quanto respeita á viticul- tura, receberiam com agrado uma breve noticia do objecto tractado n'aquella con- ferencia, quiz logo enviar a esse jornal um extracto da communicação que o dr. G. Brouzet, secretario geral da sociedade de agricultura do Gai-d, fez ao publico, e que mo foi enviada de Nimes, porém as minhas occupaçoes não m'o pennittiram então. Todavia creio que ainda não será demasiadamente tarde para cumprir este meu desejo, visto que ainda os nossos jor- naes agrícolas não deram noticia d'aquella conferencia. Com esta breve desculpa, en- tro na matéria. Cultivam-se na America diversas cas- tas de Videiras pertencentes a espécies diversas da nossa Vitis vinifera — a Cu- ningham, a Clinton, a Nortoii, a Herbe- mont, a Concord, a Diana, a Isabella, a Catawhaj a Hartford, a lano, a Seuppe- nony, a Mustang, a Thomas, a Flower, etc. Entre estas castas o snr. Lehardy cha- mou a attenção dos viticultores para um grupo de Videiras pouco conhecidas na Europa, e que, nas presentes circumstan- cias, elle julga aptas para determinarem a regeneração dos vinhedos exhaustos por uma cultura que data de muitos séculos. Os botânicos dão a esse grupo ou a essa espécie o nome do Vitis vulpina ou roton- difolia. Distingue-se elle de todos os ou- tros por differenças bem características, e das quaes a mais importante é sem du- vida, o seu vigor primitivo, pois resiste a todos os ataques dos parasitas e das doenças. Caracterisa-o ainda uma extraor- dinária fecundidade, favorecida pela flo- rescência tardia (de maio a junho) e pelo seu considerável desenvolvimento e expan- ção vegetativa. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 103 Não é raro encontrar, principalmente nos terrenos de aluvião, cepas de vinte centimetros de diâmetro, cujos ramos tre- pam aos topes das mais altas arvores das florestas americanas. As suas varas são numerosas, longas e delgadas. Produzem excessivo numero de cachos, mas estes apenas contéem de 23 a 25 bagos, cujo maior diâmetro mede ordinariamente 85 millimetros. O grande numero dos cachos e a grandeza dos seus bagos compensam amplamente a sua pequenez relativa. Esta Videira é polygamo-dioica e não se reproduz por estaca. As sementeiras também não dão bons resultados, porque o maior numero das plantas, que d'ellas nascem, são masculinas e por isso estéreis. E só por mergulhia que se propaga. Uma bem notável circumstancia apre- senta esta Videira ; é a de não ser sus- ceptivel de poda como as outras Videiras. Cresce até se exgotar, e o seu vigor é tal que despensaria a poda, ainda quando d'ella fosse susceptível, porque todos os annos se carrega de fructo sem parecer fatigar-se. A variedade mais notável do grupo vul- 2)ina foi ha mais de dous séculos encon- trada pelos primeiros colonos na Carolina do Norte, não longe do litoral sobre as margens do rio Scuppernong, d'onde lhe veio o nome pelo qual é agora designada entre os viticultores americanos. A variedade Scuppernong distingue-se das outras do mesmo typo por dar uvas brancas : o seu crescimento é mais rápido e mais vigoroso: é também a mais pro- ductiva de todo o grupo. O seu fructo, quando maduro, apresenta uma cor que varia entre a de Chasselas dourado^ e a côr do bronze amarellado. O sueco é in- color, vinoso, muito doce e com excellente aroma. Faz-se com elle um vinho branco superior, o qual, com a adicção de assu- car ou aguardente, pode fazer concorrên- cia aos vmhos brancos de Hespanha pre- feridos pelos inglezes e americanos. As outras variedades cultivadas do gru- po Vulpina são, pela ordem do seu mé- rito, a Floioer, a Thornas, e a Fender Pulp, que dão vinhos tintos; porém ne- nhuma d'ellas parece merecer tanta con- sideração como a Scuppjernong , e por isso só reproduzirei aqui o que a respeito da sua cultura disse o snr. Lehardy. Parece que a natureza do solo não exer- ce uma grande influencia sobre as Videi- ras vuljnnas^ porque por toda a parte se encontram viçosas e luxuriantes. Nas alu- viões ricas de matérias orgânicas e junto dos rios adquirem proporções collossaes. Uma única ramada de Scuppernong (afíir- ma o snr. Lehardy) pode cobrir três he- ctares de terreno e produzir mais de 50 hectolitros de vinho ! ! ! — Aqui, seja dito de passagem, ha seguramente exaggera- ção, ou para mais na superfície, ou para menos na producção — O caso é, que em consequência do grande desenvolvimento d'esta Videira a primeira necessidade da sua cultura é fazer a plantação muito es- paçada, e os cultivadores americanos des- tinam para cada cepa de 6 a 10 metros de superfície, segundo a fertilidade do solo. A sua propagação faz-se, como já fica dito, unicamente por mergulhia. Uma planta d'esta natureza não pode ser erguida senão lançando-a sobre arvo- res de grande porte, ou em grandes ra- madas. Durante os três primeiros annos basta-lhe um forte tutor : depois coUo- cam-se quatro postes em torno da Videira, formando quadrado cujo lado seja de 3 metros, e unem-se estes quatro postes na sua parte superior por travessas, consti- tuindo assim uma ramada, em que se de- bruçam as varas, e que nos annos seguin- tes se vae alargando pela coUocaçao de novos postes. A poda de todas as variedades da Vul- pina não se faz nem se pode fazer em secco, como a das outras Videiras, por que ellas a não supportam. Limita-se, pois, este serviço a supprimir os rebentos, que sahem do pé, ou os que estão mal collo- cados, e isto em quanto dura a vegetação de maio a outubro, e cortam-se também os velhos sarmentos exhaustos, ou que são embaraçosos. A cultura da terra é também necessá- ria, principalmente nos primeiros annos. A vindima faz-se de um modo singular. Quando as uvas estão completamente ma- duras, sacodem-se as parreiras sobre os pannos, que se estendem por debaixo das ramadas, e os bagos cahem sobre elles, e se apanham, como nós fazemos na colheita da azeitona. Outros formam com a lona, I pregada a um caixilho de madeira, e com 104 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA uma abertura no centro, uma espécie de grande funil ou canoura^ tendo por baixo da abertura um ban-il ou caixa para onde os bagos, cahidos na lona, se dirigem. Com esto processo seis homens recolhera por dia 352 hectolitros do fructo. Cada hectolitro de fructo dá de 24 a 25 litros de mosto, sem pressão, e com este se faz o primeiro vinho, mas do bagaço se tira ainda a mesma quantidade d'um segundo mosto, ao qual se ajunta assucar ou álcool para lhe dar na vinificação a força que exigem os consumidores americanos. Limito a estas resumidas indicaçSes o extracto que fiz da conferencia do snr. Lehai'dy de Beaiúieu, e aproveito a occa- siSo para recommendar aos que desejam ter alguma noticia da viticultura que se vac desenvolvendo nos Estados Unidos da America, a leitura de um excellente ar- tigo que o sm\ Planchon publicou ulti- mamente na «Revista dos dois Mundos». Coimbra. Visconde de Villa Maior. BÍBLIOGRAPHIA LES ROSES PAR H. JAMAIN ET E. FORNEY A casa editora de Mr. .T. Rothschild, de Pariz, acaba de dar a lume em es- plendida edição um livro com o titulo «Les Roses» devido á penna do roseirista H. Jamain et do professor d'arboricultura E. Forney e acompanhado de um prefacio de Charles Naudin, membro do Instituto de França. Do segundo auctor d'esta publicação, Mr. Forney, já era bem conhecido o seu livro intitulado «LaTaille du Rosier», que poucos amadores deixarão de possuir. O novo livro, cujo titulo se lô na epi- graphe d'esta noticia, ^io preencher ple- namente a lacuna, que se dava na biblio- theca dos especialistas de rosas que não são já em numero diminuto no nosso paiz, porquanto, além de nos ensinar a cultura e tractamento que este arbusto requer, con- tém bellissimas estampas chromolithogra- phadas, representando sessenta varieda- des escolhidas entre as mais notáveis. O gosto pelas rosas, que data sem du- vida das epochas mais remotas visto que os livros santos já fazem menção d'ellas, não se apagou, antes se avivou nos tem- pos modernos, pois que são sempre as flo- res da moda, as flores por excellencia dos poetas o das damas, as flores da realeza e do povo. Os poetas têem-n'as cantado em todos 08 idiomas e com razão alguém disso que A Rosa é tias flores A flor e rainha fundado no que dizia Sapho: «Se Júpiter quizesse dar uma rainha ás flores, a Rosa seria essa rainha». EUa é o ornamento da terra, o brilho das plantas, o olho das flores, o esmalte dos prados, uma belleza incomparável, accrescenta ainda a grande poetisa grega. Anacreonte pretendia que a rosa era o doce perfume exhalado da bocca dos deu- ses ; a alegria dos simples mortaes ; o mais bello ornamento das graças na estação flo- rida dos amores. Um poeta moderno, Parny, conta assim a fabulada origem da rosa : Lorsque Vénus, sortant dn sein des mera, Sourit aux dicux charmes de sa présence, Un nouveau joiír éclaira Tunivers, Dans ce raomeut la Rose prit naissance. Mas para que havemos de escrever a historia da rosa? Ella é de per si tão cheia de formosura, que não necessita que a ve- nham encarecer. Tem a frescura que é a mocidade, tem o perfume que é o quer que seja de espirito, que evola da alma singu- lar que se abriga nas suas pétalas. Ora quem tem formosura e espirito, quem tem o viço da mocidade, quem desabrocha no seio das mulheres, quem sorri nos esplen- dores dos bailes, quem coroa a borda das taças, escusa das cortesias dos poetas e não se lhe importa morrer pendente d'uma trança nas doudcjantes voltas d'uma cho- reia lasciva. O livro do que nos vimos occupando é como um hcrbario de folhas de setim. Po- do-se ter no quarto do estado, junto do JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 105 leito dca sesta, no chalet do horticultor e sobre a jardineira da sala de espera. Foi sempre norma dos bons livros o obedecerem ao preceito de Horácio, o reu- nirem o útil com o agradável. MJM. Ja- main e Forney assim o comprehenderam e Mr. J. Rothschild assim o executou. Quem não possuir um jardim, terá n'este livro, perpetuamente, a florescência das rosas. Não lhes gosará o perfume, mas deleitar-se-ha no seu porte, na sua ele- gância, no seu viço e no colorido mimoso das suas pétalas. Aqui está toda a vai*ie- dade e mimo de cores, desde o mais bri- lhante e garrido até o mais doce, o mais terno, o mais insinuante. Estas não são como as rosas de Malher- be que vivem uma só manhã. O pincel do artista venceu a natiu'eza, mas apesar d'isso poderemos exclamar : Viva a natu- reza e a arte ! Oliveira Júnior. ÁS SETE DIVISÕES DICOTYLEDONEAS Parece-me ser esta a divisão, do que devo primeiro tractar, não só por ser a que mais familiar se nos apresenta, por isso que o geral das plantas nos nossos climas, a ella pertencem; mas também por ser a divisão que encerra as plantas mais perfeitas, e cuja vitalidade excede as das outras divisões, geralmente fallando, contando a vida, não por annos mas por séculos, havendo exemplares que, ao que parece, eram collossos, no tempo dos ro- manos, com todas as apparencias de vi- talidade, por muitas centenas de annos ainda. Emquanto que as Monocotyledo- neas vegetam por um, ou dous séculos, o máximo ; ellas prolongam a vida pela ra- zão de que aquellas são Endogeneas, quer dizer, que crescem, augmentando o seu volume exteriormente j e portanto tornam- 86 de facto plantas novas todos os annos. Para melhor intelligencia do que vou dizer, rogo aos meus leitores, que tomem um pinhão descascado, que, embora per- tença a outra divisão, é familiar, e de- monstra bem, o que quero explicar. Abrin- do-o com um canivete, de alto a baixo, com cuidado, tirar-se-ha do centro um pi- nheiro em miniatura; a parte inferior ou ponte-aguda, chama-se a radicula, que quer dizer a raiz pequena, e a parte su- perior formada de diversas secções cha- ma-se cotyledones, ou folhas embryonarias; no centro d'estas ha uma protuberância, que é a plumula ou tronco insipiente. A parte que se cortou e se poz de lado cha- ma-se albumen. Ha sementes que toem o albumen, c outras que o não tem. As sementes d'esta divisão téem duas folhas embryonareas ou cotyledones, e é esta a razão porque se chamam Dicotoly- doneas, emquanto que as Monocotyledo- neas téem somente uma folha embryona- ria. Creio que os meus leitores ficam agora sabendo a diagnose (se me é peróiittida esta palavra) principal d'esta grande di- visão. A esta particularidade acrescem porém outras. O embryão (a tal plantinha ou pinhei- rinho) antes de germinar consiste em ge- ral em uma massa cellular, sem vestígios de tecidos ligneos ou vasculares, porém, logo que a germinação tem principio, umas finissimas cordas ligneas dimanam dos cotyledones para a radicula encontrando- se no centro do embryão, e formando o eixo ou centro da raiz. Estas cordas li- gneas augmentam confoinne ás partes con- vém, e introduzindo-se na massa cellular do embryão ficam separadas por esta parte cellular, depois apparece a plumula, con- vertida em um troncosinho, com suas fo- lhas, d'estas folhas dimanam mais cordas ligneas, que, descendo, se juntam com as creadas dos cotyledones, formando junc- ção com esta primeira madeira, e a au- gmentam. Estas cordas ligneas, que desceram das folhas, não se juntam no centro do tron- co, mas passam parallelas pela parte de foraj, formando um cylindro, cujo inte- rior consiste em tecido cellular ou me- dula ; não se juntando no centro, senão quando chegam ás cordas ligneas, que di- manai'am dos cotyledones, a fim de formar 106 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA O centro solido da raiz, e assim vae con- tinuando o crescimento da planta, sempre deixando ura centro de massa cellular e unindo-se como as primeiras, ao chegar á linha vital para augmontar a raiz. D'este modo, augmentando o tronco e a raiz reciprocamente, formam camada sobre camada, mas sempre atravessada pelos raios da medula central. A lútima ou mais moderna camada exterior cha- ma-se camhium e as interiores ou mais antigas lenho. O cambium é a parte viscosa, que fica entre o lenho e o liber, ou casca mais moderna, que é formado por parte das cordas ligneas, que descem das folhas, por entre o cambium. Esta c a formação normal d'esta grande divisão, que fica bem demonstrada no arvoredo de qual- quer quinta. Ha porém suas anomalias, como algumas AristolockiaSj que parecem ter somente uma roda, ou circido de ma- deira, mesmo nas velhas plantas, e por este modo, outras anomalias, porém a base ab- soluta serão os raios medulares que se dis- tinguem sempre mais ou menos, pois não me vem á mente planta que não as tenha com mais um ou outro accessorio, pois como disse já, natura non facit saltus. Outra distincção diz respeito ás folhas, cujas nervuras são reticulares, ou em for- ma de rede, articuladas mais ou menos com o tronco, não formando, por assim dizer, parte d'elle e terem muitas vezes, estipulas ou folhinhas ao pé da articula- ção. Também ha uma circumstancia, mui attendivel, que vem a ser as flores terem nas suas partes a base de quatro ou cinco, e nunca de três, como por exemplo, a flor do Martyrio (Passiflora) cuja base é cinco. Quando se falia de base quatro, ou base cinco, quer dizer que a flor consiste de quatro, oito, dezeseis, pétalas, quatro, oito, dezeseis sepalas, estames etc, ou de cinco, dez, vinte sepalas, pétalas, etc. As Monocotyledoneas tem por base, em geral, três, seis, etc, como o Lyrio que tem três pétalas, três sepalas, etc. Estudando esta divisão surgem duas divisões de plantas, que muitos jidgam á primeira vista pertencerem a esta divisão: as Gymnosper^iuaSj, e as Didysgeneas. Lisboa. ^ri i' ' \ (CwitinuaJ. D. J. DE Nautet Monteiro. SANSEYERIA CYLINDRICA Aos amadores de plantas esquisitas recomraendamos a Sanseveria cylindrica como uma das mais notáveis pela sua forma pouco \'idgar e estranha. Este gé- nero é composto de cerca de 15 espebies, a maior parte ainda desconhecidas e não introduzidas na cultura. São plantas acau- les, ou antes de haste espessa e subterrâ- nea, prostrada e prolifera. As folhas são radicaes, muito variadas na forma, e manchadas de verde claro so- bre verde mais carregado. A inflorescen- cia é em cachos e assimilha-se muito á das Dracaenas. A S. cylindrica cresce naturalmente em Zanzibar, onde forma fortes massiços que dão ao paiz um aspecto original. As suas folhas attingera o tamanho d'um metro, são muito âexivcis, mas d'uma rigidez a toda a prova, a ponto de servirem em al- gumas colónias de chicote para os escra- vos e criminosos ! Seja-nos permittido ob- servar de passagem que as não fez para isto a natureza. Esta planta, sendo de fácil cultura, pode tomar logar nas estufas quentes ou tem- peradas, onde muitas vezes chega a ter as mesmas proporções que no seu paiz na- tal. Quando está forte e florida é d'uma rara elegância; podendo dispor-se nas jardi- neiras de sala, onde as suas flores esbran- quiçadas lavadas de rosa produzirão bel- lissimo efteito. Esta espécie encontra-se facilmente nos horticultores do Porto, acompanhada qua- si sempre d' uma outra : a Sanseveria Guineensis. A. J. DE Oliveira e Silva. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 107 RUSCUS ACULEATUS Horridioi* rusco VIRG. ECL. YII. Entre as plantas indígenas da Europa é o Ruscics aculeatus uma das mais or- namentaes e interessantes, e bastante di- gna de figurar nos massiços e sebes viva- zes dos jardins de inverno. A sua rusticidade e os pouquíssimos cuidados que exige são circumstancias que parece deviam contribuir bastante para a sua existência nos jardins dos amadores; Fig. 25 — Rusous aculeatus comtudo poucos são os que se dignam dar-lhe algum apreço, e que a cultivam como planta de ornamento. A causa de tão grande desprezo, que até aqui se lhe tem votado, só a attribui- mos a ser facillima a sua acquisição, ou então á condição humilde do seu expon- tâneo nascimento. O género Ruscus forma um grupo com- posto de quatro plantas pertencentes á familia das LiliaceaSj tribu das Âsperra- gineas, cujos caracteres são os seguintes: arbustos de folhas alternas, simples e mem- branosas. Ramos bem desenvolvidos e fo- liciformes. Flores hermaphroditas ou dioi- cas por aborto. Cálice de seis divisões sol- tas até á base. Três estames e três anthe- ras. Ovário com três lojas, contendo cada 108 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA uma dous óvulos. Estylete muito curto e estigmatico. Fructo pouco carnudo con- tendo duas sementes, o polpa adocicada e desagradável. A mais conhecida de todas as espécies é o Rusciis aculiatus (fig. 25), chamada vulgarmente Gilbarheira^ que forma um bonito arbusto de 1 metro cie altura sobre 0,™50 de diâmetro pouco mais ou menos. Fructitica no lim do outomno e conser- va os íVuctos at'í ao principio da prima- vera, consistindo n'isto o seu principal merecimento, pois é na epocha em que nos jardins só reina a monotonia, que o Eus- ciis nos encanta a vista com a sua luxuo- sa fructiíicaçào. As flores sào pequenas, brancas, de pouco effeito e solitárias. Nascem do meio das folhas bem como os fructos que são do tamanho d'uma cereja, e d'um encar- nado vivíssimo. Cada fructo contém duas sementes encontrando-se algumas vezes, por aborto, imia somente. Segundo affirma De Candolle, as se- mentes do Huscus sao a primeira succe- danea do café, pois encerram em si um aroma tão delicado que immensas pessoas se téem enganado com cilas. Tanto os fructos como os rhisomas d'esta planta possuem propriedades diuréticas, e eram empregadas com vantagem na an- tiga medicina. Da cultura própria do Ruscus pouco ou nada temos a dizer ; todo o terreno ar- gilo-silicioso c secco lhe é conveniente. Mul- tiplica-se de semente, ou pela divisão dos rhisomas, obtendo-se do primeiro modo de operar muito melhores resultados. Lisboa. A. M. L. DE Carvalho. NOTICIA BIO&RAPHICA DR. JOSÉ DE SÁ FERREIEA SANTOS DO VALLE Filho de Manoel José dos Santos, o dr. José de Sá Ferreira Santos do Valle nas- ceu em Santarém a 27 de outubro de 1772, no anno e mez da Reforma dos Estatutos da Universidade de Coimbra, decretada por El-Rei D. José, promovida e eôe- ctuada pelo seu grande ministro, o Mar- quez de Pombal ; e recebeu de seus pães esmerada educação civil, religiosa e litte- raria. Em 1788 entrou para a real congrega- ção dos Agostinhos reformados, onde to- mou o nome de fi-. José da Piedade. Seguindo os estudos, mostrou logo tanta aptidão e talento, que a ordem o mandou para o seu collogio de Coimbra. Fez os exames preparatórios, e enti'ou na Uni- versidade, frequentando a faculdade de philosophia, onde se doutorou em 25 de julho de 1800. Obteve o despacho de demonstrador em 17 de outubro de 1807. Em 20 de novembro de 1816 foi pro- movido a lente substituto, e em 12 de agosto de 1822 a cathedratico com excr- cicio na cadeira de botânica c agricultura. Por carta regia do 12 de dezembro de 18.37 foi nomcailo decano e lente de pri- ma da faculdade. Prestou importantes serviços na ordem religiosa a que pertencia antes de secula- risar-se. Regeu cadeiras de theologia, de philosophia racional e moral e de geome- tria em Coimbra, Setúbal, Extremoz e Portalegre. Grangeou distincta fama de orador sagrado, pregando muitas vezes com grandes applausos e acceitação nas terras já mencionadas. Groveraou por muitos an- nos o collegio da sua ordem em Coimbra. O dr. José de Sá foi vogal do conselho superior de instrucção publica desde a sua instituição. Obteve a carta de conselho e a commenda da Ordem de Christo, não só pelos seus serviços, mas também pelo direito que tinha a estas condecorações como decano da faculdade. Mereceu a honra de ser eleito deputado ás curtes ordinárias de 1822 e ás extraor- dinárias de 1834. Desde junho de 1828 emigrou para Londres, Pariz e Bruxel- las, regressando a Lisboa em setembro' do 1843. Por decreto de 26 de maio de 183Õ foi nomeado director do real museu o Jardim Botânico da Ajuda, em Lisboa, commissão que abandonou para exercer o logar de decano e lente de prima da fa- culdade de pliilosophia e de professor de botânica. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 109 Serviu dè presidente na commissão en- carregada de redigir o código florestal: concluido este importante trabalho, foi presente ás cortes e revisto por uma com- missão especial em março de 1849. Este projecto de lei, ofterecido n'esta epoclia á sancção legislativa, depois de algumas al- terações não chegou a ser approvado. Desempenhou o distincto professor ou- tras commissões e pertenceu a varias as- sociações litterarias e scientificas. No ma- gistério a sua palavra não era menos elo- quente que na tribuna sagrada; e na di- recção do Jardim Botânico de Coimbra prestou muitos serviços na classificação das escliolas e na boa ordem do estabele- cimento. Permaneceu, porém, pouco tem- po no serviço da Universidade, porque os trabalhos do código florestal o chamavam frequentes vezes a Lisboa, onde residia a maior parte do tempo. Deixou importantes manuscriptos, prin- cipalmente em instrucção publica, em bo- tânica e agricultura, e numerosa collec- ção de sermões, que tudo religiosamente conserva seu sobrinho, o actual conselhei- ro do supremo tribunal de justiça, o snr. Visconde de Alves de Sá, em cuja casa falleceu a 21 de dezembro de 1854. Coimbra. J, A. Simões de Carvalho. ALGUMAS PALAVRAS ACERCA DO MODO COMO SE DEVEM FAZER E TRACTAR AS SEMENTEIRAS Em primeiro logar devé-se ter todo o escrúpulo na escolha das sementes, para que não só tenhamos a certeza de que ellas podem germinar; mas para que fiquemos egualmente inteirados de que são ellas as verdadeiras sementes das plantas que ten- cionamos cultivar. Para isto o melhor é, todas as .vezes que possa ser, fazermos nós mesmos a colheita das sementes, ou quando queiramos ter plantas de indivi- dues que não cultivamos, é sempre conve- niente ver se as podemos obter d'algum amigo ou de estabelecimento de credito re- conhecido. Depois de colhermos as sementes é sem- pre conveniente deixal-as por algum tem- po dentro do pericarpo n'um logar bem ventilado, mas aonde lhe não dê o sol, a fim de que ellas attinjam o perfeito es- tado de maduração. Mais tarde, depois de estarem debu- lhadas e limpas, devem-se guardar em pe- quenas saccas de linho, ou ainda melhor em frascos de vidro tapados; e em uma casa nem demasiadamente quente nem fria. A força germinativa das sementes é muito variável. A experiência tem mos- trado que de sementes antigas se obtém plantas mais fracas, mas que são aquellas que dão flores mais dobradas, como por exemplo acontece nos Goivos, Astersj Bal- saminaSj etc. ; assim como as que produ- zem fructos melhores e mais saborosos, como nos Melões, Pepinos, etc. Quando queremos avaliar se as sementes muito velhas ainda estão no caso de ger- minar, experimenta-se do modo seguinte : Envolvc-se uma pequena quantidade de sementes n'um trapo de linho, e deixam- se estar mergulhadas n'um vaso que deve conter uma dissolução de agua com azo- tato de potassa, chloreto de sodium, ou acido oxalico, na proporção de uma parte de qualquer d'estas substancias para 100 d'agua pura. Também podemos uzar com vantagem d'uma solução pouco concen- trada do chloro em agua. Se as sementes em contacto com alguma d'estas solu- ções pelo espaço de 12 a 24 horas, e em logar quente, não germinarem, é porque com certeza perderam completamente toda a sua força germinativa. E conveniente que as sementes morosas em germinar, como são as Eesedas, se deitem em agua pura até que germinem. Depois d'isto é que se semeiam, mas no acto da semen- teira devem misturar-se com alguma areia fina e bem secca para melhor se poderem espalhar. Algumas Leguminosas são bastante re- beldes em germinarem como as Gledits- cJtias, Cereis e algumas espécies de Acá- cias, mas pode evitar-se este inconveniente macerando as sementes durante dous ou três dias em uma solução de sulphato de cobre. 110 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA As Tílias são talvez de todas as plan- tas europeas as que custara mais a nascer, levam muitas vezes dous annos, e por- tanto logo que se colham as suas sementes, devem-se guardar até á epocha própria n'um vaso misturadas com serradura que esteja sempre húmida. Assim consegue-se muitas vezes que cilas nasçam logo pas- sado o primeiro anno. As sementes no acto de se lançarem na terra devem ser espalhadas com inter- vallos umas das outras, para que as no- vas plantas se possam bem desenvolver. Este processo deverá ser feito por tempo sereno para ellas não irem cahir em sitio impróprio. A camada de terra que se deita para co- brir as sementes deve ser em harmonia com a grandeza d'ellas. Para sementes meu- das como são as das Eesecla, DelpMniums 6 em geral de quasi todas as Myrtaceas, basta uma cobertura de terra de 1 a 2 millimetros e quando sejam porém um pouco maiores, como as do Eucalyptus glo- hulus, Cupressus glauca, Convolvidiis tri- color, etc. deve ser de 3 a 4 millimetros e assim successivamente, conforme a gran- deza das sementes até 4 a 6 centimetros de altura. Quando as sementes forem muito meu- das, como por exemplo as da Primula au- ricula, Rhododendrons, etc, não devem ser cobertas, mas só levemente conchega- das á terra com uma pequena taboa bem desempenada e depois cobertas com uma camada de musgo. Este deve conservar-se sempre húmido, devendo retirar-se quando começarem a nascer as sementes. A epocha de fazer as sementeiras varia muito. Muitas sementes deverão ser se- meadas logo em seguida á colheita, como por exemplo as Laranjeiras, Magnólias, Liriodendrons, etc. ; outras é quasi indif- ferente a epocha do anno em que se se- meiam, como as Iridias, Amaryllideas, Cannaceas, Euphorhias, etc. As sementes d'algumas arvores e plan- tas vivazes que se conservam por muito tempo na terra até que nasçam como são as Gleditschias, Rohinias, Cereis, Paeo- nias, Liliums, Daphnes, Dictamnus, etc, devem ser semeadas no outomno cobrindo- se a superfície da terra com folhas ou musgo por causa da geada ; emquanto que aquel- las que germinarem com facilidade pode- rão ser semeadas em março e abril. As plantas bisannuaes, semeando-se em agosto e resguardando-as com o devido cuidado do calor, técm a vantagem de flo- rescerem mais cedo no anno seguinte. Aquellas que podem soffrcr com as gea- das transplantam-se para vasos a fim de poderem ser abrigadas nos chassis ou em qualquer outro sitio que as proteja. Na primavera podem-se então plantar no chão. As flores de verão semeiam-se em mar- ço e abril em pequenos canteiros ou ter- rinas conforme o cuidado de que carecem, mas deve notar-se que entre eUas ha al- gumas que devem ser semeadas difiniti- vamente nos legares aonde tenham de ficar, pois com difficuldade se deixam transplantar, taes são, as Papavers, Lu- pinus, Delphiniums, etc. Ha algumas sementes de flores de ve- rão que resistem bem entre nós ao inverno e essas podem com vantagem também se- mear-se no outomno; pois, como germi- nam cedo, antecipam a sua florescência e dão flores mais perfeitas. Entre ellas po- dem-se contar alguns : Delphiniums, Pa- pavers, Gilias, Collinsias, Collomias, Clar- kias, Nemophilas, Adónis, Calliopsis, etc. As plantas que florescem na primavera são semeadas no outomno. As sementeiras das plantas de estufa devem-se fazer de preferencia na prima- vera, a não ser as annuaes que se fazem no outomno. Tanto umas como outras se- meiam-se em terrinas ou vasos e deve-se conservar nas estufas um gráo de calor appropriado ao clima d'onde são oriundas. Torna-se também necessário resguardal-as dos raios solares e ventilar as estufas du- rante as horas em que a temperatura ex- terna estiver mais elevada. Para estas sementeiras é costume haver estufas próprias, nas quaes se fazem tam- bém as reproducç3es por estacas, folhas, etc. Em todas as sementeiras não devemos nunca deixar seccar de todo a superficie da terra, sendo conveniente tel-as de mar- ço em deante a meia luz. A rega deve ser feita com regador pequeno c que a agua passe por um crivo o mais fino pos- sível. Coimbra. — Adolpho F. Moller. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 111 APPLICiCiO DO ADUBO CHÍMICO Á HORTICULTURA DE ORNAMENTO Conferencia feita no jardim de aclimação, no dia 9 de julho de 1872, pelo dr. Jeannel. I No conjuncto harmonioso dos seres, os vegetaes representam o papel de intermé- dios aos reinos mineral e animal: o reino mineral é a natureza prima da sua orga- nisação, como elles são em si mesmos a matéria prima da organisação animal ; em outros termos, os vegetaes nutrem-se de mineraes, e os animaes nutrem-se de ve- getaes. Mas de que mineraes se nutrem os vegetaes? A analyse elementar desco- bre quatorze, cuja lista é a seguinte. To- mo por exemplo o Trigo, servindo-me para isso da analyse de Mr. G. Ville : princípios constituintes DO TKIGO (Palha e grão) Por 100 Carbono Hydrogenio. Oxygenio 47,69 ■ 5,54 40,32 93,55 Silicia Acido sulph. Magnesia.... Soda Chloro Oxido de fer. Manganez .... Acido sulph. Azote Potassa Cal 2,75 0,31 0,20 0,09 0,03 0,006 ? 1,60^ 0,45 0,66 0,20^ 3,386 - PROVENIÊNCIA 'Da atmosphera debai- xo da forma de aci- do carbónico e agua. O acido carbónico, ab- sorvido pelas folhas é decomposto sob a in- fluencia da luz; o car- bono é assimilado, e o oxigénio solta-se. A agua é absorvida pe- las raizes e subsidia- riamente pelas folhas; uma parte combina- secom o carbono para formar os tecidos, os órgãos, os liquides vi- vos, etc. 'Do solo, onde existem quasi todos em quan- tidades sufficientes ; são além d'isso ar- rastados pelas aguas de irrigação ou re- ga. 3,00 ' O azote provém da at- mosphera (Legumino- sas), e sobre tudo do so]o(amaior parte das plantas), onde muitas vezes falta ; o acido phosphorico, a potassa e a cal, do solo ou das aguas de irrigação, mas muitas vezes não existindo alli, são ab- sorvidos com a agua pelas raizes. Todos estes elementos, ou a maior parte d'elles, dever-se-hão encontrar reunidos nos adubos, que são as substancias solidas ou liquidas destinadas á alimentação ar- tificial das plantas. Examinemos o adubo de quinteiro, que podemos considerar como typo dos adubos. Eis aqui a composição, que transcrevo ainda do trabalho de Mr. Gr. Ville. COMPOSIÇÃO DO ADUBO DE QUINTEIRO Por 100 Total 99,936 Agua Carbone Hydrogenio.. Oxigénio Silicia Oxido de fer. Chloro Acido sulph. Magnesia Soda Azote Acido phosp. . Potassa Cal 80 ■13,29< Principalmente no es- tado de fibra lenhosa que se desfaz em hú- mus. 5,07 Reunidos em combina- ções que se destroem } pela fermentação pú- trida e se resolvem em saes maia ou.me- 1,64 nos solúveis. Total 100,00 A arte da cultura das plantas fez im- mensos progressos desde o dia em que Mr. Boussingault escreveu, ao dar conta das suas experiências sobre a vegetação dos Helianthus: «Para cada equivalente de azote assimilado, a planta fixa um equi- valente de potassa. . . . Não é necessário ajuntar ao solo uma matéria orgânica pu- trescivel («Journal de pharmacie et de chi- mie», 1856, pag. 271). De feito tinha-se julgado até então que a vegetação exigia uma espécie de fer- mentação, a putrefacção lenta de certos elementos do solo; o dia em que se reco- nheceu que a planta absorvia pura e sim- plesmente elementos mineraes e que não era necessário juntar ao solo uma matéria orgânica putrescivel, a theoria deu um grande passo, e principiou a pratica dos adubos chimicos. Mediante estas observações, a compo- sição elementar do esterco oíferece um in- teresse capital, pois indica em que con- siste o valor real d'aquelle e a natureza dos elementos que é preciso dar ás plan- tas para o substituir. Passemos em revista os diversos elementos do esterco. 112 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 1.° A agua que humedece o esterco na proporção de 80 por 100 nSo representa nenhum papel particular ; augmcnta inu- tilmente o volume e o peso d'este esterco. 2.' A libra lenhosa (13 por lOOj em si nada apresenta também de nutriente; mas converte-se pouco a pouco cm húmus, cujo papel é fornecer ás raízes ura assento esponjoso no qual cilas se enlaçam e mul- tiplicam, possuindo além d'isso a proprie- dade, que comparte com a argilla, de re- ter momentaneamente os saes nutritivos e abandonal-os pouco a pouco á agua das regas. 3.° A silicia, o oxido de ferro, o chloro, o acido sulphurico, a magnesia e a soda são necessárias, em proporções deseguaes, á constituição das diversas plantas. Mas as magnificas experiências de Mr. Gr. Ville pozeram bem patente um facto muito im- jjortante (vide «Entretiens agricoles», 1867 e 1868) : é que estas substancias existem quasi sempre em quantidades sufficientes em todos os solos ainda nos mais estéreis. Pela minha parte accrescento ainda que se encontram todos ou quasi todos nas aguas que correm á superfície do solo, na agua commum de que nos servimos para regar as plantas. Por consequência, são elementos com que tanto o agricultor co- mo o horticultor se não devem preoccu- par. Peço comtudo um momento da vossa attenção sobre o ferro, cuja ausência pro- duz a descoloração, o estiolamento nas plantas como produz a chlorose nos ani- maes. Um millesimo de sulphato de ferro ora dissolução cura maravilhosamente o es- tiolomento das plantas, segundo os curio- sos estudos de Mr. Gris, assira como a chlo- rose na espécie humana. (Vide «Bolletim da Sociedade de Aclimação», julho 1862). Em quanto ás plantas creadas em va- sos e postas em regiraen de alimentação artificial, de que brevemente fallarei, dão- se sempre bem com uma certa dose de sal ferruginoso. O solo cm que ellas se acham plantadas pode não ter ferro, e muitas ve- zes as aguas de rega não lhe levam o pre- ciso d'este alimento essencial. 4.° O azote, o acido phosphorico, a po- tassa e a cal, principios que existem na dose de 3 por 100 no Trigo, o que faltam sempre mais ou menos nos solos estéreis, areentos, esgotados, não figuram no adubo senão por 1,64 por 100. E pois verdade dizcr-sc que 1,64 d"uma mistura conve- niente de saes azotados, de potassa, de acido phosphorico e cal, equivale a 100 de adubo de quinteiro, e deve produzir . os mesmos eífeitos sobre as plantas que vegetam era solo estéril. E ainda necessário notar que as maté- rias azotadas do esterco não se tornam próprias para a alimentação das plantas senão depois de tei'em supportado a fer- mentação pútrida, durante a qual uma notável porção de azote se desenvolve na atmosphera no estado de azote livre ou no estado de gaz ammoniaco. Avalia-se em 30 por 100 da riqueza em azote a perda que soíFre d'este agente o adubo de quin- teiro enterrado na terra. Demais, e este ponto é capital, se se procura activar a vegetação pela adicção d'uma grande quantidade de matéria ani- mal ou de esterco, o calor produzido pela fermentação, ou ainda a propagação da putrefacção, destroem as raizes órgãos de absorpção muito delicados, e a planta morre. Os saes mineraes, que a analyse chimi- ca descobre no esterco, e que provém não da decomposição do esterco no solo, mas das fabricas de productos chimicos, não' teriara seguramente os graves inconve- nientes que acabo de assignalar : com elles não haveriam volumes de pesos inúteis, nem mau cheiro, nem fermentação pútri- da, nem calor destruidor; mas teriam a mesma acção fertilisante? A esta questão é que a experiência res- ponde. Ponho debaixo da vossa vista as expei-iencias hortícolas principiadas ape- nas ha dous mezes por Mr. Quilhou na es- tufa d'este jardira, e alguns especiraens de experiências tentadas por mim mesmo em Pariz ha mais de quinze mezes nos meus aposentos. Cada uma das plantas cultivadas no Jardim de aclimação existia, em três exem- plares exactamente similhantes, nodia 2 de maio de 1872, quando a experiência principiou. N." 1 Cultura em areia; ís.° 2 Cultura em terriço; N.° 3 Cultura em areia, com adicção àe adubo mineral solúvel. Todas as plantas JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 113 tas eram regadas com agua commum, e os vasos repousavam em pratos para evi- tar a perda dos princípios nutritivos. Podeis julgar do resultado obtido pelas Begónias^ Milho, Aveia, ^ Salvia cardi- nalis, Traclescantia virginicaj Pelargo- nium zonale, Fuchsia, etc. Os Milhos, na areia regada com adubo mineral solúvel, eram enormes; eram pelo menos três ve- zes mais desenvolvidos que os que vege- tavam no terriço. O Pelargonium zonale era pelo menos duas vezes mais bello e es- tava mais florido do que o que vegetava no terriço. As outras plantas demonstram, supposto que em menor grau, pela belleza da sua folhagem d'um verde sombrio e pelo brilho das suas flores, a superioridade da cultura na areia regada com adubo mineral. O Baviòii foi a única excepção ; o novo regimen não lhe conveio, prova- velmente era a silicia que lhe fazia falta. As experiências principiadas por mim ha quinze mezes, supposto que menos me- thodicas, não são todavia menos demons- trativas. O solo regado com adubo mine- ral não se esgota jamais; dá-se-lhe diaria- mente o que a planta lhe leva, de sorte que não é possivel prever a que dimensões chegariam certas plantas assim cultiva- das, mesmo em vasos de dimensões relati- vamente muito pequenas. Eis aqui n'um vaso da capacidade de 3 litros, uma Tradescancia virginica, que não foi mudada de terra ha quinze mezes ; forma um tufo do mais brilhante verde que não tem menos de 1,"'6 de compri- mento sobre O, '"8 de largura. Eis aqui uma Hera que, depois de ter esgotada a terra do um vaso de litro e meio no qual está plantada, chegou ao ul- timo grau de marasmo. Foi alimentada com adubo mineral solúvel, desde o 1.° de fevereiro ultimo, n'um quarto não aque- cido : podeis ver que lançou cinco ou seis rebentões bem afolhados de mais de l,"*õ de comprimento. Em fim eis aqui três Arum italicum, todos três em areia e em vasos de vidro não furados. O n.° o, que está muito mais desenvolvido, recebeu todas as semanas uma abundante ração de saes nutritivos. Notae que estes Arum estão em vasos tapados; é uma innovação que pode tor- nar-se muito interessante para a horticul- tura caseira. Eis aqui agora uma serie completa de plantas de jardim em dous exemplares, em pequenos vasos de reproducção (Pe- tunias, Verónicas, Coleus, Begónias, Fu- chsias, etc), que nós plantamos aqui no outomno passado. Observae o bello des- envolvimento das que tem o n." 1 : são as que receberam adubo; estão n'este regi- men unicamente ha um mez. Em resumo, as plantas cultivadas em areia ou em terra esgotada, com adicção de adubo mineral solúvel, levam grande vantagem, e muita, salvo o Bambu, sobre as plantas cultivadas em terriço. Na gran- de cultura acontece o mesmo : o adubo mineral oíferece frequentes vezes rendi- mentos muito superiores aos que dá o es- terco. (Vide Gr. Ville, «Resultats obtenus en 1868»), Em quanto ás plantas culti- vadas em areia ou em terra exausta sem adubo mineral, são rachiticas e miserá- veis, assim como era de esperar. fContinúaJ. A. J. DE Oliveira e Silva. PLANTA PARA ABRIGO o Anthocercis picta é sem duvida a me- lhor planta para abrigos dos pomares de Laranjeiras, e dos jardins. As plantas que servem para este fim são muito estimadas e precisas. Geralmente usam para os abrigos Lou- 1 As Aveias na ai-eia, depois de terem vegetado sob a influoacia de adubos, não forneceram semen- tes; mas ellas tinham habitado uma estufa onde a temperatura se tinha tornado excessiva no meio do verão. reiros, Cannas, etc, porém estas téem o inconveniente de perder as folhas e ser cortadas nos mezes em que os abrigos são mais necessários. Os Loureiros são de um desenvolvi- mento muito moroso, emquanto que o An- thocercis cresce rápido e torna-se muito compacto, principalmente sendo aparado, porque se presta muito bem ao corte. Re- siste aos maiores frios e geadas e prospera em todos os terrenos. 114 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Ainda tem outro grande merecimento, que é dar-se admiravelmente á beira mar, legar em que tào poucas arvores se sus- tentam, e onde tào precisas são para o abrigo d'outras plantas e até das habita- ções. Na Figueira, perto do mar, encontram- se muitas d'e8tas arvores em differentes propriedades formando o abrigo de poma- res, jardins, etc, em logares aonde outras arvores vegetam mal, emquanto que esta está sempre verde e viçosa, mesmo no ri- gor do frio. Era uma propriedade do snr. António Dias Nestorio, distincto amador do plan- tas, é para ver e admirar a verdura, a es- pessura e o tamanho da sebe que o Ântho- cercis forma. As suas tlores nâo sào appa- ratosas, mas, ainda que pequenas, quando estando desabrochadas em grande quanti- dade fazem um lindo effeito. A sua cor de um branco sujo com um toque lilaz, so- bresae excellentemente no meio das folhas d' um verde claro. A sua folhagem é no- tável, não só pela cor, mas por ser car- nuda, toda coberta de pontos brancos. Cor- tada uma folha e vista á luz é de uma transparência notável. Não conhecemos outra folhagem de eífeito egual. Ha muitos annos que cultivamos esta arvore, ainda que em pequena escala, mas hoje que tão útil se torna será cultivada em maior numero e por preço mais ra- soavel, para os que precisarem de grande quantidade. Também serve como arvore para praças, alamedas etc, etc. No nosso estabeleci- mento tem-se elevado a 8 metros d'altura, mas temol-as visto era Lisboa, onde se en- contram milhares, com a altura de mais de 12 metros, e muito copadas. Keproduz-se facilmente por meio d'al- porque (^cortiço) e mesmo por estaca com alguns cuidados debaixo d'um abrigo; e logo que estão enraizadas, colloca-se cada uma era seu vaso para alli serem criadas ; porque se forem arrancadas dos viveiros para serem plantadas nos seus logares poucas são as que pegam. Aproveitamos a occasião de dizer que as Verbenas se dão bem perto do mar e que são lindissimas para vestir os cantei- ros, sendo matizadas com as differentes cores que hoje ha. Outra linda planta, que se dá á beira mar é o Chrysanthemum fru- tescens. Eleva-se á altura de mais de O'", 50 ; a sua folhagem é bonita todo o anno, e mesmo no rigor do inverno, co- bre-se de ílores que são de lindo eíFeito pela grande quantidade. íSeria imperdoável, fazendo esta rápida innumeração, esquecer a Centauria mari- tiritcij que, como o nome bem o dá a enten- der, prefere as praias. José Marques Loureiro. LINK E A UNIVERSIDADE DE COIMBRA o conde de HoíFmansegg, amador dis- tincto e instruido na historia natural, que- rendo fazer, em 1797 e 1798, uma via- gem a Portugal, e desejando ser acompa- nhado de um homem de lettras, versado na botânica e na mineralogia, escolheu para esse fim a Mr. Link. Embarcaram ambos em Hamburgo, no verão de 17ít7, e chegando a Calais, atra- vessaram era seguida a França e a Hes- panha, at('í entrarera om Portugal. Percorrerara este reino durante o anno de 1798, a fim de fazerem collecções para uma Flora do paiz; e tendo Mr. Link de deixar Portugal, cm razão das suas func- ções académicas na universidade do Kos- tock, embarcou era 1799 para Fahnouth e Londres, regressando em seguida a Ham- burgo. O conde de Hofímansegg, ainda permaneceu mais algum tempo em Por- tugal. Chegando Mr. Link ao seu paiz, ahi publicou em aliem ão as impressões da sua viagem as quaes no anno de 1803 foram traduzidas em francez e impressas em Pa- riz, com o titulo de — «Voyage en Portu- gal, depuis 1797 jusqu'en 1799». Lm dos capitules do primeiro volume tem por titulo — «Coimbre: son univer- sitó». Ahi dá noticia da cidade e dos estudos d'ella; e como acontece a quasi todos os estrangeiros, que escrevem acerca de Por- tugal, a par de muitas apreciações ver- dadeiras, faz algumas outras inexactas. Teremos occasião de fazer vários ex- JORJÍAL DE HORTICULTURA PRATICA 115 tractos do que diz Mr. Link. Hoje, porém, limitamo-nos a transcrever o que elle diz acerca de alguns estabelecimentos da Uni- versidade, assim como a apreciação que faz de alguns lentes. «Ha no extincto collegio dos jesuitas, que Pombal tinha dado á Universidade, muitos estabelecimentos públicos. Este col- legio está situado na parte superior, como todos aquelles que fazem parte da Uni- versidade. «O seu gabinete de historia natural é pouco considerável, e não contém senão muito poucas cousas notáveis. Foi classi- ficado pelo anterior director Vandelli, se- gundo o systema de Linneu. Mas a col- lecção de instrumentos de physica é pre- ciosa: ha muitos feitos em Inglaterra. Aquelles que foram construídos em Por- tugal são, pela maior parte, feitos de ma- deira do Brazil, e dourados. Esta collec- ção é em geral uma das mais brilhantes; e o gabinete é precioso por tudo o que pertence á mechanica ; mas é muito pobre em machinas eléctricas. «O laboratório de chimica é egualmente bom, vasto e bem alumiado. Além de tudo o que pertence a um laboratório, existem também ahi instrumentos pneu- máticos e uma colleção de apparelhos chi- micos, segundo a nova nomenclatura an- tiphlogistica; assim como uma collecção de instrumentos de cirurgia. «A bibliotheca publica está estabelecida em uma egreja, que, no interior, teve poucas mudanças. Não julgamos bem de uma bibliotheca, quando não podemos per- correr o seu catalogo. O numero dos vo- lumes é considerável, e julgando pelo que diz o professor de botânica, Brotero, ha n'ella muitos livros novos, de que os estu- dantes fazem um grande uso. «O observatório é bem construído e bem situado na parte superior da cidade; é commodo e bem distribuído, mas faltam- Ihe muitos instrumentos. «O jardim das plantas não é muito vas- to, e as estufas são pequenas; mas pelos cuidados do director do jardim o dr. Fé- lix de Avelar Brotero, professor de bota- tanica, este estabelecimento foi superior- mente bem arranjado. Este jardim é mais interessante do que o jardim do rei em Lisboa. «Acha-se em cada planta uma etique- ta, sobre a qual está designado o nome, distribuição similhante á do Jardim das Plantas de Pariz, do qual, á primeira vis- ta, se julga reconhecer uma parte. Além de muitas plantas exóticas, acha-se ahi uma collecção notável das de Portugal, as quaes o digno director observou com mui- to cuidado, e que descreveu. É certo que nenhum amador de historia natural visi- tará este jardim sem fructo e sem prazer. «Seja como for, os estatutos da Universi- dade de Coimbra não são para desprezar. Seguindo a opinião de juizes competentes, ella é preferível a todas as universidades de Hespanha, sem mesmo exceptuar a de Salamanca. Ha na AUemanha muitas uni- versidades, que relativamente aos estatu- tos, não valem esta, que ordinariamente é desprezada. «Tomei conhecimento com muitos pro- fessores ; mas não me pertence julgar do mérito d' aquelles que cultivam sciencias differentes d'aquellas a que me dedico. Achei entre elles espirites perspicazes e vivos, que a polidez portugueza tornava ainda mais amáveis. Conhecem a littera- tura franceza e ingleza. Pretender que elles conheçam a nossa, sei'ia exigir mui- to, mesmo de um inglez ou francez. (Contimia). J. Martins de Carvalho. CHRONICâ HORTICOLO-AGRICOLi A pretexto da exposição vinícola de Londres, o «Journal Vinicole» julga cu- rioso publicar uma noticia dos vinhos por- tuguezes, noticia que a pedido do dire- ctor do jornal lhe fora remettida, no tempo da exposição universal de Pariz de 1867, pelo snr. visconde de Villa Maior, da com- missão portugueza. É como segue; «A situação geographica de Portugal, o clima, a configuração do solo e a cons- tituição geológica das differentes regiões agrologicas d'este paiz são extremamente favoráveis á cultura da vinha. Os vinhedos mais notáveis de Portugal estão quasi todos representados na Expo- sição, 116 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 1.° Os vinhedos das margens do Douro produzem o vinho conhecido pelo nome de vinho do Porto, do nome da cidade onde principalmente se commerceia n'este vinho. Os vinhos do Porto ou do Douro sao muito alcoólicos, com certa doçura, muito aromáticos, melhorando successivamente com 08 annos e conservando-se mais d'um século. Preparam-se por meio d'um processo especial e pela addiçào de aguardente em seguida á primeira fermentação. Na ex- posição sao notáveis, entre outros, os vi- nhos do D. António A. Ferreira, da quinta do Vesúvio, os de Rebello Valente, da quinta do Naval, os de Mourão, de Alijó, e os de Almeida Campos, etc. 2.° Os vinhedos da Bairrada, que produ- zem vinhos tintos e brancos muito alcoó- licos, preparados á maneira do Douro. 8âo muito carregados, mas nno téem um caracter bem diiinido nem o perfume dos do Porto. Sobresahem os vinhos de Fernando Af- fonso, de Cantanhede, e os de Nestorio Dias, da Figueira. 3.' Nos arredores de Lisboa e na Extre- madura, n'um raio de GO kilometros, sào importantissimos os vinliedos de Collarcs, Torres, Bucellas, Cartaxo e Carcavellos, ao norte do Tejo e os do Lavradio e Se- túbal, ao sul. Os vinhos de CoUares são geralmente tintos, pouco alcoólicos (de 8 a 9 graus), seccos, suaves e de excellente gosto para pasto. Estão representados pelos vinhos dos snrs. Dejante & C.'* Os vinhos do Torres e do Cartaxo, que abastecem a maior parte do, consumo de Lisboa, são tintos, carregados, um pouco pesados, mas de bom consumo. Os vinhos de Bucellas são em geral brancos, leves, bem feitos, ligeiramente gazosos c vivos. Podem-se comparar ao vinho de Chablis, ou para melhor, são in- termediários entro os Chablis e us ordi- nários do Khcno. Os vinhos de Bucellas estão representa- dos na exposição pelas amostras dos snrs. D. J. Ferrão (Jastello -Branco e Vascon- cellos. O vinho do Lavradio ('; tinto, alcoólico, preparado hoje pelo processo do Douro, o que occulta a sua delicadeza natural sem o tornar comparável ao do Porto. O Carcavellos é branco, generoso, com doçura que se aproxima do maduro. Os do Termo são vinhos produzidos nos vinhedos dos arredores de Lisboa: ha-os tintos e brancos, todos muito alcoólicos, tinos, mas sem caracter nem aroma par- ticular. Os vinhos de Lisboa são representados particularmente pelos vinhos da snr.* con- dessa do Villa Real, pelos de Jansen, e ainda pelos de EUicot e Abreu, que ex- põem vinhos aperfeiçoados pela applica- ção do calor, o que já ha muito se pratica em Portugal (Lisboa e Madeira). O Alemtejo e o Algarve produzem tam- bém vinhos de excellente qualidade, que o commercio estrangeiro ainda não conhe- ce; taes são os de Beja, do visconde da Esperança, etc, etc. Setúbal e Azeitão, defronte de Lisboa, produzem o famoso Moscatel, já conheci- dissimo pela extrema fineza. 4.° A Madeira é bem conhecida pelos seus notabilissimos vinhos. Os expositores que representam a pro- ducção dos vinhos da Madeira sao J. V. da Silva, AVolsch e Camacho, que expõem amostras das novidades posteriores a 1803, isto é depois da moléstia da vinha. õ." Ha ainda vinhos apreciadissimos dos Açores e principalmente os da ilha do Pico, que são excellentes. A esta noticia do snr. visconde de Villa Maior, seguem-se as seguintes linhas da redacção : «Todos estes vinhos provamol-os nós em 18G7 e fizemos o respectivo relatório. Li- mitamo-nos hoje a dizer que d'essa pi*ova e das intei'essantes conversas que tivemos com o snr. visconde de Villa Maior, re- sulta que os vinhos de Portugal, a cuja boa qualidade rendemos plena justiça, nãò poderiam, como bebida, concorrer com os vinhos francezes. Podem ter o emprego de precipitantes das pequenas cervejas, mas como gosto e propriedade, são de mais elevado preço e não tem o emprego usual dos nossos vinhos de França, como liquidos aliincnticios. Os inglezes, que querem abusar, bebem os vinhos de Por- tugal ; os inglezes que querem uma be- bida sã e nutritiva pi*efei"em os vinhos JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 117 de França. N'isto consiste toda a liicta. Fiquem bem persuadidos d'isto os nossos productores e negociantes do Meio dia.» Quer-nos parecer que estas palavras sào injustas e filhas da rivalidade. Pois é crivei que os inglezes só tomem os vinhos de Portugal quando querem abusar ? Pois é crivei que os vinhos portuguezes sejam menos sãos e nutritivos que os francezes '? Não combateremos, porém, similhantes asserções desde o momento em que se le- va a questão para o campo puramente commercial da concorrência. O «Journal Vinicole» incita os produ- ctores e negociantes portuguezes a que não desanimem e a que não receiem a concorrência nos mercados da Inglaterra. A exposição vinícola de Londres hade coroar a agricultura portugueza, como tudo nol-o faz esperar. — A theoria chimica da estrumeira, tal como a estabeleceu o barão de Thenard, é curiosa e praticamente útil e portanto vamos apresental-a. Servir-nos-ha d'interprcte o snr. Fer- reira Lapa. O estrume tal qual sahe dos estábulos e depois de armado em montureira não tarda em aquecer até 40 graus. A sua massa fumega, escurece, e os resíduos orgânicos vão a pouco e pouco curtindo e désfazeudo-se era terriço ou pasta negra. Durante este curtimento, ou fermentação, a uréa das ourinas converte-se em carbonato de amónia: C2AZ2H402 + 4H 0—2 (Az H 4 O, C O 2) uréa agua carbonato de amónia Parte d' este sal amoniacal como volátil que é espalha-se na atmosphera; a outra parte entra em combinação com a matéria carbonada. Outro tanto succede ao azote das matérias or- gânicas azotadas. O ar interior da montureira contém muito me- uos oxigénio que o do ambiente. O terriço ou matéria negra da estrumeira e que vai augmentando com o curtimento, tem diversas propriedades e composição conforme o seu periodo de formação. Nos primeiros quinze a trinta dias a cellulose dos restos orgânicos muda-se em glucose, e esta combina-se com a amónia formando uma glucose azotada. 2 (C12 H 12 O 12) + 2 (Az H 4 O) t O 6— glucose amónia oxigénio 2 (012 H 12 O 12 Az) + 8 H O glucose azotada agua Este corpo contém 4,9 p. c. de azote e é facil- mente solúvel na agua. No tim de dous mezes a glucose azotada une-se com o acido bumico resultante da decomposição das matérias carbonadas e ura novo corpo negro ■e gera chamado acido fumico, o qual ó menos so- lúvel que o precedente e menos azotado: 012 H 4 O 4, O 13 H 12 O 12 Az a. bumico glucose azotada No terceiro mez finalmente, o acido bumico tendo sido decomposto em agiia e acido carbónico, a glucose azotada une-se com a glucose simples e forma o terceiro corpo negro o menos azotado e o mais insolúvel de todos, e a que vulgarmente se chama "manteiga do estrume": (2 O 12 H 12 O 12) Az O sr. Thenard não nos diz qaaes as ultimas trans- formações que se passam n'estes três corpos fumi- cos até chegarem ao estado ou forma em que são recebidos pelas raizes das plantas. Mas sabe-se por outras e anteriores observações que estes três corpos distribuídos na terra e em presença do oxi- génio do ar se convertem em agua, acido carbóni- co e acido nitrico, e que já mesmo nas montureiras esta ultima transformação ou nitrificação se come- ça a operar n'el]es. O que é importante d'esta theo- ria para a arte de compor os estrumes é a influen- cia que tem a amónia em curtir ou reduzir a cor- pos negros azotados as matérias hydrocarbonadas dos restos orgânicos. A conveniência de incorpo- rar nas estrumeiras, as ourinas dos gados, os su- mos a líquidos azotados, saes amoniacaes ou ma- térias de natureza animal, é obvia á vista d'isto. Os estrumes doa mattos e das palhas tem grande difRculdade era curtir por falta de azote. O corpo negro mais predominante é então o terceiro, quan- do chegam a curtir completamente. Vé-se também d'esta doutrina que o estrume excessivamente curtido não é o mais rico em azote, nem tão pouco o mais solúvel, e portanto o de ef- feito menos prompto nas culturas, sobretudo quan- do o terreno é argiloso ou argillo-calcareo. Pela razão de que estes terrenos insolubilisando e re- tendo em si os corpos negros azotados, maior de- mora oppõem á sua ultima transformação. — Teve logar recentemente em Louis- ville (Kentucky) a terceira reunião da so- ciedade dos apicultores da America do Norte. Tractou-se n'ella d'alguns assum- ptos de grande interesse para o publico em geral e para os apicultores. Um dos membros deu parte á socidade da perda de trinta enxames em consequência da singular desapparição das abelhas mes- tras, mortas pela epidemia que grassou todo o anno nas abelhas em geral e par- ticularmente nas rainhas. Eram estas sem- pre as primeiras que morriam mal a doen- ça entrava no enxame. Esta affecção foi assumpto para longa discussão e todas as opiniões eram unani- mes em favor do xarope de assucar candi branco para alimentar os enxames duran- te o inverno de preferencia ao mel co- lhido na ultima estação. Um sócio propoz que se juntasse ao xarope uma infusão de café feito na proporção de 1 litro de se- mentes moidas por ÕO centilitros d'agua, o que parece dar um café bem concen- trado. Em todo o caso será um bom alimento para as abelhas. Tem-se recommendado também muito 118 JOnVAL DE IIORTICULTUTÍA PRATirA como alimento para as abelhas o trevo commum, de prefoncia ao branco e ver- melho. O publico americano gosta muito de encontrar no mel pequenos fragmentos dos favos, o que lho parece ser uma garantia contra a falsificação d'aquella substancia, mas é isto um erro, que importa comba- ter. Na reuniíio da sociedade a que nos temos referido demonstrou-se claramente que os negociantes de mel falsificado sào justamente os que mais cuidado téem em addicionar os taes fragmentos de favos para melhor illudir o comprador. — Diz um jornal hespanhol que o Jar- dim Botânico de Madrid sustenta corres- pondência com os de : Amsterdam, An- vers, Atherxas, Basilea, Basano, Berlim, Bona, Bolonha, Bruxellas, Bordéus, Car- Isruhe, Chelsea (Londres), Copenhague, Christiania, Colónia, Cracóvia, Dijon, Dresdc, Dublin, Erlanga, Strasburgo, Florença, Gand, Genebra, Génova, Cisa, GreifsAvald, Haia, Hamburgo, Heidelberg, Jena, Kcenisberg, Kew (Londres), Liege, Leipsik, Luca, Lyào, Leyden, Melbour- ne, Munich, Montpellier, Moscow, Mode- na, Nápoles, Oxford, Palenno, Pariz, Par- ma, Pádua, Pavia, Petersburgo, Piza, Ratisbona, Roma, Rotterdam, Ruào, Se- na, Tolosa, Turim, Utrecht, Úpsal, Vien- na, ^ Wurzburg e Zurich. E para notar que n'esta longa relação nSo figure nem o nosso Jardim Botânico de Lisboa nem o de Coimbra. — N'este numero encetamos a publica- ção d'um artigo impresso que nos foi re- mettido de Coimbra e que tem por titulo «Link e a Universidade de Coimbra». — A caderneta da «Illustration Horti- cole» correspondente ao mez de janeiro, publica a descripção da Camellia D. Pe- dro V, a qual é acompanhada de uma es- tampa chroraolitographica, o Mr. André descrevendo-a accrescenta que é uma ob- tenção portugueza. Já o anno passado esta mesma publi- cação descreveu a Camellia D. Caídos Fernando (Príncipe Real) e para não se tirar o seu a seu donoj dissemos n'este jornal que esta Camellia tinha sido obtida de semente pelo snr. José Marques Lou- reiro. Outro tanto dizemos hoje da Ca- inellin D. Pedro V. — Um dos últimos números do «Conim- bricenso» oecupa-sc do aproveitamento do carolo do Milho para a alimentação do gado e exprimc-se assim : E8t4 hoje demonstrado, que esta substancia re- duzida a farinha pode empregar-se com grande vantagem no sustento dos animaes, supprindo a falta de prados e de fenos. Em França e na Itália tem-se feito muitos ensaios e experiências, colhon- do-se sempre excellentes resultados. O carolo de milho,' depois do bem secco, reduz-se facilmente a farinha em moinhos ordinários, e esta farinha pela sua composição representa um poder nutritivo egual a metade do que tem o bom feno. Calculando, em relação á media annnal do milho em Portugal, a quantidade de carolo em 3 milhões de quintaes por anno, pode este producto alimentar pelo menos 20 mil bois. E' uma riqueza considerá- vel, que torna mais segura e lucrativa a creaçâo do gado, em um paiz em que ha grande falta de pastos. — De Mr. J. Linden, de Gand, rece- bemos o seu catalago n." 91, de plantas de estufa. Desde que Mr. Linden reuniu em Gand todas as suas coUecções de plantas, este estabelecimento tomou muita maior im- portância e as suas collecçoes hoje sao ri- quissimas e mui variadas. — Realisou-se no dia designado, apesar do mau tempo, a abertura da exposição de plantas em Florença. A cerimonia da abertura teve logar ao meio dia e foi feita pelo rei Victor Era- manoel. Sua Magestade foi acompanhado por muitos dos seus ministros e pelos mem- bros do corpo diplomático. Cerca de 300 botânicos de todas as par- tes do mundo assistiram á cerimonia as- sim como muitos visitantes estrangeiros. O professor Ancona proferiu um dis- curso no qual desenhou a largos traços a historia da horticultura de Florença. Já que dissemos mais acima que a bo- tânica se achava alli representada por 300 dos mais eminentes professores, observa- remos que, apesar de nos acharmos inti- mamente ligados áquelle paiz pela união dos nossos régios consortes, Portugal não enviou ninguém que o representasse. Ou foi esquecimento, ou — N'uma das ultimas sessões da Aca- demia das sciencias de Pariz, foi lido um officio da companhia dos caminhos do fer- ro do norte era que se offerocia a pôr á disposição da Academia uma quantia in- determinada para estudar a questão Phyl- loxera. JORNATi DK TTORTirUT.TURA PRATírA 119 — Quem espairecer a vista pela jardi- dinagem municipal do Porto, verá que tudo é uma pobreza franciscana. Nos jardins públicos não se encontra uma planta rara, não se encontra um raassiço de plantas da estação. Não ha nada. Mas nós agora não estamos dispostos a cançar os nossos pulmões. As pessoas en- carregadas entendem que a jardinagem está muito á altura da cidade; deixai- as. Ora, do que não nos absteremos é de en- dereçar á exc.™* camará municipal a se- guinte conta que encontramos no jornal «La Municipalité», e que mostra o custo de cada arvore que se planta nos boide- vards de Pariz. E bom que se ponha ao facto do que lá fora se gasta com estas insignificâncias. Transcrevel-a-hemos no próprio idioma em que a encontramos. ExcavatJon du sol, dans les mauvais ter- rains (cequi est presque partout le cas), F. C. 15 mètres à 4 francs 60 00 Terre végétale rapportée, même quantité à 4 francs le mètre cube 60 00 Tuteur pour soutenir Tarfore, de 4 à 6 mè- trea de long 1 50 Drainage complet par tuyaux de terre cui- te, par arbre 11 15 Tuyaux d'arrosage, estimes à 2 50 Grille de fonte autour du pied de Tarbre . 46 69 Transport et mise en place de Tarbre et du tuteur 5 00 Armature protectrice en fer autour de Tarbre 8 70 Coút de l'arbre 5 00 Travail de plantation et tuteurage .... 1 69 Chaque arbre à remplacer en 12 ans, in- térèt annuel 18 00 220 23 Moin.s le prix de la terre extraite 18 23 Dépense totale. ... 202 00 Duzentos e dous francos cada arvore que se planta nos houlevaró.s de Pariz ! exclama um dos senadores. Ora, esses homens são doudos, accres- centa outro. Esbanjadores ! murmura um terceiro. Não senhores ! Não são doudos, nem es- banjadores. São homens que téem bom gosto e que entendem ser indispensável a arborisação, convenientemente feita, em uma cidade. Lá plantam-sé ; aqui deitam-se por terra. Estão no seu direito — As ultimas noticias officiaes recebi- das de Torres Vedras dizem que a gente d*aquella localidade, que vive quasi ex- clusivamente da industria vinícola, está muito desanimada na presença de um no- vo mal que se manifestou ultimamente em diversas regiões vinícolas. Um grande numero de insectos invadiu as Videiras. Desconhecidos alli até agora e visíveis a olho nu, vão corroendo as va- ras das cepas e produzem a sua anniquil- lação. Tracta-se de estudar aquella moléstia, e procurar os meios de a combater. Já se representou n'esse sentido ao governo. — O nosso collaborador, o dr. Edmond Goeze, escreveu-nos ha dias pedmdo uma rectificação a um artigo do snr. Oliveira e Silva, que no numero passado publica- mos. Dêmos agora a palavra ao snr. Goeze. O snr. Oliveira e Silva faz suppor no seu artigo sobre a C/iria nobi/is Lindl. que esta planta per- tence á família da; Liliaceas e depois continua di- zendo que a CHvia aubiiis é um synonymo de Iman- lopliiflium miiiiuiitin A primeira, a Clivia nobilis Lindl. é uma planta que foi representada em 1828 (Bot. Reg. t. 1182. Bot. Mag. t. 2856, onde passa debaixo do errado nome de linaniophylium Aitoni Hook.). A segunda, o lihantophyllum miniatim Hook., só foi representado em 1854 (Bot. Mag. tab. 4787. Fl. dea Serres t. 949-950). Emquanto aos géneros Clivia o. Imantophyllum pode muito bem sei- que acontecesse que na pri- meira "Revision des Amaryllidées" os reunissem n'um só, mas quanto a estas duas espécies são muito diflferentes uma da outra. — Em seguida damos alguns aponta- mentos sobre a conferencia feita pelo snr. António Batalha Reis, na Real Associação Central de Agricultura Portugueza. Começou a conferencia pelo parallelo entre os vinhos francezes e portuguezes. N'esta parte citou o conferente a aucto- risada opinião, sobre a vinicultura fran- ceza, de Mr. Leonoir, que, sem se levar por um falso amor pátrio, classificou de bom ^ da producção vinícola, passavel outro jV, bebivel sem extrema repugnân- cia um outro ^ e detestáveis os | restan- tes. Em seguida declarou que acceitava como verdadeiro este juizo, mas que la- mentava que da nossa parte houvesse no geral uma opinião tão absolutamente des- favorável aos vinhos francezes. Todo o vinho francez é caracterisado — disse o conferente — por uma educação esmerada e por cuidados próprios e acer- tados. Os vinhos francezes finos, como o 120 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA sSo O Bordéus, o Borgonha, o Champa- nhe o os moscatéis de llivesaltes, são pro- ductos verdadeiramente explendidos de elegância e delicadeza — em todos se en- contra uma graça, uma ligeireza e um perfume que surprehendom agradavelmen- te o paladar do provador e lhes revelam as mais deliciosas impressões que nos pode oíFerecer um vinho genuino. Mas em todos os vinhos francezes como nos italianos e hespanhoes existe como que um ar de tamilia que oe reveste d' um to- que especial que os individualisa e separa de todos os outros. Nos nossos, continuou o snr. Batalha Reis, não mo parece que isso se dê. Nós temos typos distinctos, próprios e com- pletamente nacionaes, mas temos muitos outros perfeitamente sirailhantes aos me- lhores vinhos estrangeiros e só lhes faltam os cuidados d'afinamento e uma apresen- tação para os tornar egualraente valiosos em todos os mercados do mundo Em variedade de typos e era riquezas de massas não conheço nenhum paiz que possa egualar-nos. A multiplicidade das camadas geológi- cas, a diversidade dos solos aráveis, as diíferentes exposições e mais ainda os pro- nuncies e continues accidentes do terreno que se encontrara por toda a parte, dão origera a constituições climatéricas muito excepcionaes e favorecem a cultura do vi- nho do norte ao sul do reino. O vinho francez é nos seus diíferentes grupos, em parallelo com os nossos, mais ligeiro e fraco do que o nosso vinho — o vinho francez — comparou-o o conferente a uma aguarella, na qual os claros e a luz é dada pelo próprio papel em que a pin- tura se faz, e por isso o cuidado princi- pal do preparador francez é conservar ao vinho a sua individualidade, e é a isso que o snr. Batalha Reis julga que esses vinhos devem a sua fama e reconhecido realce. Com relação aos nossos, disse o confe- rente, que pelo geral desdenhávamos o género aguarella e empregávamos a pin- tura a óleo que escondia a individuali- dade do vinho cora lotos e aguardente co- mo n'este segundo systoma de pintura se esconde a tella cora as chapadas da tinta. Ao estabelecer este contraôte, laraentou o conferente, que taes desvarios se dessem em prejuizo visível das soberbas raassas de vinhos que possuímos e que só esperam por tractamentos acertados para serem os primeiros em toda a parte. Passou depois a tractar da possibilidade de fazer entrar os nossos vinhos em In- glaterra protegidos cora os francezes pelo direito baixo. E explicando a escala alcoólica, fez vo- tos para que ella acabasse, encitando com- tudo os nossos vinicultores a não se inti- midarem com ella e a sahirom da indo- lência era que se tem conservado. A escala alcoólica, continuou o confe- rente, tera sido uma espécie de phantas- ma que ainda nenhura exportador nosso se aniraou a encarar de face, ao passo que os especuladores francezes, húngaros, ita- lianos e hespanhoes se tem servido d'ella como de um escudo, sob a protecção da qual elles croaram ura verdadeiro mono- pólio, era nossa completa desvantagem. Citou muitos dos nossos vinhos próprios pava este commsrcio, entre os quaes os de Mafra, Leiria, Caldas, Pedrógão, Carnide, Camarate, Torres Novas, Minho, muitos da Beira e alguns doDouro perto da Ré- gua. Apresentou o enxofre e o calor como substituição ao álcool até agora destinado á exclusiva conservação da todos os vi- nhos, exceptuando d'esta regra os vinhos generosos como o Porto e outros, para os quaes declarou, que o álcool era uma im- periosa necessidade, com tanto que fosse applicado moderadamente. Serviu-se de muitos exemplos, que robusteceram os ar- gumentos apresentados, e concluiu cha- mando a attcnção dos vinicultores para a exposição, de Londres, explicando o fim d'essa exposição, e, lembrando mais, que 03 vinhos premiados seriam os vinhos ac- ceites no grande mercado, e que os seus donos, seriara mais felizes do que se achas- sem uma mina de ouro, porque essa podia acabar, eraquanto que o consurao do vi- nho na Inglaterra está dependente da sedo britannica, que járaais estancará ou per- raittirá a ura inglez legitirao e puro o re- cusar ura copo de vinho portuguez. E este o resurao da conferencia do snr. Batalha Reis, segundo a «Revista Agrí- cola». Oliveira Júnior. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 121 PÊRA ANGELIQUE DE ROME Ha mais de quinze annos que recebe- mos muitas variedades de Pereiras da Bélgica, e entre ellas uma com o nome de Pêra de Luçorij notável pelo seu fino aro- ma e abundante sueco, em fim de primei- ra ordem. Ao snr. J. J. Marques, distincto ama- dor de pomicultura, vendemos um exem- plar e assim que fructificou achou-a tão distincta que veio ao nosso estabelecimento comprar outro exemplar, e da mesma en- xertou em outras que não eram varieda- des apreciáveis, porque aquelle cavalheiro gosta e sabe fazer selecção. Em uma coUecção que mais tarde rece- bemos de Angers (França) para nos ser- virem de plantas-mães, vinha um exem- plar com o distico Beurré Gris d'hiver Fig. 2f3 — Pêra Angelique de R.ome — Desenhada no Horto Loureiro nouveau e mais o seguinte nome entre pa- renthesis De Luçon. Tomamos nota d'esta variedade para, quando fructificasse, veri- ficar se era egual áquella outra De Luçon. Fructificou o anno passado e tivemos oc- casião de desvanecer as nossas duvidas; e vimos que a pêra Beurré Gris nouveau com o parenthesis De Luçon, é uma va- riedade muito distincta tanto na forma como na epoeha da maduraçao, e a que recebi amos da Bélgica com o nome De Luçon é sem duvida a pêra Angelique de Poone, Vol. y— 1874. No «Diccionario dePomologia» ha uma longa historia, que mostra quanto é dif- ficil destrinçar certas distincçoes entre al- gumas variedades. Os pomologos belgas e francezes concor- dam em que a Beurré Gris nouveau de Luçon é originaria de uma pequena cidade situada não longe de Fontenay-le-Comte (Vendèe), mas nenhum d'elles sabe o no- me do obtentor. Cultivam-na desde 1842 e os esclarecimentos que téem d'ella vêem já de 1830, epoeha de sua verdadeira pro- pagação. N." 7 — Julho, 122 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA NSo ha duvida quo a Pereira que re- cebiamos da Bélgica com o nome De Lu- Ç071 é a Angelique de Rome. A sua maduraçao é desde setembro a novembro, e a da Beurré Gris de novem- bro a janeiro, muito distincta uma da ou- tra tanto na sua forma como na cor. A Pêra Angelique de Rome é sem du- vida uma das excellentes peras que se tor- na recommendavel a todos os pomiculto- rcs. E de tamanho regular, ^muito fértil, muito succosa e aromática. E de primeira ordem. Já que temos fallado na Beurré Gris \nouveau nao deixaremos de a recommen- j dar, pelos seus grandes fructos, muito suc- I cosa e a sua maduração no inverno. i José Marques Loureiro. DIOSPYROS COSTATA Eis uma arvore de reconte introducçSo na Europa que desejáramos ver importada para Portugal, para este nosso bcllo jar- dim á beira-mar plantado, como algures lhe chamou o poeta. O Diuspyros costata Carr. forma uma pequena arvore muito ornamental e muito adequada para jardins. As folhas que sao caducas tem o quer quo seja de parecido cam as da Macjnolia Soidangianaj com- tudo sao maiores e mais espessas, (.'s fru- ctos apresentam umas certas bossas mais ou menos profundas e chegam a attingir 7 centimetros de diâmetro, isto é, o de uma maça de mais do que tamanho re- gular. A casca, quando o fructo attinge perfeito estado de madureza, toma a cor da laranja, A carne — permitta-so-nos a expressão — é polpoza e desfaz-se na boc- ca de modo quo faz lembrar o doce de damasco, de cujo gosto tem alguma cousa o fructo do Diospyros costata. Esta planta é originaria das regiões frias da China e é tão rústica que chega a fructificar em Pariz. Também recommendaraos aos amado- res o Diosjyyros Mazelij pelos seus excel- lentes fructos. Oliveira Júnior. APPLICACÂO DO ADUBO CHIMICO i HORTICULTURA DE ORNAMENTO ' o u Qual é pois a mistura que provoca es- tes curiosos resultados ? Eis aqui a for- mída em que assentei, depois de algumas tentativas, para a composição do adubo mineral inteiramente solúvel destinado á horticultura : ADUBO MINERAL SOLÚVEL Azotato de ammoniaeo 'ICO Biphosphato de ammoniaeo . . 200 Azotato de potassa 2õO . Clilorhydrato de ammoniaeo . 50 Snlphato do cal 60 Sulphato de ferro 40 pode-se introduzir o phosphoro no estado de phosphato de cal, que se dissolve len- tamente debaixo de diíierentes influencias; j e pouco importa ajuntar o azote no estado ; de azotato de soda ou de sulphato de am- moniaeo, as duplas decomposições ou as divisões das bases fornecem pouco a pou- ! CO ás raizes os saes verdadeiramente assi- j milaveis ' . Para as plantas confinadas, pelo con- I trario, era preciso saes inteiramente solú- veis, tanto quanto possível todos egual- I I 1 Eis aqui a composição do adubo represen- 1 tando 1000 de esterco, segundo M. Ville: 1000 Esta formula diffore do todas aquellas j que tem sido publicadas e que sào desti- j nadas á agricultura. Lá está-se sempre I dominado pela questão da economia ; lá Phosphato acido do cal .... 15 Azotato de p()taf?sa S Sulphato de ammoniaeo .... 14 Sulpliato de cal 21,25 58,23 1 Vide .1. II. I'., vol. V, pag. 111. Cnjo preço de venda em ISfiO era de 2:õ20 reis ou 4:500 reia pos 100 kilos. (Vide "llesultats obtenus 1 en 1866"). JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 123 mente nutritivos e podendo bastar com a agua á alimentação completa dos vege- taes. Assim demos o azote principalmente no estado de azotato de ammoniaco. O azotato de ammoniaco é o sal que nasce incessantemente no solo arejado e húmido: é o sal que se encontra nas chuvas de tem- pestade; é o agente natural da fertilisa- çâo, segundo os bellos estudos de Schoem- bein (vide «Journ. de pharmacie et de chimie», 1869, pag. 437). Em quanto ao acido phosphorico, é immediatamente so- lúvel no estado de phosphato de ammo- niaco. O desenvolvimento indefinido das plantas sempre no mesmo solo, sob a in- fluencia do adubo solúvel, de cuja formu- la, acabo de dar, parece justificar as mi- nhas apprehensÕes. Fui mesmo levado, para certas plantas não aquáticas, a sup- primir o supporte natural, a supprimir a teiTa, e tive o prazer de ver continuar a vegetação ficando as raizes mergulhadas na agua a que se tinham addicionado pe- quenas doses de adubo mineral. Apresento-vos uma Tradescantia vir- ginica creada d'este modo ; vede com que vigor ella se desenvolveu. Aqui está uma Hartwegia comosa, de que fiz uma multiplicação, no mez de junho de 1872, n'um vasinho cheio de terra de urzes ; em setembro, descobri que, sob a influencia do adubo mineral, tomava um desenvolvimento fora de toda a proporção com a dimensão do recipiente; depois as raizes levantaram-no. Então transplantei-a para um copo de pé, onde continua a viver prosperamente. Eis aqui uma Asjndistra que se dispõe a levantar-se acima do vaso (de 2 litros) que o contém, tanto as suas raizes se mul- tiplicam e engrossam sob a influencia da alimentação artificial que todas as sema- nas lhe é administrada com a agua de rega; desenvolve vinte folhas (phyllodes) novas com um vigor extraordinário. A maneira de empregar o adubo mine- ral é muito simples ; é preciso fazer dissol- ver em agua commum a mistura de sal ; a proporção é de 4 grammas por litro, e é esta solução a 4/1000 que é distribuida ás plantas todas as semanas em doses cui- dadosamente repartidas. Eis aqui as rações que ensaiei com bom resultado ; As plantas postas em experiência na estufa do Jardim de aclimação recebe- ram unicamente ÕO grammas de solução cada semana. As rações successivas fo- ram pouco mais ou menos de 150 gram- mas por semana para a grande Trades- cantia e para a Hera cultivadas em minha casa. Ora 50 grammas de solução a 4/1000 representam 08^^,2 de mistura salina; em um anuo, a planta recebe pois lOgi',40 d'esta mistura. Admittindo que o preço d'este adubo importa em 540 reis (3 fran- cos) o kilogramma, faz 18 reis (3 cênti- mos) por planta e por anno, economisando o terriço e os cuidados da transplanta- ção. Para compor esta formula, dobrei a dose de azote em razão das quantidades mal determinadas de azotato de ammoniaco sempre arrastadas pelas aguas de rega e para attingir as proporções de azote in- dicadas pela analyse do trigo ; em quanto ao acido phosphorico e á potassa forcejei por me approximar das proporções indi- cadas pelas analyses do adubo de quin- teiro. Em summa, oífereci ás raizes uma so- lução análoga á que daria o mesmo es- terco reduzido aos seus elementos mine- raes, mas mais rico em azote assimilá- vel. Ajuntei a cal no estado de sulphato era muito pequena proporção, pensando que as aguas de rega levam sempre uma notá- vel porção d'esta base no estado de carbo- nato e de chlorui-eto. Introduzi um pouco de sulphato de ferro, como já disse, a fim de prover á possivel insufficiencia d'este principio importante, quando as plantas se demoram indifinidamente no mesmo solo. O adubo mineral assim composto con- vém egualmente a todas as plantas sem distincção? Não; mas certamente convém ao maior numero. Os individues que vos apresento auctorisam-me a afíirmar que elle favorece muito a vegetação das plan- tas cujos nomes se seguem: Acanthus molVis^ Agave americana, Agave corniculata, Avena, Arum itali- ciaUj Arum esculenhom, Asjndistra, Bal- samina impatiens, Begónia, Coleus, Cu- curhita, Fuchsia, Hartwegia comosa, He- 124 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA liotrojpuit, Hiacinthus, Linum usitatissi- mum, Petunia, Resecla odorata, Solvia splendens^ Sparmannia, Solanum tubero- siim, Verónica, Zea Mays. Das experiências emprehcnclidas por Mr. O. Ville, tendo em vista a grande cul- tura, e cujos magnificos specimcns podem ser examinados no campo de estudo de Vin- cennes, julgo poder concluir, se bem que o seu adubo seja difterento, que as Grami- neas, a Beterraba, o Cânhamo^ a Colza o o Linho, etc, sào influenciadas do modo mais favorável pelo adubo chimico. E como to- das as plantas d'uma mesma familia oífe- recem muitas relações em quanto á sua organisaçào, não temo apresentar desde já, segundo estes dados, uma lista das familias que, segundo todas as probabi- lidades, prosperarão sob a influencia do novo adubo : Acanthaceas, Aroideas, Asparagineas, Balsamineas, Begoniaceas, Borragincas, Cannabineas, Chenopodiaceas, Compostas^ Convolvulaceas, Cocurbitaceas, Crucife- ras, Fumarias, Geraniaceas, Gramíneas, Hedcvaceas, Labiadas, Liliaceas, Lina- ce.as, Malvaceas, Papaveraceas, Person- nadas, Poly ganas, Resedaceas, Solaneas, Tradescancias. Damos agora uma lista de plantas para as quaes este adubo me pareceu pouco fa- vorável nas doses relativamente elevadas que empreguei : /Saxifragas, algumas Cyperaceas, al- guns Bambus. Em geral rccomniendarei que se em- pregue com muita reserva nas plantas cujo crescimento é lento, n'aquellas que soíFrem, em solo ardente, e egualmente que se sus- penda completamente a sua applicação durante o periodo de repouso. Fiz além d'isto uma observação impor- tante: o vem a ser que prejudica mani- festamente a germinação. Concebe-se, com efteito, que as sementes providas de to- das as reservas alimentares necessárias á nova planta, n"io se dão bem com uma alimentação muito substancial. Necessi- tam unicamente d'agua pura para dissol- ver os alimentos preparados naturalmente ou para favorecer as transmutações mo- leculares, sobre as quaes por agora não posso deter-mc. As novas plantas são como os recoranascidos, que tem necessidade do leite maternal e a quem o beefsfeak en- venena. Os pacientes trabalhos, as engenhosas experiências de Mr. G. Ville deram a co- nhecer qual o principal alimento exigido por certas plantas d'um grande valor agrí- cola: é o que elle chama a dominante do mineral. Assim, no solo de Vincennes, a dominante do Trigo é a matéria azotada; a da Batata é a potassa. No solo de Gua- deloupe, em casa de Mr. de Jabrun, a do- minante da Canna de assucar é o phos- phato de cal, etc. Sabe-se além d'Í880 pelas experiências de Mr. Boussingault, que as Leguminosas tomam o azote da atmosphera ^. Haverá certamente plantas de jardim que exigirão algumas modificações á for- mula que apresentei : por isso não duvi- darei supprimir inteiramente o azotato de ammoniaco para a maior parte das Le- guminosas ; certas plantas exigirão a soda, outras silica solúvel (silicato de potassa). Isto tudo dá uma nova serie de experiên- cias a emprehender. Não me será certa- mente possivel fazel-as todas, mas ten- tal-as-hão, ouso esperal-o, práticos mais experimentados e habilitados do que eu. Em quanto á horticultura propriamente dita, elía encontrará certamente indica- ções muito úteis na theoria que acabo de resumir e nos factos que a confirmam. Será fácil juntar, em muitos casos, o adubo mineral á agua de rega: é uma mina que ainda não foi convenientemente explorada. Do «Bolletim da Sociedade de Aclima- ção» de outubro do 1872. A. J. DE Oliveira e Silva. 1 Mv. G. Ville resumo n'estes termos a doutri- na dos adubos ehiinicos para a aj^ricultura. 1.0 O adubo cliiniico completo participa das pro- priedades lortilisantes do esterco, do qual contém toda a matéria activa, o ao qual é superior pelos rendimentos que produz. 2.° A acção de cada uma das quatro substancias do quo o adubo completo se compõe exige para SC manifestar o concurso das outras três. 3." Principios das dominantes: cada um dos qua- tro termos do adubo completo desempenham uma funcçâo subordinada ou preponderante em presen- ça das outras três, segundo a natureza das plan- tas. 4." Analyse do solo pela cultura comparativa de parcollas eguaes com ou sem adubo, com um adu- bo privado de um á'i seus elementos. (Vide G. Vil- le, "Resultats obtenus en 1868", pag. 72). JORNAL DE HORTICULTURA TRATICA 125 DIPLACUS Esta planta, oriunda da Califórnia, ten- do a maior analogia com os Mimulus, é do género das Scrophularias^ vivaz, hastes herbáceas ou sublenhosas, erectas, folhas oppostas, flores solitárias, tubulosas, nas- cendo na axilla das folhas; o seu limbo, aberto, é dividido em cinco lobos des- eguaes, que o tornam mais ou menos ir- regular. Ha duas espécies que occupam logar distincto nos jardins. Uma d'ellas é oDi placus escarlate (D. cardinalisjj, que se eleva quasi a 1 metro, de corollas escar- lates, cujos lobos lateraes, curvos para fora, dão-lhes um aspecto irregular, e co- mo que bilabiadas. A cultura tem produzido muitas varie- dades que se distinguem principalmente pelo colorido das flores, variando desde a cor de rosa clara até ao vermelho escuro, com pontuações escuras na gorja, ou sem ellas. Fig. 27 — Diplacus Verschaffelti — Desenhado no Horto Loureiro A segunda espécie é o Diplacus visco- SU8 (D. glutinosusj menos elevado e mais robusto que o precedente; as suas corol- las são infundibuliformes, abertas e quasi regulares, de cor alaranjada. A sua introducção na Europa data de quasi um século; e tem produzido egual- mente tão grande numero de variedades, tão differentes ás vezes da forma primi- tiva, que muitos botânicos téem feito d'el- las espécies distinctas. As principaes podem reduzir-se ás qua- tro seguintes : 1.* Diplacus aurantiacus — de flores alaranjadas com os lobos da corolla mar- ginados. 2.* Diplacus puniceus — flores de um vermelho cinabrio com os lobos margina- dos. 3.* Diplacus latifolius — que, além da cor amarella de suas flores, distingue-se das precedentes por um porte mais ele- vado, folhas mais largas, lobos de corolla quasi inteiros e arredondados. 4.* Diplacus grandijiorus — notável pe- lo grande desenvolvimento do limbo da corolla e suas divisões profundamente bi- lobadas. A sua cor é infinitamente variá- vel, oíferece todos os matizes entre o bran- co puro, e a camurça-nankin, uniformes ou maculados. A espécie de que nos occupamos, repre- 126 Jornal de horticultura pratica sentada pela respectiva gravura, é uma das três variedades denominadas Godro- nii, Vershajfeiti, e EspIeucUduSj obtidas de semente por ^[r. Ingelrebst, intelligente jardineiro em chefe do Jardim Botânico de Nancy, cruzando as variedades Auran- tiacus e Puniceus do Diplacus ghitinosus. São ostas ti'es variedades notáveis pelo brilho do seu colorido. A cultura d'esta linda planta é facilli- ma. Pouco exigente na qualidade do ter- reno, gosta com tudo de terra um pouco compacta, mas rica. Obtem-se a sua rcproducçào com faci- lidade por estacas, mesmo ao ar livre e á sombra. Camillo Alheliano. CREACiO DE UMA QUINTA MODELO • PARTE PRIMEIRA Considerações preliminares A nacào portugueza, pela diversidade de seus climas, posição geographica e dis- posição physica de seu território, consti- tuição mineral e geológica de seus solos, Índole tranquilla e trabalhadora de seus habitadores, occuparia um logar eminente entre os mais avançados povos agriculto- res da Europa, se a notável deficiência de seus processos agricolas lh'o não estor- vara. A arte moderna de grangear a ter- ra, que tantas, tão notáveis e salutares transformações opera no viver económico de alguns paizes, raros progressos entre nós realisa. Poderosissimas causas influem, porém, para favorecer, senão aggravar, este pre- judicialissimo modo de existir: procedem, umas, da falta absoluta da illustração ge- ral e especial em toda a numerosa classe de povoadores dos campos ; dependem, ou- tras, da carestia de bons e immediatamen- to applicaveis exemplos práticos; derivara, não raras, da perniciosa e condemnavel propaganda dos innovadores ignorantes, que, sem peso, nem critério, encarecem e preconisam toda a espécie do pratica cul- tural moderna; tem, algumas, a sua ori- gem nas formas anormaes, e, porventura, obsoletas da legislação vigente ; devem-se, muitas, á viciosissima constituição da pro- priedade fundiária; fundam-se, bastantes, na falta de uma larga e completa rede de viação publica, que abra e abasteça novos e mais importantes centros de consumo; relevam, quasi todas, da difficuldade de se obterem baratos e abundantes capitães. ^lodiíicar, transformar, senão destruir, absoluta e completamente, este estado pre- judicial e pervertido de viver económico, que tão intima e profundamente destroe e exhaure a fonte principal e mais impor- tante da nossa riqueza económica, quer promovendo, diffundindo e sustentando a mais larga, solida e pratica instrucção por toda a classe popular analphabeta ; quer aconselhando, produzindo e demonstrando os methodos ou preceitos agricolas moder- nos, que melhor, mais profícua e barata- mente se accommodam e aíFeiçoam ás nos- nas primeiras e mais instantes necessida- des ; quer combatendo e censurando todas as innovações, que não sejam integral e rigorosamente definidas e demonstradas; quer reformando a legislação caseira no que ella contiver de imperfeito e anachro- nico; quer promovendo, dentro da orbita do direito e da justiça, todas as modifica- ções susceptiveis de darem á propriedade fundiária uma forma mais consentânea cora a sua indole industrial moderna; quer favorecendo e propagando o principio emi- nentemente económico e social da associa- ção, na acquisição de machinismos aper- feiçoados, e na transformação de productos vegetaes e animaes ; quer desenvolvendo, na mais larga e vasta escala, os diversos systemas de viação ordinária; quer, final- mente, promovendo a creação de estabe- lecimentos de credito, que sejam, para a agricultura pátria, protecção benéfica e auxilio continuado de prosperidade e de riqueza, e não origem de miséria e de desordem, tal é, assim o entendemos, a serie de necessidades, antes obrigações, que nos impõe o rápido e triumphante ca- minhar da civilisação moderna, e o dever de solidariedade, que contrahimos com as gerações pretéritas e futuras. A nação, que não emjirega as suas for- ças, ou recursos naturaes, como elemento JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 127 principal da sua actividade económica, não pode gozar dos benefícios de uma vida honrada e independente, E, principalmen- te, pela acçíio constante, adquada e bem dirigida, d'essas mesmas forças ou recur- sos naturaes, que ella se engrandece e no- bilita. A carta de lei de 14 de junho de 1871, sanccionando o decreto das cortes geraes de 3 de junho do mesmo anno, que autho- risa a creação de um logar de agrónomo em cada um dos districtos administrati- vos do reino e ilhas adjacentes, e o regu- lamento geral das disposições da mesma carta de lei, que estatue sobre as obriga- ções, attribuições e deveres do referido agrónomo, providenceiam, dentro de uma dada orbita, a uma das necessidades mais importantes da reforma agricola, a em- prehender, commettendo a propagação da instrucção agronómica das populações á diligencia e á actividade de certos e de- terminados individues, legal e scientifica- mente habilitados. Considerados nas suas formas theoricas e abstractas, os systemas de ensino agri- cola, por cursos elementares e conferen- cias publicas, admittidos pelo citado re- gulamento geral, não nos parecem, porém, sufficien temente adquados para effectua- rem, de um modo directo e proveitoso, a instrucção geral da parte mais ignorante, e, infelizmente, a mais numerosa da po- pulação agraria, que mais instantemente precisa do ensino. As prelecções e confe- rencias publicas, que podem exercer uma benéfica influencia sobre o limitadíssimo numero dos espíritos cultivados e esclare- cidos, pouco ou nada convencem o enten- dimento apoucado e indolente da grandís- sima maioria dos ignorantes e rotineiros, e é, mui frequentemente, origem princi- pal do mais prejudicial e ostentoso pedan- tismo. O ensino agrícola, jDara realisar com vantagem e segurança a educação da parte mais rotineira e ignorante da nossa população agraria, precisa de revestir-se de um caracter essencialmente pratico; evidenciar-se, quotidianamente, pelos fa- ctos produzidos; demonstrar-se por conti- nuadas e bem dirigidas operações ; dar, por assim dizer, vida á experiência, con- firmando, pelas mais rigorosas demonstra- ções, as verdades irrefragaveia da theoria. É pela instituição e adequado desen- volvimento de boas, bem dirigidas e or- ganísadas quintas districtaes modelos, que nós suppomos poder resolver de um modo proveitoso, efticaz e positivo, n'uma gran- díssima parte, o importantíssimo proble- ma da instrucção agricola nacional. Definiremos n'este trabalho as condi- ções a que, principalmente, deverá, em nosso apoucado entender, satisfazer uma quinta districtal modelo. Daremos segui- damente uma descripção, tão minuciosa quanto for possível, da propriedade, que, dentro do território do districto adminis- trativo do Porto, se poderá, á falta de melhor, applicar a tão necessário, justo, utíl e elevado fim. PARTE SEGUNDA Instituição d'uma quinta districtal modelo Sob a denominação geral de Quintas expcrimeniaes. Quintas modelos e Quintas escholas^ andam, frequentissimamente, con- fundidos estes três centros distinctos de experiência agronómica, os quaes, toda- via, dííferem uns dos outros pelo fim es- pecial a que particularmente se destinam. Quintas experímentaes, quintas modelos e quintas escholas, não são uma e a mes- ma cousa. Cada uma d'ellas tem o seu destino definido, a sua missão adequada, e não podem, portanto, confundir-se. As quintas experímentaes, propriamen- te ditas, téem uma índole puramente scien- tifica. A missão d'ellas, toda de observa- ção e de experiência, como o seu nome o indica, consiste em averiguar, reconhecer, demonstrar e confirmar os diversos factos, ou dados theoricos em abstracto, que pos- sam contribuir para o augmento e continua perfeição da producção vegetal e animal. Todas as operações e todos os trabalhos que n'ellas se executam, ou emprehendem, téem sempre um caracter de rigorosa mi- nuciosidade e precisão, que procede dos methodos e processos de investigação em- pregados pelos diversos ramos das scien- cias auxiliares da agricultura. A sua crea- ção, e o seu ulterior desenvolvimento, acompanham os progressos da sciencia pu- ra, e são, por assim dizer, o apanágio exclusivo dos grandes centros de movi- mento e de indagação scientifica. 128 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Tem outra missão, é mais diversa, mais limitada e circumscripta, a Índole das quintas modelos. O fim principal, se- não exclusivo, que, geralmente, se pre- tende conseguir, n'estes centros distinctos de experiência e de investigação agronó- mica, é demonstrar qual o systema de or- ganisaçSo cultural, que, sob a acção ou influencia de certas e determinadas con- dições agricolas locaes, poderá realisar os mais avultados e importantes benefícios pecuniários, melhorando continuamente o poder productivo do terreno. E como essas condições agricolas locaes podem variar com as circumstancias especiaes do solo, do clima, das distancias aos centros de consumo, dos meios de transporte, do va- lor relativo das terras, do capital e do tra- balho, segue-se que poderão egualmente variar os typos de quintas modelos, cuja instituição se pretenda por ventura effe- ctuar, subordinando os seus diversos pro- cessos ou operações de grangeio ora ao systema intensivo dos grandes capitães, dos grandes adubos, das grandes colheitas e da grande engorda ; ora ao systema dos pousios e das pastagens, conforme predo- minarem as diversas circumstancias, que successivamente determinam ou favore- cem a adopção de um ou de outro syste- ma de organisação cultural. No seu artigo sobre Quintas experivien- taeSj publicado na «Encyclopedia da Agri- cultura Pratica», dos snrs. Moll e Gayot, diz-nos o distincto agrónomo, o snr. Ed. Lecouteux: «A economia rural bom en- « tendida aconselha que se faça predomi- «nar, na producção, aquelle agente que «menos custa, isto é, o solo. O capital e o «trabalho, continua, passam então para o «segundo plano, em quanto centros mais «activos de consumo não legitimam cul- «tura mais intensiva, e, consequentcmcn- «te, mais larga intervenção do capital e «do trabalho». «Acreditou-se, refere ainda o mesmo ci- «tado auctor no mesmo artigo, que a «quinta modelo devia distinguir-se pelas «Bims colheitas extraordinárias, pelo seu «material ao nivel de todos os aperfeiçoa- « mentos e pelos seus gados de concurso. «Generalisou-se, porém, muito esta asser- «ção, e hoje, atteudendo mais aos paizes «pobres, comprehende-se que não ha quin- «tas modelos dignas das honras de imita- «ção, senão aqucllas em que o capital, in- ce telligentemen te empregado, é um meio «de crear capital, do realisar lucros.» As quintas escholas, ultima forma das quintas de experiência agronómica, que nos propomos definir, são centros de en- sino agricola theorico e pratico. O seu fim principal é instruir e educar certas cathcgorias de empregados ruraes, desti- nados á direcção e guia dos diversos tra- balhos agrários. Muitas vezes, porém, esta não é a sua feição característica e exclu- siva. Buscam frequentemente demonstrar o problema, especialmente reservado á in- vestigação das quintas modelos, promo- vendo, conjunctaraento, a instrucção e o ensino das referidas cathegorias de empre- gados ruraes. A simultaneidade d'estas duas opera- ções distinctas, confiadas á missão das quintas escholas, ti'anstorna, porém, mui- tíssimo as condições normaes da agricul- tura, e a solução que do problema se pre- tende obter, pela instituição das quintas- modelos, deixa de ser realisada, por isso que a renovação, periodicamente repetida, dos alumnos a educar, obriga a continua- das e frequentes mutações no pessoal exe- cutante, e imprime, consequentemente, im- portantíssimas alterações nos resultados definitivos do trabalho e da producção. Para desempenhar cabalmente a sua missão, a quinta eschola só poderá ser quinta modelo dentro dos limites determi- nados pelas concessões feitas á instrucção de seus alumnos (Lecouteux). Dos três diversos typos de quintas, ou granjas, de experiência agronómica, cuja definição succintamente formulamos,aquel- le que, era nosso entender, mais efficaz e vantajosamente poderá contribuir para o progressivo e proveitoso desenvolvimento da nossa deficiente, atrazada e rotineira agricultura, é o da Quinta modelo. Nem as quintas experimentaes propriamente ditas, pela sua índole essencialmente scien- tifica e especulativa, nem as quintas es- cholas, pelas suas naturaes tendências ás formas genuínas da theoria pura, poderão ! satisfazer com egual ou superior vanta- gem, a esta tão importante como reconhe- cida e necessária precisão. Para penetra- rem no animo indeciso e refractário dos JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 129 incrédulos e ignorantesj os processos pu- ros da sciencia precisam de ser, por assim dizer, joeirados através das praticas roti- neiras. A maior parte, a mais numerosa, a principal e mais importante da nossa população agraria, completamente alheia e adversa ás boas praticas da agricultura moderna, e profundamente imbuida nos deploráveis erros de perniciosas e tradi- cionaes rotinas, com difficuldade perde os hábitos inveterados, e desconfiadamente acceita os factos de invenção moderna, se esses factos não trazem impresso o signal evidente de verdades claramente demons- tradas. O typo de quinta modelo, cuja adopção preferimos e aconselhamos, e cuja missão consiste, como já dissemos, e agora repe- timos, em demonstrar o systema de cul- tura, que, sob a acção ou influencia de certas e determinadas condições agricolas 6 económicas locaes, poderá realisar os mais avultados e subidos lucros pecuniá- rios, melhorando continuamente o poder productivo do terreno, emprega e combi- na, para conseguir em toda a sua pleni- tude e integridade, em todo o seu rigor e extensão, esta demonstração, todos os me- thodos, todos os processos, todos os modos e preceitos culturaes de exploração e de aproveitamento que as boas theorias, con- firmadas por frequentes e repetidas pra- ticas, successivamente aconselham e sanc- cionam, affastando e desprezando tudo quanto não tenha o caracter positivo, real e rigoroso do útil e do proveitoso, do im- raediatamente applicavel e superiormente productivo. A quinta, ou granja, de experiência agrícola, que tiver de ser fundada no dis- tricto administrativo do Porto, como nor- ma ou exemplo de boas e aperfeiçoadas praticas agronómicas, para a instrucção e ensino de sua numerosíssima população agraria, deverá, portanto, restringir as suas diversas operações a imitar ou copiar o typo preferido da quinta modelo, com- pendiando, se assim nos podemos exprimir dentro de sufficientes e adequados limites, todas as principaes e mais importantes cul- turas, no referido districto produzidas, que possam ser susceptíveis de subsequente e mais amplo desenvolvimento, e bem assim todas aquellas que em via de naturalisa- ção ou desconhecidas, possam de futuro ser productivo e abundante manancial de novas e mais valiosas riquezas; subordi- nando sempre e em todos os casos as de menor valor e importância ás de maior utilidade e de mais prompto consumo ; sub- mettendo, finalmente, como condição com- plementar e essencial de boa administra- ção e economia, todos os seus trabalhos de grangeio e de aproveitamento á mais ri- gorosa e detalhada contabilidade agrícola. As diversas operações de grangeio, ou de amanho agrícola, importam um certo numero de despezas de variada espécie, chamadas despezas de joroducçãoj cujo va- lor total, denominado custoj ou preço de producçãoj o agricultor embolsa pela ven- da ou pelo consumo subsequente dos dif- ferentes productos obtidos. A relação en- tre esse preço ou custo de producção e o preço ou custo de venda ou de consumo, constitue o beneficio ou lucro do productor. Esse beneficio ou lucro do productor, que pode ser positivo ou negativo, toma, no primeiro caso, o nome geral de beneficio^ ganho j lucro ou inter esse j propriamente dito ; no segundo caso é simplesmente de- nominado perda. O lucro é o excedente do valor do objecto produzido sobre as des- pezas de producção, e toma o nome espe- cial de producto liquido^ para se diíferen- ciar do producto bruto, que é constituído por todos os valores produzidos. Perda é a inferioridade do valor do objecto pro- duzido em relação ás despezas da produc- ção. N'uraa exploração rural bem entendida não basta executar todos os seus trabalhos ou operações de cultura, de exploração ou de aproveitamento, com a máxima per- feição e o máximo esmero. E egualmente indispensável, absolutamente necessário, produzir esses trabalhos ou operações com a menor despeza possível e com a mais restricta e rigorosa economia. A agricul- tura aperfeiçoada não tem exclusimente em vista a quantidade e a qualidade dos seus productos: ella busca com o mesmo empenho a sua maior barateza. A conta- bilidade agrícola, revelando-nos, em todos os seus detalhes e minúcias, o estado ef- fectivo dos capitães, a importância espe- cificada de todas as despezas de produc- ção, o valor de todos os lucros e de todas 130 JORMAL DE HORTICULTURA PRATICA as perdas, a realidade de todos os produ- ctos brutos e de todos os productos líqui- dos, dá-nos, portanto, o meio único, e, so- bre todos, exacto e rigorosissimo, de deter- minarmos o verdadeiro e justo custo dos objectos produzidos. PARTE TERCEIRA Descripção da quinta da Serra do Pilar Situação — A quinta da Serra do Pilar, antiga cerca do convento do mesmo nome, pertencente á extincta ordem monachal dos cónegos regrantes de Santo Agostinho (frades cruzios), e hoje propriedade da fa- zenda nacional, sob a administração im- mediata do ministério da guerra, está si- tuada na freguezia de Santa Marinha de Villa Nova de Gaya, no concelho do mes- mo nome, sobre um monte que se levanta para o lado oriental e a cavalleiro da men- cionada villa de Gaya, sobrelevando a margem esquerda do rio Douro, e defron- tando a cidade do Porto no logar vulgar- mente chamado da Serra do Pilar. Latitude e longitude — A sua latitude norte é de 40°8'45" aproximadamente; e a sua longitude oeste de cerca de 8 31 do observatório de Greenwich. Altitudes — A sua altitude máxima, aci- ma do nivel do mar, é de 89 metros; e acima do nivel médio do rio Douro é de SÇ) metros, aproximadamente. Limites — Limita-a, ao norte, pelo lado da cidade do Porto, a estrada que vai da ponte-pensil, sobre o rio Douro, para o logar de Quebrantoes, a oriente da mes- ma Serra do Pilar ; o logar do Senhor d'Além, fi as terras e casas de diversos proprietários. Extrema-a, ao sul, a estrada que vai do logar da Fer vença, na freguezia de Santa Marinha de Villa Nova de Gaya, para o logar da Gervide, na freguezia de Oliveira. Confina, ao nascente, com terras de Quebrantoes, e com a estrada vicinal, que parte da margem esquerda do rio Douro, no mesmo sitio de Quebrantoes, a entron- car com a estrada que vai da Fervença á Gervide, n'um ponto distante da sua origem cerca do mil metros. Confronta, pelo occidente, com a ex- trema oriental da já mencionada fregue- zia de Santa Marinha de Villa Nova de Gaya. Configuração, área, vedação — A sua configuração, em projecção horisontal, é, proximamente, a de um quadrado irregu- lar. Mede, a sua área cerca de 26 hecta- res. E murada por quasi toda a sua su- perfície. Divisões naturaes — Toda a sua super- fície se pode naturalmente dividir em duas partes distinctas, sufficientemente caracte- risadas : uma, mais extensa e importante, exposta ao quadrante sul, proximamente plana na sua maior parte, medianamente accidentada e um tanto declivosa na sua menor, forma, para o seu lado sudoeste, uma depressão ou concavidade natural, pouco profunda e pouco extensa, onde con- fluem as aguas que brotam em difí^ren- tes pontos do terreno; a outra, mais res- tricta, menos extensa, mui precipitada e abrupta, cahe, em rápidos declives, sobre a margem esquerda do rio Douro, e tem a sua exposição plenamente boreal. Divisões artifíciaes — Artifícialmente, o conjuncto das duas partes descriptas está separado em quatro porções ou parcellas deseguaes, cuja circumscripção ú, apro- ximadamente, a que se segue : A) Uma área ao norte, quasi comple- tamente fechada pelo perímetro das forti- ficações entrincheiradas, que constitue a fortaleza da Serra do Pilar, abrangendo: o espaço occupado pelos diversos edifícios ou construcções monásticas, em completo estado de ruína; os diversos estabeleci- mentos militares, e todo o terreno decli- voso, precipitado e abrupto, que se apru- ma sobre o Douro. B) Uma outra área, contigua á prece- dente, delimitada, ao sul, pela estrada que vai da Fervença á Gervide ; ao poen- te, pela parte oriental extrema da fregue- zia de Santa Marinha de Villa Nova de Gaya ; ao nascente, pelo caminho que, partindo da estrada da Fervença á Ger- vide, a cerca de 400 metros da origem, atravessa a quinta da Serra do Pilar em toda a sua direcção S. N. até tocar nas fortifícações. C) Uma terceira área, limitada, ao nor- te, pela linha do entrincheiramentos for- tificados ; ao sul, por parte da estrada que JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 131 vai da Fervença á Gervide ; ao poente, j pelo caminho oriental, limitrophe da par- cella antecedente; ao nascente, por um aqueducto em arcadas, que atravessa a quinta em toda a sua direcção S. N. até encontrar os alinhamentos entrincheirados. D) Finalmente, uma quarta área e ul- tima, cujas extremas são : ao norte, os terrenos abruptos e declivosos marginaes do Douro; ao sul, parte da estrada que liga a Fervença á Gervide ; ao nascente as terras de Quebrantões e a parte da es- trada vicinal, que da margem esquerda do rio Douro corre a encontrar a estrada da Fervença á Gervide ; ao poente, o aque- ducto, limite oriental da parcella anterior. Clima — O clima da quinta da Serra do Pilar é brando, moderado e sadio. A sua temperatura média annual é de cerca de lõ^. Os ventos, que n'ella geralmente pre- dominam, são os dos quadrantes norte e sul, soprando frequentemente com grande impetuosidade e violência, nas estações do outomno e do inverno, fortíssimas rajadas do levante. As suas geadas, com quanto passageiras e ephemeras, repetem-se mui- to nos mezes de dezembro, janeiro e fe- vereiro, quando o céo é sereno e claro. As neves raríssimas vezes lhe cobrem a su- perfície. A epocha das suas maiores, mais abundantes e permanentes chuvas, é desde os melados de janeiro aos meiados d'abril, proximamente. No estio e no inverno, es- pessíssimos nevoeiros a envolvem durante muitos dias. Solo e subsolo — A similhança do que se nota em quasi todo o concelho de Gaya, a rocha granítica, nos seus diíferentes es- tados de composição e de aggregação, é a base essencial e exclusiva dos terrenos da Serra do Pilar. A sua camada activa, ou o seu solo vegetal, geralmente solto, pro- fundo e bastante fértil, é facilmente ará- vel e extremamente apto ao desenvolvi- mento vegetal, avultando porém estas pro- priedades n'aquellas dobras ou pregas do terreno, onde affluem e se concentram, em maior cópia e abundância, os diversos pro- ductos erosivos. Aguas — Além dos mananciaes, ou nas- centes de agua potável e de rega, regu- larmente productivas, que brotam ou re- bentam em diversas partes da sua super- fície, a quinta da Serra do Pilar possue ainda um avultado e importantíssimo vo- lume d'e6se liquido, em permanente deri- vação, que lhe vem do exterior em aque- ductos aerios e subterrâneos, e com o qual se pode regar a maior parte da sua su- perfície cultivável. Condições económicas e commerciaes — As condições económicas e commerciaes da quinta da Serra do Pilar são de pri- meira ordem : além das diversas estradas e caminhos de viação ordinária, que lhe círcumdam as orlas e lhe cortam as im- mediações em todos os sentidos, facilitan- do assim a extracção e o transporte dos seus productos, a quinta da Serra do Pi- lar dispõe ainda, nas suas proximidades e a pequenas distancias, de uma via de communicação accelerada — a linha férrea do norte; de uma via fluvial — o rio Dou- ro: e de um grande e importantíssimo centro de população — a cidade do Porto, que todos podem contribuir, n'uma larga e poderosíssima escala, para a vasão e consumo prorapto e constante de suas pro- ducções agrícolas. Estado actual da Serra do Pilar — O estado actual da quinta da Serra do Pi- lar é o peior possível. Se exceptuarmos uma pequena parte dos terrenos que o estado arrenda a diversos pequenos agri- cultores, e cuja cultura é, em geral nota- velmente acanhada e rotineira, a grandís- sima parte da sua superfície está no mais completo estado de abandono e do ruína. Por toda a parte, uma vegetação rasteira e parasita, que a invade, incessantemente se reproduz e desenvolve, esgotando, até á mais completa esterilidade, a pouca fer- tilidade que lhe resta. O agrónomo — DiOGO DE Macedo. LINK E A UNIVERSIDADE DE COIMBRA «Não se acha na bibliotheca de fr. Joa- quim de Santa Clara, benedictíno e pro- fessor de theología, homem cheio de espi- 1 Yide J. H. P., vol. V, pag. 114. litteratura rito e de erudição, senão a allemã continuada até 1730. «Teria desejado possuir todas as scíen- cias, para poder bem apreciar o mérito 132 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA d'estes sábios. Sou amigo do dr. Félix de Avellar Brotero, professor de botânica. Os seus conhecimentos n'esta sciencia sào pre- ciosos: nas suas viagens em Portugal, tem- BO applicado particularmente a estudar as plantas d'este reino, e a augmeutar con- sideravelmente as do jardim das plantas. Tem quasi sempre respondido ás minhas perguntas de uma maneira satisfactoria. «Posso com razão collocal-o entre os melhores botânicos de todos os paizes que tenho percorrido ; e, o que é mais admi- rável, elle tem melhor estudado a botâ- nica, que muitos outros sábios mais co- nhecidos, e que obtém as suas luzes em grossos in-folios ; ou que não conhecem senão o género e a espécie das plantas de que fazem menção nas suas obras. «A introducção á obra botânica de Bro- tero, escripta em portuguez -, prova que elle tem tantos conhecimentos, e muito mais facilidade em comprehender as no- vas descobertas, que todos os sábios da Allemanha que tratam a mesma matéria. «Brotero conhece as obras dos botâni- cos allemães. Para cultivar a sciencia, re- sidiu oito annos em Pariz. Não aprendeu em Coimbra; e é por esta razão que os seus collegas lhe causam mil desgostos. E minado pela tristeza e melancolia. «Vandelli afastou-o de Lisboa, por ter muitos conhecimentos, e achou meios de alcançar para o dr. Alexandre, homem sem erudição, um logar que era devido ao mérito de Brotero. «Lembro-me com satisfacção dos nossos passeios botânicos em Coimbra. Apenas se tinha entretido comnosco meia hora, e vira a nossa collecção, que seguro dos seus conhecimentos, nos propoz immediatamen- te um passeio. Era um espectáculo encan- tador, ver e sentir augmentar todos os dias, a estima que nos ligava mutuamente. «Sei que este digno amigo foi chamado a Lisboa, e que o conde de Caparica es- timulou a sua actividade, e reanimou a sua coragem. o O dr. Constantino Botelho de Lacerda 2 "Compendio do botânica, ou noções elemen- tares d'esta sciencia, segundo os melhores cscri- ptores modernos, expostas na liiigua portugucza". Por Félix Avellar Brotero. Pariz, 1787, 2 tomos, in-8.0. O primeiro contém 471 paginas; o segundo 411. O auotor estava em Pariz quando compoz esta obra. 1 Lobo, professor de physica, não vale Bro- tero. Falia muito, é superficial; mesmo os seus conhecimentos em physica são me- díocres, mas em troca é muito laborioso, e cultiva com fructo as sciencias econó- micas. «A economia e outras sciencias, que fa- zem esperar um fructo immediato e prom- pto, são muito cultivadas n'esto momento em Portugal, mas as Musas repellem es-' tas occupações venaes e mercenárias. «O dr. Thomé Rodrigues Sobral, pro- fessor de chimica, é um homem muito há- bil. Conhece os processos actuaes dos fran- cezes n'esta sciencia; ensina a chimica segundo os novos principies antiphlogisti- cos ; traduziu até a sua nomenclatura em portuguez, e se occupa agora em publicar um manual de chimica, que falta em Por- tugal. Não duvido por modo nenhum do seu bom êxito. «N'uma palavra, Portugal possue ho- mens que conhecem o estado actual da lit- teratura. Ha ahi muito excellentes cabe- ças, mas é difficil achar n'este paiz sábios profundos, que cultivem as sciencias uni- camente por amor d'ellas. «A razão por que esta Universidade é, em geral, tão pouco útil, não é difficil de advinhar. «N'um paiz onde são obrigados a fazer imprimir os seus escriptos sem retribuição, e á sua custa, ou, com muita difficuldade, á do rei, os auctores devem ser bem ra- ros. Mas d 'onde vem esta indolência pelas sciencias? É porque a venda dos livros não compensa jamais as despozas da im- pressão? «Uma censura severa, um tribunal da inquisição, sempre temivel para os escri- ptores, bastam para extinguir todo o ar- dor pelo estudo. Todas as sciencias são irmãs; umas tem a sorte das outras. Se se não tivesse conservado as inscripçoes gravadas sobre antigos monumentos, não se procuraria hoje ahi o musgo; e Black não teria jamais descoberto o acido oxi- génio, se não se tivesse duvidado das ca- thegorias do Stagirita.» Coimbra. J. Martins de Carvalho. JORNAL DE HORTICULTUEA PRATICA 133 APPÁRELHO PARA REGAR ARRELVADOS Nas grandes parques de Pariz vimos usar para a rega dos arrelvados, por oc- casião da Exposição Intei-nacial de 1867, um apparelho assas engenhoso, que rea- lisava grande economia de tempo e pre- feição de trabalho. Este apparelho compSe-se de tubos de folha de ferro de 40 a 80 millimetros de m-^r:Mim %í 4^ Ml rmi ^w diâmetro, segundo a grandeza que se lhe quer dar. Os tubos são ligados uns aos ou- tros por peças de couro que formam uma espécie de articulações e são fixos a pe- quenos eixos de ferro fundido e" munidos do rodinhas de pau para não cortar a relva. í Em logar da lança que geralmente cos- tuma terminar este género de apparelhos destinados á rega, tem aparafusado, á ex- tremidade do ultimo tubo, uma espécie de pequeno chapéu que fecha hermeticamen- te o orifício e a agua sahe pelos orifícios dos tubos, que estão a 1 ou 2 metros de 134 JORNAL DE HORTICULTURA TR ÁTICA distancia uns dos outros como melhor se poderá ver pela fig. 28 extrahida da obra de Alphand — «Les Promenades de Paris». Os orifícios sào feitos com uma punção ou sovella de sorte que o jacto forma com o horisonte um angulo de 45^ o o que lhe dá a maior amplidão possível. As rebarbas que faz a sovella no inte- rior do tubo, deixam-se ficar com o fim de dividir o jacto e fazer cahir a agua á maneira de chuva e logo que a porção do arrelvado em que pousam os tubos está sufficientemente regada, mudam-se os tu- bos para o logar que se desejar com a maior facilidade. Com um apparelho d'este8 que tenha 300 metros pode um homem só regar con- venientemente uma extensão de 1:500 me- tros por hora. Oliveira Júnior. DO SOLO QUE CONVÉM ÁS PRLNCIPAES ESSÊNCIAS FLORESTAES QUE SE CULTIVAM NO PAIZ Quercus joedunculata, Ehrh. — Carva- lho commum. — Esta arvore dá-se em qua- si todos os terrenos, comtanto que não sejam demasiadamente seccos ou áridos; mas prefere os graniticos, schistosos e ar- gillosos. Requer muita humidade; ás vezes em terrenos muito irrigados e quasi pantano- sos é aonde vegeta com mais vigor e ad- quire maiores dimensões. Mathieu, na sua obra intitulada «Flore forestiere», diz que lhe é indifí'eronte a composição mineraló- gica do solo. Perthuis assevera que esta espécie de Carvalho^ era França, não ve- geta nos texTcnos de greda. E arvore de planicie, no entanto encontra-se nos terre- nos accidentados associada ao Quercus ses- siliflora. Prefere as regiões boreaes ás do meio dia. Quercus Sessiliflora, Smith. — Carva- lho roble. — Dá-se nos terrenos calcareos e arenosos e pedregosos, comtanto que se- jam sufficientemente húmidos e mediana- mente compactos; os argilosos e pantano- sos são-lhe desfavoráveis. Vegeta em todas as exposições, menos nas do meio dia. Quercus hyhrida, Brot. — Carvalho cer- quinho da Beira. — Prospera em quasi to- da a qualidade de terrenos. Profere a ex- posição sul a todas as outras, Quercus puhescens, Willd. — Carvalho pardo da Beira. — Prefere os calcareos sec- cos a todas as outras naturezas de terre- no, o busca a mosma exposição da espé- cie antecedente. Quercus lusitanica, Lara. — Carvalho lusitano. — Afteiçoa-se aos terrenos subs- tanciosos, férteis, profundos e frescos. E arvore própria das regiões montanhosas, mas vae bem também nas planícies. Agra- dam-lhe as exposições do norte e leste. Quercus tozza, Bosc. — Carvalho tozza. — Encontra-se nos terrenos siliciosos pu- ros ou misturados cora alguma argilla, tanto seccos como húmidos ; nos solos mais ingratos elle prospera. Agradam-lhe todas as exposições. Quercus ilex^ Lin. — Azinheiro. — Dá-se em todo e qualquer terreno, por muito árido que seja, mas vegeta de preferencia nos solos calcareos. Vae bem em todas as exposições; não lhe agradam as monta- nhas elevadas. Quercus suher^ Lin. — Sobreiro. — Com quanto se encontre esta arvore no nosso paiz em quasi todos os terrenos; os que lhe são mais aíFeiçoados são os schistosos e graniticos quando são sufficientemente frescos e profundos ; não lhe agradam mui- to os calcareos e foge dos muito húmidos e pantanosos. Dá-se em todas as exposi- ções, mas prefere as do meio dia. Quercus occidentalis, Gay. — Carvalho Occidental. — Dá-se nos terrenos silicosos ou argillo-silicosos. Prefere as exposições do sul e abrigadas dos ventos ^. Quercus hispânica, Lam. — Carvalho de Hespanha. — Dá-se em terrenos de qua- lidade medíocre. É de todas as espécies indigenas do paiz a que suporta tempera- tura mais elevada. Castanca vesca^ Goert. — Castanheiro. — Prospera nos terrenos graniticos, schis- tosos e grés, quando são sufficientemente profundos e substanciosos; nos calcareos 1 E' preciso não confundir esta espécie com a antecedente. JORNAL DE IIOTITICULTURA PRATICA 135 e nos extremamente húmidos ou pantono- sos não se dá. Aífeiçoa-se aos terrenos pouco accidentados, e busca as exposições quentes. Fraxinus excelsior, Lin. — Freixo com- mura. — Os terrenos que lhe são mais af- feiçoados são os profundos, húmidos e sub- stanciosos ; também vegeta nos ligeiros e seccos ; foge dos solos pantanosos, compa- ctos, argilosos e arenosos. Encontra-se a todas as exposições menos nas meridio- naes; os climas temperados são-lhe os mais favoráveis. Dá-se nas montanhas e colli- nas; mas prefere os valles e planicies. Uhnus campesiris, Linn. — Olmeiro. — Esta arvore dá-se em quasi todos os ter- renos, quando não sejam extremamente argilosos ou áridos e foge dos pantanosos. Vegeta tanto nos terrenos accidentados como nas planicies e prefere as exposições do quadrante norte ás do sul. Ceitis australis, Linn. — Agreira. — Re- quer terreno fértil, profundo e fresco; nos demasiadamente seccos e húmidos não se dá. Vae bem a todas as exposições. Acer pseudo-platanus, Linn. — Planta- no bastardo. — Dá-se nas encostas e pla- nicies, em quasi toda a natureza de ter- renos, comtanto que sejam frescos e pro- fundos ; em solos puramente argilosos e arenosos quasi que não vegeta ; nas areias gordas e humiferas adquire ás vezes sof- friveis proporções. Foge dos solos panta- nosos. Acommoda-se com todas as exposi- ções menos com as meridionaes. Aesciilus liippocastanum.j Linn. — Cas- tanheiro da índia. — Quer terreno fértil, profundo e fresco. Agradam-lhe as expo- sições austraes. Tilia europea^ Linn. — Tilia da Europa. — Os terrenos que lhes são mais aífeiçoados, são os arenosos, férteis, profundos e fres- cos; dá-se nos calcareos e argilosos; foge dos solos cretáceos e dos pantanosos. En- contra-se em todas as exposições, mas pre- fere as do norte e noroeste ; dá-se nas mon- tanhas e collinas, mas agradam-lhe mais os valles e planicies ; vive melhor nos cli- mas septentrionaes do que nos meridionaes. Rohinia pseudo-acacia, Linn. — Acácia bastarda. — Dá-se de preferencia nos solos ligeiros, substanciosos, profundos e frescos; repugnam-lhe os terrenos áridos, compa- ctos e extremamente húmidos. Agradam- lhe as exposições meridionaes. Gleditschia Triacanthus, Linn. — Espi- nheiro da Virgínia. — Requer chão fértil profundo e substancioso; nas areias gordas e humiferas também vegeta soffrivelmen- te. Aífeiçoa-se ás exposições quentes. Ceratonia siliqua, Linn. — Alfarrubeira — Prospera em quasi todos os terrenos, exceptuando os pantanosos. Procura as exposições meridionaes, e prefere as re- giões pouco accidentadas e da planície. Cereis siliquastrum, Linn. — Olaia. — Afifeiçoa-se aos terrenos substanciaes, pro- fundos e frescos, comquanto se dê tam- bém nos outros solos, mas adquirindo me- nores proporções. Prefere as exposições quentes. Coimbra. ^^ .. , , . (Continua). A. Frederico Moller. CHRONICi HORTICOLO-ÁGRICOLi Em dezembro do anno passado noticia- mos a publicação do primeiro volume da «Arte Veterinária ou Tractado dos Ani- maes domésticos — sua creação, propaga- ção e conservação», obra traduzida dos melhores auctores estrangeiros pelo snr. M. L. Agora recebemos o segundo. Este segundo volume é dividido em dez capitules que tractam do seguinte: V Phar- macia veterinária. — VI Arte de ferrar. — Yll Economia dos animaes ou do gado. — -Vni Principaes raças de cavallos e sua creação. — IX Do apparelho ou arreios. — X Do asno e da mulla. — XI Raças bovi- nas e sua creação. — XII Do porco. — XIII Do carneiro. — XIV Da cabra. Sobre a especialidade é das obras mais apreciáveis que temos no nosso idioma e que por isso deverá ter boa acceitação. Nós já a recommendamos por occasião de apparecer o primeiro volume e julga- mos portanto inútil fazel-o novamente, res- tando-nos só agradecer mais uma vez ao snr. M. L. o seu delicado oíferecimento. — A despeza que a cidade de Pariz faz annualmente com a jardinagem é como segue: Bosque de Bolonha, 387:000 fran- 136 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA COS ; Bosque de Vincennes, 270:340 fran- cos; squares, 545:220 francos; custo de plantas, 40:000 francos ; despeza com as estufas 11:000 francos; total 1.253:560 francos ou 225:640í>800 reis. É ura poiccochinho mais do que aquillo quo gasta a camará do Porto com a sua jardinagem. Pois não é? — A longevidade das arvores varia mui- to mas os respectivos cálculos que se tem feitOj dSo-nos as seguintes conclusões que se approximam da verdade. Cereis siliquastrum 300 Ulmus campestris 335 Heclera helix 450 Acer campestre 516 Betula alba 576 Citrus anrantium 630 Cupressus sempervirens 800 Olea EiLVopaa 800 Juglans regia 900 Platanus orientalis 1000 Tilia Europcra 1100 Epicea, Picea vulgaris 1200 Quercus robiir 1500 Cedrus Lihani 2000 Schuhertia disticha 3000 Taxiis haccata 3200 Estes cálculos foram feitos pelas cama- das annuaes e concêntricas das arvores mais velhas que tem sido observadas. — N'um dos últimos números do «Gar- den» (n.° 124, vol. V) dcparou-se-nos uma noticia que é um curioso apontamento para a historia da pomologia portugueza. Re- produzimol-a na sua integra : «Na Toscana, no tempo dos Medicis, vê-se por uma lista manuscripta dos fru- etos servidos durante o anno á mesa do gran-duque Cosme III, que o numero das differentes qualidades de peras subiu a duzentos e nove. Em outro manuscripto da mesma cpocha eleva-se este numero a duzentos e trinta e duas. Entro ellas con- ta-80 a Pêra Dorice de Portugal a qual foi introduzida pelo mesmo gran-duque e cujos garfos lho custaram cem dobrões de ouro, d'onde veio chamar-se Pêra de cem dohrZas, nome com que ainda hoje 6 co- nhecida assim como sob o titulo de Pêra do duque. — O dr. Edmond Goeze publicou re- centemente, em idioma allemào, um impor- tantissimo trabalho sobre as Aurantiaceas e que dedicou a Sua Magestade El-Rei, o snr. D. Fernando. — No corpo do jornal inserimos um ex- tenso artigo sobre a creação de uma quin- ta modelo. Este artigo, ou para melhor dizer re- latório, foi dirigido ao governador civil d'estô districto acompanhado da seguinte carta : Illm.o e excm.o snr. Em conformidade com as ideias, quo, acerca da creação de uma quinta, ou granja districtal modelo, eu expendi a v. exc.^ ao tomar posi?e do logar de agrónomo do districto administractivo do Porto, tomo a liberdade de sub- metter á esclarecidissima apreciaçào de v. exc* o presente relatório sobre a conveniência da creação d'essa quinta, ou granja, na extincta cerca do con- vento da Serra do Pilar, propriedade dos antigos cónegos regrantes de Santo Agostinho, e hoje do- minio nacional, sob a direcção immediata do mi- nistério da guerra. Em três partes di^-idi eu este meu trabalho : na primeira — Considerações preliminares — dei uma idoia geral do estado precário da nossa agricultu- ra, apontei as reformas que me pareceram mais necessárias, discuti, na parte referente á instruc- ção rural, o regulamento geral das disposições da carta de lei de 14' de junho de 1871, que creou os logares de agrónomos, e conclui affirmando a crea- ção de uma quinta districtal modelo, como o meio mais efticaz, mais proveitoso e mais pratico de resolver, n'uma grandissima parte, o problema im- portantíssimo da instrucção agricola nacional. Na segunda parte — Instituição de pma quinta distri- ctal modelo — dotini, em geral, as quintas de ex- periência agronómica, optei pelo typo de quinta experimental chamado modelo, e determinei, em exposição summaria, e como convinha ú indole re- sumida do meu cscripto, as condições principaes, (\ne, no meu huniikle entender, se deverão ter era vi.^fta, quando se tractar da instituição de uma quinta tlistrictal modelo no districto administrati- vo do Porto. Finalmente, na parto terceira — Des- cripção da quinta da Serra do Pilar — descrevi, tão (.Ictalhadamonte como o caso o pedia, a quinta da Serra do Pilar, cuja transformação em quinta districtal modelo eu proponho. Como v. exc.^ verá, eu procurei sempre, em todo o meu trabalho, desviar-me de toda a ideia espe- culativa, e encarei a questão como jnlgo se devem encarar todas as questões de immediata applica- ção o verdadeira importância, pelo seu lado oxe- quivcl, positivo o pratico. V. exc* dirá se acertei. Deus guardo a v. oxc* — Porto, 23 de fovureiro de 187K lUin." e cxc.° snr. Bento do Freitas Soares, di- gníssimo governador civil do districto administra- tivo do Porto. O agrónomo do distr. administr. do Porto, DioRo DE Macedo. — Talvez a muita gente pareça impos- sível que sem gado se possa obter estru- me e excellcnte estrume. Ilão-de sorrir-se incrédulos os rotineiros, mas o que é certo é quo é uma cousa fácil e destituída até de novidade. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 137 Este estrume a que nos referimos é um composto chamado estrume Jcmjfret^ do nome do seu inventor^ modesto cultivador do Meio dia. Fabrica-se do seguinte mo- do : Apanham-se as uvas más, cardos, or- tigas, n'uma palavra todas as plantas que na aldeia se consideram damninhas e ser- vem em geral para Larrancar os caminhos; collocam-se em montes que se regam cin- co ou seis vezes com uma lexivia que de- termine rápida fermentação. Esta lexivia é formada do seguinte modo: kiL Gesso era pó 200 Fuligem de cliaininé 50 Cal viva 30 Matérias fecaes 100 Cinzas de lenha não lexivada. • 10 Salmaiinlio 500 Salitre refinado 300 Diluem-se estas matérias em quantidade d'agua sufficiente para fazer 10 hectoli- tros de mistura. Com esta mistura se faz a rega. Ao cabo de 20 a 2õ dias tem-se um excellcnte adubo, que pode ser levado ao campo e enterrado. Esta noticia colhemos nós no «Journal des Campagnes». — A primeira sociedade em llespanha para promover a cultura de plantas exó- ticas e para proteger os animaes foi fun- dada em 1872 pelo snr. D. Ambrósio Gri- naldi. — O dr. Hartig, tendo feito numerosas experiências para determinar qual era a melhor epocha para cortar madeiras, con- cluiu que os mezes de março e abril eram os preferíveis. — Mr. Cornu, encarregado pelo ministé- rio d'agricultura de França de estudar a nova moléstia das vinhas, acaba de rece- ber ordem para proseguir com as pesquizas que tinha principiado o anno passado. Mr. Cornu vae partir para a Gironde, Hérault e Charente, onde o terrível inse- cto ganha continuadamente terreno. — Acaba-se de fundar uma eschola de horticultura em Clermont-Ferrand, no jar- dim que pertenceu ao botânico H. Lecoq, auctor do «Monde des Fleurs» e de mui- tos outros trabalhos apreciáveis, e falle- cido em 1871. — ]\rM. Vilmorin Andríeux & C.'^, anmmcíam no seu ultimo catalogo a se- mente do Pepino a que dào o nome de RoUisson'» telef/raph e que se recommenda por ser uma variedade muito precoce. O conde Léonce de Lambertye diz que no dia 9 d'abril colhera cinco fructos: um de 2G centímetros de comprido, dous de 27, um de 32 e outro de 39 centímetros. O Pepino Eollisson's telegraph tem a casca quasi completamente lisa e d'um verde brilhante. A carne é verde, quebra- diça e d'uma excellente qualidade. — Na sessão de 23 de janeiro de 1874 da Sociedade zoológica d'Aclimação íize- ram-se as seguintes communícaçoes, que julgamos que devem interessar aos nossos leitores. Foi descuberta em Jatíva, província de Valência (Hespanha) uma Eomanzeira sem sementes. Este achado não é novo, por- quanto já o barão Cloquet tinha fallado d'esta Eomanzeira como sendo muito cul- tivada nos arrebaldes de Terragona; de sorte que não dispensava a reclamação que tinha sido feita de obter a mesma Eoman- zeira sem sementes, da fronteira da Pér- sia, confins do Turkestão. Mr. Turrei deu conta d'uma nota en- viada por seu filho, Mr. Victor Turrei, cirurgião ajudante a bordo d'um navio actualmente na Indo-China, sobre uma cu- riosa industria, que elle observou na ri- beira de Tourane (Conchinchina), exerci- da pelos guardas de patos. «O pato na Conchinchina supre perfei- tamente a carne de açougue, porque, sal- vo nos grandes centros como Saigon e Hué, não se matam bois. A creação do pato faz-se pois n'uma larga escala, e de um modo simples e económico, com certa ori- ginalidade. «Os guardas de patos, pastores d'estes rebanhos aquáticos, passam a sua vida nos rios, que percorrem n'uma pequena barca feita de tranças de rotim (espécie de junco) e resina annamite que a torna impermeá- vel. «Cada guarda conduz sosinho bandos de três ou quatro mil patos, que dirige contra a corrente, ao iongo das margens, onde encontram um pasto abundante. A' tarde pára, e a um assobio particular to- das estas aves se juntam ao seu guarda sem que falte alguma. «O que ha n'isto de mais singular é que, quando muitos guardas estão juntos na mesma margem, os patos não se mis- 138 JORNAL m: TÍORTirULTURA PRATICA turam nunca com os bandos visinhos, e nunca se levanta a mais pequena questSo de reinvindicaçilo entre os guardas. «Quando os Landos chegam a um centro de populaçílo, estos animaes engordados sem despeza, veudem-se pelo preço de 75 cêntimos cada um, o que constituo um rasoavel rendimento. — Em França estào-se occupando muito do bicho da seda que se alimenta da folha do Ailanthus glanchãosa — o Bomhyx cyn- thia. Pelos modos está completamente acli- mado e em Pariz, no Museu, está des- truindo todas as folhas d'aquella arvore. É uma nova riqueza que a Europa vae ter e que vem em excelíente occasiào vis- to que o Bomhyx movi está soffrendo mui- to com a epidemia que tem grassado nos últimos annos. — Do snr. Miguel Ventura da Silva Pinto recebemos dous exemplares de um opúsculo que tracta do Sulíurador auto- mático, de que o mesmo senhor é inven- tor. O uso do gaz acido sulfuroso, ou fumo de enxofre como vulgarmente se lhe cha- ma, vae começando a ter bastante appli- caçào no nosso paiz e para nós é ponto de fé que o seu emprego se vulgarisará desde o momento em que o nosso lavra- dor se compenetrar de que é o meio mais efficaz e económico de conservar as suas colheitas. E claro que isto só se entende com os vinhos que nào são genuinos, por- que para esses é indispensável a aguar- dente. O theionoxyphero do snr. Batalha Reis como que veio chamar a attençào dos vi- nhateiros e negociantes d'este ramo agrí- cola e as experiências realisadas ató hoje tóm dado o melhor resultado. Apparece agora outro apparelho, que o seu inventor denomina «Sulfurador auto- mático» e que pela sua simples applicaçào se torna mui recommendavel. Nao queremos, porém, encarecer um dos apparelhos para depreciar o outro e ninguém melhor do que aquelles que se servirem dos dous poderão dar o seu ve- redictum. O do snr. Batalha Reis já o vi- mos funccionar por muitas vezes e o do snr. Silva Pinto apenas o conhecemos pe- las linhas que acabamos de ler no seu in- teressantíssimo trabaUio. Para se formar uma ideia das vanta- gens e economia que resultam do emprego do gaz sulfuroso para a conservação do vinho, apresenta o snr. Silva Pmto os se- guintes cálculos: Suppondo que o algarismo 1.400:000 pipas de vinho, em que, termo médio, se computa entre nós a producçào annual total d"este producto, e elimi- nando os vinhos finos ou preciosos do Douro e de outras regiões vinhateiras, os chamados verdes e os sacrificados a destillação, só cerca d'umaB duas quartas partes d'aquella totalidade, ou 750:000 pi- pas, representam a massa de vinhos mediangs ou de pasto susceptível de ser conservada pelo acido sulfuroso, e destinada tanto ao consumo interno como á exportação, e que no tempero ou lota de cada pipa do mesmo vinho despendemos apenas uns 3:000 reis de aguardente, teremos só n'este objecto 2.250:000:000 reis, verba que representa nem mais nem menos, subtrahidos uns 900:000 reis, que tanto poderão importar os 11:250 kilogram- mas de enxofre qiie é necessário consumir na snl- faração d'aquella massa vinaria (calculando 10 litros de gaz por pipa de vinho), a economia rea- lisavel ou a importância do lucro a embolsarem em cada anno ou colheita ! Um lavrador qne recolha apenas umas 40 ou 50 pipas d'este vinho em cada um anno, supprindo a agnardentação pelo gaz acido sulfuroso poderá economisar annualmente de 120:000 a 150:000 reis, que tanto lhe deveria custar a aguardente addicio- nal. Por outro lado a quantidade de vinho disponí- vel augmentaria consideravelmente e quasi na ra- zão da economia de álcool realisada, que seria ain- da assim, na nossa hypothese, pelo menos de 25:000 pipas de 30 almudes cada uma. Agradecendo ao snr. Silva Pinto a sua delicada attenção, ainda nos cumpre di- zer que o Sulíurador automático foi pre- miado pelo grande jury da exposição de Vienna d'Austria de 1873. — Em seguida publicamos a lista das variedades de peras que foram considera- das de primeira ordem pelo congresso po- mologico de Vienna. fSotivenir du Congrcs — Agosto, setem- bro, conserva-se algumas semanas. tíeigneiir Esperen — Setembro, outubro, conserva-se três semanas. Fondante des bois — Setembro, outubro, conserva-se três a quatro semanas. Beurré Hardy — Setembro, outubro, con- serva-se três semanas. Poire Dechant — Outubro, principies de novembro, conserva-se quatro semanas. Beurré Capiaumont — Outubro, conser- va-se três semanas. iMcirie Louise — Outubro, conserva-se três semanas. Beuii'é, superfin — Outubro, conserva- se trcs a quatro semanas. JORNAL DE HOKTICUI-TURA PRATICA 139 Louise bonne d'Avranches — Outubro, conserva-se três a quatro semanas. Duchesse d' Angoidcme — • Outubro, no- vembro, conserva-se quatro a seis sema- nas. Colmar d'Aremberg — Outubro, novem- bro, conserva-se seis a oito semanas. Soldat làboureur — Outubro, novembro, conserva-se seis semanas. Beurré de Grumkow — Outubro, novem- bro, conserva-se quatro a cinco sema- nas. Conseiller à la Coiir — Outubro, no- vembro, conserva-se quatro a seis sema- nas. Nouveau Poiteau — Outubro, novembro, conserva-se três a quatro semanas. Passe Colmar — Meiado de novembro até dezembro, conserva-se seis semanas. Bonne de Malines — Dezembro, conser- va-se cinco a seis semanas. Beurré rance — Janeiro, março. Èeurré Sterckmans — Janeiro, março. Joséphine de Malines — Janeiro até mar- ço., E curioso observar-se que metade das peras escolhidas pelo Cercle d'Arboricul- ture de Belgique aclia-se comprehendida no numero das que foram agora selectas no congresso de Vienna. — Em seguida inserimos uma tabeliã da produção da seda em vários paizes: Kilos Itália produz por anno 5.000,000 França " " " 2.500,000 Turquia " " " 2.000,000 Hespanha produz por anno 500,000 Grécia " " " 300,000 Áustria " " " 300,000 Portugal " " " 250,000 Allemauha " " " 250,000 Total. . . 11,100,000 — No dia 1 do mez passado, teve logar no Palácio de Industria, em Pariz, a aber- tura d'uma exposição horticola como já ha muito alli não houve. lia dez annos que alli não se realisa uma mais notável e o «Figaro» occupan- do-se d'ella exprime-se assim: Contam-se nada menos de 128 concur- sos differentes. Abrigos para vinhas, para arvores fructiferas, pavilhões, caraman- cheis, bancos, grades, facas, podões, bom- bas, e instrumentos de todas as formas, etc, etc. A exposição é tão considerável este an- no que occupa a nave inteira e foi neces- sário mudar para as naves lateraes os ins- trumentos e os productos industriaes per- tencentes á horticultura. Durante toda a manhã os differentes jurys funccionaram, inspeccionando todos os objectos, e notando os expositores a quem deviam ser dadas as recompen- sas. O primeiro premio d'honra do ministro das bellas-artes, um objecto d'arte, dado pela manufactura de Sevres, coube a Mr. Barre, jardineiro de Mr. Vorh, por uma admirável collecção de Palmeiras. Um outro objecto d'arte foi dado a Mr. Chautin, por plantas d'eslufa quente. A primeira medalha d'ouro do ministro das bellas-artes a Mr. Savoye, horticul- tor, também por plantas d'estufa quente. Uma segunda medalha d'ouro a Mr. Vilmorin, por plantas do ar livre. A medalha d'ouro do perfeito a Mr. Lad- mam pela sua collecção de Orchideas. A medalha d'ouro da Ville de Paris a Mr. Vallerand, pela sua collecção de Glo- xinias. A medalha d'ouro das santas padroei- ras, a Mr. Margotin, por uma admirável collecção de Rosas. A medalha da sociedade horticola. . . Nós não podemos mencionar tudo. Ci- tamos somente o concurso de Roseiras^ em que era preciso dar premio aos quatro concorrentes; o concurso de Amores per- feitos^ muito notável e muito disputado ; o concurso de Pyrethrumsj no qual uma magnifica collecção, exposta por Mr. Loi- se-Chouvière, não pude ser premiada por elle fazer parte do jury. Um grande numero de personagens im- portantes tem visitado a exposição. Cite- mos o marechal Mac-Mahon e a duqueza de Magenta, o conde de Paris, o príncipe Napoleão, Mr. de Metternich e Mad.^ne de Metternich, etc. — O Pinus strohii. ' de todas as arvo- res resinosas, na America, a que mais ef- ficazmente resiste ás alternativas de calor e humidade. E muito estimada em toda a nova Inglaterra e os americanos expor- tam grandes porções para a Europa. Ape- sar do emprego illimitado da madeira de Pinheiro, nada demonstra a mais peque- 140 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA na diminuição d'esta preciosa essência nas riquezas íiorestaes dos Estados Unidos. O Pinux sfrohus, mais conhecido pelo nome de Pinheiro da Lord Weymouth, por quem foi descoberto no Canadá, ó uma elegante arvore que no seu paiz natal at- tinge a softVivcl altura de GO metros, com o diâmetro proporcional, dimensões que no nosso clima ficam reduzidas a 40 me- tros pouco mais ou menos. Cresce rapidamente tomando logo pi*o- poryões gicantescas se o solo em que cn- raiza é fértil e fundo. Ainda assim nos terrenos áridos e em qualquer exposição desenvolve-se o bas- tante para se recommendar como boa es- sência florestal. Na America, como acabamos de dizer, é muito empregado para toda a casta de construcções civis e navaes, sendo os mas- tros d'esta madeira mais leves do que os do Pinheiro de Riga, mas menos fortes. Todas estas preciosas qualidades que os americanos tanto apreciam desapparecem nos nossos climas, onde a madeira d'esta arvore pode equiparar-se com a do Chou- po. Ainda assim podemos recommendar o Pinus strohus pelas seguintes vantagens — 1.° pelo seu mérito ornamental; 2.° pela sua vegetação fácil, rápida e rústica tanto nos terrenos áridos, como nos solos hú- midos e alegadiços. — Um jornal estrangeiro refere o se- guinte a propósito dos calores prematu- ros: No anno de 1172, a primavera principiou no mez de fevereiro e os calores foram tào precoces que an arvores floriram nos primeiros dias de março. Em 1289, venderam-se em Pariz Violetas e Lila- zei, na ultima quinzena de fevereiro. No mez de abril, os oaloros foram tão fortes que as aguas do Sena baixaram consideravelmente. Em 1421, floriram as arvores no mez de março e as vinhas no mez de abril. Em 1572, as arvores cobriram-se de folhas no mez de fevereiro. Os calores de abril foram mais fortes que em 1289 e a contar do dia 15 muita gen- te começou a tomar banhos no rio. Succedeu quasi o mesmo durante os annos de 158.% 1607, 1G09 e 1659. Depois d'csta opocha de- vem-se citar as primaveras de 1800 e 1846, em que o thermometro marcou, durante o mez de abril, 26 e 28 graus liéaumur. — Diz- se que na Escossia a producçâo de fructa vao diminuindo de anno para anno. N'um recente mecting da Sociedade Botânica de Edinburgo, leu ^Mr. j\IcNab uma noticia que tinha por titulo «IVovas evidentes da mudança do clima da Es- cossia» c observou que muitos dos antigos jardineiros escossezes, assim como alguns amadores, eram de opinião que muitas va- riedades de fructa agora cultivada n'aquel- le paiz, não eram de modo algum eguaes ás que se cultivavam ha 30 e 50 annos. As maçãs Rihston Pij)pin e Non pa- reil, por exemplo, são actualmente de ta- manho e de gosto inferiores. — Do snr. dr. Ba.silio Constantino de Almeida Sampaio, de ^lurça, recebemos a seguinte communicação, datada do mez passado : Os campos apresentam n'esta quadra um aspe- cto encantador e aprasivel, que faz scismar bucó- licas e idyllios mesmo áquelles que não são dota- dos da força de génio e d'expressâo dos Gessner, Theocrito, e Virgílio. ' O estado agricola manifesta-se d'um modvbem auspicioso. As messes de centeio lourejam, e em muitos le- gares visinhos já começou a ceifa, que promette ser abundante tanto em gi-ão, como em palha. Anda-se na ceifa das cevadas; algumas já estão malhadas. Ha muito boas esperanças de abundante colhei- ta de batatas. Os linhos (gallegos) téem bom principio; porque os mouriscos perderam-se pela falta d'aguas, e pelas grandes geadas do inverno. Os milhos painços estão promettedores ; e ha grande sementeira d'estes, que devem supprir a falta dos fenos, de qre ha de haver grande escas- sez pela falta d'aguas nos prados. O trigos estão excellentes, bem como os grãos de bico. As vinhas rebentaram mal; porém algumas ha com maito fructo, e estão cm meio da limpação, que será boa, se houver calor n'este8 10 ou 12 dias. Já appareceu o oidium-tuckeri, que se tracta de combater com o costumado enxofre. As Oliveira» estão lindíssimas com o seu fructo verde-alvo; porém em povoações visinhas a eata lia olivedos muito desprovidos de fructo. Os nascentes eí?tâo muito frouxos ; as aguas ca- bidas tem sido muito poucas. Os montes para estrumes estão muito pouco flo- ridos. Continua a sementeira do feijão-frade, branco e do rajado. Preparam-se as terras para as sementeiras do centeio e trigo. Começaram as redras das vinhas. O preço doa operários é a 280 reis o melo dia. A pipa de vinho para consumo está a 5 libras. O almude d'azeit© a 4:500 reis. O alqueire de centeio a 440 reis, o de feijão branco a 600 reis, e o frad» a 550 reis. — A Sociedade dos Agricultores de França decidiu oftcrecer cinco prémios de 1:000 francos cada um, sendo quatro pai-a diversos íins agricolas e o quinto desti- nado para a pessoa que descobrir o meio mais pratico de destruir o Phylloxtra. Oliveika Júnior. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 141 PERi DOMINGAS É presentemente tão mesquinho o es- tado da pomicultura portugueza com re- lação ao de outras nações, que o digno e intelligente proprietário d'este jornal, ape- sar de ter procurado com todo o interes- se reunir no seu notável estabelecimento uma collecção a mais completa possível das melhores peras nacionaes, apenas tem obtido umas trinta variedades, e ainda de entre estas só sete procedência teem in- contestavelmente portugueza, porquanto a maior parte das outras é assas duvidoso que o sejam, e muito mais provável que, em remotos tempos, fossem importadas do estrangeiro pelos nossos antigos amadores, como já demonstrou com muita critica o Fig. 29 — Pêra Domiiifías snr. Camillo Aureliano n'um bem escripto artigo, inserto no n.° 2 do 1.° volume d'este jornal. N'esse mesmo artigo conclue o erudito pomicultor por desenganar-nos de que não possuímos um pomar verdad^ramente na- cional. Amargo desengano é este, mas força é confessar que não podemos contestal-o! Uma falta de tal ordem depõe forte- mente contra a lamentável incúria que até hoje téem tido os nossos horticultores em não se entregarem á pratica das se- Vol. Y— 187-i, menteii'as das arvores fructiferas, como fazem constantemente os da Bélgica e de França, sendo este meio o único reconhe- cido de se obterem novas e distinctas va- riedades. Este desleixo é tanto mais indesculpá- vel, quanto é certo serem aquelles paizes muito menos favorecidos do que este nos- so pela amenidade do clima e bondade do solo para esta cultura, e ainda para mui- tas outras que desprezamos; podendo-se- nos applicar n'este caso o popular rifão — dá Deus as nozes a quem não tem dentes. N.o 8— Ao-osto. 142 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA No meio, pois, de tão notável penúria folgamos que nos seja permitticlo vir hoje, nas columnas d'e8te jornal, dar noticia aos amadores de pomicultura nacional de uma variedade de peras, devida por certo ao acaso, mas portugueza genuina. Não é ella d'hoje nem d'hontem, pois já conta bastantes annos de existência, mas ape- sar d'isso é ainda mui pouco conhecida, nem nos consta que por emquanto se en- contre em mais de quatro ou cinco poma- res todos próximos da localidade onde o pé-màe foi nascido. Falíamos da Pêra Domingas j representada na gravura que acompanha este artigo, e cuja historia pas- samos a referir. Domingos Kodrigues Leite, abbade de S. Thomé de Vade, no concelho da Ponte da Barca, fallecido no anno de 1848, foi sempre muito ajjaixonado por flores e fru- cteiras. Aconteceu que um dia, descendo a escada da sua residência, encontrasse nascida na fenda d'um degrau uma pe- quena planta, que logo reconheceu ser uma Peixeira. Tirou-a d'alli e plantou-a n'um vaso, onde a tractou com toda a cu- riosidade, até que vendo-a bastante des- envolvida, a transplantou no seu pequeno pomar. Alli cresceu a nova Pereira^ e passados annos, cujo numero não sabemos precisar, deu as primeiras peras, que o bom abbade colheu com muito interesse, e tendo-as provado íicou summamente sa- tisfeito por as achar muito superiores em bondade ao que esperava. Em attençao ao seu nome baptisou esta nova variedade com o de Pêra Domingas^ com que ficou sendo por aqui conhecida. E uma pêra de tamanho mais que me- diano, pyriforme, com a epiderme um pou- co grossa de cor pardacenta arruiva^a, muito parecida com a da variedade co- nhecida pelo nome de Amorim do norte, da qual temos fortes razoes para suppor que esta proceda, pedúnculo curto e gros- so, polpa branca, tenra, muito succosa e agradavelmente acidulada. Amadurece desde fins de outubro a meiado de novem- bro, e conserva-se ordinariamente nos fru- cteiros até janeiro. O benemérito proprietário d'este jornal^ a quem ha pouco proporcionamos occasiào de ver e provar esta pêra, achou-a excel- lente, segundo teve a bondade de com- municar-nos; e como teve a complacên- cia de acceitar o offerecimento que lhe fizemos da remessa d'alguns garfos (o que já cumprimos) é de crer que brevemente se encontrem no seu estabelecimento al- guns exemplares d'esta variedade. Casa e quinta d'Agrella. António de Faria. EUCâLYPTLS globulus Temos pugnado desde 1868, quanto em nossas Ibrças tem cabido, para generalisar em Portugal a cultura dos Eucalyptus e cora particularidade do E. globulus. Nào o descobrimos o nem sequer fomos seu introductor no paiz, mas temos con- corrido para que todos os silvicultores pos- suam já alguns exemplares d'esta excel- leute e incomparável essência florestal. Promotor infatigável, pois, da cultura e propagação em Portugal d 'esta famosa AJyrtacea, nào perdemos occasiào de fal- lar das vantagens que d'estas arvores po- dem advir á silvicultura, assim como das valiosissimas apj)licaçoe3 que a scieucia lhe vae descobrindo de dia para dia. Todos sabem que sem i\Ir. ' amei o Euca- lyptus glohulus estaria ainda desterrado no canto do algum jardim botânico. E pois a elle que a Europa deve a sua vulgariyuo. Mr. Ramêl depois do o haver introdu- zido na Europa, guiado pela ideia philan- tropica de que a salubridade bem conhe- cida do clima da Austrália é devida ás emanações d'esta arvore, em cujas folhas se acham disseminadas numerosas cellulas cheias de um óleo volátil aromático, não tem cessado de pugnar pela sua propaga- ção. Tem-se feito numerosos exames chimi- cos sobre as folhas e ainda não ha muito que Mr. Cloez se occupou d'este assum- pto importante para a sciencia e para a humanidade. Collocando certa quantidade de folhas seccas no capacete de um alambique de fundo duplo e submettendo-as á distilla- ção em uma corrente de vapor de agua, obtem-se approximadamente 2 p. c. de óleo essencial, incolor e mais leve do que JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 143 a agua. Esta essência possue em subido grau o cheiro da planta. A agua concentrada de uma pequena quantidade de óleo essencial tem um sa- bor fresco, amargo-camphorado e bastante agradável. Esta agua pode beber-se sem receio, porque não encerra elemento toxi- co algum. Experimentou-se que a essên- cia applicada na quantidade de dez got- tas a um cão não occasionou o menor in- cidente. Mr. Cloetz applicou-se, no exame que fez sobre as folhas, principalmente a ve- rificar os effeitos physiologicos dos produ- ctos complexos que foram extrahidos d'es- tas folhas, por meio da agua, do álcool e do ether e examinou outrosim a natureza do liquido fornecido pela combustão n'um cachimbo. O tractamento das folhas pela agua quente produziu uma infusão pouco cora- da, de um gosto amargo, adstringente, e de um cheiro activo devido á essência des- envolvida pela elevação de temperatura e ruptura das cellulas. Submettido o liquido á evaporação, dei- xa um extracto acastanhado que foi expe- rimentado n'um cão de raça pequena na quantidade de duas grammas. O animal não teve perigo mas augmentou-se-lhe o appetite consideravelmente, effeito fácil de se comprehender pela acção excitante do producto ingerido. Uma porção do extracto aquoso foi des- truída por incineração e no residuo en- controu-se uma certa quantidade de saes de potassa com vestigios de saes calcareos. Depois do tractamento com a agua, fi- zeram-se com o álcool as mesmas expe- riências sobre nova porção de folhas. A solução turva-se com a agua, contém es- sência, resina, tanino e pela evaporação a banho-maria deixou um extracto acasta- nhado, em parte solúvel na agua. Duas grammas d'este extracto, minis- trados á força a um cão pequeno, produ- ziram aproximadamente o mesmo effeito que o extracto aquoso. Nenhum incidente se manifestou; não fallando d'uma exci- tação passageira que não deixava socega- do o animal. O ether sulfúrico serviu como a agua e o álcool para preparar um producto ex- tractivo e a sua acção foi experimentada n'um cão e n'um coelho. O effeito causado por este extracto foi egual ao dos prece- dentes. Era vista da applicação especial para que Mr. Ramel propõe o uso das folhas, fez Mr. Cloetz queimar lentamente uma d'ellas n'um cachimbo de lata communi- cando por meio de tubos de vidro e de caoutchouc, com um aspirador cheio de agua. O apparelho era de tal modo dis- posto que o fumo tinha de atravessar di- versos frascos onde deixava os productos pyrogenados condensáveis que continha. Por esta operação obteve Mr. Cloetz uma quantidade bastante grande de um liquido aquoso, acastanhado, com algumas gotas oleosas e alcatroadas. O liquido aquo- so é pouco alcalino e não exerce nenhuma acção nociva sobre a economia. Quanto ao producto alcatroado, pare- ce-se com todos os que se obtéem nas ou- tras plantas pela acção do calor. Depois de ter experimentado nos ani- maes os productos voláteis e alcatroados fornecidos por estas folhas e ter verificado a sua completa innocencia, Mr. Cloetz fu- mou-as tanto em cachimbo como em ci- garro e charuto. O fumo produzido por estes três meios de conbustão possue as mesmas proprie- dades e exerce sobre a economia uma acção inversa á do tabaco, isto é, possue propriedades mais excitantes do que nar- cóticas; todavia quem persistir costuma- se a elle e acaba por achal-o agradável. Não estando as folhas corrompidas ou mal seccas, ardem com facilidade, e sendo a combustão completa, a cinza é perfeita- mente branca e muito abundante. Ele- va-se ao decimo do peso da folha, sendo formada em grande parte por saes calca- reos e por uma pequena parte de saes al- calinos. Finalmente, o resultado das experiên- cias de Mr. Cloetz demonstra que as folhas do Eucalyptus glohulus não contéem ne- nhum principio toxico para os animaes, po- dendo-se queimar e respirar pela bocca o fumo sem receio de accidente algum. Em seguida apresentamos o extracto de uma carta de Mr. Cloetz sobre o examo das folhas do Eucalyptxís glohulus. Eil-a: «Os novos ramos do Eucalyptus que 144 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA teve a bondade de me enviar, forneceram na distillaçào um pouco mais de ^ p. c. de essência de um cheiro bastante agradá- vel. As folhas frescas, separadas do caule, produzem aproximadamente 2 p. c. da mesma essência. Não conheço planta alguma indigena que produza tamanha quantidade. Esta essência tem a mesma composição que a essência de terebenthina e é um novo exemplo de isomeria. A sua densidade é egual a 0,896 e en- tra em ebullição a 175 graus. A formula chimica acha-se representada por C 20 H 10 por quatro volumes de vapor. Parece-me que poderia ser extrahida economicamente e substituir com vanta- gem o oleo volátil de terebenthina. Quanto á matéria resinosa contida nos ramos e mesmo nas folhas tem sido pouco estudada até aqui, e só se pode demons- trar que endurece com bastante rapidez e que acaba por seccar-se com a acção do ar, formando uma matéria solida de que S3 poderia egi.almente tirar partido.» O uso do alcooleo de Eucalyptus^ na me- decina vae-so tornando geral em vista dos bons resultados que se tem colhido para combater as febres intermittentes, chegan- do a haver exemplo da febre não ter ce- dido á quinina e ceder ao alcooleo de Eil- calyptus. As experiências datam de 1869, epoeha em que o dr. Lorinser, de Vienna, deu conhecimento dos seus primeiros ensaios n'este sentido, ensaios que elle não pôde então continuar, por se lhe ter acabado o preparado de Eucalyj)tus de que fazia uso. Depois d'aquella epoeha, o snr. Lamatsch, pharmaceutico, cultivou expressamente es- ta arvore, e com as folhas preparou maior porção de medicamento, que distribuiu pelos médicos da localidade, os quaes, mais tarde, fizeram saber ao dr. Lorinser os resultados que obtiveram do seu em- prego. O preparado que o snr. Lamatsch fez com as folhas do Eucalyptus foi o alcoo- leo; e os ensaios com elle feitos subiram ao numero de 53. Dos 53 doentes, 43 ficaram completa- mente curados. Cinco recahiram por não ter havido quantidade sufficiente do medicamento ha- vendo-se recorrido por essa razão ao em- prego da quinina. Dous dos casos não eram de febre in- termittente bem declarada. Em 1, nem a tintura das folhas do Eu- calyptus nem a quinina produziram a cura. Em 1, tanto o medicamento, como ou- tras substancias foram bolçadas. Em 1, o doente não quiz continuar a submetter-se ao tractamento. Em 11, a quinina tinha previamente sido empregada sem resultado; sendo em 10 d'elles, curados os doentes pelo alcoo- leo de Eucalyptus. Em 10 casos, a febre voltou com inter- vallos, que variaram de uma a quatro se- manas. Em 5, teve de recorrer-se á quinina por haver faltado o alcooleo de Eucaly- ptus; nos outros 5, foi empregado este alcooleo com êxito. Em vista dos resultados colhidos d'estes ensaios que foram feitos n'uma localidade onde as febres intermittentes predominam, considera o dr. Lorinser o medicamento em questão muito precioso, accrescendo á sua efficacia o tomar-se com grande facili- dade, ter um gosto aromático e agradá- vel, e obrar favoravelmente sobre os ór- gãos da digestão. Antes de concluirmos esta noticia ainda devemos dizer que os productos medici- naes do Eucalyptus téem outras applica- ções e que a casa Gr. Mathey & Clin, de Pariz— 14, rue Racine — tem á venda gló- bulos de Eucalyptus para as affecções de peito e larynge e outro sim folhas prepa- radas para curativo de feridas. Não levantaremos mão do assumpto de que nos vimos occupando sem apresentar uma lista dos diversos preparados do Eu- calyptus. O snr. Jules Meil, de Sevilha, escreveu-nos uma carta em data de 6 de junho em que nos dá conta dos que já es- tão no uso da medicina. Eis a carta do nosso amigo : «Caro collega — Li na sua chronica do mez de junho de 1873 a communicação de Mr. Ghersi a respeito do uso das fo- lhas do EíicalyptuSj para combater as fe- bres intermittentes. Ha já muitos annos que se usam cm Valência, onde denomi- nam 08 Eucalyptus «El arbol de las ca- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 145 lenturas», assim como na Córsega (Du mauvais air en Corse, par Regules Car- lotti, Ajaccio, 1869). Esta applicaçâo teve depois grande des- envolvimentO; e as infusões de folhas fo- ram supplautadas por outros preparados mais efficazes, mas n'este paiz lô-se tào pouco, a nào ser jornaes políticos e roman- ces, presta-se tão limitada attenção ao pro- gresso das sciencias no estrangeiro, que muitas vezes annuncia-se como novo o que é já muito velho. No notável tractado do dr. Gimbert («L'Eucalyptus globulus, son importance en agriculture, en hygiène et en medici- ne», par le docteur Gimbert, à Cannes), registrado na academia de Medicina de Pariz em 1870 e publicado em 1871, lê-se o que se segue sobre o valor dos differen- tes preparados do Eucalyptus: «Os preparados que empregamos de preferencia internamente são: 1.° a essên- cia; 2.° o pó das folhas; 3.° o extracto alcoólico. A alcoolatura que temos á nossa dispo- sição está sendo objecto de estudo. I — A essência é o producto caracterís- tico do vegetal, e a ella deve o Eucaly- jptus, segundo a nossa opinião, o seu logar na therapeutica; e por isso preferimos o uso d'eila quando as indicações patholo- gicas o permittem. Nas bronchites sub-agudas, na thysica cln'onica, na gangrena pulmonar, etc, é preferível esta essência a todos os outros preparados, pela sua rápida acção sobre as secreções e sobre a tosse. Na dor de cabeça, e em todos os in- commodos nervosos, não se deve deixar usar a essência. n — O pó é um medicamento complexo e de mau sabor, e actua não só pelo ta- nino que contém, como pela essência. Por isso nas affecções thoracicas tem elle ai gumas vezes o inconveniente de difficultar a expectoração. ni — O extracto alcoólico é somente usado junto com o pó do Eucalyptus e forma a base de excellentes pilulas, que substituem perfeitamente o uso do pó. Es- te novo preparado é muito efficaz, e, so- bretudo, tónico. N'esta qualidade é muito útil quando os doentes estão fracos, por- que excita o appetite e fortifica. IV — A alcoolatura do Eucalyptus é sem duvida um preparado importante, posto- que não possamos apreciar devidamente os seus effeitos internos, por termos tido pou- cas occasiões de a empregar. Todavia, paf a tornar bem patente o seu valor, recorre- mos ao tractado do dr. Lorinser, de Vien- na, cujo resumo foi transcripto no «Lyon medicai» d'abril do 1871. Conta o auctor que em 53 casos de fe- bre intermittente, apanhada nas margens do Danúbio, 43 tiveram cura radical com o uso da tintura do Eucalyptus; e isto ainda se torna mais importante em alguns casos, que, tendo resistido ao quinino, fo- ram debellados pelo nosso medicamento. Estes factos vêem corroborar a opinião do dr. Carlotti. Não dará, pois, este successo á alcoolatura, que sobreleva á tintura em efficacia, um futuro mais valioso do que á infusão das folhas do dr. Carlotti? A alcoolatura apresenta, comtudo, um grave inconveniente, o de ter um sabor desagradável e tornar necessária a absor- pção d'uma grande quantidade de liquido. A respeito da acção externa da alco- olatura podemos dizer que é muito efficaz. Empregando-a como desinfectante e como cicatrisante de feridas, produz resultados valiosos sobre os quaes não insistiremos, aguardando os que devem de ser publi- cados por Mr. Demarquay, que, no mo- mento em que traçamos estas linhas, faz experiências da alcoolatura sobre as feri- das, na casa Dubois. V — Empregamos exteriormente as fo- lhas do Eucalyptus, tanto directamente co- mo em cigarrilhas feitas de folhas cortadas ; também fazemos uso d'agua distillada. As folhas machucadas com as mãos, li- vres da nervura media e applicadas como se faz com o diachylão, constituem um bom remédio para pensar feridas, sendo um compressivo excellente, pouco dispen- dioso, e, o que ainda o torna mais apre- ciável, estimulante, cicatrizante e desin- fectante. VI — A cigarrilha é útil nas tosses es- pasmódicas e na asthma. VII — A agua distillada serve para in- halações, injecções, etc. ; mas onde ella é mais efficaz é na toilette como desinfe- ctante, e não ha nada melhor para com- bater as exhalações do suor. 146 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Poderia ainda citar numerosos factos d'cste eminente trabalho, devido ao zelo infatigável de uma das nossas summida- des medicas, porque em cada paragrapho encontramos leitura d'uma utilidade e ins- trucçào preciosas; mas não continuo para nao abusar da bondade que tem usado sempre com a inserção dos meus commu- nicados. » Seria muito proveitoso que os médicos íizessem experiências com as diversas pre- parações do EucalyptuSj e que publicas- sem os resultados. Quando se tracta da saúde publica, todos devemos acolher as ideias e factos novos, passal-os pelo crisol da experiência, e dar aos resultados a maior publicidade. E muito para louvar que os facultativos, que já téem empre- gado as infusões das folhas do Eucalyptus, façam uso da alcoolatura, que é, segundo se assegura, muito superior. Oliveira Júnior. SYNOPSE CHRONOLOGICÀ ' Synopse chronologica das principaes de- liberações e providencias do conselho da faculdade de philosophia sobre o estudo de botânica e agricultura na Universidade de Coimbra, desde 1774 até 1872. 1851 — Em conselho de 14 de março foi presente a proposta de reforma da facul- dade, assignada pelos drs. Goulão e Vi- dal, a qual foi remettida ao fiscal para este dar o seu parecer. Em conselho de 3 de junho foi discu- tido e approvado o primeiro artigo do pro- jecto da reforma da faculdade. Em G do mesmo mez de junho appro- vou-se o quadro do curso da faculdade proposto 'O projecto já mencionado, sendo a 7.^ cadeira a de botânica e a S.""^ d'agri- cultura, economia rural e veteiúnaria. Em 5 de dezembro foi lida a seguinte proposta do dr. Marques, que se mandou correr pelos vogaes do conselho: « Sendo indispensável estabelecer o gabi- nete de agronomia e technologia, propo- nho o seguinte : 1.'' Que se addicione á sala, onde exis- tem os modelos agrícolas, livros e estam- pas, a immediata, que é occupada pelo raachinista José de Miranda, e que estas duas, e aquella em que se acha a aula, constituam o local para o estabelecimento. 2." Que sejam mudadas as estantes que se acham na livraria do edifício de S. Bento c applicadas na referida sala. 3.° Que seja novamente auctorisado o director a empregar em modelos de ma- chinas a quantia de lõOí>000 reis, que ha 1 Vide J. H. P., vol. V, pag. 82. annos o conselho destinou á aula de techno- logia». 18Õ2 — Em conselho de 15 de janeiro foram approvadas, depois de alguma dis- cussão, as propostas apresentadas na ul- tima sessão do anno antecedente para a creação do gabinete de agronomia e te- chnologia. Em 7 de fevereiro apresentou o dr. An- tonino Vidal, director do Jardim Botânico, o catalogo do mesmo jardim, consideravel- mente reformado com os nomes scientifi- cos e triviaes, mandando-se imprimir na imprensa da Universidade, e sendo ado- ptado para o ensino da aula de botânica, como auxiliar da obra de Linneu. Em 22 de novembro foi lido o decreto de 21 de outubro ultimo concedendo ás religiosas ursulinas de Pereira a cerca do extincto convento de S. José dos Marian- nos. Foi apresentado e approvado o se- guinte relatório a respeito do estabeleci- mento de agricultura: A cerca do extincto collegio dos mon- ges benedictinos foi dada á faculdade de philosophia, e mandada incorporar ao Jar- dim Botânico da Universidade por porta- ria do ministério da fazenda de 27 do ou- tubro de 1836, confirmada por cartas de lei posteriores, e destinada principalmente para a plantação e cultura de arvores e arbustos, que até então por falta de espa- ço não se tinham podido reunir n'aquelle estabelecimento, e que o tornava por isso insufficiente para o estudo da botânica e agricultura, a que era destinado. Tendo- se posteriormente creado a cadeira d'agri- cultura, entendeu o conselho da faculdade que seria conveniente separar a cerca do Jardim Botânico, assim como tinha sido JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 147 separado o ensino da agricultura do da botânica. Não se pretendeu então estabelecer uma granja modelo, porque o não permittia: 1.° a natureza, extensão e irregularidade do terreno; 2.' a indole da cadeira de agricultura, tal como ella é e deve ser ensinada na Universidade, constituindo o seu objecto o ensino dos principios geraes de agricultura e economia rural e as leis da producção orgânica, considerando-se a agricultura como sciencia, sendo por isso uma cadeira de agronomia; 3. " finalmente as forças da dotação universitária, sempre limitada e cuja parte proporcional seria muito inferior ás consideráveis depezas que exigem a creação e o respectivo cus- teio d'um tal estabelecimento, só próprio de institutos agrícolas ; mas julgou-se que a cerca seria de um recurso mui valioso para a plantação de arvores e arbustos e para alguns ensaios agricolas, taes como preparação, correcção e amanho de terras, fabrico de estrumes, systema de afolha- mentos para sementes úteis, prados arti- ficiaes, viveiros por sementeira, enxertia, e estaca, naturalisação de vegetaes, etc, convertendo d'este modo a cerca em um estabelecimento de agronomia, e tornan- do-a útil ao ensino da mesma. Para habilitar, porém, a cerca para esta conversão eram necessários: 1.° trabalhos preparatórios importantes, taes como fa- ctura de muros, nivelamentos e algumas construcçoes ruraes ; 2." pessoal apropria- do, guarda que executasse e coadjuvasse as prescripções do director, e moços de ser- viço; 3.° dotação permanente, que substi- tuísse o rendimento da cerca quando este cessasse com a mudança da sua indole, desde que ella deixasse de ser considerada um prédio rendoso. N'este sentido representou o conselho ao governo de Sua Magestade com a respe- ctiva proposta e plano, e tem depois repe- tido suas instancias, já nos differentes re- latórios dos professores e successivos orça- mentos, já n'algumas propostas enviadas ao prelado para serem dirigidas ao gover- no de Sua Magestade. O conselho tem portanto cumprido com o seu dever. Possuidor d'um prédio, que devia converter em utilidade do ensino publico, que lhe está incumbido, mas que exigia despezas consideráveis e pessoal que não podia prover, recorreu ao único meio ao seu alcance, representando ; infelizmen- te, porém, os seus desejos e votos tem sem- pre ficado sem efteito por motivos bem fáceis de avaliar, apesar das boas inten- ções, que sem duvida o governo tém sem- pre mostrado pela prosperidade e progresso dos estabelecimentos universitários. Com- tudo é este o único estabelecimento que não tem dispendido ha annos um sofreai da dotação universitária, sendo o custeio feito pelo seu rendimento, e os sobejos applicados a reparos indispensáveis, e a al- gum melhoramento material no Jardim Botânico, o que tudo consta evidentemen- te das respectivas contas; accrescendo a isto que, sem outros recursos além da sua receita, sem um guarda e com serviçaes pouco instruídos, tem-se aperfeiçoado as limitadas culturas especiaes, que consti- tuem o seu objecto, e desempenhado do melhor modo possível as operações agrí- colas, como fabrico de estrumes, enxertias, plantações de arvores fructíferas e flores- taes, ensaios de prados com esparceto, lu- zerna, etc, etc. Tal é a historia bem resumida, e não me- nos verdadeira, e o estado actual do esta- belecimento de agricultura, que tem cons- tantemente merecido a maior solicitude dos dous professores que o tem dirigido, e que repetidas vezes tem recorrido ao conselho, pedindo providencias e lembran- do arbítrios, que por differentes motivos não teem podido ser levados a effeito, e por isso não tem produzido resultado al- gum útil. N'estas circumstancias será de necessi- dade a nomeação d'um guarda? O conse- lho entende que sim, e as suas attribui- ções nem por isso deixarão de ser variadas e importantes ; e taes são : a direcção das diversas operações de cultura; fiscalí sacão do pessoal quasi constante; a escriptura- ção regular, muito mais extensa e com- plexa que a d'outro qualquer estabeleci- mento da faculdade, e que até poderia exemplificar os preceitos de contabilidade agrícola, recommendados na economia ru- ral; a guarda do gabinete agronómico a technologico, apenas começado, porém que apesar dos minguados recursos da facul- dade, já tem alguns modelos e uma col- 148 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA lecção de estampas de machinas agricolas e technologicas, e as de applicaçào do ga- binete de physica, que o conselho desti- nou ao logar que lhes pertence. E cora es- tas obrigaçijcs de certo lhe não sobejará terapo para outro serviço, e por isso com muita difficuldade poderá conjunctamente ser ajudante do guarda de botânica, e só poderia ter facilmente logar esta disposi- ção, se a cerca de S. Bento, na impossibi- lidade do seu melhoramento ou conversão em estabelecimento agronómico, fosse para os fins exclusivos da sua dotação primit- tiva incorporada no Jardim Botânico com o pessoal d'elle mais apropriado ao servi- ço da mesma, como repetidas vezes tem representado ao conselho o director da mes- ma cerca, como meio único possivel de melhorar seu estado tornando-a relativa- mente útil sem augmento de despeza. Comtudo o conselho, reconhecendo a ne- cessidade do guarda e a utilidade do aju- dante do jardineiro, e tendo em vista o estado da fazenda publica, que demanda a mais severa economia, parece-lhe que poderia nomear-se um guarda ajudante em quanto se não melhorar o estado da cerca de S. Bento. O conselho aproveita esta occasião para também lembrar a admissão de uma clas- se de aprendizes, tanto no Jardim Botâ- nico e estabelecimento de agricultura, co- mo no laboratório chimico e gabinete de zoologia, parecendo ao conselho que é o meio mais conveniente e ao mesmo tempo o mais económico para occorrer ao serviço d'estes estabelecimentos, e assegurar o seu futuro engrandecimento. Os aprendizes não só auxiliarão os guardas nos trabalhos prá- ticos dos respectivos gabinetes, trabalhos a que até agoi'a não tem podido dar-se toda a necessária extensão, pela falta de um pessoal apropriado, mas habilitar-se- hão para no futuro substituir a vacatura dos actuaes empregados, sem que os esta- belecimentos soffram pela falta dos conhe- cimentos práticos dos que os devem occu- par. Esta providencia é além d'isso de reco- nhecida utilidade publica, porque n'aquel- les estabelecimentos se podem habilitar jar- dineiros, feitores, manipuladores e prepa- radores, tanto para as diversas escholas seientificas e artisticas, como para as fabri- cas, laboratórios e estabelecimentos agri- colas particulares. E para levar a eífeito esta salutar provi- dencia julga o conselho que podiam aquel- les aprendizes ser escolhidos d'entre os alumnos do collegio dos orphãos d'esta ci- dade, que mais idóneos se mostrassem para estas diversas profissões, mediante os ne- cessários ajustes com a Santa Casa da Mi- sericórdia; reservando-se o conselho para propor os meios e condições para levar-se a effeito esta providencia, caso o governo de Sua Magcstade a julgue digna de con- sideração. 1853 — Em 26 de janeiro leu-se a por- taria de 18 do dezembro ultimo, auctori- sando a creação d'um logar d© ajudante para o Jardim Botânico. Em 1.3 de maio foi auctorisado o dire- ctor do Jardim Botânico para fundar a es- chola de familias naturaes pelo methodo de Endlicher, consignado no «Genera plan- taram» e «EnchiridonBotanicum» do mes- mo auctor. Em 27 de julho fez-se a visita dos es- tabelecimentos principiando pelo Jardim Botânico, que se encontrou muito melho- rado 6 enriquecido de espécies e géneros novos. Foi apresentado pelo director o her- bario composto de 200 espécies das mais raras, cultivadas no estabelecimento, e ou- tras da Flora dos arredores de Coimbra. Em 14 de dezembro foi approvada a proposta para que se dirigisse ao governo uma representação pedindo uma verba es- pecial na dotação da Universidade : 1.° Para se construir uma estufa ou abrigadouro no Jardim Botânico. 2.^ Para se comprarem os modelos dos principaes instrumentos e machinas mais importantes para o gabinete de agricul- tura. 1854 — Em conselho de 9 de janeiro foi lida a portaria do ministério do reino de 24 de dezembro ultimo que mandava ou- vir a faculdade de philosophia sobre o re- querimento do dr. Manoel Xavier Pinto Homem para arrendar a parte do edificio de S. Bento que podesse ser dispensada do serviço do Jardim Botânico, para a fundação de um collegio de educação do sexo masculino. Acordou-se unanimemen- te na conveniência do dito arrendamento, devendo reservar-ae as casas indispensa- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 149 veis para officinas, gabinetes, salas cie ar- recadação, aulas, etc, dos dous estabele- cimentos da faculdade, o Jardim Botânico e cerca de S. Bento destinados ao ensino da botânica e agricultura. Em 4 de março deu-se conhecimento de uma valiosa oíferta de plantas raras, feita ao Jardim Botânico por Sua Mages- tade El-Rei o snr. D. Pedro V. O conselho summamente penhorado por tão repetidas 6 assignaladas provas da benevolência de Sua Magestade para com a Universidade, e que tanto patenteiam o seu amor pelas sciencias e a consideração especial que lhe merece o estudo da philosophia natural, recebeu com o mais subido apreço tao ge- nerosa dadiva, e resolveu unanimemente que, por intervenção do prelado, se diri- gissem os mais respeitosos agradecimen- tos a Sua Magestade. Em 1 de abril leu-se a portaria de 24 de março passado, auctorisando o arren- damento do collegio de S. Bento, em con- formidade do que se tinha resolvido em congregação de 9 de janeiro ultimo, no- meando-se uma commissao para estudar as bases d'este contracto. Nas sessões de 3 e 7 do mesmo mez recebeu o conselho duas collecções de se- mentes de plantas da Africa, colhidas nas margens do rio Bengo, no Ambriz, e arre- dores da cidade de Loanda, e nas ilhas do Cabo Verde, oíferecidas pelo dr. Welwi- tsch, 6 resolveu que se agradecesse a tão distincto botânico este seu novo serviço ás sciencias, que tanto deve concorrer para o engrandecimento do Jardim Botânico. Em congregação de 21 foram discuti- das e approvadas as condições do arren- damento do collegio de S. Bento. Na congregação de 11 de outubro foi presente o desenho, representando o plano geral para as novas estufas do Jardim Botânico, plano que foi approvado em con- selho de 16 do mesmo mez. Em 13 de novembro foi recebida nova collecção de plantas vivas, sementes e bol- bos da flora angolense, oíferecida ao Jar- dim Botânico da Universidade pelo dr. Welwitsch. Agradeceu-se nos mesmos ter- mos, que outros oflferecimentos anteriores. (Continua). Coimbra. J. A. Simões de Carvalho. BÍBLIOGlUPIIIi LE CHEVAL ET SON CAVALIER PAR LE COMTE J. DE LAGONDIE A casa J. Rothschild, de Pariz, acaba de editar em elegante formato mais uma obra de verdadeiro merecimento. Não é só um trabalho feito para a lit- teratura do sjyort composto com os fructos de muita experiência, de muito gosto, e de muita penetração : mas também de ver- dadeiro interesse para o criador e agricul- tor, que sabendo aproveitar suas pasta- gens, abre para si uma fonte de receita, e para a pátria o desenvolvimento e sa- tisfacção d'uma necessidade, como é o au- gmento e aperfeiçoamento das raças ca- vallares. Este livro serve-nos para lição e estu- do; sendo também um incitamento e um convite para entrarmos n'uma senda pro- veitosa, em que a arte subordina muitas vezes, e não poucas modifica e aperfeiçoa a natureza. Hoje mais do que nunca se torna necessário o cavallo, pelo grande desenvolvimento da riqueza publica, e pelo augmento dos grandes e importantes ser- viços, em que este animal é empregado. Portugal é um paiz montanhoso, mas tem muitos valles, e quebradas com ex- cellentes pascigos, e com terrenos adapta- dos para a cultura dos farináceos e das leguminosas. O Minho é uma d'estas por- ções de terreno do nosso paiz adequadas para a criação de gados; e nas duas maio- res planícies do reino, que são a que o Vouga forma na sua foz, e a que fica ao sul do Tejo, de que Santarém é uma con- tinuação, assim como no valle formado pelo Mondego, ha legares propicies para o estabelecimento de magníficos — haras. Alguma cousa devida á protecção dos go- vernos se tem feito n'este sentido; mas muito pouco para o que é para desejar. Já em Lisboa se veera excellentes equi- pagens com cavallos nascidos e ensinados em Portugal ; mas os cavallos próprios para cavalgar, que reunam á belleza da 150 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA forma a grandeza com músculos de aço são raríssimos. Os elegantes das nossas pri- meiras cidades, em regra, montam maus cavallos, o também geralmente os npssoa regimentos do cavallaria não possuem ani- maes da grandeza e força precisas para os trabalhos da guerra. A causa d'isto é mais a falta de gosto que ha entre nós, que a de estimulo re- munerador para os criadores. E necessário não ficarmos por mais tem- po atraz do que em outros paizes se está tentando n'este importante objecto. Verificou o sábio naturalista Isidoro Geoffroy Saint-Hilaire que das 140 mil espécies de animaes conhecidos, apenas temos domesticado 47 ! isto é, 1 por 3 mil. Já que as conquistas da domesticação so- bre espécies novas são tão raras e diffi- cultosas, cumpre appreciar bem as que foram feitas especialmente ha tantos sé- culos, como foi a domesticação do cavallo, que tanto contribuiu para o adiantamento da civilisação, pelo seu grande préstimo. O cavallo é dos poucos quadrúpedes do- mesticados o que, immediatamente depois do cão, maior alliança faz com o homem. do que é companheiro nos prazeres do cam- po, na caça, no passeio, nas corridas, nos carros e até na gloria e na morte sobre os campos de batalha. O snr. conde Lagondie encara no seu livro as mais árduas questões sobre as ra- ças dos cavallos; trata-as d'uma forma clara e com um estylo gracioso. Demons- tra com factos a influencia do sangue; da forma individual, da saúdo e ^do caracter dos pães para a procreação. É com o es- mero na selecção, que os inglezes conse- guem conservar e apurar a magnifica raça dos ^Jií?- sang que tem de brilhar nos hyp- podromos e a dos infatigáveis Jmnters. Os segredos das apostas no turf, os pre- ceitos para a educação do cavallo, a pi- caria, o tractamento do cavallo, o serviço das cai-ruagens, etc, são minuciosamente descriptos pelo aiictor, que fez um livro, que pode servir de vade mecum para os picadores, para os sportmen, e para os creadores.. Recommendamos com vivo prazer a lei- tura de obra tão útil. Murça. B. Constantino de A. Sampaio. FÃRFUGIUM GRANDE Á família das Compostas, que tantas e tão variadas plantas tem fornecido á flo- ricultura, é que pertence o interessante vegetal cujo nome serve de titulo a este artigo. O seu valor ornamental consiste unica- mente nas folhas, mas quão esplendidas e luxuriosas ellas são ! que viço, que vi- gor, que frescura que apresentam ! Imagine o leitor uma enorme folha em forma de coração, angulosa nas margens e medindo ás vezes para mais de O, "'70 de círcumferencia; imagine esta folha de uma bríllmnte cor verde esmeralda, man- chada por grandes nódoas amarellas cla- ras, irregulares, caprichosas, não mos- trando nenhuma relação com as nervuras; eoUoquo depois esta folha em cima d'um peciolo tomentoso, reúna n'um só ramo pouco mais ou menos 50 d'estas folhas for- mando um largo tufo, e terá uma peque- na ideia da belleza do Farfugium grande. Junte-se agora a estes predicados a sua notável persistência durante os rigores do inverno, sendo por isso de grande auxilio nas ornamentações d'esta estação, e tere- mos uma planta a que os mais exigentes nada terão que observar. Objectará comtudo alguém que as suas flores são insignificantes e que por isso a planta pouco merecimento tem, ao que nós responderemos : e não ha tantas plan- tas que a moda tem introduzido e cujas flores são de uma importância secundaria ou quasí nulla? Que representam na floricultura as flo- res dos Coleus, do Cissus discolor, de mui- tas DracaenaSj da maior parte das Begó- nias, Caladiums, Marantas, etc, e com- tudo não são plantas de grande valor e realmente bellas? E além d'isso se na planta do que tractamos as flores não tem valor ornamental, tem-no comtudo botâ- nico; tudo n'este mundo tem a sua uti- lidade. O Farfugium é uma planta chineza des- coberta por Mr. Fortune no jardim d'um mandarim, d'onde a enviou logo para a JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 151 Inglaterra. Os chinezes cultivam-n'a em grande escala para ornamento dos seus jardins e casas, onde realmente dá um bello resultado. Estas plantas são muito vigorosas e por precisam de um terreno forte, bem isso adubado, e de exposição meia assombrada. Devem ser regadas abundantemente durante o calor e a sua multiplicação ope- ra-se facilmente pela divisão dos pés, na primavera. A. J. DE Oliveira e Silva. CERASUS HORTENSIS Não temos encontrado esta bella varie- dade, nem nos estabelecimentos hortíco- las, nem nos jardins particulares. Ha an- nos que a possuimos, mas só ultimamente é que lhe dedicamos mais attenção e re- conhecemos que era digna de ser conside- rada. O nosso exemplar mede 4 a 5 metros e em março e abril é esplendido quando está coberto de muitas flores d'um branco de neve, muito dobradas do tamanho da rosa branca Aimée Vivert. As folhas são d'um verde claro e um pouco maiores que as da Cerejeira de íructo. Pode ser cultivada como arvore e como Fiff. 30 — Cevasus hortensis — Deseuhado no Horto Loureiro arbusto, dando-se-lhe uma poda todos os annos, pode espanejar-se nos jardins e mesmo é do necessidade que haja n'elles algumas arvores ou arbustos que se ele- vem a 4 ou 5 metros, não só para que dêem sombra á gente mas para que assom- breiem também alguns arbustos que pre- cisam d'ella. Temos notado em muitos jardins esta falta, mas nem por isso que- remos que se plantem n' estes logares ar- vores qué se elevem a mais de 5 ou 6 me- tros. Arvores muito altas só as indispen- sáveis. Indicamos algumas das que podem ser- vir para este fim: Acmena Anthocercis, Ceresus hortensis ^ Ligustriim japonicum, Jamhosa australis, Magnólia Thompsoni, Magnólia Yulan, Grevillea a robusta, Pit- tospoimnij Photinia glabra, etc. José Marques Loureiro. agàve americana Esta planta pertence á segunda tribu da familia das Amaryllideas, Endl. E indí- gena da America meridional, Jamaica e Antilhas. Foi introduzida na Europa no anno de 1561 e de ha muito que a con- tamos no numero das espécies indígenas. 152 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Resiste no inverno a uma temperatura de 1,4° cent. acima de zero. A Agave americana floresce com diffi- culdade, e portanto os antigos persuadiam- se que ella só florescia passados cem an- nos, e tanto que na AUcmanha ainda hoje é conhecida vulgarmente pelo nome de Agave secular (Hundertjâhrige Agave). Esta planta floresce entre nós na edade de 8 a 10 annos; emquanto que na Eu- ropa septontrional, aonde nào vegeta du- rante o inverno senão em estufas, entre os 30 e 60 annos e ás vezes mais. Morre logo depois da florescência, mas em com- pensação deixa por descendentes algumas novas plantas procedentes do rebentamen- to das raizes. A flor é notável em conse- quência do rápido desenvolvimento da sua haste que cresce diariamente O'", 15 até attingir muitas vezes uma altura de 6 me- tros abrindo no cimo as flores que algu- mas vezes chegam a 6:000 '. A cor das flores o d' um am arrelio esverdeado ; con- tém muito mel e um aroma muito agra- dável. Floresce entre nós em maio e junho. As folhas contém grande quantidade de ma- téria têxtil, da qual em alguns paizes se fabricam cabos, cordas o panno. Sobre este assumpto occupar-nos-heraos mais de- tidamente n'outra occasiào. Ha novidades d'esta planta muito or- namentaes, como as de folhas orladas de amarello ou branco {A. picta Hort.) e ma- tisadas de qualquer d'estas duas cores (foi. variegatis Hort.) Coimbra. Adolpho F. Mollee. DO EMPREGO DO ACIDO SULFUROSO COMO AGENTE DESTRUCTIVO DO PHYLLOXERA, DO OIDIUM E, EM GERAL, DE TODOS OS INSECTOS Se ha substancia ou agente chimico, que a todos os respeitos, e principalmen- te pela sua acção mortifera quasi instan- tânea, se faça recommendar como insecti- cida dos mais efiicazes, é sem duvida al- guma o acido sulfuroso^ gaz resultante, como é sabido, da combustão do enxofre no oxygeneo do ar atmospherico. Com eífeito, se sujeitarmos um insecto qualquer, não diremos á acção do gaz aci- do sulfuroso puro, que é muito mais enér- gica, mas simplesmente á de uma mis- tura de uma parte, em volume, de fumo do enxofre, quatro de azote (gaz impró- prio para a respiração dos animaes) e oito ou dez partes de ar, observaremos em re- sultado que, passados alguns instantes, o animal se confrange por algum tempo, cessa de dar signaes de vida, e morre fi- nalmente asphyxiado. Entre trinta e seis diversos insectos e reptis, alguns d'ellcs microscópicos, que submettcmos á acção d'aquella mistura gazosa, nem um só resistiu á morte, pas- sados 15 a 198 segundos. Esta acção exterminadora e desorgani- sadora do gaz sulfuroso sobre os insectos, sondo conhecida ha muito tempo, admira- rá por certo áquelles que ignorarem al- guns proraenores do assumpto, porque ra- zão se não usa ou generalisa o emprego do gaz sulfuroso no tractamento das vinhas atacadas pelo Phylloxera ou oidium, e na extincção de outras espécies de érésiphos ou insectos. Ora, o principal motivo da exclusão do gaz sulfuroso da immensa lista das sub- stancias propostas como preservativos ou curativos d'aque]las doenças da vinha, tem tido mais por causa a difíiculdade da sua applicação, do que o valor da sua effica- cia, a ajuizar pelos resultados obtidos em 1 A este respeito encontramos no "Manual do Jardineiro" de C. F. Fõrster o seguinte: Em Sruthgart, floresceu em 1658 uma Agave americana com 12:000 flores. No anno 1726 deu flor em Niiriiberg, no jardim do celebre Volkamer.uma d'estas plantas com 26 annos de edade, a haste tinha 8,m50 centímetros d'altura e o numero de flores era de 8:265. Em Francfurt sobre o Mens no mesmo anno floresceu uma que tinha 48 annos de edade, medindo a haste 10 metros e sendo o nu- mero das flores de 7393. Em Obergrãz, floresceu eml742 uma de 28 annos dando 14:264 flores. Em Avignon, em 1599, floresceu outra com 100 annos de edade, medindo a haste 10 metros. O interes- sante folheto do dr. J. D. Schultze sobre a Agave americana impresso em Hamburgo no anno de 1782 oita-uoB muitos à'estea exemplos. JORNAL DE HORTICULTUEA PRATICA 153 alguns ensaios, e da appHcaçíto do enxo- fre em flores, (enxofra mento), cujo bom eíFeito, como se sabe hoje, provém do aci- do sulfuroso, que elle fornece, e não da acção directa do próprio enxofre sobre o parasita. Como muito bem diz o snr. Aristide Dumont, a propósito do Phylloxera, na sua — Note sur les progres du Phylloxera dans les quatre départements de la Drô- Ttie, de Vaucluse, du Gard et de VHéraxdt — recentemente publicada — «a destruição do Phylloxera é mais um problema me- chanico do que um problema chimico.v Nós só accrescentaremos a esta proposi- ção,— que também o deve ser económico. De facto, abundam as substancias chi- micas capazes de asphyxiar e desorgani- sar ou destruir o Phylloxera ou o oidium; mas estas qualidades não bastam para a sua adopção : é necessário que o seu custo seja tam módico, quanto deve ser fácil a sua applicação á cepa doente a que deva- mos ministrar o tractamento. Depois da data em que Tucker (1845), jardineiro de M. Stater, de Margate, no- tou, pela primeií-a vez, nas hastes, folhas e cachos das videiras a doença denomina- da então — branco das uvas (blanc des grappes), que mais tarde um distincto bo- tânico inglez, Berkeley, reconheceu ser um parasita do género — oidium. — e lhe deu o nome de oidium Tuckeri, parece que os primeiros ensaios com o enxofre volatili- sado (assim lhe chama o snr. Gustave Heuzé), que, como adiante veremos, de- via ser uma mistura de azote, oxydo e aci- do carbónico j acido sulfuroso , sulfureto de carboneo, etc, como preventivo das doen- ças da vinha, foram feitos pelo snr. A. Joubert, hábil vinicultor de Enghien-les- Bains. Assim, o snr. Joubert, attribuindo tam- bém aquella enfermidade a uma alteração da seiva da planta, lembrou-se de preve- nir essa alteração por meio àe fumigações com o gaz acido sulfuroso, applicadas ás videiras. O apparelho que elle inventou, e de que se serviu para a, fumigação ou sulfuração da vinha, consiste em um fogareiro por- tátil, de chapa de ferro, coberto com um capacete do mesmo metal, de forma có- nica, e terminado na sua parte superior por um tubo conductor do gaz e normal á elevação do instrumento. Para se servir d'este apparelho tlrava- Ihe o capacete e enchi a-o de carvão, que era sustido por uma grelha de ferro col- locada inferiormente ; acceso o combustí- vel, lançava sobre a parte incandescente cerca de 30 ou 40 grammas de enxofre, embrulhadas em um papel, e fechava im- mediatamente o fogareiro, cobrindo-o com a sua tampa cónica. Desde que o enxofre era lançado sobre o fogo, uma certa parte do metalloide se transformava em gaz acido sulfuroso, que sahia de envolta com os outros gazes, por assim dizer, injectado pelo tubo conductor, em virtude da violência da tiragem do apparelho. Então, pegando no fogareiro pelo seu cabo, situado no lado opposto ao tubo, dirigia o vapor sulfuroso sobre os lançamentos e os troncos da videira. Logo que o enxofre estava consumido, renova- va-se a doze de metalloide, e continua- va-se a sulfuração. Por meio de uma por- ta communicante com o cinzeiro, se regu- lava a producção do gaz ou vapor sulfu- roso. Apesar de não ser só composto de gaz sulfuroso o jacto de fumo fornecido pelo apparelho, mas muito provavelmente, co- mo dissemos já, de acido sulfuroso, azote, oxydo e acido carbónico, enxofre, etc, os resultados obtidos pelo snr. Joubert sobre a vinha de que elle receiava, devidos se- gundo elle pensava, ao seu processo de fumigação, foram tão bellos que surpre- henderam o snr. Heuzé, quando, encarre- gado pelo governo francez (1852), de ex- perimentar os diíferentes meios propostos para combater as doenças das vinhas foi- dium), examinou as cepas fumigadas nas propriedades vinícolas de Enghien-les- Bains. Mas o enxoframento das vinhas ou a ap- plicação directa das flores do enxofre so- bre a videira, meio empregado pela pri- meira vez em Inglaterra, como curativo, começando, pelo tempo d'aquellas expe- riências, a espalhar-se pelos centros vi- nhateiros, época em que o snr. Gontier, de Montrouge, inventou o seu folie sulfu- risador, cuja efficacia em breve foi conhe- cida e confirmada, devia necessariamente desthronar o engenhoso processo e o ap- 154 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA parelho de Joubert, que era, pelo menos, relativamente, muito mais incommodo e dispendioso que a enxofrarão. Níío admira, pois, que por estes moti- vos, e pelos maravilhosos successos alcan- çados com as flores de enxofre, e por se ignorar entào que a virtude d'esta sub- stancia, no tractamento das vinhas, está no acido sulfuroso, que ella espontanea- mente produz ou sonega ; não admira, di- zemos, que esta applicaçao do gaz do en- xofre ficasse preterida, scnào condemna- da, pela pratica vinícola d'aquelles tem- pos. Hoje, porém, que a sciencia confirma ser o gaz sulfuroso o generoso protector e salvador da vinha enferma de oidiíon^ quem ousará duvidar da proficuidade d'este magnifico insecticida^ appllcado di- rectamente sobre a planta atacada? E qual será o vinicultor intelligento que deixe de o empregar, desde que, por um processo fácil e mais económico do que qualquer outro até aqui usado, elle possa realisar com proveito esta utilíssima ap- plicaçao ? O que se disse para o oidium deve ap- plicar-se não só ao Fhylloxera como ainda a outros insectos parasitários, destruido- res dos vegetaes e seus productos. Este novo processo, isto é, as fumiga- ções com o acido sulfuroso, que ultima- mente tem sido praticado contra o Fhyl- loxera, no departamento de Hérault, com mui fundadas esperanças de um bom êxi- to, segundo uma communicaçao feita pelo snr. Dumas á Academia das sciencias de Pariz, também foi já empregado pelo snr. Audouin, como o único meio proveitoso, exceptuando a agua a ferver, de destruir certas lagartas que se alojam e invernam nas fendas e cavidades rugosas das cepas e das estacas. Mas qual é o methodo e o apparelho que resolvem de um modo verdadeira- mente pratico o difficil problema da des- truição do prodigioso insecticida nas doen- ças das vinhas, ou mesmo d'outras plan- tas? O methodo deriva do nosso processo geral de sulfuraçào dos vinhos. O appa- relho é o nosso sulfurador automático, re- centemente modificado e apropriado a este novo uso. Não conhecemos actualmente outro ap- parelho mais simples, de manuseamento mais fácil, mais económico e mais vanta- joso para estas novas applicações do fumo do enxofre. Quereis fumigar ou afogar a raiz da videira com o acido sulfuroso, defumar o tronco, os lançamentos, as folhas e os ca- chos, como se regásseis cada uma d'estas partes da planta, com agua, por meio de um i'egador? empregae o sulfurador au- tomático simples. Desejaes irrigar, inundar a raiz da cepa doente com uma solução aquosa for- temente carregada de acido sulfuroso, re- cente, preparada no próprio local, que le- vará a acção d'este gaz até onde o liquido penetrar? adoptae o sulfurador automá- tico duplo, apropriado a esta operação. N'este novo processo, no primeiro caso, o gaz sulfuroso possuindo uma grande densidade, em relação ao ar, tem por este motivo uma certa força de 2>€netração, e pôde insinuar-se nos interstícios das raí- zes e estabelecer, quando empregado em abundância, em uma atmosphera calma, pelo menos durante um certo tempo, uma camada de ar sulfurado, de altura variá- vel, que poderá actuar nos sporulos sus- pensos no ar, e impedir a sua propaga- ção. E isto tanto com respeito ao Phyllo- xera como em relação ao oidium. É claro pois que, além da destruição d'estes insectos, e de havermos alcançado a salvação da vinha, no caso do tracta- mento do oidium, devemos ter também em resultado, e em relação ao antigo pro- cesso (enxoframento), — 1.°, economia de enxofre; 2.°, desapparição do detestável gosto a enxofre (acido sulphydrico) no vinho, que tanto prejudica esta bebida ; 3.°, a apreciável limpeza dos cachos, que polvilhados de enxofre se tornam repu- gnantes n'uma meza, e inconvenientes quando a uva deve ser encaixotada ou passada; 4.°, mais efficacia sobre o inse- cto do que empregando o enxofre em flo- res. Emfim, não é unicamente nos dous ca- sos que especialisamos, que o gaz sulfuro- so, pelo emprego do meu sulfurador, deve prestar valiosíssimos serviços; é, repeti- mos, em todos aquelles em quo se careça de um poderoso e infallivel insecticida, antisej)tico, ou mesmo desinfectante. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 155 o problema mechanico, relativo ao em- prego do gaz sulfuroso nas vinhas, ahi fica pois, resolvido; e para elle chamamos a attenção de todas as pessoas que d'elle se possam aproveitar. Aos poderes públicos cumpre, sollicitos como téem sido em proporcionar á indus- tria e commercio vinicolas nacionaes o des- envolvimento e prosperidade d'esta nossa melhor fonte de receita e riqueza publica, fazer estudar e experimentar este novo processo, em grande escala, por homens de boa vontade e competentissimos, já que estes ensaios não sào da ordem dos que se podem fazer dentro dos matrazes e re- tortas dos laboratórios, e visto convir te- rem um caracter official, para serem me- lhor acceites pelas pessoas n'elles interes- sados. Em um paiz como o nosso, onde não ha estimules para o trabalho; onde não ha prémios que incitem aos descobrimen- tos, como n'outras nações; onde, final- mente, os que trabalham em assumptos d'este género téem de experimentar á custa da sua magra bolsa, e onde muitas vezes o mais modesto invento representa a privação do pão quotidiano e o sangue do inventor ; em um paiz d'estes, pois, dizemos, estas questões de interesse geral não podem ser abandonadas á iniciativa particular, de ordinário impotente para tão sérios commettimentos. Pela minha parte fico tranquillo e em paz com a minha consciência. O brado ahi fica. O pouco ou muito cora que pude contribuir, n'esta parte, a bem da nossa vinicultura, aqui o deixo indicado. Em presença da afflictiva situação de muitos proprietários do Douro e outras localidades, onde o Phylloxera se está desenvolvendo, segundo correspondências d'esta provincia, recentemente publicadas pela imprensa, e em occasião tão oppor- tuna para os ensaios, seria um crime im- perdoável, parece-nos, não emprehender- mos a luta pelo gaz sulfuroso contra esses indómitos e terriveis adversários, que tan- tas fortunas e familias téem arruinado. Cuida-se com extremo e carinho em proteger o vinho e de lhe proporcionar longevidade; pois é justo, e é mesmo in- dispensável, que cuidemos também da jyrogenitora, que vale bem por muitos fi- lhos. M. V. DA Silva Pinto. CHRONICA HORTICOLO-AGRICOLA A propósito d'uma noticia que demos i no fascículo correspondente ao mez de ju- 1 nho a respeito da exposição hortícola de i Florença, escreveu-nos o nosso amigo e 1 collaborador, o snr. dr. Júlio Augusto j Henrique, dizendo-nos que havia sido no- 1 meado pela comniissâo directora da expo- 1 sição para membro do jury, bera como os j snrs. barão de Castello de Paiva e dr. Edmond Groeze. Não podemos tomar isto como uma re- ctificação á noticia que demos, mas sim simplesmente como esclarecimento e por- tanto seja-nos licito repetir: «observare- mos que, apesar de nos acharmos intima- mente ligados áquelle paiz pela união dos nossos régios consortes, Portugal não en- viou ninguém que o representasse». E já que falíamos da exposição de Flo- rença, vamos transcrever uma carta que d'alli foi dirigida a Mr. Ed. Morren. Prometti-lhe algiimas linliag a respeito da ex- posição de liorticultiira e vou-me desquitar da promessa, o que se me torna facillimo, por isso que o mau tempo nào me permitte sahir de casa depois de se fecharem os Museus, que, passan- do das três horas, deixam de ser accessiveis ao publico. Esperava encontrar aqni uma tempe- ratura quente e agradável, mas ainda ando á procura do bello céo italiano e do seu clima tão apregoado. Até agora ainda me não pude sepa- rar nem do paletó nem do chapéu de chuva. A exposição abriu-se esta manhã ás 11 horas, na ausência do sol. O rei veio de Roma para assistir á inauguração. Chegou á hora marcada e visitou a exposição com toda a minudência. Fo- ram-lhe apresentados os delegados do governo belga, a quem recebeu muito cordealmente, agradecendo-lhes o auxilio que a Bélgica pres- tara á exposição. De todos os paizes estrangei- ros o nosso é que trouxe mais collecções e pode- se dizer que as mais bellas. A exposição accommodou-se nas vastas e ele- gantes «bailes», construídas ultimamente para o mercHdo coberto. O ar e a luz abundam e pelo que diz respeito a frescura era demasiadamente sensível. No centro da principal rua existe uma vasta bacia com ura repucho e no fundo, em fa- ce da entrada, um rochedo ao vértice do qual vão dar duas escadarias, d'onde se gosa a vista geral. A exposição está disposta em jardim com muito gosto e as plantas não estão amontoadas, 156 JORNAL BE HORTICULTURA PRATICA como, infelizmente, aconteco qviasi sempre. As aleas sào largas, e apesar do grande numero de visitantes, em ni^-nhuma parte se anda aos en contròes. Duas bandas militares collocadas na entrada o outras duas no exterior alternam as suas mudicas e tornam mais animada Cíita bella reunião. Desçamos agora ás minuciosidades e primeiro que tudo prestemos homenagem ;l belleza e gra- ça das numerosas florentinus, que quizeram cm- bellezar a festa com 0 mil volumes, e entre elles avultado numero de obras hortícolas, po- r('m é muito pouco frequentada, porque as horas em que está aberta sHo inconvenien- tes para a maior parte dos habitantes da cidade, pois sondo estes sobretudo com- merciantes, artista.?, ctc, estào geralmen- te occupados durante aquellas horas. Ora, para tornar aquelle estabelecimen- to de uma utilidade real, era mister que estivesse aberto á noute, hora em que a maior parte das pessoas estão desoccupa- das e que o poderiam frequentar. Ponderamos isto ao snr. vereador en- carregado do aquelle pelouro e da illus- traçHO da exi-."" camará esperamos o seu apoio. Com uma insignificante despeza dará a camará actual uma prova evidente dos seus desejes para melhorar a cidade e des- envolver a instrucçào dos cidadãos, que só d'este modo poderão frequentar a biblio- theca. E maior do que se pensa a utilidade real que d'Í8to resultará — Api-esentamos um novo processo para a conservação das madeiras devido ao snr. Hatzeeld, tendo em vista substituir o em- prego do -eulphato de cobre c do creosote pelo tannato de ferro. O auctor d'este processo faz notar a im- perfeição e variabilidade dos resultados obtidos com o sulphato de cobre, o que pode ser devido á grande solubilidade des- te sal, sendo por isso diluido pelas aguas das chuvas, impurezas que produzem alte- rações nas madeiras, e finalmente as reac- ções acidas, que nào c fácil evitar. Quanto ao creosote julga -o relativamen- te raro, caro, de natureza inflammavel, e por isso difiicil de transportar e manejar. Sendo as substancias gommosas, azota- das e albumiuosas, as matérias corantes, etc, contidas na seiva as principaes cau- sas da podridão das madeiras, pretende exercer sobre ellas com o tannato de fer- ro a mesma acção que se exerce com o tannino no curtimento das pelles, tornan- do aquellas matérias imputresciveis, e obtendo maior dureza para as madeiras. — As Calceolarias semeiam-se em toda a estação, mas dever-se-ha preferir o mez de agosto e setembro. Lançam-se em ter- rinas com terra de urze e cobrem-se mui- to ao de leve. A terrina resguarda-se com um vidro e conserva-se a terra húmida. Logo que as sementes tenham germi- nado é preciso transplantal-as para outras terrinas, de modo que fiquem a distancia de dous centimetros. O beneficio da cam- pânula de vidro deve continuar ató que estejam bem enraizadas, o quando come- çarem a tocar umas nas outras faz-se uma segunda transplantação para vasos peque- nos, nos quacs passarão o inverno mas ao abrigo dos frios. No principio da primavera serão mu- dadas para vasos de tamanlio rasoavel, em que florescerão afinal. ( \aldas de Vizella. Oliveira Júnior. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 161 NICOTIANA WIGANDIOIDES Vae para dous annos que o snr. José Marques Loureiro introduziu esta Sola- nacea em Portugal e, não obstante os seus predicados de belleza, quasi que é com- pletamente ignorada. Este facto nSo nos admira, porque o mesmo suceede com mui- tas outras plantas, que não são de menor mérito, mas que, não tendo sido ainda apregoadas pela imprensa horticola portu- gueza, jazem no mundo do desconhecido. Fig. 31 — Nicotiana Wigandioides— Desenhada no Horto Loureiro Foi em 1852 que a Nicotiana Wigan- dioides visitou pela primeira vez a Euro- pa e foi nas estufas do Jardim Botânico de Cracóvia que veio fixar residência. D'ahi se dispersou por toda a Europa, devendo o nome porque hoje é conhecida ao professor Charles Koch, de Berlim, que assim a denominou em 18Õ9. Vol. V— 1874. A Nicotiana Wigandioides forma um arbusto de 2 metros pouco mais ou menos e as folhas chegam a attingir para cima de ÕO centímetros de comprido e 30 cen- timetros de largo. Produz interessantes flores em paniculas, que com o pezo parece quererem beijar o solo. Esta espécie de Nicotiana é bastante -sfo 9 — Setembro, 162 JORNAL 1)K HORTICULTURA PRATICA rústica e passa os nossos invernos ao ar livre, mas, como todas as plantas de fo- lhagem ampla, resente-se dos vendavaes, o que não é razào para que deixe de ser empregada nos legares a que se queira dar um aspecto sub-tropical. Somos até levados a crer que d'aqui a algum tempo ella se tornará ainda mais rústica, porque não vae longe a epocha em que a própria Wigandia caracasana morria todos os an- nos. Hoje vemol-a ostentando luxuriante vegetação nos passeios públicos e atra- vessar os nossos mais rigorosos invernos sem proteção de qualquer espécie. Assim como se podem aclimar ou natu- ralisar os animaes, também se pode fazer o mesmo com os vegetaes. A progénie é quasi sempre mais rústica do que os in- dividues originaes. Uma planta, ainda que rústica mas que ó cultivada em estufa, precisa, para não perecer, de passar por temperaturas gra- duadas antes do tomar logar ao ar livre, e portanto não seremos arrojados aventando que muitos vegetaes hoje abrigados e ro- deados de assiduos carinhos de cultura, um dia sahirão a campo a disputar rusti- cidade ás nossas plantas indigenas. Embora pareça sacrilégio aos espirites crendeiros e timoratos, o homem poderá então dizer: Transformei a natureza! Oliveira Júnior. FÉLIX DE AVELLAR BROTERO Nasceu na freguezia de Santo Antão do Tojal, termo de Lisboa, aos 2õ de no- vembro de 1744. Recebeu a primeira educação litteraria no collegio dos religiosos arrabidos da villa de Mafra, onde desde verdes annos reve- lou grande vocação para a cultura intel- lectual, fazendo muitos progressos no es- tudo das humanidades. Portugal deve sem duvida tão grande génio á Reforma de 1772; porque, sem este facto memorável, Brotero seguiria a vida ecclesiastica, para que o haviam des- tinado. Ordenado de diácono, alcançou uma ca- pellania na Sé patriarchal ; e teria subido a mais elevada posição, se lhe soprasse o vento do favor real e se a escassez de seus recursos o não impedisse de passar além do terceiro anno do curso canónico que frequentara. Outra circumstancia concorreu para o desviar da vida ( lerical, despertando-lhe o amor das sciencias naturaes : foi a per- seguição severa que lhe moveu a inquisi- ção, obrigando-o a abandonar o paiz natal e a emigrar para França, indo rcisidir em Pariz, onde tcvt; por companheiro Fran- cisco Manoel do Nascimento, contra quem se desencadeara temerosa a sanha do santo officio. Na capital da França desabrochou a vocação do lírotero para o estudo da phi- losophia natural. Seguindo com assidui- dade os cursos dos mais distinctos natu- ralistas, cultivando a amisade d'e8te8 ho- mens eminentes, cresceu por tal forma a sua riqueza intellectual e o amor ás scien- cias naturaes, que alguns annos depois o seu nome, ainda ha pouco proscripto e vul- gar, já voava apregoado pela fama, e che- gava a Portugal coberto de lom'os e pres- tigio. A sua intelligencia vigorosa procurou ainda novo campo para cultivar, além dos seus estudos predilectos. Dirigiu-se á Uni- versidade de Reims, e ahi estudou a me- dicina, e recebeu o grau de doutor. Não contente com os profundos conhecimentos já adquiridos, percorreu a França, visitou como naturalista as margens do Rheno, o centro dos Paizes Baixos, grande parte de Itália, e quasi toda a Inglaterra meridional. Doze annos durou a sua ausência da pátria, residindo a maior parte do tempo cm França. O estudo das sciencias natu- raes, e especialmente o da botânica, occu- pava todos os cuidados e desvelos do nos- so compatriota. Em 1788 publicou em Pariz o seu «Compendio de Botânica», obra que mereceu elogios ao sábio allemão Link, escriptor severo, o muitas vozes injusto para com os sábios portuguezes. Neste livro resumem-se em bom estylo didáctico as doutrinas mais sãs-e os conhe- cimentos mais philoso])hicos da epocha. Em 1790 as saudades da ])atria eram já tão pungentes, que o illustre proscri- pto, coroado de louros da sciencia, regres- sou a Lisboa, onde muito antes o tinha JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 163 precedido a fama illustre do seu nome e dos seus vastos conhecimentos. O governo da snr.^ D. Maria I, empe- nhado em completar e aperfeiçoar a gran- de reforma dos estudos, reconheceu logo n'este sábio um professor digníssimo para a faculdade de philosophia, e para dirigir as obras do Jardim Botânico, então em principio. Por carta regia de 24 de janeiro de 1791 foi Brotero graduado gratuitamente em 13 de março do mesmo anno, e encar- regado de reger a cadeira de botânica e agricultura. Principia aqui a epocha mais gloriosa da vida d'este sábio. Durante mais de 20 annos desempenhou o honroso cargo de professor, transmittin- do a seus discípulos o amor do estudo pra- tico e theorico da botânica; de suas fre- quentes e minuciosas herborisações, não só pelos formosos arredores de Coimbra, mas por muitas provindas do reino, re- sultou o conhecimento da Flora portugue- za, até então mal estudada. No fim do século passado quasi todas as nações da Europa já possuíam a des- cripção de suas floras : só Portugal, a ter- ra felicíssima, a Índia europea, como lhe chamava o celebre Linneu, ainda carecia d'esta obra importante. Tínhamos, é verdade, alguns escriptos e trabalhos importantes, não só de sábios portuguezes, mas estrangeiros; estes es- tudos, porém de nossas riquezas botânicas eram deficientes, e referiam-se mais em particular aos productos vegetaes das pos- sessões ultramarinas. Foi o dr. Brotero quem preencheu essa falta da nossa historia scientifica, publi- cando em 1804 a Flora lusitanica, verda- deiro padrão de gloria para o seu auctor e para Portugal. N'esta obra contam-se mais de cem esj)ecies vegetaes, descober- tas e descriptas por este insigne botânico, além da revisão das outras já observadas e estudadas pelos seus antecessores. Doze annos depois apparece, novo fru- cto das incessantes fadigas d'este eximio professor, a «Phytographia Lusitaniae», obra grandiosa, não só pela esmerada re- dacção, mas pelas estampas gravadas em cobre e pela perfeição typographica. «A estampa de uma planta, disse Brotero, é monumento que a deve transmittir á pos- terioridade, e por isso deve ser fiel ; e para ser fiel é preciso que o pintor e abridor sejam botânicos, ou ao menos que um bo- tânico presida a toda a obra da estampa». Este trabalho, em que o auctor empregou os maiores cuidados e desvelos, consu- mindo doze annos com o primeiro volume, e onze com o segundo, pode apresentar-se como modelo de lucidez, de verdade e de simplicidade didáctica. Linneu não des- creveu as plantas com mais exactidão e elegância do que o dr. Brotero. Além das obras já mencionadas escre- veu grande numero de memorias e outros trabalhos scientificos importantes, que se podem ver mencionados no «Diccionario Bibliographico» do snr. Innocencio Fran- cisco da Silva. Nas actas da Sociedade Linneana de Londres foram publicados al- guns interessantes trabalhos d'este botâ- nico portuguez. «Os escriptos d'este sábio, diz o snr. Rodrigues de Gusmão nos seus interes- santes «Bosquejos Biographicos», conside- rados em respeito ao assumpto sobre que versam, deve confessar-se que foram, e ainda hoje são, de mui alta valia, porque dilataram a sciencia; porém se attender- mos aos grandes serviços que por elles prestou á língua abastando-a e enrique- cendo-a como creador, mais subido mérito lhes acharemos». A lingua portugueza, das mais ricas e aptas para todos os assumptos, é ainda muito pobre de termos technicos de scien- cias naturaes. Devemos ao dr. Brotero um bom património na terminologia da botânica e zoologia. Os diccionarios são pobríssimos, e estão cheios d'erros. O dr. Vandelli alguns ser- viços prestou na nomenclatura zoológica portugueza correspondente á linneana; e António de Almeida offereceu á academia das sciencias um vocabulário portuguez de plantas com a sua synonymia ; mas o sá- bio e infatigável Brotero foi quem mais adiantou a phraseologia scientifica da nos- sa lingua em zoologia e botânica no Qua- dro Elementar do reino animal de Cuvier, e nos seus numerosos trabalhos sobre a sciencia dos vegetaes. Do conceito que as obras d'este sábio tem merecido a estranhos, diz ainda o snr. 164 JORNAL W IIORTICUI-TURA PRATICA Gusmão : « são prova« evidentes o aífan com que se imprimem, os louvores com que as citam, e o empenho com que os sábios de todas as nações solicitavam, por intervenção de nossos embaixadores, a amisade e commercio litterario do seu au- ctor, que somente por ellas conheciam. Em verdade a nossa historia litteraria poucos exemplos ofiferece de tão extrema- da consideração, como a de que gozou o dr. Brotero : rara foi a sociedade scien titi- ca, para cujo grémio não fosse convidado. i> Na direcção do Jardim Botânico da Universidade prestou este sábio professor os mais relevantes serviços, não só enri- quecendo-o com importantes coUecções de plantas indígenas e exóticas, mas refor- mando e melhorando com grande solici- tude a parte scientifica e material d'este magnifico estabelecimento. Foi pelo seu impulso vigoroso que o acanhado plano pri- mitivo se transformou na largueza e ma- gestade das obras, que ainda hoje todos admiram. Todo o empenho d'este director era or- ganisar o Jardim Botânico de Coimbra pelo modelo do Jardim das plantas de Pa- riz e dos melhores estabelecimentos d'esta ordem da Europa, que elle tinha visitado e estudado durante as suas viagens. Por decreto de 16 de agosto de 1811, foi jubilado com todas as honras o vanta- gens, a que lhe dava direito o esplendor com que exercera o professorado, e depois nomeado director do Real Jardim Botâ- nico da Ajuda, onde o melhor que alli se vê a elle se deve. O dr. Brotero era homem ingénuo, e passava uma vida simples e retirada. Sof- freu grandes dissabores, e teve inimigos implacáveis, como todos os homens de gé- nio abalisado. Com razão foi honrado com o nome glorioso de Linneu portuguez; e é notável que a única recompensa que re- cebeu da sua pátria, ou antes do favor real, foi a condecoração de cavalleiro da ordem de S. Bento de Aviz ! I Em compensação o povo portuguez hon- rou-o na aurora da liberdade com o diplo- ma de deputado ás cortes constituintes do i 1821, cargo que elle resignou, ou porque t os tumultos e debates da politica repu- gnavam ú sua Índole estudiosa e socegada, j ou porque a sua idade lhe não consentia | tomar parte activa n'aquella primeira as- sembleia popular, da qual não queria ser membro ocioso. Sendo deputado pela província da Es- tremadura, compareceu logo na sessão pre- paratória de 24 de janeiro de 1821, foi nomeado em 7 de fevereiro para a com- missão de agricultura e no dia immediato para a de instrucção publica. Na sessão de 4 de abril na discussão da lei de ce- reaes desenvolveu perfeitos conhecimentos agrícolas era abono da lei. Poucos dias depois pediu escusa por doença, e não tor- nou a comparecer. Era nonagenario, e apezar da sua idade avançada tornou- se notável pela lucidez da sua exposição e pelos principies sen- satos que sustentou, tanto políticos como económicos. No seu discurso sobre o trigo rijo e o trigo molle são excellentes estas ideias: «Os grandes preços disse elle, são os que convidam no momento, e depois a abundância fará abaratecer ; íica o dinhei- ro no paiz; e seremos independentes dos estrangeiros, que é sobretudo a que deve- mos aspirar; devemos ter o pão barato, porém deve ser o pão nosso que é o que devemos pedir na oração dominical; e o modo de o ter c o que fizeram todas as nações, convidar a todos serem agriculto- res de pão, que é o de que necessitamos, e o podemos ter uma vez que haja inte- resse em lavrar a terra, no que interessa mais o pobre, porque mais ganha com o seu trabalho, etc.» N'ura livro publicado em 1822 lO-se este juizo a respeito do seu merecimento poli- tico: a Poucas vezes se reúnem em um só homem tantas qualidades e virtudes como no illustre deputado Brotero. Mui pouco fez este respeitável ancião no novo congresso, porque a sua avançada idade lhe não permittia dar-se a uma vida activa o laboriosa, como o demanda o le- gar de representante da nação. Pelas vota- ções a que assistiu o illustre deputado e pelas opiniões que sustentou facilmente se deprehendo que no seu coração existem de longo tempo gravados os principies libe- raes, que sabemos haver sempre profes- sado, etc.» l'alleceu este grande homem no sitio do Alcolcna, em Belcm, a 5 de agosto de 1828. Coimbra. — J. A. Simões de Carvalho. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 165 INGÁ PULCHERRIMA As folhas da Inga ijulcherrima são co- mo a da Mimosa pudica e as suas notá- veis íiores, dispostas em hoiiquet, são d'um vermelho vivíssimo. Com os estames cor de castanho faz um lindo effeito. Cobre-se muito de flores, e, como se presta de todas as formas, se for aparada em pyramides ou redonda, ainda mais linda se toma. Esta notável planta surprehendeu-nos quando a vimos em uma estampa na «II- lustration Horticole». Em 1865, encommendamol-a e foi col- Pig. 32 — Inga puloherrima — Desenhada no Horto Leureíro locada na estufa como era recommendado; mas o seu desenvolvimento alli era pés- simo. Tractamos de a plantar ao ar livre e com eífeito acertamos, porque principiou a desenvolver-se rapidamente. Hoje sabemos que se dá perfeitamente em qualquer exposição, e temos um exem- plar com mais de 2 metros d'altura. Floresce todos os annos em março e abril e muitas vezes dá flores em julho e agosto. A sua reproducção não é difficil ; pode ser multiplicada pelo alporque (cortiço) e mesmo por estacas com algum cuidado. Também algumas vezes dá semente. É digna de ser cultivada nos pequenos e grandes jardins, porque se pode cultivar em ^miniatura. É pena que esta planta seja de folha caduca, porque a sua folhagem é muito graciosa. José Marques Loureiro. 166 JORNAL UE HORTICULTURA PRATICA DEFINHAMENTO DOS PINHEIROS Sabia-8C desde muito tempo quo o ar- voredo tanto silvestre, como de pomar, tinha, como as plantas herbáceas, suas sympathias e antipathias, para uns e ou- tros terrenos. O Castanheiro, por exem- plo, não medra, não chega mesmo a vin- gar em terrenos que contenham acima de 3 por cento de cal, mas vae perfeitamente nos terrenos graniticos e feldespathicos. O Carvalho e o Sobreiro dão-se bem egual- mente nos terrenos graniticos e feldespa- thicos, menos bem nos terrenos calcareos. A Azeiiheira e todas as pomaceas, ao con- trario, preferem estes últimos. Sabia-se também que, em quanto os Laricios se desenvolvera bem nos terrenos calcareos, os Pinheiros bravos ou maríti- mos aprazem sobretudo nos terrenos are- nosos muito pouco calcareos. Nos terrenos cretáceos os Pinheiros communs offerecem tal aspecto de definhamento, que de longe attestam quanto taes terrenos desfavore- cem a sua vegetação. Os snrs. Grandeau o Fliche, tendo ul- timamente estudado as causas do definha- mento dos Pinheiros nos terrenos calcareos, acharam que n'estes terrenos o Pinheiro offerece menos potassa e menos ferro, sen- do estes elementos substituidos por um excesso proporcional de cal. Examinadas as folhas, acharam que ellas continham menos fécula e menos matéria verde, e que era este desfalque a razão immediata não só da sua languida vegetação, mas da pouca terebintina que elaboram os Pi- nheiros estabelecidos em terrenos calca- reos. Sabe-se com effeito que o ferro é um dos elementos da chlorophylla, ou matéria verde das plantas, a qual a este respeito se pode bem comparar com a globulina do sangue dos animaes. Sabc-so também que a potassa é o ele- mento formatriz da fécula e do assucar, dos quaes derivam por desoxidação e des- hydratação os carburetos de hydrogenio, que formara a resina liquida ou terebin- tina dos Pinheiros. Um facto moderno, succedido nos plan- tios de pinhaes nas landes da Gasconha, acabou de pôr em i-elevo a grande anti- pathia que o Pinheiro maritimo tem para os terrenos calcareos. Muitos terrenos da Sologne, que haviam sido arroteados e dessecados, foram mais tarde semeados de penisco. Notou-se que em todos aquelles que se fizera uso da «raarga», ou terra calcarea, os Pinheiros ficaram sempre rachiticos; ao passo quo nos terrenos puramente siliciosos e não margados o pinhal desenvolveu-se bera. O contraste foi tal, que a sociedade agrícola de Orleans poz este caso a concurso para se saber as causas d'elle. Lisboa. J. I. Ferreira Lapa. DO SOLO QUE CONVÉM ÁS PRINCIPAES ESSÊNCIAS FLORESTAES QUE SE CULTIVAM NO PAIZ ' Acácia dealbata, Link. — Acácia deal- bada. — Arvore indigena da Austrália e acliraada cm Portugal. Prefere os terre- nos ligeiros, frescos e substanciaes a todos os outros solos, e dá-so em quasi todas as exposições. Acácia melanoxilon, R. Br. — Austrália. E oriunda da Austrália e aclimada no nosso paiz. Prospera melhor nas regiSes montanhosas do que nas planicies ; vegeta em quasi todos os terrenos, mas profere os ligeiros e frescos. ] Vide J. 11. 1'., vol. V, pag. 131. Myrtus communis, Linn. — Murta. — Dá- se nos terrenos profundos e seccos, vive pelas collinas e planicies. Eucalyptus glohxdus, Labill. — Arvore indigena da Austrália e aclimada no rei- no. Geralmente diz-se que esta arvore se desenvolve em toda a natureza de terreno e com todas as exposições; mas a experiên- cia tem-nos mostrado o contrario. Os so- los que lho são mais aíFeiçoados no nosso paiz são os soltos, frescos e férteis. Dá-se de preferencia nos valles e nas encostas JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 167 a pouca altura e agradam-lhe as exposi- ções quentes. Ailanthus glandulosa, Desf. — Ailantho glanduloso. — Dá-se em quasi todos os ter- renos menos nos pantanosos; mas prefere os solos ligeiros, substanciaes e frescos. Agrada-Ihe todas as exposições e vive tan- to nas colimas como nas planicies. Buxus sempervirensj Limi . — Buxo arbó- reo.— Prefere os terrenos calcareos a to- dos os outros e busca as montanhas e col- linas. Juglans regia, Linn. — Nogueira com- mum. — Dá-se em quasi todos os terrenos, mas prefere os substanciaes, profundos e frescos. Foje dos pantanosos ou dos exces- sivamente húmidos. Requer cultivo isola- do; accommoda-se a todas as exposições e vive nas planicies e nas encostas. Juglans nigra, Linn. — Nogueira preta. — Arvore indígena da America septen- trional, aclimada no paiz. Dá-se em terre- nos de natureza eguaes ao da espécie an- tecedente; mas comtanto que contenham bastante humidade. Foje dos solos panta- nosos. Betula alba, Linn. — Vidoeiro. — Esta arvore vegeta bem em todos os terrenos, exceptuando os de quartzo, argilla, cal- careos e ferruginosos. E natural dos cli- mas frios e das regiões montanhosas. Alnus glutinosa, Gaertn. — Amieiro ne- gro.— Requer terrenos húmidos, substan- ciaes e soltos ; encontra-se nas margens dos rios e ribeiros e junto das torrentes; tanto se dá nas montanhas como nas pla- nicies, e foge dos terrenos pantanosos. Populus tremula, Linn. — Choupo tre- medor. — Esta arvore vive bem nas encos- tas e planicies ; dá-se em todas as exposi- ções e em quasi todos os solos, mas prefere sobretudo os terrenos ligeiros, substan- ciaes, frescos e mesmo húmidos, próximo dos rios, ribeiros e lagoas; foge dos pan- tanosos. Soffre mais com o calor do que com qualquer outra temperatura. Populus alba, Linn. — Choupobranco. — Requer terrenos ligeiros, frescos, e subs- tanciaes, próximo dos rios, ribeiros e la- goas. Vegeta também em outras nature- zas de terrenos, mas então não adquire as grandes proporções como nos solos acima citados. Populus p7/ramidalis, Ros. — Choupo pyramidal. — Dá-se nos solos ligeiros e substanciaes; requer muito menos humi- dade do que as espécies antecedentes. Populus nigrajLimiQ.. — Choupo negro. Dá-se nos mesmos terrenos que o P. tre- mula. -^ . , y Coimbra. (Continua). Adolpho F. Moller. BIBLI0GRAPHI4 L'AQUARIUM D'EAU DOUCE, D'EAU DE MER, PAR JULES PIZETTA Lemos ultimamente um elegante livri- nho, escripto n'um estylo ameno e com verdadeira consciência scientifica, sobre os aquariums, esses preciosos apparelhos a que as sciencias naturaes tanto devem. Os aquariums são de origem muito anti- ga; 08 romanos já usavam d'elles postoque com um fim um pouco diverso d'aquelle para que são hoje appl içados. Eram verdadeiros viveiros, onde os Lu- cullos criavam as mais delicadas espécies de peixes, para regalo do paladar e os- tentação das suas luxuosas mesas, em cu- jos triclinios muitas vezes se reclinavam os poetas e philosophos contemporâneos. Alguns d'esses lagos, ou piscinas, eram verdadeiros monumentos artísticos ; não só pela ornamentação, mas também pelos aqueductos que ás vezes de muito longe conduziam a agua com que eram alimen- tados. Luxo e alimentação eram unicamente os fins a que visavam os aquariums de então. Hoje esses reservatórios téem um fim mais nobre e mais elevado, como é o de prestar á sciencia uma immensidade de novas particularidades, relativas aos há- bitos, costumes e funcções physiologicas de milhares de seres, que nem a vista nem o pensamento poderiam^ observar nas suas húmidas habitações. E a este sim- ples apparelho que devemos trabalhos im- portantissimos sobre historia natural ; taes como os de Mr. Coste e Quatrefages so- bre as metamorphoses dos Crustáceos, de 168 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Dujardin sobre ca roproducção das Medu- sas, de Gosse sobre as Actinias, etc. Reconhecida pela sciencia a importân- cia scientifica do aquarium, cstabelcce- ram-sc logo alguns nos principaes jardins zoológicos c botânicos, que, pela sua ma- gnificência, se tornam verdadeiros monu- mentos scientificos, com tanto ou ainda mais mérito do que os museus zoológicos, pois que nos aquários observam-se vivos os animaes que nas coUecções só appare- cem mortos e desfigurados. Todos conhecem pelo menos de nome os magnificos aquários do jardim zoológi- co de Londres, do collegio de França, do jardim de aclimação, que não encontrou ainda rival, além do que figurou tempo- rariamente na ultima exposição de Pariz em 1retas, Tílias, Catalpas, Pawlonias, Choupos, e muitas outras espécies indígenas comple- tam uma considerável colleção de plantas folhosas, novamente introduzidas no Bus- saco. Dous exemplares da Casuarina equi- setifolia, que apenas tem dous annos, apre- sentam um vigor de vegetação admirá- vel. As Coníferas exóticas estão também alli representadas por curiosos indivíduos das tribus das Cupressineas, das Abieti- neas, das Taxíneas, e das Podocarpeas. Os Juniperos hermudianos, os da Virgí- nia, e outros medram no Bussaco a olhos vistos, assim como os Cedros deodara, os do Líbano e atlânticos. Encanta ver o des- envolvimento rápido de uma Araucária Cunninghami j' as Brasilíensis, de que ha para cima de 20 exemplares, estão muito viçosas. Das Taxíneas temos lá varias es- pécies; o Taxodium sempervirens avan- taja-se a todas. Encontram o terreno ca- roavel cinco espécies de Abetos; do Pe- ctinata, e do Pícea ha para mais de 40 exemplares. Os Pinheiros elevara-se com ufania ; o Sylvestrís, Canaríensís, Nigra, Larício, Insignís, àesenvolvem-se admira- velmente. Dos Pinheiros novos do México possuo o Bussaco uma collecçao de vinte espécies ; foram alli semeados, ha pouco mais de um anno, e estão bem dispostos. Do Pínus j^insapo ha inn exemplar lin- díssimo de três annos, e para mais de cem ainda novinhos. De outras arvores menos notáveis tem-se feito uma soffriv^el collec- çao. Quando a matta do Bussaco era res- peitada como logar de penitencia, devo- ção e santidade, ainda os seus arvoredos se não julgavam bem guardados pela con- stante vigilância de seus venerandos ha- bitadores, tanto que em 1643 Urbano VIII fulminou uma excommunhão a quem des- truísse qualquer arvore dentro d'aquelle sagrado asylo. N'aquellas eras o succes- sor de S. Pedro fechava as portas do céo aos que attentavam contra as arvores do Bussaco ; fulminar-se-hão hoje com des- considerações aos que promovem a sua conservação e accrescentamento?» JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 173 De 1859 até hoje teem continuado as novas plantaçSes no Bussaco. As arvores modernamente plantadas apresentam-se promettedoras o mais possível, e muitas ostentam já um desenvolvimento admirá- vel. Merecem especial menção os formosos grupos ao lado e para baixo do mosteiro, os que ficam superiores á fonte de Santa Thereza, e as plantações da clareira ao lado e inferior á rua da Rainha. Coimbra. A. M. Simões de Castro. ECHEVERI ÀGÀVOIDES As Echeverias sàío plantas rústicas per- tencentes á faniilia das Crassidaceas que vivem nos rochedos, nos sitios seccos e que se agradam d'uraa exposição a pleno sol. Na maior parte são originarias do Mé- xico. A espécie de que nos occupamos foi in- troduzida na Europa em 1861 e tem a forma d'um pequeno Aloé ou d'uma Aga~ Fig. 33 — Echeveria Agavoides — Desenhada no Horto Loureiro ve em miniatura. É acaule, as folhas são muito numerosas em forma de roseta, gros- sas, muito dilatadas na base. São glabras, glaucas, d'um verde opala e cora um pe- queno bordo vermelho, pelo menos na ex- tremidade. As flores são de um escarlate desmaia- do 6 não deixam de ter algum mereci- mento. Esta planta é muito recommendavel para os jardins e também para as salas, onde vegeta bem. A fig. 33 representa um exemplar da Echeveria AgavoideSj desenhado no esta- belecimento horticola do snr. José Mar- ques Loureiro, onde os leitores poderão fazer acquisição d'esta planta mediante poucos cobres. Oliveira Júnior. SINGULAR DESENVOLVIMENTO DE ALGUMAS ESPÉCIES DO GÉNERO FICUS A vegetação d'algumas espécies de Fi- cus apresenta no seu paiz natal phenome- nos verdadeiramente admiráveis e curio- sos. Na «Historia da China», cita-se uma Figueira, que se acha próximo da cidade de Kien, e que é tão basta que um só dos seus braços pode abrigar 200 carneiros. Uma outra, perto da província de Che- kiang, mede aproximadamente 130 me- tros de circumferencia. Um dos vegetaes mais susceptíveis de oíferecer imagens pittorescas e imponentes é sem duvida a arvore sagrada dos Hin- dus ou Ficus religiosa Linn. (Figueira dos Banianos). Esta arvore é plantada próximo dos tú- mulos e templos, e á sombra d'ella é que 174 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA OS religiosos da índia se entregam á con- templação e meditação das cousas divi- nas. Os seus enormes braços desenvolvem-se magestosamente e dão origem a nume- rosas raizes, que, descendo ao solo como trepadeiras, ahi se fixam formando assim novos troncos, e dando á arvore a appa- rencia d'uma verdadeira floresta. Outras vezes as mais raizes, estendendo-se mara- vilhosamente, cobrem os edifícios que lhes estão próximos, trepam ás columnas, afei- çoando-se ás suas formas e acabando sem- pre por destruil-as ; tal é o vigor e a força da sua vegetação. A mais notável d'cstas arvores cresce na ilha de Kebyr-Bor, doze milhas ao nor- deste de Bazoutch nas índias Orieníaes. É tão alta que se descobre a muitas mi- lhas de distancia, os seus braços cobrem um espaço de terra muito considerável, e a certa distancia toraa-se mais por uma verdadeira coUina formada pela extremi- dade da ilha, do que por uma arvore. O solo, onde este colosso vegetal cresce, é areento e muito fértil; pela parte de este é banhado por uma ribeira e do lado do oeste o mar nas grandes marés vem-lhe beijar as raiz ís. No fim da estação das chuvas a ribeira, crescendo caudalosamente, inunda toda a ilha ; os habitantes fogem então para cima dos mais altos braços da arvore, o ahi se conservam dias e semanas, até que as aguas baixem ; a rapidez da corrente é tão forte n'estas occasiões que nenhum barco ahi pode navegar. Acerca d'esta arvore existem entre os Índios lendas e superstições muito curio- sas. A mais notável é a que conta a ori- gem d'e8ta maravilha vegetal. Acreditam elles que um individuo, tendo um dia lim- pado os dentes com um pedaço de pau, o lançara fora e fura isso o que dera ori- gem ao tronco que hoje se admira. Assim que morreu, foi esto individuo collocado no numero dos deuses ; e próximo do mais antigo tronco d'esta arvore vê-se um tem- plo onde a sua estatua é venerada, attra- hindo todos os annos grande numero de romeiros e estrangeiros. A Mia é uma outra espécie do género Fícuh; encontra- se em Tonga-Tabu e tem de 30 a 30 metros de circumferencia por 40 d' altura. É consagrada ao soberano de Tonga, e no dia em que este se coroa vem com a sua numerosa corte e séquito sentar-se á sua sombra. Terminemos este artigo por uma cu- riosa narração de Mr. A. de Humboldt, so- bre a Zarnang dei guayre. Esta arvore não pertence ao género so- bre que temos fallado, é uma Mimosa, to- davia os nossos leitores depois de lerem o interessante artigo do sábio encyclopedis- ta allemão, desculpar-nos-hão o desvio. «Ao sahir da aldeola de Turmero, valle de Guacara, diz M. Humboldt, descobre-se a uma légua de distancia, um objecto que se nos apresenta no horisonte como um cabeço arredondado, como um tumulo co- berto de vegetação. Não é uma coUina, nem um grupo de arvores juntas, é uma só arvore, o famoso Zamang dei guayre, conhecido em toda a província pela enor- me extensão dos seus braços, que formam uma cúpula hemispherica de 576 pés de circumferencia. 0 Zamang é uma bella espécie de Mi- mosa, cujos braços tortuosos se dividem por bifurcações. A sua folhagem leve e delicada destaca-se agradavelmente no azul do céu. Foi longo o tempo que nos demoramos debaixo d'esta abobada de ver- dura. O tronco do Zamang dei guayre, que se encontra no próprio caminho de Turmero a ]\Iaracay, só tem 60 pés de alto e O de diâmetro, mas a sua verda- deira belleza consiste na forma geral da cúpula. Os braços estendem-se como um vasto guarda-sol, e inclinam-se para a terra de que estão uniformemente afastados 12 a 15 pés. A peripheria dos braços ou do vei-tice é tão regular, que traçado di florentes diâ- metros achei-08 sempre de 196 e 186 pés. Um lado da arvore estava completa- mente despojado de folhas em consequên- cia da sêcca; do outro lado ostontavam-se ao mesmo tempo folhas e flores. Tillan- dsias, Lorantheas, a Eaquette pitahaya ' e outi'as plantas parasitas cobrem os bra- ços e fendem a casca. Os habitantes d'es- te valle, sobretudo os indianos, teem uma espécie do veneração pelo Zamang dei guayre, que os primeiros conquistadores 1 Espécie de "Opuntia". JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 175 parece terem encontrado pouco mais ou menos no mesmo estado em que hoje o vemos. Desde que se observa com attenção ainda se não viu mudar de grossura e forma. O Zamang deve ter pelo menos a edade do Dragoeiro de Orotava '^. Ha alguma cousa de imponente e ma- gestoso no aspecto das arvores velhas ; por isso a violação d'este3 monumentos da na- tureza é severamente punida, nos paizes em que faltam os monumentos da arte. Soubemos com satisfação que o atual pro- prietário do Zamang, tinha intentado um processo contra um rendeiro, que tinha tido a ousadia de lhe cortar um braço. A causa foi levada aos tribunaes e o rendeiro foi condemnado.» A. J. DE Oliveira e Silva. chronicà horticolo-àgricolà Mais com o intuito de conhecermos as famigeradas Caldas de Vizella do que com o fim de tirarmos partido das suas aguas, apesar de termos feito uso d'ellas, fomos alli passar a ultima quinzena do mez de julho. A situação geographica, as condições climatéricas e do solo, ^ poderiam tornar aquella pequena localidade ainda em mais aprazível jardim do que já é, se a mão do homem fosse mais intelligen temente diri- gida e o gosto das flores estivesse mais enraizado. Quem passeia pelos campos cir- cumvisinhos não pode deixar de se en- ' thusiasmar perante aquella variedade e abundante vegetação espontânea que em alguns pontos chega a ser luxuriante co- mo por exemplo acima do sitio denomi- nado a Cascalheira onde a Osmunda re- galis associada ao Scolopendrium vidga^e e ao Pteris aquilina e Polypodium acu- leatiivi nos recordam as regiões da Also- phila e do Balantium. Herborisaraos um bom numero de plan- tas, algumas das quaes pelo seu delicado colorido tornar-se-hiam bem dignas d'oc- cupar um logar distincto nos nossos jar- dins. Ignoramos se é devida ao cuidado da camará municipal de Gruimarães ou á ini- ciativa particular a arborisação de alguns legares das Caldas de Vizella, mas quer seja devida á primeira quer á segunda, não nos furtaremos a exprimir os nossos sentimentos pelo pouco escrúpulo que tem presidido á escolha das espécies. Sendo o numero das arvores que alli poderiam pros- 1 Conta-se que ua primeira expedição de Be- thenconrt, no anno de 1402, o "Dragoeiro de Oro- tava" tinha as mesmas proporções que hoje se lhe encontrara. perar tão avultado, é realmente penoso ver-se que as arvores que predominam são o Ailanthus glandidosa e o Ligustrum japonicum que exhalam um cheiro que incommoda; a Acácia melanoxylon d'aspe- cto fúnebre e cuja sombra está longe de ser comparada á das Tilias, ás das Ro- hinias, á dos Aescidus, Platanus, etc, não omittindo a encantadora Acácia Ju- lihrizin de que em Vizella ha os exem- plares mais frondosos que existem no paiz e que são de uma belleza inexcedivel. Re- servamo-nos para mais de espaço fallar- mos d 'esta Acácia. — O artigo que publicamos n'este nu- moro sob a epigraphe «Desenvolvimento dos Pinheiros», é transcripto da Revista Agrícola que mensalmente escreve o snr. Ferreira Lapa, no «Commercio do Porto». — O snr. Ernesto Chardron, livreiro d'esta cidade, vae editorar um livro cujo titulo é « Manual d'Arboricultura » , ou «Tractado theorico e prático da cultura e exploração das arvores fructiferas», de- vido á penna do snr. Alexandre de Sousa Figueiredo, professor d'agricultura e agró- nomo do districto de Faro. A obra formará um volume em 8.° de mais de 400 paginas, com 100 gravuras intercaladas no texto. — O primeiro premio da exposição de bois gordos, que teve logar no dia de S. João, em Braga, foi de 80í$i000 reis e per- tenceu a uma junta de bois que pesava 1:805 kilogrammas, da qual era dono o snr. F. G. Fernandes, de S. Paio de Me- relin. — A carta que em Seguida inserimos deve interessar os apicultores, por que n'ella se dá conta de um remédio fácil para curar uma moléstia que não é raro 176 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA flagellar os enxames. Está escripta com a singeleza e sinceridade d'um bom pas- tor d'almas e d'um curioso observador da natureza. Snr. redactor — Vendo enem o n.** 6, do corrente anno do "Jornal de Horticultura", que V. digna- mente redige, a applicaçào do café ás doenças das abelhas, vou referir-lhe um caso análogo, que ca- sualmente experimentei. Haverá pouco mais ou menos dez annos, tinha eu ainda só dois enxames, e, julgando melhor tel-os a coberto dos rigores do tempo, e mesmo para mais commodamente estudar seus instinctos e necessi- dades, colloquei-os em uma varanda coberta, pe- gada á cosinha. Reinou então aqui por muitos dias, n'um d'esses invernos rigorosos, um nevoeiro mor- no, abafadiço e humidojdo qual resultou morrerem- me as abelhas aos centos cada dia, de sorte que encontrava todas as manhãs um punhado d'ellas mortas no fundo dos cortiços. Examinada a causa, conheci claramente, que a doença era desintheria. Uma manhã, com cuidado e pena das abelhas, es- tava tomando café ao pé d'ellas, o qual costumo tomar bom e bem doce. Por acaso e para ver se sortiria effeito, lancei d'elle no pires e introdi^zi n'um cortiço; as abelhas, ou por instincto ou at- trahidas pelo cheiro, correm ao liquido, e em pou- co tempo lambem todo o café. Dei-lhes mais, e ao outro enxame também, e logo a mortandade foi diminuindo, e viam-se ellas mais animadas, e por isso repeti o tractamento ; mas como o nevoeiro continuava, e, existindo a causa não cessaria o ef- feito, mudei os cortiços para dentro da cosinha para quo por meio do fumo se completasse a cura. Fui feliz na lembrança ! Ellas curaram e escapa- ram os enxames, porque provavelmente ainda as respcctiva.s rainhas não tinham adoecido, pois lhes «lei o café logo no segundo dia. Prova de que o café e .'íobretudo o fumo da cosinha lhes deu a saúde. Ahi tem pois V. mais um testimunho a favor do café nas doenças das abelhas, que poderá publicar sem receio de ser enganado ; pois foi isto observa- do por mim próprio ; c não são contos de rústicos que, a respeito de abelhas, dizem o crêem cousas taes que só de ignorantes podiam surgir ; e porque as dizem e repetem desde séculos com muitos pon- tos de admiração, acreditam-se vulgarmente como mysterios : razão porque me propuz a estudal-as cora attenção, tendo conseguido collier muitas ob- servações bem diversas, não só do vulgo, mas d'al- guns escriptores, que escreveram provavelmente fiados nas informações de seus crcados ou jardi- neiros... Se eu tivesse noticia de algum tractado de apicultura, mais moderno, bem estimava obtel-o, maia por saber qualquer aperfeiçoamento relativo a cortiços, do que do seu tratamento, de que julgo saber bastante, e de quo posso dar explicações sa- tisfactorias. Fregnezia do Pombal, ^^ ^ Carrazeda d' Anciães. "^ ^ ' ''^°- Amónio da Cunha e Almeida. Das publicações recentes sobre apicul- tura podemos recommendar «Les Abeil- les» por F. Bastian, obra ornada com 53 gravuras. No fim do livro cncontra-se uma biblio- grophia a])icola que poderá interessar ás pessoas que se occupam seriamente d'csta especialidade. — Nos meiados do mez d'ago8to escre- via-nos o snr. Basilio Constantino de Al- meida Sampaio, de Murça, a carta que em seguida inserimos: Amigo Oliveira Júnior. — A quadra rae má para a agricultura. A secca é extraordinária, e as pre- ces "ad pretendam pluviam" não são ouvidas pelo Creador, que não altera os phenomenos naturaes. Não choveu o inverno passado, e d'ahi a escaesez d'agua nas nascentes n'este estio. Ha escassez de uvas nas collinas; porque a lim- paçào foi má, e a secca temn'as mirrado, porém nas olgas haverá a colheita quasi ordinária, o que quer dizer, que haverá este anno menos do ametade do ■vinho do anno passado; porque a maior parte das vinhas estão em ladeiras, e não em terras baixas. A experiência confirma o dito virgiliano — vitia amat coUes — porém em annos, como este, pouco amoraveis são as collinas para as "Videiras". Tem-se notado apparecerem muitas "Videiras" com as folhas seccas, e as uvas pouco cheias o quasi difinhadas.Desconfiou-se da visita do terrível microscópico "Phylloxera"; mas verificou-se que esse voraz insecto não preava por emquanto as ra- dicolas das "Videiras" d'este concelho. Pôde e deve haver muitas cousas que produzam o definhamento das "Videiras", o seccarem-se-lhes as folhas e perderem o fructo; mas apontaremos o seguinte, chamando a attenção dos homens com- petentes liara este phenomeno. Conta-nos o intelligente agricultor d'esta villa o snr. António Marcolino Ferreira Pinto, que em maio de 1872 vira em um seu prédio uma ramada de parreiras ameaçada pelo"oidium tuckeri",e que as mandara enxofrar pelo processo ordinário de- pois d'um pequeno chovisco cabido de tarde, e quando as "Videiras" inda não estavam molhadas. Passados poucos dias as "Videira" estavam despi- das de folhas e o fructo perdido. Experimentou em outro anno(1873)enxofrar "Vi- deiras", que estivessem molhadas, e o resultado foi análogo. Quem sabe sè a enxofração feita ao romper da manhã, quando as vinhas estão húmidas com os orvalhos da noute não prejudicará muito as plan- tas? Este phenomeno merece ser estudado, porque ás vezes o segredo das cousas está em factos im- perceptíveis. Apesar de muito calor, a maturação das uYas nâo está adiantada. As hortas estão sem verdura alguma; são pouco regadas. As hortas são os jardins do agricultor; mas n'este anno estão muito tristes. A safara das "Batatas têmporas" foi abundan- tíssima; é porém escassa a das "Batatas serôdias". N'esta quinzena passada era o tempo próprio para a collieita dos "Fenos". Foi pouco preciso afiar as gadanlias para o corte d'estas hervagens. A escassez dos "Fenos" foi no entanto suprida pela abundância das palhas do milho painço, que os lavradores n'estes sities não se cauçaram de se- mear. Podc-se dizer da necessidade o quo Cicero dizia da historia — que era a mestra da vida. Estão quasi concluidas as malhas; e a colheita do.s pães foi regular. Falíamos algures d'este jornal na importância da via(;ão para a agricultura, c lembramos a ne- cessidade da estrada de Villa Pouca d' Aguiar para entroncar perto do Populo na estrada que vao de Villa Kcal a Murça. A junta geral do districto de Villa Real, na sua JOllNAL DE HOETICULTUKA PKATICA 177 consolta ao governo de 6 de março de 1874, pedia a necessidade d'este melhoramento que facilitaria a importação e exportação dos productos agricolas das provindas do Minho e Traz-os-Montes ; mas não indicou o ponto preciso, onde essa estrada de- veria entroncar. Lembramos aos municípios de Murça, Villa Pou- ca d' Aguiar, Mirandella, e Alijó que representem ao governo de Sua Magestade n'este sentido; por- que esta estrada, entroncando no Populo, não só corta de oeste a leste pelo centro a província de Traz-os-Montes, mas fica também ligada com o Douro (Pinhão) pelo ramal que vae do Populo para Alijó e Pinhão. O thermometro tem marcado n'estes últimos dias 27 graus (Reaumur) á sombra, e n'esta quin- zena á sombra já chegou a 33 graus e J. — Como se nào fora bastante a cadeia da Relação e o hospital da Misericórdia para darem um aspecto triste ao passeio da Cordoaria, a camará municipal cons- truiu mesmo defronte d'aquelle jardim um mercado para a venda de peixe. O mal está feito e não tem remédio, mas o que desejáramos era que ao menos houvesse a máxima limpeza para o cheiro que exhala o peixe em putrefacção não chegasse aos órgãos do olphato dos j^romeneurs. Ha dias em que se torna impossível estar na ave- nida principal, onde a musica costuma to- car. Pedimos encarecidamente as mais sérias e promptas providencias para não se inu- tilisar o único passeio que tem o Porto. — No tempo em que o snr. dr. Ray- mundo Venâncio Rodrigues foi presidente da camará municipal de Coimbra, pres- tou muitos serviços á arborisação d'aquel- la cidade. Mencionamos agora o seu nome a propósito de quatro Palmeiras que elle mandara plantar aos lados da capella do cemitério da Conchada em 1871 e que es- tão mostrando boa vegetação apesar de não estarem resguardadas dos frios dos mezes de janeiro e dezembro e de serem tidas por alguns na conta de espécies de- licadas : são Corypha australis e Livistona sinensis. O sitio onde estão dispostas acha-se á altitude de 83 metros acima do nivel do mar e expostas a todos os ventos do qua- drante norte. O terreno é calcareo-argi- loso. Téem crescido cerca de 30 a 40 centí- metros. — O districto da Guarda, que é um dos que mais adeantados está na creação de sirgo, soíFreu este anno graves prejuízos. — Por um extracto que se fez do nu- mero de expositores de caixas e de gar- rafas, de amostras de vinhos portuguezes I na exposição vinícola de Londres, veriíi- cou-se o seguinte por districtos : i Numero de expositores — Bragança 20, I Villa Real 30, Braga 10, Porto 20, Vian- ' na do Castello 18, Vizeu 58, Aveiro 19, Coimbra 19, Castello Branco lõ, Lisboa j 140, Beja 19, Évora 12, Portalegre 1, : Faro 18, Guarda 8, o Santarém 4õ. ; Numero de caixas — Bragança 20, Vil- ' la Real 33, Braga 12, Porto 3G, Vianna do Castello 26, Vizeu 161, Aveiro 32, Coimbra 31, Castello Branco 16, Lisboa 386, Beja 53, Évora 22, Portalegre 13, I Faro 63, Guai'da 8, e Santarém 104. j Numero de amostras — Bragança 20, j Villa Real 33, Braga 12, Vianna do Cas- jtello 18, Vizeu 87, Aveiro 21, Coimbra I 31, Castello Brar.co 16, Lisboa 264, Beja I 30, Évora 30, Portalegre 13, Faro 27, Guarda 18, e Santarém ()0. Numero de garrafas — Bragança 480, Villa Real 792, Braga 288, Porto 846, Vianna do Castello 624, Vizeu 3:864, Aveiro 768, Coimbra 744, Castello Bran- co 784, Lisboa 9:121, Beja 1:260, Évora 968, Portalegre 312, Faro 1:500, Guarda 432, e Santarém 3:758. Total geral — Expositores 458, caixas 1:019, amostras 680, e garrafas 26:141. — Entre as Videiras que se cultivam na cerca de S. Bento anexa ao Jardim Botânico de Coimbra, recommenda para mesa, o snr." Frederico Moller, as seguin- tes : Vindas da Allemanha — Barharossa do Piemonte — Cacho e bago grandes; cor ro- xa, muito similhante ao nosso Ferral na forma 5 sabor delicioso ; amadurece nos princípios de agosto. Royal Muscadine — Cacho e bago me- dianos; cor branca, muito assucarado e gosto saboroso: amadurece nos fins de iu- lho. _ ^ Vindas de França — Sirrah ou Syras d'Hermtfage — Cacho e bago mais que me- dianos, cor roxa; saboroso, amadurece meados d'agosto. Chasselas de Fontainehleau — -Cacho e bago mais que medianos ; cor branca, mui- to saboroso; amadurece nos princípios de agosto. 178 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA — «Breve Noticia da Viticultura Por- tugueza» ou «líosumo dos Esclarecimen- tos indispensáveis para se avaliar a Col- lecção dos Vinhos apresentados na Expo- siçfio Internacional de 1874, cm Londres», é o titulo de uma publicayào official que recebemos e destinada a^ser distribuída na capital da Inglaterra. E devida á penna proficiente do um dos homens que com mais zelo tem curado da nossa agricultu- ra e cujo nome se acha inscripto á fronte dos beneméritos do paiz — o snr. conse- lheiro Kodrigo de Moraes Soares. Os «Esclarecimentos», comquanto sejam um trabalho de pequeno fôlego, como era mister que fosse para o fim a que eram destinados, ainda assim revelam os muitos recursos de que dispõe o escriptor, porque em poucas paginas se reúne tudo quanto pode interessar as pessoas que queiram tomar conhecimento do papel que repre- senta no nosso paiz a viticultura. Em tão pequeno numero de paginas era impossí- vel dizer-se mais e agradou-nos sobremo- do a maneira singela e imparcial com que se relatam as circumstancias mais impor- tantes que actuam na boa e má qualidade dos nossos vinhos. 0 snr. Moraes Soares não quiz fazei- um trabalho fantasmagórico ou de recla- me como í^e usa muitas vezes para elevar as qualidades de um producto, mas que os interessados, reconhecendo a exaggera- ção do escriptor apaixonado pelo seu paiz, ficam convictos de que precisam do ver para crer, como S. Thomé. Quem percorrer aquelle cscripto cheio de dados estatísticos e em que se mani- festa uma opinião imparcial e sincera, acreditará sem receio de que é real o que n'elle se lê. Este })roficiente trabalho é dividido em cinco partes a saber: 1 — Condições naturaes de cultura da vinha; II — Economia vitícola ; III — Viticultura e rcnologia; IV — Regiões vinícolas : 1 .'' Região — Douro. 2.'' Região — Traz-os-Montes. 3.''' Região — Minho. 4.'' Região — Beira Alta. 5.'^ Região — Beira Baixa. O,' Região — Estremadura. 7.^ Região — Alemtejo. 8.* Região — Algarve. V — Conclusão. Incorporada a este opúsculo acha-se uma excellonto carta colorida representando a producção dos vinhos communs ou de pas- to de Portugal e um esboço da carta vi- nícola do Douro. A edição é feita nos idiomas portuguez, francez e inglez e estamos certos de que será lida com o máximo interesse pelas pessoas estrangeiras que se occupam d'es- te assumpto. — Uma folha da capital escrevia ha dias 0 seguinte: E' de grande interesse na actualidade o conhe- cimento do estado geral dos cereaes, nas princi- paes nações do mundo, visto que anda nos ares certo panicoinfundado acerca da escassez das co- lheitas. Por isso, das noticias que recebemos e te- mos presentes, resumimos o seguinte : Estados Unidos — A colheita de cereaes deve ser unanimemente colossal. Em Nova York ha nova baixa nos preços dos trigos e farinhas. Rússia — Dizem de Odessa que haverá espantosa abundância de cereaes. Apressam-se as vendas dos depósitos existentes. Ha baixa nos preços. Allemanha — Colheita atrazada em parte, e em parte prejudicada por causa da secca; mas nio deve ser má. Dinamarca — Tem havido séccas, mas os preços continuam firmes. Anstria-Hungria — Reanimados os campos e me- lhoradas as esperanças dos lavradores. Baixam os preços. Bélgica — As colheitas devem ser abundantes em todas as províncias, e chegaram olfertas dos Es- tados-Unidos por preços inferiores. Hollanda — Em partes ha damnos, mas em geral os campos alegram os lavradores. Itália — As noticias são satisfactorias. Os preços continuam firmes. Inglaterra — O anno passado Louvo "deficit" na colheita, e por isso se deram quantiosas importa- ções nos mercados inglezes, mas, este anno, a co- lheita compensará, ao que parece, o "deficit" an- terior. Preços firmes. França — A colheita de 1874 será das melhores que tem havido. Nos mercados do sul notável bai- xa. Hespanha — Das principaes províncias, as infor- mações são agradáveis. Importantes zonas produ- ctoras apresentam o melhor aspecto. — O snr. director geral do commorcio e industria, conselheiro Rodrigo de Moraes Soares, dirigiu uma circular a todos os administradores dos concelhos, pedindo- Ihes os esclarecimentos e dados para a for- mação da estatística da producção do vi- nho e inventario dos vinhos nacionaes. — Foi crcado o logar de agrónomo no dístricto de Vizeu, em consequência de í uma representação das respectivas aucto- 1 ridades. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 179 — Começou-se a publicar em Cadiz um periódico mensal, órgão da Sociedade pro- tectora de animaes e plantas. É a única sociedade que d'esta indole existe em toda a peninsula, apesar da reconhecida utili- dade que d'ellas resultam. No Porto, por exemplo, a creação d'uma Sociedade pro- tectora das plantas tornar-se-hia muito necessaiúa para pôr cobro aos respetidos actos de vandalismo que presenceamos dia- riamente. Na praça dos Voluntários da Rainha tem o leitor um dos docimientos mais eloquentes do que se sabe fazer em arboricultura no nosso paiz ; isto para não citarmos muitos outros logares que não fi- cam na retaguarda. O primeiro numero do «Boletin de la Sociedad Protectora de los Animales y las Plantas» contém, além de vários artigos, um extenso e interessante noticiário em que se dá conta do que as sociedades de idêntica indole vão fazendo no estrangeiro. Só almas muito nobres e corações do- tados dos mais elevados sentimentos po- deriam constituir-se em associação tão ci- vilisadora como esta. Não fomenta a dis- córdia entre as familias, como outras que existem no nosso paiz e que todos nós co- nhecemos, mas pelo meio da união quer pôr em pratica a divisa que a distingue — Justicia — Compasion — Civilizacion — Higiene — Moral. Oxalá que encontre o apoio de que é digna. I — O snr. Augusto Mendes Simões de Castro, escriptor muito conceituado e co- nhecido pelo seu «Guia Histórico de Coim- bra» e pelo «Panorama Photographico de Portugal», de que é redactor, tem no prelo uma « Memoria historico-descriptiva do Mosteiro e cerca do Bussaco». No presente numero publicamos um ar- tigo, «A floresta do Bussaco», que é um capitulo da obra de que falíamos no pe- ríodo antecedente. Confiamos que o novo trabalho do snr. Simões de Castro será recebido com o fa- vor que merece uma obra d'esta natureza. O Bussaco tem já um nome legendário. A celebre montanha eternisou-se nas chro- nicas ascéticas, nos livros dos poetas e nas paginas da historia. Todo o portuguez tem obrigação de conhecer aquelles penhascos cobertos de verdura, pittorescos, cheios do murmúrio das fontes e do ruido das tra- dicções. O livro do snr. Simões de Castro deve ser um guia indispensável. - — A XVH sessão da Sociedade pomo- logica de França realisar-se-ha este anno em Angers. A sessão abrir-se-ha no dia 27 de se- tembro e encerrar-se-ha no dia 3 de ou- tubro, coincidindo com uma exposição horticola que a sociedade d' Angers se pro- põe organisar. — Nas estufas do Jardim Botânico da Eschola de medicina de Pariz, floresceu ha dias uma Amaryllis pertencente ao grupo Hypeastrum. A flor que é de um branco puro, media pelo menos 22 centí- metros de comprido formando um tubo, cuja abertura tinha cerca de 15 centíme- tros de diâmetro. Esta espécie é indígena de Venezuela. Deve ser de uma belleza sem egual ! — Uma publicação que nada tem que ver com a horticultura mas que não po- demos deixar de registar nas columnas d'este jornal é « A gravura de madeira em Portugal», estudos em todas as especia- lidades e diversos estylos, pelo snr. João Pedroso eminente professor de gravura da Academia de Bellas- Artes de Lisboa, nos- so amigo e que quasí desde a fundação d'este jornal tem illustrado as suas paginas com delicadíssimas estampas. I Amante pelas bellas artes como é o au- I ctor d'estas linhas, incorreria em culpa de lesa-imparcialidade se não tributasse em duas linhas a elevada consideração em que tem o snr. João Pedroso, como artista distinctissimo na especialidade a que se dedica — a gravura. «A gravura de madeira em Porrugal», forma um bellissimo álbum que encontra- rá logar apropriado em todo o atelier em que só entrem obras esmeradas. E o úni- co elogio que podemos tecer á producção do dehcado buril do snr. Pedroso. Desejáramos poder analysar cada es- tampa em particular, mas o logar não per- mitte que nos occupemos d'uma arte alheia á indole cVesta publicação. Ao snr. Pedroso os nossos emboras pela prova eloquente que acaba de dar em pu- blico do seu talento. — Mr. Emíle Planchon, de Montpellier, no seu regresso da America, onde foi en- 180 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA viado pelo governo francez, pai"a estudar a questuo do Phylhxera, fez algumas communicaçScs á iSociedade de Hoi'ticul- tura do Herault, sobre as impressões que recebera durante a sua viagem. Segundo Mr. Planchon, a ílora da Ca- rolina do Norte é bellissima e ofFerece mui- to interesse. O terreno areonto, que cons- tátue o solo em grande parte, permitte a muitas plantas ornamentacs nào só viver mas sim prosperar e tomar proporções ex- traordinárias. As melhores arvores, que viu, acham-se na Maryland, nos bosques inundados. O Liriodendron tulipifera é alli muito vul- gar. Mr. Planchon trouxe comsigo algumas semoutôs da Dionaea muscijnda, planta que se encontra só em dous ou três lega- res do mundo. — Recebemos dos snrs. Ch. Huber & C.''' de Ilicres, o preço corrente das se- mentes de Primulas sinensis,sinensis jim- hriata viacrophylla e sinensis jimhriata plena. Em todas ellas ha grandes novidades. — «O Club» é o titulo de um semaná- rio que vc a luz da publicidade n'esta ci- dade e que tem sabido graugear as mais elevadas sympathias. Com eíFeito devemos confessar que é um dos jornaes do paiz que lemos sempre com interesse pelo bem tractadas que alli costumam ser todas as questões. É collaborado por académicos distinctos que trazem alto o pensamento e que advo- gam as ideias do século em prejuízo das toupeiras. Luctadores como estes, sào sempre bem recebidos na arena das lettras e portanto é de crer que tenha longa e prospera vida. Sao directores do (fClub» os snrs. Emy- gdio d'01iveira e Ildefonso Correia, cava- lheiros bem conhecidos nas lides da im- prensa. Agradecemos a deferência que houve para comnosco, enviando-se-nos a nova publicação. — Os amadores de plantas levantam a gua voz contra o bello sexo, que lhes in- vado 08 recessos floridos e ridentes ! Nós achamos duro quo se soja tíio se- vero para quem com a sua formosura tan- to ornamenta o caminho da nossa vida accidentada, mas pelo amor sagrado que dispensamos á deusa mais encantadora de que resa a fabula — Flora — nào podemos deixar de levantar o nosso brado conjun- ctamente com os cavalheiros que nos pe- dem para intervirmos, para com as senho- ras que visitam os seus jardins e lhes de- capitam as flores, Que tào queridas téein o tào mimo.sas. Desejáramos ter o dom de persuadir as senhoras de que quem cultiva flores, as estremece como se fossem suas próprias filhas, e, com effeito, nào é preciso quebrar lanças nem partir arnezes para se provar que o sào desde o momento em que os nossos cuidados e desvelos as tornaram o ornamento dos canteiros e a coroa formosa dos vasos. Posto isto deve comprehender-se o quan- to o cultivador das delicadas plantas se possuii'á d'uín certo egoísmo que nào dei- xa ver com bons olhos o extranho, que por simples capricho o vá privar da con- templação e da companhia das suasi, filhi- nhas, das suas innocentes amantes. Fallando, pois, com a sinceridade que nos caracterisa, parece-nos que o único re- curso que temos é appellar delicadamente para os bons sentimentos e elevada edu- cação das senhoras que frequentam os nos- sos jardins e para isso usaremos das mes- mas palavras que se encontram escriptas no Jardim de Aclimação de Paríz — Les Jieurs quí ont das crinolines, sont priées de faire grâce â celles qiii nen ont pas. Isto envolve um delicadíssimo requeri- mento que deverá ser deferido, por W. Exc."'^'', amáveis leitoras. As crinolines já acabaram, não ha du- vida, mas o que ainda se não acabou, nem oxalá que jamais se acabe, são essas gra- ciosas màosinhas cor de rosa, mãosinhas que se nào temem dos espinhos e que cor- tam os pedúnculos que sustentam as flores como quem dobra uma fita de seda. Quem sabe se as próprias flores gosta- rão do sacrificio e abençoarão as mãos que as cortam V ! . . . . Se fossemos flor, teríamos pena de não sabermos exprimir o que sentissemos ; as- sim temos pena também de não saber o que pensam as flores. J. D. DE Oliveira Júnior. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 181 PÊRA BONNE-LOUISE D'ÂVMNCHES Esta pêra, que já conta pelo menos 15 annos no nosso paiz, não se acha tão es- palhada quanto o merece e para sua re- commendação bastaria dizer que foi eleita como uma das melhores pela Associação professoral para o progresso da arboricul- tura da Bélgica. A arvore que produziu esta deliciosa Fig. 34 — Pêra Boiine-LouifleId'Avraiiolies pêra foi obtida de semente por um su- jeito chamado Longueval e fructificou em 1780 pouco mais ou menos. Eis a descripção d'este delicioso fructo : Fructo volumoso ou mais que mediano, de forma ovoidal-alongada e com peque- nas bossas ; polpa branca, fína, das mais fendentes, sumarenta a sem pedras. Ma- Vol. V— 1874 turidade : do meado de setembro a mea- do de outubro. A gravura que acompanha esta nota- sinha foi desenhada do natural de um fructo produzido n'imia quinta dos su- búrbios d'esta cidade. Oliveira Júnior. N.» 10— Outubro 182 JORNAL DE HORTICULTUEA PRATICA BIBLIOGRAPHIA LA PLUIE ET LE BEAU TEMPS PAR PAUL LAURENCIN A casa Rothschild, incansável em nos dar edições de bons livi'os, d'um formato elegante e commodo, editou n'este anno a obra do snr. Paulo Laurencin «La Pluie et le Beau Temps». Hoje que a sciencia tem penetrado na vida commum, e tantos serviços nos pres- ta, são necessárias e bem recebidas pelo publico todas as obras escriptas em estylo claro e accessivel ás mais modestas intel- ligencias. A erudição pesada, a dicção nevoen- ta, o pensamento sempre envolvido em íormas obscuras, vão completamente des- apparecendo da linguagem scientifica. A sciencia sahe do tabernáculo, em que alguns philosopbos queriam deter a deusa envolvida em densos nevoeiros, e vai com sorriso gracioso e formas gentis percorrer o mundo. Os grandes vulgarisadores dos conhe- cimentos úteis prestam á humanidade tão grandes serviços como os inventores. São de todos sabidos os grandes benefícios, que o eminente Louis Figuier tem feito á sociedade contemporânea com a divulga- ção de conhecimentos das sciencias natu- raes. O snr. Paulo Laurencin n'es'te seu li- vro sobre metereologia rastreou o trilho d'este sábio. A meteorologia é uma sciencia nova, cujos principaes conhecimentcs muito apro- veitam ao horticultor, agricultor, ao ma- rinheiro, á gente de trabalho, o mesmo aos que embalam a vida cem prazeres; porque o tempo é essencial para um gran- de numero de commcttimentos mais ár- duos, e para muitas tarefas ordinárias da vida. Esta sciencia incipiente já tem feito grandes benefícios á humanidade, sobre- tudo ao agricultor e ao marinheiro; e maiores ha do fazer logo que se estabe- leça cm ])rincipios mais solides-, baseados em maior numero do experiências, de mo- do que talvez se cheguem a predizer d'uma maneira certa as variações atmos- phericas. Não ha nenhuma razão séria. que possa desalentar esta sciencia n'esse grande fim ; porque, como diz o snr. Laurencin, «á maneira de todos os ou- tros phenomenos da natureza, os phe- nomenos atmosphericos devem obedecer a leis fixas e immutaveis estabelecidas pelo Creador desde a origem do mundo, leis a que elles não se podem subtrahir, e que existem realmente, visto que se revelam pelo instincto dos animaes, e que seus ef- íeitos são manifestados pelas oseillaçoes do barómetro». Só debaixo do ponto de vista agrícola é incalculável o bem que pôde advir da previsão segura do tempo. As questões de zoologia, botânica, e agricultura dependem directamente da acção do tempo ; porque a vida dos ani- maes e das plantas precisa de calor e agua : onde não houver humidade não germina a semente ; e sem plantas e pas- tagens não ha herbivoros, e sem estes não podem existir os carnivoros ; porque na natureza tudo se liga. Nos desertos d'A- frica faltam as aguas ; e por isso não exis- tem ahi plantas nem animaes. Os ani- maes e plantas não podem viver sem um certo grau de temperatura ; e por isso muitcs morrem por excessivo frio ou de- masiado calor : e a abundância ou escas- sez das colheitas dependem muito do tempo. O insigne sábio prussiano Humboldt, que sem duvida fez no deminio das scien- cias conejiiistas mais gloriosas do que as feitas pelos seus compatriotas cm SadoAva o Mctz, traçou em 1817 as linhas isother- mas, que são aquellas que n'uma carta em planisferio do nosso globo juntam to- dos os pontos, de e^ue a temperatura me- diana é a mesma, e ak'm da ultima linha se encontra o equador theimico, que junta todos os logares de muito alta tempera- tura. A determinação das difterentes linhas isothermas, e das linhas isochimenes, ou de que a temperatura media hiberna é a mesma, e a das linhas isothcras, ou de que a temperatura media estival é a mes- ma, c útil que seja conhecida por todos quo JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 183 se dedicam á agricultui'a e botânica, por- que ha plantas, como cereaes, Vinhas, Oli- veiras, Laranjeiras, Palmeiras, cuja cul- tura está circumscripta dentro da área das^ linhas isothermas. E dado no entanto ao homem o poder por meio do seu trabalho modificar a acção do clima : a agua tão indispensável para a produeção das terras, e para os usos da vida humana pode ser procurada por mui- tos modos, e sobretudo pela creação de florestas, que muito contribuem para o augmento das chuvas, e para estorvar o damno causado pelas torrentes. Na Austrália, depois que se fez o corte das grandes florestas, appareceu a seccura e falta de chuvas. O homem também pode pela invenção de Franklin, que foi tam grande estadista e bom cidadão como grande physico, evi- tar o raio : e por isso Franklin mereceu que lhe applic assem com propriedade o celebre verso eripuit coelo fulmen, scep- trumque tyrannis. O snr. Laurencin popularisa os conhe- cimentos da meteorologia, e é tio minu- cioso na sua exposição que nada deixa a desejar, e nem fatiga a curiosidade ; por- que amenisa os seus dizeres com uma lo- cução fácil, fluente e clara. As causas que produzem os ventos pela alteração de calor e frio, e a descripção do anemómetro, do thermometro, do ba- rómetro, hygrometro, psychrometro, plu- viometro ou udometro, instrumentos pre- cisos para a medição do vento, do calor, do pezo do ar, da humidade, da chuva, ahi são esboçadas com os nomes dos seus prestantes inventores. A metereologia, como todas as sciencias, tem já prestado grandes benefícios á hu- manidade, e maiores serão, logo que ella mais se desenvolva; e o snr. Laurencin fez um livro, que tanto pode estar na meza do sábio, como na cabana do cam- ponez, na tenda do militar, ou no beliche do marinheiro; e por isso recommenda- mos a todos a sua leitura. Murça. Basílio C. de A. Sampaio. SYNOPSE CHRONOLOGICA ^ Synopse chronologica das principaes de- liberações e providencias do conselho da faculdade de philosophia sobre o estudo de botânica e agricultura na Universidade de Coimbra, desde 1774 até 1872. 18Õ5 — Em 29 de janeiro decidiu-se que se principiasse desde logo a construcção da estufa e abrigadouro do jardim botânico. Em 22 de fevereiro recebeu o conse- lho nova collecção de sementes da flora angolense, offerecida pelo snr. Welswitsch para o jardim botânico. Agradeceu-se nos termos convenientes esta nova oíferta do illustre viajante. Em 28 d' abril decidiu-se que fosse ado- ptado para compendio da cadeira de bo- tânica o «Cours elementaire» de Adrien de Jussieu. Em 19 de maio decidiu-se que não fos- sem riscados das pautas dos livros da fa- culdade os compêndios nacionaes, sem au- diência dos seus auctores. Em 26 de julho fez-se a visita ao jar- 1 Vid. J. H, P., Tol. V, pag. 146. dim botânico e encontraram-se realisados importantes melhoramentos, e já conclui- dos os alicerces para as novas estufas. 1856 — Em 7 de fevereiro foi sciente o conselho de um importante donativo feito ao jardim botânico pelo Marquez de Sou- sa Holstein, constando de um magnifico exemplar da Araucária excelsa (a) e de 78 espécies de outras plantas, do que se fez menção honrosa no livro das actas, e se dirigiram os convenientes agradecimen- tos. Em 18 de junho foi substituido o com- pendio da aula de agricultura pelo «Cours élémentairo d'Agriculture» por Girardim et Du-Bressil. Em conselho de 1 de julho foi aucto- risado o director do jardim botânico, para modificar o risco da estufa, construindo-se na parte central, em logar da casa da aula, um torreão para plantas de maiores di- mensões, e para construir a mesma estufa de ferro fundido. (a) Esta arvore fructificou este anno (1874) pela primeira vez. 184 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Em congregação do mesmo mez foram approvaclos os seguintes pontos para dis- sertação inaugural ao repetente António de Carvalho Coutinho de Vasconcellos : «Deve admittir-se a aclimação dos ve- getaes? Será vantajosa para a agricul- tura? Determinará modificações nos li- mites das regiões agrícolas ?» 1857 — Em 23 de março resolveu-so que se representasse ao governo para se crear uma cadeira de technologia, separando-se este ensino do de agricultura. Em 6 de junho foi presente ao conse- lho o risco da estufa, oíFerecido pelo snr. Dezerat, professor de desenho da escho- la polytechnica. Foi recebido com muito agrado este aprimorado trabalho, deci- dindo-se unanimemente que se fizesse men- ção honrosa d'e8ta offerta no livro das actas. Foi auctorisado o director do jar- dim botânico para consultar em Lisboa os homens d'arte mais competentes sobre o modo de realisar o mencionado projecto da construcção da estufa, informando-se dos preços por que os realisariam as dif- ferentes officinas. Em 18 do mesmo mez o director do jardim botânico deu parte ao conselho de que o Instituto industrial de Lisboa se compromettia a construir a estufa segun- do o risco já approvado, não sendo o pre- ço superior ao das outras fabricas ; e em 23 de julho foi o conselho informado de que estava definitivamente contractada esta obra na mesma officina com todas as seguranças e vantagens. Em 23 de dezembro decidiu-se que se representasse ao governo para ser man- dado a Coimbra um engenheiro para di- rigir a construcção da estufa e mais obras projectadas no jardim botânico. 1858 — Em conselho de 8 de janeiro ponderou-se que, tendo do se dar maior amplitude ao jardim botânico até o fron- tispicio do coUegio de íS. Bento, na con- formidade da nova planta approvada pelo conselho da faculdade, e sendo para isto necessário demolir as casas vermelhas; tendo egualmento de serem destruídas as casas que sorvem do aula do botânica e de arrecadação e classificação das semen- tes, por assim o exigir a construcção da nova estufa ; é chegado o caso previsto do uma das condicçSos da oscriptura de ar- rendamento d'aquelle coUegio, devendo cessar o arrendamento por sobrevir á fa- culdade de philosophia a necessidade de se appropriar da parte do dicto edifí- cio. Como porém o conselho entendesse que se podiam conciliar as novas necessida- des do estabelecimento do jardim botâ- nico com as conveniências do arrendatá- rio do collegio de S. Bento, encarregou uma commissão para combinar com este na cedência d'aquella parte do edifício, que fosse indispensável para supprir a falta das casas já mencionadas, e n'ella estabelecer a respectiva aula, casas de ar- recadação de sementes, officinas próprias, gabinete de observações, habitação para criados, etc; visto porém, que o arren- datário se recusasse formalmente a um accordo amigável, o conselho resolveu que se procedesse nos termos convenientes, re- presentando ao prelado da Universidade para, pelos meios legaes, ser compellido o arrendatário do Collegio de S. Bento, ou a ceder á faculdade de Philosophia parte do edifício que faz frente para o jardim botânico, ou a despejar todo o edi- fício na conformidade das condicções ex- pressamente formuladas na escriptura de arrendamento. Em 13 do mesmo mez foi unanimente approvado que se contrahisse um emprés- timo para a construcção da estufa e ou- tras obras do jardim botânico. 1859 — Em 3 de fevereiro foi auctorisa- do o director do jardim botânico para man- dar o jardineiro a Lisboa comprar e obter por troca as plantas mais importantes, para augmentar as coUecções da eschola. A 15 do mesmo mez foi presente uma collecção corpologica de 114 espécies ve- getaes, colhidas pelo dr. Welswitsch em Angola, e por elle offerecida para o jar- dim botânico. Foram votados os devidos louvores ao distincto naturalista. Em 1 de março foi lido um officio do dr. Mathias de Carvalho, datado de Pa- ris em 11 de fevereiro do corrente anno^ acompanhando um catalogo de sementes, publicado por Mr. Decaisne, e offerecido por seu auctor á Faculdade de Philoso- phia, e annunciando que o director do jardim das plantas de Paris vai offerecer ao jardim botânico da Universidade to- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 185 das as espécies qué possuir no seu esta- belecimento. Em 18 do mesmo mez foi lido um of- ficio do director do Instituto industrial de Lisboa, participando que as obras da estufa estavam preparadas para serem enviadas para Coimbra até c fim de maio. Em 28 de julho foi lida uma portaria do governo, com data de 7 de maio ul- timo, mandando desoccupar o edifício de S. Bento pelo actual arrendatário. Em 1 de outubro foi annunciado que já tinha chegado de Lisboa parte da es- tufa; e o director do jardim botânico pe- diu auctorisação, que lhe foi concedida, para mandar vir operários habilitados n'e8te género de trabalhos, para se en- carregarem da armação e collocação da mesma estufa. 1860 — Em 30 de março foi annuncia- da a remessa que o dr. Mathias de Car- valho fazia d'uma grande porção de se- mentes, promptificando-se a remetter as mais que lhe fossem indicadas. Em 6 de junho decidiu-se que para o anno lectivo próximo futuro fosse adop- tado para compendio de botânica o «Pre- cis de Botanique» de Richard em logar do de Jussieu. Em 27 de julho fez-se a vizita ao jar- dim botânico e o conselho viu com prazer que se havia começado o assentamento da nova estufa. 1861 — Em 20 de novembro o conse- lho approvou o seguinte texto em botâ- nica para a dissertação inaugural do re- petente Manoel Paulino de Oliveira: «Ha- verá um ou mais centros de creação vege- tal?» Em 7 de dezembro deliberou-se que a direcção e administração da cerca de S. Bento, annexa á cadeira de agricultura, ficassem d'ora avante a cargo do director do jardim botânico. 1862 — Em 25 de julho foi recebida com muito agrado a noticia de que esta- va contractada com grandes vantagens a construcção do resto da estufa do jardim botânico. 1863 — Em 11 de fevereiro assentou-se que se representasse ao governo, pedindo o auxilio de 6:000,í>000 reis para as obras da estufa, sem o que, só passados dez an- nos, se poderia concluir tão importante construcção. 1865 — Em 29 de julho leu-se e appro- vou-se uma representação ao governo, para contractar nos paizes extrangeiros um jar- dineiro hábil, para o serviço do jardim botânico. Em 31 do mesmo mez leu-se e appro- vou-se o relatório annual da faculdade, e foi auctorisada a compra de um calorifero para a estufa. 1866 — Em conselho de 1 de junho foi apresentado o contracto celebrado em Pa- ris com o jardineiro Edmond Goeze, para vir dirigir os trabalhos practicos do jar- dim botânico da Universidade. A acqui- sição d'este empregado foi devida princi- palmente aos cuidados e diligencias do snr. José do Canto. Foram votados unanimes agradecimentos a este cavalheiro por tão distincto serviço. Em 8 de julho deu parte o professor de botânica de que o snr. José do Canto, não satisfeito com o valioso serviço que tinha prestado á faculdade na procura e escolha de um jardineiro, tinha offerecido generosamente dos seus magnificos jar- dins da ilha de S. Miguel, todas as plantas que possam concorrer para enriquecer as collecções do jardim botânico de Coim- bra. O . conselho votou unanimemente os mais profundos agradecimentos ao snr. José do Canto. Em 28 do mesmo mez, ponderando-se a necessidade de conseguir do actual di- rector do collegio de S. Bento, a cedência das casas necessárias para o serviço do jardim botânico, foi auctorisado o director d'este estabelecimento para tractar da res- cisão do contracto de arrendamento, ar- bitrando-se a conveniente indemnisação. Foi auctorisada a viagem do jardineiro Edmond Groeze ás ilhas dos Açores, para se aproveitar o importante e generoso of- ferecimento do snr. José do Canto. Em 8 de setembro foi o conselho infor- mado das riquissimas collecções de plan- tas, trazidas pelo jardineiro da sua via- gem aos Açores durante as ferias. Cons- taram estas collecções do seguinte : 800 espécies de plantas, ofíerecidas pelo snr. José do Canto; 100 exemplares e 50 es- pécies, ofíerecidos pelo snr. António Bor- ges da Camará; numero igual, ofíerecido 186 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA pelo snr. José Jacome Correia; o outros tantos pelo snr. Ernesto do Canto. Tudo chegou em muito bom estado, em caixões e estufas de viagem, sendo todas as des- pezas feitas á custa dos dous primeiros cavalheiros. Estes donativos foram tão im- portantes, que foi calculado o seu valor em mais de 2:500:ji000 reis. O conselho unanimemente resolveu agradecer tão re- levantes serviços, e decidiu levar estes factos ao governo, para os devidos eíFei- tos. No mesmo dia foi presente e agrade- cida uma serie do publicações em inglez, do dr. Welwitsch, sobre a Flora da Africa. I)ecidiu-se que fosse publicada no Insti- tuto a relação das plantas vindas dos Aço- res, com as convenientes observações. Em 8 de novembro foi reconhecida a necessidade de estabelecer desde logo, na cerca de S. Bento, uma plantação de to- das as variedades de Videiras nacionaes, e das que fosse possivel conseguir do ex- trangeiro. Em 10 do mesmo mez deu-se conta de ter entrado no Jardim Botânico um grande numero de plantas, generosamente oífere- cidas por Mr. Decaisne, director do jar- dim das plantas de Pariz. O conselho di- rigiu ao sábio botânico francez plenos e unanimes votos de agradecimento. Em 21 de dezembro foi approvado o seguinte ponto para a dissertação inau- gural em agricultura, ao repetente Antó- nio d' Avellar Severino : « Será conveniente ao nosso paiz, a practica dos roteamentos, e o estabelecimento de colónias agrícolas. » 1^(37 — Em 6 de fevereiro leu-se uma portaria do governo, que louva e agrade- ce, nos termos mais lisongeiros, os valio- sos serviços, prestados pelos cavalheiros da ilha deS. Miguel, ao Jardim Botânico da Universidade. Em 13 de maio deu-se conta d'um novo presente de plantas, feito ao jardim botâ- nico pelos snrs. José ^Martinho Pereira Lucena Noronha e Faro, e Bento António Alves, ambos de Lisboa, assim como de novos serviços, prestados pelos cavalhei- ros da ilha de S. Miguel, já mencionados em outras actas. A todos se agradeceu em termos convenientes. Em 23 de maio foi o conselho infor- mado de um valioso presente, feito ao Jar- dim Botânico pelo snr. José Vicente Bar- bosa du Bocage, d'uma numerosa e rica collecção de Orchideas. Esta offerta foi re- cebida com profundo reconhecimento. Em 27 de julho fez-se a visita ao Jar- dim Botannico e encontraram-se concluí- dos os trabalhos da estufa grande e das pequenas destinadas aos trabalhos de re- producção. Em 29 do mesmo mez foi apresentado o inventario do Jardim Botannico, pelo qual se vê que n'este bello estabelecimento se acham hoje representadas a maior parte das famílias natui'ae3, sendo as mais nu- merosas as Leguminosas, Myrtaceas, Coní- feras, Lycopodiaceas, e outras. A collec- ção do jardim comprehende actualmente 127 familias, 833 géneros, e mais de 2:000 espécies. Os jardins de Pariz, S. Peters- burgo, Berlim, Kew, Hamburgo, e outros estão em boas relações com o de Coim- bra, enviando os seus catálogos de semen- tes. A bibliotheca do mesmo estabeleci- mento adquiriu nos últimos tempos obras e jornaes importantes. Tem-se obtido a multiplicação de muitas espécies de plan- tas, avultando os Chinchonos, Eucaly- ptus,Curcurhitacea, Coníferas, etc., achan- do-se o jardim em circumstancias de ceder muitos exemplares, que convenha acli- mar no continente ou nas possessões ul- tramarinas. Em 12 de novembro foi presente uma portaria do governo com data de 2 do corrente, mandando nomear uma commis- são administrativa do Jardim Botannico, que foi eleita por escrutínio secreto. Coimbra. J. A. Simões de Carvalho. (Continua). NELUMBIUM SPECIOSUM Esta magnitica planta aquática habita o t^gypto; os mares Caspio o Arai (46° N.); a Pérsia ; a índia, aonde cm Cashmire se encontra a uma altitude de ItíõO metros ; as aguas do Ganges ; a China ; o Japão ; o Amur (46° N.) e na Austrália tropical até 23° S. O encontrar-so esta planta em Ima, Po- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 187 kin e Astrachan é a prova sufficiente de nós a podermos naturalisar em diversos pontos do nosso paiz. O Nelumlmm spe- ciosum era já cultivado e venerado pelos antigos povos do Egypto sob o nome de Colocasia. r • • - Esta espécie de Nelumbium toi mtro- duzida na Europa por Joseph Banks em 1787 tendo-a trazido da índia para a In- glaterra e floresceu alli somente passados dez annos no jardim de Mr. Liptardt em Mile-End. No continente floresceu pela primeira vez em 1825 na Áustria no jar- dim de Bruck, junto ao Laytha, proprie- dade do conde de Harrach. Esta planta pertence á família dos Ne- lumhoneas — Endl. As suas folhas são emer- gentes, em forma ^q peita e concavas muito semilhantes a uma taça, d' um verde aci- zentado, esbranquiçadas, ou cor de rosa vivo conforme as variedades. As primei- ras folhas fluctuam á superfície da agua e sào planas ; o seu tamanho mede entre O'", 35 a O'", 80 de diâmetro e elevara-se um metro acima da superfície da agua. As suas flores são de ordinário d'um cor de rosa acarminado, variando ás vezes para purpura vivo ou branco puro, attingem a grandeza de 0,™20 a 0,"'25 e exhalam um aroma penetrante e delicioso. Sobre- pujam as folhas e assimilham-se muito na forma a uma flor da Dormideira (Papa- somnveriferun, Linn.) O receptáculo é tur- binado, troncado e seus fructos estão en- cerrados n'uma espécie d'alveolos, os quaes são de cor preta e de tamanho d'uma avelã. O Nelumhium speciosum póde-se repro- duzir pela devizão das rizomas ou por se- menteira. Diremos algumas palavras áceç- ca da sua cultura. As rizomas dividem-se 'nos mezes de março e abril e plantam-se em vazos grandes, que devem estar com- pletamente tapados no fando ou mandam- se fazer já sem buracos, com terra d'alu- ' vião (a melhor é aquella que se encontra nas margens dos rios, vulgarmente cha- mada nateiro) e que esteja desprovida completamente d'estrume animal, o vaso não se enche de terra, deixa-se fícar sem ella n'uma altura de O"", 15 a 0'"20 o qual é cheio de agua. O vazos assim arranja- dos coUocam-so n'um chassis convanien- temente preparado, o qual se devo con- servar com a vidraça fechada e expos- to ao sol de maneira que a agua ad- quira uma temperatura elevada 18 a 21° cent. e conservam-se alli até que a plan- ta tenha obtido um certo grau de desen- volvimento e a temperatura da agua ao ar livre tenha o minimo 20\ A agua de- ve-se renovar uma vez por semana nos chassis. Em as plantas tendo folhas que fluctuem á superfície da agua, é conve- niente abrir um pouco as vidraças dos chassis durante as horas de maior calor. Depois tiram-se as plantas do chassis e vão-se collocar no tanque ou lago^ que se tem destinado para ellas; mas em sitio que lhe dê o sol durante todo o dia e acabam- se de encher os vazos com terra. As flo- res abrem geralmente durante o mez d'a- gosto e ás vezes quando a estação lhe corre favorável em julho ;_^e para flores- cer é preciso a agua ter 25.° Logo que as folhas comecem a envelhe- cer cortam-se 0™,08 acima da terra e ti- ram-se as plantas do tanque ou lago e conservam-se durante a estação invemosa dentro d'uma estufa ou chassis que con- tenha algum calor, 6° a 8° cent., até á primavera seguinte em que se deve repe- tir o processo que acabamos de indicar. A superfície dos vazos cobre-se com mus- go e a terra deve conservar-se sempre húmida. Quando se queira reproduzir pela sementeira, é necessário semeal-a nos me- zes de março e abril em estufa quente ou em chassis que esteja convenientemente preparado para conter uma temperatura elevada. O grau de calor que é preciso para ella germinar é de 25"^ a 3Q^ cent. As sementes deitam-se em vazos ou terrinas, as quaes devem estar cobertas com uma altura de O™, 10 d'agua, alguns dias depois de nascidas as plantas trans- plantam-se para vazos e dasse-lhes o mes- mo tractamento que indicamos para as ri- zomas. A'í sementes do Nelumhium speciosum contém ]ior muito tempo a força germi- nativa; ha exemplos de ter germinado passados 12 annos, i-nas então levam mais tempo a nascer, isto é 10 dias, e emquanto que nova 3 a 4 dias. Esta planta requer para se desenvolver bem, agua funda. Na China, os rhizomos d'este Nelum' hium servem de alimento. 188 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Aconselhamos os nossos leitores a cul- tivarem esta planta entre as aquáticas uma das mais ornamentaes e é sem du- vida rival da Victoria regia Lind. No lago do jardim Botânico de Coimbra cul- tivou-se oste anno pela primeira vez. Ainda ha outras espécies do Nelum- hium, taes como Nelumhium Casjpiuvi Lisch., que habita o mar Caspico, e que alguns botânicos dão como variedade do Nelumhium speciosum. Nelumhium luteum Willd., indigena da Jamaica, Florida e Carolina. Nelumhium discolor Steud., e Nelumhium marginatum,. Steud., ambos oriundos da China. Muito mais poderíamos dizer sobre o Nelumhium speciosum, mas reservamos o assumpto para outra occasião. Coimbra. Adolpho Frederico Moller. KALMU LÁTIFOLIA Esta magnifica planta da America do norte ó sem duvida um dos arbustos mais bellos e encantadores, quando em abril e maio está coberto das suas graciosas flo- res em corymbos cor de rosa carminados, de forma elegantíssima. E' surprehendente em^^verdade na flo- rescência; as flores já abertas teem a for- ma de sino, as fechadas tem uma forma exquisitissima. Às flores abertas sào do côr de rosa mimosa, e as fechadas, côr de rosa viva. Umas e outras, sahindo do meio de linda folhagem verde claro, muito similhante á '.€%_, Fig. 35 — Kalmia latifolia — Desenhada no Horto Loureiro das Camellias, formam um contraste ma- ravilhoso. Ha outras variedades, porém esta é a mais bella. Esta encantadora planta dá-se em to- das as exposições, comtanto que a terra lho seja adequada. Dá-se admiravelmente em terra dos mattos, e se for barrenta ainda melhor. Nao quer terreno húmido, e vae per- feitamente onde floresçam as Azáleas e os Rhododendrons. Temos viato cxomplaros com mais de dous metros d'alto e o mesmo de cir- cumferencia; isto no Porto em casa do snr. Christiano Van-Zeller, onde a terra é leve e cOr de castanha, porém na sua quinta de Fiães (Avintes), aonde a terra é barrenta, tem exemplares com mais de três metros d'alto e mais de dous de cir- cumferencia. Também se encontram em Oliveira do Douro (Avintes) e Lavandei- ra magníficos exemplares, e em todos estes legares a terra é muito barrenta e pouco húmida. A sua roproducção é difficil entre nós, JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 189 porém temos bons exemplares a florescer, e os amadores não deixarão de possuir esta formosa planta, que tem uma qualidade que a avantaja a muitas outras. Quando se corta xnn ramo e se deposita n'uma jarra com agua, as flores conservam-se sempre vistosas por 15 ou 20 dias como cortadas de fresco. José Marques Loureiro. SiLYIA GENERIAEFLORA (INTERESSANTE PLANTA PARA SALA) Esta planta é um bello ornamento para os quartos e salas em março e abril, épo- ca em que costuma florir. A cultura aconselhada para as outras Solvias é a mais fácil supposto que esta possa crescer perfeitamente em pequenos vazos durante o verão. E' preciso não a deixar passar sede, por quanto n'este es- tado perde as folhas inferiores, o que tor- na a planta muito desgraciosa. Transplantadas as Solvias para vazos na occasião em que principiam a puchar. produzirão abundantes flores e por muito tempo. Nos dias quentes devem-se borrifar as folhas abundantemente; a meia luz que geralmente ha nos quartos é muito con- veniente a estas plantas. Com estes pequenos cuidados obter-se- hão lindíssimos exemplares de Sálvia ge- neriaejlai^a para dentro de casa. A. J. DE Oliveira e Silva. ALGUMAS PALAVRAS SOBRE A MOLÉSTIA DAS LARANJEIRAS Ha annos que as plantações das La- ranjeiras do meio dia da Europa tem sido atacadas por uma epidemia devas- tadora, que debalde se tem procurado de- bellar, posto que se tenham empregado remédios, que provaram apenas ser mais ou menos efficazes contra uma propagação mais extensa do mal. São as raizes que esta doença, ainda não designada por um nome scientifico, ataca de preferencia. Primeiramente são invadidas as radicu- las, mas depois a doença estende-se com rapidez a todas as raizes grossas e lenho- sas e produz em pouco tempo uma pu- trefacção fétida de todas as partes radi- caes da arvore. E' verdade que alguns observadores pretendem que a doença ca- minha de cima para baixo, isto é, que o tronco e suas partes são os primeiros ata- cados, fendendo-se a casca d'onde sae um liquido gordurento, de péssimo cheiro; mas até onde alcançam as nossas observações somos levados a affirmar que o foco do mal deve ser nas raizes, e que os phenomenos pathologicos que se manifestam no tronco são a consequência, a continuação da epi- demia. Tudo leva a crer que a doença teve a sua origem na Itália, e desde logo foram bem extensos os seus estragos. O gover- no italiano fez todos os esforços para a destruir ou pelo menos para a localisar e propôz um grande premio para a des- coberta da cura radical. Muitos indivi- dues, seduzidos pela elevada recompensa, submetteram as arvores doentes a uma multidão de experiências e alguns houve que se persuadiram ter descoberto um remédio efíicaz, mas a respectiva com- missão que devia dar o parecer na ma- téria, deixou desapontados a todos os in- ventores e chegou por fim á conclusão que não tinha cura a epidemia, a qual era simplesmente natural consequência da edade muito avançada de algumas das arvores e que o melhor meio seria arrancar todas as arvores velhas no si- tio onde o mal apparecesse e substi- tuil-as por plantas novas. Quer-nos pa- recer que, apezar de tudo, é demasiada- mente arriscado converter em regra ge- ral este conselho, primeiramente, porque muitas familias pobres que se nutrem dos seus laranjaes correriam o risco de per- der de repente a sua fortuna e em se- gundo logar porque é muito provável que esta doença, por luna cultura racional das plantas, seja, senão inteiramente debella- 190 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA da, pelo menos muito monos funesta nas suas consequências. Mr. Joseph Decaisne, professor do cul- tura no jardim das plantas de Pariz, ten- do-lhe sido enviadas raizes doentes d'uraa Laranjeira d'Hyères, exprime-se do se- guinte modo sobre a causa provável d'esta doença : « Estas arvores, dispostas n'um terre- no schistoso de pouca profundidade e por conseguinte em espécies de bacias, são ha mais de 50 annos constantemente re- gadas para evitar a demasiada seccura. Estas regas determinaram pouco e pou- co, pelas lavagens successivas, o empo- brecimento d'um solo de si já pobre. O único meio de acudir a esta ruina se- ria mudar o solo, operação impraticável. («Flore des Serres» 18Õ4-5Õ, pag. 39.) O professor Schultz Schulzenstein, cuja recente morte produziu uma grave lacu- na na sciencia, dirigiu-se, ás ilhas Balea- reas para alli estudar a doença, e era julho de 1870 dirigiu-nos uma carta a este res- peito. Daremos em poucas palavras o re- sumo das suas observações : a Na Itália, considerava-se ao princi- pio que esta doença tinha origem nas fo- lhas, que começavam a encrespar-se, a araarellecer, cahindo era seguida. As mi- nhas observações provam todavia que o mal se origina nas raizes, sendo a queda das folhas apenas uraa consequência na- tural. A putrefação das raizes é acompa- nhada de symptomas, que reconheço como causa da doença, a saber, por uma espé- cie de decorticação, e é mais que prová- vel que as excessivas quantidades de es- trume de vacca e de jumento, junto ao grande aquecimento do solo sejam os agen- tes principaes do estado putrefacto das raizes. Forçava-se a arvore, com estas fortes dozes de adubo, a florescer e fructi- car extraordinariamente, de modo que as arvores novas davam grande quantidade de fructo, mas depois de alguns annos estas arvores, assim tractadas, deram in- varialmente signaes do doença. O solo, apezar das boas regas, estava de tal mo- do infectado de podridão, que, para salvar pelo monos, parte das arvores, foi neces- sário substituil-o por outro. » Aqui temos a opinião de dous homens compotontes. Todavia, o quo acontece muitas vezes, differem completamente uma da outra. O que um procura ex- plicar pelo muito poucOj o outro tenta proval-o pelo demasiado. Em quanto que Mr. Decaisne propõe como ultimo recur- so substituir o S(')lo empobrecido por terra mais substanciosa; o botânico allemão sustenta pelo contrario que o solo putri- ficado pela abundância d'estruraes de- ve ser substituido por outro mais pobre em estimulantes. Mas como é que esta epidemia que tem percorrido todo o meio dia da Europa, apresentando por toda a parte os mesmos symptoraas, apparece em muitos laranjaes, cujo solo nem é de- masiadamente pobre nem demasiadamen- te substancioso e onde as arvores não es- tão expostas nem a regas frequentíssimas nem a um calor excessivo do sol, como temos tido repetidas vezes occasião de ob- servar? O que devemos concluir é que estes sábios seguiram caminho errado, considerando como causa da epidemia os symptomas externos, que eífectivamente não são se não as consequências. O mal em si é mais profundo e deve seguramente ser attribuido á presença d'um Cogumelo raicroscopico que se estabelece como ver- dadeiro parasita em grandes massas nas raizes das Laranjeiras e que não é de- pendente nem das qualidades do solo, nem d'outros agentes como a agua e o calórico. Esta conclusão parece ser justi- ficada se se submetterem a um exame profundo os syraptomas da doença, taes quaes se mostram, ha muitos annos, nas nossas plantas cultivadas. Pela cultura, os cereaes, as arvores fructiferas, as plan- tas bolbosas e tuberosas, como a cebola e a batata, e as plantas chamadas indus- triaes, tera-se de tal raodo multiplicado, misturado e hybridisado umas com as ou- tras, que já se não podem conhecer n'ellas alguns caracteres das espécies typos, o que, como se sabe, produz sempre, no reino animal e sobretudo no reino vege- tal, uma grande fraqueza nos órgãos vi- taes. Considorando-se, aléra d'isso, que todas estas plantas cultivadas, á excep- ção das espécies annuaes são quasi sem- pre reproduzidas pela via degenerica e o que 6 da mesma maneira o meio mais seguro para produzir fraqueza o muitas vozes doenças, niLo ó nada para admi- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 191 rar que as substancias alimentícias, taes como se tiram do reino vegetal, estejam sujeitas a uma catastrophe momentânea, que os nossos antepassados mal chegaram a presentir, e que a geração futura, se- gundo cremos, terá de soffrer muito me- nos pela introducção de espécies typos ou de espécies novas. A sciencia tem de- monstrado claramente que as epidemias, como febres typhoydes, febre amarella, o cholera, etc, tem origem em pequenos seres orgânicos, isto é em Cogumelos mi- croscópicos, que voam no ar, impercepti- veis á vista, exercendo a sua influencia primeiramente nas pessoas fracas ou já doentes, e os mesmos phenomenos vemos repetirem-se no reino vegetal, nas plantas por assim dizer domesticadas pelo ho- mem. Lisboa. Edmond Goeze. (Continua). DO SOLO QUE CONVÉM ÁS PRINCIPAES ESSÊNCIAS FLORESTAES QUE SE CULTIVAM NO PAIZ ^ Taxus hacata, Linn. — Teixo. — Seria uma soberba espécie para povoar os ter- renos calcareos, se não fosse a extrema morosidade do seu crescimento. Comquan- to seja aquelle solo o que lhe é mais afei- çoado também prospera em quasi todos os outros ainda que com menos vigor. Agra- dam-lhe todas as exposições e dá-se tanto nos terrenos de planicie como nos monta- nhosos; n'estes últimos encontra-se mui- tas vezes á altitude de 1:500 metros aci- ma do nivel do mar. Cupressus glauca^ Lam. — Cedro de Goa ou do Bussaco. — Dá-se nos solos si- liciosos, schistosos, basalticos, graniticos, grés e calcareo-argilosos, tanto seccos co- mo frescos. Nos valles aonde o terreno for profundo, fresco e houver algum húmus, adquire ás vezes proporções gigantescas. Parece que lhe agradam todas as exposi- ções e tanto se encontra nas montanhas de pouca elevação como nas planícies. Cupressus sempervirens, Linn. — Cy- preste. — Dá-se quasi nos mesmos terrenos do que a espécie antecedente comtanto que sejam profundos. Juntperus comviunis^ Linn. Zimbro — Agradam-lhe os terrenos siliciosos, calca- reos, e argilosos tanto seccos como húmi- dos; dá-se nos solos montanhosos. Juntperus phoenicia, Linn. — Agra- dam-lhe principalmente os terrenos sili- ciosos e busca de preferencia os moveis. Pinus marítima, Lam. — Pinheiro bra- vo.— Estima de preferencia os solos de natureza siliciosos, tanto seccos como hu- 1 Vide J. II. P., vol. V, pag. 166. midos e mesmo brejosos, desenvolvendo-se n'estes muitas vezes com extraordinária rapidez, mas então dá productos de in- ferior qualidade. E a melhor essência flo- restal que temos para povoar as nossas dunas. Dá-se também nos solos schistosos, graniticos, de grés e argilo siliciosos; mas n'estes adquire menores dimensões e os seus productos são mais medíocres. São- Ihe desfavoráveis todos os terrenos de com- posição calcarea e de argila compacta. Dá-se em todas as exposições e nas planí- cies e montanhas pouco elevadas. E-lhe muito prejudicial a derrama, processo que infelizmente está muito em pratica em quasi todo o paiz. Pinus pinea, Linn. — Pinheiro manso. — Agradam-lhe os terrenos siliciosos, grés' graniticos, schistosos e as areias litoraes. Da-se em todas as exposições e não pros- pera a altitudes superiores a 500 metros. Desenvolve-se pessimamente quando são cultivado muito basto. Pinus halepensis, Mill. — Pinheiro do Alepo ou de Jerusalém. — Prospera nos terrenos calcareos, argilosos, de lage e nos pobres e áridos. E' uma essência muito pre- ciosa; pois com ella podem-se arborisar aquelles terrenos aonde outras espécies não vingam; e além d'isso desenvolve-se com extraordinária rapidez. Dá-se em to- das as exposições e vive nas planícies e montanhas de pequena elevação. E arvo- re indígena da zona denominada — região das oliveiras. Coimbra. Adolpho F. Moller. 192 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA BREVES ÍNSTRUCÇÕES SOBRE A CULTURA DA BETERRABA DE ASSUCAR Variedades da beterraba de assucar — A heterraha (Beta rapa, Beta vulgaris rapacea) é uma planta bis-annual da fa- mília das Chenopoãeaceas, sobre tudo dis- tincta pela sua grossa raiz, que, é fusi- forme ou globulosa. Esta espécie tem produzido mais de vinte variedades, as quaes se podem di- vidir em beterrabas de assucar ou indus- triaeSf e em beterrabas de forragem. As beterrabas de assucar sSo as que nos devem aqui oceupar. As variedades mais importantes sao as seguintes : 1/ -á beterraba vermtlha, grossa ou be- terraba escarlate. — Esta variedade tem uma raiz comprida, cylindrica, regular, de cor vermelha escura ou derrochida, e em grande parte sabida da terra. As fo- lhas Scão de um vermelho fusco com pe- ciolos cor de sangue. Não é muito esti- mada. 2.* A beterraba branca, ou beterraba da Silesia. — Tem uma raiz fusiforme, re- gular, quasi completamente enterrada, ou mostrando apenas um pequeno collo ver- de; é de um branco amarellado exterior- mente, e tem uma massa muito branca e muito doce. E variedade mais estimada do que a primeira. 3.^^ A beterraba branca de collo cor de rosa. — Esta variedade, muito recommen- dada por Mathieu de Dombasle, tem uma raiz, um pouco mais pequena do que a da variedade precedenre, cor de rosa na parte superior. E a mais empregada na industria do assucar. 4.» A beterraba branca de Madge- bourg. — Tem uma raiz pequena, larga na parte superior, muito aguçada na parte inferior, muitas vezes ramificada, e, por isso, difficil de limpar. É variedade muito estimada na Prússia, onde a consideram mais doce do que todas as outras. .5.* A beterraba imperial de Knauer, de Grobers, que elle distingue pelos se- guintes caracteres : — folhas pouco desen- volvidas, as exteriores dispostas horison- talmente e as do centro erectas e um pouco encrespadas ; raiz branca com collo vordo, em forma do Cenoura, muito aguçada o completamente enterrada. Esta variedade, que é uma das mais ricas de assucar, é mais tardia; mas pa- rece ter a propriedade de se conservar mais tempo do que as outras. 6.* A beterraba de Vilmorin. — Tem o collo muito grosso, e as raizes geralmente irregulares e mal feitas. E variedade muito rica de assucar, mas difficil de se arrancar sem se ofifender. 7.* A beterraba conhecida no norte da França pelo nome de betterave boutoire, e que parece ser a beterraba da Silesia degenerada ou muito modificada. Uma parto da raiz apparece fora da terra. Esta beterraba dá geralmente menos 2 a 3 p. c. de assucar do que a beterraba branca do collo cor de rosa. Escolha do terreno para a cultura — Os terrenos mais favoráveis para a cul- tura da beterraba de assucar parecem ser os terrenos silico-argilosos e um pouco cal- cários, algum tanto húmidos, profundos e assentando sobre um sub-solo permeável. Nos terrenos seccos e fracos e nos que são áridos a beterraba toma pequeno desen- volvimento ; nos terrenos demasiado hú- midos ella adquire grande volume, mas contem muita agua e pouco assucar. E, todavia, para notar que, depois de mais de meio século de experiências, não ha ainda uma analyse exacta que caracte- rise uma boa terra de beterraba. O me- lhor e o mais fácil meio do apreciação que por ora temos debaixo d'e8te ponto de vista, é semear a beterraba e ver se ella vem bem ou mal, se é, ou não, rica de assucar. Preparação do terreno — Deve semear- se a beterraba n'um terreno bem prepa- rado e movei ; sendo para isso conveniente cortal-o profundamente com antecipação, e removel-o duas ou três vezes, deixan- do-o, nos intervallos, exposto ao ar, apla- nando-o depois, e semeando em quanto a terra está um pouco húmida. Estrumes e adubos — A producção da beterraba 6, dentro de certos limites, tanto JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 193 maior quanto mais rico é o terreno. Con- serva-se ou augmenta-se a fecundidade do solo por meio de estrumes, de residuos ve- getaes ou aguas de lavagem de estrumes. Não se devem empregar adubos salinos, taes como o nitrato de potassa, que tor- nam difficil a extracção do assucar e per- judicam a clarificação do xarope. Os es- trumes puros ou misturados com terra calcaria são os que se devem empregar de preferencia, sobretudo quando já estão meio-decompostos. O estrume grosso, es- pecialmente estando mal cortido, é incon- veniente; e, quando tenha de ser empre- gado, deve sel-o dous ou três mezes antes da sementeira. O estrume miúdo já de- composto e terroso, é o que se pode em- pregar em fevereiro ou março. O empre- go do guano não parece ter produzido muito bom resultado ; o adubo de Gr. Ville parece ter oíferecido mais vantagens. Os auctores não estão de accordo sobre a quantidade de estrume que deve ser empregada; mas pode dizer-se de uma maneira geral, que ella depende da ri- queza do solo e da quantidade de beter- raba que se espera recolher. A média de experiências feitas por diversos cultiva- dores levam a crer que quem espera re- colher 40:000 ou 50:000 kilogrammas de beterraba por hectare deve empregar n'esta superfície de 20:000 a 30:000 ki- logrammas de estrume. Mas note-se que, sendo o solo fértil, como é o solo da Ma- deira, não ha vantagem, segundo o que a experiência tem demonstrado, em adubar demasiado a terra, porque, com quanto a beterraba adquira n'e3tas circumstancias maior volume, diminuo n'ella a quanti- dade de assucar. Escolha e preparação da semente — A boa escolha da semente é um ponto im- portante. Convém empregar-se semente de uma só variedade, preferindo-se a que dá maior proporção de assucar. Na Aíle- manha téem-se formado associações para o aperfeiçoamento d'esta semente; e al- guns cultivadores allemães fornecem ao commercio semente que produz beterraba muito rica de assucar, na proporção de 17 p. c, de 20 p. c. e até de 24 p. c, dando suecos da densidade de 10°, 15°, e 20° do areometro de Baumé! A beterraba, sendo uma planta bis-an- nual, não dá semente senão no segundo e ultimo anno da sua vegetação : por isso é necessário que, na occasião da colheita, o cultivador reserve para esse fim um certo numero de plantas escolhidas. Em agosto ou setembro do segundo anno a se- mente está geralmente madura; mas o melhor é recolhel-a o mais tarde possivel. Escolhem-s6 os fructos maiores e mais maduros da parte media da espiga e dei- tam-se fora os outros. Cada planta pode dar cerca de 200 grammas de fructos sec- cos. A semente da beterraba conserva du- rante três ou quatro annos a faculdade de germinar; mas é sempre prudente não a deixar envelhecer, e, quando isso acon- teça, é bom, antes de a semear, tel-a de molho durante 24 horas em agua bem es- trumada ou em ourina, e conserval-a de- pois húmida dous ou três dias em cama- das delgadas de dez centimetros, em sa- cos, por exemplo. O mesmo se faz com grande vantagem á semente nova. Alguns cultivadores costumam hume- decer a semente com agua simples antes de a lançar á terra; e muitas vezes pro- longam esta operação durante 4 ou 5 dias, mergulhando depois a semente, du- rante algumas horas, em vinagre fraco. Ha quem recommende, para apressar a germinação da semente, fazel-a macerar durante alguns dias em agua morna, (meio que permitte ao mesmo tempo de separar a semente boa da má, porque esta sobe á superficie do liquido), enterrando-a de- pois ainda húmida, pulverisada de gesso, cinza ou cal, em pó fino, para facilitar a manipulação. Diz-se também que a semente, sendo preparada com nitrato de potassa na oc- casião de ser lançada á terra, tem uma evolução rápida e dá planta vigorosa ; re- sultado que parece ter sido egualmente obtido pondo-se a semente de molho em agua acidulada com um centessimo de acido azotico. Tempo da sementeira — A beterraba deve ser semeada depois de passado o maior frio do inverno. Em geral, nos pai- zes temperados, faz-se a sementeira em fevereiro e março, e, quando muito, até o principio d'abril, não devendo fazer-se mais tarde para que as plantas possam 194 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA tlesenvolver-se sufficientemente antes dos grandes calores do estio : nos paizes frios oUa faz-se desde meado de março até mea- do de maio. Convém que, na occasião de semear, a temperatura do ar nào seja, termo médio, inferior a 10° C, que a terra se ache pouco húmida e que esteja um bello dia. Parece que a semente que é lançada á terra mais cedo dá beterraba maior e mais rica de assucar, acontecen- do o contrario quando a sementeira é feita demasiado tarde. Maneira de semear — Póde-se semear a beterraba no logar mesmo onde esta plan- ta deve percorrer todas as phases da sua evolução, ou em viveiro. No primeiro caso a semente pode ser espalhada a lanço ou distribuida em li- nhas ou em regos; mas o primeiro d'estes dous processos tem sido geralmente aban- donado por nào dar resultado satisfactorio. A distancia entre as linhas ou regos de sementeira da beterraba de assucar deve ser um pouco maior ou menor, segundo que o solo for mais ou menos fértil, ou se empregar maior ou menor quantidade de adubo, e segundo que o terreno semeado poder receber durante o verão maior ou menor quantidade de agua ; não devendo, todavia, exceder 0'",40 a 0'",50. As plan- tas de cada rego devem ficar distantes umas das outras de 0'",30 a 0"',40. A se- mente deve ser enterrada na profundida- de de 0'",02, 0,'"03 ou O, "^04, segundo a maior ou menor consistência do solo. Quando se tem de semear uma grande extensão de terreno, o melhor é servir-se de um sementeiro, por meio do qual se podem semear, termo médio, 3 hectares por dia. Nas pequenas culturas, o meio mais geralmente seguido, consiste em tra- çar ao cordel linhas ou regos parallelos e egualmente espaçados, nos quacs as se- mentes são dispostas por mulheres ou ra- pazes que as vão cobrindo por meio de um pausinho. Alguns cultivadores recommendam a sementeira em viveiro ; mas esta não pa- reço ofFcrecer tantas vantagens, porque a transplantação atraza o desenvolvimento da planta. Quantidade de semente que se deve em- pregar —(guando so semeia a beterraba no logar mesmo onde oUa tom do chegar ao seu completo desenvolvimento e em linha ou rego, é preciso empregar 5 a C kilo- gi'ammas por hectare. Para semear em viveiro são necessários cerca de 80 kilo- grammas para um hectare. Convém notar que um kilogramma de semente representa quatro litros, pouco mais ou menos, contendo perto de 48:000 sementes, e que, por consequência, os 5 ou 6 kilogrammas de semente que se semeiam sobre um hectare representam 240:000 a 250:000 sementes, ou cinco vezes, pelo menos, o numero de plantas que podem prosperar sobre tal extensão. Modo de tractar a Beterraba — A beter- raba precisa de ser sachada três vezes. A primeira quando as plantas teem apenas as suas duas primeiras folhas ; devendo pro- ceder-se a essa operação por um tempo secco, e fazel-a com a maior attenção. Para evitar de agravar as plantas que ainda estão tão tenras, contentam-se, em geral, os cultivadores de tomar mais leve a terra no intervallo das linhas. A segunda vez deve ser quando as be- terrabas teem já três ou quatro folhas bem desenvolvidas e as hervas más começam a invadir o solo, o que tem logar três ou quatro semanas depois da primeira sacha. A terceira vez, finalmente, tem logar em julho ou agosto, antes que as folhas te- nham coberto em grande parte a superfí- cie do solo. Quando as plantas estão muito juntas nas linhas, arrancara-se algumas, a fim de deixar entre as que ficam um espaço, se- gundo as variedades, de 25, 30 ou 40 cen- timetros. Deve-se começar esta operação logo que a beterraba tem três ou quatro fo- lhas. A mesma semente pode dar origem a mais de uma planta ; mas convém não deixar senão um só pé para cada semen- te. Em quanto as plantas estão tenras cortam-se com a unha logo por cima do collo. Onde houver rallos e faltas, sup- prcm-se. Podem-se tirar, sem inconveniente, as folhas da htttrraha que mudaram de côr e começam a amarellecer e a murchar, bera como as da base quando a vegeta- ção se tornou já menos activa; mas não se devem nunca tirar folhas verdes á be- terraba, senão quinze dias antes de se arrancarem as raizos. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 195 Antigamente julgava-se que as folhas da heterraha eram uma excellente forra- gem ; e esta planta era quasi unicamente cultivada para se aproveitarem as folhas para este fim. Hoje está reconhecido que estas folhas constituem uma má alimen- tação para os animaes e que, dadas sós, são demasiado purgativas, e o animal não assimila as matérias azotadas que ellas contéem. Mas as folhas da heterrahaj se não podem ser consideradas como um bom alimento, fornecem á terra um magnifico estrume, pois conteem, a pezo egual, qua- tro vezes mais azote do que as raizes. Nem se julgue que, pelo facto de não servirem as folhas da heterraba para ali- mento dos animaes, não fornece todavia, esta planta uma óptima alimentação para elles ; pois é certo que, depois de extra- hido o sueco da raiz fica uma massa que constituo um alimento de grande valor nutritivo, muito appetecido pelos animaes e que se vende sempre por bom preço nos paizes onde ha fabricas de assucar de he- tevrciba. Colheita — A heierrdba chega ao seu completo desenvolvimento em agosto, se- tembro ou outubro. Não ha, porém, in- conveniente em conserval-a na terra em quanto a temperatura exterior não íôr in- í erior a 10.° C; mas deve ser arrancada antes das grandes chuvas, e nunca com chuva, o que dá grande prejuizo. Em ge- ral arranca-se mais cedo a 'beterraba quan- do o terreno é argiloso e húmido, e mais tarde quando elle é secco e leve. Mas, o que, em todo o caso, é necessário, é que haja o maior cuidado em se não ferir a raiz no acto de a arrancar. Quando se quer conservar a raiz da heteraba durante algum tempo é conve- niente cortar-lhe o collo de modo que a secção fique egual e regular, havendo todo o cuidado em não a oftender ; quando ella vae immediatamente para a fa;brica bas- ta separar as folhas por meio de torsão. A secção do collo deve ser perpendicular ao eixo da raiz, e esta operação deve ser feita com bom tempo. E' preciso também desembaraçar logo a beterraba da terra que lhe abhere e das pequenas raizes; o que se faz com as cos- tas de uma faca de pau ou de uma fouce, e não batendo com as beterrabas umas contra as outras, o que as oftenderia. Convém, logo depois, transportar a. be- terraba para o logar onde ella tem de ser conservada, e, em quanto isto se não faz, reunil-a em montes e cobril-a com folhas e terra, a fim de a subtrahir á acção do ar que a seccaria e a enrugaria, o que difficultaria a sua conservação. Conservação da raiz da beterraba — Nos paizes frios, em quanto a temperatura se conserva a baixo do zero do thermometro centigrado, a beterraba conserva-se indi- finidamente. Se, porém, a temperatura sobe, se se eleva a 12° ou a 15° C., sobre tudo estando o tempo húmido, a beterra- ba altera-se com a maior facilidade. No nosso clima, onde a temperatura se conserva sempre acima de zero, mesmo durante os maiores frios, a conservação prolongada da beterraba fora da terra, mesmo reunida em montes pouco espes- sos, cobertos de folhas ou de algum ou- tro corpo protector, e dispostos em logar fresco e arejado, é muito difficil. Ella po- derá, comtudo, conservar-se sem altera- ção o tempo sufficiente para ser transpor- tada para as fabricas. Inimigos — A beterraba tem inimigos principalmente entre os insectos, que é necessário conhecer e procurar destruir ; mas não cabe nos curtos limites d'estas instrucções dar a este respeito os necessá- rios esclarecimentos. Funchal. Dr. Joao da Camara Leme. CHRONICA HORTICOLO-AGRICOLA — o Jardim Botânico de Coimbra aca- ba do ser mimoseado com um riquissimo presente de Orchideas, constante de 13G espécies todas classificadas. N'este nume- ro vera incluídas 18 espécies terrestres. Esta collecção foi enviada do Brazil, — As noticias que recebemos de Cima- Corgo são bem tristes, calculando-se na generalidade a producção entre um quar- to ou metade a menos do anno passado. Na Beira dizem-nos que a colheita é re- gular. 196 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA — Temos em nosso poder já ha tempos uma poesia que nos enviou o nosso colla- borador D. Juan Texidor y Cos e de que é auctor D. José de Viera y Clavijo, poe- ta do principio d'este século. Esta poesia é extrahida do «Librito de la doctrina Ru- ral», edição de 1807 e hoje muito rara. O poeta desenhou conforme pôde o qua- dro alegre das vindimas e que os leitores teem agora, como nós, occasião de apre- ciar. Eil-o : LA VENDIMIA Al Bon do jarras, onbas y toneles Setiembre nos anuncia la Yendimia ; Y á este aviso (que gozo !) las falanges De jomaleroB, con feliz oodioia, Todos alegres, ofioiosos todos, Armados de sus cestas y cuchillas, Con el aire marcial que infunde Baco Marchan ai campo apenas es de dia. Ya desoubren el plácido oollado, Sus valias, sus zarzales y sus pitas, Ya montan á la brecha y victoriosos. No dan ouartel á la sitiada viiia : Caen los racimos de oro por mil partes De las tortuosas sepas mal heridas, Y los vendimiadores, coronados De las hojas verdoSas y blanquizcas Manchados con la sangre do las uvas Bajan corriendo por la gran colina, Agobiados dei peso dei canasto En que, con vanidad, las traen cautivas, Llegan ai puesto en donde los espera El lagar insaciable, y á porfia Van hacinando dentro de su parque Todo el despojo de la presa opima Los Atletas entre ellos mas robustos Se desnudan, emprenden la fatiga Y ai compas de los pies y dei aliento Estrujan el esquilmo, y lo repizan. Salta el noble licor, corre, se mezcla Con el sudor de los que lo liquidan Y el orújo, ai gemir bajo la prensa, Acaba de entregar cuanto tenia. Postrado está a tus plantas ese Mosto, O' Viiiador dichoso, pêro mira, Que en poder es mas terrible ahora, Pues le da fuerzas su derrota misma : Por mas que lo aprisiones en las cubas. Por mas que lo sujetes en las hidrias El se subleva, hierve muy furioso Arroja espuma, efectos de sus iras, Y si no te precaves, á su lado Puedo matarte el aire que respira... Mas no te asustes, no : tu muy bien sabes Que el colérico ardor, que se sucita En pechos generosos, poço dura Y su bondad se muestra marqnisa Cesó la turbacion ; ya es vino nuevo; Aoudid bebedores : que noticia ! Acudid a probar vuestras bodegas Y oxaminad, on tazas cristalinas, Su color, sn fragancia, e su limpeza, Sin volver otra vez á las barricas. — Nos principios do mez passado, re- cebemos sob a opigraphe de «Perspectiva agrícola de 1874», o que em seguida se vae lêr: Circumstancias ponderosas actuaram para que 0 anno de 1874 marque na historia agrícola do nos- so paiz uma época bem triste e desgraçada. As condições anormaes da falta de chuvas no inverno passado, e os ventos seccos, que predomi- naram, foram a causa da gravíssima falta das aguas, que produziram escassez da alimentação verde dos gados, e pobreza dos estrumes, sendo por esta razão as sementeiras feitas em péssimas condições. Nos mezes de abril e maio houveram muitos dias de sol ardente impróprios d'eBte tempo, que forçaram a vegetação das plantas de forma que apresentavam magnifico e promettedor aspecto, porém os frios de junho, e as quasi constantes né- voas húmidas vieram aniquilar as lisongeiras es- peranças dos agricultores, causando enormes pre- juízos, por virem na época em que costumam flo- rir 08 cachos, e limpar a flor das "Oliveiras." Os mezes de julho e agosto com os seus excessivos calores e constantes ventos seccos e ardentes, vie. ram fazer o triste epilogo do presente anno. Penalisa vér os campos, que foram sementados de "Milho" e que deixaram de ser regados por fal- ta da agua que costumavam ter nos outros annos; o aspecto que apresentam causa sincera dôr, por vôr tudo secco e requeimado pelo africano sol, e falta d' agua para as regas, seocando nascentes, que aos mais velhos nâo lembra terem desapparecido. Nos terrenos leves e siliciosos nào chegaram a gradar os "Milhos", e nos mais fortes e fundos que nào fo- ram regados a producção ó um terço da que costu- ma haver em um anno regular, e mesmo nos cam- pos que tem abundância d'agua a produccào é me- nor que nos annos regulares. Os "Trigos e "Cen- teios" apresentaram-se magníficos em maio, porém os frios e chuvas de junho destruíram as justifica- dasesperanças de boa producção, que nutriam os agricultores. São verdadeiros os antigos prover- bios^que por aqui repetem os lavradores — "que a chuva do junho ó mordedela de víbora, e a chuva do S. João tira o vinho, e não dá pão." 1 Pode-se calcular que a producção cerealifioa 'd'este anno ó talvez metade d'um anno regular. As vinhas tem sofiFrido muito com os grandes calores e ventos do julho e agosto, e muito prin- cipalmente aquellas que se acham expostas ao norte e poente, e que estão plantadas em terrenos leves. A má rebentação causada pelas rápidas al- terações atmosphericas, os frios e chuvas do junho que foram causa da péssima infarnação ou desavi. nh^ dos cachos, e depois os excessivos calores e continuados ventos ardentíssimos que houve nos mencionados mezes atrophiaram os cachos, e mur- charam a vegetação por tal forma, que a maior parte Aa folhagem tem cabido secca, e muitas "Vi- des" nâo poderam resistir á força do sol abrazador que as flagellava. Vi ha poucos dias vinhas no bai- xo Corgo, que muito me penalisou o seu triste as- pecto. Consta-me por vários amigos a quem dou todo o credito, que em cima Corgo também a secca tem causado gravíssimos prejuízos, sendo necessário proccdor-so do, prompto á vindima do "bastardo" "malvazia" e "musoatel", que sendo uvas delica- das e finas o sol as ia reduzindo a passas. As vinhas dos terrenos fundos e frescos estão em boas condições de magnifica vegetação, e per- feito doseuTolvimento dos cachos, e nas mesmas JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 197 oiroumstanoias estão as "Vides", que orlam os campos, qne foram regados como se aoham em muitas quintas à'este concelho, principalmente nas freguezias de Barro, S. João e S. Martinho de Mou- ros, apresentando magnificas uvaa, que hão de pro- duzir excellentes vinhos brancos. O "Phylloxera", terrível inimigo, qne ameaça destruir a nossa principal riqueza agrícola, feliz- mente ainda o não encontrei nem por estes sitios, nem mesmo nas minhas quintas sitas nos conce- lhos do Peso da Regoa, Mezãofrio, e Baião ; é cer- to, que muitas "Vides" tem seccado, mas a causa é sobejamente conhecida ; eu tenho examinado com a maior attençào as raizes das "Vides" seccas, po- rem em nenhuma encontrei signaes evidentes do "Phylloxera." Eis aqui quanto posso actualmente aíRrmar das circumstancias agrícolas do presente anno. Casa da Soenga, 3 de setembro de 1874, JOAQUIM DE CAKVALHO AZEVEDO MELLO E FARO. — Ha dias foi-nos remettido o «Rela- tório apresentado á Junta Geral do Dis- tricto de Coimbra na sessão ordinária de 1874» pelo governador civil, o snr. con- selheiro António de Gouveia Osório, vis- conde de Villa-Mendo o d'ene vamos trans- crever o que concerne á arborisação d'a- quelle districto, convencidos de que será lido com interesse: Um dos assumptos que deve merecer a mais séria attençào da parte dos poderes públicos é a arborisação. E' inútil fazer considerações sobre a conve- niência e vantagens — sobre a necessidade mes- mo— da sementeira e plantio de arvoredo, por- que ningnem contesta isso, e geralmente se r'e- conhece que é urgente explorar esta grande fon- te de receita, e ao mesmo tempo que é indis- pensável obstar, por meio da arborisação, á in vasào das areias do littoral, e aos estragos de toda a espécie, e cada vez mais sensíveis, que resultam da falta de arvoredo nas serras e cu- miadas. Nem o estado, nem os districtos, nem os mu- nicipios, téem empregado tantos esforços quan- tos eram precisos para dar á arborisação o des- envolvimento que ella podia ter, e que por to- das as considerações convinha que tivesse, e to- davia seriam bem empregados todos os sacrifi- cios que se fizessem, porque se attenderia a uma grande necessidade publica, e se aproveitariam os elementos d'uma importante riqueza, E' o districto de Coimbra um d'aquelles, cm que é urgente e da máxima conveniência dar impulso á arborisação, porque ha e.xtensissimos tractos de terreno que só para ella se podem aproveitar, e porque do que se tem feito é pou- co, 6 muito o que resta a fazer. Temos no districto uma extensão de costa, que não tem menos de 50 kilometros, desde o logar das Casas da Barra ao N, de Mira até ao Rego da Leirosa, Da extremidade N. até á Murtinbeira e palheiros de Quiaios, na exten- são de 32 kilometros, são tudo areaes que podem ser arborisados, e egualmente o podem ser os que se estendem desde o Cabedello da Figuei- ra até o Eego da Leirosa, com o comprimento de 9 kilometros. A extençâo da superfície de todos estes areaes não se pode calcular em menos de 1:800 hecta- res, e todavia nada ha feito relativamente á sua arborisação ! ! Pelo que respeita ás terras do interior, bas- ta vêr a carta junta ao relatório acerca da ar • borisaçâo geral do paiz, para se conhecer e ava- liar a grandíssima extensão de solo inculto em serras, collinas e cumiadas, que poderia apro- veitar-se para a arboiisação. Algumas camarás téem-se occupado d'e3te assumpto e alguma cousa técm feito. A de Coimbra deu um grande desenvolvi- mento aos viveiros de arvores, e fez plantações em grande numei'0. Na serra da Louzã tem-se feito muitas se- menteiras, e fui informado de que se progride n'ellas. Em Montemor e Cantanhede também se téem feito plantações. Do que porém se não tem tractado é das se- menteiras em larga escala nas charnecas e ser- ras incultas, e é d'is80 principalmente que de- ve tractar-se. Merece especial menção, pelos trabalhos de arborisação e pelo impulso que lhe tem dado, a Direcção das Obras do Mondego. Por uma nota que ella me forneceu, se conhece que as plan- tações feitas nas mattas do Mondego, camalhões e areaes, téem sido as seguintes : Salgueiros Arvores diversas Desde Julho de 1866 até o fim do an- no económico de 1869-1870. . . . 1.406:176 145:072 Anno económico de 1870-1871, , . 276:829 10:267 Anno económico de ' 1871-1872. . . . 223:611 12:648 Anno económico de 1872-1878. . . . 608:313 29:396 Total. . . . 2.514:929 197:383 O assumpto é importante e merece que lhe dediqueis toda a vossa attenção. Providenciae emquanto a elle, que fareis um bom serviço á causa publica e ao districto ; e se o julgardes conveniente incluio-o na vossa consulta, que bem digno é de ser especialmente mencionado. — O estudo da natureza revela de dia para dia curiosissimos phenomenos quo en- chem de assombro o espirito que os ana- lysa, O conhecimento que se vae adqui- rindo da maneira de ser dos diversos cor- pos que povoam a terra modificará pro- fundamente dentro em breve a corrente secular das tradições. Nada ha que mais variadamente se apresente do que a vida. Este phenome- no simplicíssimo e ao mesmo tempo infi- nito nas suas manifestações tem sido o alvo de todas as grandes intelligencias. Tudo o que existe vive, no systema d'a- 198 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA quelles que generalisam á matoria as fa- culdades, que, segundo certos pliilosophos, pertencem unicamente aos seres pensan- tes, dotados da actividade triplico da al- ma. Será por ventura indestructivel a di- visão geralmente admittida entre corpos orgânicos e inorgânicos ? Não se desco- brirá uma vida rudimentar no mineral? Não so aplainará um dia o limite que existe entre a physiologia e a chimica ? As divisões artiíiciaos entro os três rei- nos vão soffrendo de momento para mo- mento alterações sensíveis. Quanto mais attentamente se observa, tantas mais pro- priedades se descobrem, tantos mais ca- racteres novos se revelam. As revoluções na sciencia são mais fre- quentes do que vulgarmente se imagina. Os systemas e as theorias succedem-se com rapidez e por vezes, de todo um edi- fício scientifico construído com a mais ap- parente solidez, apenas se aproveita uma pedra para o novo edifício. O facto estudado por Darwin e revela- do ultimamente pelo dr. Hooker á British Association a respeito dos hábitos de cer- tas plantas carnívoras vera aproximar muito de perto as funcções das plantas e dos animaes. Depois de ter exposto á assembleia as experiências de Darwin, o dr. Hooker apresentou um exemplar de Dionoea, cujas folhas, espandindo-se, se fechavam imme- diatamente sobre si logo que apanhavam qualquer mosca. Procedeu-se ao exame do phenomeno e verifícou-se que a mosca se tinha dissolvido n'um fluido digestivo, exactamente similhante ao sueco gástrico. Assim que a mosca fícou dissolvida, a fo- lha tornou a desenrolar-se para surprc- hender nova presa. Lançou-se n'uma folha uma pouca de carne; a folha fechou-se e só se tornou a abrir depois de ter devoi'ado o alimento. Com o queijo succodou uma cousa curio- sa ; não gostavam nada d'elle, o, se o deixavam estar, as folhas morriam. Foram apresentadas ainda outras plan- tas carnívoras, explicando-se os moios de que ellas se serviam para apanhar a pre- sa, que passasse no seu caminho. Collocaram-se também pequenas por- ções do mineraos nas folhas que apanha- vam insectos, mas não deram signaes do contracção. Fechar am-se, enganadas tal- vez, sobre um pedacinlio de gesso, mas abriram-se logo para o deixarem cahir. E' geral o principio de que todos os seres animados tem ura laço coraraum de união n'uma substancia que contém em si todos os rudimentos do structura. Essa substancia é o protoplasraa. Uma das suas mais notáveis propriedades é a tendência a contrahir-se e em todos os organismos as partículas do protoplasraa estão de tal modo dispostos que obram concertadamen- te. Produzem effeitos cumulativos, que são bem manifestos nos resultados. Simi- lhante manifestação encontrou-se na con- tracção dos músculos e é possível que seja a que existe na contracção da folha da Dionoea. Todos os estudiosos de natureza vege- tal, fícaram admirados, quando o dr. San- derson disse que varias experiências ten- tadas por elle a instigações de Mr. Dar win provavam que as folhas de Dioiícea, quando se contrahem, produzem effeitos idênticos aos da contracção dos músculos. Não só os phenomenos da digestão, n'esta maravilhosa planta, se parecem com os que se dão nos animaes, mas também existe a mesma identidade nos phenome- nos da contractibilidade. Esta noticia a respeito das plantas car- nívoras colhemol-a n'um resumo do «Dai- ly Telegraph» e sentimos não termos en- contrado mais demorados promenores so- bre a maneira como se produzia a absor- pção dos alimentos na Dioncea e como apparecia nas folhas o liquido similhante ao sueco gástrico. A sciencia ha de enca- minhar para este ponto as suas observa- ções, mas desde já se pôde asseverar que a physiologia geral, vegetal e animal, depois d'este interessantissimo phenome- no, deve progredir admiravelmente na descoberta da grande e mysteriosa força que se chama vida. — Os leitores devem estar recordados de havermos dito ha talvez quatro ou cin- co mezes que o nosso coUaborador, o snr. Augusto Luzo da Silva, andando nas suas pesquizas botânicas para os lados de Fan- zeres, dera uma fatal queda, da qual re- sultara quebrar uma perna. Hoje congratulamo-nos e todas as pes- soas que estimam o intelligente natura- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 199 lista portuense se elevem congratular. O snr. Augusto Luzo, depois d'um doloroso curativo, logrou alcançar quasi o seu es- tado normal e, apezar das horas de mor- tificação porque passou, achamol-o outra vez disposto a proseguir os seus traba- lhos scientificos. Contaram-nos um facto que se deu com o snr. Luzo, que nos veio provar o quan- to vale a resignação. O snr. Augusto Luzo é um d'estes caracteres nobres, grandes, mas frios e fleugmaticos, que en- cara as cousas pelo seu justo valor. Estava no leito, enfraquecido pela grande perda de sangue originada pela fractura, sem comtudo perder o uso da razão, sem quasi nunca perder a serenidade. Ao terceiro ou quarto dia achou-se peior e um algebrista, cujo nome ignoramos, sendo consultado pelo doente, respondeu-lhe com estúpida selvageria : «É verdade, d'aqui para a co- va não lhe falta muito ; e o snr. ha de sentir a approximação da morte. Quando a sentir mande parte aos seus parentes. » Isto parece-nos que bastaria p^r-a fa- zer succumbir um homem quo estivesse no goso perfeito da sua saúde e ao snr. Luzo valeu-lhe a sua elevada philoso- phia para resistir á doença e a tão profun- das impressões moraes. Este proceder recorda-nos o que se conta d'um medico que sendo chamado para observar o estado d'uma sua doente, lhe disse: «Oh I V. Exc* não pôde viver muito. Tem exactamente a mesma doença que fulana de tal que está para morrer. » Seria caso para se dizer: «escaparia da moléstia, se não morresse da cura», mas chama-se a isto um medico sinceramente franco, para não se lhe dar outro nome. — As sociedades novas são por na- tureza essencialmente trabalhadoras. A America, esse continente de maravilhosa opulência, está assistindo ao grandioso es- pectáculo da formação das grandes nacio- nalidades. Três linguas, o portuguez, o hespanhol e o inglez, e duas raças são as que dominam quasi unicamente. A pouca variedade de idiomas deve contribuir po- derosamente para a harmoniosa propa- ganda da civilisação no Novo Mundo. As republicas hespanholas, apesar de se terem diacerado em cruentas lucta s civis, caminhlam corajosamente na estrada do progresso e fazem todos os esforços para adquirirem uma posição brilhante. Agora temos nós deante dos olhos um livro que nos foi obsequiosamente remet- tido e que demonstra quanto é a exhube- rancia de vida d'aquelles novos paizes, a quem a natureza vegetal, sempre luxu- riante, deve servir de estimulo. O livro a que nos referimos é escripto na lingua franceza e foi destinado a ser distribuído na recente Exposição Univer- sal de Vienna. O seu titulo é o seguinte : «La Republique Orientale de TUruguay à TExposition de Vienne», e é dedicado á Associação Rural do Uruguay. O seu auctor chama-se Mr. Adolphe Vaillant. Este livro é um bello e curioso reposi- tório de noticias. Por elle se terá um co- nhecimento exacto do estado florescente não só de Montevideu, como de toda a re- publica do Uruguay, com relação ao com- mercio, industria, instrucção, policia, etc. Agradecendo tão primorosa ofFerta, sau- damos a prosperidade das nações ameri- canas oriundas da raça ibérica e dese- jamos ardentemente que essa prosperidade não encontre obstáculos no seu dilatado caminho. — De Murça escrevia-nos ha dias o snr. dr. Basilio Sampaio. N'este anno passado plantaram-se n'e9te conce- lho mais de trezentos mil bacellos e talvez só pe- gasse a sexta parte por causa da sêoca :pe.rdeu- se inutilmente muito tempo e muito trabalho. Choveu aqui ha dias muito de mansinho ; foi pouca a agua, mas beneficiou bastante os agri- cultores, a quem animou a começarem já as se- menteiras do inverno, principalmente as de ce- vada, e nabaes. Os olivedos por estes sítios apresentam um triste aspecto : as poucas drupas que tinham, tem cabido com a sêcca : a safra ha de ser es- cacissima. A pipa de vinho tem corrido a 22|500 reis e o almude d'azeite a 6p000 reis; o alqueire de trigo a 550 reis e o de centeio a 440 reis. — D 'um excellente livro temos hoje a dar noticia n'esta Chronica e sentimos não ter ha mais tempo saldado esta divida de gratidão para com o seu auctor, que nos quiz mimosear com a sua obra. É esta a «Flora Farmacêutica de Espa- na y Portugal» e confeccionou-a D. João Texidory Cos, catedrático de pharmacia na Universidade Central de Madrid e membro de outras sociedades scientificas. Antes de entrar verdadeiramente no 200 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA assumpto, o auctor procede a sua obra de uns curiosos capítulos a respeito das ge- neralidades botânicas indispensáveis ao pharmaceutico. A «Flora Farmacêutica» é um grosso volume do mil o duzentas paginas e por isso so dcprehende o desenvolvimento dado á matéria. Quor-nos parecer que os nossos phar- maceuticos lucrariam muito com a leitura d'esta obra, principalmente quando é tão notável a difficiencia da nossa litteratura medico-botanica. O idioma hespanhol não pôde ser obstáculo, por isso que é immensa a afinidade que existe entre as línguas dos dous povos visinhos. Nós estimamos que se estreitem as re- lações scientificas e litterarias entre Por- tugal e Hespanha e d'aqui enviamos os nossos parabéns e agradecimentos ao snr. D. Juan Texidor y Cos. — Fomos ha dias vivamente magoados pela noticia do passamento do nosso col- íaborador Adrião Pereira Forjaz de Sam- pai». É a primeira pagina d'este jornal que se cobre do luto ! E a primeira lagrima que derramamos na campa dos nossos col- laboradores ! E o primeiro nome que dei- xa de apparecer na lista dos homens que nos téem coadjuvado na missão que nos impozemos ! Conturba-se a alma e o espirito quando vemos a mão implacável da morte vir ar- rancar do nosso seio um amigo, um com- panheiro do trabalho, um irmão podera- mos dizer ! N'esses momentos em que os nossos pensamentos se concentram no com- plexo quadro da nossa existência parece que detestamos a vida mas receiamos a frieza do tumulo ! Quizoramo-nos despe- nhar, quizoramos o suicidio que é o re- mate do desespero, mas tudo isso nos hor- rorisa, tudo nos faz sentir o calefrio que nos emudeço e toma inerte. Vem emfim a resignação o a lucidez de espirito que nos deixam acreditar nos principies immutaveis da creação e para allivio da nossa dor escudamo-nos com o fatal — tinha de ser. Tinha de ser! O snr. Adrião Pereira Forjaz do Sampaio tinha o seu nomo ins- eripto no livro do destino, na folha ante- rior á nossa. Hoje choramos a sua morte; ámanhS, chorarão a nossa aquelles que nos prezam e a quem estamos ligados pelos íntimos la- ços da amizade. O snr. Sampaio era lente jubilado na faculdade de direito, fidalgo da casa real, sócio da academia real das sciencias, com- mendador da ordem de S. Thiago, etc. Contava apenas 15 annos quando deu entrada na Universidade de Coimbra co- mo académico, formando-se em 1830 e doutorando-se em 1835. N'este mesmo anno entrou na regência interior da ca- deira de historia e jurisprudência romana e portugueza. O fallecido deixou-nos algumas obras que são muito apreciadas e entre as quaes se apontam : «Pensamentos e Memorias» ; «Fructos das minhas leituras»; «Uma via- gem á Serra da Louzã»; «Memorias do Bussaco»; «Elementos de economia polití- , e no nosso jornal encontram-se al- ça» guns artigos rubricados pelo seu nome (A. de Sampaio). Este cavalheiro era o prototypo da hon- radez e geralmente bemquisto, havendo porém quem o intrigasse. Mas que importa a intriga se ella é a única arma dos fracos, dos covardes, dos ignóbeis, dos que não téem uma só gotta de sangue quo lhes dê o rubor da vergo- nha ? ! O snr. Sampaio proseguia serena- mente na sua missão de estudar para po- der ensinar e pouco se importava com as intrigas de bastidores. Era um caracter digno a todos os respeitos. O sm-. Sampaio exhalou o seu ultimo suspiro na Figueira da Foz, contando 64 annos de edade. Os seus restos mortaes foram conduzidos para Coimbra. O cor- tejo foi numeroso e em todas as pessoas so podia ler a profunda magoa que lhos causava a perda de tão sympathico ca- valheiro. A sua família perdeu um excellente chefe, a sciencia um vulto que a orna- mentava dignamente, e a horticultura um cultor que a protegia com carinho. Á família de tão illustrado cavalheiro endereçamos os nossos sentidos pezames e sírva-lhe de consolação o saber que tem muitos que choram tão lastimável perda. Oliveira Juniob. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 201 ARALIA VEITGHII Como se vê da estampa que acompa- nha este artigo, a Aralia Veitchii está longe de rivalisar com a sua congénere a Aralia papyrifera, da qual demos uma gravura com a respectiva descripção no primeiro volume d'este jornal. A ampla folhagem da Aralia jpapyri- fera e o seu porte de planta sub-tropi- cal ou mesmo tropical tornaram obriga- tória a sua existência em todos os jardins e com effeito vemol-a hoje representada na maior parte d'elles. Excluímos os publi- Fig. 36 — Aralia Veitchii cos, porque ahi só ha o querido Papagaio e mais meia dúzia de cousas também queridas da camará municipal. A espécie de que nos queremos occu- par é principalmente recommendavel pelo seu elegante porte. As folhas, que são di- gitadas, sustentamn-as uns peciolos pre- tos muito delgados, lisos, e luzidios. Pela figura 36, vê-se que as folhas são em numero de 5 a 9, compridas e estrei- tas, graciosamente onduladas, rosaila^ por baixo, com a nervura media mais clara. Mr. Carrière fallando da belleza d'esta planta exprime-se assim : E uma verda- deira miniatura e d'uma delicadeza e ele- gância que não se podem descrever. Oliveira Júnior, MIMULUS MOSGHATUS De certo poucas pessoas ignoram a existência de uma pequena e interessan- te planta vivace, villosa, muito diíFusa, e exhalando de toda ella um pronuncia- do cheiro a almíscar. Pois esse insignifi- cante vegetal é excellente para cultivar nas salas, onde se desenvolve prodigio- samente formando um lindo Vol. V— 1874. vaso, e o seu forte perfume, espalhando-se pelo aposento, concorre prodigiosamente para o tornar mais agradável e hygienico, não sendo em excesso. Douglas foi quem o introduziu da Co- lumbia, e á facilidade da sua reproduc- ção se deve a grande popularidade que dentro em pouco obteve. N.° 11 — Novembro. 202 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Pela propriedade que tem as suas has- tes de cahirem para fi')ra dos vasos, tor- na-se excellente para ornar su;'pensões, jardineiras, rochedos artificiaes, etc. ; a sua grande docilidade pcnnitte ainda eultival-a em forma de relva, ou adap- tal-a a grades, espheras, ou outra qual- quer forma que se imagine, apresentan- do sempre, de todos os modos, uma con- siderável quantidade de flores amarellas, pouco desenvolvidas, sim, mas de um soberbo eíFeito sobre o alegre fundo ver- de formado pelas hastes e folhas. Terra de urzes leve e sombra é o parco sustento que esta planta requer. Reproduz-se quasi que por si mesma, ou então por estacas, na primavera. Recommendando-a como planta essen- cialmente própria para a cultura de por- tas a dentro, esperamos que dentro em pouco ganhará alli a mesma popularida- de que já tem nos jardins. Terminando, não deixaremos de dizer, que o cheiro de almíscar que exhala vem dos pcllos glutinosos do que toda a pum- ta está coberta, e que segregam uma substancia viscosa. A. J. DE Oliveira e Silva. BROMUS SCHRADERr Bromus Schraderi, Kunth. ; Ceratochloa pêndula, Schrader; Ceratochloa bre- viaristata, Hook. Vantagens da sua cultura. — O Bromus, sobre o qual tivemos a honra de chamar a attenção da Sociedade d' Agricultura, não é uma planta de recente introducção na Europa, comtudo tem vivido completa- mente desconhecida e comquanto seja originaria do norte de Oregon, na Ame- rica septentrional, o seu emprego é ain- da restricto no Novo Mundo, ao sul dos Estados Unidos, onde se cultiva sob o nome de Resciie-grass. Experiências de sete annos poderam convencer-nos do seu valor real e do in- teresse que lhe devem ligar os agriculto- res. Receiariamos, porem, parecer exag- gerados se as experiências feitas em to- da a parte não nos pormittissem, ao menos tanto quanto é possível em tão pouco tempo, reconhecer as qualidades que assignalamos n'esta planta forragi- nosa. 0 Bromus Schraderi é uma Gramí- nea vivaz. Verificamol-o nós e Mr. Decais- ne veio-nos confirmar n'uma das lições do seu curso do Jardim das Plantas, em que examinou as partos subterrâneas da planta. E' uma planta muito rústica resistin- do bem ás seccas, de vegetação vigoro- 1 Por Alplionse Lavalléc — Vers<ào de Duar- te de Oliveira, Juuior, sa, podendo dar quatro e mesmo cinco C()rte3 de verde d'uma forragem excel- lente principalmente para as vaccas de leite. O primeiro corte tem logar no mez de março, se o ultimo do anno prece- dente foi feito cedo, mas em todo o caso pôde fixar-se o dia 20 d'abril como o praso mais tardio. O Bromus secco constituo um magni- fico feno; cultivado para se aproveitar a semente, produz muito e a palha con- serva uma parte das vantagens que apre- senta convertido em feno. Emfim este grão, comquanto seja le- ve, poderia em certos casos servir de alimento para as aves. As vaccas, como já dissemos, encon- tram n'esta Gramínea uma forragem que favorece muito a producção do leito que augmenta consideravelmente, tornando- se ao mesmo tempo de melhor qualidade. O Bromus Schraderi mais do que a Spergula (Esparguta) e que a Mostarda branca constituo uma verdadeira planta para manteiga e para emittir esta opi- nião baseamo-nos nas nossas observações e no que nos tem dito as mulheres empre- gadas na nossa queijaria. A cultura d'esta forragem faz pouca despeza e accomoda-se quasi a todos os terrenos não sendo completamente sec- cos e pôde subsistir uns poucos d'anno3 — seis ou oito. Ao quinto anno no mes- mo terreno, nunca vimos que diminuísse a producção. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 203 Uma particularidade do Bromus Schra- deri é a de apresentar a cada corte e em cada pé bastantes espigas com o grão formado e~ quando não o esteja, ao me- nos já consistente. Apontamos esta quali- dade porque é muito raro que uma for- ragem perfeitamente verde tenha espigas maduras e cremos que é uma das causas do valor nutritivo d'esta planta. Foi as- sim que mandamos cortar á foucinlia as espigas destinadas a fornecerem semen- te e depois mandamos segar a parte her- bácea sem que fosse possivel ver diíferen- ça alguma com os outros cortes. Apesar do grão ser muito leve como dissemos mais acima, o seu rendimento em compensação é considerável e dá no primeiro corte um numero de hectoli- tros superior ao da melhor Aveia. Apesar do Bromus Schraderi ser vi- vaz, nasce e desenvolve-se tão rapida- mente como os cereaes e por conseguinte é possivel tirar-se ainda excellente par- tido cultivando-se, em certos casos, co- mo planta bis-annual. Semeada no fim do estio na epocha das chuvas dá bom corte em outubro ou novembro e no fim do inverno dá ainda outro curte melhor (1). Se depois da sega se arrancasse, ainda haveria o tempo precioso para se lavrar o terreno e empregal-o para ou- tra cultura como por exemplo, para as Beterabas, Cenouras e Batatas. Seria também muito possivel semear o Bromus como os Trigos^ mas sendo as- sim não se poderia contar com o corte antes da primavera. Devemos , porem, observar que as sementeiras feitas mais tarde, em dezembro por exemplo, não produzem bem. Muitas pessoas nos teem perguntado se a alimentação com o Bromus não ti- nha produzido alguns casos de meteori- sação. Nunca o observamos e causar-nos- hia admiração que esse perigo existisse, porque isso acontece só com os animaes submettidos ao regimen d'uma planta Le- guminosa e sobretudo o Trevo. Quando as forragens são da familia dos Gh-amineas isso é muito raro. Desde que o progresso agricola pres- creveu o alqueivar a terra e os cultiva- dores augmentaram os seus productos forraginosos formando prados artificiaes de grande duração ou temporários, tem-se procurado muito as Gramineas para esse fim. Em Inglaterra e nos departamentos maritimos de França encontra-se a Eay~ grass e a sua variedade conhecida de- baixo do nome de Ray-grass d^Italia^ mas a sua cultura só é realisavel nos terrenos ricos e frescos, sob um ceo ne- buloso e com muito adubo, e como tão bem demonstrou o celebre Mr. Mathieu de Dobasle (2) , não convém ao Ray-grass nem o centro nem o este da França. Mr. Doba-'le sentia muito não conhe- cer alguma Gramínea forraginosa que po- desse cultivar com bom êxito em Rovil- le. O Ray-grass precisa da visinhança do mar. O Bromus Schraderi^ como se verá mais adiante, não é originário de lega- res maritimos, mas d'um paiz continen- tal. Produzirá portanto bem nos nossos departamentos do este, mostrando tanta rusticidade como onde nós o cultivamos — no Seine-et-OioC. (Continiia.) Oliveira Júnior. CULTURA DOS CRAVOS A cultura dos Cravos é hoje uma das occupações favoritas de muitos amado- res, contando-se já algumas collecções (1) N'umá carta qne S. A. a Princcza Bac- cioclii dirif^iu de Korn-or-Houct (Morbilian) ao "Journal d'Agriculture Pratiquc« em 12 de janeiro passado, encontra-se uma phrase a es- te respeito que diz muito: "O Bromus Schrade- ri cresce como na primavera, depois de ter si- do segado no dia 2(j de dezembro, com um frio de 7 graus abaixo de zero. importantes d'esta3 plantas, que muitas vezes desapparecem por falta de cuidado na sua cultura. Julgamos pois que serão lidas com interesse algumas regras, que a nossa própria experiência pôde aucto- risar, o outras que temos colhido da lei- tura de livros especiaes. Supponhamos que temos uma grande collecção de mergulhias que desejamos (2) Annales de Koville. 204 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA transplantar para vasos ; se a epocha, em que se fizer esta mudança, for na pri- mavera, devemos plantar logo os olhos nos vasos em que devem florir ; se, pelo con- trario, for no outomno, devem ser plan- tados em vasos pequenos onde passarão o inverno. Rccommcndamos o diâmetro de 15 centímetros de boca e 20 de al- tura para os vasos em que os Cravos de- vem florir; o tamanho dos vasos peque- nos pôde variar. Escolhidos os vasos, enchem -se de terra franca, que tenha sido re^^ada durante um anno com adubo liquido ; se for ar- gilosa dove-se-lhe addiccionar uma quarta parte de terriço bem consummido o que não esteja muito húmido. O aspecto da terra deve ser unctuoso e macio. Cheios 03 vasos, enterram-se as novas plantas a 4 ou 5 centímetros de profun- didade, calcando-se bem a terra em re- dor para obstar á rápida evaporação dos seus principies nutritivos. O Cravo não deseja humidade ; terae-a mais do que a seccura, o que não quer dizer que uma e outra se não devam evi- tar. Antes de se plantarem as mergulhias, tiram-se-lhes todas as folhas velhas ou amarellas e depois prendem-se a estacas pequenas, para as livrar de qualquer ac- cidente. Em seguida conservam-se á som- bra por espaço de 15 dias. Depois de preparados os vasos pela forma que deixamos descripta, regam-se levemente, sendo-lhes prejudicial a muita agua, bem como a tirada logo dos poços, por cujo motivo é conveniente tel-a ti- rado com um ou dous dias de anticipa- ção. No inverno deve-se apenas regal-os o sufficiente para as plantas não morre- rem. Quando os Cravos principiam a vege- tar é conveniente dar-lhes uma ou duas regas com adubo liquido, assim como na occasião em que as flores começam a desabrochar. O melhor adubo empre- gado para este fim é um kilogramma de guano desfeito em agua para cada 100 plantas. Esta dissolução é necessário fa- zer-so dous dias antes de ser empregada. No mez de abril ou maio devemos mu- dar a collccção de Cravos para bancadas onde o sol e a luz lhes dê livremente, e querendo conservar por muito tempo a florescência, mudar-se-hão os vasos para um logar a meia luz. Desejando-se obter flores grandes, basta supprimir os pequenos botões que estão adherentes ao principal; 5 ou 6 flores, sendo bellas e fortes, devem sa- tisfazer as exigências do amador, dan- do-se além d'isso a circumstancia da sup- prcssão dos botões redundar sempre em favor das futuras mergulhias. Logo que se aproximam as chuvas frias do inverno, recolhom-se os Cravos debaixo de qualquer abrigo comtanto que seja bem arejado e illuminado, e apenas principie a boa estação, isto é em março ou abril, coUocam-se outra vez so- bre as bancadas em que devem florir. Tanto 03 Cravos como todas as outras plantas teem seus inimigos, sendo d'estes o mais terrível a Forjicula auricularia vulgarmente chamada Bicha-cadella. Deve-se portanto ter todo o cuidado em destruir esses insectos antes da floração, e para isso aproveitam-se as unhas do porco ou as pequenas pontas de carneiro, que se collocam presas a um pequeno pau em cada vaso; o insecto depois de concluída a sua obra destruidora, vae procurar abrigo debaixo d'estas peque- nas ratoeiras; tornando-se então muito fácil saccudir de manhã as referidas unhas ou pontas e extinguir todas as Forficulas, que ahi se encontrarem. A degeneração das plantas é um de- feito assas commum a todas ellas, mas especialmente nos Cravos. O pouco cui- dado que geralmente se lhes presta é muitas vezes a origem d' este defeito, e por isso, logo que se observe, que al- guns Cravos principiam a perturbar-se no seu colorido, e que o fundo não c tão puro como devia ser, tomando então uma cor avermelhada, é preciso tranaplan- tal-os logo para o chão, em terra franca e sem mistura alguma. Se este meio lhes não restituir as suas antigas cores, de- vem ser immediatamente rejeitados, sob pena, no caso contrario, de ver a collcc- ção completamente estragada. Ahi ficam dcscriptas as principaes re- gras para a cultura d'esta interessante flor de collccção. Dous meios se nos apresentam para JORNAL DE HOETICULTURA PRATICA 205 a sua reproducção: a sementeira e a mergulhia. O primeiro, talvez o mais importante, só deve ser empregado quando deseje- mos obter novas variedades; raras ve- zes a semente de Cravos reproduz fiel- mente 03 caracteres da mãe e por isso deve ser rejeitado este processo quando queiramos reproduzir variedades já co- nhecidas. O segundo meio de reproducção é co- nhecido de todos e muito usado ; con- siste em fender uma das hastes do Cravo mãe, sem a cortar do pé, e mergulhal-a no mesmo vaso para a obrigar a desen- volver raizes. O modo como geralmente é feita esta operação julgamol-o bas- tante defeituoso, porque as mergulhias raras vezes se enraizam bem, e quando acontece o contrario sahem sempre defei- tuosas. O processo de multiplicação por meio de pequenos cartuchos de folha de chumbo não tem nenhum dos inconve- nientes acima indicados; a planta mãe por este meio não fica estragada, as re- producções são mais perfeitas, sahem com todas as raizes e pegam com mais facili- dade. Eis o modo como se faz este pro- cesso : lança-se mão de uma folha de chumbo de 2 a 3 millimetros de espes- sara e corta-se em pedaços triangulares de 6 a 7 centímetros, tendo o cuidado de l-^es arredondar a base; os cartuchos fi- Ca m então com 2 a 3 centímetros de dia- m etro sobre 4 a 5 de altura. Preparados assim os cartuchos, no mez de agosto dá-se começo á operação do se- guinte modo; alguns dias antes do des- tinado para a reproducção dos Cravos deixam-se de regar estes para que os braços destinados a mergulhar se tornem mais flexíveis. Antes de operar cortam-se com uma tesoura as folhas em excesso e que só serviriam de estorvo para o bom resul- tado da operação ; fende-se a haste se- gundo o mesmo modo usado para a mer- gulhia ordinária, e colloca-se o cartucho, em forma de funil, de roda da mergu- lhia e de modo que a haste fique perfei- tamente no centro. Assim preparadas as mergulhias en- chem-se os cartuchos com terriço penei- rado muito fino, cobrindo-os depois cora argilla desfeita em agua para conservar a humidade e absorver as regas com mais facilidade. E' conveniente regar duas ou três vezes por dia até que as mergulhias estejam pegadas, o que se realisa em 30 ou 40 dias ; depois po- dem-se cortar da mãe, plantando-as em pequenos vasos como dissemos no co- meço d'este artigo, ou então, destinan- do-as para fora, podem conservar-se nos cartuchos sobre uma camada de musgo e á sombra, afim de conservar a fres- cura ás raizes. A. J. DE Oliveira e Silva. PRIMEIRO PEGEGO Temos ouvido recommendar por tan- tas vezes o pecego, cujo nome se lê na nossa epigraphe, que nos parece conve- niente tornal-o conhecido dos nossos lei- tores. Com esse fim vamos trancrever o que a este propósitos e lê no Cultivador : «Arvore vigorosa, de folhas glandulo- sas, grandes, arqueadas, frequentemente acanudadas, d'um verde carregado, re- luzentes na superficie, ligeiramente in- dentadas, nervura e peciolo d'um verde amarellado, glândulas reniformes fre- quentemente dispostas sobre o limbo. A flor rosácea, grande, verticalmente ova- da; o fructo sobre o espherico de 30 a 35 milímetros de diâmetro, achatado no olho aonde ha uma saliência obtusa, atravessado do pé ao olho d'um lado e raras vezes dos dous por uma ruga que o divide em duas partes eguaes; pelle muito delicada, soltando-se da polpa com extrema facilidade, ligeiramente penu- genta, d'um encarnado ondeado e salpi- cado sobre um fundo amarello ; polpa mui ligeiramente adherente, amarella, menos na região do caroço aonde é d'um encarnado pronunciado, contendo em grande quantidade um sueco acidulado em geral não muito doce, mas d'um sa- bor agradável, que como a de todos os pecegos de polpa amarella, se simelha um pouco ao gosto de certas ameixas; 206 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA caroço regular e ligeiramente oval e pouco rugo.^0. A academia recebeu esta variedade de pecego com a denominação de Primeiro pecego vermelho temporão que cnteade- moà dever modificar afim d' evitar a con- fusão com outras variedades que teem já a mesma qualificação, mas como con- vém por outro lado seja o mais temporão de todas as qualidades coukecidas, conser- vamos-lLie a denominação de Primeiro pecego temporão de polpa amardla o que o destingue claramente, sendo o único de todas as variedades miúdas precoces que tem a polpa amarella. Em quanto á sua precocidade é tal que em 1870. apresentou fructos ma- duros em 10 de julho, antes, por conse- quência de todas as variedades de da- masco. O fructo, na forma, aspecto geral e proporções, assimelha-se perfeitamente ao pecego Petitte mignonne, e quando o Pecegueiro está carregado nada mais ornamental e lindo. Devemos notar, todavia, que este pe- cego é muito melindroso, e que por muito pouco que se lhe toque, a pelle se des- taca da carne. Devem-se colher por- tanto com a maior precaução.» Em vista do que acaba de lêr-se, ve-se que o Primeiro pecego tem um le- gar reservado em todos os pomares e por conseguinte desejaremos que a sua introducção no nosso paiz não seja de- morada. Diremos muito baixinho que isto en- tende-se principalmente com os nossos horticultores. Oliveira Júnior. ALGUMAS PALAVRAS SOBRE A MOLÉSTIA DAS LARANJEIRAS' Sabe toda a gente que a moléstia das vinhas e das Batatas tem origem n'es- ses Cogumelos microscópicos. Phenome- nos mais ou menos análogos se repetem em muitas variedades de fructeiras, por exemplo, nas Pereiras, onde os Cogume- los se apresentam primeiramente nas fo- lhas e causam a morte successiva das ar- vores. Em França observou-se, ha al- guns annos, uma nova moléstia nos Pe- cegueiros, que Mr. Prillieux reconheceu ser causada por Cogumelos microscópi- cos. A doença tomou o nome de cloque e Mr. Tulasne descreveu o Cogumelo como Trapihrina defo^-mans. No meio dia da Europa, muitas plan- tações do Castanheiros , de Sobreiros e de Oliveiras, estão soffrendo desde bas- tante tempo da epidemia dos Cogumelos, mas sobre tudo é a Laranjeira e algu- mas das suas congéneres que são vic- timas. Já disse mais acima que ainda não era conhecido um curativo radical para esta moléstia e por isso não julgo necessário fallar de todos esses remédios que vá- rios proprietários teem experimentado * Vide J. II. P., vol. V, pag. 189. para salvar as suas Laranjeiras affecta- das. Ha porém um empregado por um cavalheiro de reconhecida intelligencia dos subúrbios de Coimbra que, com al- gumas modificações que aconselharei, po- der;í dar bom resultado na cura com- pleta das arvores doentes. Descobre-se o tronco até ás raizes grossas, operação que deverá ser feita com o máximo cuidado, depois regam-se as raizes doentes com agua alcatroada e enche-se a cova com bocados grandes de carvão de choça e por cima do carvão deitam-se pedi-as do tamanho de gran- des laranjas formando uma camada de um pé d'altura. A agua alcatroada impede o desenvol- vimento dos Cogumelos, o carvão de cho- ça é um especifico contra a putrefacção, e como o carvão e as pedras dão accesso ao ar atmospherico até ás raizes, é es- te que se encarrega de fíizer o resto na cura das plantas. Ensaiem, pois, os nossos cultivadores este processo e verão dentro em pouco tempo as arvores revestirem-se de fo- lhagem verde-escura, o que é um signal de saúde. A chimica também se tem occupado JOENAL DE HORTICULTURA PRATICA 207 d'esta moléstia e nos « Aimalen der Che- mie und Pll3^sik » Band 73, encontra- mos uma anaíyse dos princípios que com- põem uma Laranjeira doente. Analyses análogas foram feitas, ha alguns annos, na ilha de S. Miguel, com as cinzas de uma Laranjeira em bom estado. Eis aqui o resultado d'e3tas duas analyses. A composição das cinzas da arvore de S. Miguel é completamente differente da da Laranjeira doente. A quantidade de cal e a falta proporcional d'acido phos- phorico em todas as partes da arvore doente, exceptuando nos fructos, onde se encontra uma accumulação de Kali bastante notável. Mas^ se estas anoma- lias se acham ou não ligadas á origem da moléstia, ainda não está provado. A experiência tem demonstrado que esta epidemia nas Laranjeiras doces, e é d'estas que nos occupamos, toma um ca- racter muito menos pernicioso se são en- xertadas em LMranjeira azeda. Isto le- va-nos a dous pontos importantes da phy- siologia e da systematica. Se concluímos em primeiro logar que todas as varieda- des e raças das nossas Laranjeiras doces são obtidas por meio de uma hybrida- ção continua, vão cahindo em decadên- cia pouco a pouco e basta dar mais um passo para qvie a Laranjeira doce ou da China (Citrus aurantiiim Risso) não seja mais do que uma variedade da La- ranjeira azeda (Citrus Bigaradia Du- ham). Pondo os garfos enfraquecidos da va- riedade que se pretende reproduzir (La- ranjeira doce) pelo processo da enxertia, em contacto intimo com a seiva sã da espécie mãe ou da espécie typo (Laran- jeira azeda), os indivíduos assim obtidos mostram muito mais vigor do que os ob- tidos por sementeira, e por consequên- cia não deixam desenvolver tão facil- mente nas raizes os Cogumelos e não en- tram tão facilmente em putrefacção. Não se deve porém deixar de dizer que os individues enxertados na Laranjeira aze- da não resistem tão bem ao frio como os que se obteem por sementeira e que es- tes últimos se tornam recommendados para as localidades situadas mais para o norte. Noa Açores, na Madeira, nas ilhas Ca- nárias e nas de Cabo Verde esta epide- mia causou também avultados prejuízos aos cultivadores de Laranjeiras, assim como egualmente em mais duas partes do globo — no Brazil e na Austrália, para onde esta arvore foi introduzida da Europa. Alli mostra os mesmos caracte- res perniciosos. Nos homens, as epidemias mostram o seu máximo desenvolvimento, depois di- minuem pouco a pouco, e geralmente acabam por desapparecer completamen- te. No reino vegetal vemos repetir oa mesmos phenomenos. A antiga moléstia das vinhas, por exemplo, que causava tamanha devasta- ção na Madeira e n'outras partes, está, com certeza declinando. A moléstia das Batatas, causada, como a primeira, por uma espécie de Oidium, diminuiu nota- velmente tanto em extensão como em intenção, e muito felizes seremos em po- dendo dizer o mesmo da moléstia das Laranjeiras. Estas arvores estão comtudo sujeitas a outros ataques de que fallaremos de passagem, ainda que não seja senão para completar este capitulo. Em Portugal, como nas outras partes, as folhas, os ramos, e mesmo muitas ve- zes os troncos de todas as arvores que são conhecidas sob a denominação gené- rica de « arvores de espinho » são sujei- tas ao ataque de alguns Cogumelos mi- croscópicos ; doença conhecida sob o no- me de Fumagine ou morpheia. Aconse- Iha-se como remédio a applicação, nas partes affectadas, de uma dissolução fra- ca de cal. Ha alguns annos que uma epidemia se manifestou nas Laranjeiras, na ilha de Ta- hiti. Consiste principalmente n'uma pe- lícula parda que começa por manchar os fructos, e que acaba por cobril-os com- pletamente de modo que cahem antes de estarem maduros. Attribuiu-se esta doen- ça a causas muito diversas, e como meio de cura chegou-se a ensaiar o descasca- mento, mas o remédio mostrou sempre eíFeitos peiores do que os da moléstia. Contra o Coccus hesperidiím que appa- rece primeiramente nas folhas, tem-se empregado alguns remédios externos taes como pimenta, enxofre, negro de fumo, 208 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA mas quando o insecto encontra todas as condições precisas para a sua existência, lia apenas um meio de nos vermos li- vres d'elle — é descoroar as plantas para rebentarem de novo. Citemos ainda um outro insecto pre- judicial ás Laranjeiras, a Ceratites citri- perda Macl. E' uma espécie de mosca que felizmente ainda é desconhecida em Portugal. Onde apparece, produz, em pouco tempo, grande mortandade nas plantações e ainda nào se conheceu um remédio efficaz contra o flagello. Antes de concluirmos, façamos a se- guinte pergunta : « Quaes são as condi- ções essenciaes para que as Laranjeiras prosperem bem V » A isto dá-nos o professor Griesebach, na sua obra recentemente publicada « Die Vegetation der Erdo » alguns con- selhos importantes para se poder respon- der. Segundo o citado auctor poder-se-hia calcular assim a distribuição vertical das Laranjeiras cultivadas no meio dia da Europa, etc. Para Granada até a altura de 2:000 pés; para Nice 1:200 a 1:300 pós : para o Etna 1:900 pés (segundo Gomellaro a mesma altitude da Oliveira); e em Chy- pre até á altura de 1:500 pés. Próximo ás margens dos lagos d'Ita- lia, onde ha algumas vezes geadas mes- mo no verão, e onde os invernos são bastante rigorosos, as Laranjeiras, tendo algum abrigo, prosperam bem, mas cor- respondem muito mediocrementc ás con- dições climatéricas geraes da Flora Me- diterrânea. Em Hespanha cultivam-se, sem abrigo algum, somente no littoral, ao passo que em Portugal vegetam bem quasi por toda a parto. Em Itália, é na parte do meio dia onde se dão perfeitamente e depois cncontram-se em toda a Africa Beptentrional e na Syria até Morea e emfim apparecem, ao pé da Oliveira, no Pontus do mar Negro, onde o clima é temperado pela abundância da humi- dade. Para voltarmos ainda á Hespanha, Mr. Willkomm, nos seus mappas da ve- getação d'aquello paiz, limita a cultura das espécies do género Citrus a três la- dos da Galliza até á Catalunha, mas Mr. Boissier, apoiando-se na auctorldade de Mr. Gay (J. Gay, « Observationes de Plantis Asturicis »), escreve o seguinte : « Nas planícies que coroam os montes do interior, nos subúrbios de Ronda e de Granada, não podem resistir á mesma altura. E' uma nova prova da necessidade que teeni as Aurantiaceas d'um clima sem extremos de calor nem de frio. As regiões marítimas convéem-lhes perfeitamente debaixo d'este ponto de vista e é por isso que se encontram em toda a exten- são da península até á Galliza e nas províncias da costa septentrional sem que em nenhuma parte penetrem nas pla- nícies do interior » . (Boissier « Voyage en Espagne»). Taes condições climato- lógicas correspondem bem ás da origem das Laranjeiras na zona tropical. Emquanto ao solo que mais convém ás Laranjeiras não ha regras fixas. O dl'. George Bennett no seu artigo sobre a introducção e a cultura das Laranjeiras da Nova Galles do Sul (New South Wa- les) diz : « As Laranjeiras e os Limoei- ros vegetam luxuriantemente em terra arienta, muito fraca e coberta de roche- do?. » (« Journal of Botany », 1867). E' certo que um terreno um tanto ar- giloso convém-lhes muito bem mas é pre- ciso adubal-o talvez de três em três an- nos com estrume substancial mas que não seja muito quente. E' nos legares elevados que ellas vão melhor, porem, es- sas plantações exigem durante os mezes do verão regas frequentes e é sabido que soíFrem muito mais com a secca do que com a abundância d'agua, circums- tancia que as torna bem distinctas das Oliveiras. Nas margens do Mondego, perto de Coimbra, onde o solo está muitas vezes innundado por semanas durante o inver- no, vimos Laranjeiras que nada deixa- vam a desejar. Antes de concluirmos, devemos dizer que estas arvores soffrem muito com os ventos do norte e com os do mar e é por isso que nos Açores as protegem com grandes sebes formados por Camdlias, Eriohotryas, Pittosporum, etc. Lisboa. Edmond Goeze. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 209 LARANJEIRA COROA DE REI o género Citrus é natural das índias e da China. Aclimada em todos os pai- zes do mundo, onde a temperatura nun- ca desce de 4 a 5 graus abaixo de zero, a Laranjeira representa um papel im- portante no commercio. É sem duvida uma das arvores mais admiráveis da Europa, já pela elegância do tronco, já pelo viçoso da folhagem. A graça e suavidade das suas flores es- tão em competência com a côr dourada e com o sabor delicioso dos fructos. Pode- se considerar como um dos mais bellos ornamentos do globo. Temos feito grandes esforços para for- mar a coUecção mais completa de La- ranjeiras que existe no nosso paiz, não só com o lim de engrandecer commer- Fig. 37 — Laranja Coroa de Eei. — Desenhada no Horto Loureiro cialmente o nosso estabelecimento, mas com o desejo sincero de vulgarisar entre nós as melhores qualidades d'este deli- cioso fructo. Ultimamente adquirimos umas seis va- riedades muito distinctas, mas a mais notável é a Coroa de Rei. De certo lhe vem o nome de apresentar uma coroa muito saliente nas duas extremidades do fructo, o que a torna d'uma surprehen- dente bellesa. É notável também por ter uma estria dourada junto ao peciolo. O fructo é de tamanho regular, muito doce e a casca muito fina. Não tem pe- vide, o que acontece com outras varie- dades, d'Embigo (Bahia), Saúde e Pêra. D'esta ultima também brevemente apre- sentaremos uma gravura. José Marques Loureiro. RHODODENDRUl HYBRIDOS No catalogo de Mr. J. Linden que re- cebemos ha dias, encontramos dousi?Ao- dodendrum novos e obtidos no estabele- cimento d'aquelle horticultor, que re- commendamos aos nossos amadores. O primeiro d'elles, o Ehododendrum Madame Linden, é uma planta vigorosa de ramos robustos, verdes na extremi- dade e herbáceos. As folhas são verde es- curas, rijas, oblongo-ellipticas, um pouco convexas e glabras. Os corymbos são ter- minaes, muito grandes, compactos, es- 210 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA pliericos, compostos de admiráveis flo- res, com pedúnculo bastante saliente; a coroUa é muito aberta com lóbulos ovaes- obtuâ03 d'um mimoso e transparente lilaz com uma linha media flliiforme mais escura. A pétala superior é mar- cada em mais de metade da superfície por uma serie do pontuações d'um carme- sim muito intenso e dispostas cm linhas. As duas pétalas superiores lateraes são levemente marcadas com pontos análo- gos em fi')rma do accento circumflexo. O segundo Rhododendrum a que nos queremos referir é o R. Príncesse Louise, que obteve o primeiro premio no con- curso de Rododendrum novos, na Ex- posição Internacional de Gand em 1873. E' uma planta de porte vigoroso e de regularissiraa fiunna. As folhas são oblon- gas, lanceoladas, agudas e com os bor- dos um pouco arqueados para baixo. Os capitules de flores que se destacam da folhagem são compactos, esphericos, e teem as flores dispostas em linhas muito regulares e são de branco puro, e as pétalas superiores são levemente ponteadas de amarello pallido. As péta- las d'e.sta3 encantadoras corollas são ovaes, mais ou menos acuminadas ou obtusas e graciosamente onduladas nas beiras. Como todas as novidades, estas plan- tas são vendidas ainda por um preço bastante elevado. No catalago de Mr. Linden vêem marcadas a 2.5 fi*anco3. Para os amadores endinheirado 5, po- rém, não será isso motivo para que dei- xem estar por muito tempo os seus jar- dins sem estas preciosas plantas devidas á intelligencia d'um homem illustrado como é Mr. J. Linden. Oliveira Júnior. SYNOPSE GHRONOLOGICA ('' Synopse chronologica das principaes deli- berações e providencias do conselho da faculdade de philosophia sobre o estu- do de botânica e agricultura na Univer- sidade de Coimbra, desde 1774 até 1872. 1868 — Em 28 de julho fez-se a visita ao Jardim Botânico, e n'essa occasião fo- ram visto? novos melhoramentos, não si) em plantações de arvores e arbustos, mas no estabelecimento do horto medico e eschola de plantas industriaes. Na cerca do S. Bento foram observados importan- tes trabalhos do plantação de arvores fructiferas, e a formação de um pomar, composto de plantas, das quaes umas vieram de França, e outras foram oíFere- cida.s pelo snr. Borges da Camará. Este cavalheiro, de accordo com a commissão administrativa, dirigiu com o maior zelo e assiduidade este e outros trabalhos, taes como o ornamento da cerca, etc. Em 8 de outubro leu-se a portaria do governo, de 27 de agosto ultimo, dissol- vendo a commissão administrativa do Jardim Botânico, e ordenando que a ad- ministração voltasse ao estado normal. 1869 — Em 29 de maio votaram-so (1) Vide J. H. P., vol. V, png. 183. agradecimentos ao dr. Hooker pelo oífe- recimento de uma preciosa coUecção de plantas do Jardim de Kcw. Tendo acabado o arrendamento do collegio de S. Bento, e cedendo o go- verno a parte do edifício que fosse pre- cisa para o serviço da Faculdade de Phi- losophia, procedeu-se em 10 de junho á escolha das casas mais necessárias, pre- ferindo-se no primeiro andar metade do corredor que fíca do lado do jardim, e todo o corredor contiguo, do lado da cer- ca de 8. Bento, alguns quartos do an- dar superior, as duas entradas e todas as lojas pelo lado do jardim e cerca. Em 5 de novembro foi o conselho in- formado dos resultados da ultima via- gem feita pelo jardineiro Edmond Goe- zo, que obteve para o Jardim Botânico uma collecção de 400 sementes de plan- ta^ da Austrália, 50 espécies de plantas ofFcrecidas pelo dr. Hooker, director do jardim botânico de Kew, e 200 espé- cies de plantas oíFerecidas por ]\Ir. De- caisne, director do Jardim das plantas de Pariz. Foram devidamente agradecidas estas dadivas dos dous sábios botânicos inglcz o francez. 1870 — Em 15 de janeiro foram appro- vados 03 planos de novas obras e melho- JORNAI. DE HORTICULTURA PRATICA 211 ramentos do Jardim Botânico, e a appli- cação da sacristia da egreja de S. Bento para um gabinete, devendo conter o her- bario, um museu botânico e a bibliotheca do jardim. Em 4 de junho foi o conselho infor- mado dos seguinte.3 offerecimentos que unanimemente agradeceu : Do snr. Pinto de Magalhães, nma collecção de madei- ras e fructos das nossas posse "^sões ultra- marinas para o museu botânico ; e do snr. Vicente Freire, do Rio de Janeiro, duas remessas de plantas, constando de Orchi- deas, Fetos arbóreos e arhoresceníes , etc. Em 5 de julho recebeu-se outra col- lecção de Orchídeas, oíferecida pelo snr. António José Corrêa de Lima, a qual che- gou em óptimo estado de conservação. Mandou-se agradecer. Foi auctorisado o director do Jardim Botânico para man- dar para a ilha da Madeira e outras possessões ultramarinas alguns exempla- res de Cinchona, para se generalisar a cultura d'esta preciosa planta nas regiões apropriadas. Em 28 de julho fez-se a visita ao Jar- dim Botânico e reconhece a-se o bom ar- ranjo das estufas e grande numero de plantas n'ellas cultivadas. Em 7 de dezembro recebeu o conse- lho do dr. Ferdinand von Mueller, di- rector do Jardim Botânico e de aclima- ção, de Melbourne, um precioso pre- sente de sementes de plantas da Austrá- lia e exemplares de Fetos arbóreos de gran- de belleza e merecimento. Tributaram-se ao generoso offerente unanimes votos de agradecimento, dando-se parte ao gover- no para os devidos effeitos. Em resultado d'isto o governo agraciou ò dr. Mueller com a commenda da ordem de S. Thiago. 1871 — Em 8 de fevereiro deu-se conta do offerecimento de uma collecção de Fe- tos e das principaes variedades de Videi- ras da ilha da Madeira, feito pelo Conde da Foz. Agradeceu-se nos devidos termos. Em 19 de abril recebeu-se o seguin- te: uma collecção de sementes de plan- tas da America, pelo snr. Vicente Frei- re ; uma collecção de Fetos da Madeira, pelo snr. Alfredo . Leal ,• e uma collec- ção de sementes de plantas da índia, pelo snr. Duque de Loulé. Agradeceu- se devidamente. Em 31 de maio recebeu-se nova col- lecção de sementes de plantas da Aus- trália, e diversas obras de botânica pu- blicadas pelo dr. Ferdinand von Mueller, tudo generosamente offerecido pelo seu auctor. Agradeceu-se convenientemente. Em 15 de julho procedeu-se á visita do Jardim Botânico, e observou-se o bom estado da estufa e as novas acquisições de plantas que se tinham realisado, e visi- tou-se o novo museu botânico e respec- tiva bibliotheca, estabelecida em uma magnifica sala, que serviu antigamente de sacristia. Em 27 do mesmo mez foi proposta e approvada a suppressão de compêndios na aula de botânica, devendo o profes- sor fazer prelecções livres das discipli- nas a seu cargo. Em 13 de novembro foi nomeada uma commissão para regular as obras a que se está procedendo no edifício de S. Ben- to para serventias e casas de trabalho, conservação de productos do jardim e habitações de empregados e criados. 1872 — Em 10 de fevereiro foi rece- bida uma proposta do encarregado doa negócios da republica do Peru em Lis- boa, com o fim de estabelecer relações com o Jardim Botânico da Universidade para troca de sementes e plantas. Coimbra. J. A. Simões de Carvalho. GHRONICA HORTIGOLO-AGRICOLA Os leitores devem-se recordar de ter já visto o plano de jardim que acompa- nha estas linhas, mas que novamente re- produzimos para lhes poupar o enfado de recorrerem ás cadernetas passadas. Eis pois novamente «O Meu Jardim», aquelle jardimsinho a que todos chama- vam o seu querido bijou e que, á simi- Ihança d'um movei, d'um objecto d'uso quotidiano, passou a outras mãos. Coita- dinho ! Como tu tens sido tractado ! Que sede não passastes, pobres e inoíFensivas plantasinhas ! São as leis do mundo — hoje é-se rico e amanhã é-se pobre; hoje 212 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA é-se amado e amanhã desprcsado. Quando nos pertencias, jardim, tinhas todos os cuidados do amante que idolatra a mulher eleita do seu coração; agora calcam-te aos pés, deixam morrer todas essas filhas do sol á mingua d'agua e á mingua de sus- tento ; matam-n'as á fome e á sede. Não ha tesoura para aparar os ramos seccos; e as hervas parasitas assenhorearam-se do vosso mimoso dorainio ! Quem assim quereria ser jardim?. . . Não é hoje nosso, mas temos-lhe amor como se o fosse. Vimol-o ! Que aspecto cadavérico que elle tinha ! As folhas das Roseiras, en- carquilhadas e cheias de pó, não mos- travam signaes de vegetação; os Pelar- goniums mais rústicos mostravam algu- mas folhas rachiticas ; as Centáureas, plantas extremamente rústicas, estavam seccas e o mais tudo tinha accentuado na sua phisionomia a tristeza de quem perdeu o seu protector. Não é hoje nosso, repetimol-o, mas te- mos-lhe ainda amor como se o fosse, ama- mol-o com saudade, imaginativamente, com a melancolia do bem que perdemos . . . Mas ah! queremos que a tua tristeza SC desvaneça, que sejas outra vez viço e formosura, que nos encantes com o aspecto agradável das tuas moutas, que nos sua- vises com o perfume dos teus canteiros. Deitem-se as hastes seccas á lareira que é o seu logar próprio agora no inver- no. Cave-se o terreno, adube-se, apla- ne-se que vae receber novos hospedes, novos amantes que entre si communi carão o seu amor que é grande e verdadeiro. Comecemos os trabalhos pela figura A, que deve ser de todas a mais primo- rosa, porque é a mais próxima da casa d'habitação e que primeiro se vê quando BO entra no jardim. Nas artes, na litte- ratura, na própria jardinagem, na socie- dade— jardim da vida — as primeiras im- pressões valem muito. Para modificarmos completamente o aspecto que tinha primitivamente esta figura, disporemos no centro de cada uma das estrellas (1) um exemplar de Thxiija semper áurea, planta de desen- volvimento muito pouco vigoroso e que pelo seu delicado amarello-dourado se destaca muito da verdura geral. Se a estrella tiver dimensão que com- porte alguns pés da Centáurea marítima á volta da Tliwja, dever-se-hão plantar, porque formarão uma orla de contraste entre a verdura da relva e como uma meia tinta ou passagem para o amarello da Thuya. Ao centro do n.° 2 disporemos o for- mosíssimo Lilium auratum, Roi des jardins, ce favori de Flore Cliiirme à la fois Todorat et les yeux. Esta Liliacea é uma das mai? bellas que se conhece. Quando Lindley a des- creveu, fel-o cheio de enthusiasmo e a única designação que encontrou que lhe coubesse bem foi a de gloriosa. Nenhuma, diz elle, mereceria tão bem esse nome. No «Meu Jardim» terá pois o Lilium auratum um logar distinctissimo, como merece. Bastaria elle ser o Rei dos Jar- dins, como lhe chamou o poeta, para que lhe déssemos o throno. Como formando a sua real corte, dis- poremos em redor alguns Jacinthos pre- ferindo os vermelhos, azues, roxos e cor de rosa e collocando-os pela seguinte or- dem : na peripheria uma linha cor de rosa, em seguida outra vermelha, depois os azues, até que por fim chega a vez dos roxos. Estas graduações de cores de- vem produzir um bello eífeito. O n.° 3 será composto exclusivamente de Crociis, podendo as cores ser dispos- tas ao acaso. Assim formarão um aça- fate de matiz que nos desvanecerá da ideia as continuadas linhas regulares. Para o n.° 5 poder-se-ha escolher qual- quer d'estas plantas: Phormium te naxfol. var ou o Gynerium argenteum foi. var. Ambas aqui ficarão egualmcntc bem. O n." 6 precisa de plantas um pouco mais elevadas do que as do n.° 2 e 3 para se poderem ver a uma certa distancia. Escolhemos por isso os Ranunculos. Ao redor da planta n.° 5 fazer-se-ha uma linha vermelha escura que a circuite, outra vermelha clara, outra branca, ou- tra amarclla o por fim outra do Ranuiv- culo viridijíwa. Esta planta inteiramente nova no paiz, foi introduzida o anno passado pelo snr. José Marques Loureiro. A flor é grande, tem as primeiras ordens de pétalas ver- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 213 melhas com estrias douradas; estas vão alargando de modo que a cor amarella vem substituir a primeira, ficando as pétalas com estreitas estrias de verme- lho. Ao aproximar-se do centro estas co- res vão desapparecendo e transforman- do-se as pétalas em verde. No centro forma, pois, o que os horticultores cha- mam olJio verde. -/yimj^oq Fig. 38 — 0 Meu Jardim Passemos agora ao centro B. Conservaremos no n.° 2 a Cryptome- ria elegans, porque esta planta com o frio toma uma cor acastanhada que a torna muito distincta no meio da vegetação que a rodeia e no n.° 3 ficarão muito bem Tulipas de cores variadas. Como formando o quadro d'esta figura dispo- remos no n." 1 alguns exemplares de Anémonas. Para os grandes taboleiros da figura C recorreremos aos Liliums e entre el- les alguns ha de subido valor horticola. Mencionaremos o L. Icmcifolium álbum; L. Thumbergianum aureum grandijlorum, e o L. tigrinum. Por' entre os Liliums disporemos algumas Sjparaxis. No n.° 2 ficará muito bem a Acácia vestita, de folhagem quasi branca e dif- ferente de toda a outra que a rodeia. Nos n.°^ 3 e 4 plantaremos alguns exemplares de Ixias e Tritonias. Ainda nos resta encher os canteiros próximos ao muro de vedação. Ahi^ en- contrarão excellente logar as Roseiras, Gladiolus, Violetas, Bellis jperennis. Ver- benas, etc. Aqui está amigo leitor o que nós fa- ríamos ao nosso querido jardim. São sete palmos de terra que antes de dous ^ me- zes parecerá o leito virgem dos noivos. Tudo alli será ridente e esperançoso e o ar será embalsamado pelo suave aroma das flores que enlevará o nosso espirito ás regiões em que a felicidade anda de mãos dadas com os sonhos d'um futuro venturoso. Se a creação de novos estabeleci- mentos hortícolas é uma prova do de- senvolvimento que a horticultura vae to- mando entre nós, é com muito regosijo que noticiamos a abertura d'um que pro- mette ser dos primeiros d'esta cidade, porque as pessoas que o dirigem alliam a bastantes conhecimentos especiaes a boa vontade de que geralmente dispõem aquelles que professam este ramo como amadores. Ora nós conhecemol-as e sa- bemos quanto podem fazer em pró d'essa deusa chamada Flora e para a qual mui- tos olham com o mesmo desdém que nós olhamos, supponha-se, para o hediondo monumento que um quidam, a que dão o nome d'artista, erigiu no largo da Ba- talha. Mas adeante. O estabelecimento a que nos referi- mos é na rua da Constituição e acaba- mos de receber o seu catalogo n.° 1 (1874-75) de bolbos, raizes e varias se- mentes, no qual os amadores poderão fa- zer uma escolhida selecção para os seus 214 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA jardins. A collecção de bolbos é entre todas as outras a mellior. Em Gladio- lus^ Jacinthos e /ris, ha uma grande va- riedade e agora que é a epoclia própria para se fazerem as plantações, lembra- mos aos cultivadores a acquisição do ca- talogo para assim poderem fazer a sua escolha. Muitas das variedades vêem acompanhadas da sua respectiva descrip- ção o que auxiliará o amador menos ex- periente. Saudamos d'aqui os proprietários do Horto Portuense e desejamos que as suas fadigas sejam bem compensadas pela pro- tecção do publico. Isso concorrerá pode- rosamente para que este ramo se desen- volva e venha a occupar brevemente en- tre nós um logar tão digno como no ex- trangeiro onde merece os cuidados dos homens mais i Ilustrados. — Escreve-nos o snr. Nicolau P. de Mendonça Falcão, de Vizeu, para ver- mos se será possivel obter garfos de uma Macieira que, no dizer de aquelle cava- lheiro, ó uma das melhores que possuí- mos e segundo parece portugueza de lei. Denomina-se Leiriõa, o que dá a en- tender que é natural de Leiria, ou pelo menos ahi baptisada. É de tamanho me- diano e do feitio da Camoeza de Rosa, mas um pouco maior do que esta; rajada de bello vermelho e tão lustrosa c a cas- ca que parece envernisada. A polpa é al- va, muito doce e aromática. Se algum dos leitores nos poder in- formar onde existe a Macieira Leiriôa, obsequiará o snr. Mendonça Falcão as- sim como a nós dando-nos quaesquer es- clarecimentos. — E cada vez mais curioso o catalogo das edições da casa J. Rothschild, de Pa- ri z, que tantos serviços tem prestado á botânica, horticultura e sciencias congé- neres. Hoje temos a dar noticia de um li- vro e^cripto por Mr. II. Rodin e que ae intitula «Les Plantes Médicinales et Usuelles de nos Charaps, Jardins, Forets» . E um tractado resumido o curioso, ao alcance de toda a gente, que tenha inte- resse em conhccor a virtude c utilidade das plantas mais vulgares na medicina e na industria. E acompanhado do 117 vinhetas. Para pessoas dadas á medicina cazei- ra, é que esto livro é principalmente um guia seguro e ameno. — Visitamos o jardim do nosso amigo, o sni". conselheiro Camillo Aureliano o fomos agradavelmente surprehendidos. Não foi nada menos nem nada mais do que uma riquíssima collecção de Dahlias inéditas que assim nos surprehendeu. Ha-as de todos os coloridos, de todas as formas e de todos os tamanhos e a col- lecção sobe a cerca de vinte variedades. São devidas a um intelligente espe- cialista que !ia bastantes annos pe dedi- ca á propagação d'esta planta por via de sementes habilmente fecundadas. E bom que se saiba desde já o seu nome que de- ver;í occupar um logar distincto entre os amadores do nosso paiz. É o snr. dr. An- tónio Augusto Cabral de Souza Pires, juiz de direito de Villa Nova de Famalicão. Das variedades mais distinctas já man- damos fazer os desenhos que serão inse- ridos n'um dos próximos números d' este jornal acompanhados da sua respectiva descripção. Estas variedades serão lançadas para o anno no nosso mercado. — A pedido do cônsul francez em Ca- dix, enviou o nosso coUaborador, o snr. Francisco Ghersi, para Pariz, uma col- lecção- de folhas de varias plantas que se cultivam n'aquella cidade. — Temos prezente o catalogo n.° 92 (1874-75) do estabelecimento hortícola de Mr. J. Linden, de Gand. Este catalogo é apenas das especiali- dades Azáleas. Rhododendrum, Camellias, especialidades que formam per si riquís- simas collecções. Entre as CameUias al- gumas se encontram de sementeira por- tugueza, taes como : D. Carlos Fernando (Principe Real); D. Pedro V; D. Maria Pia; D. Fernando II (Rei de Portugal) e outras que deixamos de enumerar. O estabelecimento do snr. Linden é bem conhecido e torna-se portanto des- necessário recommendal-o aos amadores. — Temos sobre a banca o catalogo n." 11 (1874-75) do estabelecimento de hor- ticultura do snr. José Marques Loureiro; que forma um volume de quasi 200 pa- ginas o que é oflferocido gratuitamente ás pessoas que desejarem possuil-o. JOBNAL DE HORTICULTURA PRATICA 215 Como nos catálogos anteriores, muitas das plantas vêem acompanhadas de uma ligeira descripção que serve de valioso auxilio para as pessoas menos versadas n'esta especialidade. A collecção de arvores fructiferas pó- de-se considerar tão rica como a de qual- quer estabelecimento lá de fora, d'onde o snr. Loureiro importa todos os annos as variedades mais recommendadas que vão apparecendo. As plantas de estufa merecem a par- ticular attenção do snr. Marques Lou- reiro e tornam-se um dos principaes at- tractivos do seu estabelecimento que é muito digno de ser visitado. — Em seguida publicamos o resumo de uma noticia sobre a florescência da Vi- ctcrria Regia, que maito interessará aos nossos leitores : «No primeiro dia as pétalas são bran- cas, no segundo côr de rosa ; para a tar- de do segundo dia, entre as quatro e seis horas, os seus numerosos estames mos- tram um movimento vibratório, que con- tribue para a expulsão do pollen e favo- rece a fecundação ; ao mesmo tempo a flor exhala um aroma de baunilha e ana- naz. No dia seguinte, terceiro, as pétalas fecham-se e a flor dirige-se para debai- xo d'agua, para ahi amadurecer os óvu- los. Uma capsula madura contem 300 se- mentes do tamanho d'uma ervilha; esta perde a sua faculdade germinativa con- servando-se fora d'agua. A prefoliação é muito curiosa ; uma espécie de estipula envolve a nova folha rudimentar; quando esta estipula cahe, a folha ainda se conserva enrolada, de sor- te que 03 seus lados exteriores são enro- lados para a parte de dentro e os nume- rosos espinhos da face inferior apresen- tam a forma d'um ouriço, que os ani- maes aquáticos não se atrevem a atacar ; pouco a pouco as bordas desenrolam-se e a folha acaba por se patentear á su- perfície das aguas. As bacias para a cultura d'este vege- tal devem ter cinco metros de compri- mento e três ou quatro de largo, para que a planta se possa desenvolver á von- tade. Mr. Caspari de Berlin está encar- regado pela Academia das sciencias d'a- quella cidade de escrever uma minucio- sa memoria sobre a Victoria Regia. A Victoria regia é uma interessante Nympheacea achada em janeiro de 1837 nas aguas do rio Berbice na Guyana, pelo inglez Schomburgh, e que já tinha sido des cripta em 1799 por Haencke, botânico allemão, fallecido na America, e por elle designada Euryale amazonica em memoria do rio em cujas margens abunda. Foi depois descoberta pelo via- jante Poeppig, em 1830, no seio de to- das as aguas que afluem ao grande rio das Amazonas, e em 1831 por A. de Orbigny, nas ribeiras do Paraná, Para- guav. Rio Mamore, etc. Os guaranis chamam-lhe Yrujpé, e os hespanhoea Milho d' agua. Lindley, botânico inglez, deu-lhe o nome de Victoria regia, em honra da rainha de Inglaterra. As suas folhas tomam o espantoso des- envolvimento de 2 metros. — Foi mandado louvar o conselheiro ' dr. Bernardino António Gomes pelo ser- viço que prestou offerecendo á Escola Polytechnica o herbario que foi do dr. Valorado; sete cartas do próprio punho do dr. Brotero, que servem para provar quanto o dito herbario está auctorisado pela revisão que d'elle fez este sábio; e varias collecções de plantas ordenadas pelo dr. Fr. Welwitsch, pelo oíFerente e por seu filho, o snr. Bernardino Bar- ros Gomes. — Conta um jornal do paiz que um vinhateiro francez conserva as uvas até o mez d'abril tão frescas e tão sabo- rosas, como se fosse no mez de setem- bro ou outubro. Guardava segredo acerca do processo de conservação, mas por fim decidiu-se a revelal-o. Em primeiro logar deixa tanto tempo quanto é possível os cachos na cepa; e só os colhe quando é indispensável, para que não se estraguem, corta os antes das primeiras geadas, tendo a precaução de lhes deixar pegada uma parte do lança- mento, com dous nós abaixo do cacho e dous acima. A parte superior do lançamento é co- berta com cera no corte para impedir a evaporação dos líquidos. Depois tiram-se 216 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA com todo O cuidado os bagos que não es- tão bem sãos e colloca-se a extremidade inferior do lançamento n'uma garrafa que contem agua misturada com algum car- vão vegetal. A garrafa é tapada com uma rolha de cortiça furada no centro para deixar passagem ao lançamento e lacrada. Collocam-se as garrafas a par umas das outras, tendo o cuidado de as ampa- rar para que não succeda desequilibra- rem-se com o peso dos cachos, e affas- tam-se o necessário para que os cachos não toquem uns nos outros. Estas gar- rafas devem ser guardadas n'uma casa bem sêcca; assim consegue-se conservar as uvas durante todo o inverno e pri- mavera. E necessário examinal-as de vez em quando para cortar todos os bagos que tendam a estragar-se. O carvão impede que a agua se cor- rompa e conserva-a fresca, assim como as uvas. E experiência que se faz facil- mente e por onde se reconhecerá a pro- ficuidade d'este meio de conservação. No Algarve ha quem siga um processo similhante, mas os cachos ficam dentro das garrafas, que são de bocca larga, e são mettidos antes do seu desenvolvi- mento ; alli crescem, sendo depois ne- cessário partir as garrafas quando se pre- tende comer as uvas. — Annuncia-se para 1876, em Ams- tcrdam, luna Exposição Internacional de Horticultura. Os amadores terão tempo de se pre- venirem. Ainda não se acha publicado o pro- gramma nem tampouco designado o mez em que deverá ter logar esta festa. — Mr. Ramel, o introductor do Eii- calyptus globulus na Europa, rccommenda muito, em carta dirigida a Mr. Ed. An- dré, a c.spccie colossea. Entre nós é completamente desconhe- cida o Bentham não faz menção d'ella na sua importante «Flora Australiensis». E provável que seja uma espécie re- centemente descoberta. — Recebemos do snr. João Félix Pe- reira duas folhas de uma sua traducção das oGeorgicas» de Virgílio em verso endecasylabo. Esta traducção vem acompanhada de annotações exclusivamente agronómicas e zootechnicas que nos parecem dignas de lêr-se. Conhecíamos a brilhante traducção do visconde de Castilho, bem como a de Pina Leitão (edição de 1794), mas a do snr. João Félix Pereira tem um lado cu- rioso que muito deve interessar aos agri- cultores e por isso a recommendamos. — A ser verdade o que se lê nos « Anna- les de la Societé dMIorticulture et d'His- toire naturelle de THerault» está immi- nente a completa ruina dos vinhedos eu- ropeus. Flagello após flagello! Segundo Mr. Lichtenstein, um novo inimigo está-se batendo com as vinhas de Roussillon, cm Salanque, tendo já destruído aproximadamente quinhentos a seiscentos hectares. Oxalá que isto não passe de um mero equívoco do sábio professor ! — Segundo o «Boletim de S. Fran- cisco» plantaram-se este anno na Cali- fórnia nada menos do que lun milhão de Encalyptus globulus. — Na eschola vitícola, na cerca de S. Bento em Coimbra, existe uma collecção do Videiras das principaes regiões do nosso paiz assim como do extrangeiro. A ilha da Madeira, a Hungria, a Allema- nha, a Inglaterra, e a França, téem ali alguns representantes, e segundo infor- mações que temos as Videiras da Ma- deira são as que mostram mais vigor, mais fructo e que apresentam menos mo- léstia. Todas as pessoas que teem visi- tado esta eschola téem ficado maravilha- das com o resultado que ellas dão e os pedidos para exemplares d'aquellas va- riedades teem sido numerosos. As Videiras vindas da Madeira que alli estão em cultura são as seguintes: Negrinho, Tinta, Boal, Xerez, Musca- tel Xerez, Listrão, Carão de moça, Co- xado. Negra niolle, Maroto, Dedo de Da- ma, Bastardo branco, Borgonha, Uva americana. Barrete de padre. — O numero total das sementeiras fei- tas este anno desde janeiro até junho, no Jardim Botânico de Coimbra, foi de 2:160 espécies, não entrando [n'e3te nu- mero as de ornamento. — Vae-so enriquecendo de dia para JOKNAIv DE HORTICULTURA PRATICA 217 dia a bibliotheca do nosso agricultor. Ainda ha pouco noticiamos n'este logar o apparecimento do interessante livro do snr. Ferreira Lapa, a primeira parte da sua «Technologia Rural», e já hoje temos a festejar um outro, que deve occupar a par d'elle um distiiicto logar. Referimo- nos ao volume dado á luz pelo snr. An- tónio Batalha Eeis e que se intitula «A Vinha e o Vinho em 1872». O snr. Batalha Reis foi commissionado á exposição vinícola que em 1872 se rea- lisou em Lyon e o seu livro é o resultado feliz d'um estudo consciencioso feito não só n'essa exposição, mas nos vinhedos da França e da Suissa, paizes que o distincto oenologo percorreu em viagem d'instruc- ção. E a França, o paiz onde os processos vinicolas teem chegado a maior grau de adeantamento e apresentando, n'um qua- dro substancioso, o estado d'essa indus- tria, é de vêr qual o serviço prestado pelo snr. Batalha Reis aos cultivadores portuguezes. O livro do snr. Batalha Reis, escripto n'um estylo singelo e agradável, como o poderia fazer um touriste da sciencia, recommenda-se sobretudo pelo seu lado pratico. A theoria é acompanhada sem- pre pelo processo. Ha também n'este livro uma cousa que o torna do grande vantagem e até delei- toso á vista. É grande o numero das pa- ginas illustradas com estampas. Por muito desenvolvida que seja a descripcão, a pin- tura dos objectos pela penna é sempre pallida. A gravura provoca o interesse, disperta a curiosidade. Os leitores mais indolentes deixam-se muitas vezes sedu- zir pelo desenho. Os 'livros de propa- ganda scientiíica precisam, como a obra do snr. Batalha Reis, de ser illustrados. Dos apparelhos estampados, nem todos são extrangeiros, alguns ha de inven- tores portuguezes, entre os quaes figu- ram os do próprio auctor do livro. Agradecendo tão valioso prezente, transcrevemos com muito prazer a criti- ca qUe acerca da obra publicou no «Com- mercio do Porto» o snr. J. I. Ferreira Lapa, juiz competentíssimo como todos sabem. E como falia o decano da oeno- logia portugueza, é nosso dever o silen- I cio. Eis as palavras do snr. Ferreira Lapa: Está publicado o relatório da exposição de Lyon, redigido pelo meu presadissimo amigo, o snr. António Batalha Reis. Intitula-se: «A Vi- nha e o Vinho em 1872». E' um volume grande de perto de 400 pa- ginas com numerosas gravuras intercaladas no texto. Este livro é uma revista conscienciosa do que o auctor presenciou nas suas excursões a regiões e officinas vinhateiras de vários pai- zes, e nas suas visitas e estudos da exposição de Lyon, e ao mesmo tempo um ffuia pratico do vinhateiro e do negociante de vinhos, desde a cultura da vinha até á ultima phase technolo- gica e commercial do vinho. E' simultaneamen- te uma obra de occasiào para curiosos, e um directório permanente para instrucçSo dos ho- mens do officio •, porque, par a par com as no- vidades de uma rica exhibição do material vi- nario, colligido na exposição ou desencantado em diversas explorações cenologicas, o auctor soube entresachar as doutrinas mais escolhidas da oenotechnia, arrancadas umas dos numero- sos livros da sciencia que lhe são familiares, outras dos factos da vida vinícola extraugeira, outras emíim da sua própria experiência, e da experiência dos seus conterrâneos. De ha muito que o meu amigo sentia a ne- cessidade de escrever para uso dos práticos um pequeno livi'o puramente pratico também, onde o officio do vinhateiro estivesse e.tposto segun- do a successào dos trabalhos, com todas as re- gras de acção e minudencias de factos, mas sem maiores explanações scientifieas, grande parte das quaes não é entendida pelo commum das pessoas, que, ou por gosto, ou por necessidade, exercem esta parte das Artes Agrícolas. Sentira esta necessidade conimum em si mesmo, quando ha 15 annos começou a occu- J5ar-se das cousas oenologicas, e conhecera quão iitil podia ser, se poupasse a outros as difficul- dades que elle teve de vencer durante muitos annos de lida e de estudo, apresentando-lhes o fructo formado, sem a necessidade dos mesmos sacrifícios que elle empregou para o conse- guir. A exposição de Lyon, á qual foi enviado pela Real Associação "Central de Agricultura em 1872, permittiu-lhe o ensejo de realisar o seu benévolo intento, então com a dupla pre- eminência de offerecer o seu trabalho engasta- do na interessante moldura de um successo cu- ja descripcão sempre viva, verdadeira e modes- ta, rescencle não poucas vezes com as flores de um estylo mimoso e apurado, e depois d'isto apoiado ainda e fortalecido com numerosos ca- sos e citações de alheia pratica, esmeradamen- te entretecidas com a parte doutrinal. Temos visto por ahi muitos relatórios de exposições que se foram estudar espressamente, e nos quaes avulta mais a enchellaria da scien- cia feita e corriqueira dos livros, do que as no- vidades de factos e de ideias testemunhadas ; parecendo mais que o relator aboberou ou dor- miu no seu gabinete de trabalho, do que pas- 218 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA seou e esquadrinhou nos palácios das exposi- ções. Na obra que temos sobre a banca de tra- balho, nào ha esta duvida. Tudo alli revela a penetrante, a fadigosa copitaçào do que esteve á vista. A sciencia vem tanto do apparelho, da uiachina ou do objecto exposto que se examinou attentamente em re- pouso e em acçào, como de qualquer estudo anterior que a prisào lógica das ideias podia invocar para mais aclarada definição das cou- sas expostas. O livro contem a figura da exposição de Lvon desmembrada no didactismo de um cor- po de doutrina; mas as formas carnudas d'eR- ta, longe de empastar o molde, deixam-lhe so- bresahir t.íuito ao vivo e em relevo as linhas naturaes, que o leitor, pizando terreno um pou- co conhecido, assiste ao espectáculo da exposi- ção, como se a seguira pelas suas naves e ave- nidas. Se a exposição de Lyon se disposera como os capítulos ordenados de um vnde, mecum do vinhateiro, a obra do snr. A. Batalha Reis se- ria a sua mais rcíú e verdadeira photographia. O nosso amigo, que colheu glorias e palmas na exposição de Lyon, ganhou agora com esta sua publicação um triumpho mais assignalado. Uma obra d'estas equivale a uma carta de curso da especialidade. Ninguém lhe fará favor, senão justiça, em o incluir no limitadíssimo numero dos nossos cenologos mais distinctos, quer como officiante, quer como escriptor. Res m meoforo ve.rtitur. E' um pouco empliatica a epigraphe, mas leiam o livro, e verão que o meu juizo, se não é dos mais competentes, é pelo menos jus- to e imparcial até onde ijóde chegar. Devo, po- rém, ao auctor mais do qut; um juizo, devo-lhe o agradecimento sincero pela honra que me fez, dedicando-me este seu valioso trabalho, sem eu ter outro titulo para o merecer, senão o da firme aniisade que nos une. A Real Associação Central de Agricultura deve ufanar-se pela gloria com que acaba de se cobrir o seu digno secretario, e tanto mais que uma parte d'esta gloria lhe reverte por ter contribuído com adiantamentos de auxílios pa- ra o efhcaz desempenlio da commissão do seu enviado. Entre os cavalheiros que mais se dis- tinguiram a este respeito merecem honrosa men- ção os snrs. Caetano Luz, e visconde de Car- nide. O visconde de Carnide, o antigo e simples Street, o ajijo custodio da Real Associação de Agricultura, alma nobre, cheia de fogo e de inspiração que tem acalentado em seus braços esta instituição, tantas vezes periditante, co- gitador incessante de todos os progressos agrí- colas, amando deveras os homens úteis da agri- cultura, foi o que mais fervorosamente coope- rou para este resultado, em que, ao lado d'um novo campeão da cenología portugueza, nos ap- parcffí nm livro, que ha-de exercer grandíssima inHu<'ncía no aperfeiçoamento dVsta industria. Muitos louvores merece também o snr. mi- nistro das obras publicas, Cardoso de Avelino, pela coadjuvação que prestou ao commissario da Real Associaçilo de Agricultura na sua en- viatura á exposição de Lyon, e pela impressão que ordenou se fizesse gratuitamente na Im- prensa Nacional do seu relatório. Protecções d'estas honram sempre a illustração de um mi- nistro. Mas quando são coroadas por serviços tão relevantes em prol da causa publica, essa honra fica consubstanciada com a do nome do servidor illustre. — Das observações feitas durante um lon^o período d'anno3 sobre a influencia das florestas nos climas, colheram-se as seguintes conclusões: 1.° — Que a humidade media nas flo- restas é, se.i^undo o vento, de 10 a 20 por cento maior do que em campo razo; 2.° — Que a temperatura media do ar, nas florestas é mais baixa do que em campo ra^o; 3.'' — Que a temperatura das arvores é mais baixa á altura d'um homem do que na coroa da arvore ; 4." — Que a temperatura media do solo das florestas é consideravelmente mais baixa do que a do campo; 5.° — Que a chuva e a neve é em maior quantidade no campo do que nas florestas ; ô.** — Que nas florestas a chuva que se infiltra na terra é em maior quanti- dade do que no campo. — Ahi vae uma noticia que deve ale- grar os amadores de Lisboa. Não é decerto vaidade da nossa parte o dizermos que o Porto tem melhores es- tabelecimentos, de horticultura do que Lisboa: é um facto que os habitantes da capital são os primeiros a reconhecer. Ora alegrem-se os amadores de Lisboa, porque nos primeiros dias de novem- bro será inaugurada a abertura de uma casa filial do estabelecimento de horti- cultura do snr. José Marques Loureiro, proprietário d'este jornal. Essa filial é na rua do Salitre n.° 90. Ahi encontrarão o? amadores as mais primorosas coUecções de plantas para sala, arbustos para jardins, taes como Camel- lias, Rhododendrum, Azáleas, arvores fructiferas, Coníferas e emtim tudo quan- to se podo exigir para que um jardim tenha o cunho do bom gosto. Contamos, pois, que o pensamento do snr. Loureiro será bem acolhido e que merecerá o apoio das pessoas que tribu- tam verdadeiro amor á deusa Flora. JOENAL DE HORTICULTURA PRATICA 219 — O jardim da Cordoaria continua quasi que em completo estado de aban- dono. Triste e amarga verdade — São do snr. António da Cunha e Almeida, as linhas que em seguida se vão lêr: Relativamente á poda das arvores de frueto sou da opinião de V.;mas em quanto ãDamas- queiros, que são muito melindrosos, tenho mi- nhas duvidas : tenho-os podado em vai-ios me- zes com mau resultado, e afinal n'estes dous úl- timos annos podei-os no fim de junho ou depois de colhido o frueto e fiquei mais satisfeito. Pa- rece que n'esta épocha, em que a,03 Damasquei- ros nascem novos rebentos, e em que a planta applica toda a sua seiva a esta ultima vege- tação, sabe melhor a poda e, por não querer des- perdiçar sueco, a planta quasi não lança rezina nem mêlla, antes se reveste de nova gala : ve- remos se se confirma esta experiência. A propósito d'arboricultura occorre-me di- zer alguma cousa relativo a enxertia. Todos os escriptores mandam enxertar antes da planta- ção ; reprovo tal systema : 1." porque a planta, mudada para diverso ton-âo, ainda que melhor, soffre sempre com a mudança e assim enfraque- cida parece degenerar ; 2.° porque enxertada depois d'enraizada, assim como muda de aspec- to e se robustece com uma nova vegetação, dá frueto ao 2.° ou 3." anno, e ás vezes no 1.°, se se souberem escolher os gomos fructiferos; sóten- do-se experimentado ambos os modos de plan- tação e enxertia é que se conhece a diíFerença. Convencido pela experiência, não acceito taes theorias, nem fallo de leve n'e3ta matéria, em que tenho feito toda a sorte de experimentações, algumas juvenis, pois comecei desde tenra eda- de a enxertar a torto e a direito quanto me lem- brava. De tanto me divertir com enxertia e ex- perimentações de todo o género, fiz talvez des- cobertas, taes que ainda não vi escriptas nem de tradição : 1.° Foi que para grudar as fendas dos en- xertos de cunha e de coroa, a bosta d'ovelha por adherente e fresca é a melhor matéria que tenho achado. 2." Que na enxertia de coroa pegam melhor os prumos ás avessas, isto é, com a casca para dentro. Apara-se o prumo d'um lado, do outro fica-lhe a casca, tiraudo-lhe de leve somente a cútis, e introduz-se com este lado voltado para o tronco, e sendo dous prumos unidos ainda me- lhor pegam, pois parecem coadjuvar-se e segu- rar-se melhor. E por hoje como sempre, com aifecto, estima e respeitosa consideração deV. etc. Tembal, da Carrezeda de Anciães, 10 de ou- tubro de 1874. António da Cunha e Almeida. — O Congresso pomologico de Fran- ça sanccionou este anno apenas sete va- riedades de plantas fructiferas, a sa- ber: Ginja jaourprée hãtive — Muito gran- de, têmpora, pedúnculo fino e compri- do. Fértil. Framboeza Sur passe Falstaff — Re- montante. Pêra Beurré de Nivelles — Boa varie- dade serôdia. Obtenção belga devida a Parmentier. Pêra Jules d'Airolles — Frueto fino, sumarento, amanteigado ; amadurece em dezembro. Maçã Bouquepreuve — Variedade mui- to cultivada em Marselha. Maçã Rose de Provence — Variedade meridional. Uva Tschaouck Safra Uzum — Origi- naria da Turquia. Bago grande doura- do. Bello cacho. — Meiado d'outubro recebemos uma carta de convite bem como o program- ma para os dou? congressos internacio- nae5 siricola e vitícola que, ao tempo em que e=!crevemos estas linhas, se deve es- tar realisando em Montpellier. Os convites eram feitos por Mr. Gras- ton Bazille, presidente da Sociedade de Agricultura do Hárault, a quem agrade- cemos a honra mal cabida que se dignou dispensar-nos. Sentimos profundamente não ter po- dido ir assistir a este congresso, onde de certo estão hoje congregados todos os ho- mens que se teem occupado da nova mo- léstia, questão para que o presidente cha- ma particularmente a attenção dos con- vidados. Pelo programma vemos que ha passeios vitícolas aos subarbioí de Montpellier para visitar alguns vinhedos que ora es- tão completamente aniquilados, para ins- peccionar as Videiras americanas, as vi- nhas submergidas, etc, etc. Fazemos votos para que d'este con- gresso, a que vão representantes de qua- si todos 03 paizes da Europa, resulte emanar alguma luz na intrincada ques- tão da nova moléstia das vinhas. — Do nosso illustrado collega de Pon- ta Delgada, o «Cultivador», extracta- mos as linhas que em seguida se vão lêr : A fructa conserva-se alem do tempo da sua duração ordinária colhendo-a antes do seu es- tado de maturação ; mas é preciso ter em lem- 220 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA bninça que se a apanha fôr demasiadamente cedo, as suas qualidades diminuem. É necessário nào juntar fruetos teniporãos com fructos serôdios ; o acido carbónico que se destaca dos primeiros quando elles chegam a amadurecer, faz adiantar os outros; é por esta razào Tiiio convém retirar do fructeiro todos os fructos (pie se ajn-oximani ao estado de maduro. Deve-se evitar com cuidado a Immidade-, nào é necessário renovar o ar da casa a nào ser que haja n'elhi um excesso d'iuimidade, o que con- Tcui evitar. Se luna completa escuridão nào é indispensável é preciso evitar a muita clarida- de, sempre nociva no adiantamento da madu- raçào. A cal bem secca espalhada no fructeiro contribue para lhe seccar o ar, apoderando-se das emanaç-òes aquosas e absorvendo o gaz aci- do carbónico que se evapora constantemente do fructo; ijuriíica o ar quando é suflicientemcntc renovado, sobretudo se o espaço é circumscrip- to e contem mnita fructa. Em ([Uiuito a tempe- ratura, deve observar-se a maior regularidade possivel, tendendo para baixa; alguns graus apenas acima de zero. Para a renovação d'ar basta a abertura da porta toda a vez que se en- tre ou saia, mas se por qualquer motivo convier arejar mais a casa deve-se praticar uma fresta na parede pelo lado voltado ao norte. — Projecta-se no Uruguay uma ex- posição que deverá ter logar em agosto próximo. O programma ainda não está formu- lado. — Dizem-nos de Lisboa que o jardim da praça do Príncipe Kcal causa dó ver- se, tal é o estado de abandono em que está. Registramos o facto e appellamos pa- ra a boa vontade e zelo do snr. Mar- giochi Júnior que tanto se interessa pelo desenvolvimento da jardinagem na ca- pital, empregando para isso todos os meios ao seu alcance. Fazemos toda a justiça ao snr. Mar- giochi c cremos piamente que, para se dar o facto que agora referimos, houve alguma razão imperiosa que nos é alheia. — Mr. Clemenceau escreve a Mr. Car- rière dizendo-lhe que tirou um bcllo resultado pincelando o tronco e ramos d'arvores atacadas pelo pulgão, ou piolho, com uma mistura em partes eguaes d'es- sencia do terebentina e óleo de mão de vacca. Plantas litteralmente cobertas li- caram desembaraçadas d'este insecto que desappareccu juntamente com a formi- ga, inseparável do pulgão. Outra receita indicada como profícua para este effeito é um cosimento de 30 grammas de quassia com 300 grammas de sabão ordinário em 10 litros d'agua. Com este liquido seringa-se ou rega-se a planta devendo o regador ter um crivo fino. — Os snrs. Dehérain e Ed. Landrin submetteram á Academia de Pariz, na sua reunião da 25 de maio, uma nota re- lativa a uma das questões mais curiosas da physiologia vegetal. Ha muito tempo que é sabido que o contacto do ar e a presença da agua são condições necessárias para a germi- nação das sementes, mas ignorava-se o modo como actuavam estes agentes. Os snrs. Dehérain e Landrin propo- seram-se, pois, lançar alguma luz sobre estes mysteriosos phenomenos e conclui- ram que a agua amoUece os invólucros das sementes a ponto de os tornar permeá- veis aos gazes, porquanto quando estão sufficientementc embebidos, os tecidos das sementes adquirem a propriedade de os condensar. Então esta condensação não podendo ter logar sem producção de calor, o oxygenio que penetrou nos te- cidos chega a uma temperatura suffi- eiente para determinar a oxidação e em seguida o acordar da vida vegetal. Segundo os sábios a que acima alludi- mos, é a condensação dos gazes na se- mente o ponto de partida da germina- ção. Ora, não se produzindo este phe- nomcno, quer seja por ialta d'agua, quer seja porque o ar não possa pene- trar até á semente, não pode haver a for- mação dos principies immediatos neces- sários á evolução do gérmen. As observações dos snrs. Dehérain e Landrin, apesar de serem puramente scientificas, oíferecem sob o ponto de vista pratico um interesse real, porque permittem ao cultivador o fazer ideia da influencia que p<'>dem ter no l)om re- sultado da sementeira a densidade do solo, a seccura, a humidade c emfim a profundidade a que a semente deve ser lançada. A experiência tem dado n'este pon- to lições úteis, mas a seiencia vem cor- roborar a pratica e determinar com exac- tidão o caminho que se deve seguir. J. D. DE Oliveira Júnior. JORNAL DE HORTICULTUEA PRATICA 221 BANKSIA VERTICILLATA Das vastas collecçôes de plantas que hoje possue o Jardim Botânico de Coim- bra, a familia das Proteaceas occupa alli um logar distincto e não ha quem se deixe de extasiar quando os seus difFe- rentes "representantes ostentam as capri- chosas inflorescencias que são peculiares a cada espécie. Ás boas relações estabelecidas entre 08 snrs. Edmond Goeze, ex-inspector do Jardim da Universidade, e o dr. F. von Mueller, director do Jardim Botânico de Melbourne, na Austrália, deve aquelle primeiro estabelecimento a esplendida e importante collecção de Proteaceas que hoje possue. Nada menos do que nove géneros com cincoenta espécies do ar li- vre ! Em março de 1872, visitamos o Jar- dim Botânico de Coimbra e não podemos Fig. 39 — ^Banksia verticillata callar o nosso enthusiasmo ao vermos em frente de nós uma das arvores mais bel- las que temos encontrado. Estava en- tão ostentando toda a sua belleza e dava ares d'um collossal candelabro com nu- merosas velas que se destacavam da folhagem. Era a Banksia verticillata R. Br. A florescência d'esta encantadora Pro- teacea é como se vê pela figura 39 em for- ma d' espiga oblongo-cylindrica e o espé- cimen que temos presente mede 25 cen- tímetros de comprimento. As bracteas são Vol. V.--1874 truncadas ou levemente acuminadas^ e o periantho é amarello, sedoso e quasi de 2 centímetros de comprido. Depois de secca toma uma cor acastanhada e^ na ilha de S. Miguel, onde esta planta já é antiga, dizem-nos que empregam as suas espigas em guisa de escovas. Fallando da vegetação da ilha de S. Miguel, dá conta o nosso amigo, o dr. Edmond G-oeze, de haver encontrado alli algumas Banhsias de respeitáveis dimen- sões. Entre outras assignála estas espé- cies que teem a seguinte altura : N.° 12 — Dezembro 222 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Banksia marcescens 16 pés « Uttoralis. 14 » » compor 35 « » integrifolia 36 » « verticillata 14 » Estas arvores que são oriundas da Austrália vegetam bem no nosso paiz. Oxalá que ainda as possamos vêr cam- pear profusamente pelos nossos jardins ! Oliveira Júnior. VICTORIA REGIA Esta planta aquática é a maia bella de todas as que constituem a familia das Nyurpheaceas, Endl. A Victoria regia é indigeiTa da America equatorial e do Bra- zil, aonde habita nas aguas represadas junto dos grandes rios como o Amazonas etc. Foi introduzida na Europa acerca de 25 annos. A principal belleza d'esta planta consiste nas proporções gigantes- cas que adquirem as suas folhas, as quaes medem de ordinário l'",50 de diâmetro, e ás vezes ainda que raras, 1™,80 a 2™, 00; a sua forma é quasi circular, peitada, com a orla levantada no pri- meiro periodo da sua evolução, o que lhe dá então a apparencia d'uma bande- ja fluctuante. N'este estado, as folhas são capazes de supportar um peso conside- rável (1). São lisas e inermes na face superior, e reticuladas com grandes ner- vuras, armadas de espinhos, e de cor roxo escuro na parte inferior. As suas flores são muito similhantes ás das Nym- pheas, mas contém maior numero de pé- talas (100 pouco mais ou menos) e são muito maiores ; uma flor, depois de estar completamente aberta, mede entre O*", 30 a O™, 32 de diâmetro. A sua cor é pri- meiro branca, depois roxa e por fim pur- pura no centi'o. Abrem ao cahir do sol 6 fecham pela manhã. Os fructos estão cobertos por uma camada de espinhos e logo depois da fecundação o pedúnculo mergulha e amadurecem debaixo d'agua, do maneira que, para se poderem colher as sementes, é preciso embrulhar os fruc- tos n'um bocado de panno, aliás per- dem-se. A Victoria regia precisa, para se des- envolver bem, d'um tanque grande, isto c, proporcional á sua grandeza, aonde a agua se possa renovar frequentes vezes e couserval-a n'uma temperatura eleva- (1) Uma creança de 2 a 3 annos póde-se conservar em pé sobre uma d'estas folhas sem se afundar. da. Esta planta, quando se acha no pe- riodo em que a sua vegetação está com toda a força, precisa d'uma temperatu- ra de 24° a 25° centígrados durante a noute e de 30^ a 35° durante o dia; com 21° já ella p(')de vegetar adquirindo me- nores proporções. Requer, como todas as outras plantas aquáticas, muita cla- ridade, de maneira que o tanque aonde ella estiver, fique exposto a toda a luz do sol. Se estiver em estufa, não se de- vem de modo algum pintar os vidros nem cobril-os com pannos, e se estiver ao ar livre não se deve conservar objecto algum junto do tanque que possa fazer sombra. A sua cultura não é difficil como n'ou- tros tempos se julgava, póde-se dizer que é quasi egual á das Nympheaceas. Diremos a este respeito o que nos pare- cer de mais importância. A Victoria re- gia faz uma excepção na familia das Nym- pheaceas; pois que, segundo a opinião de alguns botânicos, parece ser planta annual, de maneira que a confirmar-se isto, será preciso semeal-a todos os annos. A terra que lhe é mais conveniente é o lodo que se encontra no leito das valias e dos rios, ou a terra de alluvião, vulgar- mente chamada nateiro. Emquanto á pro- fundidade em que esta planta se deve ter mergulhada, varia muito, assim no seu paiz natal encontra-se ella com as raizes a alguns metros abaixo da super- fície da agua, outras vezes também uni- camente com alguns centimetros. Nos tanques devemol-a coUocar entre 20 a 30 centimetros de profundidade ao ar li- vre, e nas estufas 15 a 20 centimetros. Como esta planta gosta que a agua es- teja sempre ura pouco agitada, é conve- niente ter nos tanques aonde ella se achar alguns peixes. Aos nossos leitores que se interessa- rem por esta soberba planta, recommen- damos a leitura d'um excellente artigo JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 223 publicado por Mr. van Houtte na obra intitulada «Flore des Serres», tom. VI. Esta planta pode-se cultivar talvez sem ser em estufa na parte temperada do nosso paiz, sem que adquira, já se vê, as proporções gigantescas que obtém na sua terra natal. Mr. Decaisne diz- nos que já viu florir a Victoria regia na Bélgica e em Nice, em estufas que não tinham absolutamente calor algum artificial e a agua dos aquariums era somente aquecida pelo calor do sol; e diz mais que viu também cultivarem- na ao ar livre no meio dia da Europa e em Alger, produzindo follias de grande- za mediana, mas não floresciam. Nós ti- vemos occasião de admirar por varias vezes a belleza d'esta planta n'uma das estufas do Jardim Botânico de Hamburgo. Coimbra. Adolpho Frederico Moller. PALESTRAS HORTÍCOLAS Fios est plautarum gaiidiíim. Incompetente para apresentar na im- . prensa as minhas observações horticolas, impelle-me simplesmente o elevado desejo de concorrer quanto possível para o des- envolvimento d'eãte ramo de industria, útil a uns, instructivo a muitos e agra- dável a todos. É sabido o atraso em que se acha a horticultura emPortugal, com- parada com outros paizes menos favoreci- dos da natureza. Sejamos justos. Não attribuamos este atraso á incompetência dos nossos jardineiros, que, com os es- cassos conhecimentos theoricos e techni- cos de que dispõem, muito fazem. E verdade bem conhecida que a agri- cultura e a sua filha mais velha, a hor- ticultura, estão muito mais adiantadas nos paizes do norte, onde o homem tem de luctar mais com os rigores e incons- tancias do clima do que nos paizes do meio-dia, em que certos trabalhos se fa- zem pela própria natureza sem que o homem disponha para isso de meios al- guns. Outros motivos ju.stificam o nosso atra- so na encantadora arte da horticultura, ou para melhor dizer — a jardinagem. Possuímos já, e principalmente em Lis- boa, alguns ama-^ores esclarecidos, mas por mal do bom gosto o numero d'elles é bastante diminuto. Maior seria se os proprietários ruraes quizessem com os meios de que dispõem ornar os seus jar- dins de plantas e.-colhida?, condemnan- do o que fosse vulgar, e assim obteria- mo8 certa concorrência, que, na epoclia em que estamos, daria largo impulso á educação do gosto hortícola. Em quasi todos os paizes a horticultura tem toma- do um desenvolvimento extraordinário, e são 03 governos em geral que a teem protegido e animado. Além d'isto, os monarchas mais poderosos teem aformo- seado os seus palácios com jardins onde o bom gosto, a arte e a sciencia, auxi- liados por uma bolsa bem guarnecida, teem obtido verdadeiras maravilhas. Em Portugal por emquanto não podemos di- zer que os governos se hajam interessa- do, e tenham concorrido para este des- envolvimento; a politica, cerrando o es- pirito ás puras alegrias da natureza, ab- sorve completamente todas as ideias. Não se julgue de pouca importância, mesmo sob o ponto de vista económico, a hor- ticultura em qualquer paiz. Pode indi- car-se como fonte de grande receita para o thesouro a cultura de plantas indus- triaes e commerciaes, que n'este aben- çoado torrão encontrariam o seu paiz adoptivo em toda a posse da sua vege- tação. E provável que tarde ou cedo os nos- sos governos protejam a creação e entre- timento de jardins, e tenho o presenti- mento de que vem próximo esse dia ao recordar o novo Jardim Botânico da Es- chola Polytechnica de Lisboa, o qual, no curto espaço de tempo que dafa o prin- cipio da sua formação, já possue um avultado numero de famílias e espécies classificadas. Um único argumento bastará para provar que os nossos governos não pro- tegem a horticultura como empreza na- tural, é a falta de exposições horticolas. Em França, na Bélgica, na Hollanda, na AUemanha, na Rússia, em Inglater- 224 JOENAL DE HORTICULTURA PRATICA ra, na Itália e em muitos outros paizes ha todos 03 annoã exposições hortícolas, tanto nas cidades como nas provincias, onde 03 concorrentes encontram prémios offerecidos pelas difFerentes sociedades e ricos amadores, bem como egualmente pelo estado. Em Lisboa e Porto teem-se feito va- rias exposições, mas os prémios dos con- cursos são tão insignificantes que poucos se tentam a disputar os louros; e é este o principal motivo porque não appare- cem concorrentes. Os jornaes estrangeiros contam miu- damente os resultados do grande concur- so botânico que houve ultimamente em Florença. Esta festa foi inaugurada por sua magestade el-rei d'Italia, e assisti- ram a cila as principaes pessoas d'aquella capital, e concorreram alli os botânicos e horticultores de quasi todos os paizes da Europa, e não só da Europa, pois também a America e a Austrália envia- ram alli 03 seus contingentes. Portugal, tão intimamente ligado á Itália pela fa- mília da sua soberana, não teve a honra de ser representado n'aquelle concurso, e não foi de certo por esquecimento da Itália, que mandou cartas de convite, para fazerem parte do jury internacio- nal, a algumas pessoas d'aqui, ás quaes chegaram pela intervenção do ministério dos negócios estrangeiros. Tudo isto tira a coragem e o animo, mas para que o leitor não perca a paciência vou fazer- Ihe a descripção d'alguns jardins de Lis- boa e seus arrabaldes, os quaes tenho encontrado nas minhas assíduas visitas, não só em bom estado de cultura, bom gosto e bom tractamento, mas também em boa escolha das espécies que observei. Deveria principiar a narrativa das minhas observações pelo Paraizo de Flo- ra, a quinta real das Necessidades, de sua mage-tade el-rei D. Fernando, porém o meu particular amigo, o doutor Edmond Goeze já o descreveu n'um jornal inglez e creio que foi traduzido o artigo n'um dos jornaes da capital. José Augusto Braamcamp, um dos mais esclarecidos o dedicados amadores de Flora, possue um lindo e apreciável jardim n'iim pequeno recinto formado de canteiros, atravessados de estreitos ria- chos, ideia completamente nova em Lis- boa e muito útil para as plantas, por isso que aproveitam com a humidade que se lhes transmitte nos rigores do verão, tor- nando-se ao mesmo tempo fácil a opera- ção da rega. Um dos canteiros, systema inglez, apresenta alguma novidade, pois é formado de barras em oval sendo cada uma matisada de plantas com folhagem de cor differente ; assim, uma barra de Pelargoniums, outra de Lohelias, outra de Iresines e Achyrantes apresentam uma vista surprehendente. No alto d'este can- teiro vê-se um soberbo exemplar — o Sa- bal pahnetto. Outro canteiro de forma montanhosa, composto de plantas gordas, tem no cume uma magnífica Agave coc- cifera, e em volta Aloés, Cactus, etc. Alguns exemplares de merecimento matisam aquelle jardim, e entre elles a Dracaena Draco, que bem pode rivali- sar em elegância com o soberbo Dra- goeiro do Jardim Real da Ajuda. — Un- canteiros de Fetos, outros de escolhidas Roseiras, outros de variadas plantas, fors mam o conjunctod'este pequeno terreno- observando-se em geral todas as plantas em bom estado de tractamento e cultura. Emquanto a estufas tem o snr. Braam- camp o que ha de mais agradável : um verdadeiro jardim dentro de casa. Em se- guimento ás salas depara-se-nos uma ga- leria magnífica de crvstal e ferro, dando sahida para o jardim, ao lado esquerdo um pavilhão, também de crvstal e ferro, seguindo-se outra pequena galeria com entrada para a sala do jantar: estas três estufas estão adornadas com magníficas plantas, figurando entre ellas a Dracaena indivisa, (Cordyline) o Cocos romansos- riana, a Musa zebrina, Crotons, Begó- nias, Caladiums, Billbergias, Tillandsias, Aralias, Aspidistras, Phylodendrums,Au- cubas, Tf/deas, etc, etc. A galeria pos- sue uma linda cascata de pedra rocha, ornada de Adiantums, Selaginellas, Tra- descantias, etc. Algumas trepadeiras, for- mando um tecto verde, se enleiam em appara tosas suspensões. No jardim tem ainda o snr. Braamcamp uma estufa, também de crvstal e ferro, própria pa- ra multiplicação e conservação de plan- JOENAL DE HORTICULTURA PRATICA 225 tas, onde existem alguns bonS exempla- res de Fetos^ Selaginellas, e Oi^chideas do Brazil. Siga pois o snr. Braamcamp na cultu- ra das plantas com a vontade e dedica- ção de que está possuído, pois concorren- do assim para o grande desenvolvimento da horticultura, em breve chegará a ser um dos seus principaes sacerdotes. Lisboa. Luiz de Mello Breyner. COSTUMES DAS ABELHAS Já n'um dos números passados publi- camos uma carta que nos dirigiu o rev.*^" padre António da Cunha e Almeida e hoje recebemos outra com curiosos pormeno- res acerca dos costumes e creaçào das abelhas, a qual gostosamente inserimos nas columnas do nosso jornal. Dêmos, pois, a palavra ao nosso apai- xonado apicultor : «Um celebre inglez, Mr. Holdman, domesticou as abelhas a ponto de, alem d' outras maravilhas, levar a uma expo- sição em Londres dous cortiços e, coUo- cando-se elle a certa distancia, cada um dos enxames se lhe vinha metter em ca- da bolso a certo signal, e a outro signal voltavam a seu cortiço sem o molestarem ou a pessoa alguma. Não sei que deixas- se o seu segredo ; parece-me que só ex- trahindo-lhes as respectivas rainhas, e imitando-lhes o — ti ti ti — som agudíssi- mo, que só ellas sabem produzir, se po- deria conseguir a maravilha. Seja porém como for, o que é certo é que as abelhas se domesticam de modo que se fazem dóceis e amigas do seu bem- feitor, a quem conhecem e distinguem mesmo a grande distancia. Tenho observado fazerem-me seus fes- tejos onde quer que me encontram, sen- do que as alheias passam por mim d'um modo bem differente. Agradecem a seu modo as meiguices que lhes faço baten- do as azas de contentes. Deixam-se afa- gar, pego n'ellas e ellas mesmo me vem ás mãos a brincar comigo. Ha todavia occasiões, em que parecem como galli- nhas chocas, e então encrispam-se como para arremetter; mas se as reprehendo abaixam a cabeça e vão para dentro do cortiço como envergonhadas. N'ou- tros dias ainda mais irritadas e menos soíFredoras (a meu vêr quando a rainha anda no fundo do cortiço, no tempo da maior criação somente) vem uma abelha zunir-me aos ouvidos, como a dizer: «vai- te, vai-te,» e então é deixal-as, senão vem outra e outra e a final picam, por- que a ninguém amam tanto como á saa rainha. E notável que nunca me picassem no rosto, onde de preferencia picam os es- tranhos, tendo recebido apenas algumas ferradellas nas mãos e muito poucas na cabeça, signal evidente de que me res- peitam e distinguem. Se acaso ha algum enxame fraco, que é necessário sustental-o, conhecem a al- guma distancia que lhes levo o papeiro e correm em multidão a rodear-me com zunido alegre como aves domesticas. Fazem-se entender e entendem-me per- feitamente, como provam, entre muitos os casos, seguintes: Andava eu uma noute á cata das bor- boletas da tinha, que são luciferas. As abelhas, logo que sentem alguma borbo- leta, saem em numerosos grupos dos cortiços a perseguil-as por toda a parte, e como já sabem que eu ando na mesma diligencia, e as borboletas se escondem da luz, a primeira abelha que encontra a borboleta pára defronte, como o cão a amarrar a. perdiz, muda e queda até eu chegar com a luz, e então começa a ba- ter as azas de leve, como a indicar, e só depois de a ver matar se vae para o cortiço. Diz um escriptor que as abelhas teem repugnância ou nojo em tocar nas bor- boletas, mas observou mal, se observou. O que ellas teem é medo do ferrão da sua inimiga, porque uma abelha izolada es- quiva-se sempre d'atacar de frente a bor- boleta; mas sendo duas então filam-se todas sem medo e, se a borboleta, que é mais desembaraçada, não pode escapar, é victima, immediatamente. É tamanha a raiva das abelhas que, quando se lhes atira alguma borboleta das que mato, fi- 226 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA lam-se muitas n'ella furiozas e arras- tam-na para longe. Outro caso bem significativo. Um dia vejo vir uma abelha arrastando para íó- ra do cortiço um verme da tinha dos de marca maior. MaÍ5 valente, enro.?cava-3e na abelha e levava-a vencida: então grita ella por soccorro, e eu, que já ia ein seu auxillio, matei o verme e ella ficou um pouco a olhar para miin como a agi^a- decer e muito satisfeita. Seria demasiado extenso se referisse tudo o que tenho observado para provar a intelligencia, docilidade e reconheci- mento d'este3 insectos; cuja creação para pessoas obrigadas á vida sedentária é um exercido muito recreativo e, alem d'util, dos mais innocentes. A poder de as ver e tractar frequentemente cheguei a ponto de differençar as abelhas de cada cor- tiço. Para inexperientes parecerá i.>to uma parvoicc, mas é uma verdade, de que tenho uma testimunha, que é um meu compadre, por nome António Areias, também dono d'abelhas, mas d'ellas como do mais segue pela rotina de seus avós. Eis o caso : estávamos ambos em uma tarde de março ao sol ao pé da mina do meu quintal, e, olhando para a agua, vejo n'ella duas abelhas afogadas, tiro-as da agua e digo, vou ressuscitar estas abe- lhas. Como? se estão mortas, diz elle. Aque- ço-as nas mãos, e brevemente se mostra- ram vivas. Depois digo-lhe, esta é do cor- tiço tal, est'outra do de tal. Solta elle uma rifada d'incredulo, mas eu volvi — pois vamos a ver. Levo as abelhas separa- das em cada mão até próximo dos cor- tiços, abro as mãos e ellas lá se dirigem aonde eu tinha dito. Ficou elle espan- tado, sem comprehendcr o que via. Fiz- Ihe depois comparar umas com outras, observando-lhe — não são estas mais es- curas do que aquellas e est'outras maio- res do que aqueiroutras? etc, etc... E verdade. — Pois é como se differençam; e sendo estes cortiços de varias proce- dências, e por isso de differentes raças, as filhas sahem similhantes ás mães, umas são mais propensas a juntar mel, e ou- tras mais prolíficas e inclinadas a enxa- mes, e por isso todas são úteis ; e se por necessidade ou por conveniência se lhes dá outra rainha, passado um anno tor- nam-se diíFerentes em tudo. . . O differençar as abelhas tem sua uti- lidade, por exemplo quando ha tempes- tade e não chegam a tempo ao cortiço e ficam entorpecidas por esse chão. Não sendo soccorridas morrem, e não as dif- ferençaudo e levando-as a cortiços alheios, as extranhas não as consentem lá e ma- tam-nas. Estão tão affeitas a ser soccorri- das que ao verem-me aproximar mostram- se com bater as azas para que eu as apa- nhe e leve ao cortiço, onde se reanimam com o calor das mais.» E o snr. António da Cunha e Almeida um dedicado investigador e muito sen- timos que a sua edade e os seus incom- modos o não deixem entregar-se, como era do seu ardente desejo, á composição de obras agrícolas. Ainda assim muito estimáramos que, todas as vezes que podesse, nos dedicas- se algumas horas de ócio e honrasse o nosso jornal com as suas investigações e com a sua experiência de muitos aunos. Um dos predicados do snr. Almeida é uma rude singeleza d'cstylo, que bem demonstra a sua bcUa alma e a sua con- vivência constante com a natureza. Aqui está um ministro de Christo que é útil aos seus concidadãos. Oxalá que houvesse muitos assim ! Oliveira Jitnior. A AMOREIRA E A SUA FIBRA Por vezes se tem proclamado na nos- sa imprensa a utilidade de gencralisar a cultura da Ainoreirn, unicamente para augmcntar a creação do bicho da seda. O governo e algumas camarás municipaos teem feito bastante por auxiliar esta cul- tura o sempre com aquelle único intuito. A Amoreira pôde porém ; 1700 1855 1048 „ 456 » » 1504 1856 1115 )) 540 » » 1655 1857 1135 » 606 » 226 1967 1858 924 » 341 » 197 1463 1859 986 » 326 n • » 1315 1860 931 » 367 » » 1298 1861 963 » 585 » » 1548 1862 854 » 469 » » 1313 1863 1117 » 236. » » 1353 1864 852 » 359 » » 1217 Vê-se pois claramente que no decurso de dez annos este foi o menos favorável para a producção das forragens. 234 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA A vegetação do Bromus Schraderi, póde-se dizer que não tem iuterrupção a não ser no estio, no caso das seccaa serem excessivas ; comtudo no outomno apre- senta uma força notável (*) que as pri- meiras geadas não vêem diminuir. N'e8ta epocha não se pôde seccar o ul- timo corte; mas ao menos esta planta permitte-nos dar aos animaes um ali- mento verde por muito tempo e fornece aos carneiros uma pastagem hibernal que em muitas partes não ha. É principal- mente na primavera e no fim do outom- no que esta Gramínea mostra todo o seu vigor. Deveremos todavia observar que não deve ser segada em pleno inverno, porque sabemos por experiência que n'esse caso, as toucas apodrecem e não tornam a rebentar quando vem o bom tempo. Verdade é que com as outras Grav^i- neas vivazes acontece o mesmo. Conser- vam as folhas durante o inverno, mas morrem se lh'as tiram n'e3sa epocha. O dr. Chatin, professor de botânica na eschola de pharraacia, teve a bonda- de de nos mostrar (10 de dezembro de 1864) uma cultura experimental de Bro- mus, no Jardim Botânico em que os seus discípulos estudavam. Se nos quizessemos servir das próprias expressões de Mr. Chatin, diriamos que era notável e esplendido o estado em que estava o Bromus e na realidade causava espanto a vegetação que apresentava, ape- zar de estarmos no inverno e o solo ser calco-silicioso e bastante pobre. Por esta occasião veio Mr. Chatin con- firmar a nossa opinião de que os nego- ciantes de Pariz dão indistinctamente os nomes do Bromus, Cerathochloa Schrade- riy jíendula, australis e unioluides á mes- ma espécie, isto é aquella de que nos vi- mos occupando. (1) Mr. de Lentillac escrevia de Lavallado (Dordoprne), o seguinte em data de 3 de janeiro a'este anno : «N'e9ta epocha em que a vegotaçào se jkhIc dizer que está adormecida, em que todaa as for- ragens téem um aspecto árido e como que parecem queimadas, o Bromus Schraderi chama para si a nossa attençào. Elle segue o seu caminho sem parar um aó instante, e, quando tivemos fi graus de frio, e as suas folhas estavam coiigehidas apresentavam a rigidez do vidro. Quando des- gelou, porém, nào vimos uma só foUia seccar. Producto em feno — O Bromus Schra- deri, convertido cm forragem secca, per- de no seu peso na proporção das ou- tras Gramíneas — aproximadamente ^/a. Os 17,300 kilogrammas de forragem ver- de deram-nos exactamente 6,000 kilo- grammas de feno e tornando a pezar de novo quatro mezes depois, não encontrei differença alguma no peso. Eram os mes- mos 6,000 kilogrammas. Por consequên- cia 100 kilogrammas de Bromus cor- tado em verde, antes da maduração das sementes, contém 34 kilogrammas, 72 de matéria secca. Sentimos não ter o producto do feno dos segundos e terceiros cortes. Cremos todavia que a colheita total em feno, de um hectare, poder-se-ha elevar a 12,000 kilogrammas ou 12,400 se fosso possível seccar o ultimo corte do outomno. Os 38,100 kilogrammas, producto to- tal dos cortes de Mr. Dailly, poderiam produzir 13,213 kilogrammas de feno. Mr. Mayre, agricidtor do Seine-et- Marne, dá n'uma interessante carta (*) publicada no «Journal d'Agricuiture Pratique», o producto de feno que lhe deram dous ares : Grilo, não comprehendendo uma gran- de perda, devida á adeantada ma- duraçào 26 kil. Feno seceo depois da debulha 78 kil. l^otal 104 kil. «O que daria, accrescenta Mr. May- re, no primeiro corte, comprehendendo grão e feno secco, 5,200 kilogrammas por hectare. Se se considerar que este producto é devido a 1 kilogramma de semente que se lançou á terra três mezes antes, não se pôde dizer que o Bromus Schraderi seja uma planta pouco generosa.» Este feno conserva todas as preciosas qualidades que a planta tem no estado de verde, e os bois, cavallos, porcos, etc., comemn-o com avidez e passam muito bem com e.3te alimento. Nas vaccas a secreção do leite augmenta e conserva as mesmas qualidades que se observam quando estão submettidas a um regimen verde. (1) 5 de outubro de 18G4. JOBNAL DE HORTICULTURA PRATICA 235 O feno do Bromus não é mais difficil de se preparar que o dos prados; levou- nos quatro dias comprehendendo a sega. O enfeixar é fácil e tanto faz que se gaste logo como d'alli a muito tempo, porque como ainda ha pouco dissemos, a dessecação não é maior no fim de qua- tro mezes, visto que o peso era o mes- mo que tinha quando deu entrada no palheiro. Não devemos occultar que esta Gramí- nea no estado de feno tem um defeito e vem a ser o não ter tão bom aspecto co- mo o dos prados húmidos, chegando até a parecer duro, porém isto não passa de apparencias que n'este caso pouco ou nada valem. A este propósito extrahimos algumas linhas d'uma carta de Mr. Mayre : «Deu-se ás vaccas o feno de que aca- bamos de fallar em estado muito secco mas ellas comeramn-o com avidez com- quanto estivessem habituadas a comer Ray-grass cortada verde n'um terreno muito irrigado.» Mr. de Laveyrie, presidente do Co- mício Agrícola d'Argentac escrevia tam- bém. «Para convencer os meus homens que pensavam que esta forragem não era boa, dei-a aos meus cavallos em presença d'el- les assim como feno escolhido do melhor : 03 dous cavallos depois de terem prova- do a primeira não comeram o feno se- não depois de não terem mais Bromus. y> Producto em palha — A palha é muito pesada, correspondendo o seu peso quasi ao do feno e comquanto seja um pouco dura, 08 cavallos, as vaccas e sobretudo os porcos comemn-a mesmo sem ser se- gada e preferemn-a á de Aveia e á de Trigo. De resto, observando a homoge- neidade que existe entre o peso do feno e o da palha — tomando-se em conta que está sem grão — facilmente se é levado a concluir que as qualidades devem ser qua:si as mesmas, desde o momento que os animaes não a acham muito dura e a comem bem. Temos empregado aqui a designação de palha em logar de colmo, porque nos parece o termo mais apropriado na falta d'outro melhor. Colmo serve para desi- gnar as hastes seccas dos cereaes — Tri- go, Aveia, Centeio, etc, — a que se tirou o grão das espigas. Mas estes cereaes são annuaes e na epocha da colheita as has- tes nunca são acompanhadas de folhas radicaes, e mesmo raras vezes as téem caulinares, ao passo que o Bromus Schra- deri, seja em que epocha for, tem sem- pre a sua base guarnecida de folhas. Por isso mesmo, é que é uma espécie vivaz. Esta palha constituo pois um verda- deiro feno, e é quasi tão boa para con- summo dos animaes como se a planta fora segada antes da maduração do grão. Os animaes comemn-a, pois, do mes- mo modo e, em uma palavra, não se po- deria dizer como do Centeio, por exem- plo, que se semeia para ser cortado no estado verde. O Bromus ainda que te- nha as espigas maduras conserva-se sem- pre verde. Oliveira Júnior. (Continua.) CHROIIGA HORTIGOLO-AGRICOLA Algumas pessoas que entre nós téem cultivado a Videira Moscatel Preto de Hamburgo queixam-se da inferioridade d'esta variedade com relação a muitas das antigas que possuímos e accrescentam ain- da que os cachos são geralmente de tama- nho muito medíocre. Não sabemos como explicar isto, por- que vemos que no extrangeiro esta Vi- deira está chamando a attenção das pes- soas que se dedicam á horticultura. Na Exposição Hortícola que se realisou re- centemente em Belfast havia cachos que pezavam 20 arráteis e 12 onças ingle- zas. O mesmo expositor Mr. Hunter já o anno passado expoz um cacho que peza- va 13 arráteis e 4 onças. Poderá algum dos leitores dizer-noa alguma cousa sobre este objecto? — O professor Vogel, de Munich, acaba de fazer uma serie de observações sobre os effeitos da agua camphorada nos ve- getaes, e partindo do principio de que 336 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA ella conserva a frescura ás Tulipas, etc, descobriu que as sementes velhas que tinham perdido quasi completamente as faculdades germinativas, germinam com muita mais facilidade do que as semen- tes novas submettidas ás condições ordi- nárias. As Ervilhas, por exemplo, que preci- sam de oito dias para germinar, desen- volvem-sc, quando tractadas com agua camphorada, no fim de três dias. A semente de Pepino que não germinaria no melhor solo, germinou muito bem de- pois de ter sido tractada com a agua camphorada. — Um jornal d'0de3sa diz que a pes- te bovina está causando gravíssimos pre- juízos. Segundo parece, os animaes che- gam a morrer pelas ruas. — Nos concelhos de Faro, Olhão e Ta- rira, fizeram -se este anno multiplicadas experiências de novos processos de poda e empa de vinhas, sendo de esperar que algumas castas, reputadas estéreis, dêem regular producção, quando submettidas a um tractamento apropriado ás suas necessidades. — N'este n." publicamos um artigo so- bre a fibra que se pode cxtrahir da ^??20- reira e do seu emprego. Este artigo foi publicado no «Com- mercio do Porto» d'onde, com a devida vénia, o extrahimos. — Como dissemos ha tempos, construiu- se no Jardim Botânico de Coimbra uma estufa expressamente para a cultura dos Fetos. Dizem agora de Coimbra que de- pois de se ter feito a mudança d'aquellas plantas, teem-se desenvolvido considera- velmente. — No principio d'cste anno o snr. dr. Júlio Augusto Henriques, director do Jardim Botânico de Coimbra, propoz em congregação da faculdade de phylosophia para se acabar com a eschola que alli existia plantada pelo systema de Linneu e converter todo o jardim n'imia só es- chola seguindo-se a classificação pelo sys- tema natural. — O aGarden» diz que as seguintes arvores e arbustos são muito apropriadas para os jardins á beira-mar : Abies Menziesii, A. nohilis, o A. orien- tali», Acer creticum e A, mompessula- num, Araucária imbricafa, Arlnitus (a maior parte das espécies), Atriplex Ha- limus, Aucuba japonica, Baccharis ha- limifolia, Buddlea globosa, Bupleurum fruticosum, Buxus (todas as espécies), Camellia japonica, Chamcerops humilis, Chenopodium fruticosum, Cineraria ma- rítima, Coluteaarborescens, Daphne Cneo- rum e D. pontica, Desfoitainea spinosa, Elceagnus (a maior parte das espécies), Escalonia (todas as espécies), Evonymut (todas as espécies de folhas persistente), Ficus carica, Garryaelliptica, Griselinia littoralis, Halimodendron argenteum, Hip- pohae rkamnoides, Hydrangea Hortênsia^ Ilex (todas as espécies), Lardizabala bi- ternata, Laurus nobilis, Lavandula Spi- ca, Leptospiermum lanigerum, Ligustrum (as espécies de folhas persistente), Ly- cium europmum, Myricaria germânica, Myrtus communis, Olea ilicifolia. Os- manthus ilicifolius, Pernettya (todas as espécies), Phillyrea (todas as espécies), PÍ71US macrocarpa, P. pinaster, e P. Sa- biniana, Pyrus salici folia, Quercus Ilex e Q. Suber, Raphiolepis ovata, Rham- nus alaternus. Puta graveolens, Santoli- na Chamcecyparissus, Sh^pherdia argên- tea, Tamarix gallica, Verónica Anderso- ni, V. decussata e V. salicifolia, Yucca (todas as espécies), e Zenobia speciosa pulverulenta. — No «Diário do Rio de Janeiro» le- mos ha dias o seguinte a propósito dos vinhos portuguezes: Os vinhos de Lisboa, branco e tinto, os da Figueira e os do Porto, communs, todos mais ou menos, teem soffrido alguma depreciação nos preços, havendo assim mesmo grande difficul- dade, sempre que se pretende realisar qualquer venda mais avultada. Se as entradas não cessarem por algum tem- po, dando logar a que o consumo possa ir di- minuindo o avultado deposito que existe, cre- mos que não será tão cedo que poderemos avi- sar mudança na situação d'este género. Apenas os de Collares e Ribatejo, de Dejan- te, tem escapado a esta depreciação geral. Sendo cada dia mais acceitos no mercado, tanto por sua pureza, que não admittc prepa- rações estranhas, como por suas qualidades tó- nicas e estomacaes, o que os torna mais que nenhuns outros próprios para o nosso clima, os vinhos d'este exportador tem conquistado entre nós uma posição que difficilmente será abalada. E não é só no Brazil e em Portugal que es- tes vinhos gosam da merecida reputação que tem sabido grangear. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 337 Na exposição vinícola, que ultimamente teve logar em Londres, foram os vinhos de Dejante escolhidos pelo jury portuguez com mui poucos outros, entre todos os vinhos de Portugal, para serem servidos no jantar, que alguns capitalis- tas inglezes oíFereceram aos iniciadores da crea- ção de uma companhia importadora de vinhos portuguezes em Inglaterra. — Do nosso collaborador Mr. Jean VerschaíFelt recebemos o mez passado o supplemento n.° 18 ao seu catalogo ge- ral. É inútil dizer-se que contém muitas novidades. — Mr. P. de Mortillet, de Tronche (Isère), annuncia como novidade as se- guintes Pereiras : Theresa — Fructo bastante grande, achatado, da forma da Bergamotta ; é verde claro fugindo para o amarello. A polpa é muito perfumada e amanteigada. Amadurece em setembro. Agrícola — Arvore vigorosa e muito fértil. Fructo magnifico. Amadurece em agosto. — Dizem-nos que a moléstia das Oli- veiras se tem desenvolvido considera- velmente principalmente na margem do Douro desde a Regoa até ao Porto. Informam-nos egualmente que tanto as Laranjeiras como as Tangerineiras estão também muito affectadas. — Os jornaes italianos noticiam que um ensaio feito em Itália o anno passado para a cultura da Tkea viridis (Chá), nSo dera bom resultado, e que este anno serão renovadas as experiências nos dis- trictos do sul d'Italia e para esse fim já se pediram sementes directamente do Ja- pão. Esta planta pertence á familia das Ternstraemiaceas, á qual também per- tence a Camellia, um dos ornamentos mais bellos dos nossos jardins. Nós vemos como ella ostenta o esplen- dor da sua vegetação em toda ou quasi toda a provincia do Minho, e foi isso, sem duvida, que levou Link a dizer: «Lorsqu'on voudra cultiver. le Thé en Europe, le pays le plus propre à choi- sir pour cet arbuste, serait, sans con- tredit, les provinces du nord en Portu- gal». Com eífeito a Thea viridis soffre os rigores dos nossos invernos e seria sum- mamente vantajoso que o governo man- dasse fazer alguns ensaios. Não os pedi- ríamos em grande escala, porque julga- mos que é sempre melhor caminhar slow and sure, como algures diz o príncipe dos poetas inglezes. Também ouvimos dizer, ha tempos, que a Sociedade Agrícola de Ponta Del- gada vae mandar vir um individuo da China para ensinar a industria da pre- paração do chá na ilha de S. Miguel, onde a planta do chá (Tkea viridis) ve- geta muito bem, e a Sociedade Promo- tora d' Agricultura Michaelense recebeu do snr. visconde de S. Januário, gover- nador geral de Macau e Timor, as indi- cações que em seguida inserimos e que podem aproveitar a quem quizer ensaiar aquella cultura. Eis as communicações do snr. viscon- de S. Januário: As plantações de chá obtem-se por meio de semente que deve ser lançada A terra em de- zembro. A semente deve ser comprada na Chi- na por pessoa muito conhecedora, para que não seja velha ou adulterada. O seu custo é dedous a três mil reis por cem litros. A semente tem o volume d'uma ervilha. Para um terreno qua- drado de 250 jardas, são precisas seiscentas li- bras de semente. — O chá dá-se bem nos terre- nos próprios para as i^aran/eiras, planos ou ac- cidentados, mas não muito, e que não sejam muito barrentos. E preciso também que o terre- no tenha alguma humidade, mas não muita. A semente do chá ao fim d'um anno perde as pro- priedades germinativas. A planta do chá começa a produzir um anno depois de semeada, mas só aos três annos toma o seu completo desenvolvimento. A máxima altura que o arbusto ou a planta deve tomar é uma jarda. Para isso poda-se e consegue-se as- sim que os rebentos sejam mais robustos, e pro- duzam mais folhas e maiores. O chá tem seis ou sete colheitas annuaes á medida que a ve- getação se vae desenvolvendo. Um terreno qua- drado de 250 jardas por lado pode produzir em cada colheita 150 libras de chá. Para obter semente deixam-se crescer livre- mente algumas plantas, que tomam a altura de três ou quatro jardas, e que aos cinco annos produzem já boas sementes. Depois de nascida a planta do chá limpa-se muito bem o terreno de todas as hervas, e cobre-se com uma cama- da de palha, para que não nasçam outras, e para que o sol o não seque muito. Os terrenos destinados á cultura do chá nem antes nem depois da sementeira precisam estru- me algum. E' só preciso que se achem muito limpos de herva, ou gramíneas. A colheita do chá pôde ser feita por mulhe- res ou rapazes. Dopois de colhida a folha é en- volvida, sêcca e depois torrada e preparada, se- 338 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA gundo a qualidade de chá que se pretende, por que a planta do chá é só uma, e as diversas qua- lidades de chá que appareccm no mercado pro- vem da preparação que se lhe dá. A planta do chá dá-se nuiito bem em districtos da China que estào na mesma latitude que os Açores, e que teem as mesmas condições de clima. Dá-se também em nmitas ilhas do Japào que estào nas mesmas condições. Occupando-se do cliá diz o «Garde- ner's Clu'onicle» que a cultura d'e3ta planta está bastante adeantada em An- jou e como este departamento da Fran- ça se presta admiravelmente para o des- envolvimento da Camellia experimentou- se cora excellente resultado o enxerto do chá n'esta planta a ponto que só um cul- tivador, Mr. André Leroy, que tem para cima de 100:000 plantas de chá conta de 400 a ÕOO enxertadas na Camellia. lia uma grande similhança entre estas duas plantas, a ponto de quasi se con- fundirem os enxertos do chá feitos na Camellia com as próprias Camellias. Se a temperatura não tem sido dema- siadamente fifia, a planta infloresce em abril e em outubro colhe-se a semente. Pcrgunta-se naturalmente se o chá pro- duzido em Anjou tem o aroma do chá da China. Infelizmente não o possue, nem a sua infusão tem gosto algum de chá. Mr. Maniére dAngers no «Reportório de Pharmacia» attribue esta circumstan- cia á ignorância do modo de seccar as folhas, ou talvez á ausência das mais aromáticas flores d'algum outro membro da farailia da Camellia que convenha mis- turar com o chá para lhe dar mais sa- bor. Nas investigações feitas para desco- brir a presença da theina como também do acido tannico nas plantas de Anjou, Mr. Manière achou que a primeira d'estas substancias existia em pequena quanti- dade, mas até hoje as suas experiências teem sido incompletas. — Segundo o relatório enviado ao go- verno pelo intendente de pecuária do districto de Braga, com relação ao estado da industria pecuária, no anno decorrido desde o 1.* de outubro de 1873 a 30 de setembro próximo findo, as perdas pecuá- rias podem avaliar-se em 45:114 cabe- ças, no valor de 134:487?5790 reis, sen- do uma terça parte d'e3ta8 perdas de- vida á fome. As espécies que mais soflPreram foram a ovina e a suina. — A direcção da sociedade agrícola de Faro resolveu publicar \xm jornal, com a denominação de «Jornal da Socie- de Agrícola de Faro», devendo sahir o primeiro numero no 1.° de janeiro pró- ximo. Será principalmente redigidopelo agró- nomo e intendente de pecuária d'aquelle districto. — Por varias vezes se tem occupado este jornal da arborisação do paiz, as- sumpto momentoso que deveria preoccu- par o espirito dos particulares e do go- verno com especialidade. Infelizmente pouco ou nada se tem feito n'esse sentido e os resultados da nossa incúria vão-sesentindode dia para dia e ainda ha de chegar uma epocha, que não vem longe, em que as madeiras terão de ser todas importadas para as edificações e outras obras em que é in- dispensável e os carregamentos que já nos chegam da Rússia e da Suécia são como que uma prevenção do que nos suc- cederá se não pozermos termo a este nosso proverbial desmazelo. N'um paíz como o nosso, em que as principaes essências florestaes se desen- volvem como no seu paiz natal, é real- mente para lastimar que não se cure se- riamente da arboricultura, de todas as culturas aquella que mais rende e que de menos capital carece. O «Campeão das Províncias» tracta- va n'um dos seus últimos números d'este assumpto e fazia algumas considerações que julgamos extremamente sensatas e que por isso passamos a transcrever de- sejando que sirvam de estimulo ás pes- soas que possuem terrenos incultos e que com uma insignificantíssima dcspeza po- deriam formar magnificas mattas. Dê- mos a palavra ao «Campeão das Provín- cias»: Toda a crente, sem grandes esforços de ima- ginação, sabe que, em vista do consumo cres- cente das madeiras, e combustiveis, não temos uns e outras para satisfazer por largo praso ás exigências das industrias variadas que o pro- gresso e a civilisação criam incessantemente. E não obstante essa convicção, ninguém cu- ra, nas altas regiões do poder, da arborisação conveniente do paiz. Os milhares de hectares de dunas do littoral, que tanto damnificam os JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 239 povos e os terrenos contíguos, são uma vergo- nha nacional, mau grado os estudos, i^latorios e orçamentos bem elaborados por homens com- petentíssimos na matéria. Lamentamos sinceramente tão grande mal; porque, além de perdermos terrenos, que ne- nhum outro emprego podem ter senão o da ar- borísação, legaremos a nossos filhos a pobreza florestal com todas as consequências funestas do nosso egoísmo, da nossa criminosa imprevi- dência. E' desanimadora uma tal perspectiva, que reclama o mais assíduo cuidado, a mais séria attenção dos poderes públicos. Montado como está, e devidamente organi- sado o serviço florestal, se o compararmos com as epochas decorridas, parece-nos azado o mo- mento para olharmos para esta questão d'alta conveniência social. Dê-lhe, pois, o devido impulso, quem não de- ve olvidar esse grande e impreterível dever. Já que aproveitamos o trabalho dos que lá vão, fa- çamos alguma cousa a bem dos que nos hão de substituir na lida constante da humanidade, nas agruras da vida precária da nossa fraca es- pécie. E' um dever a que, decentemente, não po- demos faltar. Tem razão o «Campeão das Provin- cias» 6 fazemos nossas as suas ideias. E justo que substituamos a indolência pelo trabalho e o e^"OÍsmo pela dedicação. — A Sociedade de Horticultura de Londres acaba de estabelecer uma sec- ção que será denominada «Pelargonium Society» e se occupará exclusivamen- te de Pelargoniums. Promoverá expo- sições especiaes e verificará quaes são as variedades que se recommendam mais, tanto sob o ponto de vista botânico como horticola. — Queixam-se-nos alguns cultivado- res de trigos que não os podem conser- var além do mez de novembro, em con- sequência de nos celeiros se desenvolve- rem pequenas borboletas e uns peque- nos insectos que picam o trigo e o cor- rompem. Isto está causando graves prejuízos e pedem-nos para obter alguns esclareci- mentos sobre o modo de combater este flagello. Dirigimo-nos pois aos nossos leitores e solicitamos que nos communiquem qualquer observação que por ventura tenham feito. — De uma publicação que offerece muito interesse principalmente para as pessoas que são dadas a trabalhos esta- tísticos, temos a accusar a recepção e a agradecer o offerecimento. Referimo-nos ao Relatório apresentado á junta geral do districto de Faro na sessão ordinária de 1874, pelo snr. go- vernador José de Beires, relatório que forma um grosso volume de duzentas e tantas paginas acompanhadas de diver- sos mappas. Este livro vem cheio de documentos importantes, muitos dos quaes o são tam- bém para a agricultura e n'este ponto tem o snr. governador civil prestado va- liosos serviços ao districto que lhe con- fiaram, já fazendo resuscitar a Socieda- de Agrícola que ha annos se considera- va morta, já dotando aquelle districto com um agrónomo activo e trabalhador, fa- zendo acquisição d'um terreno para uma eschola experimental, e emfim prestando muitos outros serviços que deixamos de especificar. — O snr. visconde da Esperança offe- receu ao Jardim Botânico da Universi- dade uma collecção das melhores varie- dades de Videiras do Alemtejo. Estes bacellos vão cultivar-se na eschola vití- cola da cerca de S. Bento, onde já exisr tem muitos exemplares de Videiras na- cionaes e extrangeiras. — É preciso que não haja descuido em plantar agora as arvores de folha ca- duca tanto florestaes como fructifera.s. O tempo tem decorrido muito propi- cio para estes trabalhos. — Já tivemos noticia da maçã Zeirioa, em que tinha empenho, o snr. Nicolau P. de Mendonça Falcão. O snr. Joaquim Augusto Mano, de Porto de Moz, escreveu ao proprietário d'este jornal offerecendo-lhe garfos da Macieira Leiriôa bem como d'outras. Aquelle cavalheiro falia n'uma maçã a que dá o nome de Pau preto e n'outra Espelho e diz que são de excellente qua- lidade. Os nomes dão a entender que são por- tuguezas, mas nós nunca ouvimos fallar n' estas variedades e por isso talvez que os seus nomes sejam puramente locaes e conhecidos sob outra designação. — D'um nosso amigo de Lisboa rece- bemos a seguinte communicação acerca da inauguração do estabelecimento hor- 240 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA ticola que o snr. Loureiro acaba de abrir em Lisboa: Foi no dia õ que se inaugurou a succursal horticola, que o snr. José Marques Loureiro es- tabeleceu na calçada do Salitre n.» 190. O sitio é bonito, porque domina o alegre vai de Pereiro, mas o terreno é um pouco ingrato, porque nào tem agua e nào deixará dar ao estabelecimento do snr. Loureiro o desenvolvimento que este deseja. Eram cerca das 3 boras da tarde quando appareceu o snr. D. Fernando acompanhado pelo seu camarista, o snr. conde de Santiago. Sua Magestade andou examinando attentamen- te e como distinctissimo amador algumas das plantas mais notáveis como Palmeiras e Fetos. Estavam presentes alguns cavalheiros dis- tínctos como o dr. Goeze, sábio director do Jar- dim da Eschola Polytechnica, Braamcamp, D. Luiz de Mello Breyner, Pinto da Fonseca, etc. Sua Magestade, acompanhado do snr. Loureiro, demorou-se a conversar com alguns d'elies c perante o snr. Braamcamp teceu grandes elo- gios ao snr. Loureiro pelos serviços que tem prestado ao paiz no ramo da horticultura. Sua Magestade prometteu vir outro dia, acompanhado pela snr''. condessa d'Edla, para fazer acquisiçâo de algumas das mais notáveis plantas. O snr. Loureii'0 offereceu ao snr. D. Fer- nando dous ricos boiíquets, mandados vir cx- pres.samente do seu estabelecimento do Porto, um d'elles era formado de folhas de plantas ri- cas e ornamentaes e outro de flores raras, entre as quaes sobresahiam bellas Orchideas. Durante aquelle dia visitaram o estabeleci- mento algumas senhoras da nossa distincta so- ciedade e que presam os encantos de Flora. Estimamos que o snr. Loureiro receba a condigna animação dos amadores lisbonenses, pois é digno de toda a recompensa pelos exfor- ços que tem empregado para coUocar a horti- cultura á sua verdadeira altura. Pela nossa parte estamos de accordo e oxalá que a prosperidade seja o galar- dão do trabalho útil e honesto. — A casa Dick Radclyffe & C", uma das mais acreditadas para objectos hor- tícolas e de ornamento para salas, en- viou-nos ha dias o seu ultimo catalogo. Por muitas vezes nos temos já occu- pado d'este estabelecimento, cujo ende- reço aqui damos aos leitores : 29 High Holborn W. C. — London. O ultimo catalogo traz algumas novi- dades que são representadas em bellas estampas. — Já recebemos noticias, com quanto resumidas, do Congresso sericola e vití- cola que noticiáramos no n." passado. Parece-nos que ó caso para se dizer cá e lá más fadas ha, porque segundo as informações que temos, devidas á obse- quiosidade de um dos membros do Con- gresso, as cousas não correram como se- ria para desejar. Como disséramos, um dos assumptos de que se deveria tractar com mais at- tenção era a nova moléstia das vinhas que todos os dias vae causando maiores prejuízos tanto cm França como aqui. Isso porém não passou de palavríado de programma porque, pelos modos, tractou- se a questão o mais superficialmente pos- sível e para se acreditar isto basta dizer que quando os oradores subiam á tribuna eram desde logo prevenidos de que deve- riam ser breves e que não era permít- tido lêr-se qualquer impresso ou mesmo manuscripto. Lastimamos esta maneira de proceder e muito mais quando esperávamos que d'este Congresso dimanasse alguma luz sobre a questão da nova moléstia. Ficamos porém como estávamos. Concluiu-se que unicamente a submer- são era efficaz, que certas espécies de Videiras americanas resistiam á molés- tia e. . . mais nada. Com pouco se contentaram ! — Mr. J. Línden, de Gand, conjunc- tamente com o marquez delia Valle de Casanova, fundaram um estabelecimento horticola em Pallanza, nas margens do lago Maggiore. — Mais uma vez somos chegados ao termo da nossa viagem, não para descan- çar, que n'este caso o descanço seria des- animo, mas para ncrcorrer de novo o nosso caminho, já agora, felizmente, al- guma cousa enflorado. Completa hoje cinco annos de existên- cia o Jornal de Horticultura Pra- tica, o único periódico no seu género existente em Portugal. Não queremos encarecer a nossa persistência nem tam- pouco ostentar os modestos louros da nos- sa campanha. Cumpre-nos simplesmente agradecer a todas aquellas pessoas que nos tem prestado, n'este longo tyrocinio, já a sua valiosa coUaboração, já outro qualquer auxillio. Esperamos encontrar do novo os nos- sos antigos amigos e com esta esperança proseguiremos na nossa estrada. Oliveira Júnior. omâ k gtfrMíttm §mím PORTO — TYP. DE BARTHOLOMEU H. DE MORAES — ROA DA PICARIA, 5o A 5^. índice Adansonia digitata 163 Adubos (Os) chimicos .... 82 Acer campestre foi. maculatis. . 235 Aesculus Hippocastanum . . . 143 Aphis persicae 224 Araucária brasiliensis .... 66 Araucária Cookii 51 Araucária excelsa speciosissima . 32 Arvores (As) da Quina em Cabo Verde e na Madeira. . . .142 Arvores transplantadas — Devem- se podar as 181 Azáleas 85 Azeite nas azeitonas — Formação do 73 Batatas — A nova moléstia das . 148 Bibliographia . . 8, 121, 154, 165 Boehmeria tenacíssima .... 201 Bougainvillea spectabilis ... 48 Bromelia acanga 126 Bromus Schraderi . . 3, 22, 45, 61 Cactos — Algumas palavras acerca dos 52 Camellia — Propagação da. . ,110 Carnívoras — As plantas ... 68 Chronica Horticolo-agricola 14, 34, 54, 76, 93, 116, 137, 155, 175, 195, 216, 236. Citrus — Estudo do género. 133, 149 Conferencias vinicolas . 192, 212, 225 Cordyline indivisa 49 Dahlias portuguezas .... 1 Divisões — As sete . . . 128, 207 Estrume de herdade — O gado e a fabricação económica do. . . 92 Figueira violeta 81 Florestas (As) não seccam o solo . 9 Fogo sagrado 32 Fraxinus aucubaefolia . . . .211 Fuchsia corymbiflora .... 141 Gados (Os) de engorda. ... 25 Gramínea ornamental — Nova . . 63 Habrothamnus elegans . . . .175 Hervas — Meio de destruir as más 42 Hortênsias azues — Meio de obter. 67 Imbondeiro 163 Jaborandi — Questão da identidade 103 Jardins notáveis de Portugal . . 230 Kalmias 85 Laranja pêra 67 Laranjeiras — Poda e limpeza das 64 Louvor immerecido 101 Maçãs escolhidas pelo congresso pomologico de Vienna ... 54 Mangifera indica — Fructificação da 7 Moléstia das Batatas .... 148 Moléstia das vinhas — A nova 42, 86, 112, 148, 170, 182; 208. Morangueiros — Dever-se-ha suppri- mir 03 estolões dos .... 230 Oliveiras — Poda e limpeza das . 172 Pão — O melhor. . . . 102, 195 Parque das Buttes Chaumont . .104 Pecego Reine des Vergers. . . 41 Pêra Belle Angevine ... .91 IV índice Pag. Pêra Duqueza de Angoulcme . .221 Pêra Serrurier 21 Plantação — Alguns esclarecimen- tos sobre a 162 Plantas (As) carnívoras Plantas herbáceas — Sobre algu- mas das Plantas industriaes e medicinaes que podem ser acclimadas em Por- tugal as Plantas de sala — O pó Poda dos arbustos . Polygala myrtifolia . Ramie — Cultura do Rhododendrons . Rótulos nas arvores fructiferas 68 30 201 161 14 9 201 85 82 Pag. Sala — Plantas de 161 Solandra grandiflora .... 187 Solanum tuberosum 127 Solanums recommendaveis . . . 229 Stapelia grandiflora 174 Subterrâneo do Fleuriste de la Muette 202 Thermometro vegetal .... 32 Victoria regia 28 Videiras (As) do estabelecimento Loureiro 205 Videiras — Reproducção de . . 29 Vinhos corados artificialmente. . 50 Vinicultura portugueza 90, 107, 129, 145, 168, 188. índice da ghroniga OLIVEIRA JÚNIOR JANEIRO A exposição de vinhos em Londres — Jantar dado pelo commissario portU'^ guez — Producção do casulo no districto da Guarda — Plantações effectuadas nas mattas a cargo da direcção das obras publicas do Mondego, etc. — O commercio dos pecegos em Pariz — Exposição internacional de fructas em Edimburgo — Flo- rescência do Anthurium Scherzerianum — Tacsonia Buchananii — Catalogo das plantas á venda nas mattas do Choupal — Melhoramentos realisados recentemente no Jardim Botânico de Coimbra — Extracto do Relatório da administração geral das mattas do reino, com referencia ao anno económico de 1873-1874 — O Jardim da Eschola Polytechnica de Lisboa — O Jardim da Praça Príncipe Real — Catalo- go dos snrs. Charles Huber & C.'° — Os boulevards de Vienna — Catalogo de se- mentes da quinta de Mr. Gressent — Estudo da moléstia das Laranjeiras — O Ai- lantus glandulosa, empregado como remédio contra a dysenteria — Rusticidade do Eucalyptus globulus — Fructas obtidas em 1873 — Processo para a conservação das Camellias — Aula d'agricultura em Setúbal — OfFcrecimento de plantas ao Jar- dim Botânico do Coimbra — A agricultura cm França — A cultura do Chá em Por- tugal 14 FEVEREIRO O Phylloxera vastatrix na Áustria — Algumas palavras sobre a nova molés- tia das vinhas — Estudo do dr. Rocslor sobre a nova moléstia das vinhas — Nova publicação hortícola em llespanha — Exposição hortícola em Gand — Uma obra útil — A Tydaca Madame Heine — Carta do Mr. Jules Meil sobre o Eucalyptus lííDlCÊ V globulus — Utilidade da sua plantação nas nossas possessões — Transcripção— ^ «Manual Pratico do Agricultor Indiano», pelo snr. Bernardo Francisco da Costa — A camphora applicada contra os insectos qne roem o trigo — Qual é o fim do agricultor? — Exportação de cortiça para Inglaterra — Cousas municipaes — Meio de destruir a lagarta — A fecundação artificial — Uma succedanea da Quina — Fal- lecimento de Markara Nesfield— As pennas dos árabes e dos musulmanos — Dos Cogumelos— Uma Nynpbaea nova — Escolba de Begónias bolbosas — Um ama- dor 34 MARÇO Carta ao snr. D. Joaquim de Carvalho Azevedo Mello e Faro — Acto de van- dalismo— «Jornal dos Agricultores do Algarve» — Laranja preta — Pêra FaVorite Morei — Congresso Sericola em Milão — A nova moléstia das vinhas em Génova — Relatório sobre a apparição do Phylloxera vastatrix na Áustria — «Les Fougéres» —Catalogo dos snrs. Dick Radcliffe & C.° — Influencia da agua pura na engorda do gado — Conflicto entre o conselho de administração do Jardim Botânico de Bru- xellas e o seu presidente — «Index Seminarii Horti Botanici Academici Conimbri- censis», 1875 — Maneira de atrazar á vontade a florescência das plantas — Errata : carta do snr. conselheiro Camillo Aureliano — Sobre a importação da Batata — A sua introducção em Portugal: documento importante — O «Mosaico», folha litte- raria e scientifica — A propósito das Quinas — Varias considerações sobre o as- sumpto— Poder-se-hão acclimar em Portugal? — Parallelo entre o serviço do arado primitivo e os de moderna invenção — Opinião do Shah da Pérsia sobre os jardins da Europa. ... * 54 ABRIL Carta do snr. George A. Wheelhouse sobre a jardinagem municipal — O jar- dim da Cordoaria e a substituição das Tilias — O jardim de S. Lazaro — As ar- vores das ruas e o podão municipal — Protesto— As Magnólias da praça de D. Pedro — O cemitério d'Agramonte — Eucalyptus colossea— Creação do logar de agrónomo oíficial no districto de Bragança — A Flora dos Estados-Unidos — Vanta- gens da cultura do Feijão preto — A horticultura na Inglaterra e na Rússia — A casa Cárter de Londres — Adiantum Farleyense — Composição resinosa para en- xertos— Fructa escolhida pela Sociedade Pomologica de França — Expedição ao polo do norte — Transcripção — O governo italiano e o Phylloxera vastatrix — Amei- xieira que floresce duas vezes —Fallecimento de Mrs. Hooker .... 76 MAIO Regras geraes a que se devem submetter as Pereiras — Florescência da Bill- bergia vitatta — O «Cenáculo» — Extracto — «Annuaire de THorticulture Belge» — Estações oenologicas — Carta vitícola do reino — Eucalyptus amygdalina — Planta- ção de Eucalyptus na via férrea — Quantidade de travessas que se gasta nos ca- minhos do ferro dos Estados-Unidos — Zamia Lindeni — Monumento em memoria do botânico von Siebold — Novo remédio para combater o oidium — A propósito da emigração — A jardinagem portuense — Vandalismo municipal— A Beterraba — Experiências sobre o movimento que a agua tem no interior das plantas . 93 JUNHO A cultura do Chá na ilha do S. Miguel — Programma da Exposição Interna- cional de Horticultura em Colónia — A quinta regional do districto do Porto e a yi índice junta geral do districto — Expediente — A exposição de Gand — Communicação do snr. José do Canto — Pergunta — «Manual de Viticultura Pratica» — Visita de El- Rei o snr. D. Luiz I ao estabelecimento do snr. Mello Breyner — Sobre a acclima- ção das Quinas em Portugal — Catalogo dos snrs. Charles Huber & C.'^ — Esta- belecimento Linden — OfFerecimento de plantas á camará municipal de Lisboa — A «Republica das Lettras» — Novo remédio para a moléstia das vinhas — Catálo- gos de MM. J. Linden e Vilmorin Andrieux & C.'<' — Programma para a Expo- sição Regional da Galliza — Tributo que pagam na Suissa as pessoas que ca- sam H" JULHO Carta do snr. dr. Basilio Constantino d'Almeida Sampaio a propósito da emigração — Considerações sobre a emigração — Modificações que pôde soffrer o colorido das flores naturaes — Observações do professor L. Gabba — Offerecimento feito a Mr. A. De Caudolle pela Federação das Sociedades de Horticultura da Bélgica — Catalogo de Mr. Alégatiòre — Carta do snr. José Marques Loureiro — A jardinagem publica e a camará municipal — Pede-se justiça 137 AGOSTO Serviços prestados pela iniciativa particular á jardinagem municipal — A Bate- ria da Victoria — Parabéns ao snr. Alexandre Soares Pinto d'Andrade — Os jar- dins regulares e os irregulares chamados «á ingleza» — Arcos de ferro para jar- dins e passeios públicos— Carta de Mr. Le Hardy sobre as Videiras rebeldes ao Phylloxera — «Questões do Pará», pelo snr. D. A. Gomes Percheiro — Varias con- siderações sobre a emigração — Á «Revue de Tllorticulture Belge» — Desenvolvi- mento de algumas espécies de Eucalyptus — Catalogo de Mr. Augusto Van Geert — Destruição das Couves na America — Acquisição de Videiras feita pelo Jardim Botânico de Coimbra — Fabricas dassucar na AUemanha — Carta do snr. Mar- ques Loureiro — Processo de cultura de vinha, adoptado pelo snr. António Au- gusto Alves Guimarães — Congresso e Exposição Internacional de Pomologia em Gand — Nova variedade de Sequoia sempervirens — Exposição Hortícola no Chili — Visitantes ao Jardim Botânico de Kew — Florescência do Cupressus macrocarpa — Senecio foliosus — Stipa gigantea — Experiências sobre a absorpção do oxygenio e emissão de acido carbónico pelas folhas — Mr. Ed. Morren — Desenvolvimento da cultura da Quina na índia — «Revista dei Instituto Agrícola Catalan de S. Isidro» — A arborisação em Vizella 155 SETEMBRO «Manual de Arboricultura», pelo snr. Alexandre de Souza Figueiredo — Fallecimento de Mr. Edmoud de Ghellinck — A taça Cárter — «Esboços c Recor- dações», pelo snr. Brito Aranha — Creação d'um Jardim Botânico em Clúcago — Compra de Aruntiaccas — A propósito da destruição do Phylloxera — Medidas ca- marárias— A «Actualidade» — «Livro de leitura para as escholas ruraes»? pelo snr. João Félix Pereira — A Exposição de Barcelona — O Phylloxera vastatrix na Gal- liza— A arborisação em Coimbra — Conferencia vinícola pelo snr. António Au- gusto de Aguiar — Podca e limpeza das Oliveiras — Composto chimico — Ornamon-. tacões floraes em Guildhall — OíFcrecimento de plantas ao Jardim Botânico de Coimbra — Analyses de cascas de Quinas — Novo jardim em Manchester — Cata- logo do snr. José Marques Loureiro — As ruas e as arvores — Uma nova moléstia das vinhas em Itália — O que valem os Agriões em Pariz — Fallecimento de Mr. André Leroy I75 índice OUTUBRO VII A jardinagem nas cidades — A jardinagem em Lisboa — Bibliotlieca horticola fundada pela Camará de Lisboa — Acclimação das Quinas no Algarve — A questão Welwitsch — Vinho fabricado com as uvas da eschola ampelographica do Jardim Botânico de Coimbra — Consequências da desarborisação — Proposta para ajardinar o largo do Rato — Visita de S. M. el-rei D. Luiz ao estabelecimento do snr. José Marques Loureiro — A collecção de Orchideas de El-Rei — Resposta do snr. dr. Júlio Augusto Henriques ao snr. Visconde de Monte-São, a propósito dos RR lan- çados a dous estudantes nos exames de botânica — Catalogo dos snrs. Brandão & Costa — Catalogo de MM. Vilmorin Andrieux & C.^'' — «Cultura das arvores fru- ctiferas — Pereiras, Macieiras e Pecegueiros», pelo snr. conselheiro Camillo Au- reliano da Silva e Sousa — O artigo «Melhor pão», do snr. George A. Wheelhouse — Creação do bicho da seda do Ailanthus — Plantações de Eucalyptus na Argélia, e seus eíFeitos — Nova espécie de Eucalyptus — A jardinagem da cidade O que escreveu o snr. Francisco Pinto Bessa sobre a jardinagem das cidades no relató- rio da sua viagem a Pariz e Londres, e o que nós temos escripto sobre o mesmo assumpto 195 NOVEMBRO Florescência da Fourcroya rigida no Jardim Botânico de Coimbra — Producção do trigo nas diversas nações — Conservação dos. ovos segundo o processo de Mr. Durand — Regras para quem quizer cultivar as arvores fructiferas proveitosamente para o commercio — Meio de afugentar as moscas — Fraude e processo contra um horticultor inglez — Visita ao Porto, do botânico Mr. George Maw — Plantações feitas este anno em Pariz — Duas palavras sobre as Begónias tuberculosas — Es- cripto curioso do snr. António Girão — Os Eucalyptus na Argélia — «Les Roches», por Mr. Edouard Janettaz — Relatório apresentado á junta geral do districto de Faro^ na- sessão -ordinária de 1875, pelo conselheiro governador civil José de Bei- res— Borboleta que ataca as Laranjeiras na Austrália — «Breves apuntes sobre el cultivo en nuestra localidad de las Begónias, Camellias, Caladiums y plantas crazas», pelo snr. Francisco Ghersi — Club Loudon — Novo processo de cultura da Tetragonia expansa — Catalogo do Horto Portuense — Exposição Internacional de Bruxellas — «Tratado da Farmácia Operatória», pelo dr. Raimundo Fors — Pêra Clapp's favourite — Jorge H dlnglaterra e as flores dos seus jardins . . 216 DEZEMBRO «Manual de Viticultura Pratica», pelo snr. visconde de Villa Maior — Ro- seiras novas, obtidas por Mr. Joseph Schwartz — Distincção conferida a Mr. Del- chevalerie — Fructificação da Mangifera indica no Jardim Botânico de Coimbra — O Eucalyptus marginata — Razões por que morrem algumas arvores adultas — Flo- rescência do Crinum asiaticum ao ar livre — 'Assucar de feno — Plantações feitas nas mattas do Mondego — O primeiro boulevard da Europa — Eífeitos da cal na preservação da madeira — O agricultor e as toupeiras — Anniversario — Despedida do Chronista 240 GRAVURAS Pag. Acácia melanoxylon — Porte da . 99 Acer campestre foi. maculatis . . 235 Arcos de ferro para jardins . .155 Arcos de ferro para passeios públicos 155 Bromelia acanga 127 Bromus Schraderi 61 Cascata das Buttes Chaumont. . 105 Cordyline indivisa 49 Dahlia Adelaide Sarmento (Não Ad- ministrador Sarmento) ... 3 Dahlia Camillo Aureliano ... 1 Dahlia Carolina 3 Dahlia Duarte de Oliveira. . . 1 Dahlia marginata 1 Desbaste da copa das arvores trans- plantadas 181 Enxerto da Camellia ao ar livre — systema Cornélis 111 Enxerto da Camellia ao ar livre — systema barão Tschuody. . .111 Figo Violeta 81 Fraxinus aucubaefolia . . . .211 JPag. Fuchsia coryrabiflora .... 141 Habrothamnus elegans . , . .175 Hecatombe (A) de 22 de fevereiro de 1875 97 Hydropulvis 161 Laranja pêra 68 Pecego Reine dos Vergers. . . 41 Pêra Duqueza de Angoulême . .221 Pêra Serrurier 21 Poda dos Platanus em frente d'e8ta redacção 99 Poda á escovinha applicada á Acá- cia melanoxylon 99 Polygala myrtifolia 9 Polygala myrtifolia — Flor da. . 9 Praça dos Voluntários da Rainha . 99 Solandra grandiflora . . . .187 Solanum pseudo-capsicum nanum . 229 Subterrâneo do Fleuriste de la Muet- te 203 Taça Cárter 79 Videira — Estaca de .... 29 TOTAL: 39 GRAVURAS JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA DAHLIAS PORTUGUEZAS Não é a primeira vez que temos pro- clamado n'este jornal a utilidade e con- veniência das sementeiras. É por ellas que as mimosas filhas da nobreza de Itália teem enriquecido os jardins da Europa com as suas lindíssi- mas Camellias. Que bellezas não apparecem todos os Fig. 1 — Dahlia Duarte de Oliveira annos devidas ás reiteradas sementeiras! Lá se vê uma, tão formosa, tão deli- cada, tão bem posta, que os amadores exclamam : — Parai, filhas do Tibre. — Esta é a belleza das bellezas, é a ultima palavra. Enganam-se ; porque no anno seguinte, ahi vem outra, ainda mais bella, mais Fig. 2 — Dahlia Marginata Fig. 3 — DaUia Camillo Aureliano delicada, mais encantadora ; e no anno seguinte outra, e outra, e outra, e é en- tão forçoso concluir que a sementeira não tem limites, e que a natureza é inexgo- tavel nas suas producções. O que acontece com este formoso gé- nero, dá-se com o Rhododendron, com a Azálea, com o Pelargonium, com a Vol. VI.— 1875 Roseira, com a Dahlia^ e com tudo quan- to pôde reproduzir-se pela semente. Todos os annos os catálogos dos esta- belecimentos de horticultura da Europa vem recheados de novas acquisições, de- vidas ás sementeiras, e muitas vezes re- putadas por preços fabulosos. E que fazemos nós no meio d'este mo- N.° 1 — Janeiro JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA vimento progressivo? Ler esses catálogos, escolher com o auxilio de pomposas des- cripyõcs aquillo que nos parece melhor, mandar vir, o ficar muitas vezes desnor- teados pelo engano em quo cahimos. E com isto nos contentamos, sem nos lembrarmos que uma pouca de curiosi- dade nos poderia dar tão formosas pro- ducyões, senão melhores, que aquellas porque vamos dar grosso cabedal. Mas estou vingado do desleixo dos nossos horticultores. Saibam elles, que cm um cantinho de Portugal existe um amador distincto, um caracter elevado, que para amenisar o atribulado e espi- nhoso mester de julgar, se entretém com o passatempo mais innocente que eu co- nheço— a cultura das flores. A sua dedicação especial é votada á sementeira das Dahlías e tem obtido a coUecção mais bella que eu conheço. Ain- da não vi melhor importado do extran- geiro. Pezar tenho eu que as forças d'este Jornal não permittam exhibir coloridas as lindas amostras que apresentamos. A belleza da sua íjrma, a sua regulari- dade e o colorido não podem ser exce- didos. Parabéns, meu illustre collcga, exc."^" António Augusto Cabral de Souza Pires, digníssimo juiz de direito na comarca de Villa Nova de Famalicão, pelas bellas acquisições que tem feito com as suas se- menteiras. Penhorado em summo grau pelo dona- tivo que me fez das 22 variedades da sua rica collecção, obtive do proprietário d'e3te Jornal a faculdade de as apre- sentar aos seus assignantes. Tenha o coUega a satisfação que todas desabrocharam pomposamente no meu jardim, onde foram admiradas pelos que as viram e examinaram detidamente. Os quatro Flox que também me en- viou, como amostra da sua sementeira, em nada desmereceram ás qualidades dos pães. Em meu nome, em nomo do Redactor principal d'este Jornal, o do seu proprie- tário lhe agradecemos a honra que nos fez do distinguir cora os nossos nomes três das suas mais bellas acquisições. Concluirei com a descripção das va- riedades aqui estampadas, e de algumas outras ; e, com a relação dos nomes de todas com que fui brindado. Dahlia Duarte de Oliveira — É Lili- putiana ; mui bem formada, a cor geral é rosa desmaiada, muito encanudada, alguns semiflorões cor de canário, outros cor de rosa viva; a mistura das três co- res é de um effoito bellissimo, algumas vezes dii flores totalmente rosadas. Carolina — É uma Dahlia Liliputiana, mui bem formada, regular, cor de palha com as pontas brancas, algumas vezes dá flores metade brancas, e metade cor de palha; é mui bella. Administrador Sarmento — E uma Dah- lia, cujo colorido inteiramente novo é difícil de descrever ; contei-lhe quatro co- res imbutidas na mesma flor: a cor bran- ca, rosa desmaiada, rosa carregada, o amarello desmaiado, e uma cor assalmo- nada: a mistura d'estas cores torna esta Liliput de uma belleza singular. Marginata — Dahlia Liliputiana, muito regular, e encanudada, a cor geral é rosa desmaiada, e todos os florões e se- miflorões orlados engraçadamente de roxo claro ; é uma flor de grande mimo. Camillo Aureliano — Esta Dahlia ó de todas a mais Liliputiana, anã, não ten- do o arbusto mais de trinta eentimetros d'altura ; a sua flor, em miniatura, tem a cor geral de um lindo vermelho acar- minado e as pontas brancas recortadas. Esi^lendida — Dahlia de um tamanho médio, muito bem formada, regular, olho verde, no centro é branca; cor geral rosa delicada, todos os florões e semiflorões or- lados de carmim. E notável esta Dahlia pela frescura do seu colorido. Duque de Saldanha — Dahlia Lilipu- tiana. Olho verde, cor geral castanho cla- ro avelludado, todos os florões e semiflo- rões recortados na ponta. Rajada nova — Liliputiana, olho ver- de, cor geral castanho escuro avelludado, todos os florões o semiflorões estriados e ponteados de cor d'ouro. E uma belleza, mas como não ha belleza sem senão, tem esta Dahlia o mau sóstro de se deixar singelar um pouco no fim da estação. E na verdade uma pena. Fora talvez con- veniente, que o illustre obtentor colhesse semente d'clla; e a semeasse a vêr se po- JOBNAL DE HORTICULTURA PRATICA deria obter alguma mais dobrada com o mesmo colorido. Canário — Liliputiana, mui bem for- mada; regular, muito encanudada, cor geral amarello canário, todos os florões e semifloroes orlados de roxo. Maria da Gloria — De grandeza me- diana, muito bem formada, olho verde, cor geral da aurora aclarando para a peripheria; o fundo dos florões e semi- ^^y^^,. s-'úciwttiatJ Fig. 4 — Dahlia Administrador Sarmento tiana, muito regular, encanudada, olho verde, cor geral roxo escuro avelludado, com a notável singularidade de appare- cer a parte inversa dos semiflorões de uma cor mais clara e não avelludada so- bre as outras mais escuras, formando um bello contraste. Gran Mogol — Grandeza mediana, muito regular, cor roxa escura toda es- triada de negro : é um colorido novo mui bello. Relação dos nomes Administrador Sarmento Barão de Joanne Baroneza de Joanne Bernardim Ribeiro florões é amarello claro, o centro amarello tostado, e as extremidades rosa clara, a reunião próxima d'estas três cores forma um todo exquisito mas bello. Marques Loureiro — É uma Dahlia de grandeza mediana, muito regular, enca- nudada e bem formada; a cor geral é de carmim vivo, pontas brancas recor- tadas. Visconde de Seabra — Dahlia Lilipu- Fig. 5 — Dahlia Carolina Brilhante Canário Carolina Camillo Aureliano Dona Maria Henriqueta Duarte de Oliveira Duque de Saldanha Esplendida Grran Mogol Maria Adelaide Maria da Gloria Marginata Marques Loureiro Multicolor Rajada nova Visconde de Seabra. Camillo Aureliano. BROIUS Rendimento em grão — O hectare, ao segundo corte (1863), deu 65 hectolitros de grão. Suppondo o primeiro d'egual SGHRADERI ' força, era de esperar que a colheita no (1) Vide J. H. P., vol. V, pag. 232. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA mesmo anno e no mesmo terreno fosse de 130 hectolitros. A experiência, po- rém, demonstrou que o rendimento do segundo C()rtc não era tão considerável quando já se tinha deixado o primeiro tomar grão. É possivel ainda obter-se uma terceira colheita, mas nunca certa- mente no primeiro anno de sementeira. É de notar que no outomno é muito me- nos regular a formação da espiga apesar de ser muito grande, n'esta estação, o vigor da nossa planta. Reconhecemos que n'um solo ariento o rendimento em grão era muito mais con- siderável que nas terras francas, pelo me- nos, emquanto ao primeiro corte. Nos legares húmidos o grão é pouco abun- dante; é pequeno e meno-í pecado. Como a maior parte dos agricultores só tinha podido alcançar algumas gram- mas de semente de Bromus Schraderi, dedicaram-se sobretudo a produzil-a. O conde Benoist d'Azy, com um quinto de litro, o máximo, colheu 35 litros de semente, afora a muita que cahiu na terra. Mr. de la Salle escrevia-nos cm 27 d'agosto que com a pequena quanti- dade de semente que lhe mandáramos na primavera e que elle semeara (no Loirct) em 12 de maio, tinha já colhido 1 kilog. 500. Mr. Fúria, no Jura, tinha apenas a semente necessária para cobrir um can- tinho de terreno de 1™,30 por 1 metro. Fez a sementeira a 10 d'abril e em 15 de junho começava a sua primeira co- lheita, que lhe rendeu 2 litros e ^s^ Mr. Rochellc, próximo do Chateau-du-Loir, chegou com 100 sementes a colher 3 a 4 litros. EmíimMr. Proyart (*), no Pas-de- Calais, pôde com 1 só kilog. obter 74, algarismo assaz eloquente para que seja necessário insistir mais sobre o conside- rabilissimo rendimento em grão d'esta Giriminea. O grão do Bromus Schraderi é dos mais leves, pois o hectolitro não pesa se- não 20 kilog. 350, o que é quasi meta- de do peso da aveia, e só o terço do da cevada nos nossos arredores (^). Se o grão é tão pouco pesado, em compensação a (1) "Journal crAgriculture Pratique», 20 de novembro do 18(51. (2) O príio do Brormis d'uina cultura dos subúrbios de Pariz pesava ainda menos. O hc- sua abundância, como se vê, é muito grande. Insistimos n'este ponto por estar- mos convencidos que os grãos quasi madu- ros contidos na forragem verde e o feno são uma das causas dos excellentes efiFeitos d'esta forragem. Além d'isso, em casos de necessidade e em circumstancias mui- to restrictas, este grão pôde ser dado ás aves cazeiras ; os gansos, os patos, e so- bretudo 03 perus comem-n'o com prazer, apesar das grandes glumas que o envol- vem. Ao principio as gallinhas rejeitam- n'o, depois acabam por comel-o, mas nun- ca com avidez. Muitas pessoas, e principalmente o marquez de Leusse («Journal d'Agricul- ture Pratique», 20 d'outubro de 1864), pensam que este grão poderia substituir a aveia em certos casos. Eífectivamente tom um aspecto bastante similhante ás variedades brancas d'este precioso ce- real, á da Hungria, por exemplo, e os cavallos comem-n'o bem, mas o seu peso nos parece demasiadamente leve para que se possa, excepto algumas vezes, cultival-o para este emprego, apesar da quantidade considerável de grão que se pôde obter e da qualidade forraginosa da palha. Para colher este grão, que é muito caduco, perdendo o menos possivel, de- ve-se de preferencia fazer o corte pela manhã e malhal-o no mesmo terreno; porque o emolhar, o carregar, os trans- portes e as descargas fazem cahir muito. E' preferivel não esperar por grande ma- dureza, porque as espigas contéem grãos maduros, apezar de terem um aspecto um pouco verde. Valor nutritivo — Vendo a avidez com que os no^ísos animaes consumiam esta forragem, resolvemos cultival-a a titulo de ensaio comparativo com algumas ou- tras espécies para indagar qual pode- ria ser o seu valor real. Cedo observamos que este alimento dava os melhores re- sultados nas vaccas leiteiras; o leite au- gmcntava sensivelmente e a sua boa saúde era digna de nota. Dous porquinhos New- Leicester de nove mezes, aos quaes se ctolitro tinha apenas 17 kilogrammas, mas de- vemos accrcscentar que este grào fora coibido antes de completa maduraçào. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA dava apenas uma ração de forragens misturadas, como o indicou Mr. Dezei- meris, foram postos no regimen do nosso Bromus, e não tardamos a descobrir que estavam engordando. Fizemos mal em não tomar conta mais exacta, pezando-os em epochas determinadas. Mas podemos pelo menos apreciar assim o regimen d'e3ta alimentação. As analyses que damos mais adiante mostram que o Bromus Schraderi con- tém em doze mais elevada o azote que outra qualquer forragem. Não nos atreve- mos todavia a concluir que o seu valor nutritivo fosse maior antes que a expe- riência o viesse confirmar d'um modo certo. Seria precioso poder associar ao 5ro- mus Schraderi uma planta Leguminosa co- mo o Sanfeno ou o Trevo, mas receia- mos que não haja facilidade em encontrar uma espécie d'esta familia que se desen- volva desde logo vigorosamente para não ser abafada e brote nas mesmas epochas que a nossa planta. Por emquanto ainda não fizemos nenhuma tentativa a este res- peito. Haveria mais probabilidade em juntar outras Oramineas ao Bromus; esta associação produziria sem duvida menor eíFeito do que se fosse uma Leguminosa, mas em todo o caso quebrar -se-hia a unidade de alimentação, que existe ne- cessariamente quando o sustento consis- te n'uma forragem cultivada só. Para o regimen dos gados está isto bem reco- nhecido que é uma condição pouco favo- rável, posto que na pratica seja im- possível o mais das vezes livrarmo-nos d'ella. Influencia na producção do leite — A alimentação das vaccas leiteiras com o Bromus Schraderi apresenta grandes van- tagens. A observação que fizemos da abun- dância e da excellente qualidade do lei- te, quando as vaccas o comiam por al- gum tempo, é que nos levou a fazer o trabalho que hoje temos a honra de apre- sentar á Sociedade d'Agricultura. Fizemos a seguinte experiência compa- rativa: O leite das vaccas nutridas ha um mcz com boa ração de Luzerna foi rigo- rosamente medido e a quantidade de creme por 100 partes tomado exacta- mente com o auxilio d'um galactometro. Notamos três dias a seguir os algarismos, que foram identicamente os mesmos. De- pois submettemos as vaccas ao regimen do Bromus; achamos no primeiro dia um augmento de 18 por 100; mas nos dias seguintes diminuiu, como acontece ge- ralmente depois d'uma mudança de re- gimen e só foi de 10 por 100, algarismo que ficou estável durante os 15 dias que durou a mesma alimentação. No fim d'es- te praso restituímos os animaes ao regi- men da Luzerna e 48 horas depois a pro- ducção do leite diminuiu pouco a pouco 10 por 100. É de observar que a ração da Luzerna e a do Bromus tinham o mes- mo peso. Não obtivemos diíFerença sen- sível na quantidade do creme, mas com o pesa-leite podemos verificar que era maior a densidade do leite. Dissemos que o leite das vaccas sub- mettidas a esta alimentação era além d'Í3so d'uma excellente qualidade. D'isto tivemos uma prova notável n'este outo- mno. A penúria das forragens era gran- de e não houve outro remédio senão re- correr ás mais medíocres. O leite, pouco abundante, era além d'isso muito mau. Mas no dia em que reconhecemos que já não podíamos este anno colher mais ne- nhum grão, puzemos as vaccas no regi- men do Bromus e todos da nossa familia se admiraram, ao cabo de alguns dias, do melhoramento do leite e sobretudo da manteiga. Efí'ectivamente o leite, quando as vac- cas consomem Bromus Schraderi, tem qualidades excepcionaes, que logo reco- nhecem as mulheres encarregadas da lei- taria,^ do fabrico da manteiga e dos quei- jos. É difíicil designar essas qualidades: a manteiga, por exemplo, nos grandes calores, faz-se mais depressa, é muito mais dura e guarda-se melhor ; tem gosto mais fino e até melhor aspecto. Analyse chimica do Bromus Schraderi — A extrema bondade de Mr. Decaisne devemos duas analyses do feno do Bro- mus Schraderi, que elle, em nosso nome, pediu a Mr. P. P. Dehérain. Este hábil cbimico fez-nos notar que o feno da primeira analyse era dos tufos completamente verdes, ao passo que a segunda fora feita com plantas amarel- lecidas e estioladas pela escuridão em JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA que estiveram bastante tempo. Com ef- feito a differcnça c muito sensivel. — 1.* Aualyse feita com plantas per- feitamente verdes : Agna 16,284 p. O O Materiíis gordas . 3,333 » Cinzas l-4,540 » Celhúose. . . • 19,313 » encerrando 4,44 de azote Matérias azotadas. 23,981 » — análogas ao ami- do . . . . . 21,000 » — por determinar . 1,549 » 100,000 As cinzas encerram: Chloro. Cal. Potassa. Acido phosphorico. — 2.* analyse feita com plantas ama- rellecidas ou estioladas : Agua 1G,«J0 p. O O Matérias gordas . 2,857 » Cinzas 12,8G8 » CeUulose. . . • 30,709 » Matérias azotadas 13,467 » — análogas ao ami- J encerr \ 2,155 de i cerrando iizote do — por determinar. 22,727 0,422 100,000 As cinzas encerram: Chloro. Cal. Potassa. Acido pliospliorico. Segundo nma analyse feita por Mr. Terreil, achou-se em 100 partes a se- guinte quantidade de azote : PAKTES DA PLAXTA PLANTA SECCA PLANTA VERDE Espigas 2.82 0.945 Colmos 1.75 0.791 Folhas 1.40 0.617 Raizes 1.78 0.823 A incineração das diversas partes da planta deu os seguintes resultados: PARTES DA PLAXTA Espigas Colmos Folhas Raizes As cinzas composição : PEUDA EM AGCA EM 100 PARTES 66.40 54.80 55.90 53.75 apresentaram 2.50 2.40 4.50 6.25 seguinte PARA 100 PARTES ESPIGAS FOLHAS COLMOS Potassa Soda Cal Magnesia Oxydo de ferro e aluminia Acido pliosphor. Acido sulfúrico. Acido carbónico Chloro Silica Carvão dividido 6.52 I 2,30 vostiír. vestiíT- i;3.(i2 4.80 5.82 2.17 0.42 1.01 11.04 2.54 3.26 1.20 3.52 1.20 5.24 1.85 50.00 82.80 0.56 0.13 7.24 vestig. 15.20 6.86 3.16 8.01 3.76 3.80 5.83 45.50 0.64 2.44 vestig. 5.Í3 2.31 1.06 2.70 1.27 1.20 1.96 81.60 0.33 100.00 100.00 100.00 100.00 Em resumo, a composição das diver- sas partes do Bromus Schr aderi em cen- tésimos é representada como segue tan- to para a planta verde como para a secca : ESPIGAS VERDES SECCAS VERDES COLMOS FOLHAS SECCOS \T:RDES SECCAS ^'ERDES SECCAS RAÍZES Matérias combustíveis. Azote Potassa Soda Cal Magnesia O.xydo de fcr. e alumin. Acido phosphorico. . . . Silica Acido sulfúrico Chloro Agua 30.259 O.Í)45 0.163 vestig. 0.340 0.145 0.010 0.276 1.250 O.OSl 0.131 66.400 90.031 2.820 0.486 vestig. 1.015 0.432 0.02Í» 0.824 3.731 0.241 0.391 42.117 0.791 0.173 vestig. 0.365 0.164 0.076 0.192 1.092 0.090 0.140 54.800 93.182 1.750 0.382 vestig. 0.S(')7 0.3(J4 0.167 0.425 2.415 0.199 0.309 100.000 lOO.OO) l(X).0OO 100.ÍM)0 KXXOOO lOO.íXXI jlOO.OOO 40.701 0.617 0.103 vestig. 0.216 0.097 0.045 0.114 2.070 0.0.54 0.083 55.900 92.290 1.400 0.234 vestig. 0.489 0.221 0.103 0.259 4.694 0.122 0.188 39.275 0.823 0.152 vestig. 0.320 0.144 0.06(5 0.169 5.100 0.079 0.122 53.750 84,916 1.780 0.329 vestig. 0.693 0.312 0.143 0.365 11.027 0.171 0.264 100.000 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA O valor nutritivo d' um alimento apre- cia-se segundo a sua riqueza em azote. Poder-se-liia portanto, mesmo sem expe- riências praticas, conceder ao Bromus Schraderi a qualidade de ser muito nu- tritivo, visto que Mr. Dehérain encon- trara no feno 4,44 d'azote, quantidade superior á de qualquer outra forragem, como todos sabem. Só as folhas do Sa- bugueiro é que contéem mais (5,42), mas não é uma espécie forraginosa. Do seu afolhamento — Concebe-se que ainda seja difficil determinar d'uma ma- neira positiva o logar que occupa no afo- lhamento, porque a rotação das culturas varia, segundo os paizes, e por assim di- zer de logar para logar, mas em França o fim que se propõe geralmente é prepa- rar a terra para a producção dos cereaes e principalmente do trigo. O Bromus, comquanto seja da familia das Gramíneas j não pude ir d'encontro em nada ao sys- tema cultural, visto que não é destinado a produzir grão mas sim a dar forragem. Todos sabem com eíFeito que os cereaes vegetam muito bem n'um terreno que seja sorribado e que seja próprio para as Gramíneas, facto este que foi observado antes de Pictet, mas em que insiste o sá- bio genovez no seu tractado sobre afo- Ihamentos. Além d' isso não seria mais vantajoso para muitas explorações que se fa- zem fora de legares privilegiados, taes como a Normandia, cujos prados natu- raes enriquecem os proprietários e fazem, como na Inglaterra, diminuir a cultura dos cereaes e augmentar a producção das forragens ? Não seria melhor augmentar mais a creação do gado? Adoptando-se porém esta nossa indicação teriamos de recorrer ás Gramíneas vivazes e forra- ginosas taes como o Bromus Schraderi, que é talvez a única capaz de satisfazer, no nosso clima, a esta nova fonte de ri- queza agricola. O Bromus Schraderi poderia succeder ás Leguminosas e prolongar assim, no mesmo solo, a producção forraginosa co- mo em certos casos se deseja. Varias considerações nos levaram a crer que o Bromus não é uma planta que exhaure o terreno. Vimos, por exemplo, depois d'uma cultura do Bromus durante dous annos, prosperar as Beterrabas, as Batatas e mesmo as Couves. Isto com- prehende-se, porque as raizes e mesmo os restos dos colmos que ficam com ellas sendo enterradas, quer verdes quer sêc- cas, constituem um adubo muito bom pe- las riquezas que contéem em matérias or- gânicas. (Contínua.) Oliveira Júnior. FRUCTIFICAGÃO DA lANGIFERA INDICA Um dos últimos números do jornal in- glez «The Garden» publica um artigo do nosso collaborador, o dr. Edmond Goeze, sobre a fructificação da Mangifera indica, na quinta das Necessidades de El-Rei D. Fernando. D'esse artigo pas- samos a traduzir alguns periodos : «Ha de haver aproximadamente um anno que S. M. El-Rei o senhor D. Fer- nando plantou na sua quinta das Neces- sidades alguns exemplares da Mangifera indica e comquanto na primavera pas- sada tivessem boa apparencia devemos confessar que não contávamos ser tão agradavelmente surprehendidos. Em quanto que El-Rei esteve fora de Lisboa, nos mezes do verão, visitamos umas duas vezes aquelle recinto encanta- dor, que então soffria muito com a sêcca, e não fizemos o menor reparo para aquel- las plantas que, entre parenthesis, deve- mos dizer que são as favoritas de El-Rei D. .Fernando. Pode portanto imaginar-se qual foi a nossa surpreza quando S. Magestade nos disse o outro dia que uma d'ellas es- tava com fructos e a nossa admiração decerto que não diminuiu quando com os nossos próprios olhos podemos obser- var o facto. O exemplar que fructificára tem um aspecto que denuncia não ter mais de quatro annos e a altura regula por l'°,50. Os fructos são em numero de oito e tem a forma d' ovos de pato. A planta está bom protegida da chuva e das ventanias o, não se podendo receiar as geadas nem mesmo os frios, alimen- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA tamos a boa esperança cie que El-Rei terá o prazer de ver na sua nieza de jantar um prato de fructos maduros da Mangi- fera indica. É sabido que os fructos d'esta planta amadurecem muitas vezes na Madeira e mesmo na ilha de S. Miguel, mas cro- mos que na Europa continental ó a pri- meira vez que este facto se assignála.» Todos sabem que El-Rei D. Fernando é par exceUence o Rei Artista, o Rei que protege as Artes e as Sciencias, o Rei que tem amor sagrado pelo bello, o Rei que se interessa pelo desenvolvimento de tudo quanto pode ser útil ao seu paiz. A hor- ticultura é de certo uma das partes dos conhecimentos humanos que lhe merece acrysolada paixão e os seus jardins são como um livro aberto que documenta o quanto S. Magestade entende d'esta es- pecialidade. Fazemos votos para que o Real horti- cultor seja imitado, para assim darmoa um throno condigno á deusa Flora. J. D. DE Oliveira Júnior. BIBLIOGRAPHIA LES CONIFÈRES INDIGÈNES ET EXOTIQUES PAR C. DE KIRWAN N^estes últimos tempos a cultura das Coníferas tem tomado um desenvolvi- mento sempre crescente. A agricultura encontra n'estas preciosas arvores excel- lente-í espécies para a rearborisação das montanhas, dunas e terrenos incultos; a horticultura tira um immenso partido d'esta3 esplendidas formas vegetacs, de sorte que não ha hoje parque ou jardim, por muito pequeno que seja, que não conte entre as suas collecçoes alguns re- presentantes d' esta família. Como essên- cias florestaes, são mais que sabidas as vantagens que a industria e as artes de construcção tiram das suas madeiras. Taes predicados reunidos n'uma familia que junta á grande variedade de formas, afora pequenas excepções, pouca exigên- cia na escolha de clima e solo, deviam decerto chamar a attenção dos homens práticos e scientificos. E por isso que é sempre recebida com agrado qualquer publicação que appareça sobre o assum- pto. Tem-se escrlpto muito acerca das Co- níferas; existia porém uma lacuna im- portante; faltava um livro pratico que podesse ser consultado sem fastio e com proveito pela classe hortícola e agrícola. Mr. Carricre tinha publicado um impor- tante trabalho sobre as arvores sempre verdes ; porém, além da forma essencial- mente scicntifica que este sábio entendeu dever dar il sua obra, era d'um preço elevado, e por isso fi>ra do alcance da maioria dos amadores de horticultura. Era uma obra excellente para ser con- sultada por um botânico, por um natu- ralista, mas faltava-lhe aquelle caracter essencialmente pratico, aquella lingua- gem clara e fácil, que deve caracterisar sempre as obras escriptas para o povo. Esta lacuna veio enchel-a Mr. Kir- wan com o seu tractado pratico das Co- niferas. Em estylo fácil e despretencioso, vulgarisa-se n'esta obra o conhecimento de todas as espécies que sob o ponto de vista da sylvicultura ou horticultura, como valor industrial ou como objecto de luxo, podem offerecer no nosso clima um interesse verdadeiramente pratico. Mattas de talhadia, bosques, sementei- ras, fixamento das dunas, utilidade, rear- borisação das montanhas, rehabilitação dos solos incultos, productos das madei- ras resinosas, ornamentação dos parques e jardins, viveiros, plantações, sjnoni- mia, descripções, etc, das Coníferas in- dígenas e exóticas, tudo ahi é clara- mente exposto e n'uma linguagem in- telligivel para todos. Em quanto á par- te artística da obra bastará dizer que é editada por Rothschild, o infatigável edi- tor dos «Passeios e jardins de Pariz», dos «Fetos exóticos e indígenas», dos «Co- gumellos da França», etc, obras justa- mente apreciadas pelo seu mérito artís- tico e scientifico. 106 gravuras, habil- mente desenhadas, adornam esta inte- ressante publicação, tornando assim a sua leitura mais aprasivel e instructiva. N'uma palavra, a obra do Mr. de Kir- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 9 wan é um livro preciso, pratico, clássi- co no género. O amador, o silvicultor e o jardineiro encontrarão n'ella todas as indicações e noticias de que careçam pa- ra os seus trabalhos quotidianos. A. J. DE Oliveira e Silva. P0LY6ALA MYRTIFOLIA As Pulygalas são pequenos arbustos da familia das Polygaleaceas, que se tornam recommendaveis pela sua folha persis- tente, ostentando assim uma verdura pe- renne, o que se presta muito para for- mar pequenos massiços nos jardins. As flores cor de violeta tem alguma similhança com as das Papilionaceas. A figura 7, não obstante ser pouco fiel, as- sim o mostra. A florescência é muito prolongada e as flores, que são de muita duração, po- Fig. 6 — Polygala myrtifolia dem entrar elegantemente na formação de houquets, ou para a abotoadura do frac, etc, etc. Este arbusto é antigo no paiz, mas não tão conhecido quanto o deveria ser, e quanto nós o desejáramos, em consequên- cia da sua não vulgar qualidade de ser seviper virente, e de produzir por longo Flor da Polygala myrtifolia tempo bellissimas flores, que, não obs- tante a sua cor triste, se podem oífere- cer como mimo em quasi todas as esta- ções do anno. Não esqueçamos no entretanto a má- xima: De gustibus et coloribus non est disputandum ! Oliveira Júnior. AS FLORESTAS NÃO SEGCAM O SOLO Este assumpto, que tem dado logar a tanta divergência de opiniões, encontra- mol-o hoje tractado pelo célebre dr. Sacc, com aquelle saber que todos lhe reco- nhecem. Lemos o seu escripto no «Cultivador» e passamos a transcrevel-o, porque nos parece que deve interessar os nossos lei- tores. «As florestas não seccam o solo. Eis uma asserção bastante singular, apoz os resultados contrários e as tão cé- lebres experiências de Hales, já confir- madas pelo snr. marechal Vaillant, e, re- centemente, pelo snr. Kisler. Esta asser- ção vamos proval-a referindo as expe- riências que fizemos em 10 de agosto de 1869, ás 11 horas da manhã, por um tempo magnifico, no extremo da bellis- sima floresta de Carvalhos que limita ao norte o nosso campo, acima da aldeia de Bevaix, no cantão de Neuchãtel (Suissa). Dous pedaços quadrados de panno gros- so de algodão, medindo O™, 45 e pesando 39 grammas cada um, foram mettidos n'agua a 6 graus centígrados e torcidos 10 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA depois ; cada um d'elle3 pesava então 73 grammas, continha pois 34 granimas d'agua. A's 11 horas e 12 minutos os dous pan- no3 foram expostos: o 1.° sobre a terra núa e ao sol; o 2.'^ sobre a terra núa e á sombra dos Carvalhos. — O n.° 1 esta- va completamente secco ás 11 horas e 2õ minutos, isto é, em 13 minutos, e o n.° 2 ás 12 horas e 5 minutos, isto é, em 35 minutos. O que nos leva a con- cluir que a evaporação é três vezes me- nos rápida dentro do bosque do que a descoberto. Examinando o solo sobre o qual fize- mos estas experiências, encontramos a terra completamente sccca a O™, 66, em rasa campina, emquanto que se achava fresca debaixo dos Carvalhos, e ainda húmida nos pontos que estavam cobertos de folhas ou de relva. O thermometro centígrado marcava ao ar livre e ao sol 30 graus ; debaixo dos Carvalhos e á sombra 25 ; na herva e ao sol 20 5 debaixo das folhas e relva 20. Estas experiências, que confirmam a opinião geralmente admittida que as flo- restas conservam a humidade e arrefe- cem o clima dos paizes onde predomi- nam, não destroem em cousa alguma as de Hales e as dos snrs. marechal Vail- lant e Eugénio Risler; ao contrario con- firmam-n'as. Com efí'eito todo o liquido que passa ao estado gazoso produz ab- sorpção de calórico ; logo, tanto mais uma arvore evapora, tanto mais arrefece, tanto mais condensa a humidade atmos- pherica: tal c a rasão porque os orva- lhos são durante as claras noutes de es- tio tão fortes nos bosques que se tornam em chuva; tal a causa em virtude da qual as florestas manteem as nascentes d'agua, e permittem aos Musgos que ne- cessitam de tanta humidade o desenvol- vcrcm-sc á sua fresca sombra. Ainda mais ; as florestas, detendo os ventos e outras correntes de ar, para- lysam uma das causas mais activas do enxugo do solo; e por isso as florestas são quentes no inverno e frescas no es- tio. As florestas de arvores verticaes da Nova Hollanda fornecem a prova, pois que o calor alli é mais intenso do que om rasa campina, porque deixando pe- netrar perpendicularmente os raios sola- res, o ar torna-se immovel. As florestas, dividindo por sobre as folhas e ramos das arvores a chuva que cae, reteem-n'a e forçam-n'a a penetrar no solo, atravez dos canaes que lhe abrem as suas innumeraveis raizes. — As florestas condensam os nevoeiros, de mo- do que, quando elles reinam, a terra fi- cando secca, a agua deslisa ao longo dos ramos das arvores, segue o seu tronco e penetra abundantemente na terra. Vè-se pois claramente que a grande questão da acção das arvores sobre o solo é muito complexa, e demanda ser muito «experimentada». E inútil discutil-a n'es- te momento, porque a esta discussão fal- tariam bases solidas ; comtudo julgo não me enganar estabelecendo desde já o facto de que é illusoria a affirmação de que uma arvore tanto mais evapora quan- to maior quantidade d'agua absorve do solo pela simples rasão que quanto mais agua rouba ao solo, tanto mais lh'a res- tituo tirando-a do ar em forma de or- valho. O que julgo também poder assentar como facto c que quanto uma planta mais agua evapora, mais rápido é também o seu crescimento; resta provar se este enorme consumo d'agua está em relação com a reducção do acido carbónico do ar e do solo, ou simplesmente com a forma, o numero e as dimensões dos po- ros das plantas.» Pouco tempo depois d'esto artigo ser publicado escrevia Mr. L. Moll o se- guinte : «Li com grande satisfação a interes- sante nota do sr. dr. Sacc sobre este as- sumpto («Journal de TAgriculture», n.° de 4 de maio) , e o meu illustrado collega comprehcndel-o-lia facilmente quando lhe disser que a opinião que emitte e que apoia com engenhosas e concludentes ex- periências, foi sempre a minha, a qual professei no meu curso e publiquei em 1860, na «Encyclopediede ragriculteur» (artigo Deboiscmcnt, vol. VI, pag. 11). Não ; as florestas não scccam o solo. Ao contrario conscrvam-lhe a frescura cm quanto o sol e o vento enxugam as ter- ras c 03 prados circumvisinhos. Não ha camponcz, caçador, botânico ou mesmo JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 11 simples transeunte que não tenha vinte, cem vezes, visto, e muitas por seu mal, que depois de todo o vestigio de chuva ou de orvalho ter desde muito desappa- recido dos campos, das relvas, dos ca- minhos e atalhos da planicie, haver ain- da, dentro dos bosques, principalmente nos pontos mais copados, agua e lama de enterrar até á cintura os que ahi se aventurarem. Ha caminhos ílorestaes que não seccam em todo o anno. Isto faz-me lembrar um engenheiro muito distincto, mas pouco amigo das florestas, que, n'um trabalho acerca das inundações, negava abertamente ás flo- restas toda a acção sobre o regimen das chuvas, sobre a conservação da humida- de do solo e alimentação das fontes, e que, não obstante, n'um outro trabalho (sobre os caminhos vicinaes) se pronun- ciava energicamente contra o costume de orlar as estradas com arvores, dizen- do, com rasão, que taes arvores impe- dem o prompto enxugo dos caminhos e n'elles conservam por muito tempo uma humidade altamente prejudicial. Accres- centava que aquelles que duvidassem não tinham mais do que comparar em qual- quer estrada as partes pouco ou nada assombreadas com as que o são muito. N'e3tas ultimas, dizia elle, as despezas de conservação são duas ou três vezes maiores do que nas outras, e ainda as- sim o caminho nunca é tão bom. Deverão conceder-me que, se este ef- feito se produz por modo tão sensível sob a influencia de uma simples marginação de arvores, com maior rasão deve ma- nifestar-se n'um solo completamente co- berto pela vegetação florestal. São factos estes, por tal modo cons- tantes, de tal forma geraes, que bem dis- pensariam a confirmação scientifica. To- davia é esta indispensável para certos espi- rites, e útil para todos, e o dr. Sacc prestou um verdadeiro serviço ministrando os primeiros elementos d'esta confirmação. Porém no momento em que se dese- jaria assentar a definitiva conclusão, vêem tolher-nos o passo as magnificas experiências de Hales, confirmadas por outras feitas posteriormente e pelas in- vestigações ainda mais recentes dos snrs. marechal Vaillant e Risler, experiências e investigações cujo valor ninguém cui- dará pôr em duvida. A planta «transpira», é um facto in- contestável, e esta transpiração, que é uma condição da sua existência, tem co- mo resultado a perda, pela evaporação, de uma quantidade de agua que, dadas certas condições, é relativamente con- siderável. Esta quantidade é, em egual- dade de circumstancias, proporcional á superfície das folhas, ou para mais exa- ctamente fallar, das partes verdes das plantas. E como um espaço de bosque bem plantado apresenta uma maior su- perfície verde de que nenhum outro, po- de concluir-se, com todas as apparencias da lógica, que a floresta secca o solo, pois em tempo de secca, não pode tirar senão do solo a agua que exhala para a atmosphera. Sabido é por modo positivo que certos terrenos pantanosos tem sido e são diaria- mente dessecados por meio de plantações de arvores, principalmente Alamos. Porque modo se poderão conciliar es- tes factos, na apparencia tão contradicto- rios? Digo em apparencia, porque não ha contradicções na natureza. Quando as encontramos é porque vimos mal ou porque de um facto verdadeiro tiramos consequências falsas. O snr. dr. Sacc acha a explicação n'e3- ta lei physica bem conhecida, segundo a qual toda a evaporação, isto é, toda a transformação de um liquido em vapores produz um abaixamento de temperatura no meio em que se opera. Resulta pois d'este facto que a floresta é uma causa frigorifíca; é-o ainda pela sombra que produz e que impede a ter- ra de se aquecer sob a acção do sol. Ora toda a causa frigorifíca, ainda que não seja senão garrafa d'agua fresca, posta sobre a meza da casa de jantar tem por eíFeito invariável condensar uma parte dos vapores aquosos espalhados no ar ambiente. A garrafa, toda a gente sabe isto, começa por se cobrir de uma espé- cie de suor que se resolve em pequenís- simas gottas, depois em pingas que cor- rem ao longo do vidro e acabam por fa- zer em torno do pé uma espécie de char- co. O phenomeno é menos apparente na floresta, porque a acção frigorifíca é ahi 12 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA menos intensa, mas, na substancia, é exactamente a mesma; abundância de orvalhos, frequência de nevoeiros e de chuvas. Confesso que em presença d'este encadeamento tão simples, tão lógico das leis e dos factos, encadeamento confir- mado pelo effeito das grandes desarbo- risações e rearborisaçues sobre o clima, não comprehendo que haja quem, admit- tindo, sem duvida, a exhalação aquosa das plantas ; admittindo, sem duvida, a acção frigorifica da evaporação da agua, negue, comtudo, a influencia das flores- tas, mesmo das mais vastas, sobre a fre- quência das chuvas. A estes dirigirei esta simples pergun- ta : se se pozesse em pleno c^tio, sobre o cume de uma montanha de pequena ele- vação, uma considerável massa de gelo e de neve, que efí'eito produziria sobre a atmosphera ambiente, ou se assim o querem, sobre o clima da montanha? Todos 03 que teem algumas noções acerca da physica do globo, serão accor- des, assim o julgo, em responder que se formaria na parte superior da montanha um espesso nevoeiro, uma coroa de nu- vens que persistiriam tanto quanto o tem- po que levasse o gelo e a neve a derre- ter-se e doa quaes se desprenderiam, se- gundo 03 ventos, chuvas mais ou menos abundantes. Creio que esta consequência da minha hypothese será por todos admittida. Se uma causa frigorifica poderosa co- mo montão de gelo e de neve, collocado sob uma atmosphera quente, produz este eff'eito, uma causa frigorifica mais fraca, deve necessariamente produzir um effei- to menos intenso, sem duvida, mas si- milhante na essência. Assim, a acção frigorifica da floresta bastaria para explicar como a terra co- berta de arvoredo, comquanto incessan- temente privada de uma parte mais ou menos considerável da sua humidade pela evaporação das arvores, tem-n'a, comtudo, em maior quantidade do que a mesma torra cm rasa campina, porque a recebe em maior porção. A demonstração será ainda mais com- pleta, se se notar que a floresta oppõe um obstáculo quasi absoluto á acção das duas mais poderosas causas da seccura da superficie, o sol e o vento, e se se admittir, como é provável, que a quan- tidade d'agua que subtrahe cada dia á terra pela transpiração das folhas, é me- nor do que a que lho subtrahiria, no mesmo tempo, o sol e o vento, se hou- vesse ficado exposto á sua acção. O que tende a provar que esta ultima supposição é verdadeira, é que, nos le- gares em que o bosque é mais copado, e sob as essências florestaes que dão som- bra mais espessa (Faias, Abetos dos Vos- ges, etc.) o solo, em egualdade de cir- cumstancias, conserva a maior humidade. Ora, como um bosque cerrado, uma som- bra expessa, indicam um grande desen- volvimento de folhas, isto é, uma gran- de superficie evaporante, era o effeito contrario que deveria produzir-se se a evaporação pelas folhas fosse mais con- siderável do que a evaporação pelo sol e pelo vento. Mas ha talvez ainda ahi outra cousa. O que desde ha muito m'o tem feito pen- sar, é que tenho julgado notar nos factos que se produzem nos campos, algumas contradicções, não com as experiências de Hales, mas com as consequências que d'ellas se tem tirado. É sabido que as suas experiências re- cahiram principalmente sobre plantas cultivadas, Girasoes, Couves, Lujyulos, e certo é que o célebre reitor de Theddin- gton assombrou todo o mundo scientifi- co de então, quando fez conhecer que em doze horas de dia um Girasol (He- lianthus annusj havia evaporado em me- dia 610 grammas de agua, uma Couve Õ80 grammas, etc. Alem d'isso compro- va que esta evaporação era evidente- mente activada pelo calor, seccura e agitação do ar, c que era quasi nulla de noute c nos tempos de chuva c ne- voeiros. Devo accrescentar que Hales minis- trava amplamente ás plantas a agua ne- cessária para esta evaporação. E para sentir que não tenha levado mais longe as suas experiências, e obser- vado o que se passa quando a planta não encontra no solo senão uma quantidade d'agua cada vez mais reduzida, como tão frequentemente acontece nos nossos campos. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 13 Em duas circumstancias differentes, por occasião de sêcca intensa que se pro- longou por mais de vinte dias a primei- ra, e mais de quinze a segunda, em 1858 e 1869, foi attrahida a minha attenção para este ponto. Tractava-se de Couves no primeiro caso e de Topinamhas no se- gundo, umas e outras plantadas n'um terreno, cujo subsolo a O™, 30, 0'^,25, O™, 20 de profundidade, era, ou pelo me- nos parecia ser, absolutamente impene- trável ás raizes e impermeável ás aguas inferiores. O solo nos dous casos, de mui- to mediocre qualidade, tinha recebido por hectare, para as Couves, 50 metros cúbi- cos de immundicies, para as Tojpinambas, 100 metros cúbicos de lodo de tanques com cal; e sob a influencia d'eote3 adu- bos, as duas plantações haviam adquiri- do magnifico desenvolvimento quando fo- ram alcançadas pela sêcca. Só ao cabo de cinco ou seis dias é que me occor- reu a ideia de investigar qual seria a quantidade de humidade que conteria ainda a terra á superfície, entre O™, 10 e O™, 15, e a 0™,25 de profundidade. Não pude encontrar os meus aponta- mentos d'então, ficaram provavelmente na minha granja. Mas recordo-me d'isto, que, admittindo mesmo um algarismo in- ferior ao de Hales, 500 grammas para a Couve em vez de 580, os 40:000 pés que cobriam um hectare, na minha plantação, teriam absorvido e evaporado a totali- dade da agua contida na camada arável ao cabo de sete dias, suppondo que não houvessem morrido antes, o que certa- mente teria acontecido. Ora depois d'este lapso de tempo, encontrei ainda uma pe- quena quantidade de humidade no solo, e as minhas Couves, excepto um pequeno numero, estavam vivas, supportaram ain- da muitos dias de sêcca, e recomeçaram a vegetar vigorosamente pouco depois do temporal que pôz termo a esta calami- dade. Aconteceu quasi o mesmo com as To- jpinamhas em 1869, com a excepção po- rém de que encontrei mais alguma hu- midade no solo, tanto no principio como no fim da experiência. Não podendo por falta de planimetro, medir a superfície frondosa que apresentava um metro qua- drado de terreno tomado na parte média do campo, suppuz a evaporação egual á das Couves^ comquanto a superfície eva- porante me parecesse mais considerável. Não tenho certamente a pretensão de haver resolvido o problema com duas experiências, digamos antes duas obser- vações, tão incompletas como estas. O que quiz simplesmente foi chamar a at- tenção e provocar novas experiências fei- tas em condições análogas ás que adop- tou Hales e que me parecem as melho- res para chegar a resultados de rigorosa exactidão. Se, como firmemente estou convenci- do, estes resultados foram conformes aos que obtive, forçosamente se admittirá que uma dada superficie de folhagem, em egualdade de circumstancias, não evapo- ra sempre a mesma quantidade de agua; que esta quantidade é determinada não somente pela temperatura e pelo estado de seccura e pela agitação do ar, como também pela luz, mas ainda e principal- mente pela quantidade de agua que con- tém o solo e que está á disposição das raizes, e que á proporção que esta quan- tidade se reduz, a evaporação, sem ces- sar inteiramente, diminue na mesma pro- porção ou talvez n'uma proporção maior ainda. Conceder-me-hão sem duvida não ser este o único caso em que o organismo vivo encontra o meio de neutralisar ou pelo menos attenuar o effeito momenta- neamente prejudicial das leis physicas. Todo o mundo animado não existe senão graças a esta faculdade.» Achamos curiosos estes artigos e por isso os reproduzimos. Não fazemos a cri- tica d'elles, porque nem nos achamos á altura dos conhecimentos dos seus au- ctores, nem temos encaminhado para es- te assumpto a nossa attenção. A critica que poderíamos fazer seria a resultante da leitura d'estas observa- ções. A experiência do dr. Sacc, é ef- fectivamente curiosa, mas parece-nos que não será ella de per si só que nos dará a incógnita do problema. Mr. MoU procura abranger maior nu- mero de factos e apesar de os querer ex- plicar segundo as leis mais geraes da physica, mostra-se por ultimo organista ou vitalista, quando diz que o organismo 14 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA VIVO encontra o meio de neutralisar ou pelo menos attenuar o effeito momentanea- mente prejudicial das leis jyhysicas. E appcllar para o desconhecido, para as forças mysteriosas da natureza, quando a tendência do mundo scientifico actual é toda para o positivismo. Não c esta questão um mero passa- tempo. A influencia das florestas sobre a metereologia e sobre o solo é um pro- blema altamente importante para a agri- cultura e para a hygiene. Bom será que a tlieoria o explique, para que a silvicultura obedeça sempre aos preceitos da sciencia. Oliveira Júnior. DA PODA DOS ARBUSTOS A cultura dos arbustos de flores, mais generalisada entre nós de que a dos ar- bustos ornamentaes, reclama na poda a máxima attenção do jardineiro. É uma condição essencial para se ob- ter abundante florescência que se faça a plantação em terra boa ; dar aos arbus- tos exposição conveniente, e prestar-lhes 03 cuidados que reclamam durante os grandes calores. Não é porém menos certo que a epocha da poda contribuo muito para que produzam maior ou menor quan- tidade de flores. Os arbustos poderão, pois, ser dividi- dos em três series: A primeira composta dos que flores- cem na primavera ; A segunda dos que florescem no es- tio; E a terceira dos que florescem no ou- tomno. Os arbustos que florescem antes do principio de junho devem ser podados logo que acabe a floraç ao, porque no mostram as suas corolas nas ramificações do anno precedente. A poda do inverno dá apenas fracos rebentos que só florescem no anno se- guinte, ao passo que a uma poda, exe- cutada logo depois da florescência, suc- cede uma vegetação menos vigorosa, é certo, mas que no outro anno se desen- tranha em flores. Quanto aos arbustos, que só florescem durante o estio e o outomno, devem ser podados no inverno. A poda primaveral também aproveita ás plantas vivazes que florescem por abril ou maio, quando não se quer conservar- Ihes as sementes. Por este meio obtem-se quasi sempre uma segunda florescência no outomno e muitas vezes mais bella do que a da pri- mavera. Oliveira Júnior. GHRONIGA HORTIGOLO-AGRICOLA O snr. António Augusto Aguiar, que foi enviado pelo governo como com- missario para representar o nosso paiz na Exposição de vinhos realisada em Londres, tem desempenhado o seu en- cargo do modo mais lisongeiro, tendo os nossos viticultores só a agradecer-lhe os bons serviços que lhes tem prestado e o governo a congratular-se pela acertada escolha que fez. As vantagens que resultam para o paiz dos exforços empregados pelo governo para tornar os nossos vinhos considera- dos segundo o seu justo valor nos prin- cipaes empórios vitícolas, não podem ser de modo nenhum esquecidas. O governo prestou valioso serviço. A iniciativa particular é cousa que en- tre nós, pôde dizer-se, que não existe e portanto o governo, organisando as col- lecções dos diversos typos de vinhos, tor- nou-os conhecidos e as encommendas que nos vão fazendo são a prova evidente de que a semente não foi lançada em terreno estéril. Como já dissemos, ao snr. Aguiar deve- se muito, mas nem por isso podem ficar na obscuridade os nomes do ministro Cardoso Avelino, um dos poucos homens activos que temos no paiz, o do snr. conselheiro Rodrigo de Moraes Soares, sempre dis- posto a prestar os seus conhecimentos especiaes, o do snr. António Batalha Reis, que não perde a occasião de mos- JORNAL DE HOETICULTURA PRATICA 15 trar quanto vale e quanto pode a sua vontade de ferro e emfim o do snr. Fran- cisco António de Vasconcellos, segundo official do ministério das obras publicas. Antes de se retirar de Londres o snr. Aguiar offereceu um jantar aos membros da commissão ingleza, no Pall Mali Kes- taurant, uma das casas mais acreditadas pelo seu bom serviço no oeste da cidade e frequentada sempre por uma sociedade escolhida. Os vinhos apresentados no jantar su- biram a 26 sendo os seguintes : Bucellas, 1873; Wiun & Custance; CoUares, Tei- xeira Marques; Chamusca, de Silva; Ou- rem, de Miguel do Canto; Torres Ve- dras, de M. Pereira; Alemtejo, Leitão; Bucellas 1869, Wuin ; vinhos tintos : Borba, Pinto; Tavira, Maldonado; Re- guengos, Papança ; Castello de Vide, Lecoq; Almeirim, conde de Sobral, viuva Theotonio ; Abrigada, J. Brito ; Torres, Corvo. A sobre-meza appareceram os seguin- tes vinhos: Bucellas, fino de 1854, de Wuin; Carcavellos, de Medlicote ; La- vradio, de J. Brito; Porto, 1844, 1840, de D. Antónia Ferreira; Porto, 1851, 1830, de Bernardo Ferreira; Madeira, do barão da Conceição e Netto; Mosca- tel, de M. Pereira e Moscatel Roxo, de Fonseca. Tanto uns como outros mereceram o melhor acolhimento por parte dos con- vivas, que eram em numero de 30. Entre os cavalheiros portuguezes en- contravam-se os snrs. conselheiro Ricci, engenheiro Mendes Guerreiro, capitão Almeida; extrangeiros, entre outros os se- guintes : general Scott, dr. Frankland, o primeiro chimico de Inglaterra, dr. Tyndall, redactor da «Press and Medicai Gazette», dr. Garette, dr. Gaskom, me- dico, dr. Cundonell Caster, redactor do «Times», editor do «Morning-Post», Scri- venor, vários membros da commissão in- gleza, commissarios russos, coronel Greek, commissario húngaro Schieífner, D. Be- nito, representante da Sociedade de Agri- cultura de Valença, dr. Appel, Lagrave, expositor francez, director do Jardim de Horticultura, Kelly, antigo official de ma- rinha, secretario do University College. Houve muitos brindes. O commissa- rio portuguez brindou a rainha de In- glaterra, o Rei de Portugal, os minis- tros, os snrs. Cardoso Avelino e João de Andrade Corvo, e aos snrs. Rodrigo de Moraes Soares e João Palha de Faria La- cerda, aos sábios inglezes representados no jantar pelo dr. Frankland. Os snrs. general Scott, Brúdenell Caster e profes- sor Frankland dirigiram os maiores encó- mios ao snr. Aguiar, pela maneira hon- rosa como se desempenhara da commis- são que o governo portuguez lhe confiara, declarando ao mesmo tempo serem os vi- nhos portuguezes, segundo a sua opinião, os mais accommodados ao paladar britan- nico. O snr. Aguiar tomando a palavra fez um relatório minucioso da exposição, sen- do no fim muito applaudido pelos repre- sentantes de todas as nações. O discurso durou cerca de uma hora. As 11 horas da noute terminou o jan- tar por uma saúde proposta pelo general Scott ao commissario portuguez, que foi calorosamente correspondida. Isto é extremamente honroso para o snr. Aguiar, a quem d'aqui dirigimos os nossos sinceros emboras. — Segundo dados estatísticos, reputa- dos officiaes, a producção do casulo este anno no districto da Guarda, foi de 38.537:078 kilos, incluindo n'este nu- mero 24.595:078 kilos, aptos para sof- frerem as differentes operações de fiação, torcedura e tecelagem, e de 13:942 ki- los perdidos pelas doenças. O valor d'a- quelles a 467 reis o kilo é de 11:500!$!159 reis, e o d'este, pelo ultimo preço, é de 6:519ií$i279 reis, o que dá um valor total de 18:019í^438 reis. Apesar da mortan- dade que houve devida á epizootia que tanto tem ferido o Bomhix mori, foram entregues ao commercio mais de 150:000 kilos, que vendidos por aquelle preço dão 69:940/5(000 reis. — Eis a nota das plantações definitivas effectuadas nas mattas a cargo da Direc- ção das obras publicas do Mondego e bar- ra da Figueira, e mattas do rio Mondego e valias dos campos adjacentes, no anno económico de 1873-1874 : Aesculus 4 ; Ailantus 599 ; Acácias (diversas) 183; Anthocercis 40; Acer (di- versos) 66; Broussonetia 5; Casuarina 16 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA (diversas) 103; Cupressus (diversos) 157; Castanea vesca 125; Citrus 8; Ceitis aus- tralis 280; Cereis siliqiiastrum 7; Euca- lyptus (diversos) 764; Fraxinus (diver- sos) 54; Gh'evillea robusta 1 13; Hakea sa~ ligna 38; Juglans (diversos) 232; Melia (diversas) 40; Blorus (diversas) 56; Pla- tanus 230; Populus (diversos) 43:668; Pinus (diversos) 25; Quercus (diversos) 30; Robinia (diversas) 16; Salix (diver- sos) 389:250; ;Sa»í6ucMs 699; Ulmus 112; Total 436:904. Plantações em viveiros, no chão ou em vasos : Na matta do Choupal, 7:391 plan- tas. No pinhal do Valle de Canas, 14:852. As sementeiras feitas no anno de 1873 a 1874 foram as seguintes : No Choupal — Acer (6 espécies); Ai- lantus (jlandulosa; Alnus (3 espécies); Bignonia Ccitalpa;Broussonetia papyrife- ra; Ceitis (6 espécies) ; Cereis (5 espé- cies); Dyospiros (2 espécies); Fraxinus (15 espécies); Gleditschia (16 espécies); Juglans (4 espécies); Melia (3 espécies); Morus (14 espécies); Miosporum picta; Robinia (9 espécies); Pawlonia imperia- lis; Ulmus campestris. Em Valle de Canas — Abies (11 espé- cies); Alnus (3 espécies); Arbutus unedo-. Araucária (2 espécies); Acácia (26 es- pécies); Betula (3 espécies); Biota (2 es- pécies); Callitris (9 espécies); Casuari- na (2 espécies); Carpinus betula', Cedrus (3 espécies); Cezalpina eckinata; Cha- maecyparis (2 espécies); Cryptomeria (4 espécies); Cupressus (25 espécies); Cun~ ningkamia (2 espécies); Eucalyptus (29 espécies); Firmiana; Giyptostrobus pen- dulus ; Gi-evillea robusta; Jambosa aus- tralis; Leptospermwn laevigatum; Libo- cedrus decurrens;Larix (4 espécies); Juni- perus (12 espécies); Persea indica; Pi- nus (72 espécies); Quercus (3 espécies); Retinospor a obtusa; Robinia (4 espécies); Salisburia adianti folia; Saxe-Gothaea; Taxodium (4 espécies) ; Taxus (7 espé- cies); Torreya californica; Thuya (2 espé- cies); Wellingfonia gigantta. Uma grande parto d'esta3 sementeiras nasceu soffrivelmente. Em 30 do junho do 1874 existiam noa viveiros do Mondego : No Choupal, 15:530 plantas, com o valor de 1:144:5260 reis. Em Valle de Canas, 11:038 plantas, com o valor de l:056.-)980 reis. O rendimento bruto das mattas do Mon- dego foi no anno económico de 1873-74 de 3:187:5140 reis, incluindo a renda das terras do Choupal para cultura cerealí- fera e 851)^185 reis, producto bruto doa viveiros da Direcção. Em 30 de junho de 1874 ficaram exis- tindo no armazém do Choupal madeiras manufacturadas no valor de 556f5í550 reis. Durante aquelle anno económico fo- ram empregadas nas obras, ou cedidas gratuitamente a diversos estabelecimen- tos públicos, arvores e productos no va- lor de 3:245:5135 reis, sendo: Do Choupal, obiectos no valor de. . 511Í423 De Valle de Canas « » .... 355iíllO Das Rcmolhas » » » » ... 182^078 Das mattas do rio avalias » » ... I:909ií534 Dos Camalhões » » » » ... 2865990 O numero das arvores vendidas no ultimo anno económico foi de 12:418 « as cedidas gratuitamente a diversos es- tabelecimentos públicos foi de 1:505. — Montreuil, que fica muito perto de Pariz, é muito notável pelos excellentea pecegos com que abastece os mercados da metrópole e é fabulosa a samma que a cultura d'este fructo rende a Mont- reuil. Este anno produziram nada me- nos de 960 contos de reis ! N'aquella localidade ha 600 cultiva- dores que mandam ao mercado durante mais d'um mez para cima de 500:000 pecegos por dia. — Nos dias 15 e 16 de setembro de- ver-se-ha realisar em Edinburgo uma Exposição Internacional de fructas e já está votada a quantia de 700 libras es- terlinas para prémios. — Um dos últimos números do aGar- den» vinha acompanhado de uma gravu- ra representando o Anthurium Scherze- rianum com 21 flores. Era verdadeira- mente surprehcndente e via-se que não podia haver exaggeração da parte do ar- tista, porque a gravura era copiada d'uma photographia. A planta cm questão c propriedade do dr. Paterson, pessoa muito dedicada á cultura das plantas. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 17 No volume 11, pag. 51, encontrarão 03 leitores uma estampa da Aroideacea de que nos occupamos. — Conhecíamos a Tacsonia Buchana- ni de reputação e por uma bellissima estampa que d'ella deu em tempo a «II- lustration Horticole», mas nunca lhe vi- mos a flor, mesmo porque não nos consta que tenha florescido em Portugal. Agora porém, recebemos noticia do nosso ami- go que algumas vezes nos dispensa a sua valiosa coUaboração, o snr. D. Joaquim de Carvalho Azevedo Mello e Faro, de que a referida planta florescera na sua quinta da Soenga, próximo a Lamego. Esta planta esteve na estufa durante o inverno, de novembro a meiado de março, e depois foi posta ao ar livre en- costada a um muro aonde floresceu. O snr. Mello e Faro assevera-nos que é uma das Tacsonias mais bellas que tem visto. No estabelecimento do snr. Loureiro é cultivada ha três ou quatro annos em estufa mas nunca floresceu, decerto por- que lhe falta alguma das condições essen- ciaespara que possa exercer convenien- temente as suas funcções. — Publicou-se e recebemos o Catalo- go (1874-1875) das plantas florestaes que estão á venda nos viveiros da matta do Choupal e de Valle de Cannas, nos su- búrbios de Coimbra. A variedade das arvores é bastante grande e os preços são muito rasoaveis e algumas ha n'este estabelecimento que não se encontram n'outro do paiz e, para que o leitor poss?a fazer ideia como alguns dos géneros estão alli bem representados, vamo.3 dar-lhe uma amostra cortada ao acaso. Cahiu por sorte a collecção de Euca- lyptus, que é variadíssima, e senão ve- ja-se : Eacalyptus acmenioides Schauer. — amygdcdina Labill. — Callophylla R. Br. — Citriodora Hook. — coccifera. — corymhosa Smith. — diversicolor F. de Muell. — engenioides Sieber. — Jissilis. — gigantea Hook. Eucalyptus globulus Labill. — goniocalix F. de Muelí. — Ounii J. Hook. — latifolia. — leucoxilon F. de Muell. — marginata Smith (Mahago- — megacarpa F. de Muell. — nonigera. — obliqua Herit. — piperita Smith. — Risdoni. — robusta Smith. — rostrata Cav. — Stewartiana F. de Muell. — Sjpecies (White gum.) Nada menos do que 25 espécies ! — Na «Correspondência de Coimbra», liamoí ha dias, o que em seguida passa- mos a transcrever, com a devida vénia do iilustrado coUega: Em passeio que demos ha dias ao Jardim Botânico, notamos uma transformação completa na classificação das plantas. Estas achavam-se distribuídas por diíFeren- tes systemas, a saber: — os três primeiros pla- nos de taboleiros de este tinham as plantas dis- tribuídas pelo methodo natural de Stephano En- dlicher; o plano central ou médio comprehendia a eschola Linneana, e o plano superior do lado de oeste comprehendia uma eschola medicinal e outra industrial, classificadas pelo systema de De CandoUe. Agora este ultimo plano foi transformado n'uma só eschola de plantas medicinaes e in- dustriaes, classificadas pelo systema de Jussieu,, annuUando assim a grande repetição de indi-' viduos e famílias, e portanto simplificando so- bre maneira o estudo, e deixando logar para muitas plantas que alli faltavam. Este trabalho foi feito, segundo nos infor- maram,'na primavera passada. Os três planos superiores e o plano grande inferior, que constituem a eschola philosophica, ' e que até aqui estavam plantados por dous sys- temas, ficaram agora segundo o methodo natu- ral do grande botânico allemão Endlicher. Este trabalho, principiado no 1." de outubro, ficou concluído nos últimos dias de novembro. Nos primeiros havia uma só planta por cada género, e o segundo adoptava uma classificação que a sciencia abandonou, o que dava logar a um anachronismo scientifico, e ao mesmo erro da eschola medica e industrial pela repetição das plantas. Além d'isso a eschola Linneana desde a súa fundação pelo nosso Brotero não tinha soffrido amanho algum radical, o que muito se fazia sentir; era portanto urgente e mister arrancar todas as plantas para lhe occorrer com este grande beneficio. A antiga vinha sítà'ada na cerca dos Bentos 18 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA junto á cerca das Ursulinas, onde ha annos se tinha plantado prrande numero de EucalyiHiis e Grevilleas, sendo terreno impróprio para estas arvores, ficou agora transformado em eschola de plantas de essências resinosas. Visitamos as estufas que achamos na melhor ordem, e tivemos occasiào de ver o presente of- ferecido áquelle estabelecimento e vindo do Rio de Janeiro, de Orchideas, Palmeiras, Fetos e outras plantas todas mui notáveis e com os res- pectivos nomes botânicos. Vimos também a nova estufa dos Fetos, concluída na primavera d'este anno, apresen- tando aquellas cryptogamicas uma vegetação luxuriante. Entre as obras feitas notamos a grade da alameda, a ponte que dá passagem do Jardim para a cerca, e a casa de trabalho para o ser- viço das estufas. Ahi admiramos os cysnes oflFerecidos pela camará municipal de Lisboa. Na cerca vimos também muitas plantações de arvores fructiferas e de vinlia, prendendo a nossa attençào sobre tudo os viveiros das me- lhores espécies das nossas cepas e do estran- geiro, que a direcção do Jardim tenciona pôr á venda por preços muito baixos, pois o seu louvável intento é introduzir as novas espécies e não fazer negocio. A actual direcção do Jardim Botânico torna-se digna dos maiores encómios pe- los esforços que emprega para engran- decer aquelle estabelecimento scientiíico por emquanto o primeiro no seu género que temos em Portugal. — Do summario do relatório da admi- nistração geral das mattas do Reino com referencia ao anno económico de 1873 a 1874 consta o seguinte: — a receita total importou em 53:693^908 reis, e a des- peza 41:062:5356 reis, havendo um saldo de 12:631í>552 reis. A somma disponí- vel para despezas e custeamento do serviço florestal de 1874-1875 foi de 10:716;5966 reis, subtrahidos os encar- gos na importância de 1:914;5586 reis, que passam da gerência d'aquelle anno para este ; e diminuindo da verba da re- ceita o saldo de 8:684?5109 reis que passou do anno anterior, vê-se que a re- ceita própria foi de 45:009;5»799 reis. A venda da madeira produziu uma verba de 40 e tantos contos de reis. A exploração da gomma fez-se n'uma área de 2:013 hectares, e foi de 400:000 aproximadamente o numero de arvores sujeitas áquolla operação. A colheita foi do 284.615:107 kilo- grammas de gomma, que, depois de fa- bricados, renderam em difFerentes pro- ductos 278.948:395 kilogrammas. Do anno anterior havia passado em saldo 319.874:420 kilogrammas. O total dos productos da fabrica da resinagem ficou portanto sendo de 319.874:420. D'este foram vendidos 312.031:725. As vendas realisadas foram no valor de 15:130;5980 reis, e a despeza feita foi de 7:529í>049 reis. O saldo foi de reis 7:601;5931. O preço médio dos productos vendidos foi : terebinthina, sem tara, 269 reis por kilo; essência de terebinthina, sem tara, 103r>734 reis, pêz loui'o, com tara, reis 30:5345, e resina amarella com tara, reis 306076. Extrahiram-se das mattas do Bussaco 8:707 plantas, e dos viveiros do campo Grande 2:033 arvores. — Segundo ouvimos dizer, os traba- lhos do Jardim Botânico da Eschola Po- lytechnica de Lisboa, vão muito adean- tados. — Não nos enganamos quando dissé- ramos n'um dos números passados que havia algum motivo imperioso e alheio á. vontade do snr. Margiochi Júnior para que o jardim da praça do Príncipe Real de Lisboa tivesse um aspecto triste e co- mo que de abandonado. A razão que houve para que o deixassem chegar a esse estado foi, segundo somos informa- dos por pessoa de inteira confiança, a grande estiagem do anno passado de mo- do que os arrelvados e as próprias arvo- res tiveram de ser regadas a regador e com grande parcimonia porque a agua era extrahida de poços e não chegava para abundancias, a ponto de algumas plantas morrerem á sede. Triste morte ! Informam-nos comtudo que o snr. Mar- giochi Júnior está tractando de empre- gar os meios para de novo lhe dar o seu antigo aspecto. — De MM. Ch. Huber & C", rece- bemos o seu catalogo geral para o ou- tomno de 1874 e primavera de 1875. Segundo um aviso que publicam os mesmos senhores, fizeram uma grande re- ducção aos seus preços anteriores. Como sempre, o presente catalogo traz algumas novidades. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 19 — Os boiãevarãs de Vienna, que são considerados os melhores, téem nos sitios mais importantes 160 pés de largura, e são assim divididos: os passeios são de 18 pés de largura; em cada lado da rua lia um caminho de 20 pés para a passa- gem de vehiculos e em seguida outro ca- minho arborisado para os equestres. As arvores principaes que ornamentam os boulevards são: Platanus orientalis, Ai~ lantus glandulosa, Robinia-jpseudo- Acá- cia, etc. — Mr. Gressent é bem conhecido en- tre nós pelas suas publicações, taes como «Le potager moderne», «L'arboriculture fruitière», e pelos seus populares «Alma- nachs» que publica desde 1868 e que sem- pre vêem repletos de noticias interessan- tes. Vem isto a propósito d'um catalogo que Mr. Gressent nos enviou, das se- mentes colhidas pela sua própria mão no seu jardim. Mr. Grressent, professor d'arbori cultura e fundador do Jardim-Eschola com o seu nome em Sannois (Seine-et-Oise), é um dos mais conscienciosos cultivadores que tem a França, e os nossos agricultores terão muito a lucrar em tomar relações com aquelle cavalheiro. O catalogo de Mr. Gressent, em hor- taliças, contém tudo quanto ha de me- lhor. — O governo francez encarregou a di- recção da estação agrícola de Montpel- lier de estudar a moléstia das Laranjei- ras, que, segundo consta, tem-se desenvol- vido d'um modo assustador na Córsega. O director da estação de Montpellier já pediu ao ministro da agricultura para solicitar do governo italiano uma nota dos estudos alli effectuados sobre a de- sastrosa moléstia. Ha alguns annos que esta moléstia grassa na Itália e o governo já prescre- veu diversas providencias tendentes a re- mediar o mal. — Nos « Archives de Médecine Nava- le D encontramos uma noticia relativa ao uso da casca do Ailantus glandulosa, como remédio contra a dysenteria. O dr. Robert, medico da divisão naval da Chi- na e Japão, affiança a excellencia do re- médio. — Um correspondente do «Garden» diz que existe em Exeter um Eucaly- ptus gloòulus, que conta vinte e cinco annos e que tem passado os invernos sem soffrer nada, apesar do thermometro (Fahrenheight) descer mais de 4.° abai- xo de zero. Isto prova que esta espécie é mais rús- tica do que muita gente ainda suppõe. — As fructas novas obtidas em 1873 são em numero bastante crescido e pro- vam o quanto se cura lá por fora das se- menteiras. Entre as uvas mencionaremos a Gol- den Queen, variedade serôdia produzida pela Alicante cruzada com a Ferdinand de Lêsseis. Outra variedade, Venre^s òlack mus- cat, è, segundo se affirma, superior á Mus- cat Haniburgh, introduzida ha três ou qua- tro annos no nosso paiz. Estas duas variedades foram obtidas por Mr. Pearson, de Chilwell. As maçãs novas são em crescido nu- mero, mas como de reconhecida superio- ridade limitar-nos-hemos a recommendar a Barc7iard's Seedling, a Ladi/ Henniker^ SL D. T. Fish e a Worcester Pearmain. As peras são em pequena quantidade. Referiremos apenas a Lucy Grieve, que não é grande, mas que tem um gosto de- licioso. Ao dr. Roden devemos as seguintes variedades de morangos : Gijpsy Queen, grande e serôdio; Fnchantress , no géne- ro do British Queen, mas melhor e mais fértil; Sir John Falstaff, rústico e fér- til; The Countess e Early Crimson Pine. Entre os melões são recommendados os seguintes, premiados pela Real Socie- dade de Horticultura: Chair êcarlate de Read, fructo delicioso, e Chair verte de Gilhert, de gosto muito particular. — Hoje são frequentes os pedidos das flores de Camellias para a capital, e mais numerosos seriam se não fosse o receio de soffrer o desapontamento de as ver desfolhadas ao abrir a caixa que as con- tém. Para evitar esse inconveniente indica Mr. Gilbert um processo empregado por elle ha muitos annos e pelo qual conse- gue que as flores se conservem frescas e viçosas por alguns dias. ?Q JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Corta em pedaços quadrados uma Ba- tata grande e pue-no3 todos juntos no fundo da caixa, e para os segurar prega umas ripasinlias nos sítios da juncçao dos quadrados de Batatas. Feito isto, resta colher as Camellias, aguçar-lhes os pés e enterral-os nas Batatas. Por este modo, diz Mr. Gilbert, tem feito remessas de flores que se conservam no seu natural estado de frescura por oito dias e mais. Quem diria que as Batatas serviriam para a conservação de flores ! Sempre descobre cousas a imaginação humana! — Por iniciativa do snr. administra- dor do concelho de Setúbal vae abrir-se n'aquella cidade uma aula de agricultura. — O snr. António Borges, da ilha de S. Miguel, ofFereceu ao Jardim Botânico de Coimbra vinte e tantas Palmeiras. O mesmo estabelecimento foi recente- mente mimoseado com outros presentes do Rio de Janeiro, constando de collec- ções de Orchideas, Fetos c varias outras plantas. — São do nosso estimável collega, o «Jornal do Porto», as linhas que em se- guida se vão lêr: Para que os lavradores adoptem as práticas agrícolas mais recommendaveis, é preciso, en- tre outras cousas, que dêem o exemplo os per- sonagens de maior prestigio social. Em França, occupam-se de sementes, ani- maes, adubos e industrias ruraes, os cidadãos de mais nomeada, e fazem-n'o, segundo dizem, para ganhar n'esta esphera o que perdem na politica. E os proprietários seguem de boa men- te as suas indicações e auxiliam os seus propó- sitos. Poucos francezes ha de reputação europeia que nào consagrem algum tempo a sua attcn- çiío a agricultura nos congressos, nas acade- mias ou exposições. Por oecasiào do congresso de Chateaure- nard, celebrado a 27 de setembro d'este anuo, o marechal Mac-Mahon offereceu um magnifico vaso de porcellana de Sévres, ao professor que mais se distinguiu no ensino agrícola. Foi pre- miado com elle o professor de Courtenay. Mr. Nouette-Delorme, ao distribuirem-se os prémios, pronunciou um discurso, do qual faze- mos o seguinte extracto: "Nào esqueçamos que o progresso agrícola envolve o proveito do lavrador ao mesmo tem- po que o desenvolvimento da riqueza publica; não esqueçamos que as condições económicas da nossa cpocha e as especiaos da França impõem deveres sagrados k agricultura. Elhi tirou do seio da terra os thesouros que asseguraram a independência da pátria.» No concurso de Soissons, Mr. Vallerand, fal- lando do estado da mechanica applicada á agri- cultura, disse: «O sacho de cavallo, especialmente o de gra- des articuladas, executa um trabalho perfeito nos meloaes, batataes e em outras plantações, cujas linhas estejam suíKcientemente espaça- das. Emquanto ao arado, o ponto de apoio que se lhe tem dado, escusa ao que o dirige de o manter em equilibrio. De modo que revolve me- lhor a terra que o antigo.» Na reunião livre dos agricultores da assem- bleia nacional, Mr. Delacour combateu o impos- to sobre a azeitona, aduzindo dados convincen- tes. Em Lyão constituiu-se uma sociedade de vi- ticultura. O barào de Chauraud, presidente, ex- poz nas seguintes phrases a indole e objecto da nova sociedade: "Devemos, em primeiro logar, melhorar a qualidade dos vinhos sem perder em quantida- de, escolhendo as cepas que mais conA^enham ao solo, ao clima e á exposição. Devemos depois, com bom cultivo e uma poda bem entendida, au- gmentar a quantidade do vinho sem alterar a sua qualidade. A questão roduz-se a três pontos: selecção de vides, cultivaçào e poda. Os ensaios principia- ram já em algumas localidades; em breve se rea- lisarào em toda a região do Rhodano.» Assim 03 nossos aristocratas e os nossos políticos imitassem este salutar exemplo ! — No numero passado falíamos dos en- saios da cultura do Chá, a que se está procedendo em Itália e Ponta Delgada, e pedíamos para que aqui se fizesse ou- tro tanto, cônscios de que dariam o me- lhor resultado. Eita nossa opinião, fundada em obser- vações próprias, é confirmada pelo snr. dr. Júlio Augusto Henriques, director do Jardim Botânico de Coimbra, que nos diz que em sua casa, em Cabeceiras de Basto, tivera por muitos annos vegetan- do ao ar livre, florescendo e fructifican- do, alguns exemplares da planta do Chá, nascidas de semente vinda de S. Paulo (Brazil), segundo parece recordar-se o snr. dr. Júlio Henriques. A esta communi cação accrescenta o nosso amigo que ás plantas não se lhes prestavam os mais pequenos cuidados. Ora este ultimo facto é muito para ser tomado em consideração, porque nos mostra á evidencia a rusticidadc de que c dotada e portanto os serviços que pôde prestar á nossa industria agrícola.- J. D. DE Oliveira Júnior. JORNAL DE HOETICULTURA PRATICA 21 PÊRA SERRURIER Seria desconsiderar uma tão preciosa variedade se d'ella não déssemos uma noticia aos amadores de pomicultura. Esta variedade fructificou a primeira vez em 1873 no nosso estabelecimento, surpreliendendo-nos de dia para dia pela sua belleza, forma e tamanho. Todas as vezes que a visitamos a contemplávamos, e dizíamos muitas vezes : que prodígio a natureza nos apresenta! Se ella corres- Fig. 8— Pêra Serrurier ponder no gosto á apparencia, daremos mil votos de louvor ao que se desvelou em obter tão preciosa variedade. Foram correspondidos os nossos vo- tos e portanto sejam dados os louvores Vol. VI.— 1875 ao snr. Van-Mons, pela bella acquisição, que dedicou ao seu amigo Serrurier, membro do Instituto de Hollanda e gran- de amador de pomologia. O fructo gran- massa fina, e de um de, muito succoso j^.o 2 — Fevereiro 22 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA aroma muito delicado e pouco commum; emfim, é uma preciosidade, pois reúne to- dos 03 bons predicados. bro. Maduração desde setembro a novem- JosÉ Marques Loureiro. BROMUS SCHRADERI ' Natureza do terreno — Cultivamos priucipalmcnto o Bronms Schraderí n'um torre uo de trigo, mas realmente esta ter- ra não era mais do que ura sub-solo, por- que recentemente havia-se tirado uma porçcão da terra da supcrficic. Uma semen- teira de plantas de prado, feita ao mes- mo tempo, deu muito mau resultado, ao passo que o Bromus vegetou maravilho- samente. Repetidas sementeiras feitas á sombra e em mattas de corte deram o mellior resultado. N'um areal pobre mas muito fresco e ainda nas margens d'um ribeiro o resultado foi idêntico. Podemos agora mellior do que quando publicamos a primeira edição d'este livro, indicar a natureza do terreno em que cres- ce espontaneamente esta Gramínea for- raginosa. Douglas, um dos primeiros explorado- res do Orégon e da Califórnia septen- trional, observou-a nas margens elevadas e áridas dos rios Lewis e Clarke e pró- ximo das nascentes do rio Colômbia (*). Variando as nossas experiências, che- gamos a fazer ideia exacta da natureza do solo que c mais favorável á vegetação do Bromus Schraderi, que parece com eífeito preferir uma terra siliciosa ou argilo-si- liciosa. Ao menos podemos dizer que a se- menteira feita esta primavera n'uma ter- ra areenta pobre (situada perto do areial d'onde tiramos sempre a areia de que precisamos) teve o melhor êxito, ao pas- so que n'uma pequena porção de terre- no que tinha levado gesso, nasceu muito mal, apesar de ser regado copiosamente quasi todas as semanas. Em Fariz e seus arredores o Bromus Schraderi não vaebem,segundo nós mesmo tivemos occasião de observar. Esta Gra- mínea prefere um terreno mais sêcco do que pensávamos, visto que na areia, como acabamos de dizer, produziu bem, dando Cl) Drv flovatcil frronnds of Lewis' aiul Clark(!'s rivfrs, ;ui(l lu-ar tlii' SDiirccs of Coluin- bia. (Douglas. (Flora borcali Americana». Hoo- ker. T. II, pag. 253.) sobretudo muito grão. Ao contrario não obtivemos nada n'um solo paludoso, ape- sar da terra ser de boa qualidade. O «Journal d'Agriculture Pratique», fazendo menção dos ensaios feitos com o Bromus Schraderí, cita alguns agriculto- res distinctos que obtiveram bons resul- tados em solos ar centos : Mr. Mayre em Seine-et-Marne e Mr. Gast no Haut- Rhin. «Sabemos, disse Mr. Barrai na «Chronica Agrícola» de 20 de novembro, que a melhor producção dada pelo Bro- mus foi colhida nas areias. Foi o que aconteceu a Mr. Briot, em Finistère. » Mr. Toutée, de Saint-Fargeau (Yonne), dá conta, porem, do Bromus ter produ- zido bem n'um solo muito argiloso que ti- nha o sub-solo quasi de argila plástica e onde não vegetava nem a Luzerna nem o San feno. Como o seu habitat e a experiência indicam, o Bromus não precisa de terre- no muito escolhido ; pelo menos até ao presente tem mostrado que se accommo- da em todos. Vimol-o em Lyon, nas cul- turas de Madame Maurer, prosperar n'um solo ardente e pedregoso e, se por acaso as experiências falharam n'alguns solos calcareos, não aconteceu outro tanto nas propriedades do conde Benoist d'Azy, co- mo se verá mais adeante. Os agricultores do Dauphiné são de- vedores a Mr. Julien Bertrand de va- riados ensaios feitos com o maior escrú- pulo com o Bromus Schraderi e temos o prazer de os poder assignalar, extrahin- do-os d'uma carta que aquelle distincto agrónomo publicou no «Sud-Est» e dos esclarecimentos que a nós mesmo pres- tou. Eis aqui dous fragmentos muito inte- ressantes da carta que nos dirigiu : «Na minha propriedade d'Autram, si- tuada a 1:100 metros acima do nivcl do mar, semeei nos fins de maio uma peque- na porção de Bromus, n'um solo bom, é (1) Vide J. II. P., vol. VI, pag. 3. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 23 verdade, mas um tanto sêcco. A vegeta- ção que moãtrou era magnifica.» Mais adeante accrescenta Mr. Julien Bertrand : «Na minha propriedade de Saint-Quen- tin obtive, n'uma superfície de cincoenta metros quadrados de terra bem prepara- da e adubada, aproximadamente 75 li- tros de grão. Os ensaios, que fiz nos terrenos que não foram adubados, deram-me comparativa- mente duas vezes mais forragem de Bro- miis, do que a Luzerna e o Sanfeno : não deixei produzir grão. Apesar da geada, o Bromus está ve- getando e a cor verde que tem contras- ta com a pallidez das Qramineas que o rodeiam. Ainda devo dizer que nas terras de alluvião do Isère, tanto a Luzerna como o Sanfeno só vão bem nos terrenos bem preparados e adubados e mal chegam a durar dous annos.» Os esclarecimentos que acabam de lêr- se são importantissimos, porque nos dão a esperança de que o Bromus /Schraãeri poderá servir para revestir de verdura as montanhas, objecto que com tanta jus- tiça prende|a attenção este anno. Como se sabe, esta planta tem a gran- de vantagem de se semear per si e es- peramos que Mr. Julien Bertrand con- tinuará a fazer as suas experiências a diversas altitudes e que nol-as commu- nicará. O agricultor acima nomeado ainda ob- serva «que o Bromus produziu aproxi- madamente o dobro da Luzerna e do Sanfeno». A Sologne deveria convir a uma plan- ta que parece prosperar sobretudo nas terras siliciosas e de sub -solo fresco e com eíFeito alguns agricultores, entre os quaes MM. de la Salle e Labiche, assigna- laram os bons resultados que obtiveram. O bom êxito da planta que nos occu- pa está também provado na Argélia e na Itália e soubemos por Mr. Borély de la Sapi que na nossa colónia da Afri- ca, onde o anno passado os gafanhotos causaram gravíssimos prejuízos, haviam também destruído quasi completamente a pequena porção de Bromus que tinha semeado. Se ainda restam algumas duvidas pa- ra que se possa determinar d'uma ma- neira absoluta o género de solo que me- lhor convém a esta planta forraginosa, é todavia certo que não exige terras ex- cellentes e escolhidas e foi com razão que um agrónomo disse que com esta forragem aconteceria o mesmo que com a Luzerna, o Sanfeno, o Trevo, cada uma das quaes tem logar conveniente na cul- tura e debaixo de certos climas. Segundo o «Journal d'Agriculture Pra- tique» o bom êxito do Bromus Schraãe- ri foi evidenciado nos seguintes depar- tamentos : Finistère, Isère, Ilaute-Loire, Mayenne, Moselle, Saône-et-Loire, Sei- ne-et-Marne, Seine-et-Oise e Haut-Rhin. As cartas que nos têem sido dirigidas permittem-nos que ajuntemos mais estes departamentos : Basses-Pyrénées, Cher, Dordogne, Hérault, Jura, Loiret, Niè- vre, Hhône, Sarthe, Somme e Yonne. Quantidade de semente por hectare — A principio semeamos em Segrez 250 litros por hectare, mas esta quantida- de era de mais, porque esta planta afi- lha muito e f(5rma tufos enormes. Mais tarde empregamos só 200 litros e pare- ceu-nos bastante e em 1862, desejando fazer uma sementeira n'um espaço de terreno determinado e não nos parecen- do que chegasse a semente de que dis- púnhamos, tivemos de a lançar mais rara e seis mezes depois estava o campo per- feitamente guarnecido. Emfim o anno passado (1864), tão pouco favorável para as forragens, fize- mos experiências com o intuito de fixar com exactidão a quantidade de semente que se deveria empregar, e d'este estu- do concluímos que bastam 160 litros por hectare para as terras boas, mas nunca menos, porque então a producção do pri- meiro anno seria fraca. E nos terrenos areentos e pobres achamos que se deveria empregar 200 litros. Devemos porém ponderar que nos parecem mais conve- nientes as sementeiras raras, quando se pretende conservar por muito tempo o Bromus no mesmo solo. N'uma carta que dirigimos a Mr. Barrai sobre o resultado dos ensaios feitos em 1864 com o Bromus Schraãeri inseri- mos algumas linhas bastante interes- 24 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA santea, devidas ao conde Benoist d'Azy e que vamos reproduzir aqui, porque nos pa- recem demonstrar evidentemente a van- tagem das sementeiras raras. Eil-as : «Recebi do meu collega, Mr. Laval- léo Sénior, em principios de 1864, um saquinho com semente do Bromus Schra- deri: seria o máximo a quinta parte de um litro. Fiz a sementeira nas minhas proprie- dades em Saint-Benin d'Azy (Nièvre) n'um tetreno pouco beneficiado que ti- nha cerca de 50 metros. A semente fi- cou disposta muito rara. Foi no mez de março que fiz aquella operação. As plantas desenvolveram-se cora muita força, produzindo cada uma cinco a seis hastes : colhi 3õ litros de grão, não contando uma grande quanti- dade que cahiu no solo. Depois de ter feito esta colheita man- dei fazer a sega e hoje ainda tenho uma forragem que tem mais de O™, 30 de al- tura e que apresenta um aspecto vigo- roso, apesar da geada. O terreno cm que o cultivei é o que se chama em Nivernais terreno dos Amo- gnes, que é um terreno argiloso e cal- careo (calcareo coraliano), terreno mais sêcco do que húmido. Esta forragem é um tanto grossa mas parece tenra e de boa qualidade. Era pou- ca a que tinha e por isso não pude veri- ficar se os animaes a comiam. OfFereci uma pequena porção de semente á So- ciété d'Agriculture de Nièvre, mas serei eu o próprio a continuar uma experiên- cia de que espero feliz resultado. 11 de novembro de 1864. Conde Benoist d'Azy.» Ao que se acaba de ler devemos ac- cresccntar que se semeia per si e nasce com abundância. Os terrenos que rodeiam aquelle em que cultivamos o Bromus Schraderi assim como as próprias ruas cobertas de pedra próximas ao nosso cam- po d'experiencia3, dentro de poucas sema- nas appareceram povoadas com esta Chra- minen. Cuidados da cultura — Os cuidados a prestar ao Bromus Schraderi são quasi nenhuns ; quando muito uma rolagcm na primavera. Restam -nos agora os traba- lhos preliminares que se limitam : 1." — lavrar o mais fundo que possa ser; 2." — semear; 3." — gradar; 4.'' — fazer a rolagem com um rolo bastante pesado. Insistimos n'esta ultima operação, por- que o Bromus prefere os solos que têem a superfície bem calcada. Doze ou quinze dias depois germina a semente e desde logo a vegetação começa a manifestar-se rapidamente. No fim de dous mezes póde-se proceder ao primei- ro corte, caso a sementeira tenha sido feita em março ou abril e logo que o Bromus seja segado vê-se desapparecer todas as plantas vivazes ou annuaes, cu- ja vegetação tinha terminado ao mesmo tempo que a do Bromus. Com effeito esta planta occupa tão bem o solo, afilhando e preenchendo as mais pequenas lacunas, que não permitte a nenhimia outra o viver associada com ella. É, pois, uma planta essencialmente destruidora que não deixa viver ao seu la- do nem sequer o Cardo, a Acelga, a Gra- ma ou outra planta qualquer das que in- vadem os nossos campos. Pela uniformi- dade com que cresce, a sua verdura é muito bonita. Das propriedades destruidoras do Bro- mus já ní3s nos servimos uma vez para poder cultivar um terrenosinho que an- tes tinha servido de viveiro e que de- pois fora invadido pelas hervas bravas. No primeiro anno foi esse terreno occu- pado por Ervilhas e no segundo por Ce- nouras^ e comparativamente, apesar de ser sachado, o Bromus conservava-o mui- to mais limpo. Fizemos sempre as sementeiras a lan- ço : devemos porem fazer menção d'outro systema proposto por Mr. Briot, presiden- te do Comice Agricole de Quimper. Este distincto agricultor faz a semen- teira cm linhas que estão 0™,30 distan- tes umas das outras, e cava o terreno mais de uma vez para que os tufos tomem bom desenvolvimento e possam ser divididos e plantados depois em quin- cunce. Este methodo de cultura pelo meio de rebentos pode auxiliar muito a rcpro- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 25 ducção do Bromus Schraderi. Comnosco deu este systema o melhor resultado, to- mando as plantas todo o vigor de que são susceptíveis. Cada tufo produziu 20 ou 30 repro- ducções que d'alli a cinco ou seis mezes tinham o mesmo aspecto que as plantas d' onde haviam sahido. Isto é uma prova evidente de que o Bromus Schraderi é vivaz, porque se fos- se bisannual ou mesmo triennal não re- bentaria de modo que se podésse multi- plicar. Parece-nos, pois, que, pela transplan- tação dos rebentos, se pôde reproduzir consideravelmente esta Gramínea, com- tudo devemos ter em vista que seria um meio dispendioso, porque emprega muita mão d' obra. Pela sementeira poupa-se essa despeza e depois do primeiro corte ha- verá occasião de se apreciar a sua vege- tação. Duração — Não podemos fixar exacta- mente a duração que pôde ter uma cul- tura d'esta planta forraginosa. A cultura mais antiga que temos con- ta cinco annos e os cortes do anno que acaba de expirar não denunciam de mo- do algum que esteja a chegar o seu ter- mo. Deveremos com tu do dizer que o pro- ducto em 1864 foi mais pequeno do que no anno precedente, mas esta diminuição pôde attribuir-se á sêcca extraordinária da primavera e do estio. Também não devemos occultar que, precisando muito da semente do Bromus, fomos obrigados a fazer cinco colheitas de grão no espa- ço de dous annos e todos sabem como esta espécie de colheita enfraquece as plantas. Ainda assim o nosso Bromus an- tigo sô mostrou soífrer alguma cousa nas occasiões das grandes sêccas e no outo- mno deu uma boa forragem. (Continua.) Oliveira Júnior. os GADOS DE ENGORDA Uma das industrias mais importantes e momentosas, que emanam e derivam immediatamente da agricultura — mãe e fonte, mais ou menos directa, de todas as industrias — é por certo a cria e en- gorda dos gados para consumo, assim no próprio paiz como nos estranhos. Tratos ha na Europa, aonde esta es- pecial industria existe ha séculos, com grande prosperidade e ganância para os productores e não menos proveito para os consumidores. Nos pampas e em ou- tras partes do Novo Mundo é sabido que vagueiam manadas immensas de bois, cujos productores foram trazidos pelos conquistadores hespanhoes, e que hoje constituem uma grande riqueza, ainda pouco aproveitada, apesar de muitos es- forços, entre elles os de Liebig, que in- ventando o extractv/m carnis, teve em vista não deixar desperdiçar a carne dos bois, que nos pampas são mortos aos mi- lhares, só para curtimento da pelle. Demonstrar a necessidade de engor- dar gados para abastecer os mercados europeus, isto é, para alimentar e sus- tentar a grande massa de população, que lida, tressúa e se afadiga, cada qual no seu mister, e cuja somma de esforços é a final o progresso, a civilisação, o aper- feiçoamento e o aproveitamento das for- ças naturaes, melhoria de commodos, au- gmentação de vida, prosperidade para todos e cada um ; demonstrar que a car- ne é essencial á harmonia do trabalho, crescimento do pecúlio social, á satisfa- ção de todas as necessidades vitaes, tan- to da communidade como do individuo; é mais do que sobejidão e excrecencia, é chateza ridicula, é pleonasmo indescul- pável em quem, como os que vivemos n'este século, andamos avezados e affei- tos a estudar, em leituras comesinhas e ao alcance de todas as intelligencias, as doutrinas da moderna economia politica, sciencia amplíssima que braceja pelos do- mínios das restantes sciencias physicas e moraes, auferindo de todas suecos nu- tritivos e seiva opulenta. A carne, mais do que o pão, é o ali- mento primordial do homem. O pão indica já um estado de civili- sação adiantado, uma cultura mais do que rudimentar, uma certa estabilidade dos habitantes. O povo selvagem, erradio, sanguina,- 26 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA rio, como um bando do bestas feras, ali- menta-30 somente do3 despojos da caça nas grandes florestas, que cobrem as Ín- vias solidões e os gi-andes tratos virgens, por cujos recessos umbrosos e ainda ho- je quan mysteriosos, vagueiam aqui o cerdo montesinho, o cabrito, o veado, o porco espinho, além o búfalo, o urso, a zebra, e todos os specimens das faunas das solvas o dos descampados, das serra- nias c das lymphas; desde os gélidos plai- nos do polo árctico até ás adustas re- giões intcrtropicaes, desde o esquim;') inoffensivo até ao torvo e sanguinário escravo do rei de Dahomay. Não raro ainda, nos nossos dias, por traz dos robustos troncos das arvores, acoitado pela ramada, se divisa o antro- pophago, cujos olhos reluzentes buscam a prosa, a victima imbellc do seu feroz appctite. Quando faltam os productos do mar, e a terra escalvada e nua, rcqueimada por um sol abrazador, não gera fructos, não sustenta animaes, c erma de vida, dilata-so como um vasto cemitério, é já espantoso que o homem devore o seu si- milhante, comquanto a necessidade o obrigue ás vezes a comer terra, argilla vermelha misturada com um oxido de ferro, para enganar a fome e socegar os rebates insoífridos do estômago. Mas não se comprehende como em cer- tas ilhas afortunadas do Pacifico, aonde a força productiva da terra é espontânea e admirável, ou que na Nova-Zelandia, na Tasmania e em outros sitios ainda, o homem soja excepção monstruosa á sabia lei da natureza, que sobreleva e antepõe a conservação da espécie á conservação do individuo. Os povos caçadores e pescadores vão porem decaindo successivaraente, e as tribus, que ainda restam, são cada dia esmagadas pela corrente caudal da civi- lisação. De envolta com cilas vae aca- bando a anthropophagia, a qual, dentro cm pouco, será amaldiçoada por todos os homens. Aos povos caçadores seguem-se os po- vos nómadas, os quaes pastoreiam gran- des rebanhos, como ainda hoje vemos nos ctmfins da Rússia, aonde os kalmukos representam perfeitamente este estádio do progressivo caminhar da humani- dade. A carne é-lhei alimento principal, mas já o pão entra em todos os repastos e refeições, alcançado, quer pela cultura, quer pelo trafico commercial. Aos povos sedentários pertence susten- tarem-se principalmente de pão. A cultura cerealífera caracterisa ver- dadeiramente o estado de uma civilisação adiantada. Nos primeiros inícios o pão substituo quasi completamente a carne, a qual c pertença exclusiva, e como que foro no- bíliarchico do rico-homem e do fidalgo. É assim que na edade-média as coita- das eram legares defezos e isentos, e o peão, a arraia-miuda, de longe em lon- ge, em dia de festa e folgança, comia am tassalho de toucinho. A caça era regalia dos fidalgos. Os possuidores de animaes domésticos de to- da a espécie pagavam enormes taxas aos senhores da terra. D'est'arte immensos tratos ficavam maninhos e incultos, co- bertos de espesssura brava, não só para acoitar a caça, mas também porque fal- tavam braços e animaes de cultura. Este horrível abuso da força, que tor- nava uma casta privilegiada superior ás leis da justiça e da egualdade, foi dimi- nuindo a pouco e pouco. Começou o habitante do burgo, que se enriqueceu com o commercio, a reagir contra o fidalgo; formaram-se as corpo- rações de officios, cujos mesteiraes ousa- vam fallar alto. Os juizes do povo pro- clamaram os seus direitos e prestando ajuda e apoio ao braço real, desmorona- vam o feudalismo. A instrucção foi-se derramando tarda, apoucada, rachitica e enfezada, mas sufficiente já para der- ruir instituições tão damninhas e obno- xias. Desde então até hoje a historia da humanidade é uma lucta ; cm primeiro le- gar contra os privílcgios do nascimento e da riqueza, cm segundo logar contra a natureza. Egualar, quanto ser possa, as condi- ções do consumo e producção, de sorte que a cada qual caiba a porção necessá- ria de alimento para viver, e trabalhar, c produzir por sua vez o máximo, pelo exercício das suas faculdades, tal é o JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 27 problema que á sciencia incumbe resol- ver pelo emprego e combinação de todos os seus esforços. Importa isto em dizer mui resumida- mente, que emquanto o espirito carece das luzes da instrucção, necessita o cor- po de pão e carne, os dois alimentos na- turaes do homem. A historia do que se ha feito para re- solver este problema de incalculável al- cance e importância subida é impossível rastreal-a aqui, ainda que fosse perfun- etoriamente. Arredaremos pois para lon- ge tudo que não tenha ligação immedia- ta, parentesco bem definido com o nosso assumpto, e dando como aventada e de todos conhecida a verdade do que ahi fi- ca explanado muito ao correr da penna 6 sem visos alguns de originalidade, tra- ctemos tamsómente dos animaes de engor- da, que no nosso paiz servem de alimen- tação— o boi e o porco. Da cultura cerealífera muito se ha di- to e muito falta que dizer. N'e3te mesmo jornal, que se presa de ser órgão da nossa primeira associação agrícola, já se ha escripto sobre tão im- portante cultura, que se não vae entre nós em progressiva decadência, não os- tenta melhorias. Para tão miserando qua- dro alguns dos bons talentos d'esta terra tem chamado a attenção dos que devem amparar, dirigir e aviventar a agricul- tura, alicerce do edificio nacional, pul- mão immenso, onde o sangue do paiz vem pôr-se em contacto com o oxigénio vivificante. Nós mesmo, com sermos quasi hospedes em taes matérias e mui pouco azados para commettimentos e entrepre- sas de tanta magnitude, alçámos por ve- zes a voz e ainda ultimamente, fallando a propósito da phosphorita de Marvão, proclamámos a instante necessidade de melhorar, por todos os modos, a cultura pela estrumação racional e scientifica das terras com os adubos chimicos e corre- ctivos adequados. Hoje vamos encarar o problema sob paralaxe difí*erente. A these é a mesma. Entre o produzir carne e o produzir pão não ha difí'erença. São os mesmos ele- mentos com apparencias diversas. Importantíssimo e de subida monta é o assumpto ; falhos e quasi nullos os meios que envidamos. Confessamol-o com sin- geleza, sem ares de falsa modéstia ou de precaução oratória, como recommen- dam todos os Quintilianos. II As duas pedras angulares de toda a civilisação são pois a carne e o pão. Aca- bem estes dous alimentos ; soíFram que- bra e diminuição constante: assim aca- bará também o progresso, diminuirá suc- cessivamente a população, afrouxarão os laços sociaes, baixará o nivel intellectual, cahirão as industrias, começará o maras- mo, e na colla da pobreza e da miséria virão todos os males e todos os cataclys- mos. Compulsemos a historia das grandes guerras, que duravam annos e annos, entre os potentados do mundo, rivaes no poderio e riqueza, ciosos da opulência alheia, verdadeiros abutres^ que nos cam- pos de batalha ganhavam ou perdiam co- roas; vampiros, que se alimentavam á custa do sangue do povo, que sugavam a salvo. Relancemos um rápido olhar, não já pelo vasto panorama das guerras anti- gas, d'essas formidáveis invasões, que derrocaram pelos fundamentos impérios e civilisações, thronos e sólios, que trans- formaram o Egypto n'um deserto, o Mé- xico em um açougue, as velhas e acaso primitivas sociedades das regiões indicas em hordas miseráveis e nuas ; não inqui- ramos esse terrível desmembrar e des- truir nos tempos ante-historicos, ou nos períodos, de que restam apenas quasi obliterados indícios e tradicionaes e le- gendarias relações; esqueçamos as con- quistas dos romanos, cujas phalanges e cohortes assolaram e talaram meio mun- do ; deixemos Attila no escuro e com elle todos os conquistadores, que do norte e do oriente irromperam pela Europa, co- mo uma torrente furibunda, e bem as- sim as matanças da edade média, as re- presálias do feudalismo, que, em tempos não mui remotos, originaram a anthro- pophagia no centro da França ; corra- mos um véo sobre todos estes negros ca- pítulos da historia e analysemos tamsó- mente os perniciosos eflfeitos das guerras 28 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA do3 últimos seciilo3. A falta de braços produziu na Ailemanha, duraute a guer- ra dos trinta annos, o abandono dos tra- balhos campestres ; as terras ficaram de pousio, as colheitas diminuiram e era tanta a fome, que morriam milhares de victimas á beira dos caminhos, imploran- do debalde a caridade dos viajantes. Na guerra, que Luiz XIV emprehen- deu para collocar no throno de Hespa- nha a seu neto Filippe de Bourbon, ciie- gou a fome a tal ponto, nas mais ricas províncias da França, que os próprios abastados fugiam para o exercito a fim de ganharem um pedaço de pão. O mes- mo succedeu nas guerras napoleónicas d'e3te século, e o mesmo succedeu sem- pre, e sempre ha-de succeder. Mas pa- ra que accumular exemplos? Para que apresentar provas e argumento a fim de demonstrar o que é de si evidente e ver- dadeiro ? Da terra e na terra vive e alimenta- se o homem. Da terra tudo lhe vem, as- sim como para a terra tudo volta. Se a agricultura acabar, acaba o ho- mem civilisado, e ficará o selvagem, o caçador, o animal erradio, vagabundo, vivendo pelo instincto de conservação, luctando com os outros animaes, vencedor ás vezes, vencido outras. Se um dia a caça lhe faltar, tornar-se- ha anthropophago, e assim fora que a espécie humana, pela faculdade que os indivíduos toem de não respeitarem o seu slmllhante, viria a acabar completamen- te, depois de alguns séculos de extermí- nio e matança. Mas, como acima disse- mos, 6 Impossível tal catastrophe, por absurda e contraria ás regras harmóni- cas da natureza. A espécie é eterna e eternamente fixa e Inalterável, e permanente nos seus ca- racteres essenclaes. É em virtude d'este principio natural que o homem trabalha som descanço, ca- da vez com mais ardor, anelando sem- pre por melhorar as condições da vida, extrahlndo emfim da terra a maior quan- tidade de productos. Esta cadeia Ininterrupta, cujos elos representam os estádios diversos da clvi- llsação, e abrangem a humanidade em todos os períodos e estados, desde o an- thropophago até ao homem dos nossos dias, é a historia do progresso, ó a epo- péa do trabalho. Porém se o caminho andado é muito, é Immenso, quanto falta ainda? Quanto é necessário trabalhar, que somma pro- digiosa de força viva c mister empre- gar, para que entre os homens não haja eleitos e réprobos, felizes e precitos? Hoje, no melo da nossa çlvlllsação hu- manitária, que de míseros não cahem, á beira da rua, contrahidos pelas garras da fome, soltando o derradeiro grito af- fllctlvo, o extremo arranco, em que a al- ma se lhes esvae ! Que de tormentos não encobrem os andrajos e os farrapos, que mal envol- vem o corpo de milhares de pobres! E quantos, e são os mais numerosos, trabalham continuamente, regam com o suor a terra, e a officlna, machlnas vi- vas e productlvas, que mal ganham par- co alimento, com que a progénie não pode desenvolver-se, crescer e robuste- cer. Que de rachltlsmo physlco e intelle- ctual, que de anemias e atrophiamentos, que de degenerações monstruosas da es- pécie causadas pela miséria ! E forçoso expunglr das sociedades mo- dernas a lepra da fome. E forçoso que ao grande banquete da abastança todos possam sentar-se. E forçoso que o artífice possa produzir, sem empenhar no presente o futuro pró- prio e o da espécie. É forçoso dar a todos pão c carne, os dous grandes alimentos do homem, as duas alavancas poderosas, que asseguram á espécie humana a supremacia e a rea- leza tellurlca. A. Osório de Vasconcellos. VICTORIA REGIA Lendo no n." 12 um artigo erudito do snr. Adolpho Frederico MoUcr, seja-mc licito, sem querer de modo algum con- testar o que escreveu aquelle verdadeiro amador, dizer que no Jardim Botânico de Kew, plantou-se uma Victoria regia. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 29 n'uin tanque ao centro d'uma estufa pe- quena, onde havia plantas que requeriam muito calor, sombra, e humidade atmos- pherica. Esta estufa tinha somente vi- dro no tecto, sendo os lados parede, e es- tes vidros devidamente resguardados dos raios do sol. Aqui a Victoria regia cresceu e floresceu bellissimamente, como tive oc- casião de ver. Construiu-se depois uma grande estufa de ferro n'um ponto eleva- do; com os lados e tecto todo de vidro sem protecção alguma aos raios do sol, no cen- tro fez-se um grande tanque, no qual se collocou um apparelho para ter a agua constantemente em movimento, porém a Victoria regia não produziu folhas do tamanho da outra nem chegou á per- feição, o que provou para muitos que ella, embora crescesse nos rios, não era este o seu habitat. Tendo eu tido pos- teriormente ensejo de fallar com um grande proprietário da Demerara ingle- za, disse-me elle que cresciam em gran- de profusão no rio de Demerara, mas que povoavam os sitios sombrios, e onde a agua era mais represada. N'isto differe um tanto das outras Nymjphaeas, que costumam crescer nos sitios descobertos. Aproveito a occasião para accrescen- tar, que tenho-me dado bem, dando uma tal ou qual sombra ás Nymjphaeas quando em flor, pois conserva-lhes as cores mais vivas: a humidade atmospherica é-lhes de grande utilidade quando estão para abrir. Lisboa. D. J. DE Nautet Monteiro. REPRODUCCÃO DE VIDEIRAS Apesar da cultura das Videiras ser entre nós importantissima, os proprietá- rios não adoptam um systema fácil de reproducção para os grandes vinhe- dos. Com o intuito, pois, de elucidar os nossos leitores, vamos apresentar-lhes um methodo fácil de reproduzir estas plan- tas. Tiram-se bacêllos ou hastes das Vi- deiras que se apresentam em bom esta- Fig. 9 — Estaca de Videira. do, e fazem-se as plantações pela forma seguinte : Em fevereiro arranja-se um taboleiro de terra, conforme a quantidade de re- producções a fazer; cavando-se aquella bastante fundo, em logar abrigado do norte, e em que possam ser regadas de verão. Faz-se a reproducção de dous mo- do»: Fig. 10 — Estaca de Videira. 1." — de cada olho se faz uma nova planta, cortando-se um bocado de pau que tenha um olho (fig. 9), fazendo-lhe um corte pela parte inferior d'este (d)^ á similhança de penna d'escrever, met- tendo-se na terra quasi totalmente, de modo que o olho (c) da Vide fique tocando o solo, fazendo-se esta plantação em li- nha recta, distantes umas das outras 3 30 JOUNAL DE HORTICULTURA PRATICA centímetros ; podendo ficcar algum tanto inclinadas, calcando-se levemente a ter- ra com a encliada antes da plantação. Depois regam-se com o raro, e torna-se necessário conservar a terra húmida até fins d'abril, porque n'esta cpoclia aclia- se transformado todo o pau em raizes e sahe uma nova Videira do ollio. Ein outubro cada planta deve attingir um metro d'altura ou mais, havendo o cuidado de as regar amiudadas vezes durante o verão. Tinhamos feito estes trabalhos nas es- tufas como eram indicados por auctores estrangeiros, porém o resultado era pés- simo, pelo que, resolvemos fazcl-os ao ar livre, e a experiência foi sati.-íactoria. Agora apresentamos o segundo syste- ma, que é ainda mais fácil : Cortam-se pedaços das hastes das Vides, que tenham só um olho (a fig. 10), eplan- tam-se em regos em logares al:>rigados, e que sejam susceptiveis de serem regados ; d'este modo se obtora milhares de Vi- deiras, para serem depois transplanta- das. Por este modo obtem-r?c milhares de novas plantas, emquauio que pelo sys- tema usado geralmente, que é péssimo, o resultado é dispendioso e ao mesmo tempo incerto, porque fazendo as plan- tações com grandes varas (barbados) sem raiz, a maior parte morre e outras estão um, dous e até três aunos rachiticas e sem desenvolvimento algum. Ora, fazendo as reproducções pelos systemas acima indi- cados, podem-se ter viveiros de muitos milhares, e fazer as transplantações com boa raiz, dando um resultado infallivel e com pequena despeza, porque um ho- mem em seis dias p()de fazer uma re- producção de mais de cem mil Videiras em poucos metros de terreno, e o pro- prietário tem sempre abundância de no- vas plantas das qualidades que mais lhe convenham, e ao segundo anno já fructi- ficam pelo menos a maior parte. Estes cálculos não devem falhar, porque têem sido feitos por nós e temos tirado o me- lhor resultado possivel. Fazeudo-se a multiplicação por esto ultimo systema, as estacas deverão ser dispostas perpendicularmente. José Marques Loureiro. SOBRE ALGUMAS DAS PLANTAS HERBÁCEAS E gramíneas que podem interessar os sylvicultores Nas mattas encontra-se uma grande quantidade de plantas herbáceas e Gra- míneas, mas entre ellas só uma pequena parte é que tem verdadeira importância florestal; estas podem-se dividir em três classes, a saber: 1.* — Plantas prejudiciaes na econo- mia florestal. 2.* — Plantas que servem para indi- car a natureza geológica dos terrenos e do clima. 3* — Plantas que tGcm uma utilidade especial na economia florestal. 1.* classe Pertencem a esta classe as plantas que se tornam prejudiciaes ;ls plantações novas e ás sementeiras, que muitas vezes as aba- fam de tal maneira que lhes pôde causar a morte, se não se tem o cuidado de as ceifar ou mondar, o que se torna muito dispendioso quando a arca plantada ou semeada é extensa, e a melhor maneira de as extinguir é cortar-lhe amiudadas vezes as flores. Como não ha regra sem excepção, diremos que em casos espe- ciaes podem-se tornar úteis para abrigar as novas plantas. Citaremos aqui algu- mas das mais prejudiciaes, a saber : Ejnloòiwn — E. angiistifolium, latifo- lium, montanum, tetragonum. Senecio — S. nemorensis, saracenicus, jacohaae, crucaefolia. Digitalis — D. imrpurea, ambígua. Sambucus — S. ebidus. Angélica-- A. sylvestris, archange- lica. Atropa — A. belladonna. Verbascum — V. nigrum. ITf/pericwn — //. montanum, perfora- tum, hirsiiium. Ajuga — A. pyramidalis, reptans. Lamium — L. macidatum. títachis — S. sylvatíca, germânica. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 31 Clinopoditim — C. vulgar e. Humulus — H. lupulus. Mercuricdis — M. perennis. Asperula — A. odorata, tinctoris. Agrostis — A. arundinacea^ alba, syl- vatica. Milium — M. effusum. Eh/mus — E. caninus, europaeus. Melica — M. nutans, coerulea. Aira — A. caespitosa, canescen?. Poa — P. nemoralis, hulbosa, trivia- lis, pratensis, decumhens, rígida, verti- cillata. Tríticum — T. repens. Panicum. — P. arenarium. Carex — C. muricata, sylvatica^ digi- tata, leperina, paniculata, virens, dis- tans. 2.* CLASSE Aqui pertencem não só aquellas plan- tas que pela sua propriedade e estabili- dade nos podem indicar a natureza dos differentes terrenos ; assim como aquellas que pela singularidade do sitio onde se encontram, nos indicam se o clima é mais ou meno? húmido, abrigado, etc, etc. Ci- taremos algumas das principaes, a saber : PLANTAS QUE INDICAM A NATUREZA DO TERRENO Terrenos calcareos Aira — A. caespitosa. Elymus — E. europaeus. Terrenos arenosos Arundo — A. arenaria. Elymus — E. arenarius. Carex — C. arenaria, hirta. Aira — A. flexuosa, canescens. Festuca — F. ovina, òromoides, Nardus — N. stricta. Triticum — T. repens. Paneratium — P. maritimum, Saponaria — S. officinalis. Terrenos argilosos DactylUs — D. glomerata. Bromus — B. giganteus, hirsutus, ere- ctus. Terrenos húmidos e molhados Juncus — J. squarrosus, sylvaticus, ne- morosus, alhidus. Scirpus — S. sylvaticus. -^ Carex — C. remota. Terrenos pantanosos Scirpiís — S. palustris, caespitosui. Juncus — J. conglomeratus, effusus. Eriophorum — E. polystachyon. Plantas que indicam o clima e tam- bém os terrenos. Thymus — T. serpillum. Atropa — A. helladonna. Lafhyrus — L. pratensis, sylvestris. Vicia — V. sylvatica, pisi.formis. Lotus — L. capitanus. Serapias — S. rubra. Physalis — P. alkekengi. Oentiane — O. ciliata, lutea. Valleriana — V. officinalis. Anemone — A., sylvestris. Mendicago — M. falcata. Hedysarum — ■ H. onsbrychis. Tussilago — T. farfara. Mercurialis — ■ M. perennis. Oxalis — O. acetosella. Convallaria — C. majalis, bifolia. Epilobium — E. angustifolium, monta- num. Arnica — A. montana. Trifolium — T. montanum, alpestre, Lilium — L. martagon. Arum — A. macxdatum. Parnossia — P. palustris. Drosera — D. rotundifoUa. 3.* CLASSE Uma grande parte das plantas herbá- ceas e das Gramineas dão bom sustento para o gado, e portanto nos massiços on- de as arvores já tenham altura bastante que estas as já não possam prejudicar, podem-se conservar, pois dão ás vezes um bom rendimento florestal, e n'este caso estão também todas as plantas me- dicinaes eindustriaes. Além d'estas todas, ainda ha outras com muita mais utilida- de florestal, que são aquellas que se dão nos terrenos arenosos e que convém pa- ra prender as dunas, as quaes tantos es- tragos causam á agricultura, invadindo d'areia terrenos ás vezes fertilissimos. Adolpho F. Moller. 32 JORXAL DE HORTICULTURA PRATICA UM THERMOMETRO VEGETAL O Rhododendron maximum gosa de uma propriedade notável, corao é a de indicar perfeitamente o estado de tem- peratura da atmosphera. Repetidas ob- servações comparadas com um verdadei- ro thermometro, têem demonstrado o quanto são exactas as suas indicações atmosphericas. Quando o ar está frio o por consequên- cia o thermometro se aproxima de zero, as folhas do vegetal enrolam-sc tão es- treitamente que parece impossivel torna- rem a abrir-se; além d'e3te phenomeno mudam de côr, tornando-se quasi negras. Apenas, porém, principia a aquecer o tempo, tornam as folhas a desenrolar-se e a mudar de côr, mas esta mudança é de tal modo vagarosa e regular, que, ob- servando-a, podemos formar uma perfei- ta ideia do estado do tempo. Quando a atmosphera está completamente serena e quente, as folhas adquirem a sua primi- tiva côr verde brilhante. A. J. DE Oliveira e Silva. ARAUCÁRIA EXCELSA SPECIOSISSIMA A Araucária excelsa speciosissima é talvez uma das mais bonitas que tem produzido a espécie, sendo principalmen- te notável pela sua rusticidadc, assim como pelo aspecto, que se parece alguma cousa com o da Araucária Cunninghamii, mas com proporções maiores. Admiramol-a muitas vezes no jardim de Mr. Rougier-Chauvicre, horticultor, rua de la Roquette, 1Õ2, o qual, á custa de muitos esforços, chegou a reunir uma grande quantidade de variedades da Araucária excelsa, como nunca vimos. O que distingue esta variedade é, além do seu aspecto e da sua robustez, o com- primento das folhas, que são bastante grossas, arqueadas e depois erectas, che- gando a ter 4 centimetros de comprido. São acuminadas em ponta aguda e de- pois erectas, como já dissemos, o que faz que os ramos tenham exactamente o aspecto dos da Araucária Cunning- hamii. D'onde veio esta variedade? Não o sa- bemos, mas o que podemos affirmar é que é uma das mais bonitas e ornamentaes e que a vimos no jardim de Mr. Rougier Chauvière, onde se poderá obter, assim como muitas outras variedades d'e3ta planta. E. A. Carrière. («RcTue Horticolc»). FOGO SAGRADO (CAPITULO DEDICADO AOS DANDIES DA EPOCHA) O «Diccionario de Botânica» de Ger- main de Saint-Pierre, ultimamente publi- cado (1870), é um livro que devia estar na estante de todo o homem que se de- dica ao aprasivel e innocente estudo das flores. Os seus artigos concisos e claros reve- lam 03 profundos conhecimentos do illus- tre presidente da Sociedade Botânica da França, e tem a grande vantagem de ser- vir tanto para o sábio como para o sim- ples amador. Além d'is8o, por uma methodica coor- denação dos artigos, descripta no seu prin- cipio, pôde este precioso livro transfor- mar-se n'um completo compendio de bo- tânica, e as numerosas gravuras de que vem acompanhado, completando as des- cripções, são para o principiante um po- deroso auxiliar nos seus estudos e com- parações. Extractando d'elle o interessante ar- tigo — Fogo Sagrado — levamos em vis- ta ver se pela sua leitura chamamos a at- tenção da mocidade de hoje para o estudo das sciencias naturaes, vastíssimo campo onde encontrariam distracções mais úteis e proveitosas do que as que geralmente adoptam. «Sabe-so vagamente no mundo que a JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 33 Botânica é uma agradável sciencia ; mas ignora-se geralmente que para nos entre- garmos com resultado aos estudos de ob- servação em geral, e á botânica em par- ticular, é preciso, como para os traba- lhos de imaginação, ter recebido do céo pelo menos uma faisca d'aquilIo que se convencionou chamar fogo sagrado. É possivel que esta chamma sagrada só se accenda em contacto com o ardente fogo d'um adepto zeloso ; mas é mais na- tural e mais ordinário que ella se accen- da por si mesmo e cedo, em presença do maravilhoso espectáculo da natureza. Se pois ainda creança, deixastes os bonecos de cartão e os ruidosos brincos das creanças da visinhança para seguir com alegria as sebes floridas e a margem dos regatos, depois entraes em casa com os bolços cheios de pedras, de conchas e fructos de Roseiras, e passaes seguida- mente dias inteiros a admirar as vossas colheitas ; se mais tarde, sem conselho, vós tentastes desenhar ou pintar com cores da vossa composição as flores ou as borbo- letas do jardim : oh ! então, com perseve- rança e ajuda de Deus, sereis naturalista. Mas a vossa perseverança e vocação podem tornar-se em dons fataes, se a vossa situação vos impozer uma profissão que vos afaste dos vossos estudos de pre- dilecção; pôde ser então que, commercian- te ou guarda-livros, invejeis a sorte do simples jardineiro que respira o ar dos campos, e vê todas as manhãs germinar as sementes que confiou á terra ou cres- cer as suas alfaces. Poucas occupações ha, por muito assí- duas que sejam^ que não permittam, que um dia por semana ou algumas ho- ras no dia, vós possaes ir colher plantas e fazer um herbario : mas se vós sois me- dico d'aldeia, e que ao mesmo tempo que caminhaes herborisaeS; chegareis tarde a casa do doente ; e se sois empregado de escriptorio, o vosso chefe vos reprehen- derá e desconfiará da vossa inclinação pelo estudo. Felizes aquelles que pela sua posição e independência, podem dispor do tem- po e meios para satisfazer sem restricção um gosto que fará a sua felicidade ! In- felizmente um pequeno numero de man- cebos, que se acham coUocados n'esta po- sição independente, se entregam ao estu- do e aos trabalhos de observação : correm atraz d'outros prazeres, sem querer sa- ber que no estudo da natureza se encon- tra ao mesmo tempo felicidade e prazer, prazer sempre novo que não cança, felici- dade tão verdadeira que dura toda a vida. Se pois, animado pelo fogo sagrado, podeis dispor de uma fortuna indepen- dente, por muito modesta que seja, e que laços de familia vos não imponham o de- ver de vos consagrardes a augmental-a ; se gosaes d'uma saúde robusta, se tendes boa vista que se não cance muito depres- sa em observar pequenos objectos, batei com coragem á porta do templo. Não esqueça dizer que, animado pelo desejo de saber ao sahir do coUegio, de- veis ter a vossa educação completa aca- bando de vos familiarisar com a lingua latina, e possuireis pelo menos as raizes gregas. Das linguas vivas estrangeiras, a lingua allemã e ingleza devem ser as mais úteis para vós ; principiae a estu- dal-as cedo, diligenciae, senão fallal-as, pelo menos lel-as correctamente. Com effeito, um certo numero dos mais im- portantes livros scientificos estão escri- ptos em latim, a lingua verdadeiramen- te universal, muitos dos melhores estão escriptos em inglez, e não estão tradu- zidos em francez ; alguns, emfim, são es- criptos em italiano ; os hespanhoes escre- vem pouco, os russos escrevem muitas vezes em latim ou mesmo em francez : ora a sciencia é única, em qualquer lin- gua que ella se exprima, e devemos ex- forçar-nos pela seguir ao mesmo tempo em todas as partes do mundo. Dotado d'uma feliz memoria, mas sem aptidão para a botânica, chegar-se-ha a conhecer o estado da sciencia, mas nun- ca conseguir fazel-a dar um único passo. Privado da memoria das palavras, mas largamente provido de aptidão, as im- pressões recebidas serão mais profundas e mais duradouras ; possuir-se-hão a fun- do os conhecimentos adquiridos, e pode- mos mesmo collocar-nos em estado de contribuir para o progresso da sciencia. Dotado de memoria e aptidão, poder-se-ha chegar a hábil professor ao mesmo tem- po que bom observador.» A. J. DE Oliveira e Silva. 34 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA GHROIÍIGA HORTIGOLO-AGRICOLA A nova moléstia das vinhas vae ga- nhando terreno de dia para dia. A prin- cipio era só a França que se queixava, em breve Portugal foi-se associar aos seus prejuizos e hoje a Áustria também já está sentindo os eíFeitos do mal. Um tclegramma inserido no «Jornal Official» de Mcnna é do seguinte theor: «Uma das vinhas do estabelecimento central creado na Áustria inferior pa- ra a cultura das arvores íructiferas e da vinha, foi encontrada atacada pelo Ph^l- loxera. «Este insecto foi evidentemente impor- tado com as cepas que se mandaram vir da America em 1869. As auctoridados tomam as medidas ncce^-sarias para in- terceptar a marcha da moléstia e desde já mandarão arrancar as Videiras em ques- tão.» Na Áustria está agora naturalmente acontecendo o que succedeu comnosco quando primeiro estudamos esta questão, deixando-nos arrastar pela corrente dos factos que haviamos lido nos jornaes fran- cezes e dos que superficialmente colhêra- mos no paiz in continenti ao primeiro gri- to de alarma. N'uma publicação que fizemos recen- temente com o titulo «Algumas conside- rações sobre a nova moléstia das vinhas», apresentamos a opinião que nos foi dado formular depois de um estudo mais de- morado e de algumas observações colhi- das no próprio campo onde a moléstia mais florescia. Não a temos em grande conta, não julgamos as nossas palavras infalliveis, nem tampouco temos a estólida pre- tensão de haver cortado com a espada de Alexandre o nó gordio da questão, mas o que nos parece é que a reunião dos factos apresentados poderá dar al- guma luz o dirigir o espirito do obser- vador para um caminho que se nos afi- gura mais seguro e mais certo para se chegar á verdade. Ha dous ou três dias que recebemos de Mr. L. Laliman, de Bordéus, um opúsculo de mais do 60 paginas, em que tracta largamente da questão que nos pr e • occupa agora e em que faz mui judicio- sas considerações. Esse trabalho tem por titulo «Documents pour servir a TUis- toire de Torigine du Phylloxera» e n'el- le se encontram compendiados os factos que mais eloquentemente provam que o Fhylloxera não é a verdadeira causa da morte das cepas. Adopte-se pois um systema de cultu- ra mais racional e os nossos vinhagos es- tarão a salvo ; as encostas de Gouvinhas, hoje despovoadas, poderão ostentar nova- mente as suas galas e dar colheitas va- liosas. Estamos atravessando uma crise. Os terrenos estão exhaustos e precisam de adubos : equilibrem-se as forças e vere- mos prosperar as Videiras. No século passado já houve uma crise similhante que causou graves prejuizos em Perigord e na Gascogne e principal- mente, segundo Cabieux d'Arcachon, em Saint-Macaire (Gironde). O presidente do comicio de Lunel, na conferencia que fez em 14 de janeiro do 1872, apoiando-se em vários escriptores antigos e sobretudo em Gabriel Verdi, diz que os vinhedos da Áustria, das mar- gens do Danúbio, da Hungria, da AUe- manha, da Alsacia, da França, da Hes- panha e da Itália haviam desapparecido com uma moléstia que se manifestara em 1730 e que durara 46 annos. Como com todas as outras moléstias que em diversas epochas têem atacado vários vegetaes, temos a maior fé que a actual moléstia das vinhas virá a seu ter- mo, principalmente empregando os moios que parecem mais rncionaes e que passa- mos em revista no livro que publicamos recentemente. O tempo nos dirá até que ponto a razão está do nosso lado. A Áustria accusa hoje as cepas ame- ricanas de terem sido as importadoras do Phylloxera. A França fez o mesmo, e nós, devemos confessal-o, também nos deixa- mos ir no Ímpeto das ideias que abun- davam alli entro os homens mais emi- nentes. Hoje reconhecemos que estáva- mos laborando em grave erro e temos as provas mais convincentes de que o pe- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 35 queno aptero não nos veio do Novo Mundo. Entre nós accusaram-se a principio as cepas americanas pelo facto da moléstia se haver manifestado em G ou vinhas, na quinta do snr. Lopo Vaz de Sampaio, onde effectivamente existiam algumas Videiras das espécies indigenas da Ame- rica. A falta d'outro3 promenores e as informações que nos chegavam de Fran- ça levavam a concluir que o insecto não era de modo algum europeu e que só po- deria ter sido introduzido por via das re- feridas cepas. Isto está porém destruído desde que o próprio snr. Vaz Sampaio nos diz: «Em 1862 morreram na minha quinta quaren- ta ou cincoenta cepas das variedades in- digenas. No seu logar foram logo plan- tadas outras que seccaram também e só de 1863 para 1864 é que nas minhas propriedades foram introduzidas as espé- cies americanas.» Nos documentos colhidos pelo nosso prosado amigo, Mr. Laliman, para a his- toria da origem do Phylloxera vemos que MM. Schiebler e Sohn, directores dos vi- veiros de Celle (Hanovre), receberam em 1868 cepas americanas e em fevereiro de 1873, data em que fazem esta commu- nicação, não havia os menores vestígios do insecto. Ora se as cepas americanas fossem as importadoras do insecto, como se explica- ria que o marquez Ridolfi cultiva ha uns poucos d'annos, próximo de Florença, cer- ca de cem hectares de Videiras da Ame- rica, sem que appareç.am os menores ves- tígios da moléstia, apesar d'entre aquel- las cepas haver algumas que foram en- viadas das propriedades de Mr. Lali- man, onde existe a moléstia com todos os seus caracteres mais pronunciados? Ao que referimos relativamente a Gou- vinhas ainda temos a adduzir um facto que per si demonstraria que o insecto não foi transportado para alli em plan- tas, porque o que oífereceram ao snr. Vaz Sampaio foi simplesmente bacellos ou por outra ramos de Videiras desprovidos de folhas. Ora. o Phylloxera, habitando as fo- lhas e particularmente as raizes, não era decerto n'este3 bacellos que se lhe offere- cia meio conveniente de transporte. Sahiram elles d'um jardim d'esta cida- de pertencente a um antigo negociante britannico (Mr. Harris). Como se pôde pois explicar que os vinhedos do Porto e seus subúrbios nada tenham soíFrido, ao passo que com os do Douro não suc- cede outro tanto? Como se explicaria ainda a não existência do Phylloxera na Régua, onde ha vinhagos, em que verde- jam luxuriantemente as cepas america- nas? O corollario que hoje podemos, pois, formular é que o Phylloxera não foi im- portado da America para Portugal. Nas nossas «Considerações sobre a no- va moléstia das vinhas» já o dissemos e novas observações vêem fortalecer o que alli expendêramos. Temos portanto fé que a Áustria virá a modificar a opinião que decerto formulara baseada nas primei- ras imprecisões. Do dr. L. Roesler, de Klosterneuburg, cidade que fica cerca de duas léguas de Vienna d 'Áustria, recebemos ha dias uma carta em que nos diz que se vae occupar d'este importante assumpto. O dr. Roesler é um chimico muito dis- tincto da Áustria e justamente conside- rado em toda a parte pelos seus valiosos trabalhos especiaes. — Esta redacção acaba de receber a visita d'um seu correligionário : é, po- rém, inútil dizer-se o jubilo com que mandamos correr o reposteiro para lhe apertarmos a mão e manifestar-lhe o pra- zer que sentíamos por ter ao nosso lado tão digno hospede, tão corajoso gladia- dor. Se as luctas sanguinolentas dos últi- mos annos têem travado as rodas do pro- gresso na visinha nação, que tão poderosa e rica poderia ser se não fossem as am- bições nefandas de filhos desnaturados, ainda assim ha um certo numero d'ho- mens que têem conseguido salvar-se das suas garras devastadoras e que continuam trabalhando tant hien que mal, consoan- te os recursos de que podem dispor. Es- ses homens merecem o elogio e a protec- ção dos paizes extranhos, já que as con- dições excepcionaes em que estão não lhes permittem realisar cabalmente os seus so- nhos. Em Barcelona existia uma Sociedade 36 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Florestal, cuja índole a sua denominação noâ deixa perfeitamente ver. Os seus fundadores entenderam comtudo, e en- tenderam muito bem, que para dar um verdadeiro impulso a este ramo era pre- ciso que a associação dispozesse de um periódico que fosse órgão da Sociedade e que amiudadas vezes pozésse sob os olhos dos seus associados os progressos que esta sciencia fazia nas terras extra- nhas. Em conformidade com estas con- siderações resolveu crear um jornal que abrangesse todos os ramos de cultura, jornal que recebemos com o titulo de «Revista Hortícola». E esta a única publicação especial que existe actualmente em Hespanha. Ha annos, porém, publícava-se n'aquella na- ção, em idioma hespanhol, a «Belgíque Horticole» (*), de que então era redactor na Bélgica Mr. Charles Morren. Se es- tamos bem certos, a traducção era feita pelo snr. Colmero, professor de Botâni- ca em Madrid. A «Revista Hortícola», segundo a nos- sa opinião, tem um grande futuro, mas é preciso que os seus fundadores não des- alentem no meio das contrariedades que devem soffrer, como todos soíFrem quan- do encetam uma obra útil. Os dous primeiros números que temos presentes são de bastante interesse e es- tamos certos de que os seguintes não des- mentirão a ideia que agora formamos d'este jornal. Desejamos-lhe longa e prospera vida e enviamos um abraço fraternal aos nos- sos illustrados collcgas. — Temos sobre a nossa banca o pro- gramma para a próxima Exposição Hor- tícola que se deve realisar em Gand, do dia 14 ao dia 17 do próximo mez de março. Esta exposição é promovida pela Real Associação de Agricultura e de Botâni- ca de Gand e com esta faz 138 que a sociedade promove. — E-nos extremamente grato annun- ciar nas nossas columnas a próxima pu- blicação de um livro que tractará da cul- tura das arvores fructiferas, devido á há- bil pcnna do nosso collaborador, o snr. (1) Não no3 podemos recordar sob que titu- lo se publicava em Hespauha. conselheiro Camíllo Aureliano, cujos es- criptos 03 leitores têem tido occasíão de apreciar. Esta obra será illustrada com nume- rosas gravuras, que auxiliarão a compre- hensão do texto nos diversos processos da poda, formação das arvores e tudo o mais que diz respeito a este ramo de cul- tura de que lá fora se faz uma especia- lidade em que ha homens de reputação europeia. Com a publicação do snr. Camíllo Au- reliano, em que tenciona seguir os syste- mas de tractamento não só mais em voga na França e na Bélgica mas também os mais racionaes para a producçãO; prestar- se-ha um valioso serviço aos nossos pomi- cultores que até aqui sentiam esse deside- ratum. Aguardamos pois com o máximo interesse o livro do meritissimo juriscon- sulto, que tão utilmente aproveita as pou- cas horas feriadas do seu espinhoso mis- ter de juiz. — A «Revue Horticole» descreve n'um dos seus últimos números uma recentís- sima obtenção hortícola — a Tydaea (hy- hrida) Madame Heine. Esta nova Tydaea faz parte d'uma se- rie de bellissimas hybridas obtidas pelo cruzamento do Sciadocalix digitalijiora com differentes Tydaeas. Com a vigoro- sa vegetação do Sciadocalix, estas novas plantas conservaram a florescência fácil e abundante das Tydaeas e perderam um certo aspecto desagradável que costumam tomar quando desabrocham as flores. E uma boa acquísição que a horticul- tura franceza acaba de fazer. — Os leitores devem estar recordados de havermos dito ha cerca de um anno que o nosso collaborador Mr. Jules Meil, director dos Passeios Públicos de Sevi- lha, tinha deixado aquella cidade em consequência do estado dos negócios de Hespanha não lhe offerecer allí mui- ta garantia. Retirou-se portanto para França e fixou a sua residência em Mar- selha, e apesar de se ter entregado á vi- da commercial, contínua aproveitando as horas que lhe sobejam dos seus negócios, na cultura das plantas, que tracta como se fossem suas próprias filhas, a imaginar pelo amor que lhes tributa. D 'este cavalheiro acabamos de rece- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 37 ber uma carta particular, da qual vamos extrahir algumas passagens que serão lidas com interesse. Caro CoUega, snr. J. Duarte de Oliveira Júnior. . . .Apesar das minhas presentes occupações, api'oveito todos os ensejos que se me ofierecem para me occupar também de assumptos borti- colas e as circumstancias especiaes da casa com- mercial onde estou permittem que pense em aclimar alguns vegetaes nas costas orientaes e occidentaes da Africa, por intermédio dos nu- merosos empregados da casa. N'aquellas paragens insalubres, n'aquelles paizes em que as febres dominam sempre e on- de os europeus têem tanta difficuldade em lia- bituar-se ao clima, lembrei-me de que ninguém melhor do que os empregados da casa poderiam cuidar em tornar sadias aquellas regiões como os mais directamente interessados, porque não raras vezes alli encontram uma morte prematu- ra. Resolvi-me, pois, a mandar-lhes sementes do Eucalyptus glohulus assim como as necessárias instrucções sobre este precioso vegetal e entre outras enviei-lhes o opúsculo de Mr. Ernest Lambert, inspector em chefe do serviço das flo- restas na Argélia. Os resultados d'estes ensaios ser-me-hào communicados e transmittir-lh'os- hei opportunamente. Este projecto suggeriu-me algumas refle- xões que peço licença para lhe submetter. A costa oriental d'Africa, sendo uma colónia portugueza muito insalubre, como é que o go- verno do seu paiz não tracta de lá introduzir a cultura do Eucalyptus globuhis, cujas qualida- des febrífugas são hoje bem conhecidas e apre- ciadas por todos? Além d'isso o producto em madeira seria um grande recurso para as edifi- cações. Como é que entre os governadores d'a- quellas províncias ainda não appareceu um ho- mem que tomasse a peito a introducção d'este precioso vegetal, distribuindo semente pelas pes- soas que estivessem mais no caso de auxiliar as experiências da introducção d'uma arvore que não só melhoraria o clima mortífero, mas que também daria madeira preciosa, que alli mais preciosa se tornava, visto que a não ha ? Como é que a imprensa não tem chamado a attenção do governo, dos governadores d'esta colónia, das sociedades d'agricultura,d'horticulturae de aclimação ? Tem-se escripto porém bastante so- bre este assumpto, e graças ás publicações de V., que são sobre modo interessantes e d'uma utilidade incontestável, ninguém do seu paiz, na classe instruída sobretudo, deve desconhe- cer os benefícios que ha a esperar d'esta cul- tura,. E portanto claro que, se nas suas colónias não se occupam d'este objecto, é isso devido ao pouco interesse que ligamos, nos paizes meri- dionaes, ás questões coloniaes e ao pouco par- tido que sabemos tirar d'esses paizes d'um fu- turo tão brilhante. Era porém preciso e muito preciso que se empregasse mais zelo na salubridade d'aquella3 regiões. Não ha n'isto uma grande questão humani- tária? Ha sim ! E o tornar estes logares salu- bres não é o primeiro passo que se deve dar ? E as nossas missões catholicas têem-n'o com- prehendido melhor do que os nossos governos e os nossos representantes? Não! Tanto alli, como em outras partes, por exem- plo nas Guinés, nunca se cuidou de empregar os meios precisos de persuadir a utilidade que ha- veria em se curar da salubridade do paiz, ape- sar d'isso ser em proveito da missão difficil que lhes foi confiada. O Eucalyptus expulsa a febre : temos pro- vas por toda a parte. Que as missões catho- licas formem portanto plantações próximo das suas egrejas e verão como a febre se distaneeia com rapidez, resultado que deve causar espan- to á raça negra. Que o governo, os seus empre- gados e todos os europeus circuitem as suas ha- bitações com estas arvores e o negro, acos- tumando-se a ver desajaparecer a febre de todos os sitios plantados de Eucalyptus, quererá tam- bém rodear a sua cabana e assim pouco e pou- co esta cultura ganhará terreno e todo o paiz será salubre n'uma dada epocha. Que o seu governo mande sementes de Eucalypius a to- das as suas colónias e instrucções aos seus go- vernadores. Não temos nós provas manifestas mesmo na Africa, na Argélia, no Egypto sobretudo? No Cabo não ha magnificas plantações que têem dado os mais notáveis resultados? O resultado obtido pelos inglezes na coló- nia do Cabo, pelo Khédiva no Egypto, por al- guns particulares e pela Société Algérienne, na Argélia, é um facto que faz com que lastime- mos que este exemplo não tenha sido seguido em todos os pontos da costa onde ha alguns euro- peus. Que a imprensa illustrada empregue toda a sua força na obra de regenerar os climas pela influencia salutar da arvore australiense ! Acceite, caro collega, as expressões da mi- nha verdadeira estima. JuLES Meil. Marselha, 12 de janeiro de 1875. Foi-nos em extremo grato ver um ex- trangeiro, como Mr. Jules Meil, in- teressar-se tanto pelo bem estar dos nos- sos compatriotas, e para uma causa tão humanitária, como é a de tornar salubres as regiões das nossas possessões africa- nas, chamamos mui particularmente a attenção do governo. No paiz temos feito o que em nossas forças tem cabido para a propaganda do Eucalyptus glohulus e rejubilam -nos os resultados que temos colhido, mas á Afri- ca decerto que não chega a nossa débil voz e portanto ao governo incumbe to- mar sobre si essa útil e proveitosa missão. Assim o desejamos. 38 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA — O artigo que hoje publicamos subor- dinado ao titulo «O.- gados de engorda» é trauscripto do nosso excellente coliega, o «Cultivador», de que ó redactor prin- cipal o sur. George Read Cabral. — Temos a accusar a recepção d'um livro que o seu auctor teve a delicadesa de nos oíibrecer. É o segundo volume do «Manual Pratico do Agricultor Indiano», devido á penna do snr. Bernardo Fran- cisco da Costa, natural da índia. O snr. Bernardo Francisco da Costa, como bom tilho que presa o torrão que o viu nascer o que poderia dizer sem mentir Esta é a ditosa pátria minha amada, quer ser-lhe prestavel e repartir os vas- tos conliccimentos de que dispõe pelos seus concidadãos. Cavalheiros que assim procedem capti- vam a sympathia de todos e tornam-se dignos de elogio. N'cste segundo volume, o snr. Fran- cisco da Costa tracta, alóm da parte bo- tânica puramente scientilica, da cultura de varias plantas, que são alli usuaes e indica o partido que a mão intelligente p(ide tirar d'ellas. N'esta obra acham-se compendiados muitos conselhos úteis e dignos de ler- se. Accresce ainda que a obra é nitida- mente impressa e o texto é acompanha- do por numerosas gravuras que auxiliam a comprehensão da parte scientilica. Muitas das gravuras representam fru- ctos da índia. Ao snr. Bernardo Francisco da Costa enviamos os nossos sinceros agradecimen- tos pela distincção que se dignou dispen- sar-nos e por fim damos-lhe os parabéns, porque pôde ter a satisfação de que pres- tou um valioso serviço á agricultura da sua pátria, que tão atrazada ainda está, conforme affirma o auctor. — Em resposta a uma pergunta que fizemos cm dezembro passado aos nossos leitores sobre a maneira de pôr o trigo a coberto d'um pequeno insecto que o perfura e assim o dostroe, dirigiu o snr. Joaquim Augusto Mano, de Porto de Moz, uma carta ao proprietário d'este jornal, cm que diz que o sou trigo tem ^jstado até hoje ao abrigo do flagello. No entretanto o snr. Augusto Mano propõe a camphora como verdadeiro an- tídoto para os tae.j bichinhos, porque o cheiro activo d'esta substancia costuma afugentar toda a espécie d'esses peque- nos insectos que alguns annos mais do que outros costumam prejudicar as co- lheitas. A camphora é essencialmente volátil e de um cheiro penetrantíssimo e não duvidamos que dê o resultado para que é agora proposta pelo snr. Augusto Ma- no, a quem agradecemos esta sua com- municação. — No «Journal desCampagnes» encon- tramos o seguinte, que encerra uma ver- dadeira lição para os nossos agriculto- res : Qual é o fim do agricultor? Ganhar dinheiro. Para ganhar dinheiro é necessário vender numerosos productos, Ter boas colheitas. Obteem-sc boas colheitas a troco de abu- bos. Para ter adubos em abundância é mister crear muito gado. Para crear muito gado é necessário ter for- ragens. Tudo se encadeia. Os prados alimentam o gado; O gado dá o adubo; O adubo dá o gnio. Para se obter Ijom resultado eis a regra que se deve seguir: Cultivar em metade da propriedade raizes e fazer d'ella prados. Nào ha bocado de terra de que se nào possa fazer um prado com uma espécie ou com outra. Eis ainda uma i-egra: Lavrar-se só o que se poder adubar. Um hectare bem estrumado produz mais do que três hectares mal estrumados. Em agricultura, o dinheiro é o ponto de apoio . O estrume é a alavanca. Sem dinheiro e sem adubo, Nada! Com dinheiro e com adubo, Deixa de haver más terras. — Segundo o nosso coliega, a «Cor- respondência de Coimbi'a», a Inglaterra em 1871 importou 7:256 toneladas de cortiça no valor de 763:388?>000 reis: procedente de vários paizes 26 tonela- das; de França 115; de Hespanha 548 e de Portugal 6:567 ! — A inclemente podôa municipal tem andado a fazer as suas façanhas annuaes. Este anno foram victimas as arvores do JOENAL DE HORTICULTURA PRATICA 39 Jardim dos Martyres da Pátria que es- tavam em frente do sumptuoso mercado das peixeiras e foi justo para que osjia- iieurs do domingo não se queixem de fal- ta de zelo municipal e possam dizer com o grande pensador Voltaire: Jamais rien de si beau ne frappa notre vue ! São cousas nossas que por vergonha própria devemos deixar passar em silen- cio.. . — Uma das preoccupações do cultiva- dor é, como se sabe, o livrar-se de um inimigo terrível, a lagarta. Muitos meios se tem empregado para obter este resul- tado, mas até hoje quasi todos elles são difficeis na applicação e sahem caros. Mr. Husson, proprietário em Pariz, tem- se dedicado ao estudo d' esta importante questão, e foi levado ao descobrimento de um processo pouco dispendioso, de fá- cil emprego e de uma efficacia reconhe- cida. Consiste elle em misturar o melhor possível petróleo com terra e esti-ume por forma que se obtenha uma matéria extremamente dividida e que se espalha sobre o solo infestado pelo bicho damni- nho. Reconheceu elle que as melhores proporções para fazer a mistura são: meio litro de petróleo para vinte litros de uma mistura de terra e estrume, mis- turando-a com o esterco de animaes ou com um guano qualquer. As proporções da terra e do estrume dependem da na- tureza da terra sobre que se opera, e só a experiência do agricultor pode indi- cal-as. Um outro meio egualmente bara- to consiste em fazer uma mistura intima de agua com petróleo, por forma que a agua se impregne quanto possível do óleo, e depois regar com ella as terras. O petróleo, depois de empregado em sa- turar a agua mais ou menos vezes, ain- da pôde ser utilisado na illuminação. — Ch. Darwin, que a «Revue Hortico- le » classifica um dos grandes vultos do sé- culo XIX e como caracterisando uma epocha do progresso das mais notáveis nos annaes das sciencias naturaes, tem de- monstrado as vantagens dos cruzamen- tos nas plantas por meio da fecundação d'um individuo com o pollen d'outro, ou entre flores da mesma planta. O augmen- to de vigor que resulta d'este simples acto é geral e infallivel ; nota-se a mes- ma robustez e persistência em todas as plantas d'uma mesma espécie, mas, sem excepção, as plantas provenientes das flores fecundadas com o pollen d'outro individuo são mais vigorosas. Já a canção franceza dizia em velhos tempos : II faut des époux assortis Daus les lieus du mariage. Um infatigável amador de plantas, Mr. Jean Sisley, de Lyon, resume nas seguintes palavras a sua opinião sobre a vantagem da fecundação artificial : «A fecundação artificial é o futuro hortíco- la; é, porém, pouco conhecida e pouco praticada.» Quem divergirá d'esta opinião?! — Segundo lemos n'um jornal estran- geiro descobriram-se n'uma planta indíge- na do Brazil propriedades que a tornam tão apreciável como a Quina. A desco- berta deve-se ao dr. CoutinhO; medico portuguez. Esta planta, que ainda não se acha classificada, serve para provocar violen- tas transpirações e tem sido applicada em casos de febre com o melhor êxito, e o dr. Coutinho mandou alguns espécimens a Mr. Rabuteau, pharmaceutico de Pa- riz, para os analysar. Este vegetal, que parece virá prestar valiosos serviços á humanidade enferma, é conhecido no seu paiz pelo nome de Jabo7'andi. — Falleceu recentemente em Londres o talentoso architecto de jardins Mar- kam Nesfield. De um couce que recebera de um ca- vallo que montava em Regent's Park resultou a perda da sua vida. O cavallo tomara o freio nos dentes e o cavalleiro, perdendo o equilibrio, cahiu e recebeu o couce na cabeça, moi-rendo quasi instan- taneamente. Contava apenas 33 annos. — Os árabes empregam para escrever, em logar de pennas d'aço" ou de pato, a Bambusa scrijptoria e os musulmanos da Africa o Arundo donax (Canna com- mum). — N'uma das interessantes revistas agrícolas do snr. Ferreira Laj)a encou- 40 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA tramos os seguintes períodos sobre os Cogumelos, que, com a devida vénia, pas- samos a transcrever: É quasi desconliecido entre nós o uso culi- nário dos Tortulhos ou Cogumelos comestíveis. Mas em França, em Pariz sobretudo, coiistitue um manjar obrigado ainda ás mesas mais mo- destas, como é o puchero nas mesas dos nossos visinhos liespanhoes. Cultivam-se os Cogumelos, porque o seu con- sumo é enorme em França, começando também já a generalisar-se em algumas cidades de In- glaterra, Rússia e de outros paizes. Faz-se a cultura ao ar livre, ou dentro de subterrâneos. O primeiro processo fornece productos mais sa- borosos, mas menos volumosos e abundantes que os do segundo methodo. O preparo do terreno em que se quer fazer nascer uma ceara de Cogumelos tem bastante de curioso. Arranja-se estrume de eavallo bem curtido e amanteigado. Sobre um terreno bati- do e revestido com uma camada de gesso ou de caliça se armara cômoros ou medas oblongas d'este estrume bem calcado. Procede-se, logo que a meda aqueceu a 30", á sementeira dos Cogumelos, enterrando em bu- racos de 6 centímetros de fundo, praticados na superfície da meda e á distancia de 30 centíme- tros, bocadinhos de mycellio, ou d'aquelle bran- co que o estrume cria na montureira. No fim de uma semana as raízes brancas do mycellio alastram, o que é signal de baver pegado. Co- bre-se então a meda com terra fina e peneira- da, ou com pó de carvão. Os Cogumelos rom- pem, e se vão colhendo á medida que chegam ao volume desejado, mas emquanto tem o clia- peu fechado em esphera. Cada meda pôde pro- duzir durante 4 a 5 mezes. Ha em Pariz culti- vadores que fornecem por dia 1:000 kilos de Cogumelos ; de um d'elles se refere que as me- das da sua exploração, se fossem postas em li- nha, formariam um comprimento de 5 kilome- tros. Em Mery-sur-Oíse a producção diária dos Cogumelos chega a 2:000 kilos, e a extensão li- near da meda faria um todo de 45 kilometros. O preço da venda dos Cogumelos em Pariz é de 1,25 francos a 1,50 francos o kilogramma (200 a 240 reis). Convém saber distinguir o Cogumelo comes- tivel do Cogumelo venenoso. Este, além do mau cheiro e mau sabor que tem, oôerece as folhas do chapéu sempre brancas, não despega facil- mente a pelle, e tem o pé entumecido na base, formando ahí uma espécie de bolsa. O Cogumelo comestível tem o pé branco, li- so, cylindrico, um pouco adelgaçado na base, chapéu espherico e depois boleado, ordinaria- mente branco ou cor de palha. As folhas do chapéu não pegam com o pé, e são deseguaes, brancas primeiramente, depois rosadas e es- curas. — Mr. Balansa descobriu no Para- guay uma Ni/mphea que, segundo se af- firma, faz com que se perca de vista to- das 03 espécies do género. Mr. Balansa, mandando algumas se- mentes a Mr. Duricu de Maisonneuve, director do jardim Botânico de Bordéus, dizia-lhe assim : «Envio-lbe pelo correio um pacote contendo semente da Nt/m- pheacea mais esplendida que talvez exista no mundo ! A própria Victoria regia em- pallidece deante d'ella ! É a planta que mais me impressionou durante todas as viagens que tenho feito.» Em vista d'isto a Victoria regia, essa Rainha das aguas, vae ser supplantada por uma Ni/mpheacea mais bella. São as leis do mundo ! E diga-se que Victor Hugo não tem razão de dizer que ceei tuera cela. . . — Mr. E. A. Carrière fez a seguinte es- colha entre as Begónias bulbosas, que diz serem as mais bellas : Alata coccinea, Bo- liviensis superha, Charles Raes, Docteur Master's, Emeraude, Intermédia, Lévia- tan, Mastodonte, Onix, Professeur Thys- selton, Corrége, Léger^ Rubra superba, Sedeni perfecta, Stella, Vesuvius. — Dizia o outro dia um abastado pro- prietário, ao entrar n'um estabelecimen- to de horticultura e ao olhar para uma bella Araiícai'ia : — «Oh ! que bonita planta ! O snr. quer vendel-a? — Pois não ; replicou o horticultor. — E quanto custa? — Cedo-lh'a por 30;$000 reis; já está muito desenvolvida e precisa de ser plan- tada no chão quanto antes. — Ora o snr. está a caçoar. Diga-me uma cousa : então isto dá algum fructo tão exquisito que a planta possa valer tal preço? — Não, senhor. Custa esse dinheiro porque é ainda rara na Europa, mas o fructo não é comestível. — Então, se não dá fructo, perdeu pa- ra mim todo o merecimento. — Outros lh'o darão. . . Quer o senhor comprar alguma semente de Nabos, Al- face ou Ervilhaíí) A bon chat, bon rat ! Aqui tendes, leitores, um homem que decerto não se apaixonará por Flora o que de boamente trocaria os encantos da deusa por um prato de lentilhas, á simi • Ihança de Esau. J. D. DE Oliveira Júnior. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 41 PECEGO REIIÍE DES VERGERS O3 pecegos de Amíirante go^am de grande reputação no paiz, e é realmen- te á terra do santo casamenteiro das ve- lhas que devemos um certo numero de variedades puramente nacionaes e que em nada são inferiores a muitas que nos vêem lá de fora com uma reputação for- mada. Aquella região tem o quer que seja que agrada ao Pecegueiro e que o deixa prosperar como em poucas localidades, e é Amarante que em grande parte abas- tece o mercado do Porto com os seus de- liciosos fructos, que nós saboreamos a sós ou acompanhados com vinho velho e as- sucar. O preço porém que attingem é a pro- va mais evidente que se pôde dar para demonstrar que esta cultura occupa uma parte insignificante na nossa pomicul- tura. Na America não acontece outro tanto. Os pecegos vendem-se tão baratos, que chegam ás mezas dos mais pobres. Fiír. 11 — PeceffO Eeine des Ver pelo trasfògo, e principalmente pelo frio, se deposita com as fezes. As reacções não serão tão manifestas, se se tracta da mistura de vinho verme- lho e vinho naturalmente branco, mas tinto artificialmente; o problema porém será conduzido ao primeiro caso pelo se- guinte artificio : misture n'um copo 100 grammas pouco mais ou menos de vi- nho com metade da clara d'um ovo, pre- viamente diluída com volume d'agua egual ao seu. Depois de bem misturada, lance o liquido sobre um filtro ou deixe assentar. Pela filtração, o liquido tornar- se-ha immediatamente limpido e poderá ser logo utilisado. Pelo repouso, este re- sultado só será obtido no fim de meia a uma hora. Com este vinho alburainado, repetir- se-ha a primeira experiência, duplicando ou triplicando a quantidade do vinho, tendo era vista que convém communicar á agua cor bem sensível. Se a cor do vi- nho a^sim tractado passar a verde ou vio- leta poder-se-ha attribuir com certeza esta mudança a matéria c<')rante artifi- cial. Mas, ainda que elle conserve a cor vermelha, não pi'»de afiirmar-so que ella seja natural, já porque os vinhos acidi- ficados não produzem a mesma reacção com a agua potável, já porque os vinhos tintos com as bagas de 1 hjtolacca de- candra ou com a rosanilina conservam a apparencia do vinho puro, depois do seu tractamento pela agua. K comtudo fácil conhecer estas duas matérias ci^rantes, porque, emquanto o vinho puro, depois de tractado pela albumina, se torna fi'an- camente verde pelo ammoniaco, pela so- da e pela pota'^sa, aquelle que contém phvtolacca, ao contrário, adquire côr araarella franca, e o C(irado com a ro- JOUNAL DE HORTICULTURA PRATICA 51 egual tracta- sanilina descóra-se, por mento. Se, nos ensaios com agua potável, o vinho puro ou o trasfegado se tornar de cor verde ou violeta, póde-se conhecer a que substancias (baga de sabugueiro, de arando, alcea rósea ou cochonilha), se deve attribuir a mesma cor. O ammoniaco, o acetato d'alumina, e o sub-acetato de chumbo esclarecerão a duvida. Com o ammoniaco, o vinho, tractado pela albumina e depois filtrado, torna-se cor de violeta, se a cor é devida á co- chonilha; verde, se é devida á baga de sabugueiro, e amarella esverdiada, se é devida ás bagas de arando. O acetato d'alumina fará passar á cor verde só o vinho que tiver sido tinto com bagas de arando. O sub-acetato de chumbo dará pre- cipitado cor de rosa com o vinho tin- to pelas bagas de sabugueiro^ e ver- de azulado com o tinto com a alcea ró- sea. Em alguns casos raros, não tendo o auctor podido obter resultados bem ma- nifestos pelos meios indicados, e sobre o vinho clarificado com a albumina, tractou pelo álcool forte as fezes que ficaram so- bre o filtro. Como as matérias corantes, addicionadas ao vinho, são mais solúveis no álcool forte do que a sua matéria co- rante natural, obteve por este meio, al- gumas vezes, solutos tão carregados na cor, que esta era suffi ciente para denun- ciar a natureza da matéria corante ad- dicionada ao vinho. Submettendo o so- luto alcoólico ao methodo de tractamento geral, diz ter obtido egualmente indica- ções preciosas. Finalmente, no quadro synoptico se- guinte, reuniu o auctor as indicações do seu methodo geral d'analyse. Quadro indicando a natureza das matarias corantes addicionadas ao vinho VINHO SUSPEITO 2 a 5 grammas em 250 grammas de agua potável Conserva a sua cor ou passa a violeta E', em grande par- te, descorado pela albumina. Toima-se I de côr verde franca l ! pelo ammoniaco. * I Pela albuminação, a côr vinosa torna-se mais clara e passa a violeta amethysta. ' Passa a verde antes e, ainda melhor, depois de albuminado Pelo acetato d'alu- mina, torna-se vio- leta Pelo acetato d'alu- mina, torna-se ver- de Pelo ammoniaco: torna-se amarello. . . . torna-se azul descóra-se, e pelos áci- dos recolora-se. . . . Pelo acetato de chum- bo : I precipitado vermelho . ' precipitado verde azu- lado Puro. Phytolacca (bagas). Cochonilha. Eosanilina. Sabugueiro (bagas). Alcea rósea. Arando. Oliveira Júnior. ARAUCÁRIA GOOKII Araucária Coohii R. Br. — Syn. — Cu- jpressus columnaris Forst. ; Araucária co- lumnaris Hort. aliq. — Arvore de cincoen- ta a sessenta metros ; tronco coberto de uma casca fina, quasi brilhante e muito similhante nos novos individues á da Araucária excelsa ; ramos patentes regu- larmente verticillados ; verticillos distan- tes, finos, inclinados para fora e grossos na base; folhas alternas; as do caule grossas, comprimidas, patentes ou incli- nadas para fura, de quinze a vinte mil- liraetros ; as dos ramos muito mais finas, mais numerosas, mais curtas, inflexas, subtetragonas, acuminadas no vértice; amentilhos masculinos terminaes, ovoi- daes de quatro centímetros de comprido ; cones lateraesj muitas vezes geminados, 52 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA de dez a quinze centímetros de comprido e de seiaa oito de largura, ovoidaes obtu- sos, arredondados no vértice ; escamas lar- gas, coriaceas, mais finas nos bordos, for- temente imbricadas, terminadas no vér- tice por um appendice em forma de bra- ctea. O seu diâmetro é tão pouco pro- porcionado com a altura, que quan- do a equipagem do capitão Cook as des- cobriu, em 1774, tomou-as por columnas de basalto ou de qualquer outro produ- cto vulcânico. Nada mais se soube com relação a estas arvores, até que Mr. Moore, jardineiro em [chefe do Jardim Botânico de Sydney, n'uma exploração á Nova Caledónia, em 1850, as encon- trou cheias de vigor, e dirigiu as seguin- tes linhas ao dr. Lindlev : «A arvore tem as proporções de uma d'essa3 cha- minés das nossas manufacturas.» O maior exemplar que conhecemos d'csta e.specie, existe na Foz (Porto), na quinta do snr. barão da Roeda, e tem approximadamente sete metros. No Bus- saco e no Passeio Publico da Estrella, em Lisboa, existem dous bellos exem- plares. Foi introduzida em Portugal em 1864. Oliveira Júnior. ALGUMAS palavras ACERCA DOS CACTOS D'entre as plantas exóticas poucas ha que tenham encontrado na Europa tan- tos collectores e amadores como os Cactos. N'e3te particular, como em outros pon- tos de horticultura, constituia Portugal, não ha ainda muitos annos, inexplicável excepção. Sobrevieram porém melhores tendências em relação ás plantas ; come- çou a desenvolver-se o gosto pelos jar- dins, e actualmente já os Cactos téem entre nós os seus apaixonados ; e d'al- guns nos consta tão exclusivistas, que não dedicam os seus cuidados a outras plantas. Similhante exclusivismo não é decerto infundado. Com eífeito se bem considerarmos a fácil e pouco trabalhosa cultura dos Cactos, a variedade de f(')r- mas que apresentam as lindas flores que muitos de si desabrocham, como por exemplo o Cereiís grandijlorus Willd., indígena das Antilhas e das ilhas de Ca- raiba ; concluiremos que téem justifi- cada preferencia sobre as outras espé- cies aliás apreciadas. Além d'Í3to ac- cresce a vantagem de se poderem tractar dentro das habitações onde servem de ornato. Os Cactos constituem por si uma úni- ca familia denominada Cacteae D. C, hoje uma das mais numerosas em espé- cies. Segundo o methodo natural do gran- de botânico allemão vStcphano Endli- cher, a familia Cacteae é dividida nos Boguintcs géneros : Mdocactus Tourf., Anhalonium Lem., Mamillaria Haw., Discocactus Pfeiíf., Echinocactus Link e Otto, Astrophytum Lem., Echinopsis Zucc, Pilocereus Lem., Cereus Haw., Phyllocactus Link., Epiphyllum Pfeiíf., Rhipsalis Gaertn.,Zep ií?»míu Pfeiíf., íZa- riota D. C, Ojnmtia Turf., Pertskia Plum. Os distinctos botânicos inglezes Bentham e Hooker, no seu «Generum Plantarum» citam mais os géneros : Pele- cyj)hora Ehrenb., Leuchtenbergia Hook., e Nopalea Salm.-Dyck. As espécies de Cactos hoje conhecidas são approximadamente 943, segundo Ben- tham e Hooker, divididas da seguinte maneira : Melocactus 30, Mamillaria 300, Ptàlecyphnra 1, Echinocactus 200, Diosca- ctus 3, Cereus 200, Phyllocactus 13, Epi- jjhyllum 3, Rhipsalis 30, Napalea 3, Opuntia 150 e Pereskia 13. (*) Todos os Cactos são oriundos da Ame- rica e a maior parte d'elle3 habitam a zona tórrida. Alguns ha, porém, e não poucos, mas em numero comparativa- mente menor, que vivem nas zonas tem- peradas d'aquelle continente, tanto do norte como do sul. Muitas espécies acham- sc hoje naturalisadas nos outros continen- tes, onde crescem espontaneamente, co- mo por exemplo a Opuntia vulgar is Mill., e Opuntia jicus indica Mill., na re- gião mediterrânea, e a Opuntia coccinel- (i) Soprundo o motliodo adoptado poios snrs. Bontham e Hookor no seu «Gonorum Planta- rum'), o prcnoro Anhalonium faz parte do frcne- ro Mamillaria. O fjenero Astrophytum do EcJd- nocactus e os géneros Echinopsis e Pilocerus do de Ctreus. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 53 lifera MilL, oriunda do México, nas Ca- nárias. (}) O nosso Brotero na sua «Flora Luzi- tana» não teve duvida em descrever a O^untia vulgaris como planta do nosso paiz ; pois diz que habita espontaneamen- te em toda a parte meridional de Portu- gal. Grande numero d'estas plantas resis- tem entre nós, ao ar livre, ás asperesas do inverno, e as mais melindrosas apenas ca- recem, durante aquella estação, da tem- peratura de -|- 6° a 10' cent. Diremos agora algumas palavras acer- ca da sua cultura : Os Cactos reproduzem-se por semen- tes, estacas e rebentos. A sementei- ra deve ser feita na primavera, e im- porta que as sementes sejam lançadas em pequenos vasos ou terrinas, e que não se cubram de terra, mas que unicamente a comprimam na superfície da terra. Em seguida convém regal-as com crivo ; os vasos ou terrinas deverão ser cobertos com um pedaço de vidro, collocados n'um chassis ou estufa, cuja temperatura não seja inferior a -|- 20°. Fazendo-se a se- menteira doesta maneira, se as sementes forem novas, devem germinar passados 8 a 16 dias. Seguindo-se outro processo, a germina- ção será mais tardia. O tempo adequado para a reproduc- ção dos Cactos por meio de estacas de- corre de março até fins d'agosto. As es- tacas encolhidas devem ser cortadas por cima da articulação. Esta clausula é de muita importância; e, se não for obser- vada, difficilmente se desenvolvem as raí- zes : acontece então que só apparecem passados dous e ás vezes quatro annos. E conveniente cauterisar o sitio por onde se cortaram as estacas, polveri- sando-o com pó de carvão, do tijolo ou de gesso : expòe-se depois ao sol até que a ferida fique completamente sêc- ca. N'este estado plantam-se as estacas em pequenos vasos e levam-se para uma (1) E n'esta planta que se encontra o Coc- cus Cacti L., insecto que nos fornece a magni- fica tinta que vem para o commercio debaixo do nome de Cochonilha. Ultimamente foi impor- tada a Optmfia coccinellifera pelo governo fran- cez para Alger, assim como o insecto. Dese- jariamos vêl-a cultivar no Algarve. estufa ou chassis, cuja temperatura este- ja a -[- 25". As regas que se lhe appli- carem devem ser moderadas. As Mamillarias, Echinocactus, Echino- psis e alguns Cereus em geral deitam pou- cas hastes, e portanto é conveniente ter alguns exemplares unicamente destinados para reproducção. O meio de obrigar uma d'estas plantas a produzir rebentos é cortar-lhe a cabeça, a qual já nos pô- de servir para plantarmos. Os Meloca- ctus são as únicas que só se podem re- produzir por meio de sementes. A terra para a cultura dos Cactos de- verá ser preparada do modo seguinte : Mistura-se 1 parte de estrume animal muito velho, com 2 ou 3 partes de ter- ra d'urze, ou na sua falta de terra de matta, e com 1 parte de areia grossa. Quando cultivarmos os Cactos em vasos é preciso dar a estes uma boa draina- gem. A não ser as Ojpuntias e alguns Ce- reus e Pereskias achamos preferível a cultura dos Cactos em vasos. Aos Cactos plantados em vasos é con- veniente mudar a terra todos os 2 ou 3 annos ; e a melhor epocha para se fazer isto é na primavera. Durante o inverno é preciso ter a maior cautela com a rega; devem re- gar-se só quando a terra estiver quasi sêcca, mas sem se borrifarem de modo algum ; no verão porém devem ser rega- dos e borrifados todos os dias depois do occaso do sol. Os Phyllocatus , Epvjjhyllum , Rhipsa- lis e Pereskía supportam mais humidade do que todas as outras espécies de Ca- ctos^ pois que na sua pátria encontram- se geralmente nos valles húmidos das florestas virgens. Julgava-se antigamente que a enxer- tia dos Cactos era impossível; hoje po- rém é processo muito empregado pelos horticultores estrangeiros. E só por meio da enxertia é que se tem conseguido que algumas espécies de Cactos tenham flo- rescido na Europa. Os Cactos enxerta- dos florescem com menos difficuldade e as suas flores são em regra sempre mais perfeitas. As espécies de Cactos que me- lhor se prestam para receber a enxertia são Cereus e Opuntias, e entre ellas as melhores os Cereus grandijlorus, peru- 54 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA vianus, sj^eciosissimus, tetragonus, trian- gular is, pterogonus, Ojjuntia brasãiensis, coccinellifera, decumana, Dillenii, Ficus indica, tuna, etc. As Pereskias que ti- verem tronco espesso servem também pa- ra enxertia. Coimbra. Adolpiio F. Moller. MACAS ESCOLHIDAS PELO CONGRESSO POMOLOGICO DE VIENNA Em seguida encontra o leitor a lista das maçãs escolhidas pelo Congresso po- mologico de Vienna. Charlamowshi ; principio e meado de agosto ; conserva-se três a quatro semanas. Pearmain d^été; meado de setembro até ao fim de outubro ; conserva-se qua- tro a seis semanas. Pomme d'automne de Cludius ; fim de setembro e outubro; conserva-se três a quatro semanas. Pearmain de Schioarzenbach ; setem- bro e outubro 5 conserva-se três a qua- tro semanas. Non jjareille de Langton; fim de se- tembro a meado de outubro; conserva- se três semanas. Pearmain écarlate ; principio de outu- bro a principio de novembro. Peinttte de Burchardt; meado do ou- tubro ate principio do dezembro; con- serva-se dous a três mezes. Noble jaune j principio de novembro até janeiro. Peinette jaune de Blenheim; fim de novembro até março ; conserva-se mui- tos mezes. Pomme Wagener ; fim de novembro até dezembro; conserva-se até maio. Reinette Harbert ; principio de dezem- bro; conserva-se até março. Reinette d' Orléans ; dezembro até mar- ço e abril. Beaujin panaché; dezembro e março. llibston 2iÍ2^pin ; fim de dezembro até abril e mais tempo. Reinette grise de Canada; fim de de- zembro, abril e maio. Reinette d' Oberdieck ; janeiro e maio. Court-pendu royal; janeiro e maio. Reinette Baumann; janeiro ; conserva- se até junho. Reinette de Champagne; março e ju- nho ; conserva-se um anno. Wellington; maio e junho; conserva- se um anno. Oliveira Júnior. GHRONIGA HORTIGOLO-AGRICOLA Abrimos hoje esta Chronica, inserin- do uma carta que acabamos de dirigir ao nosso prosado amigo, e collaborador d'c3- tc jornal, o snr. Mello e Faro. ÍEil-a: Hl."» e Ex."" Snr. D. Joaquim de Carvalho Aze- vedo Mello e Faro. Li com muito prazer a sua resj^osta ao meu opúsculo " Alfrumas Consideraçõ(;tí soljre a Nova Moléstia das Vinlias», e peruiitta V. E.\c.* que desde já lhe af^radeça as delicadíssimas e.xpres- BÕes que me diripje, expressões que só posso attri- buir á sua muita amisade. Quizera desde já responder a alfíuns dos tó- picos do artifro de V. Exc.", o (pie faria, se por ventura nào tivesse actualmente entre mãos ou- tros traballios que cliamam a minha attençào, (! SC nào carecesse de alf^umas ffravuras que siJ poderão ser executadas no meiado da prima- vera, A boa amisade e a exccllente eamarada^íem que V. Exc.» ha tantos annos me tem dispen- sado, moveram-mc a dirigir-lhe estas linhas para que do meu prolongado silencio não se in- ferisse que tinha em menor conta as considera- ções de V. Exc.'' e a sua critica sincera ao meu trabalho. Acceitc V. Exc." um fraternal abraço do Seu amigo muito dedicado, JoSK DCAUTK DK OlIVEIRA, JuMOR. Carmo — G. 2õ de fevereiro de 1875. — Um jornal que se publica em Villa Real sob titulo de «Commcrcio de Vil- la Real», trouxe-nos ultimamente uma noticia que, se não gosa da vantagem de ser nova, ainda a^sim é importante e pre- cisa de ser relatada no nosso jornal, pa- ra d'este modo chamarmos mui particu- JOKXAL DE HOrwTlCQLTUEA PKATICA 55 larmente a attenção uão só das auctori- dades locaes mas também do ministério publico, que deve usar do seu poder pa- ra que se empreg-uem os meios que as leis concedem para se pôr cobro a actos de vandalismo. Paizes ha em que existe um código florestal, no qual ha leis severas que pu- nem todo aquelle que por simples diver- timento, maldade ou utilidade sua, des- troe arvores, seja de que espécie for, que lhe não pertençam. Passou-se assim o facto: Uma turba de homens e mulheres da freguezia de Lor- dello, armados de machados e d'outros instrumentos cortantes, dirigiram-se a um pinhal existente n'aquella freguezia e destruiram-n'o, sob pretexto de que o governo o queria vender. Ora em questões de lei não ha pretex- tos e faz-se obra simplesmente pelos fa- ctos, e dizemos isto porque, segundo o nosso collega de Villa Real, houve outra causa que moveu os populares a irem destruir o arvoredo. Nós não queremos a causa, queremos os factos, e queremos que as auctoridades dêem um exemplo salutar. O caso não é novo. Vemos repetidas vezes as arvores das ruas e das estradas cortadas, sem que por isso a pessoa a quem compete ponha em vigor o que o código penal faculta, único meio de remediar o mal. Diz o artigo 477.° do código penal : «Aquelle, que cortar, ou destruir qual- quer arvore fructifera, ou não fructife- ra, ou enxerto pertencente a outrem, ou a mutilar, ou a damniíicar de modo que a faça perecer, será condemnado na pri- são de três a trinta dias, e multa até um mez. § 1.° Se for mais do que uma arvore, ou enxerto, a pena será imposta, multi- plicada pelo numero das arvores, ou en- xertos destruídos, comtanto que não ex- ceda ao máximo da prisão correccional, e multa correspondente. § 2." Se a arvore, ou as arvores, eram plantadas em logar publico, em estrada, caminho publico, ou concelho, as penas serão em dobro, sem nunca excederem ao máximo da prisão correccional e mul- ta.» Ahi fica a lei e é preciso que se po- nha em execução. Não se remedeia o que está feito, mas evita-se a repetição amiu- dada de casos idênticos, e assim se con- tém os excessos do povo rude, emquan- to se não desbrava a sua ignorância. — Temos diante dos olhos o primeiro numero do «Jornal dos Agricultores do Algarve», publicação que vê a luz em Faro, e que é feita pela Sociedade Agrí- cola d'aquelle districto. Folgamos muito em ter ao nosso la- do mais um campeão que deverá pres- tar valiosos serviços á agricultura, por- que a maneira como são tractados os as- sumptos não só é clara mas convincen- te da utilidade e vantagem que o agri- cultor pôde colher, adoptando este ou aquelle systema de cultura. Desde 1872, epocha em que se reor- ganisou a Sociedade Agrícola do distri- cto de Faro, as auctoridades locaes e alguns homens illustres téem envidado 03 seus esforços para que a agricultu- ra se desenvolva alli. Já o dissemos em tempo e agora o repetimos : em pou- cos ou nenhuns districtos se tem tra- ctado tanto de lançar á terra semente fecunda e productiva como n'este. A todos pois os nossos louvores, não olvidando o snr. A. de Sousa Figueire- do, redactor do «Jornal dos Agriculto- res do Algarve», moço intelligente e la- borioso. Desejamos ao collega uma longa e prospera vida. Os jjrincipios são sempre difficeis mas nada de desalentar, e como prova do apreço em que o temos, pedi- mos desde já licença para transcrever para as nossas columnas o artigo que so- bre as Laranjeiras alli encontramos. Por falta de espaço não o fazemos já, reser- vando-nos para o próximo numero. — Os jornaes americanos annunciam a apparição de uma laranja preta. Ha-de ser como a rosa ... da mesma cor. — Um dos números passados da «Re- vue Horticole» vem acompanhado de uma estampa representando a pêra de- nominada Favorite Morei. E provenien- te de semente da Williams''s Bon Chré- tien, e foi obtida por Mr. Morei, notá- vel cultivador de fructa. Mr. Carriòre recommenda esta pêra a 5Ô JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA assegui'a que reúne todos os requisitos para constituir um excellcnte fructo. — Em 1876 haverá em Milão um Con- gresso Sericola á maneira do que houve nos fins do anno passado em Montpel- lier. Alli serão tractadas todas as questões concernentes a este ramo. — No numero passado dissemos que a nova moléstia das vinhas se havia mani- festado na Áustria, e hoje encontramos no «Journal d'Agriculture Pratique» a seguinte carta, que do castello de Col- lexe (Génova) lhe dirigiu Mr. Borel. Pode dizer na sua Chronica que infelizmen- te o Phylloxtra vastatrix fez a sua apparição na Suissa, na semana passada. A sua presença foi officiahnente verificada n'uma encosta em Prégnj^, cantão de Génova. Essa vinha affectada foi immediatamente se- questrada por ordem do governo. Acabo de saber que a sua presença fora ob- servada também em duas vinhas visinhas que foram eguahnente sequestradas. Se assim continua, será um verdadeiro desas- tre para as regiões vinicolas d'este paiz. Conta-se porém que as neves que costumara abundar aqui impedirão a propagação, mas pa- ra isso era preciso que este inverno nào fosse como o passado, em que quasi não houve ne- nhuma e que foi muito sêcco. Pelo conteúdo d' esta carta vè-se que a impressão que a nova moléstia causa- ra na Suissa íôra a mesma que causou por toda a parte onde cila se tem mani- festado, e a caminhar assim não viria longe o dia em que a viticultura seria eliminada dos mappas agrícolas ! O governo austríaco, sabendo as fu- nestas consequências que a moléstia tem causado nos paizes onde tem appareci- do, começa a preoccupar-se seriamente com a questão. Escripto em idioma allemão recebe- mos ha dias um opúsculo de cerca de 30 paginas em que se passa em revista par- te dos remédios mais ou menos efficazes que téem sido ensaiados em França pa- ra debellar o mal. Esse opúsculo tem por titulo «Relatório sobre a apparição do Phylloxera vastatrix na Áustria» e foi feito por ordem do ministro de agri- cultura d'aquella nação, e conclue por estas palavras: Se a propagação do Phylloxera na Áustria nào assumiu maiores proporções do que até agora se tem observado, lisonjeia-se o Comité d'acrõo com a esperança de poder, provisoria- mente, limital-a aos locaes actualmente invadi- dos e debellar o mal. Para poder, porém, suffocar á nascença qual- quer novo foco, é necessária a incessante vigi- lância e auxilio das auctoridades, naturalistas e viticultores. Despertar e excitar essa vigilância será pa- ra o ministério da agricultura uma tarefa, em cujo desempenho empregará todas as forças de que dispõe. Já estão tomadas as necessárias medidas, e desde o começo da vegetação do anno próximo será cuidadosamente analysada a marcha do Phylloxera apenas appareça. D'esta franca exposição dos factos e expe- riências, deve quem fòr imparcial concluir, que não pikle accusar-se ninguém como culpado da invasão do Phylloxera na Áustria, e que desde o momento em que foi reconhecida a sua exis- tência, se fez quanto humanamente podia fa- zer-se para obstar á propagação. Lançae as vistas para a França, o paiz onde mais adiantada se acha a viticultura e onde abundam homens de sciencia glorio- samente conhecidos no mundo, e vereis que, n'um combate de dez annos contra o Phylloxe- ra, nào conseguiram ir um passo mais longe de que a Áustria nos três estios decorridos desde a primeira invasão. Ha mais : tomaram-se medidas para comba- ter o mal, que mereceram a mais decidida ap- provaçào cm França, e o que é certo é que em Klosterneuburgo se procedeu com mais energia e conhecimento de causa do que em França por occasião da primeira invasão, já se vê porque po- déram utilisar-se as experiências feitas naquel- le paiz. A analogia de apparições similhantes dá-nos a esperança — inútil para o presente — de que o ilagello do Phylloxera ha-de um dia dcsapjja- recer, como appareceu. Influencias metereologicas contribuirão de- certo jiara extinguir o mal, e assim como a in- telligcncia do homem conseguiu paralysar a ac- ção nociva do Oidiuin, da moléstia das batatas, e a do bicho da seda, assim também a sciencia e a experiência hão-de vencer o Phylloxera. Como dissemos no numero passado, o dr. Roesler vae-se occupar d'e3te assum- pto, e é com o maior interesse que aguar- damos 03 trabalhos de homem tão emi- nente. — A casa Rothschild acaba de reim- primir oLes FougèresB, obra illustrada com avultado numero de gravuras. É um livro muito interessante. — Recebemos o agradecemos mais um catalogo que os snrs. Dick Radclyffe & C", do Londres, distiúbuiram ultima- mente. Contém numerosas gravuras e custa apenas 6 pence. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 57 — As ultimas observações realisadas nas estações agronómicas da Allemanlia vieram confirmar um facto já suspeitado ha muito tempo; isto é: que a agua pu- ra bebida em grande quantidade preju- dica a engorda do gado. Mr. Hemneberg conclue que a agua augmenta a produccâo do acido carbó- nico e prejudica a formação da gordura. Resultaria d'estes factos, que, no regi- men da engorda, é preciso limitar as quantidades de agua ao que é indispen- sável para suavizar a sede dos animaes ; convém ainda temperar esta com farello, ou outra farinha qualquer. Esta prática, já provada na engorda doa bois, pôde applicar-se também a ou- tros animaes, principalmente aos porcos. — Na Bélgica levantou-se um confli- cto entre o conselho de administração do Jardim Botânico de Bruxellas e o seu presidente, de que resultou tanto este como o conselho pedirem ao governo a sua demissão. Pelos modos o presidente do conselho de administração queria tornar o Jar- dim Botânico em Passeio Publico, com lindos massiços e bellas avenidas em que se podessem pavonear á vontade as bon- nes cVenfants e os hussarãs. Realmente estas cousas téem graça, mas não podemos deixar de protestar contra tae? projectos como são os do pre- sidente do conselho de administração do Jardim Botânico de Bruxellas. É absurdo ! — Recebemos e agradecemos o «Index Seminarii Horti Botanici Academici Co- nimbricensis» 1875. — Mr. Tellier, de Pariz, tem feito actualmente uma serie de experiências, cujos resultados são curiosíssimos. Os seus trabalhos téem por fim atra- zar á vontade a florescência de certas plantas por meio de um frio artificial. Já fez experiências com certas plantas bolbosas e, na reunião da Société Cen- trale d'Horticulture de 3 de julho, apre- sentou três exemplares do Narcissus bi- florus, cuja vegetação o frio artificial tinha atrazado perto de quatro me- zes. Da continuação d'estas observações te- rá a horticultura muito a lucrar. — Do nosso amigo, o snr. Camillo Au- reliano, recebemos a seguinte errata : No artigo «Dalilias portuguezas» publicado no D." 1 do corrente auno, onde se lê Dalilia Administrador Sarmento deve lêr-se Dalilia Adelaide Sarmento. Fez-me cahir n'este erro a arrevesada cal- ligraphia do meu amigo Pires. Espero que pa- ra outra vez será mais cauteloso, para não ver transtornada a sua nomenclatura. Camillo Aureliano. Damos os parabéns á Dahlia em ques- tão. Sempre vale bem mais ter o nome de uma dama bondo-ia e intelligente do que o de um. . . Administrador Sarmento. Isto sem querer por sombras oíFender o sexo masculino. — Segundo o «Cultivador» ha diver- gência d'opinião com relação ao primeiro que importou a Batata e d'onde. Quando os hespanhoes conquistaram o Peru no século XVI mandaram algumas Batatas a Sua Santidade. A cultura foi adoptada em pequena escala na Hespanha, Itália, Borgonha e nos Paizes Baixos, e da sua similhança com as trufas pozeram-lhe os italianos o nome de Tartufi d'onde os allemães fo- ram buscar o seu Kartojfel. Os france- zes chamam-lhes Pommes de terre e a Áustria Erd-Appel. O almirante Drake em 1586 mandou alguns tubérculos a um seu amigo para cultivar, com es- clarecimentos sobre a excellencia e pro- priedades nutrientes. Este amigo do almirante semeou os tubérculos que nasceram e se desenvolveram bem e quando a semente amadureceu, toman- do-as elle pelo tão recommendado fru- cto, mandou-as colher, fritar em man- teiga e servir com canella e assucar. As- sim cosinhadas foram apresentadas aos commensaes convidados de propósito pa- ra participarem d'esta novidade : achan- do-as porém detestáveis, concluíram que era planta que se não podia cultivar na Europa. O jardineiro teve ordem d'ar- rancar a planta e queimal-a, e quando estava n'este processo passou junto da fogueira alguém que, pondo por acaso o pé sobre uma das Batatas assadas, no- tou a brancura e delicadeza da massa e, tomando-a nas mãos, foi tentado a pro- val-a pelo cheiro agradável que exhala- va. D'este modo foi descoberto na Eu- 58 JOUXAL DE HORTICULTUliA rUATICA ropa o modo de a comer e propagada a cultura, vendendo-se no século XVI a 560 reis por Ib. Hoje a Batata é um dos vegetaes que vae a todas as mezas. Nào ha rico nem po- bre que nào íaoa consummo d' este delicio- so tubérculo que a cultura tende ainda a aperfeiçoar de dia para dia e senão liaja vista ás numerosas variedades que os in- glezes téem obtido por meio da semen- teira. Sobre a introducçào d'esta Solanacea em Portugal, temos á mão um documen- to que deve ser lido com interesse, e por isso aqui o reproduzimos. Eii-o : Francisco Dias Rodrigues da Silveira, Com- mendador da ordem de Christo, e Cavalleiro da de Nossa Seuliora da Conceiçào de Villa Viçosa, Medico de S. M. a iiainha, Sócio Vi- ce-Secretario da Academia lleal das Scieií- cias de Lisboa. Certifico que revendo o Livro primeiro das Actas dos Conselhos e Assembleias de Effecti- vos da Academia Real das Scieucias de Lisboa, que serviu desde 10 de janeiro de 1780 até li) de junho de 1807, delis consta que na Assem- bleia de 9 de maio de 17ÍJ8, especialmente des- tinada á adjudicação dos prémios propostos pa- ra animar a cultura das batatas, se concedera á 111."'^ e Ex.^^ snr.» D. TherezaLiiiza de Sou- sa Maciel o premio de uma medallia de ouro pela maneira seguinte : «Ein attençào a ter D. «Thcreza Luiza de Sousa Maciel colhido, para "cima de quatrocentos alqueires, também de ter- «reno a maior parte até entào inculto, em o si- «tio de Villarinlio de S. Romào, onde fura a «primeira a introduzir este ramo de Agricultu- «ra: A ter descoberto um modo fácil de con- "servar as batatas por espaço de um anno sem «corrupção, ou deterioramento : E a ter junta- «do aos seus documentos uma descripçào da «sua cultura, em que se patenteia maior intel- «ligencia do que nos outros concorrentes: Hou- «ve a Academia por bem distinguil-a extraor- «dinariamente, conferindo- lhe em premio uma «Medallia de Ouro do valor do cincocnta mil «reis.» — E quanto ao sobredito respeito consta da mencionada Acta, a que me reporto, a qual está assignada pelos Seniiores — Duque de La- fões.— António Caetano do Amaral. — Joaquim de Foios. — Custodio Gomes de Villas Boas. — José d'Azevedo. — Alexandre António das Ne- ves.— Fr. Joaquim de S. Agostinho. — Francis- co de Borja Garçào Stockler. — E d'ella se ex- trahia esta certidão por decisào de Effectivos de 15 d'este niez a requerimento do seu Sócio o 111."» e Ex.""^ Snr. Visconde de Villarinlio de S. Romào, Digno Par do Reino : E vae por mim assignada, e sellada com o scllo grande da Aca- demia Real das Sciencias. — Lisboa aos 18 de janeiro de 1845— Logar do Sello— Francisco Eliaa Rodrigues da Silveira, É para estimar que o nome d'uma se- nhora portugueza figure tão honrosamen- te nos annaes da Academia Real das Sciencias. Em Portugal os nomes das senhoras, quando não figuram nas con- tas das modistas, brilham simplesmente nas noticias dos bailes ou nas listas das confrarias. As excepções são raras. — Temos recebido os primeiros núme- ros do «Mosaico», folha li tteraria e scien- titica, que se publica em Coimbra. Sahe a lume duas vezes por mez e contém muitos e variados escriptos, ru- bricados por nomes bem conhecidos nas lides litterarias. Sem querermos encarecer esta publi- cação, que por muitos titulos deve me- recer a protecção do publico intelligen- te, não nos esquivaremos a dizer que é uma das mais distinctas que actualmen- te se faz no paiz. Oxalá que a sua vida seja tão longa e prospera quanto sinceramente deseja- mos. — Por carta que nos cícreveu o snr. dr. Júlio Augusto Henriques, de Coimbra, soubemos que algumas das Cinchonas (Quinas), que o Jardim Botânico da Uni- versidade mandara para as nossas pos- sessões ultramarinas, haviam florescido este anno, o que quer quasi dizer que as plantas estão perfeitamente aclimadas. Quando em tempo noticiamos no nos- so jornal a remessa das caixas Ward com estas plantas, demol-as como pertencen- tes á espécie C. succiriibj^a. Parece, com- tudo, que se oftereceriam agora algumas duvidas sobre a identidade do vegetal, pensando-se que não era a C succiru- bra mas sim a C. lancifolia que se tinlia remettido para as nossas possessões para o ensaio de cultura. Para se verificar qual das espécies era, foram enviados pelo governador de Cabo Verde alguns espécimens ao snr. dr. Jú- lio Henriques, que, em consequência do mau estado em que chegaram, não pôde classificar satisfactoriamente e de modo que não ficasse existindo a menor duvi- da sobre a determinação da espécie. Ape- sar doi exemplares remettidos pelo go- vernador não estarem perfeitos, como já dissemos, o snr. dr. Henriques enviou JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 59 alguns a Mr. Weddell, que, depois de percorrer a região das Quinas na Ame- rica, escreveu a «Histoire naturelle des Quiuquinas» e outros estudos sobre o mesmo assumpto, e que portanto é um especialista. Mr. Weddell inclina-se a crer que as plantas em questão sejam a C. succiru- bra e a C. micrantha e Mr. Howard, que também as examinou, parece estar d'ac- eordo com Mr. Weddell, sem comíudo nem um nem outro darem uma decisão definitiva. Se não nos enganamos, as Cinchonas foram remettidas para as nossas posses- sões no tempo em que o dr. Edmond Goeze era inspector do Jardim Botâni- co de Coimbra, e portanto é de crer que este senhor saiba d'onde lhe foi remetti- da a semente e o nome que a acompa- nhava. Segundo Mr. Weddell, uma das espé- cies que deveria ser cultivada nas nos- sas possessões é a C Calisai/a Ledgeria- na, que vive perfeitamente em Java e na índia ingleza, e que, segundo aquelle naturalista, produz 10 a 12 ^/o de qui- nino. Apesar dos primeiros resultados prá- ticos da cultura das Quinas terem sido obtidos pelos inglezes e pelos hollande- zes, é certo que foi a França que lhe deu um grande impul>o em seguida aos trabalhos do botânico Weddell, que, n'essa qualidade e na de medico, fez parte da expedição scientifica á America meridio- nal, que se effecíuou pelos annos de 1843 a 1848. N'e3sa epocha ainda pouco se sabia d'e^tas plantas preciosas para muitas das enfermidades que flagellam a humanida- de, e então Mr. Weddell querendo pres- tar um relevante serviço, concentrou to- da a sua attenção em tão proveitoso assumpto. Percorreu então as florestas dos Andes bolivianos e peruvianos que ainda não haviam sido explorados pelos quinologos precedentes, e ahi colheu amostras de casca, de madeira, de semen- tes, etc. Em 1849 sahia do prelo a grande obra de Mr. Weddell e os paizes europeus que possuíam colónias começaram a occupar- se da propagação das Cinchonas. Os primeiros indivíduos que se viram na Europa foi n'esse anno no Jardin des Plantes, em Pariz, e o primeiro que floresceu foi em 1850 nas estufas da So- ciedade de Horticultura de Londres, em Chiswick. Era a Cinchona calisaya. É d'esta epocha que datam os esfor- ços empregados por todos os paizes para propagarem as Cinchonas nas suas coló- nias. Vemos o governo inglez que tem mandado vários viajantes ao Peru, á Bo- lívia, ao Equador, e á Nova Granada simplesmente com o fim de trazerem se- mentes e plantas da Quina, destinadas ao estabelecimento denominado das gran- des culturas no Indostão. Essa difficil tarefa foi confiada a MM. Clément R. Markham, Pritchet, Spruce, e Robert Cross que a desempenharam da maneira mais honrosa. As espécies mais úteis das Cinchonas estão agora aclimadas em diversos pon- tos das índias orientaes, devido isto ao zelo e iutelligencia de homens hábeis que não pouparam fadigas para verem reali- sada a missão de que os seus governos 03 incumbiram. Entre outros podemos ci- tar o dr. Falconer, fallecido em Londres ha exactamente dez annos, que na qua- lidade de superintendente do Jardim Bo- tânico de Saharempore e depois de Cal- cuttá, passou cerca de nove annos da sua existência assistindo ao inicio d'esta cultura. A este homem prestimoso suc- cedeu o dr. Anderson, que plantou mi- lhares de arvores em Darjeeling, perten- cente á presidência de Bengala. O dr. W. G. Mac Yvor, director das culturas de Cinchonas em Ootacamund, nas mon- tanhas de Neilgherry, depois de ter con- seguido reproduzir esta planta por esta- ca, distribuiu-a aos milhares pelos habi- tantes. Em 1866 existiajá milhão e meio d'estas arvores nas Neilgherry. O governo dos Paizes Baixos também tem curado d'este assumpto. Em 1852 encarregou o dr. J. Ch. Hasskarl do Jar- dim Botânico de Buitenzorg de ir colher sementes aos Andes do Peru, para se- rem enviadas para Java e em 1853 já se tractava seriamente de proceder ás plan- tações. Emfim se quizessemos relatar o que 03 outros paizes téem feito para natura- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA lisar as Cinchonas, teriamos de encher paginas que só poderiam servir para pôr bem em relevo a incúria dos nossos go- vernos passados. Hoje íolizmeute temos á frente do estado homens que reputa- mos dedicados pelo paiz e que muito po- deriam fazer n'e3te sentido se não fos- sem outras necessidades de nào somenos importância e a que é preciso attender. Ainda assim ousamos esperar que, se continuarmos a ser dirigidos por um governo intelligente e honesto, as nossas | colónias virão um dia a representar um \ papel mais importante na riqueza do es- j tado. j A remessa de algumas plantas em cai- 1 xas deWard era muito bom emquauto se ignorava se o clima e o solo lhe convi- riam, mas hoje que se viu florescerem em Cabo Verde, cremos que se prestaria um valioso serviço encarregando pessoa com- petente de se occupar, mas a valer, da sua propagação no próprio logar. Mandar plantas em caixas para as nossas possessões, recorda-nos o que con- ta Levingstone dos habitantes de uma certa tribu africana que colhiam a agua com uma casca d'ovo de gallinha. Para encher uma vasilha de dimensões menos usuaes, era negocio para annos. Antes de levantarmos mão do as- sumpto, vamos fazer uma interrogação que não se nos affigura de todo arris- cada. Poder-se-iam cultivar algumas das es- pécies de Quina em Portugal? Eis o que nos diz Mr. Morren e que nos parece dar bom fundamento a esta pergunta que causará espanto a muitos que nunca pensaram em similhante cou- sa. Dêmos a palavra ao nosso amigo : fA Cinchona officinalis Linn., que as recentes viagens introduziram na cultu- ra, é mais rústica e tem variedades que podem resistir a um frio de 3 graus abai- xo de zero.» Isto significa para nt)s o mesmo que se se dissesse que a C, officinalis c da re- gião do Kucahjptus globulus e de muitas outras arvores exóticas que hoje so cul- tivam entre nós. Ao Jardim Botânico de Coimbra, vis- to que não temos um jardim especial para experiências, incumbo dar alguns passos para se verificar se cffectivamen- te ha possibilidade de aclimar a Cincho- na em Portugal. As vantagens que d'ahi resultariam é desnecessário trazel-as á tela e desejamos que o nosso alvitre, visto ter um certo fundamento, não fi- que esquecido na gaveta dos papeis ve- lhos. — O aperfeiçoamento que certos ins- trumentos aratorios téem soffrido nos úl- timos annos é incontestável, e como exem- plo citemos o que o snr. Ferreira Lapa diz a propósito de arados: Quanto lavra por dia (10 horas de trabuUio) o nosso arado primitivo puchado por uma jun- ta de bois ? Termo médio 30 ares. Quer dizer que nào revolve mais de lõO metros cúbicos de terra n'aquellc tempo. Quanto lavra uma charriux de Dombasle com o mesmo motor e em egual tempo? Termo mé- dio, 4 vezes aquelle serviço. Quanto lavra uma cliarrua a vapor no mes- mo período de tempo? Termo médio 8 a 10 he- ctares de terreno e a maior profundidade que as macliinas precedentes. Que espantosa differença ! Mas aonde a la- voura a vapor é enormemente vantajosa é nas arroteias c nas lavouras do estio. O trabalho violento obrado com o enxadito e o alfercc por dezenas de trabalhadores e durante muitos dias, opcra-o a charrua a vapor em algumas horas apenas com limitadíssimo pessoal. Factos d'es- tes são uma lição que dispensa palavras. Sim ; isto é muito verdade, mas o por- tuguez é patriota e não está disposto a auxiliar a industria estrangeira. E então quando lhe faliam em innovações d'e3ta natureza, toma fôlego, indigna-se, e diz : «Nada como o meu arado!» É inútil dizer-sc que o seu arado fôra- Ihe legado em testamento pelo avô. — Quando o Shah da Pérsia andou a visitar a Europa, encheu o seu Diário de notas .sobre a agricultura e a horti- cultura europôa. A propósito de cada jardim lá iam meia dúzia de pontos de exclamação, elogios e mais elogios ; sur- preza^ e muitas surprezas. Isto seria caso para os horticultores europeus se encherem de orgulho se não fora o vShah da Pérsia ter-se, segundo os seus apontamentos, enthusiasmado tanto pelas figuras de cora. Dizem que foi uma das maravilhas que lhe dera mais no goto. J. D. DE Oliveira Júnior. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 61 BROMUS SGHRADERI ' Descripções — O Bromus Sckraderi, descripto sempre incompletamente, mal era conhecido dos botânicos e, como se acaba de vêr, confundiram-no muitas ve- zes com as espécies visinhas (todas an- nuaes), das quaes citamos a maior parte. Schrader levou-o ao género Cerato- chloa creado por Palissot de Beauvois e admittido por De Candolle nas espécies de Bromus de paniculas ramosas, cujas glumas são quasi eguaes entre si, com es- piguetas multiflores e comprimidas, não Fig. 13 — Bromus Sctraderi sendo todavia este género acceite pelos agrostologos. Kunth emfim comprehendeu sob o no- me de Bromus (*) (que é uma palavra do grego que significa ao mesmo tempo ali- mento e Aveia) 87 espécies espalhadas pe- lo velho e novo mundo. N'este numero, 16 crescem espontaneamente em França e apenas 5 entram na composição dos nos- sos prados, mas sem serem consideradas como plantas forraginosas. (1) Enumeratio plantaram. T. I, pag. 412. Vol. YI.— 1875 Parece-nos por conseguinte útil, para evitar confusão, dar aqui os caracteres especificos do Bromus Schraderi e depois daremos summariamente aquelles que dis_ tinguem as suas congéneres : Bromus Schraderi Kunth; Ceratochloa pêndula, Ceratochloa breviaristata Hoo- ker. Planta vivaz. Raizes fibrosas. Col- mos erectos, simples, de 0°',70 a 1™,50, glabros, com cinco ou seis nós marcados por uma pequena linha castanho-escura. i (1) Vide J. H. P., vol. VI, pag. 45. N." 4— Abril 62 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Folha?! d'um verde claro, planas, em fita, muito attcuuadas no ápice. Peciolo em- bainhante, muito piloso e guarnecido superiormente de uma ligula membra- nosa franjada, branca e villosa. Limbo podendo attingir O'", 60, percorrido em uma grande parte da sua extensão por uma nervura dorsal saliente, levemente pilosa na face superior, o que a torna um pouco áspera ao tacto. Panicula bas- tante dividida, 1'amosa, pendente para um lado ou erecta. Pedúnculos a princi- pio erectos e depois inflexos, geminados ou ramosos, deseguaes, solitários ou reu- nidos aos dous, raras vezes três, um dos quaes tem o pedicello muito mais com- prido; cada um tem 3 ou 4 e^piguetas. Espiguetas oblongas, ponteagudas, com- primidas, compostas de 3 a 6 flores, d'um verde pallido. Gluma de valvas similhan- tes, em forma de quilha (carinata), gla- bras, membranaceas nas margens, lan- ceoladas, sendo a superior mais compri- da e mais ampla. Glumellas egualmente agudas; a externa em forma de quilha muito pronunciada, bifida no vértice, tendo uma aresta curta que é a prolon- gação da nervura média, a interna adhe- rente ao ovário, estreita, egualmente bi- fida, formando duas quilhas (carina) denteadas com as margens dobradas para dentro. Estamos em numero de 3 com os filetes muito ténues e muito uni- dos ao ovário. Ovário oblongo, em pon- ta, com um sulco profundo guarnecido no ápice de uma lanugem esbranquiçada. Escamulas em numero de duas, muito curtas, cultriformes, obtusas. Na epocha da maduração os pedicellos inclinam-se e as espiguetas tomam uma posição pen- dente. O Bromus Schraderi approxima-se so- bretudo de duas espécies a saber: o B. unioloiães e o B. WilldenmrÁi. São as únicas espécies com que se pôde con- fundir. Não 6 sem fundamento que receiamos que haja alguns negociantes de sementes que vendam estas espécies por aquella que nos occupa. D'este modo aconteceria que 03 agricultores lhe encontrariam a ausência de certos predicados que tem o Bromus Schraderi. Parece-nos portanto importante, para se reconhecer prompta- mente o logro, indicar aqui os caracteres que distinguem estes dous Bromits, sem todavia darmos uma descripção completa ou mesmo uma diagnosis. O Bromus unioloides (*) Humb. e Kunth (Ceratochloa australis Spreng) distingue- se do Bromus Schraderi pela sua folha- gem estreita, pelos pedúnculos verticil- lados e espiguetas compostas de dez ou doze flores e desprovidas completamente d'arestas. E annual. ("^) O Bromus Willdenoivii Kunth tem a bainha pilosa só na extremidade (folio- rum vaginis ápice harhatis', Kunth, «Enu- meratio plantarum») e as espiguetas téem oito flores pelo menos. Emquanto ao Bromus arduennensis Kunth (B. jplatystachis Desf.) tem as es- piguetas munidas d' arestas do compri- mento das glumas. E uma espécie muito distincta que nem mesmo pertence á secção Ceratochloa. Um botânico allemão, Mr. de Schlec- tendal imaginou que podia reunir n'uma só e mesma espécie todas aquellas que acabamos de citar e ainda lhes juntava as espécies Ceratochloa haenkeana Presl. e C. exaltatae. O dr. Schlectendal tinha porém examinado tamsómente as plantas do Jardim Botânico de Halle que podiam muito bem ter a designação errada. O nome de Bromus giganUus, que tam- bém foi dado ao Bromus Schraderi, é um dos menos adequados, porque, quer seja a espécie de Linneu, quer a de Villara, nem uma nem outra tem relação algu- ma com o Bromus Schraderi. O primeiro está collocado no género Festuca (F. gi~ gantea Vill.) e o segundo {B. asper Lin. filho) é uma espécie europeia muito co- nhecida, bem caracterisada e que não se pôde confundir com outra qualquer. (1) Hookcr 6 o próprio a indicar esta espé- cie como visinha da Ceratochloa breviarísta- ta: synonyino do Bromus Schraderi. «Cerato- chloa breviaristata: AUied to C. unioloides, but vory difrerent iu tlie foliago and^^in tlic presen- ce of a distinct awn to íiorcts.» (2) Podemos afiançar que c com effeito an- nual. Pelo menos assim se mostrou nas proprie- dados do dr. Janin e tinha-lhe sido enviada a semente de Natcliitocli (Louisiaue) sob o nome de Jícscue-grass e como planta annual. Devemos obáorvar que esta espécie era erradamente in- dicada como originai'ia da Nova Hollanda. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 63 Nós consideramos o Bromus Schraderi uma planta de um valor excepcional dan- do um rendimento considerável no fim do outomno depois de todas as outras es- pécies forraginosas e possuindo proprie- dades nutritivas notáveis que se devem sobretudo attribuir á presença das semen- tes na epocha da sega. É n'e3te ponto que devemos insistir, porque não conhecemos na agricultura nada similhante. Sabemos que os algarismos que damos podem parecer exagerados. A isso ape- nas podemos oppôr a affirmativa de que são a expressão da verdade. Muitas pessoas já tentaram a cultura doesta planta. Numerosas cartas, algumas das quaes foram publicadas, confirmam os resultados que apresentamos e ainda alguns excedem os nossos próprios. Deixamos ao cuidado dos agrónomos o cuidado de estudar miudamente to- das as condições favoráveis á cultura do Bromtís Schraderi e o logar que deve occupar em cada exploração. A nossa missão está concluída: chamamos a at- tenção dos agricultores para esta gene- rosa Gh^aminea. Considerar-nos-hemos felizes se conse- guirmos, com a publicação d'esta Memo- ria, introduzir na agricultura uma espé- cie útil que vem augmentar a producção forraginosa tão importante em França. Oliveira Júnior. UMA NOVA gramínea ORNAMENTAL A introducção das Gh^amineas na cul- tura ornamental foi um dos grandes pro- gressos que nos trouxe esta epocha de enthusiasmo hortícola que vamos atra- vessando. E na verdade poucas plantas se pres- tam tanto ás decorações hortícolas como esses pequenos e interessantes vegetaes, que Linneu na sua poética imaginação appellidou a plehe do império de Flora. É na producção das Gramineas que se revela toda a munificência da natureza, porque não ha familia mais geralmente espalhada nem de reproducção mais se- gura. Espairecendo a vista desde as praias até ao cimo da mais elevada montanha, vemos sempre esta rica familia forman- do, aqui extensos prados em que o olhar se entretém e o espirito se deleita, alli toucando os alcantilados serros e pene- dias com o seu formoso manto de verdu- ra; emfim não ha canto do globo onde ella não cresça e fertilise; solo, que, por muito más que sejam as suas condições, não possua algumas das variadas espé- cies em que se divide. Quer o terreno esteja exposto aos rigores do frio ou do calor, quer sujeito ás inundações ou ás tempestades, logo que elle seja susceptí- vel d'alguma vegetação, podemos ter a certeza de que lá encontraremos estas preciosas plantas. O conhecimento das Gramineas é um dos mais importantes e o que mais van" tagens pôde trazer ao agricultor; é a base do seu bem-estar e a fonte das suas riquezas. A sua cultura bem dirigida, e á boa escolha das espécies, está ligado em grande parte o desenvolvimento da propriedade, a sua riqueza, o seu futu- ro ; aprender a distinguir as melhores es- pécies, as que são boas e salutares das que lhe são nocivas e indifferentes, co- nhecer as que mais lhes convém para a alimentação dos gados e cultura do ter- reno ; notar o solo que melhor se lhes adapta e finalmente saber substituir umas pelas outras, são conhecimentos impor- tantíssimos, que infelizmente vemos des- pregados no nosso paiz essencialmente rotineiro e aferrado aos antigos costu- mes. Mas deixemos por agora esse ponto importante da nossa agricultura; não ó a estes livros nem a nós que pertence o tractar taes questões ; intelligencias mais experimentadas e robustas que as levan- tem e discutam, e n'isso prestarão um importante serviço ao paiz. Voltando ao assumpto que tínhamos na ideia quando principiamos este arti- go, permitta-nos o leitor que lhe apre- sentemos uma nova Gramínea, a Uniola latifolía, encontrada por Mr. Michaux na America Septentrional. As Uniolas formam um género da fa- milia daa Gramineas^ tribu das Festucas, 64 JOKNAL DE HORTICULTURA PRATICA e compõe-se de 18 espécies muito espa- lhadas na America Septentrional. E uma planta elegante, que se eleva á altura de 3 a 4 pés ; os colmo ssão ar- redondados glabros e um pouco ramosos. As folhas são lanceoladas, largas, en- vaginantcs. Floresce em graciosas pani- culas com as espiguilhas pendentes na extremidade de longos pedicellos, ovaas, achatados, formados de 8 a 10 flores. Poderiamos estender muito mais esta descripção no interesse da botânica, po- rém como o nosso verdadeiro iim é re- commendar esta planta como altamente decorativa, terminamos aconselhando a sua introduceão nos jardins, onde produ- zirá excellente effeito isolada nos cantei- ros ou relvados. A. J. DE Oliveira e Silva. PODA E LIMPEZA DAS LARANJEIRAS Em tempos não muito remotos, a ex- portação de laranja constituiu no Algar- ve um importantíssimo ramo do commer- cio. Sobreveio depois uma epocha de de- cadência e desanimo, devida á epiphitia que destruiu a maior parte dos nossos la- ranjaes. Hoje felizmente pôde dizer-se que o flagello desappareceu, apenas apparece isoladamente algum caso de enfermida- de, com caracter sporadico ; por isso esta importantíssima cultura tende a reani- mar-se; já nos últimos annos tem toma- do notável incremento. As plantações de novos laranjaes vão-se multiplicando, e é de espei'ar que em breve possamos exce- der as importantes exportações d'outro tempo. Em todos os mercados da Europa, a laranja portugueza tem sempre gosado justas preferencias. Em Portugal, é a zona Algarvia a mais propicia á sua cul- tura. A não serem alguns fructos exce- pcionaes originários da America do sul, ainda não vimos laranja mais fina e pri- morosa do que a do Algarve, especial- mente dos concelhos de Villa Real de Santo António, de Monchique e alguma dos subúrbios de Faro ; entretanto é las- timoso que 03 snrs. proprietários não dêem a esta cultura as attenções e cui- dados que merece. Conhecemos, é ver- dade, alguns laranjaes excellentemente tractados que poderiam servir de modelo mui digno de imitar-se, taes são os dos ex.™°' snrs. Barrot de Olhão, Nogueira, Manoel d'Ascenção e Manoel Aleixo Pe- reira, de Faro; é possível que ainda haja outros dignos de elogio, mas infelizmen- te estes bellos exemplos constituem ape- nas brilhantes excepções. Em Monchi- que, em Lagos, Villa Real, Tavira, o por todo esse Algarve temo-nos cansado de vêr, com pesar, extensos laranjaes, optimamente situados, gosando de todos os favores naturaes, mas cobertos de li- chens, comidos de ladrões, apresentando cada arvore a sua f(3rma, cada qual a mais caprichosa e esgrouviada, interior- mente cheias de ramagem espessa e en- trelaçada, impedindo absolutamente a acção benéfica da livre circulação do ar e da luz. Agora que estamos em epocha própria para applicar aos pomares e arvoredos os cuidados de poda e limpeza que re- clamam, parece-nos boa opportunidade lembrar e recommendar a applicação d'estes cuidados á Laranjeira, que tanto 03 agradece e aproveita, e que tão fá- ceis são de executar e tão pouco custam, relativamente á incalculável remunera- ção que nos promettem. Abstemo-nos de recommendar aos po- mareiros do Algarve as podas rigorosas, e a armação de formas, que alguns li- vros aconselham, e que se adoptam com muito trabalho, mas também com muito proveito, em outras regiões menos favo- recidas pela Providencia, para esta cul- tura. Para obtermos um importantíssimo progresso na cultura das Laranjeiras, não necessitamos romper do todo com as antigas práticas, para adoptarmos as es- paldeiras, leques, cordões e outras for- mas usadas era paizes mais setenptrio- naes ; parece-nos que bastaria por agora quo imitássemos conscienciosamente os exemplos acima indicados ; para isto não necessitamos ompregar grandes capitães, nem fazer altos sacrifícios, bastaria que houvesse diligencia o boa vontade; os JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 65 cuidados a empregar limitam-se a pouca CO asa, podem resumir-se ás singelas in- dicações que se seguem : 1.° Limpar perfeitamente os troncos e ramos da Laranjeira, de todos os lichens e parasitas que alli adherem. Consegue- 86 isto com muita facilidade, friccionan- do-os com um tecido áspero, ou melhor com uma luva, das que servem para a limpeza dos cavallos, aproveitando-se pa- ra este serviço uma occasião em que te- nha chovido, e os troncos estejam húmi- dos. 2." Supprimir rigorosamente todos os ramos interiores da arvore, que são sem- pre inférteis, só servem para absorver inutilmente e impedir a livre circulação do ar e da luz. 3.° Supprimir sem dó todos os ramos, seja qual for a sua situação, que se apre- sentem com physionomia de ladrões, isto é, muito direitos e aprumados, de cor clara, muito vigorosos e regorgitando de seiva. Só quando alguma das arrancas da arvore, ou algum ramo indispensável á sua symetria deva ser substituído, é que poderemos conservar algum d'estes, quando se apresente em condições de ser aproveitado como substituto do outro que houvermos de cortar. 4." Abrir as arvores pela parte supe- rior, de modo que o ar e a luz possam penetrar dentro da copa, e supprimir to- dos os ramos sêccos. Todos 03 cortes que se fizerem nas La- ranjeiras, assim como em toda e qual- quer arvore, deverão ser bem lizos e ní- tidos, sempre um tanto oblíquos, para que a humidade não possa alli estacio- nar e introduzir-se na madeira; quando se fazem cortes mais rigorosos, é de gran- de utilidade resguardar as feridas com terra argilosa amassada com excretes de gado bovino, ou ainda melhor com um emplastro composto de sebo, cinzas e pez louro derretido. Mesmo em pomares bem tractados, te- mos testemunhado muitas vezes a negli- gencia com que os trabalhadores fazem 03 cortes, apesar das recommendações dos proprietários ; mal se calcula o pre- juízo causado por estes descuidos; mui- tas vezes os cancros e a morte rápida da arvore são as suas consequências. Sobre- tudo, o que ha a recommendar, com a maior insistência, é que, quando se cor- tem alguns ramos, não se deixem peque- nos tornos ou cotos, devem cortar-se exa- ctamente pela sua base, rentes e cerce com o tronco ou pernada d'onde nasce- ram ; ficando esses pequenos tornos, ou elles ficam com alguns olhos na sua base, e então cobrem-se ahi de producções inú- teis, que roubam muita seiva, ou seccam e apodrecem e vão levar ao interior da arvore o gérmen da sua ruina. Das doenças que atacam as Laranjei- ras^ a lagrima é a mais terrível, e a que maiores estragos tem causado; felizmen- te pode dizer-se que ella desappareceu do Algarve. Presentemente os inimigos que mais nos prejudicam são dous para- sitas, um animal outro vegetal, que quasi sempre andam juntos e se combinam pa- ra dar cabo dos nossos laranjaes. Appa- recem sobre o tronco e ramos principaes algumas nódoas negras, formadas como de poeira de carvã©; ao mesmo tempo apparecem algumas pequenas crostas par- dacentas, de forma circular ou elyptica. E contar que a arvore em breve esmo- rece e morre se lhe não acudirmos. Aquella poeira negra é um exercito inu- merável de pequeníssimos insectos, que os zoologos chamam Coccus aurantii, as manchas pardacentas são formadas por um lichen, que os sábios chamam Dema- thium monophilum. Nas arvores bem tra- ctadas e bem arejadas, que gosam lar- gamente dos beneticíos da luz, raríssi- mas vezes estes inimigos se atrevem a apparecer; para atacar buscam sempre a obscuridade e a sombra, por isso o me- lhor meio de combatel-os é dar ás arvo- res muita luz e muito asseio. Muitas ve- zes basta empregar este meio para o inimigo se declarar vencido e bater em retirada, mas se o exercito é muito gran- de e já fez algumas victimas, recorre-se conjunctamente a outros meios d'ataque; n'este caso emprega-se com excellente resultado a seguinte receita : Agua 18 litros Alcatrão */2 » Flor d'enxofre . . . , . 500 gram. Sabão de potassa . . , . 3 kilos. Tudo isto bem misturado, applica-se Bobre os ramos affectados. 6.1 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Succede ás vezes, quo as Laranjeiras começam a entri.stecer sem causa conhe- cida, as folhas perde):i o viço, murcham e empallidecem, u'esse anno a arvore carrejía muito de fructo, mas pequeno, de?mcdi*ado, e amadurece muito tempo- rão. Tudo isto são presagios de morte. As vezes este estado é determinado pela existência d'agua em quantidade exces- siva nas camadas profundas do solo, de modo que a arvore vive bem emquanto lá não chegam as raizes, mas logo que alli chegam começam a macerar-se e apodrecem. N'este caso é indispensável sanear o terreno, abrindo valias profun- das que dêem esgoto á humidade super- abundante, ou fazer uma boa drainagem. Mas nem sempre é esta a causa da en- fermidade apontada ; succede quo em ter- renos enxutos também ella se manifesta; n'este caso o mal só se pôde attribuir a uma verdadeira anemia da seiva, que se combate, ordinariamente com bom re- sultado, com a applicação do sulphato de ferro, (caparosa verde) dissolvido em agua, em irrigações e por aspersão so- bre as folhas. A dose de sulphato de ferro a empregar nunca deve exceder a duas grammas por litro d'agua. Fazem- se duas e três regas durante o inverno com esta dissolução, escolhendo-se para isto um tempo sombrio, e melhor será serem feitas depois do sol posto. A aspersão das folhas pode fazer-se com um regador qualquer, ou melhor com uma bomba portátil; deverá tam- bém fazer-se por tempo sombrio. Ha dous ou três annos tem começado a apparecor nas Laranjeiras do Algarve uma outra doença, por emquanto, feliz- mente, pouco generalisada, mas que en- tretanto tem já causado sérios prejuisos; denuncia-se logo pela amarellidão e es- tiolamento das folhas, descobrindo-se as raizes vôem-se algumas nódoas parda- centas, nos pontos atacados o lenho tor- na-se moUe, sêcco, e esfarella-se em pó ; o remédio que até ao presente tem dado melhores resultados consiste em desco- brir as raizes, com um instrumento bem afiado cortar todas as partes aífectadas, até ao são, e deixal-as descobertas por duas ou três semanas, dando-lhes depois abundantes regas. Este processo tem dado resultados satisfactorios, salvam-se quasi todas as arvores, mas é certo que se re- sentem muito d'este tractamento, que as deixa em extremo debilitadas; temos aconselhado uma pequena modificação que nos parece deverá dar resultados muito mais vantajosos, consiste em ope- rar bem nitidamente todos os cortes da raiz, applicar sobre as feridas o ingre- diente que em outro logar indicamos, composto de sebo, cinzas e pez louro, e deixar as raizes descobertas somente o tempo necessário para seccar completa- mente este ingrediente, e cobril-as com boa terra nova proveniente d'outra par- te, applicando-se-lhe depois três regas, espaçadas de dez em dez dias, com agua, na qual se deverá ter dissolvido duas grammas de sulphato de ferro por cada litro. Parece-nos que, com este tractamento tão simples, poderemos ter toda a segu- rança de salvarmos todas as Laranjeiras que se apresentem atacadas d'e3te mal. Consta-nos que n'esta occasião alguns senhores proprietários estão applicando aos seus pomares aífectados a receita in- dicada; esperamos em brevo poder infor- mar aos nossos leitores dos resultados que obtiverem. A. DE Sousa Figueiredo. ARAUCÁRIA BRASILIENSIS Araucária hrasiliensis A. Rich. Syn. — Pinus dioica Arab.; Coh/mbea Angus- tifolia Bertol. ; Araucária Ridoljiana Sa- vi.; Araucária di Bibhiani Ilort. Itat. — Arvore attingindo de quarenta a cincocn- ta metros, pyramidal emquanto nova e depois com o cimo patente e o caule des- pido de ramos do meio para baixo em consequência do seccamento successivo dos ramos inferiores ; ramos vertici lia- dos, patentes ou inclinados para f(')ra, elevados nas extremidades ; ramúsculos simples, compridos, muitas vezes pen- dentes, muito caducos ; folhas alternas, de dous a cinco centimetros do compri- do e de quatro a oito millimetros, dila- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 67 tadas, decorrentes na base, muitas ve- zes um pouco torcidas, um tanto glaucas inferiormente nos individues novos, lon- gamente acuminadas em ponta scariosa, fina e muito aguda, persistindo muito tempo, algumas vezes sêccas e acasta- nhadas ; amentilhos femininos, ovoidaes, obtusos; cones muito grandes quasi es- pliericos ; sementes approximadamente de cinco centímetros de comprido, arruiva- das e brilhantes. E uma espécie já bastante espalhada, mas de que nem por isso gostamos mui- to, porque, conforme vae crescendo, as- sim perde os ramos inferiores, ficando porém os superiores, que formam uma espécie de guarda-sol, mas de effeito des- agradável. No dizer de Mr. de Martins, que percorreu durante muitos annos o Brasil, esta arvore nunca toma boa ap- parencia nem ainda nos legares onde ella é indígena, razão porque nos abstemos de a recommendar como arvore de orna- mento para ser disposta isoladamente. Associada com outras espécies florestaes não deve produzir mau efí'eito. Conhecemos exemplares que medem para cima de doze a quinze metros, po- rém nunca vimos nenhum que pela sua belleza mereça particularmente ser as- signalado. A sua introducção na Europa data de 1816, e calculamos que fora in- troduzida em Portugal depois de 1830. Os fructos da Araucária hrasiliensis vendem-se nos mercados do Brasil como género alimentício. Esta espécie tem uma variedade, a : Araucária Brasiliensis, var. graci- lis Hort. — Syn. — Araucária gracilis Hort. ; Araucária elegans Hort. ; Araucá- ria Ridoljiana Knight. — É quasi desco- nhecida nos nossos jardins, e distingue- se por ter as folhas mais finas, mais es- treitas, mais juntas do que na espécie tvpo e quasi glaucas ; os ramos também são mais delgados, patentes e algumas vezes pendentes. Oliveira Júnior. MEIO DE OBTER HORTÊNSIAS AZUES O Conde de Medici-Spada, secreta- rio de uma Sociedade de horticultura, communicou á «Revue Horticole» o meio de obter facilmente para as Hortênsias, todas as cambiantes do azul, pelo alú- men romano (triplo-sulphato de alumi- na, de potassa e ferro), com que se pol- vilham as plantas no mez de março, an- tes de entrarem em vegetação. Regula- se a operação segundo o grau de colori- do que se quer obter, e repete-se uma ou duas vezes quando se deseja levar a cor ao maximum de intensidade, O snr. de Mediei nunca ligou importância ao dizer- se que a luz mais ou menos directa exer- ce uma certa influencia no tom do colo- rido. Na villa Tordonia, em Castel-Gandol- fo, próximo de Roma, pode vêr-se no mesmo sitio uma grande quantidade de Hortênsias, quer em vasos, quer no chão; as primeiras conservam a sua bella cor rosada, emquanto que as outras, confia- das á terra, apresentam as suas flores com a mais bella cor azul ultramar, o que se explica pela presença dos silica- tos ferruginosos em decomposição, que entram na formação vulcânica do solo d'aquella localidade. A. J. DE Oliveira e Silva. LARANJA PÊRA Achamos esta variedade tão fora do commum que resolvemos represental-a n'este jornal por meio da gravura. Ha annos que recebemos algumas La- ranjeiras do Brazil e entre cilas vinha uma denominada Laranja Pêra. Pelo no- me suppuzemos que teria a forma de Pêra, porém não aconteceu assim, porque quando deu fructo vimos que tinha a for- ma de laranja commum e que nada apre- sentava de notável. Mais tarde obtivemos uma variedade sem nome, e quando fru- ctificou vimos que esta é que era a va- riedade Pêra, por a sua configuração se lhe assimilhar. Não tem pevide e tem uma espécie de umbigo muito saliente. E muito doce e fina, porém os fructos não são grandes. 68 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA No catalogo geral n." 11 cio nosso es- tabelecimento vão mencionadas algumas variedades notáveis e novidades, e entre eilas ha uma muito singular que é a La- ranjeira Hortelã, porque quando se des- casca fica nas màos um cheiro muito pro- nunciado á Hortelã mourisca. Ha annos que me fallavam n'esta variedade e eu suppunha não ser verdade, porém pude obter dous fructos e effectivamente não havia engano. Em grandeza e doçura é notável a d'Embigo (ou da Bahia). A da Saúde também é grande e a sua forma é a da Fig. 14 — Laranja pcra — Desenhada no Horto Loureiro maçã Calville. É d'uma doçura admirá- vel. Em dezembro e janeiro já são muito saborosas. Escusado será recommendar aos proprietários que téem grandes ter- renos e logares apropriados para esta planta; que façam grandes plantações, porque já todos reconhecem as innume- raveis vantagens que d'ella3 se tiram. Não daremos aqui explicações algumas so- bre a sua cultura porque já de sobejo, nos primeiros volumes d'este jornal, se tem fallado d'este assumpto. J. Marques Loureiro. AS PLANTAS CARNÍVORAS Extracto do discurso pronunciado pelo dr. Hooker, na sessão de zoologia e botânica da Associação Britannica de Belfast, ao occupar a cadeira da pre- sidência «Escolhi, disse o illustre sablo, para as- sumpto do meu discurso os hábitos car- nívoras d'algun8 vegetaos que podem ser considerados nossos irmãos, dcl)aixo do ponto de vista do organismo. Diversos oV>servadores descreveram com mais ou menos exactidão os hábitos d'osscs caça- dores vegetaea, taea como a Drosera^ a Apanha-moscas ou Dionaea, assim como as plantas de urnas, mas poucos inda- garam as causas, isto é, o porquê d'e3- tas cousas. Por outro lado os que estu- daram estes phenomenos com mais exa- ctidão não alcançaram o credito que me- reciam. Muito recentemente este assum- pto adquiriu novo interesse, em resulta- do das observações de Mr. Darwin sobre os phenomenos que acompanham a pre- sença da substancia alburainosa nas fo- lhas da Drosera e da Pinguicula, phe- nomenos que, na opinião d'um physiolo- gista eminente, provam, no caso da DiO' JORNAL DE HOETICULTURA PRATICA 69 naea^ que esta planta digere exactamente as mesmas substancias e por o mesmo modo que o faz o estômago humano. Mr. Darwin continua com as suas observa- ções n'e3te sentido e foi com o fim de lhe prestar todo o auxilio, todo o apoio que me permittia a minha posição, que eu examinei, guiado por elle, outros dif- ferentes vegetaes carnívoras. No decurso das minhas investigações fui levado a consultar os documentos an- tigos sobre todo este assumpto, e são tão pouco conhecidos e tão interessantes que penso que um resumo d'estes factos, até ao momento em que Mr. Darwin se occu- pou d'este assumpto, não deixará de oíFe- recer algum interesse aos membros d'es- ta assembleia. A Apanha-moscas de Vénus. (Dionaea muscipula Linn.) Em 1768, Ellis, natura- lista inglez bem conhecido, enviou a Lin- neu o desenho d' uma planta, a que deu o poético nome de Dionaea. Vou lêr a descripção que enviou a Linneu e que obrigou este naturalista a dizer, que, apesar de ter visto e estudado muitas plantas, nunca tinha observado pheno- meno tão maravilhoso. Eis a descripção de Ellis : «A Dionaea mostra que a natureza pode ter certos desígnios emquanto á sua nutrição, fazendo da junta superior da folha uma espécie de machina para apa- nhar a comida, ficando no meio a ratoei- ra destinada a illudir o desgraçado in- secto, que se torna presa sua. Grande numero de glandulasinhas vermelhas que cobrem a sua superficie, e que talvez suppurem um licor assucarado, tentam o pobre animal e o convidam a provar, mas no mesmo instante em que as par- tes tenras são irritadas pelas patas do insecto, os dous lóbulos levantam-se, aper- tam-se muito, endentam-se como uma ra- toeira e comprimem a desgraçada victi- ma até dar cabo d'ella. E com medo que chegue a livrar-se dos grandes esforços que emprega para salvar-se, ha três pon- tasinhas direitas fixadas no meio de ca- da lóbulo, entre as glândulas, as quaes pontas tem por fim pôr termo aos esfor- ços desesperados da victima. Os lóbulos não se abrem emquanto o animal se con- serva alli. Parece todavia certo que a planta não pode distinguir uma , substan- cia animal d'outra vegetal ou mineral, porque, se introduzirmos uma palha ou um alfinete entre os lóbulos, ella o aper- tará, tão estreitamente como se fora um insecto.» Linneu não viu n'estes actos maravi- lhosos senão uma sensibilidade extrema das folhas e não acceitou a descripção de Ellis pelo que diz respeito ao golpe mortal que o insecto recebia dos três pel- los do centro de cada lóbulo da folha. Durante um século a historia da planta progrediu pouquíssimo. Sessenta annos depois do que Linneu tinha escripto, o doutor Curtis, de Wilmington, da Caro- lina do Norte, publicou as seguintes e exactas observações: «Cada metade da folha é um pouco concava para o lado interno, onde estão collocados três órgãos delicados em for- ma de pellos, de modo que um insecto mal a pôde roçar sem se pôr em conta- cto com um d'elles: então os dous lados reunem-se e cerram a presa com uma força que excede os esforços que possa fazer para safar-se. As franjas de pellos ásperos dos lados oppostos d'uma folha entrelaçam-se como os dedos de duas mãos que se cruzam. A sensibilidade reside somente n'estes pellos rijos do interior das folhas, porque se podem tocar todas as outras partes sem determinar efí'eito3 sensíveis.» A Ellis cabe o merecimento de ter descoberto o motivo da prisão dos inse- ctos pela Dionaea^ mas Curtis desceu ás minuciosidades do mechanismo. Duran- te outra geração a historia da planta ficou por aqui, mas em 1868 um botâ- nico americano, Mr. Clanby, durante a sua residência na localidade da Dionaea, estudou com muito cuidado os caracte- res d'e3ta planta, principalmente os pon- tos determinados pelo dr. Curtis. A sua primeira ideia foi que «a folha tinha a faculdade de dissolver a matéria animal, que ficava então em estado de correr através do peciolo formando canal até á raiz e fornecendo assim á planta um ali- mento bastante oxygenado ou azotado. Nutrindo as folhas com bocadinhos de carne, observou que estes eram comple- tamente dissolvidos e absorvidos, reOi- 70 JORNAL DE HOKTICULTURA PRATICA brindo-se a folha com a superfície per- feitamente secca, e prompta para dige- rir de novo, ainda que com menos appe- tite. Observou que o queijo era péssimo para as folhas, as quaes emmarellecia e por tira matava. Descreveu finalmente com minuciosidade a lucta que sustenta inu- tilmente o CurcuUo, estabelecendo defi- nitivamente o facto de que o fluido j;i indicado é segreí?ado no momento e não i-esultado da decomposição da sub- stancia digerida pela folha. O Curculio, sondo de natureza robusta, procurava uma aberta roendo a folha. Quando se deu por isto, estava ainda vivo e tinha praticado um buraquinho através d'um lado da folha, mas já estava muito en- fraquecido. Abrindo a folha, viu-se que estava envolvido por uma grande quan- tidade de liquido segregado, que gra- dualmente, sem duvida, o teria atacado. Deixou-se outra vez á folha o fechar-se sobre si e o Curculio morreu logo. O doutor Ilooker deu conta em segui- da da communicação acerca d'esta plan- ta apresentada na ultima reunião da As- sociação pelo doutor Burdon-Sanderson. Todos os estudantes da secção vegetal da natureza orgânica ficaram admirados d'ouvir dizer que certas experiências, que o doutor Sanderson fizera instigado por Mr. Darwin, provaram que os phenome- nos que se dão, ao contrahir-se a folha da Dionaea, eram exactamente similhan- tes aos que se passam quando os múscu- los se contrahcm. Não só os phenomenos da digestão n'e3te vegetal maravilh 'SO são como nos animaes, mas também os da contractilidade. Drosera ou Orvalhos do céo. — Estes ve- getaes não occupam sinnente uma loca- lidade do Novo Mundo: estão distribuí- dos pelas partes temperadas dos dous hemispherios, em terrenos areontos e ala- gadiços. Estão actualmente reconhecidas como próximas congéneres da Dionaea, facto que ora apenas supposto, quando BC descobriram os seus curiosos caracte- res. M. Ilooker fez a traços largos a his- toria interessante da Drosera e provou que era a Darwin que se devem as mais recentes e importantes addições aos fa- ctos estabelecidos pelos antigos observa- dores. Apesar d'Í3to e posteriormente, alguns botânicos tinham ousado affirmar que não eram verdadeiras as antigas descripções da Drosera. Os attestados repetidos de difFerentes observadores a respeito da Dionaea e Drosera passam d'um século, e ainda que em nenhuma epocha fossem acceites com enthusiasmo, pensa o dr. Hooker que são sufficientes para provar que na familia das Drose- raceas ha plantas que em primeiro lo- gar, prendem os animaes para seu sus- tento em segundo logar os digerem e dissolvem por meio d'um liquido que é segregado para este eíFeito, e que, em terceiro logar, absorvem a solução de matéria animal, que é assim produzida. Antes das observações de Mr. Darwin terem empenhado outras pessoas n'este estudo, a razão d'e3tes phenomenos foi muito pouco apreciada, tia apenas al- guns annos que um botanico-physiolo- gista francez, Duchartre, depois de ter mencionado as ideias de Ellis e Curtis a respeito da. Dionaea^ manifestou a opi- nião de que as folhas d'esta planta ab- sorviam as substancias animaes dissolvi- das. Esta opinião estava demasiadamen- te em desaccordo com os nossos conhe- cimentos das funcçues das folhas e de todo o curso da nutrição vegetal para que fosse seriamente discutida. Se as Droseraceas fossem um caso isolado d'um grupo de plantas apresentando uma dis- posição d'esta sorte, ainda poderia haver motivo para tal critica, mas eu penso, accrescentou o dr. Ilooker, que posso mostrar que não é este o caso. Ha hoje razões para crer que ha muitos casos d'este3 costumes carnívoras nas difFeren- tes partes do reino vegetal, e entre es- pécies que não téem entre si nada abso- lutamente de commum a não ser esta propriedade. Sarracenia. — Como outro exemplo dos factos que acabo de fallar, apresentarei o grupo curiosíssimo das plantas, cujas folhas imitam urnas graciosas, embclle- cidas muitas vezes por lindo e variado colorido, plantas conhecidas em botâni- ca pelo nome de Sarracenia. Este gru- po ó peculiar do Novo Mundo. O géne- ro Sarracenia comprehcnde oito espécies todas similhantes como caracteres geraes JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 71 e todas oriundas dos Estadoa orientaes da America do Norte, oude se encon- tram mais especialmente nos terrenos bi- tuminosos e em logares cobertos por aguas pouco profundas. As folhas, que lhes dão um caracter inteiramente espe- cial, são em firma de urnas ou de trom- betas reunidas em tufo ou roseta e sa- bem immediatamente do solo. Na epo- cha da florescência lançam uma ou mui- tas hastes delgadas, cada uma das quaes supporta uma flor solitária. Esta tem um singular aspecto, devido em grande parte á expansão em forma de umbella revirada que termina o estylete. O primeiro facto que chamou a atten- ção sobre estas urnas foi descobrir-se que continham agua logo que começavam a vegetar. Em 1829, Burnett escreveu uma nota contendo grande numero d'ideias originaes, minuciosamente expostas, na qual insistia vigorosamente sobre a exis- tência d'um verdadeiro apparelho diges- tivo da Sarracenia^ análogo ao que exis- te no estômago dos animaes. Graças ás observações de dous physicos da Caroli- na do Sul, os nossos conhecimentos acer- ca das faculdades da Sarracenia vario- laris são quasi completos. Um d'elles, o doutor Bride, fez as suas observações ha quasi meio século mas até agora estive- ram cabidas n'um completo esquecimen- to. Tomou elle á sua conta o descobrir o modo porque a Sarracenia variolaris era visitada pelas moscas e como as captu- rava. O doutor Mellichamp, que reside actualmente no logar onde o doutor Bri- de fez as suas observações, accrescentou grande numero de factos aos nossos co- nhecimentos. D'estes estudos resulta evidentemente que ha dous typos distinctissimos de ur- nas na Sarracenia; o exame das espé- cies mostra que devem haver provavel- mente três. Podem ser classificadas em urnas abertas e de tampa levantada e que recebem, por conseguinte, em maior ou menor quantidade, a agua da chuva, e em urnas fechadas pela tampa, nas quaes a agua pluvial não penetra ou só penetra com muita difficuldade. Ha sem duvida muito que aprender a respeito da Sar- racenia, e é d'esperar que os botânicos americanos se appliquem a este estudo. Darlingtonia. — Não posso abandonar a Sarracenia sem dizer algumas pala- vras acerca da sua próxima alliada a Darlingtonia, planta ainda mais maravi- lhosa e que, pela distribuição geogra- phica, se acha muito afastada das loca- lidades da Sarracenia, pois habita na Sierra Nevada da Califórnia, a uma al- tura de 5 mil pés. Este género compor- ta duas espécies de urnas; uma, parti- cular á planta quando nova, consiste em tubos estreitos, um pouco torcidos, em forma de trombetas, tendo aberturas ou boccas obliquas e abertas, cujo lábio dor- sal se alonga em capuz arqueado, de cor escarlate, que fecha apenas a bocca. A ligeira torsão do tubo faz com que estas boccas se dirijam em direcções va- riadas e só possam apanhar pequenos in- sectos. Antes de chegar ao estado de completo desenvolvimento, a planta apre- senta urnas muito maiores, quasi direi- tas, egualmente torcidas, com o lábio des- envolvido em um largo capuz achatado, que se arqueia completamente por cima d'uma pequenina entrada da cavidade da urna. Um órgão singular, d'um ver- melho alaranjado, bilobado, pende da extremidade do capuz até em frente da entrada, que, segundo nos informou em carta o doutor Asa Gray, é untada de mel na parte interna. Estas urnas estão cheias de insectos, principalmente ti- nhas, que se decompõem formando mas- sa pútrida. Não pude saber se no sitio em que nascem naturalmente se encon- trou agua n'essas urnas, mas verifiquei a presença d'uma secreção ligeiramente acida nas duas espécies d'urnas, quando são novas. Não porei de parte as Darlingtonia sem notar um facto que me pareceu dos mais curiosos na sua historia : é que a sua transformação d'estado delgado, tubuloso, de bocca. aberta, em urnas deprimidas, de bocca fechada, se realisa bruscamente na planta adulta. Não encontro nenhuma urna n'um estado intermédio de desen- volvimento. Isto não deixa de ser algu- ma cousa significativo e o interesse do facto augmenta, porque as urnas novas representam até certo ponto as das Sar- racenias de boccas abertas e tampas le- vantadas e as urnas antigas as das Sar- 72 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA racenias de boccas fechadas e de tampas globulosas. A combinação dos caracteres representativos n'uma espécie de um paiz tão afastado, pertencente a um grupo tão pequeno, não pôde deixar de coasi- derar-se como um tacto maravilhosamen- te significativo para os morphologistas, que sustentam a doutrina da evolução. Nutrição das lílantas. — Na parte que precede descrevi os exemplos mais notá- veis das plantas que parecem inverter a ordem da natureza, e que tiram a sua nutrição, em parte pelo menos, do reino animal. Poderia accrescentar outros fa- ctos aos que já narrei. Provavelmente ha ainda muitos desconhecidos da scien- cia e vegetaes, cujos caracteres ainda não foram descobertos. O problema, po- rém, que se impõe á nossa attenção é o seguinte : Como é, por exemplo, que es- tas singulares anomalias na ordem, por outro lado tão uniforme da nutrição ve- getal, se apresentam em algumas partes longínquas do reino vegetal? Porque não são mais frequentes e como é que estes caracteres extraordinários foram deter- minados ou contrahidos "? A primeira vis- ta o embaraço não diminue consideran- do a natureza da nutrição vegetal ordi- nária. As raizes absoi-vom cortas maté- rias do solo. O nitrogénio f(')rma quasi 03 quatro quintos do ar que respiramos; no emtanto as plantas não podem procu- ral-o em nenhuma parto no estado livre, isto é, não combinado. Extrahem do solo em quantidade minima os nitratos e os saes amoniacaes e com estes e com o ami- do ou outras matérias análogas formam compostos albuminóides ou proteicos ne- cessários para a nutrição e desenvolvi- mento do protoplasma. A primeira vis- ta, nada parece mais inverosímil que MxaskDionaea ou Nepenthcs capturando os insectos, embebendo-os d'um liquido di- gestivo e absorvendo os albuminóides do animal. Comtudo alguma cousa ha que não deixa de ter analogia no uso das plantas mais regularmente constituídas. As sementes do Rícino, por exemplo, contcem, além do seu embrvão, uma massa de tecido cellular ou cndosperma cheio de substancias fortcincnto nutriti- vas, do modo que a plantasinha que des- cança n'o3te3 depósitos nutritivos se acha em contacto com elles. O calor e a hu- midade da germinação estabelecem mo- dificações que produzem a liquifação das substancias contidas no endosperma; o embrvão apropria-se d'cllas, cresce e tendo cmfim absorvido tudo o que pôde do endosperma, que então se acha ex- haurido, firma a chlorophylla nos seus cotyledones sob a influencia da luz e vive então dos seus próprios recursos. Um grande numero de plantas, quan- do novas, absorvem d'e3ta maneira os seus compostos nutritivos, inteiramente pre- parados d'ante-mão, e é isto eíFectiva- mente o que fazem mais tarde as plan- tas carnívoras para effectuar o seu cres- cimento. A diíferença absoluta entre as plantas que absorvem c se nutrem por si próprias com os productos da decom- posição das estructuras vegetaes e as que fazem uso similhante das estructu- ras animaes não é grande. Podemos ima- ginar que as plantas, accidentalmente, permittiram a accumulação de insectos em algumas partes da sua estructura, porque esta propriedade se desenvolveu e fixou, porque foi considerada útil. Ha muito tempo suggeriu-se a ideia que o receptáculo formado pelas folhas do Vi- jysacits poderia ser um órgão que come- çasse d'esta maneira, e posto que não se tenha attribuido nenhum habito inse- ctivora a esta planta, a theoria não é improvável. Linneu, e mais recentemen- te Baillon, mostraram como uma urna de Sarracenia se poderia considerar modifi- cação de uma folha do typo das Ni/m- phaea. Podemos, pois, imaginar que tal folha se cavava ao principio, deixando accumular detritos de diff'ercnte3 espé- cies; estes decompôr-se-hiam e produ- zir-se-hia uma solução, cujos constituin- tes se disseminariam cm parte pelos te- cidos subjacentes da planta. Isto é na rea- lidade a absorpção e podemos suppor que no primeiro caso — como talvez ainda na Sarracenia purpúrea — a matéria absor- vida não era outra cousa senão os pro- ductos nutritivos salinos da decomposi- ção, taes como saes ammoniacaes. O acto da digestão — operação que reduz sem decomposição a nutrição solúvel n'uma fornia solúvel própria para a absorpção — foi sem duvida subsequentemente pro- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 73 movida. Comtudo, a secreção dos líqui- dos pelas plantas não é phenomeno raro. Nepenthes. — Em muitas Aroideas, uma pequena glândula situada na extremida- de das folhas segrega um liquido mui- to abundante e a urna ou ascidia da Nejyentkes não é senão uma glândula análoga extraordinariamente desenvolvi- da. Não poderia acontecer que essas mara- vilhosas amphoras vegetaes e seus há- bitos carnívoras dessem origem por se- lecção natural a uma tal glândula que segrega mel? Póde-se, pois, suppôr que os insectos foram envolvidos pela secre- ção viscosa d'essa glândula e que alli morreram, em resultado da acção das matérias acidas que abundam n'estes ve- getaes, assim como em muitas outras plantas. A modificação subsequente dos órgãos secretores da uru a em substan- cias aquosas, saccharinas e acidas, se- guiria as evoluções da urna, segundo as leis mysteriosas que resultam da corre- lação dos órgãos e das funcções em toda a extenção da natureza, e que, segundo o que posso conceber, excedem em ad- miração e interesse a da evolução e ori- gem das espécies. Estas observações, creio, ajudar-vos- hão a comprehender — ainda que os pro- cessos da nutrição dos vegetaes sejam geralmente differentes dos dos animaes — que o protoplasma das plantas não é absolutamente privado de servir-se da nutrição de que se serve o protoplasma dos animaes, e que, debaixo d'este ponto de vista, os phenomenos das plantas car- nívoras formam mais uma malha na con- tinuidade da natureza.» O trabalho do dr. Hooker é extrema- mente curioso e oíFerece um novo cam- po d'estudo aos physiologistas, e se não é a este sábio que cabe a honra da desco- berta das plantas carnívoras visto que em 1765, isto é, ha mais d'um século, já Collinson as assignalava, ainda assim tem o grande merecimento de haver cha- mado a attenção do mundo scientifico pa- ra um assumpto que estava como que esquecido. As conclusões do dr. Hooker não são todavia acceitas unanimemente, e natu- ralistas de reputação como Duchartre e Parlatore não querem crer que as leis da natureza sejam assim desthronadas e vêem n'estes factos, que são por certo muitíssimo curiosos, apenas uma inter- pretação errónea. Para Mr. Parlatore, por exemplo, os órgãos que capturam os insectos não o fazem senão com o fim de impedir que as flores sejam perturbadas na sua fe- cundação e portanto os pellos, espinhos, escamas e mais órgãos de que são dota- das, não são mais do que armas de de- feza^ cujo fim até hoje não havia sido bem determinado. Mr. Darwin está-se occupando d'es- ta questão e muito brevemente dará a lume uma obra que deverá causar gran- de sensação como sempre tem aconteci- do com as producções d'este eminente professor. Nós aguardamol-a com anciedade co- mo todos que ligam verdadeiro interesse a discussões tão profundas, das quaes re- sulta muitas vezes destruirem-se theo- rias admittidas desde tempos immemo- raveis. Não esqueçamos comtudo que Salo- mão pretende que não ha nada que seja novo debaixo do sol — Nihil sub sole no- vum! Oliveira Júnior. FORMAÇÃO DO AZEITE MS AZEITONAS Quasi por toda a parte foi pequena a funda de azeitona, mas o azeite é de su- perior qualidade, e avultado relativa- mente á quantidade do fructo fabricado. Estes dous factos são a consequência natural da estiagem do anno passado. A mostranqa das Oliveiras foi todavia esperançosa; mas a falta de humidade não deixou crear muita azeitona que ficou em estado de rebolo; e muita outra da que chegou a formar-se, cahiu aos suões abrasadores do agosto, que lhe mirraram o pé. A azeitona porém que pôde vingar até á formação completa encontrou, na sêcca e no calor excessi- vos do anno, condições favoráveis á sua maturação. A maturação das azeitonas é um phe- 74 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA nonoem chimico complexo, que se não está ainda definitivamente estudado em todos 03 seus promenores, deixa-se toda- via separar em períodos distinctos de elaboração, que permittem algumas con- jecturas prováveis, sobre tão importante phenomeno. No primeiro periodo, quando a azei- tona está feita, mas ainda verde-clara e dura, não lia n'ella sombra sequer de azeite, nem tão pouco nas folhas da ar- vore. N'e8te estado a azeitona e as folhas o que contem principalmente é matéria verde — matérias amargas, matérias azo- tadas, e corpos saccharinos (glucose e ma- nite). No segundo periodo, quando a azei- tona começa a pintar e a amollecer, a matéria verde não desapparece, mas ap- parece a seu lado uma outra roxa que ennegrece successivamente. As matérias doces desapparecem, mas augmentam as matérias amargas, e vê-se apparecer pou- co a pouco o azeite. No terceiro periodo, quando a azeito- na amoUeceu de todo e se fez completa- mente negra (a que tem esta cor) a chlo- rophylla existe ainda, mas as matérias amargas diminuiram notavelmente e au- gmentou a quantidade do azeite. Em presença d'estes factos fornecidos pela observação e pela analyse, crê-se naturalmente, que o azeite não se forma de uma só vez da simples conjugação dos elementos carbóne, hydrogenio e oxyge- nio, mas que é o resultado de uma trans- formação successiva, de que a glucose e a manite serão o primeiro termo. Adoptando este modo de vêr, vejamos o que se passa na molécula da glucose para se tornar em molécula de azeite: Molécula de glucose C 12 H 12 Q 12 Molécula de matéria amar- ga tomando por tvpo a molécula da Olivila. ... C 2*? PI i« O i» Ou da Olivina C 28 H 12 q * Molécula de azeite consti- tui da por duas moléculas de margarina e de olci- na C222 H226 O 36 Vê-80 que a molécula da glucose se enriqueceu de carbóne c de hydroge- nio, ou que so empobreceu de oxy génio. Em peso egual a glucose e o azeite téem a seguinte composição elementar: C 40,000 77,300 H 6,667 13,300 0 53,333 9,400 100,000 100,000 Por onde se vê, que em peso egual a glucose tem que duplicar quasi o seu carbóne e o seu hydrogenio, e que per- de quasi -g- do seu oxygenio para ser con- vertida em azeite. N'esta hypothese, o carbóne sendo fornecido pela decomposição do acido carbónico, e o hydrogenio pela de- composição da agua, operadas pela ma- téria verde em presença do calor e da luz, percebe-se que a necessidade d'e3- tes agentes para operar a conversão do assucar em azeite deverá ser muito maior do que a que tem logar para a formação da glucose. Isto explica a razão da conveniência do tempo quente e luminoso no periodo da maturação da azeitona; explicação que subsiste do mesmo modo, se ado- ptarmos a hypothese de que a molécula de glucose se transforma em azeite, não por ganho de carbóne e de hydrogenio, mas por eliminação de oxygenio. Porque sendo o assucar um hydrato de carbó- ne, o oxygenio não pôde ser eliminado d'elle, sem que uma parte da sua agua combinada seja decomposta, e sabe-se que o hydrogenio para se separar do oxygenio exige mais do quádruplo de calor e de luz, do que exige o carbóne para se separar do mesmo corpo. Mas a azeitona não requer só calor e luz para amadurecer, convóm-lhe egual- mente um tempo sêcco. A razão chimica d'esta segunda con- dição comprchender-se-ha, sabendo-se que a agua que foi necessária até á formação da azeitona, entre outros motivos para formar a chlorophylla, o assucar e a ma- nite, tornar-se-ha em uma causa perma- nente de sustentação d'e3tes corpos, im- possibilitando a sua transformação ulte- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 75 rior, se ella não diminuir. Evidentemen- te, se a molécula de assucar tiver que largar oxygenio, separando-se primeiro a molécula de agua que o ha-de ceder, uma outra molécula de agua que exista livre tomará n'eã3e mesmo acto o logar da primeira, e restabelecerá a molécula de assucar no próprio momento em que se ensaiava a sua transformação. É como se um liquido, contendo um sal em dissolução que estivesse princi- piando a depor por evaporação, fosse par a par com essa deposição recebendo uma dose de agua egual á evaporada. A quantidade do liquido permaneceria con- stante, e o sal não crystallisaria nunca. As matérias amargas que parecem ser n'este caso um estado intermédio ao as- sucar e ao azeite, são hoje consideradas pelos chimicos como combinações do as- sucar com um outro corpo menos oxy- genado que este. As (jlucosides, como se chama a estas combinações, téem bastante analogia com os etheres compostos, eliminando mais ou menos moléculas de agua, quando os dous corpos se unem, e absorvendo-a quando se separam. Ora é evidente que a necessidade da diminuição da agua co- meça já n'esta primeira metamorphose do assucar; porque se a agua persistisse no fructo na mesma quantidade ella res- tabeleceria a individualidade d'aquelles corpos. A conversão das matérias amargas em óleo ou em corpos gordos exige ainda mais a diminuição da agua. Basta com- parar a fórmula do assucar com a das matérias amargas, e as d'estas com a do azeite para se ver que n'esta segunda transição ha muito maior eliminação de oxygenio, e portanto maior dispensa da agua preexistente. Com eíFeito, se a agua abunda na Oli- veira no periodo d'esta ultima transfor- mação, a azeitona funde muito pouco azeite, e o que dá mais é agua russa, carregada como se sabe de matérias ne- gras e amargas. O tempo chuvoso na época final da maturação da azeitona exerce na funda do azeite notável desperdício. É um fa- cto prático, que em muitos annos se ve- rifica e já assignalado por Plinio, quan- do a este respeito escreveu na sua «His- toria Natural» : Quum sitienti imòres copiosi accessere vitiatur oleum in amurca. Ha nas Oliveiras uma doença denomi- nada gonima, que consiste na exudação pelas fendas da casca de uma matéria amarga, que depois de sêcca toma a ap- parencia de uma gomma resina : é a oli- vina. Esta excreção dá sobretudo nos oli- vedos mais viçosos, e nos legares menos soalheiros e menos sêccos. Para mim es- ta doença revela uma sobra de matérias amargas, que um excesso de humidade e a falta de calor sufficiente não permitti- ram que chegasse á sua final transfor- mação. A arvore descarrega-se do que foi de menos no fructo. A perda em azei- te traduz-se então em aborto mórbido de excreção. Estes dous factos demonstram como a comparência de um excesso de humi- dade nas Oliveiras e a falta de calor luminoso, se oppõe á transubstanciação das matérias amargas em óleo. Outros factos certificam que estas mes- mas duas causas chegam até a operar verdadeiros retrocessos na elaboração do azeite, seja fazendo voltar as glucosi- dades ao estado primário de glucose, se- ja mesmo reduzindo o azeite já formado no fructo aos seus estados precedentes. Ambos estes factos verificam-se clara- mente no preparo que se faz á azeitona denominado curtimenta, e que consiste simplesmente em a golpear e deixar por alguns dias em maceração em agua um pouco salgada. A azeitona perde a maior parte das suas matérias amargas, fazen- do-se macia, mais doce e menos oleosa. A hydratação, e a acção do sal, análoga á de um alcali, n'este caso, fizeram des- dobrar em glucose livre uma parte das giucosides amargas. Isto mesmo se pas- sa na curtimenta dos tremoços, das lan- des e de outras sementes amargas. E é emfim também o que tem logar em todas as sementes no acto da germi- nação, cujas matérias amargas, oleosas e amylaceas se convertem em glucose li- vre. O facto da retrogradação do azeite ao estado de matéria amarga e de glucose 76 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA succede não poucas vezes, estando a azei- tona ainda na arvore. Não é de hoje nem de liontcm a observação, de que a azeitona de duas arvores, uma colhida antes das chuvas do solesticio do in- verno, e a outra apanhada depois, ren- dem em peso egual diífcrcnte funda de azeite, sendo a d'csta ultima ás vezes menor de imi quarto a um terço da pri- meira. Em conclusão direi, que se a Oliveira requer humidade no período da formação do fructo, na maturação d'este precisa mais que tudo de calor luminoso e de uma certa seccura no solo e no ar. To- dos os productos vegetaes ricos em car- bóne e em hydrogenio são inflamma- veis, dão cbamma viva de luz e de ca- lor, a mesma luz e o mesmo calor que demandaram ao astro do dia para se for- marem na planta. Diz-se que a hulha é um repositório do sol, que como elle nos dá o calor, a luz branca e diversas cores. Pois as sub- stancias gordas, as resinas^ as essências vegetaes que emanam da mesma origem, são uma espécie de hulha, não aposenta- da nas entranhas da teiTa, mas em cir- culação de metamorphoses no commercio da vida orgânica. Queixámo-nos da prolongada estiagem do anno passado, que nos deu pouca azei- tona. Mas a que vingou de algum modo compensou na qualidade o fraco medrio da safra. Não ha mal nem bem absolutos. E muitas vezes, à quelque ckose malheur est hon. J. I. Ferreira Lapa. GHRONIGA HORTIGOLO-AGRICOLA Ha tempos que temos em nosso po- der uma carta do snr. George A. Wheel- house, de Lisboa, e á qual não temos dado publicidade por escassez de espaço, e que hoje fazemos. Eis como se expri- me o nosso collega e amigo: iSío anno próximo passado fiz uma pe- quena digressão ao Minlio, deinorando-me al- guns dias na cidade do Porto. Sempre tinha feito ideia de que os jardins públicos no Porto deviam ser superiores aos de Lisboa, porque aquella cidade está debaixo de um clima muito auspicioso á vegetação. Fiquei porém desapon- tado. Os jardins públicos d'essa cidade estão co- mo que abandonados, e se existem algumas plantas, taes como Abies, Azáleas, Camdlias, Acácias, etc, é devido ao clima e ao terreno. O Jardim do Palácio de Crystal, que podia ser um lindo jardim, e que está muito bem de- lineado, tendo uma vista encantadora sobre a cidade e rio Douro até á Foz, se não fossem al- gumas plantas exóticas que ainda alli existem, já não se llie podia chamar jardim. No Porto quem quizer ver algumas plantas raras e lindas, tem de procurar os particulares, ou então o cemitério d'Agramonte que está es- meradamente tractado, e com toda a decência. Haverá poucos na Europa que o egualem. En- contra-se alli uma linda collecçào de plantas exóticas, que mostram claramente de quanto é susceptível o clima do Porto, para que esta ci- dade possa ter os maia lindos jardins do paiz. Também procurei ver as grandes arvores de Maf/7ioli" (/raiidijlora, de que um livro allemão de viagens tanto falia, e diz qu(! é a única pra- ça da Europa aonde existem Magnólias d'aquel- las dimensões, mas não as encontrei. Disseram- me que tinham sido mandadas cortar por or- dem da camará municipal, pelo motivo de tira- rem a vista á casa da camará. Forte vandalis- mo ! George A. Wueelhouse. A carta do nosso amigo, comquanto escripta sobre o joelho, revela bem o pe- sar que o dominava por vêr o que a hor- ticultura é aos olhos da ex."^* camará municipal d'esta invicta cidade. No Jardim da Cordoaria não se deve fallar porque se uma vez foi jardim — na epocha em que o snr. visconde de Villar Allen era camarista e tinha a seu cargo este pelouro — hoje não é mais do que um terreno em que tudo está em desordem; um verdadeiro pêle-mêle. Quem mandou substituir no Jardim da Cordoaria as formosas Tílias pela Acá- cia melanoxylon, arvore imprópria para formar avenidas de passeios públicos, já porque a sua folhagem não é fresca, já porque a sua cor escura torna a paisa- gem sombria e melancólica e já porque, no caso de se quererem substituir as ar- vores existentes — o que comtudo só por desenfado ou para proteger algum horti- cultor se poderia fazer — havia muitas ou- tras que se accommodavam melhor ao lo- cal, taes como as Grevílleas robusta, as Magnólias, os Aesculus hippocastanum, I as Fersea indica, a Acácia Julibri- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 77 zin e outras suas congéneres encantado- ras. No jardim de S. Lazaro não se falia egualmente, porque, além de um soldado da municipal que está a uma das portas e de um guarda que faz alli a policia, nada mais SC encontra que seja digno de men- ção a não ser a extraordinária limpeza das ruas. Sahindo dos jardins e passando pelas ruas o que vemos? O santos da corte do ceu, acudi-nos ! O sociedades protectoras dos animaes e das plantas, vinde aqui protestar contra as barbaridades do podão municipal. Áquelle maldito podão nada lhe escapa ! As suas façanhas já se revelaram ha dous, ha três, ha quatro, ha. . . annos, mas d'esta feita lá vae tudo quanto Mar- tha fiou. O podão municipal não respeita na- da ; o podão municipal é furibundo ; o podão municipal é sacrílego. Todas as plantações da cidade, que tan- to tempo levaram a formar-se, foram agora mutiladas, sacrificadas ao capricho d'a- quelle insensato e irracional instrumento. E havemos de ver a pé quedo estes vândalos ? Havemos tamsómente de mur- murar em familia os execrandos actos d'eâte3 Troppmans da natureza vegetal? Não ! É d'aqui, bem do alto das co- lumnas d'este jornal, que levantamos o nosso protesto ; não que possamos agora remediar o mal, mas para que se saiba que ha alguém que levanta a voz quan- do se praticam taes desatinos. Até as ar- vores da praça dos Voluntários da Rai- nha foram arrancadas ! Nem estas, que commemoravam a ultima visita de Sua Magestade a Rainha a snr.* D. Maria II, ao Porto, em 1852, foram respeitadas pe- io serrote municipal ! N'outro paiz qualquer, homens que praticassem similhantes desatinos, eram processados; aqui apenas provocam a irrisão publica. Pergunta ingenuamente o snr. George Wheelhouse pelas Magnólias da praça de D. Pedro, em que falia o tal allemão. Pobres Magnólias! eram indignas de defrontar com o município, e zás — abaixo com ellas. Nós endereçamos á pessoa a cargo de quem está a jardinagem o seguinte li- songeiro bilhete de visita, extractado da carta do snr. Wheelhouse : «No Porto quem quizer vêr algumas plantas raras tem d'ir ao cemitério de Agramente.» O snr. Wheelhouse faz justiça a quem a deve ter. Não que no cemitério d' Agra- mente está lá um homem intelligente e laborioso; um homem que não se vexa de pedir conselho quando não confia com- pletamente na sua pessoa ; um homem de muito gosto — o reverendo padre Ale- xandre Pinto Pinheiro. E assim terminamos este assumpto, de que desejáramos não nos occuparmos mais, mas, em consciência, o «Jornal de Hor- ticultura Pratica», órgão da horticultura portugueza, não podia nem devia ficar si- lencioso em face de tão inesperadas bar- baridades e de factos que só denotam uma crassa ignorância em cousas hortícolas. — Acabamos de vêr n'um artigo pu- blicado no numero de novembro do Bo- letim da Sociedade de Aclimação, sobre o desenvolvimento da cultura dos Euca- lyptus, que nas plantações feitas nos ar- rabaldes d'i\.rgel, Mr. Ramel apresenta como uma feliz innovação a introducção do Eucalyptus colossea, plantado em gran- de numero com as outras espécies nos massiços. Egual em elegância ás outras espécie? do mesmo género, o colossea pa- rece levar vantagem a todas ellas, e em particular sobre o glohulus pela sua rus- ticidade e resistência ás variantes da tem- peratura. O seu desenvolvimento é quasi tão rápido como o d'aquelle, e os seus períodos de vegetação são mais accentua- dos. Resiste perfeitamente, quer seja plan- tado no inverno, ou na primavera. Pro- mette ás paisagens da Argélia uma de- coração imponente. E mais uma conquista feita para a cultura florestal e mais uma arvore pre- ciosa para o nosso paiz. Já por outras vezes temos feito men- ção d'esta espécie e esperamos que as pessoas que estão organisando mattas não sejam exclusivistas da espécie glohulus. Praticamente fallando, ainda não co- nhecemos o Eucalyptus colossea, mas sa- bemos, pelo que lá fora se tem escripto, que é um dos que produz melhor ma- deira. 78 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA — A junta geral do districto de Bra- gança, resolveu propor a creação do le- gar de agromo official, votando 03 meios neceriísarioá para o seu ordenado e para a creaçào de uma estação experimen- tal. — Segundo uma noticia enviada á As- sociação Americana para o progresso da Scieucia pelo professor William H. Bre- ■vver de New-Haven, a Hora dos Estados- Uuidos conta para cima de 800 espécies lenhosas e mais de 300 arvores. N'este ultimo numero, cerca de 2Õ0 espécies são bastante vulgares: approximadamen- te 120 sào de grande porte, 20 attingom 100 pés, 12 passam de 200 pés e entre ellas ha talvez õ ou 6 que chegam a 300 pés inglezes. — No «Campeão das Províncias» le- mos o seguinte: Pessoa que se interessa muito polo clcsen- volvimento de tudo o que pilde iuteressar á nossa agricultura, quer que leuibreuios aos nos- sos agrónomos a conveniência de semearem, de preferencia a outro qualquer, o Feijão preto. Es- ta especialidade está sendo muito procurada para o Brazil, onde alcança um preço relativa- mente grande — porque o que chega ao Rio das dittercntes procedências nacionaes, não dura; corta-o o gorgullio, o que nào acontece ao Fei- jào portuguez, que resiste por muito tempo á acçào dos vermes. Téein vindo ordens para compras em grande quantidade, e nào ha que comprar, porque aquella especialidade é pouco usada aqui. U que apparece vende-se por mui- to maior preço que o outro, e esta circumstau- cia, junta á de que elleijroduz na terra mais do que qualquer outro, nào é para ser desprezada por aquelles que vivem da agricultura. — É realmente para causar admira- ção o desenvolvimento que a industria hortícola toma em IngUiterra, de auno para anno, apesar do clima ser rebelde á maior parte das plantas que entre nós prosperam maravilhosamente ao ar livre, ou quando muito se satisfazem com um simples abrigo. Esto facto só tem uma explicação pouco lisongeira para n(')s, mas que se nos afigura ser a verda- deira: é o atrazo de educação em que estamos. O nosso espirito não é guia- do, pelas pessoas a quem a educação é confiada, para o mundo do desconheci- do, para a investigação. Ensinam um pouco do portuguez e algum francez c os pães acham-se satisfeitos : se Ihei fal- lam em historia natural, ai ! isso é uma heresia que merece todos os castigos do ceu. Na Rússia, por exemplo, onde é preci- so muito cuidado para o frio não gelar o nariz da gente, vemos nos salões, nos gabinetes d'e3tudo, nas salas de jantar, nos búudoirs emfim, as mais delicadas plantas. Parece que anda alli o dedo ma- gico da Providencia, mas enganamo-nos, porque é simplesmente o dedo gentil, delicado e rosadinho d'uma formosa mos- cowita. Em Inglaterra, n'e3sa ilha que é um verdadeiro mundo, onde parece que nem sequer ha tempo para pensar em assum- ptos que não sejam puramente commer- ciaes, também alli vemos Horescer as ar- tes e a horticultura que é de todas a mais encantadora, a mais cheia de attra- ctivos. o entrar-sc n'uma sala em que se pos- sa facilmente deletrear os assíduos cuida- dos de uma mão experiente, causa-nos, a nós que estamos habituados a vêr nas salas pouco mais do que alguns quadros chromolithographados representando N. Senhora partindo para o Egypto com a sua burrinha, ou o Senhor das Chagas com um olhar que faz commiseração — causa-nos, iamos dizendo, uma surpre- za tão agradável quanto indescriptivel. N'esse paiz nevoento, cm que ao meio dia é preciso accender o candelabro; n'es3e paiz frigidissimo, em que poucos são os mezes em que se pode largar o sobretu- do e o confortável rug ; n'esse paiz, em- hm, em que se tem a luctar contra uma serie de condições que são sobre- modo perniciosas aos vegetaes, vemos que a horticultura é o passatempo dile- cto do burguez como do aristocrata, da mulher do povo como da dama da corte. As exposições multiplicam-se alli to- dos os annos; os concui'sos agrícolas au- gmentam de dia para dia ; as associações são innumeraveis e não poupam exfor- ços para disseminar a paixão pelos ve- getaes, e os particulares não se esquivam a aproveitar todos os ensejes que se pro- porcionem para propagar, vulgarisar tal ou tal planta, para melhorar tal ou tal e-ipecie, para aperfeiçoar a sua cultura, etc, etc. Os horticultores que entre nós se ar- JORNAL DE IIOUTICULTURA PRATICA 79 receiam de fazer uma pequena despeza que tenha por fim tornar conhecida uma planta qualquer, os nossos horticultores que entendem que se deve colher sem semear, os nossos horticultores que vi- ram no «Jornal de Horticultura Prati- ca» um phantasma que os ia lançar na miséria (!!!) porquanto ensinava a toda a gente indistinctamente os processos mais aperfeiçoados de multiplicação e cultu- ra dos vegetaes, que até alli eram ape- nas do dominio de meia dúzia de mono- polistas, os nossos horticultores, repeti- mos, como prova da sua illuítração e se por ventura querem operar a desejada metamorphose no espirito do publico, téem de desviar-se da senda trilhada até aqui. EUes devem ser os próprios a en- sinar e a vulgarisar os conhecimentos colhidos no seu longo tirocínio, devem distribuir gratuitamente certas plantas que pouco valor intrínseco teem, promo- ver exposições, já que nào ha quem as promova, e até distribuir prémios aos amadores. É indispensável semear para colher ; é mister trabalharmos à outrance ', é neces- sário fazer um struggle for Hfe; e é pre- ciso não esquecer que o nosso poeta já dizia : Receberá o fértil e abundante Da terra o lavrador se n'ella cansa. E isto O que vemos fazer lá fora. A casa Cárter de Londres distribuo todos 03 annos numerosos prémios e a isso de- ve talvez o ser o primeiro estabelecimen- to de sementes d'aquella segunda Baby- lonia. Ha dias recebemos o seu catalogo, verdadeiro Vacle mecum, e encontramos um annuncio, por via do qual se torna publico que os proprietários da casa Cár- ter offerecem uma taça no valor de 50 guineos (fig. 15) ao proprietário que, na exposição promovida pelo Royal Horti- cultural Society e que deve ter logar no dia 7 de julho próximo, apresentar 24 pratos de diíferentes vegetaes, e entre elles 03 seguintes : 2 selamins da Ervilha Cárteres Karly Premium Gem. 2 » da Ervilha James' s Prolijic. 2 » da Ervilha G. F. Wilson. 2 selamins do Feijão Hardys Pedigree Windsor. 2 » do Feijão Cárteres White Ad- vancer. 2 » do Feijão Cárteres Chamjpion Runner. 2 » áa,E'vilha Ca7'ter's Comman- der-in-Chief. 2 » àa. E'vilha Cárteres New Mam- moth Long-jpod. A taça que a casa Cárter ofiferece é uma verdadeira obra d'arte, como os lei- tores poderão vêr pela gravura que acom- panha estas linhas. Fig. 15 — Taça Cárter Os snrs. James Cárter & C.° téem prestado valiosos serviços á horticultura, não só estimulando os amadores por meio das recompensas que amiudadas vezes oíferecem, mas também lançando todos os annos no mercado novas variedades de vegetaes por preços accessiveis a to- das as bolsas, apesar de haverem custa- do piúmitivamente sommas fabulosas. Era justamente o que nós desejára- mos vêr fazer aos nossos horticultores. 8Q JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA — Na ultima exposição que teve lo- gar em Liverpool cxpôz Mr. Cromwell, jardineiro de Mr. Th. Moss, um exem- plar do Adiantuni Farhyense, com seis pés de diâmetro. Este Fdo, que c decerto o mais bello do género, já é cultivado ha dous ou três annos no nosso paiz, e no estabelecimen- to do snr. José Marques Loureiro temos visto alguns excmphires que teem para cima de O^^^õO de diâmetro. E uma planta muito recommendavel. — Eis, segundo o «Cultivador», a ma- neira de se preparar uma composição re- sinosa para os enxertos : Derrcte-se lentamente a calor brando, 450 grammas de resina ordinária. Logo que esteja derretida ajunta-se-llie 455 grammas de espiri- to de vinlio •, mexe-se e passa-se para garrafas bem rolhadas. Este betume pôde applicar-se era todo o tempo 5 nào prejudica nem a casca das arvores nem os rebentos novos e nào penetra na fenda. Uma só camada é sufficiente para proteger os enxertos e resguardar as feridas de madeiras novas da acçào do ar ; de modo que, por meio d'esta composição, póde-se cortar os ramos na força do verào. Sécca promptamcnte e forma uma capa delgada e adherente, que nem se der- rete nem estala. — A Sociedade Pomologica de Fran- ça, n'uma das suas ultimas sessões, esco- lheu as seguintes fructas que considerou como dignas de merecer a attenção dos horticultores : Cerejas — Bigarreau Marjólet, Gar ci- ne, Walpiirgis. Framboezas — Jaune de Hollande, Su- crée de Metz. Pecegos — Precoce Béatrice, Precoce de Hale, Precoce Rivers. Peras — André Desportes, [Madame Bon- nefond. Maçãs — Adam's Bearmain. Uvas — Chasselas des Bouches du Rhô- ne, Madeleine Angevine, Musqué de Mar- seille, Souvenir du Congrès, /Surin jaune, Surin rose. — Em Inglaterra estão-se fazendo pre- parativos para uma nova expedição ao polo do norte. A sciencia em geral devo ver esta de- liberação com grande prazer, e espere- mos que a botânica vá condignamente representada no pessoal d'c3ta perigosis- eima expedição. — Com a devida vénia transcrevemos do oCommercio do Porto» o artigo do snr. Ferreira Lapa, que tracta das Oli- veiras e que vae inserido no corpo do jornal. — O governo italiano prohibiu a im- portação de plantas, sob pretexto de que poderiam ser meio de transporte para o Phylloxera vastatrix. Achamos curiosa esta maneira de es- tabelecer o cordão sanitário. — Sob a denominação de Prunus hife- ru, descreve Mr. Carriòre, na «Revue Horticole», uma notável qualidade de Ameixieira que floresce duas vezes no anno. A arvore é vigorosa e a flor é grande. Pelo meado de maio, quando a fructa co- meça a formar-se, floresce outra vez, A primeira camada de fructa colhe-se no principio d'agosto. — Foi- nos doloroso saber que havia sido cortado o fio d'uma vida preciosa, Falleceu em Londres a esposa do dr. Hooker, director do Jardim Botânico de Kew. Esta senhora era filha do professor Henslow, e reunia ás apreciáveis quali- dades de ser muito amável e modestíssi- ma, o ter um talento peregrino. Coad- juvava o seu marido nos trabalhos de que estava encarregado, e prestou- lhe bastante auxilio na redacção do diário das suas viagens ao Himalaya. O ultimo trabalho de Mrs. Hooker foi a traducção para o inglez do excel- lente tractado de botânica de Maout e, Decaisne. O mundo scientifico perdeu uma sa- cerdotisa que lhe dava honra, e o dr» Hooker uma esposa como todos os ho- mens que se occupam das sciencias ou das artes desejaram ter. Como não devem ser agradáveis aquel- les colloquios entre marido e esposa cm que cada um por seu lado envida todos os exforços para realisar uma descober- ta, para se fazerem reciprocas surpre- zas ! A mulher sem instrucção é o que mais se approxima do mármore bruto. E uma mulher. . . et puis voilà tout. J. D. DE Oliveira Júnior. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 81 FIGUEIRA VIOLETA É d'e3ta magnifica variedade que va- mos fallar, pois nada ha melhor n'este género. Não é por informações que as- sim falíamos, mas sim porque a temos visto fructificar no nosso estabelecimento. Não sabemos a sua origem, se veio do estrangeiro ou se é de sementeira portu- gueza. O que é verdade é que em 1844, epocha em que viemos para este estabe- lecimento, encontramos uma pequena planta em um vaso já velho e quebrado, parecendo estar alli ha muitos annos. Não era sustentada pela rega, mas sim pelas raizes que sahiam pelo fundo do vaso. Como nos fosse preciso fazer obras no logar em que ella estava, foi trans- plantada, e o seu desenvolvimento foi tal que todos os annos os ventos lhe partiam Fig. 16 — ^Figo violeta. 03 ramos ; porém tractamos de lhe coUo- car tutores e conseguimos que fructifi- casse. Tivemos occasião de saborear e apreciar as suas boas qualidades. Os fru- ctos estavam maduros em fins de junho e já tinha outros nascidos ainda peque- níssimos, porém em setembro estavam maduros e eram magníficos. Portanto dá duas colheitas e os fructos são muito dis- Vol. IV.— 1875 tinctos. Os primeiros são compridos e muito bojudos, cor de violeta por fora e por dentro ; os segundos são grandes mas redondos e de cor branca por fora. Quer os primeiros, quer os segundos, são mui- to doce? e muito succosos. Finalmente é uma variedade de primeira ordem e todos os proprietários a devem possuir. J. Marques Loureiro. N." 5— Maio 8g JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA RÓTULOS MS ARVORES FRUGTIFERAS Na occasião em que se fazem as plan- tações é necessário que haja o maior cui- dado cm pôr cm todas as arvores fructi- feras um rotulo com o nome do fructo, podendo a este esclarecimento juntar-se a indicação da epocha da niaduração. Comquanto os horticultores usem ge- ralmente nos seus estabelecimentos nú- meros para designar as variedades, não deve fazer o mesmo o amador e portanto convém que estes adoptem o systema de rótulos que lhes pareça mais durável. Quanto a nós, os melhores são os de zin- co, nos quaes se deve escrever com tin- ta indelével. Além d'estes rótulos é bom que haja outros mais pequenos, com um numero aberto a punção, que correspon- da á numeração de um catalogo que to- do o pomicultor deve possuir. Estando as plantas assim designadas, aproveitará o proprietário e seus empre- gados, porque ficarão aptos a distinguir promptamente o hotn do mau, o que mui- tos pomicultores, pela confusão em que téem os seus pomares, não estão habili- tados a conhecer com presteza. Oliveira Júnior. os ADUBOS GHIMICOS São maravilhosos os resultados obtidos com estes adubos nas culturas de 1868. Segundo um folheto, que temos pre- sente, e que ultimamente publicou o snr. Georges Ville, só com relação á cultura da Beterraba pôde este distincto chimi- co colligir os resultados de 190 culturas, que em harmonia com a sua producção classificou da seguinte maneira: Kendimento por hectare 1.* cathegoria 70:000 kilog. e mais 2.» » 60:000 a 70:000 3.» » 50:000 » 60:000 4.* D 40:000 » 50:000 5.» 9 30:000 ^) 40:000 6.* D 20:000 )) 30:000 Em seguida o snr. Ville publica o no- me de todos 03 agricultores, localidade.; em que foram feitas as experiências, ren- dimento por hectare com os adubos chi- micos, com o estrume de granja, e com a terra sem nenhum adubo. Das 190 experiências comparativas 170 são a favor dos adubos chimicos e 20 unicamente a favor do estrume de granja. Confundindo todos os rendimentos em uma média única resulta que 1:326 kilog. de adubos chimicos produziram 51:948 kilog. de Beterrabas por hecta- re, emquanto que 50:650 de estrume de granja produziram so- mente 41:811 kilog. Excedente médio a favor dos chimicos 10:137 » Em 1865 dizia o snr. Ville que com uma estrumada de adubos chimicos obti- nha-se facilmente de 20 a 30:000 kilog. de Batatas por hectare (300 a 400 he- ctolitros). Os resultados da grande cultura con- firmaram a asserção do snr. Ville, por- que das 85 culturas colligidas Rendimento por hectare Kilog. Hectol. 17 produziram em média 38:271 588 16 » » 24:288 373 26 » » 17:266 265 24 » » 11:119 171 Média geral por hectare 22:736 kilog. (350 hectolitros por hectare), empregan- do 1:090 kilog. de adubo completo. Dividindo todas as colheitas em duas cathegorias, as boas e as más, temos que de quatro culturas três dão uma média de 26:608 kilog. (409 hectol.), a quarta é de 11:119 kilog. (171 hectol.), três producções boas contra uma má. Para mostrar até á evidencia a supe- rioridade dos adubos chimicos sobre o estrume de granja, publica ainda o snr. Ville, do mesmo modo que para a Beter- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 83 raha, a lista de todos os agricultores que fizeram a experiência. Deduzindo a média geral dos rendi- mentos para as quatro series, temos : Por hectare Kilog. Hectol. 1:090 kilog. de adubos chimicos produziram 22:736 3õO 39:946 de estrume de granja 18:559 285 Excedente a favor do adu- bo chimico 4:177 65 No folheto que temos presente tam- bém o snr. Ville indica a formula do adubo chimico mais conveniente para a cultura da Batata e a influencia que o mesmo adubo tem não só na melhor qua- lidade dos tubérculos, como também na menor intensidade da doença ou antes na sua ausência completa. Como já n'este jornal e em um artigo especial tractamos da influencia dos adu- bos chimicos sobre a producçào da Ba~ tatá e sobre a sua influencia para com- bater o mal que na maior parte dos an- nos invade esta utilissima cultura, é a razão porque agora não transcrevemos o que se refere a este assumpto, mesmo porque todos os factos ultimamente ob- servados estão perfeitamente de accor- do com o que então escrevemos. Ao tempo da publicação d'este folhe- to, e com relação á cultura do trigo, ain- da o snr. Ville não tinha recebido um numero suffi ciente de resultados para so- bre elles formular a sua opinião, mas hoje, segundo uma carta que o diatincto chimico escreveu ao snr. Deligny e que este cavalheiro teve a bondade de nos confiar, vemos que o numero das expe- riências é de 138, as quaes se resumem n'estes dous factos: hectol. 921 kilog. de adubos chimicos produziram em média 29, 73 de grão por hectare, emquan- to que com 40:203 kilog. de estrume de granja, a colheita foi uni- camente 21, 06 o que em numero redondo dá um exce- dente de 8 hectol. ^/a de grão por hecta- re a favor do adubo chimico. Mas isto não é tudo, accrescenta o snr. Ville. Se decompozermos estes 138 re- sultados a fim de os compararmos com as variantes da colheita, tanto com o adubo chimico como com o estrume de granja, temos : Colheita por hectare Adubos Estrume chimicos de grauja ] lectol. hectol. 10 vezes 46, 50 39, 22 12 » 35, 90 26, 84 20 » 31, 20 19, 31 22 » 27, 42 14, 50 26 » 22, 44 14, 50 38 » 15, 00 12, 03 O que quer dizer que sobre quatro culturas, a colheita foi: Colheita por hectare Adubos Estrume chimicos de granja hectol. hectol. 2 vezes de 35, 25 25, 00 1 » 22, 44 14, 50 1 » 15, 00 12, 03 Por consequência, com os adubos chi- micos ha a probabilidade de obter so- bre quatro culturas, duas vezes uma co- lheita intensiva, uma vez uma boa co- lheita média, e uma vez uma colheita medíocre ; emquanto que com o estrume de granja obtem-se duas colheitas mé- dias e duas medíocres. Eis aqui, a largos traços, os resulta- dos importantíssimos das culturas de 1868, resultados tanto mais para apre- ciar por isso que foram obtidos por um grande numero de agricultores em solos e climas differentes. E pelo grande numero de ensaios e pela publicidade dos seus resultados, que a theoria dos adubos chimicos ha de pro- var á evidencia e em pouco tempo, se- gundo estamos convencidos, como a pro- ducção agrícola pôde augmentar vinte, trinta e cincoenta por cento, e em mui- tos casos duplicar e triplicar. São estas estatísticas da producção pu- blicadas todos os annos que hão de inci- tar ainda os mais relapsos para tudo 84 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA quanto é progresso agrícola, a ensaiar os adubos chimicos, a adoptal-os com enthu- siasmo, e a proclamarem que ao distin- cto chimico o snr. Georges Ville se deve a solução de uma das mais importantes questões do século XIX, a do augmento da producção agrícola. O ministro da agricultura era França, dirigindo-se ultimamente aos directores das granjas escolares, dizia : «Ninguém ignora as experiências que se fazem ha bastantes annos, para co- nhecer exactamente a natureza dos agen- tes da fertilidade do solo, a que se pôde recorrer, para supprir a insufficiencia no- tória dos recursos da agricultura em es- trumes. É pois de toda a conveniência que as granjas escolares não se conser- vem estranhas ao movimento que pre- occupa a opinião publica, e cujas conse- quências devem ser da maior importân- cia, se 03 ensaios, a que se procede por toda a parte, vierem consagrar as no- vas theorias, a que se referem.» O ministro da instrucção publica, em harmonia com esta opinião, n'uma cir- cular que dirigiu aos prefeitos disse : «Os professores de instrucção prima- ria da circumscripção de Thionville, dando a este respeito um excellente exemplo, fizeram sobre os adubos chimi- cos perto de quarenta experiências, que fixaram a attenção do comicio da mes- ma circumscripção. «Um documento recente, publicado por este comicio, prova que 1:200 kilog. de adubos chimicos, custando 360 fran- cos, produziram em média 54:222 kilog. àe Beterrabas por hectare, emquanto que 72:090 kilog. de estrume de granja, ava- liado nos mesmos 360 francos (5 francos cada 1:000 kilog. !), produziram somen- te 48:888 kilog. «O que fizeram os professores de ins- trucção primaria da circumscripção de Thionville outros o devem ensaiar, c por isso é necessário annexar um campo de experiências a todas as escolas primarias do império.» As escolas regionacs, sociedades de agricultura e comícios agrícolas da Fran- ça também não ficam indlfferentes ás no- vas ideias agrícolas, por isso que todas mais ou menos tractam de ensaiar o novo processo, a fim de com a auctoridade que lhes dá a experiência e a sua posição of- ficial, poderem garantir toda a verdade da doutrina do snr. Georges Ville. A par d'esta tendência manifesta dos espíritos para as novas ideias agrícolas que se diíFundem em França, e que já invadem a Bélgica e a AUemanha, en- contra-se entre nós a mais completa in- diíFerença; emquanto nos outros paizes todos desejam certificar-se do que ha de verdadeiro na nova theoria dos adubos chimicos, em Portugal não se faz o mais pequeno ensaio ; e, se a falta é grande com relação aos particulares, quanto maior não é com relação ao governo, que tendo uma granja de ensino á sua dispo- sição, ainda não ordenou que n'ella se fi- zesse a menor tentativa! Se a granja de ensino prático não ser- ve para este fim, então de pouco serve. Talvez seja por economia que se não fazem as experiências ; mas, n'este caso, a maior de todas as economias seria ris- cal-a do orçamento. Discordamos completamente da mo- derna escola das economias por conside- rarmos muitas d'estas como verdadeiros esbanjamentos. Não se previne só com economias a decadência de um paiz, é preciso conjuntamente com aquellas pro- mover a prosperidade de todas as indus- trias, facilitando-lhes os meios de circu- lação aos seus productos, e destruindo- Ihes todos os obstáculos, a fim de que pos- sam concorrer nos mercados com os pro- ductos similares das outras nações. Ora de todas as industrias não é por certo a agricultura a que teria menos a recla- mar da acção do governo, e não com o fim de protecção, mas sim no sentido de lhe facilitar o seu máximo progresso e desenvolvimento. O snr. Deligny, um dos primeiros ces- sionários da mina de S. Domingos, e ho- je proprietário da fabrica de productos chimicos estabelecida na Povoa, impres- sionado pelas experiências por elle pre- senciadas no campo de Vincennes, e a quem o snr. Georges Ville envia todos 03 annos os resultados dos seus traba- lhos, resolveu, haverá um anno, produ- zir na sua fabrica um dos principaes ele- mentos de adubo completo, o phosphato JORNAL DE HORTICULTUEA PRATICA 85 acido de cal, mas, infelizmente, pouco, ou antes diremos nenhum, tem sido ven- dido para consummo do paiz. Hoje, porém, attendendo ao pedido de alguns dos nossos agricultores que leram ultimamente o opúsculo publicado pelo snr. Ville — «L'Ecole des engrais chimi- ques, premiéres notions des agents de fertiíité», vae-se proceder na fabrica do snr. Deligny á producção de adubo com- pleto, visto ser este o que a maior par- te das nossas terras, por depauperadas, reclamam em primeiro logar. Sem podermos desde já affiançar se o snr. Deligny levará por diante a ideia que lhe suscitámos de estabelecer um pe- queno campo de experiências, que não ficasse muito distante de Lisboa e nas proximidades do caminho de ferro, a fim de com pouca despeza e facilidade po- der ser inspeccionado por todos os agri- cultores, estamos convencidos que era este o meio mais efficaz de promover a adopção dos adubos chimicos entre nós, em pouco tempo e sem grande relutân- cia. O campo de experiências considera- mol-o de grande alcance, não só pela muita utilidade que d'elle podiam tirar 03 que acreditam no progresso das cou- sas agricolas, mas também como um bom incremento para a nova industria dos adubos chimicos. O campo de experiências seria ainda uma excellente lição dada aos rotinei- ros. M. DE Andrade. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE AS AZÁLEAS, KALMIAS E RHODODENDROIÍS Ha muitos annos que temos o desgos- to de ver morrer milhares d'estas plan- tas. Temos feito as plantações de difí'e- rentes maneiras, dando-lhes o terreno que ellas exigem, ora á sombra, ora ao sol. Em julho e agosto eram atacadas de um pequeno insecto nas folhas, que as tornava negras, cahindo todas, e a sua morte era certa. Tractamos de lhes dar alguns banhos com agua de sabão, quas- sia, etc, que se costuma applicar para a destruição d'eãtes insectos ; porém na- da se aproveitou, porque as plantas mor- reram do mesmo modo; mas agora pen- samos haver descoberto a causa da sua morte. Em fevereiro de 1873 mandamos pa- ra os viveiros onde cultivamos as fru- cteiras, 50 Azáleas e 50 e tantos Rhodo- dendrons, para vêr se alli conseguiamos a sua cultura. Na occasião da rebenta- ção estavam pomposos, mas isto não nos admirou, porque nos acontecia o mesmo no nosso estabelecimento das Virtudes até julho. Chegada a occasião em que a morte era como que certa, vimos perecer to- das as que tinham ficado no estabeleci- mento, ao passo que as que tinham ido para os viveiros não foram atacadas dos insectos, e conservaram-se sempre boas. Em vista d'isto interrogavamo-nos se seria devido ás qualidades especiaes do solo o resultado que acabávamos de co- . Iher. Em 1874 plantaram-se no nosso esta- belecimento 467 Azáleas e 326 Rhodo' dendrons, chegados da Bélgica e da In- glaterra, e estávamos convencidos de que tinhamos conseguido conservar-lhes a existência. Aconteceu todavia o contrário, porque chegada a epocha fatal não escapou uma só ! Outras, que tinhamos mandado na mesma occasião para os viveiros, esta- vam magnificas. Tivemos então a occasião de verificar que a origem da sua morte provinha da agua que temos no estabelecimento, que é muito salobra, emquanto que a que temos nos viveiros já assim não é. Tractamos de consultar algumas obras sobre a cultura d'estas plantas, e eflfecti- vamente dizem que a agua salobra, cal- carea e férrea é a causa da sua morte. Ha outras plantas a que acontece o mesmo, como são as Eriças, Epacris, Cantuas, Eutaxias, Clianthus e muitas mais. Todas estas morrem no estabeleci- mento, e cultivadas nos viveiros dão-se admiravelmente. Tinhamos algumas plantas nas estu- 86 JOENAL DE HORTICULTURA PRATICA fas, cuja vegetação ora péssima, hoje fazemos uso das aguas pluviaes, e na sua falta mandamol-a vir da fonte onde se acham eátabelecidos os viveiros, e as plantas téem tomado um lindo aspecto e a sua vegetação é mais vigorosa. Está portanto demonstrado que muitas plantas morrem sem se saber a causa, sendo a sua morte exclusivamente devida á agua. J. Marques Loureiro. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A NOVA MOLÉSTIA DAS VINHAS A agricultura, como todos os ramos da industria humana, está sujeita a gra- ves perturbações. Umas vezes estas per- turbações são puramente económicas e pertence mais ao estadista resolvel-as ; outras vezes téem origem nos elementos e pertence mais ao naturalista o seu es- tudo. A cultura da vinha em Portugal, por isso que c a principal base da sua ri- queza agricola, deve merecer todo o cui- dado aos homens de scicncia c aos ho- mens do estado, ao lavrador intelligente e ao negociante illustrado. E este um problema complicado e cujo estudo não fica completo quando se não considere debaixo de todos os pontos de vista. E necessário conhecer a fundo a natureza dos terrenos, ter noções das me- lhores castas de plantas, estar ao facto dos processos mais aperfeiçoados, ter em conta as exigências dos mercados, con- ciliar os interesses da lavoura com os do commercio, harmonisar emfim as leis da natureza com as leis económicas mais sensatas. Ha annos que a cultura da vinha em Portugal soffreu ura grave mal-estar com o apparecimento d'uma moléstia denomi- nada o oidiíim. O cultivador ficou descançado por ter encontrado a panacea desejada, mas esta confiança parece-nos demasiada. Bem desejáramos que se evitasse en- tre nós a perturbação que seriamente ameaça similhan temente á causada pelo oidium e oxalá que sejam bem infunda- dos os receios d'aquelles que vêem no Phi/lloxera a próxima destruição dos vi- nhedos, como está acontecendo em França. N'este paiz, onde a doença primeira- mente se descobriu, é que os estragos tem sido mais scnsivois e fataes, o por isso não admira que ahi so tenha dis- pertado mais a attenção dos naturalistas e dos práticos, posto que não existam por emquanto resultados definitivos. A commissão nomeada pela Sociedade Linnoana de Bordéus não tem poupado esforços para que se faça alguma luz n'esta intrincada questão, em que as opi- niões variam do homem para homem co- mo se não houvera um ponto qualquer de apoio, mas por emquanto só temos a registrar a sua boa vontade e alguns fa- ctos curiosos que podem ser valiosos au- xiliares. Com o oidium tambcm houve diffi- culdadcs a vencer, mas era uma molés- tia que se manifestava externamente, e portanto, qualquer que fosse o estudo a que se tivesse de proceder ou o remédio a applicar, torna va-se isso fácil. Ora o averiguar uma enfermidade, o analysar uma vida subterrânea, oíFerece sérias dif- ficuldades e receiamos que um remédio qualquer não se achará com a prompti- dão que os nossos vinhedos do Douro o estão exigindo. As noticias que nos vcem de lá são muito aterradoras, embora des- contemos o exagero com que algumas são relatadas. Na margem esquerda, so- bretudo, a moléstia vae manifestando lar- gamente as suas fataes consequências e lavradores ha que receiam vòr-se seria- mente attribulados, porque, sendo o seu único rendimento o que dá a parra, já se imaginam em ruina completa. Da Pes- queira recebemos nós ha alguns dias uma interessante carta do snr. Augusto Viei- ra Pimenta, ura dos mais intelligentes agricultoi'os que conhecemos, e na qual pinta o doloroso quadro que já oíFerecem algumas das propriedades d'aquella mar- gem. A quinta do Seixo (*), por exemplo, (1) Carta do snr. A. Augusto Vieira Pimen- ta, de 2 í) d'agosto de 1874. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 8c1 que, apenas ha dous annos, contava al- guns indivíduos aífectados, tem hoje tal- vez mais de 12 mil Videiras completa- mente mortas, e mais de 30 mil affecta- das, e que succumbirão em menos de ou- tros dous annos, se as mesmas causas actuarem com egual intensidade (^). Um cavalheiro nosso amigo, que visi- tou a quinta do Seixo o anno passado, calculou o augmento da moléstia alli, de 1872 para 1873, na razão de 1 para 3. A vinha do Monte Bravo está do mes- mo modo quasi completamente perdida. Seguramente, é esta localidade aonde a nova moléstia mais tem progredido. Não é uma ou outra zona perdida, são vinhas quasi completamente inutilisada?. Recor- damo-nos de ouvir dizer ha dous annos ao snr. Vieira Pimenta que no Monte Bravo e immediaçães haveria 30 milhei- ros doentes. Hoje são 30 milheiros de ce- pas mortas. Menor tem sido o estrago nas vinhas do snr. Francisco de Almei- da do Castanheiro, no Caldeirão, apesar de já estarem muitas doentes. A quinta de Valmor acha-se bastante compromettida, assim como a de Santa Barbora. Faremos especial menção d'uma vinha situada na freguezia do Sarzedinho. E boa, tanto a exposição, como a si- tuação. Tem 6 milheiros de cepas pouco mais ou menos, e foi plantada ha 20 an- nos o muito. Privilegiada em relação ao oidium^ deu sempre novidades surpre- hendentes. N'e3ta localidade não ha vi- nha que em proporção de terreno desse maiores e mais regulares novidades. Ape- nas ha três annos soífriam três ou quatro Videiras. O anno passado via-se toda a vinha doente, mas ainda assim com uma novidade magnifica ; este anno está quasi completamente perdida, e a não dar es- peranças de para o anno produzir um cesto d'uvas ! As vinhas próximas e apenas separa- das com parede, ainda que invadidas, não téem o menor termo de comparação com a mesquinha, já toda infesada e des- pida de sarmentos, com um ou outro cacho apenas, que mais indica a fertilidade do (1) Esta opinião é corroborada pelo sur. José Silvério Vieira de Sousa, de Celleirós — Carta de 14 de setembro de 1874. que foi, do que a vida de quem o sup- porta. A quinta do snr. Vieira Pimenta está invadida em três pontos ; isto é, em três sitios aonde os caracteres da doença são tão distinctos, que o mais leigo na ma- téria pôde dizer — existe. Deixemos porém de especialisar, por- que longo seria enumerar os pontos in- vadidos. No Kio Torto poucas propriedades ha- verá que não estejam tocadas n'um ou outro ponto. Quasi egual sorte cabe ás freguezias de Vallença, Balça, Desejo- sa, Adorigo, Taboaço e Castanheiro. Er- vedosa soíFre menos para o Douro do que para o Rio Torto, comtudo a quinta de Vautorello e outras propriedades téem já ba-5tante a sentir. Avaliando o numero de cepas sem producção em ambas as margens do Rio Torto, e que téem por causa a nova mo- léstia, calcula o snr. Vieira Pimenta que seja o seu numero de 20:000. As Videi- ras mais ou menos doentes e que morre- rão nos próximos dous annos — progre- dindo o mal com a mesma intensidade — passam seguramente de 150:000. Na margem direita do Douro também já ha grandes prejuízos na região Cima- Corgo. Toda essa região foi ultimamente per- corrida pelo snr. António Roque da Sil- veira, digníssimo intendente de pecuá- ria do districto de Villa Real, com o in- tuito de observar o progresso que a mo- léstia havia feito desde agosto de 1872, epocha em que este cavalheiro nos acom- panhou fazendo parte da Delegação que a Commissão Central de Lisboa nomea- ra para o estudo da moléstia nos locaes aífectados. Como resultado d'esse passeio mais de- morado e prescrutador do que o que fez em companhia da Delegação na epocha acima mencionada, adquiriu conhecimen- to da existência da nova moléstia em si- tios onde ainda se não contava. A quinta do snr. Francisco José Cla- ro, no sitio da Timpeira, pertencente á freguezia do Valle da Ermida, tem sof- frido bastante, comquanto o prejuízo não seja tão avultado como n'outras. Logo que a doença se manifestou, o snr. José 88 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Claro começou a arrancar não só todas as Videiras que se motí travam muito affectadas, mas ainda aquellas em que havia symptomas que podesísem fazer desconíiar da exiáteucia d'eila. Ficaram povoando o terreno somente aquellas que não mostravam a menor alteração no seu estado normal; todavia hoje vão-se en- contrar cepas mostrando os mesmos pe- ríodos da doença, apresentando na maior parte um desenvolvimento fraco, o que é prenuncio de morte próxima. Perto d'e3ta propriedade ha outra per- tencente á freguezia de Folhadella, do concelho de Villa Real, onde em 1872 esteve a Delegação, e pôde verificar a presença do Fhyiloxera. N'essa proprie- dade procedeu-se também ao arranca- mento e incineração das cepas doentes, mas o mal continua progredindo. Em Celleirós ha bastantes vinhas ata- cadas, e principalmente a denominada vi- nha do Cerro tem a doença n'um gran- de grau de adiantamento. O snr. Roque da Silveira visitou uma propriedade do snr. António Leopoldino Pinto de Queirós, em Valle de Mendiz do concelho de Alijó, onde a Delegação não foi, e afiança-nos que a moléstia já para ahi alongou os seus braços e que na quinta d'e3te senhor, conhecida pela designação da Quinta do Vaile Grande, já alli morreram 75 Videiras^ havendo já cerca de 200 que apresentam os ca- racteres próprios da enfermidade. Nos vinhedos da Régua em parte al- guma augmentaram os symptomas que já ha dous annos havíamos observado nas vinhas do Juncal, uma pertencente ao snr. Camillo de Macedo e outra ao snr. Joaquim Pereira do Amor Divino, na quinta do Paço da snr.* D. Rosa Sam- paio o n'outra vinha da snr.* D. Engra- cia Júlia de Oliveira. Hoje são os mes- mos : cepas enfraquecidas no geral e al- gumas mortas entre outras que estão vi- gorosas, mas não apresentando aquelles pequenos grupos affectados que se en- contram nos vinhagos de Cima-Corgo. Na freguezia de Goivinhas, que foi d'ondo partiu o grito d'alarma, tem a moléstia progredido para o sul, conser- vando-3c estacionaria nas propriedades que ficam para o uorto, a não ser na do snr. Francisco Teixeira Lobo, em que houve notável incremento. As vinhas que se acham atacadas na freguezia de Goivinhas, são as seguin- tes : Quinta do conde de Villa Real, quinta da viscondessa de Guiães, quin- ta do Calleiro do snr. João d' Almeida Moraes Pessanha, quinta do snr. Antó- nio de Mello, quinta do snr. Lopo Vaz de Sampaio e Mello e outras situadas em toda a costa de Goivinhas até á foz do Ceire. Na quinta do conde de Villa Real pro- grediu a moléstia desde que a visitamos, assim como nas dos snrs. João d'Almei- da Moraes Pessanha e António de Mel- lo. As outras téem soffrido menos. Em Donello é que a doença tem au- gmentado muito nos últimos tempos, po- dendo dizer-se que, tirando a média pela somma dos estragos causados em todas as propriedades que já estavam affecta- das, o augmento foi na razão de 1 pa- ra 2. As propriedades queimais sentiram es- tes estragos foram as seguintes: quinta da Sarzêda do snr. António Caetano de Mello, a de Valle de Figueira do snr. Lucinio Pereira da Silva e outra no mes- mo sitio do snr. Manoel António Vilella e a quinta da Roxa do snr. João d'Al- meida de Moraes Pessanha. Na primeira mencionada o prejuizo duplicou de 1872 para 1873 e nas ou- tras teve algum incremento, exceptuan- do na do snr. Moraes Pessanha. Em Covas do Douro conserva-se a mo- léstia estacionaria desde que visitamos aquella localidade. As propriedades af- fectadas são as pertencentes aos snrs. António Borges de Carvalho, Joaquim Pereira da Silva, snr.* D. Maria Rosei- ra e Manoel António Guerra. Existem algumas propriedades affecta- das no sitio do Fojo, em Pajona e no So- bral. Pertencem ao snr. Luciano Perei- ra de Barros. Em Chancelleiros ha algumas proprie- dades em que a moléstia tem augmenta- do e outras cm que se tem conservado no mesmo estado em que estava em 1872. As vinhas em que a moléstia progre- diu são as seguintes : Cardinhaes, do snr. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 89 Francisco Pinto ; Goutelho, do snr. vis- conde de Chancelleiros e do snr. José Paulo Teixeira de Figueiredo. Nas seguintes não tem augmentado : quinta da Bouça do snr. José Paulo Tei- xeira de Figueiredo, quinta da Olivei- rinha do snr. visconde de Chancelleiros. No concelho de Santa Martha foi a moléstia observada o anno passado em duas propriedades pelo snr. Henrique Avelino, o qual já em 1872 encontrara algumas vinhas affectadas n'uma fregue- zia do mesmo concelho. Um dos sitios em que o snr. Avelino descobrira a mo- léstia denomina-se Covêllo, pertencente ao logar de Bertêllo, freguezia da Cu- mieira, do concelho de Santa Martha de Penaguião, e o outro chama-se Calvário e pertencente ao mesmo logar, freguezia 6 concelho. Ouçamos ainda o snr. José Silvério Vieira de Sousa (^), agricultor intelli- gente, a quem devemos muitos obséquios : «A nova moléstia das vinhas tera-se desenvolvido em todo o paiz vinhateiro do Douro, especialmente em Cima-Cor- go, havendo ahi poucos sitios onde não appareça o terrível flagello. As povoa- ções que mais téem soffrido são as de Goivinhas, Ortenho e Donello. N'estas três povoações talvez que o prejuízo não seja inferior a 300 pipas de vinho. Em Covas, Chancelleiros e Pezinho, também este anno a moléstia se desen- volveu em grande escala, assim como nas margens dos rios Torto e Távora e cos- ta da Roeda.» Fazendo esta rápida enumeração das propriedades que se acham affectadas, tivemos principalmente em mira mostrar a gravidade do mal, que de dia para dia vae alongando as suas raizes, e se aos go- vernos cumpre auxiliar o estudo d'esta momentosa questão, não menor dever téem 03 proprietários de cooperar para esses trabalhos por meio d'uma socieda- de, em que todos gastam, é verdade, mas em que todos téem a lucrar. Os prejuízos em França são muito maio- res do que em Portugal e alguns pro- prietários estão-se virando para a cultu- ra do Ramie (Boehmeria tenacíssima), que vae tendo muito boa cotação nos (1) Celleirós, li de setembro de 1874. mercados britannicos. Pela nossa parte muitas vezes temos pensado que alguns dos terrenos, que hoje estão perfeitamen- te nús e em que ainda ha pouco tempo se viam vicejar as plantações de Videi- ras, podiam prestar-se á cultura do Ta- baco, caso esta não fosse prohibida no paiz. É assumpto que é preciso estudar- se seriamente e não encarar-se com a superficialidade com que entre nós se olha para muita cousa de subida impor- tância. Ao espairecer a vista pela receita daa alfandegas, é certo que nos salta logo aos olhos a valiosíssima cifra que todos os dias paga de direitos de entrada o Ta- baco que importamos para consummo, e também é certo que o governo indeferi- ria de prompto qualquer representação que se lhe fizesse para tornar a cultura do Tabaco livre, porque veria cessar uma das verbas que mais produz para o es- tado. Isto, porém, é o que se apresenta á primeira vista, mas quem se opporia a que o governo lançasse um tributo sobre os cultivadores d'esta planta, como se lança aos productores de vinho, por exem- plo? E quem nos diz a nós que a cultu- ra do Tabaco não viria ainda augmentar a receita que já existe? Não são os nos- sos vinhos procurados nos diversos em- pórios estrangeiros? E porque não en- contrariam ahi também venda os nossos Tabacos ? Accresce ainda que o cultivo do Tabaco é fácil e não requer muita escolha de terreno, se attendermos a que o vemos brotar espontaneamente em mui- tos pontos do nosso solo. Suggeriu-nos esta ideia quando ha cer- ca de dous annos visitamos os vinhedos atacados pelo Phylloxera e, submetten- do este alvitre a alguns proprietários das regiões affectadas, de prompto o abraça- ram. Desejáramos portanto que se pen- sasse maduramente n'e3te assumpto e que fosse estudado consoante o merece. A questão tem muitos lados por onde deve ser encarada e a principal é a financei- ra ; mas quando uma moléstia, como é a actual, ameaça de ruina muitos cidadãos que eram abastados, é mister não des- presar qualquer alvitre, por mais insigni- ficante que se afigure apparentemente. Quando o mal nos bate á porta tão 90 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA seriamente e quando tudo que se sabe a seu respeito pouco paiísa do campo hy- pothetico, deve-se procurar remedial-o por todos 03 meios. Por morrerem as Vi- deiras a um proprietário deverá este cru- zar 03 braços e reclinar-se n'uma poltro- na, gosando as delicias do dolce far nien- te que por nossa infelicidade tão implan- tado está enti'e nós? Não! O campo agrícola é vastíssimo e ter- renos ha no Douro que se prestam a ou- tras culturas. Percorrendo essa região é verdade que não se encontra uma Flora espontânea variada, em que se achem representadas muitas famílias, mas ain- da assim tivemos occasião de colher um certo numero de plantas que dão a co- nhecer que outras suas congéneres alli poderiam viver com alguns cuidados. Este facto é digno de ser meditado n'uma epocha em que ha uma certa área de terreno cultivado que se acha seria- mente ameaçado pela nova moléstia, e é portanto mister que o homem envido to- dos 03 seus esforços, acompanhados pelo estudo e observação, para que no mo- mento aníjustioso se não ache entregue unicamente á desgraça que o persegue, sem estar prevenido com algum novo re- curso. Lembremo-nos, pois, de que ainda nos restam muitos recursos ; numerosas mi- nas agrícolas que ainda não foram ex- ploradas. A creação dos gados é uma que não deve esquecer, e portanto nós lembramol-a aos agricultores da região vinícola do Douro. A vasta família das Gramíneas, que, na região aífectada, representa um papel tão importante, poderá auxiliar muito a creação do gado. Desta familia herbo- risamos numerosos indivíduos, muitos dos quaes não nos foi possível chegar a clas- sificar, porque, quando os colhemos, foi em epocha pouco própria e estavam des- providos dos órgãos esseuciaes para a sua classificação. Já dissemos mais acima que em Fran- ça se estava ensaiando a cultura do Ra- mie (Boehneria tenacíssima) , mas n'um paiz rotineiro como o nosso, quer-nos pa- recer que a adopção e genex-alisação da cultura d'este vegetal será em extremo morosa. (Continua). Oliveira Juxior. A VINICULTURA PORTUGUEZA I Por pouco que se estudem as nossas cousas publicas, por alto que se folheem as estatísticas aduaneiras, salta logo ao entendimento que é a vinha a nossa pri- meira riqueza agrícola, e que sendo a industria agricola a principal de todas as nossas industrias e a que fornece o grande alimento ao nosso commercio in- terno e externo, é ainda o vinho e seus derivados o artigo de maior vulto, n'es- sa industria e n'esse commercio que a agricultura sustenta. Um paiz que em 9 milhões de hecta- res de área apenas tem cm cultura 2 milhões de hectares, que conta mais de 4 milhões de habitantes, que vivem, que commerceiam, e que existem quasi ex- clusivamente pela agricultura, c ao mes- mo tempo um prodígio de preguiça, um verdadeiro milagre de arte e de activi- dade. Não ha fugir a esta antlthese ; des- de que se verifica que a população exis- te e vive pelo geral na abundância, e até cresce em numero, ao mesmo tempo se reconhece que a área cultivada não augmenta nem melhora sensivelmente de anuo para anno em justo parallelo com o movimento da sociedade. Se não é isto um enigma, é pelo me- nos um paradoxo ; tão antagónicos pare- cem os extremos do facto que puzemos em relevo. Pois não ha nada mais simples de com- prehender. E a vinha em grande parte o segredo d'essa apparcnte actividade agricola, har- monicamente abraçada com a preguiça real e effectiva. A vinha, sim ; a cultura que dá o maior producto liquido; a cultura menos fadi- gosa ; a cultura que prende mais constan- temente a população aos campos ; — a cul- tura que fundou quasi todas as nossas cidades ruraesj — a cultura colonisadora JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 91 por excellencia ; a cultura que transpor- ta em poucos annos a choupana a casal, o casal a palácio, o meieiro a rendeiro, o rendeiro a proprietário j a cultura em- fim que faz a famiiia, e que mais favo- rece o crescimento da população. O homem, a famiiia, a sociedade são o reflexo da terra que habitam, reflexo phjsico muitas vezes, reflexo moral sem- pre.— Tirae o Portugal planice que é pe- queno, fica-vos o Portugal das coUinas, dos outeiros, das serranias, das monta- nhas, que é grande, que é um povo re- lativamente immenso. — Esta natureza orographica antepõe a aptidão agrícola arbustiva e arbórea á aptidão pratense e cerealífera. — Juntae a isto o clima sê eco da maior parte do paiz e tereis a expli- cação porque a vinha se tornou entre nós a cultura predominante, — e ainda mais que a da oliveira, que todavia se acha mais ou menos densa onde o vinho senhoreia. Somos, portanto vinhateiros por ne- cessidade local, e somos preguiçosos em agricultura por condição; porque a vi- nha, como a Oliveira, como os monta- dos, como a cultura pomicula em geral, geram, pelos menores trabalhos que exi- gem, a indolência, e pelo seu relativa- mente grande producto liquido, uma cer- ta abastança, que descuida o futuro. Mas teremos ao menos nós a necessária acti- vidade na cultura para a qual a nature- za nos especialisou? Será a nossa pre- guiça tamsómente o legitimo goso de uma industria fácil? Custa-nos a dizel-o, mas não é. Nos dous milhões de hectares, sujeitos aos trabalhos da cultura agrícola e florestal a vinha não chega ainda bem a compre- hender a decima parte d'aquelle dominio útil e aproveitado. — A producção do nosso vinho oscilla entre 5 a 5,5 milhões de hectolitros. Se d'esta pi-oducção tirar- mos para o consummo interno em vinho, aguardente e vinagre, três milhões de hectolitros, ficam-nos apenas para ex- portar 2 a 2,5 milhões de hectolitros ; o que é realmente bem pouco para um paiz vinhateiro que podia exportar o de- cuplo d'e3ta producção sem tirar o logar ás outras culturas, antes também dila- tando-as. É o vinho a nossa primeira riqueza agrícola. A elle devemos principalmente a famiiia rural. É elle que equilibra a nossa balança de commercio. E elle que paga a maior parte dos tributos agríco- las. A elle principalmente devemos a paz, a menor miséria das classes ruraes proletárias. Calcule cada um o que seria, se du- plicássemos ao menos a actual producção d'eáta riqueza. Clama-se ahi todos os dias para que se alargue o commercio dos nossos vi- nhos nos mercados estrangeiros ; para que se especialisem e aperfeiçoem os ty- pos dos nossos muitos vinhos de pasto ; para que se fabriquem mais sólidos, mais elegantes e mais baratos. Tudo com o fim de grangear credito e procura a um artigo que a natureza nos depara com a máxima generosidade. Quem ouvir estes clamores e ignorar esta parte da nossa economia rural, ha- de julgar que o paiz regorgita em vinho, que a pouco tardar os rios se tingirão de roxo, á falta de mercado consummidor. Nada d'isso. — O paiz não chega a ven- der para fora tanto quanto bebe. A ver- dade é que 3/4 partes de cada colheita estão esgotadas ao approximar da colhei- ta futura. Se querem augmentar o commercio externo dos nossos vinhos, se querem acreditar e vulgarisar os nossos typos de pasto, quasi todos preciosos quando bem organisados e afinados, não esqueçam que é preciso começar um pouco também pelo principio, isto é, por dar mais largura á vinicultura. Uma cousa deve pelo me- nos acompanhar a outra. J. I. Ferreira Lapa. PERA BELLE ANGEVINE Mr. Thomas C. Brehant, de Guern- sey, escrevia recentemente a Mr. Car- rière dizendo-lhe que tinha exposto em Londres seis peras daBelleAngevine, que ganharam o primeiro premio que devia ser conferido ás seis ]^eras maiores. 92 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Um d'e3te3 fructos media 50 centíme- tros de circumfereacia e pesava 2 kil. 267 e 03 outroá ti-es posavam approxima- damente o mesmo que este. Isto uíio nos admira, porque temos já visto no nosso paiz a Belle Angevine com proporções collossaes, sem comtudo poder- mos lixar exactamente o seu peso. Além d'isto também conhecemos o peso que por vezes tem attingido esta pêra, que é de- certo a maior que se conhece até hoje. Leroy faz menção no seu «Dictionnaire de Pomoiogie» d'uma que foi exposta em 1846 em Tours, que pesava 2 kil. 250 ; em 1864 outra em Cholet 2 kil. 0:^5; em 1847 outra em Brionne (Eure) 1 kil. 3OO ; em 1862 outra em Chartres 1 kil. 054; emfim, também em 1872 em Nérac (Lot-et-Garonne) um ramo com quatro peras que pesavam todas juntas mais de 3 kilogrammas. A a Union», jornal parisiense, escrevia n'um dos seus números de novembro de 1863: «Atravessando a praça do Châtelet notamos n'uma vidraça do Restaurante Victoria, um cestinho com seis peras enormes com esta inscripção: «Peras Belle Angevine — as seis 150 francos.» Vinte e cinco francos cada uma ! Isso é de graça, se nos lembrarmos de que ha dous annos o famoso Chevet expunha es- tes fructos a 60 francos cada um.» O leitor que não conhece esta pêra deve imaginar, polo preço que attingia em França já em 1863, que é um fru- cto que ao seu tamanho excepcional reú- ne as qualidades essenciaes para que seja de primeira ordem. Ora ahi está do que devemos desde já desenganal-o. A pêra Belle Angevine é só para vista ou então, quando muito, para coser. Ainda assim deve encontrar um logar em todo o po- mar, porque constituo um bonito orna- mento para as mczas de jantar. Esta pêra não é nova no paiz. No ca- talogo do snr. Jo>)é Marques Loureiro, publicado em 1866, já a encontramos mencionada. Oliveira Júnior. o GADO E A FABRICAÇÃO ECONÓMICA DO ESTRUME DE HERDADE Ao3 olhos de todo o cultivador, o es- trume de estabulo será sempre o adubo por excelloncia, porque, independente- mente dos saes que contém o cujo valor se não contesta, compòe-se de substan- cias vegetaes, cuja decomposição procu- ra ao solo o húmus ou terriço. Ora, o terriço é hoje positivamente reconheci- do, não só pela velha experiência cultu- ral, mas ainda pela chimica agricola, como um dos elementos mais essenciaes da fecundidade dos solos aráveis. O estabulo é a officina onde se faz o estrume; é o gado a machina que o fa- brica, procurando como acréscimo a car- ne, o leite, a gordura, a lã, o trabalho, se o corpo dos animaes de nossas herda- des corresponde, como qualquer outra machina, a duas condições indispensá- veis, a saber : 1." Que seja bem construído; 2.*' Que seja bem alimentado. A amplidão 6 o primeiro ponto de boa construcção ; porque d'clle dependo a extensão do logar que os órgãos occu- pam no corpo ; sem logar suffieiente, es- ses órgãos não poderiam desenvolver-se e fuuccionar convenientemente. A alimentação deve ser sempre abun- dante e de excelloute qualidade. Para o demonstrar, dividem-se theo- ricamente em nutrição ou ração de en- tretenimento, e em nutrição ou ração de reproducção — os alimentos que um indi- viduo p(')de consummir. Pelo termo ração de entretenimento , entonde-se o que sustenta o animal sem avigmento nem diminuição de peso. Se cUe não recebe nada mais, o seu appe- titc não fica satisfeito o nada fornece em leite, trabalho ou progenitura senão á custa de sua própria substancia. A ração de reproducção comprehende tudo o que p()de consummir a mais. O pro- ducto é proporcional a esta segunda par- te de alimentos, e como a despeza que occasiona c sempre precedida por uma despeza om nutrição de entretenimento. JOBNAL DE HORTICULTURA PRATICA 93 resulta d'isso que o ganho liquido é tan- to maior, n'outro3 termos, que o estru- me sahe tanto mais barato quanto o ani- mal mais consomme. Suppondo, diz o snr. L. Gossin no re- sumo de suas conferencias agricolas, que a nutrição de entretenimento de uma vacca custa 50 centessimos por dia, que a sua nutrição de producção custa egual- mente 50 centessimos, e que, por 5 cen- tessimos de nutrição de producção, ella produz um litro de leite do valor de 10 centessimos. Reunindo estas condições, temos por um franco de despeza, 10 li- tros de leite a 10 centessimos, ou 1 fran- co de producto; o estrume é obtido a mais e nada custa; porém se o animal recebe somente 25 centessimos de nu- trição de producção, já não temos, por uma despeza de 75 centessimos, mais de 5 litros de leite, ou 50 centessimos. Em- fim, se aos 50 centessimos de nutrição de entretenimento juntarmos somente 10 centessimos de nutrição da produc- ção, não encontraremos, por 60 centes- simos de despeza, mais de 2 litros de leite, ou 20 centessimos de producto. O estrume, n'este terceiro caso, custa 40 centessimos ; o que excede muito o seu valor real e deve constituir uma perda na maior parte das culturas, porque são estas que deverão, nas contas finaes, sup- portar a despeza do adubo. Os exemplos seguintes farão compre- hender a importância que é preciso li- gar ao fabrico económico dos estrumes de herdade. Seja um hectare de Beterrabas estru- mado na razão de 60:000 kilog. de adu- bo de herdade. Supponhamos que o pre- ço de custo d'este adubo é de dez fran- cos por 1:000 kilog. ; eis pois, logo no pri- meiro artigo, uma despeza de 600 francos. Admittindo que os dous terços da es- trumada serão absorvidos pela colheita das Beterrabas, teremos uma somma de 400 francos para levar ao debito d'esta cultura, além das outras despezas obri- gatórias que necessita, ou, querendo an- tes, 400 francos que devemos descontar do preço de venda por hectare. As cousas mudariam de face se o cul- tivador fosse proprietário de um gado escolhido, bem constituido, absorvendo uma alimentação conveniente, para pa- gar, pelo augmento dos productos crea- dos em consequência da applicação de uma certa ração de producção, o valor total da nutrição que esse gado consom- me. Então o estrume seria obtido de gra- ça e a cultura da Beterraba seria des- carregada da despeza de 400 francos, menos os gastos de transporte de estru- me ao terreno que teria sempre de sup- portar. O que quer dizer, a fim de nos fazermos comprehender bem de todos os nossos leitores, que o cultivador guar- daria na sua caixa uma somma de cer- ca de 400 francos mais, que não ha- veria tirado da venda do hectare de Beterrabas, se o estrume tivesse um va- lor de 10 francos por 1:000 kilogram- mas. O que acabamos de dizer da Beterra- ba applica-se á cultura de qualquer ou- tra planta. Pôde portanto ousadamente avançar-se que fabricar estrume de her- dade por baixo preço, alimentando copio- samente animaes bem constituídos, do- tados de excellente appetite e pagando com os seus productos os alimentos que consommem, é dar a todos os ramos de uma exploração rural as melhores pro- babilidades de lucros. A. Stiennon. GHRONIGA HORTIGOLO-AGRICOLA Ha um certo numero de condições a que no estrangeiro attendem para que as arvores fructiferas ou outros quaes- quer vegetaes prosperem e dêem abun- dantes colheitas. Entre nós, porém, co- mo temos toda a confiança no solo, no cli- ma e sobretudo na Providencia, fazemos todas estas cousas a troche-moche, sem methodo, e por fim deixámol-as, como lá se diz : ao Deus dará. Não é raro portanto vermos Maciei- ras, Pereiras e outras fructeiras, attin- girem proporções collossaes, apesar do que a safra é menos do que mediocre. Se lhes tivessem dado uma poda racio- nal e boa exposição, já isso não aconte- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA ceria. Não será, pois, supérfluo indicar a3 regras geracs a que, segundo Mr. Ra- farin, se devem submettcr as Pereiras, regras simples e de fácil observação. Segundo Mr. Rafarin esta arvore pre- fere a exposição ao nascente, isto é, aquel- la de que possa receber o sol até ao meio dia. Nos solos frescos, húmidos, siliciosos e turfosos aconselham os arboricultores que as Pereiras que se tenham de plantar sejam enxertadas em Marmelleiro. Nos solos sêccos ou calcários as francas são preferíveis. Exceptuam-sea esta regra as variedades muito vigorosas. As variedades que começam a amadu- recer em outubro devem ser dispostas a este ou a nordeste, segundo são mais ou menos serôdias : em solos profundos, sêc- cos ou calcários, produzirão excellentes fructos. Para as variedades têmporas é preciso o contrário : solo fresco, húmido, silicioso ou turfoso e dispôl-as do este pa- ra o sul, conforme são mais ou menos têmporas. — Em uma das manhãs chuvosas do mez de janeiro fomos agradavelmente surprehendidos, entrando no nosso som- brio jardim, vendo que um exemplar da Billbergia vittata, que durante dous ou três annos estivera n'uma caixa de plan- tas á janella, começava a desabrochar uma encantadora espiga com bellissimas espathas escarlates. Pensamos que é uma noticia que de- ve ser lida com jubilo pelos amadores, porque nunca ouvíramos dizer que esta planta florescera ao ar livre no nosso paiz nem mesmo na Europa. A Billbergia vittata vem minuciosa- mente descripta na «Belgique Hortico- le» (vol. XXI, pag. 193-1871), e Mr. Morren, que nos últimos annos se tem dedicado ao estudo das Bromeliaceas , abre assim o seu artigo: «Podemos as- severar depois d'uma longa experiência que a planta que representamos, sob o nome de Billbergia vittata, é ura dos mais bellos ornamentos de estufa quente. » Bem se vê que ha poucos paizes co- mo o nosso para as plantas. — Em elegante formato e nitidamen- te impresso, começamos a receber uma publicação mensal quo, sob o titulo de «Cenáculo», emprehendeu em Lisboa, o mimoso escriptor portuguez, o snr. Cân- dido de Figueiredo. O « Cenáculo )s que é uma revista da litteratura pátria, encerra artigos e poe- sias de merecimento, rubricadas por no- mes conhecidos e apreciados devidamen- te pelo publico, taes como Bulhão Pato, Gonçalves Crespo, Sousa Viterbo, Luiz de Campos e muitos outros satellites que constituem a constellação dos homens de intelligencia de Portugal. O snr. Cândido de Figueiredo, em- prohendendo a publicação do «Cenácu- lo», presta um bom serviço ás lettras, e é de justiça que seja auxiliado pelas pessoas que são dadas á leitura amena. O «Cenáculo» pode entrar tão bem no gabinete de trabalho do estudante co- mo no boudoir da mais formosa vestal. As damas, pois, que porventura lêem, encontrarão n'esta publicação algumas horas de agradável passatempo. Agradecemos ao snr. Cândido de Fi- gueiredo a distincção com que nos hon- rou enviando-nos o seu jornal e fazemos votos para que o collega tenha longa e prospera vida. — Ultimamente escrevia o snr. D. Luiz de Mello Breyner n'um diário de Lisboa, o que em seguida se vae ler: Findou o anno de 1874, e os annaes da his- toria liorticola registram mais alguns factos que demonstram bem o progresso e desenvolvimento que ultimamente tem recebido em Lisboa uma das mais úteis e certamente a mais delicada das industrias — a horticultura. A abertura de um novo estabelecimento, suc- cursal do que possue no Porto o snr. José Mar- ques Loureiro, o primeiro e mais bem fornecido no paiz, veio abrir campo aos amadores distin- ctos para satisfazerem as suas ambições e os seus desejos. Vê-se alli uma bonita coUecção de Co- níferas, alguns Fetos raros, Palmeiras, arbustos e plantas de flor. O snr. Turc & C* apresenta-nos uma exposi- ção de arvores de fructo, lioseiras, plantas de flor, cebolas e tubérculos, etc, etc. O nosso antigo e bem conhecido horticultor Jules Leroy Waigel annuncia-uos grandes no- vidades no seu estabelecimento a Valle de Pe- reiro. Uma exposição de plantas omamentaes de estufa c tempo que tive a honra de apresentar a publico, mesquinlia e insignificante, bem o sei, pois me faltam condições precisas para este fim, sendo a principal um espaçoso terreno, veio con- ceder-me a alegria de vêr filiados no grémio de Flora novos amadores distiuctos, e de ter conbe- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA cimento da formação de novos jardins e da cons- trucção de novas estufas. Além d'isto, outros pequenos estabelecimen- tos hortícolas, já conhecidos, fornecem-nos mui- tas e variadas plantas. Não será tudo isto a pro- va do grande impulso que a horticultura vae tendo em Portugal? E com certeza. É inquestionável que as exposições são o mais activo elemento para o desenvolvimento de qualquer industria e muito mais d'esta que en- contra em Portugal condições especiaes pai-a vir a ser fonte de um grande commercio, e apresen- tar productos que mais tarde poderão figurar en- tre os primeiros. Em França, Inglaterra, Bélgica, AUemanha, Itália e outros paizes as exposições são contínuas, 6 os resultados d'ellas sempre satisfactorios. Sigamos com coragem e firme vontade esse exemplo e veremos coroados os nossos esforços. Nós fazemos coro com o nosso amigo e dizemos amen. Exposições é o que nós desejáramos vêr todos os annos, todos os mezes, to- dos os dias se possivel fosse. D'este mo- do depressa a horticultura lançaria pro- fundas raizes e então vêl-a-iamos flores- cer como em parte nenhuma. — Gand, o berço por assim dizer da horticultura, está-nos dando todos os dias provas de que em nenhuma parte ella merece, como alli, a attenção das pessoas intelligentes. Um livro que nos acaba de chegar ás mãos, sob o titulo «Annuaire de THorti- culture Belge» e redigido pelos snrs. Fr. Burvenich, Ed. Pynaert, Em. Rodigas e H. J. Van Hulle, professores da Eschola d'Horti cultura do Estado annexa ao Jar- dim Botânico da Universidade de Gand, é o documento que mais á evidencia pro- va a attenção que este ramo de conheci- mentos está merecendo actualmente nos paizes estrangeiros. O «Annuaire de THorticulture Belge» é um volume de 176 paginas, nitidamen- te impresso e acompanhado de muitas gravuras que auxiliam a comprehensão do texto. Abre esta obra por uma lista dos horti- cultores, negociantes de sementes, archi- tectos de jardins, fabricantes de instru- mentos hortícolas, etc, que existem na Bélgica, seguindo depois uma serie de pequenos artigos que devem interessar a todas as pessoas que se occupam de jar- dinagem ou de qualquer outro ramo que lhe diga respeito. Recommendando este livro aos ama- dores de Portugal, cumprimos um dever que a consciência nos impõe, e as pessoas que desejarem possuil-o poderão obtel-o de qualquer dos nossos principaes livrei- ros ou dirigindo-se directamente a Mr. Em. Rodigas, 4, Boulevard du Chateau — Gand — Belgique. — O snr. Ferreira Lapa diz que lhe constara que n'esta sessão legislativa se- rá apresentada uma proposta de lei para se fundarem três estações oenologicas, mo- deladas pelas que se acham funccionan- do na Áustria e na Itália, e diz-se que os pontos escolhidos serão : Lisboa, Por- to e Coimbra. Os fins principaes d'esta3 instituições serão expor ao publico os melhores systemas de cultura e educação das vinhas apropriadas ás diversas loca- lidades ; estudar praticamente as diver- sas castas de cepas em relação ao terre- no, aos adubos, á cultura e ao clima. Esta primeira parte, ou eschola de viti- cultura, deverá formar mestres de vinhas, isto é, homens práticos especiaes n'este género de cultura, de que ha tão palpá- vel necessidade. A segunda parte de cada estação oeno- logica consistirá em uma eschola cenote- chnica, tendo por fim expor os processos de fabrico e de educação de vinhos, mais adequados á região. Esta segunda escho- la formará mestres de adegas, isto é, ho- mens práticos e esclarecidos n'este offi- cio, que também não abundam no nosso paiz. Não chegamos a saber o que se pas- sou no parlamento sobre este assum- pto, mas desejaremos que fosse tomada em consideração a importância do as- sumpto. — O snr. conselheiro Rodrigo de Mo- raes Soares está tractando de organisar uma carta vitícola do reino. Esta carta compôr-se-ha de quatro corpos, cada um dos^ quaes tem quasi um metro. E mais um bom serviço que o snr. Moraes Soares presta ao nosso paiz. — O barão Mueller, n'um dos seus úl- timos relatórios acerca das excursões que fez durante o anno passado, diz que en- controu um Eucalyjptus amygdalina, que media 400 pés de altura. É prodigioso ! 96 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA — Os artigos que publicamos ii'este numero sob as epigraphes «O gado e a fabricação económica do estrume de her- dade» e «Os adubos chimicos» são ex- trahidos do nosso collega o «Cultiva- dor». N'este numero começamos egualmente a transcrever uma serie de artigos pu- blicados ha tempos pelo snr. Ferreira Lapa, illustrado professor do Instituto geral de Agricultura de Lisboa, na in- teressante «Revista de Portugal e Bra- zil » . Estamos bem certos de que estes ar- tigos serão lidos com o máximo interesse pelos nossos viticultores. — A empreza dos caminhos de ferro do norte e leste comprou este anno 6:000 Eacalyptu,s para povoar os taludes e ter- renos confinantes das linhas férreas per- tencentes á companhia. — O nosso coílaborador o snr. Geor- ge A. Wheelhouse dá-nos n'uma carta que temos presente o seguinte interes- sante calculo : Os caminhos de ferro dos Estados-Unidos aetuacs, precisam 150 mil milhões de travessões. Para dar estes travessões é preciso 750 mil acres de bosques bem povoados. Os travessões duram geralmente cinco annos, assim para a conserva- ção annual dos caminhos de ferro precisa-se 30 mil milhões de travessões ; mas como o desen- volvimento dos caminhos de ferro nos Estados- Unidos é cada vez maior, onde se irá buscar madeira se não houver uma nova invenção que substitua os travessões ? ! O que acontece nos Estados-Unidos acontece na Europa, por isso o Ercço da madeira deve chegar a um preço fa- uloso. — O ultimo numero da «Illustration Horticole» vem acompanhado de uma estampa representando uma Cycadea des- coberta o anno passado por Mr. Roezl na Republica do Equador — a Zamia Lin- deni. — Em Wurzbourg, na Allemanha, organisou-se uma commissão com o fim de promover uma subscripção, com o pro- ducto da qual se erigirá alli um monu- mento em memoria do célebre botanico- viajanto von Siebold, a quem a Europa é devedora de numerosas plantas que hoje ornamentam os nossos jardins. As muitas sympathias, que soube con- quistar no mundo scientifico, servem-lho bojo do garantia para que o seu nomo não fique só nos livros, mas também n'um monumento que recordará aos visitantes de Wurzbourg a passagem na terra do um homem eminente. — N'uma das ultimas reuniões da So- ciedade de Horticultura de Amsterdam, Mr. W. Sacher participou á sociedade que tinha descoberto um novo remédio para combater o oidium, remédio muito mais barato e de menos difficil applica- ção que o enxofre. Segundo aquelle agricultor bastaria, para fazer desapparecer a Cryptogami- ca, a plantação da Ruta graveolens pró- ximo das vinhas. Mr. Sacher declarou que esta sua descoberta era filha da ob- servação de muitos annos. Emfim . . . pode ser. — A emigração para a America, em logar de declinar, vae tendo maior in- cremento de dia para dia, e vão faltan- do nos nossos campos aquelles braços ro- bustos que eram a nossa riqueza. Ainda não ha muito que o nosso coílaborador, o snr. dr. Basilio Constantino, escreven- do a propósito d'este assumpto nos dizia : Continua para o Brazil a emigração em gran- de escala. Os mancebos scismam o El Dorado nas terras de Santa Cruz. A emigração indica sempre um mal estar nas sociedades d'onde se expatria. Os felizes e ricos raro emigram. Nas legiões immensas do proletariado é que se recruta na Europa e na China a multidão dos emigrantes. O êxodo das raças é providencial, filho da necessidade, e uma lei da historia; porque sem isto o globo não se povoaria; e o homem tem o direito de sahir da sociedade onde arrasta a miséria, e de procurar um centro onde o seu trabalho seja mais bem recompensado, e onde as bagas do suor causado pelo seu esforço uào sejam impro- fícuas. A emigração, que não pode ser condemnada em these, pôde no emtanto ter causas que com a acção das leis se pode remover. A nossa lei do recrutamento incita muitas vezes 03 mancebos á emigração. È sobremodo triste e prejudicial á agricultura e á defeza da nação, que se permitta aos mancebos de 21 an- nos, quando antes não tenham sido chamados ao serviço militar, a faculdade de emigrarem. A emancipação civil não deve estorvar que cada um pague á pátria o tributo que lhe é de- vido. Confrange o coração, que a lei não estorve que emigrem os mancebos que só deixam os pe- nates com o fim de se esquivarem ao serviço mi- litar. As causas naturaes da emigração não pode em muitos casoa removel-as a lei ; mas as fictí- cias pode. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 97 — Suppomos que não haverá ninguém que, por mero divertimento ou para ma- tar o tédio, tome da penna como arma offensiva e venha para a imprensa ag- gredir um individuo ou offender uma corporação. Fig. 17 — Praça dos Voluntários da Rainha (1) Fig. 18 — A hecatombe de 23 de fevereiro de 1875 (1) Um descuido incompreliensivel do nosso desenhador fez com que appareça da direita o que deveria estar da esquerda e vice-versa. Es- peramos que o bom senso do leitor releve este engano que nada iuflue sobre o effeito das gra- vuras que apresentamos. 98 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Quem tal fizesse teria dado provas da baixeza do seu caracter ou da perversi- dade do seu talento. Esta a nossa maneira de pensar, esta a nossa maneira de proceder. Censurar não é atacar violentamente e quando censuramos é com o maior pesar e por vezes com a máxima repugnância, porque a nossa aspiração constante seria elogiar sem sahir dos limites do justo. Ha todavia certos factos perante os quaes é quasi uma vergonha o silencio. O que ultimamente tem succedido com a jardinagem portuense está clamando, não diremos vingança, mas um protesto Bolemne. E o que fazemos; protestamos. Julgamos isso um dever. A jardinagem de uma cidade é um ra- mo importante do serviço publico e deve merecer todo o cuidado das camarás mu- nicipaes. O vereador encarregado d'este pelouro não deve ignorar tão completa- mente os rudimentos da horticultura que deixe praticar as maiores arbitrariedades ao pessoal que lhe obedece. Quando o município não tem empregados peritos e sufficientemente illustrados, é necessário que o director do pelouro tenha o senso commum sufficiente para consultar as pessoas entendidas o deixar-se guiar pe- los seus conselhos. Nas grandes capitães, e não só nas grandes capitães como nas cidades de se- gunda e terceira ordem, a arboricultura é estimada, apreciada e tractada com to- do o respeito. Aqui, no Porto, é uma cousa a que se liga pequena considera- ção e dir-se-hia que a jardinagem está confiada a rudes hortelões. Ainda se não comprehendeu o attractivo que off'erece uma cidade com as suas ruas arborisa- das e com as suas praças e squares as- Bombreadas pela verdura e perfumadas pelas flores. Em Lisboa alguma cousa se tem feito ii'este sentido, principalmente desde que está á testa do respectivo pelouro o snr. Margiochi, Júnior, mas os exforços d'e3te apreciável cavalheiro estão longe ainda de dar a Lisboa o logar que deveria ter na horticultura europea. A Patriarchal o as sqiiai-es do Aterro devem meucionar-se com louvor. A Es- trella, posto que um pouco abandonada, ainda assim p(jde considerar-se um bello jardim da metrópole. O Passeio Publico, no coração da baixa, tem limpeza e aceio nas ruas, os arvoredos estão bem cuida- dos, mas faltam-lhe condições para ser um verdadeiro jardim e está reclamando a sua transformação em boulevard. Oxalá que e.^ta ideia se realise brevemente e que uma grande avenida communique o ve- lho Passeio Publico com o Campo Grande. Em Lisboa e mesmo em Coimbra fa- zem-se todos os annos plantações, mas no Porto segue-se um systema mais com- modo, verdadeiramente draconiano: der- rubam-se as existentes ou decapitam-se de tal sorte que as pobres arvores — coi- tadas ! — não sabem o que mais devam agradecer; se o cortarem-lhes a raiz, se o cortarem-lhes a rama. A horticultura portuense tem datas memoráveis pelo lado da destruição. A hecatombe de 23 de fevereiro de 1875 ha-de ficar eternisada nas paginas do in- fausto destino. Havia uma bellissima e encantadora plantação de Platanus na Praça dos Vo- luntários da Rainha, plantação que a mais de um titulo deveria ser respeitada e, quando não houvesse outro, bastava o facto de commemorar a ultima visita que Sua Magestade a Senhora D. Maria II fez ao Porto em 1852. Pois essas arvo- res inoíFensivas e que pelo contrario pro- digalisavam uma sombra agradabillissi- ma nos mezes em que o sol a pino nos vem visitar, foram derrubadas. O facto mal se pôde crer mas é realmente ver- dade ! Ha dous annos ainda que a Pra- ça dos Voluntários da Rainha era um verdadeiro oásis, como o leitor pode vêr pela figura 17, e hoje está reduzida á mi- séria representada na figura 18. Veja-se quanto não p»)de a ignorância e os sen- timentos de verdadeiros vândalos ! Muito de propósito, para que os vin- douros possam avaliar os actos de selva- geria que se praticavam nos .fins do sé- culo XIX na ditosa j)atria minha ama- da, mandamos fazer estes desenhos, que faliam mais ao vivo do que qualquer mi- nuciosa doscripção. Em face d'cste vandalismo poderíamos realmente ficar silenciosos? Deveriamos estragar as nossas luvas applaudindo a JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA jardinagem camarária? Cumpria-nos la- vrar um voto de louvor a quem conde- mnou a Praça dos Voluntários da Rai- nha á aridez do deserto? Pensamos que não, mas a opinião pu- blica vale mais do que a individual e ajuizará pelas estampas que representam o estado da referida Praça em 1872 e depois do dia de 23 de fevereiro próximo passado. Fig. 19 — Poda dos Platanus em freute d'esta redacção Infelizmente os desatinos não pararam aqui. Defronte d'esta redacção havia uns Platanus das proporções dos representa- dos na figura 17. Vejam agora (fig. 19) a que estado o brutal podão os reduziu ! Na Aguardente a poda não foi tão se- vera, mas pouco menos. Na Praça de D. á escovinha que se dá á Acácia melano- xylon que para nosso mal é a arvore que mais abunda na cidade. Chamamos-lhe poda á escovinha porque é uma espécie de tosquia, como se faz aos carneiros, e para que se generalise este systema de poda camarária apresentamos um exemplar, copia do que se acha em frente do palá- cio real, á rua do Triumpho (fig. 20) . Pe- la cidade são abundantíssimos os exem- plos d'este género. A Acácia melanoxylon é, como todos sabem, uma arvore imprópria para a or- namentação das ruas, porque em pouco tempo sobe ás aguas furtadas d'um ter- ceiro andar e além d'isso, como já disse- mos n'outra occasião, a sua sombra não é fresca, a sua folhagem (phyllodes) não é bonita e em conclusão não tem nada ab- solutamente por que se possa recommen- Fig. 20 — Poda á escovinha applicada á Acácia melanoxylon Pedro arrancaram-se as Rohinias pseudo- Acacias, var. umbracullifera, arvores de pequeno porte que não molestavam nem os moradores nem tampouco os transeuntes. Em tudo se revela a mais crassa igno- rância d'estas cousas. Este ridículo nos faz rir, mas o que mais nos provoca a hilaridade é a poda Fig. 21 — Porte da Acácia melanoxylon — Desenhada no Horto Loureiro dar, a não ser pelas flores, que apenas duram alguns dias. Mas é extremamente ridículo o que- rer sujeitar uma arvore d'este porte (fig. 21) a uma forma lilliputiana como o entende a tesoura municipal e prova á evidencia que ha alli total carência de conhecimentos especiaea. 100 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Houvera-se de acreditar que o Porto é uma terra onde o arvoredo não tem as necessárias condições de desenvolvimen- to, onde as arvores são extremamente caras, onde as plantaçòci ficam por um preço excessivo. Todos sabem que nada d'isto é verdade. As condições climaté- ricas e as do solo são as mais vantajosas e o trabalho é pago o mais medicamente possivel. Se a illustre municipalidade portuen- se soubesse o dinheiro que consomme a municipalidade de Pariz em passeios e arvoredos, deitava as mãos á cabeça e gritava aqui d^el-rei! Sua ex.*, a camará municipal, tem na sua bibliotheca a monumental obra de Alphand «Les Promeuades de Paris» ; pois se se desse ao trabalho de a consul- tar veria que o preço por que fica cada arvore plantada nos òoulevards da capi- tal da França é de 180 francos (28^.800 reis) approximadamente. Inaudito ! Mas esta despeza — diz Alphand — indispen- sável para se obter uma vegetação re- gular não é excessiva, posta em paral- lelo com 03 serviços que prestam as plan- tações. Elias são indispensáveis — accres- centa Alphand — para renovar o ar vi- ciado das cidades, absorvendo o acido carbónico que decompõem c transformam em oxygenio. Proporcionam a sombra tão necessária á numerosa concorrência das ruas, e emfim contribuem muito e mui- to para o embellesamcnto de uma cidade. Isto é o que não comprehende a camará municipal do Porto. Em Pariz as arvores são plantadas a cerca de 5 metros de distancia das ca- sas e com intervallos também de 5 me- tros de umas ás outras. Na Praça dos Voluntários da Rainha ha talvez doze ou treze metros de distancia das edifica- ções, a não ser que o metro municipal tenha mais comprimento. E o que se nos afigura n'e3te caso, porque do con- trário as arvores teriam sido respeitadas. E provável que o patriotismo da bur- guezia portuense se indigne com estas approxi mações e não queira saber do que faz a municipalidade de Pariz em maté- ria de arboricultura. Paciência ! Uma observação porém nos occorre e com ella vamos pôr ponto a estas li- nhas. Se applaudimos e adoptamos as modas e futilidades extranhas, se quasi nos chegamos a rebalsar por vezes no lodo dos òoulevards, porque não havemos de seguir e adoptar o que lá por fora ha de útil, de serio e de vantajoso? — O conde de Gasparin vaticinou que um dia a Beterraba daria a volta do glo- bo. Os acontecimentos vão tornando cer- ta esta predicção. A Beterraba, depois de percorrer todos os paizes da Europa, mes- mo a Rússia, depois de transpor as mon- tanhas, e estabelecer-se nos férteis valles da Califórnia, onde promette dar origem a uma industria importante, lá vae cami- nho da Ásia apresentar-se aos súbdi- tos do Mikado. A Commissão japoneza na exposição de Vienna, admirada dos grandes resultados obtidos com a cultura d'e3ta preciosa planta, tractou immedia- tamente de adquirir semente3 e contra- ctar homens para irem introduzir a cul- tura d'e3ta planta no Japão. — O dr. Mac Nab, que se tem appli- cado ao estudo do movimento que a agua tem no interior das plantas, acaba de publicar nas «Transactions of the Royal Irish Academy» o resultado das suas ex- periências. Das suas conclusões vamos dar um re- sumo. Em condições favoráveis, a ascenção da agua no caule de uma planta pôde chegar a um metro. Em contrário á opinião geral, a cor- rente ascendente não cessa á noute. O facto de parar a transpiração, o que se obtém pondo a planta na obscuridade, não atraza a rapidez da corrente. A ablação ou arrancamento dos tecidos corticaes não interrompe a corrente no caule, fazendo-se a sua passagem somente pelos canaes fibro-vascidares. Uma corrente ascendente rápida ve- rifica-se n'um caule mesmo depois de ar- rancadas as folhas. O movimento dos liquides de cima para baixo faz-se com cgual rapidez. A pressão do mercúrio não exerce ne- nhuma influencia na rapidez da corrente. É de crer que o dr. Mac Nab conti- nue as suas experiências, que são extre- mamente curiosas sob o ponto de vista sciontifico. Oliveira Júnior. JOENAL DE HORTICULTURA PRATICA 101 LOUVOR IMMERECIDO Do «Cultivateur de la région lyonnai- se» vamos traduzir o relatório apresen- tado á Associação Horticola Lyonnesa, por uma commissão de que foi relator Mr. Cenas, a propósito do nosso «Jornal de Horticultura Pratica» : «Primeiro que tudo devemos pedir- vos perdão da demora que tivemos em vos apresentar o parecer acerca do jornal horticola, publicado no Porto pelo snr. José Marques Loureiro, sob direcção e principal redacção do snr. Oliveira Jú- nior. Circumstancias independentes da nossa vontade foram a causa única de adiar este trabalho. Este jornal é um dos que não podem ser analysados sem prejudicar o seu me- recimento. Os artigos que o compõem, tratando alternadamente das generali- dades agrícolas, da floricultura, da po- mologia, da horticultura, dos insectos damninhos, etc, etc, são todos escriptos com tanto cuidado, talento, clareza, con- cisão, que seria preciso, para vos pôr em estado de apreciar o merecimento d'esta espécie d'encyclopedia horticola, tradu- zir todos os artigos e oíferecer-vos assim a sua leitura. Posto que pouco familiarisa- do com a lingua portugueza, tentaremos fazel-o, de quando em quando, em pro- veito do nosso «Cultivateur». A cultura horticola occupa n'esta col- lecção todo o logar que merece. Os jar- dineiros e publicistas portuguezes com- prehendem melhor que nós que o útil e o necessário não devem ser postos de parte á custa do agradável. Uma bella rosa, uma Camellia, um bonito vaso, tu- do isto tem os seus encantos, mas para 03 gozar é preciso não ter o estômago vasio. A similhança dos portuguezes, não abandonemos, pois, a arte de cultivar os legumes. Não contente de fallar de todas as cousas horticolas, o jornal de que nos occupamos não se esquece também dos homens que deixam este mundo depois de n'elle terem prestado serviços á cul- tura e á jardinagem. Retrata-íhes a vi- da, falia dos seus trabalhos, e assignala o bem que praticaram estes obreiros do Vol. VI.--1875 campo, do jardim ou da litteratura. O que a penna do redactor ou dos collabo- radores não pôde completar, completa-o o desenhista n'um retrato bem executado. Esto jornal é impresso em caracteres typographicos irreprehensiveis e em ex- cellente papel. O texto é acompanhado de numerosas gravuras e estampas colo- ridas representando plantas novas, flo- res raras, legumes de valor, fructos es- timados, instrumentos de cultura, inse- ctos e animaes damninhos, plantas de jardins, construcçoes rústicas, etc, etc. Estas gravuras e estampas coloridas tem a precisão, o aceio, o esmero, n'uma palavra, o cunho artístico, de que os nos- sos desenhadores e pintores francezes muitas vezes se esquecem. Terminamos, pois, senhores, propon- do-vos : 1." — Dirigir aos snrs. Oliveira e Lou- reiro, redactor em chefe e proprietário d'este jornal, todos os nossos agradeci- mentos pela remessa que se dignaram fazer-nos ; 2." — Pedir-lhes o obsequio de conti- nuarem a dirigir-nos os números á pro- porção que se forem publicando, oíFere- cendo-lhes em troca o «Cultivateur»; 3." — Oíferecer a estes senhores o ti- tulo de membros correspondentes da nos- sa Associação; 4." — Conferir ao «Jornal de Horticul- tura Pratica» a maior recompensa de que possaes dispor. Os membros da commissão : Cousan- çat, Joly pae, Rohner e Cenas, relator.» Este parecer é demasiadamente lison- geiro e só podia ser exarado por uma penna muito benévola. Folgamos, não por nós, mas pelo paiz, que lá fora se registrem com louvor os trabalhos da horticultura portugueza, e isto nos servirá de incentivo a proseguir com aífinco na nossa empreza. A Sociedade Horticola Lyonnesa e em particular a Mr. Cenas, enviamos d'aqui os nossos votos d'estima e reconhecimento, procurando corresponder o mais possivel ao lisongeiro conceito em que tiveram o nosso jornal. Oliveira Júnior. N.» 6— Junho 102f JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA O MELHOR PÃO Todos se queixara do elevado preço a que 03 alimentos técm cheirado nos últi- mos anno.^, e sendo um d'elle3 o mais ne- cessário de todos, o pão, desperdiçamos annualmcnte milhões de matéria purifica- vcl. Este desperdicio é devido em gran- de parte ;l moda e ao grato efFeito que produz á nossa vista a alvura do pão, e também ao desprezo e ignorância das leis da sciencia. A alimentação mais própria á nutri- ção do homem ó aquella que contém maior numero de substancias nutritivas precisas á vida. Sabemos que o leite contém ao mesmo tempo uma alimentação animal e ve- getal adequada ao sustento da infância. Os cereaes são para os adultos o mes- mo que o leite para as crianças ; contéem uma alimentação vegetal e animal, com a differença única de que, nos cereaes, esta alimentação estcá separada, emquan- to no leite está junta e combinada, O branco do trigo, que é o interior do bago, compõe-se principalmente de fécu- la; o erabrvão, os invólucros, as células e a casca da semente contéem glúten, branco do ovo (albumina), phosphatos, gorduras e outras mais substancias nu- tritivas. Pela acção da moagem rcduz-se o in- terior do trigo a farinha, e as outras par- tes a miudezas, taes como rolão, cabeci- nha e semea. D'aqui deduz-se que, quanto mais es- poada é a farinha, tanto mais pobre é em glúten e nas outras substancias nu- trientes. As miudezas do trigo contéem 13 p. c. de glúten e 26 p. c. de fécula, e além d'isso contéem cinco vezes mais a quantidade de phosphatos e mais três vezes a quantidade de gorduras que a farinha e-600 até 36/5.000 reis. Em Cabeceiras de Basto a differença de qualidade é tal que o preço varia de 12ói000 a 60;)000 reis a pipa. Em Espozende o preço da pipa de 30 almu- des é de 30)^000 reis. Em Guimarães o vinho de exportação para o Brazil regu- la por 50?$Í000 reis. Esta elevação de preços, que não está em harmonia com o custo da producção, nem com a qualidade mais geral d 'estes vinhos não se pode explicar, senão pelo largo e certo consummo que tem na pró- pria região da sua producção. — E este largo consummo provém de que o vinho verde é ao mesmo tempo uma bebida e um alimento para o camponez ; alimen- to de calor, e alimento de nutrição, jun- tando a isto não embriagar tão facilmen- te como fazem os vinhos maduros e al- coólicos de outras regiões. J. I. Ferreira Lapa. 110 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA PROPAGAÇÃO DA GAIELLIA A reproducção da Camellia mereceu > desde longo tempo 03 assíduos desvelos dos mais insignes horticultores e amado- res. O grande mérito d'e3ta Rainha do inverno tem despertado o desejo de lhe applicar todos os meios possíveis de pro- pagação. Fassemol-03 em revista, e o modo de 03 executar. Enxerto por approximação — O enxer- to por approximaqào, o mais antigo e o de mais fácil execução, foi o que primei- ramente se empregou na reproducção da Camellia. Este enxerto pôde executar-se em to- das as estações, mas a melhor é a de março, em que começa o movimento da seiva. Pratica-se fazendo uma entalha vertical no cavallo do comprimento de 1 a 2 centímetros, segundo a sua capa- cidade, separando o alburno e entrando alguns millimetros na parte lenhosa, e outra entalha egual no ramo da Camel- lia que se pretende reproduzir; ajusta- se o cavallo ao ramo, de forma que a epiderme d'um e outro fiquem bem uni- das, ligam-se depois com um vime ou melhor com uma tira de esteira de Ri- ga. No fim de seis mezes estão perfeita- mente adheridos e podem destacar-se; esta operação porém não deve fazer-se d'uma só vez, deve durar um mez, cor- tando-se aos poucos de oito em oito dias. Enxerto de placage — A grande voga que tomou esta beliissima planta e o im- menso commercio a que deu logar, mos- trou a insufficiencia d'este primeiro en- xerto, porque a demora de seis mezes era demais para acudir ás necessidades dos pedidos. Os engenhosos horticultores belgas ima- ginaram o enxerto de jjlacage, feito em estufa, e conseguiram formar uma plan- ta dentro do curto espaço de 20 dias. Abre-se no cavallo uma entalha ver- tical do comprimento d'um centímetro, do mesmo modo que no enxerto por ap- proximação, separando o alburno e al- guns millimetros da parte lenhosa, cor- ta-se da Camellia que se pretende repro- duzir um rebento do anno anterior, e deixando-lhe apenas duas folhas com dous olhos, prepara-se o garfo com o en- xertador em forma de faceta, que ajus- te perfeitamente na entalha do cavallo ; liga-se com fio de lã, e submette-se á es- tufa, conservando-lhe um calor regular de 2õ graus centígrados. No fim de 20 dias está soldado, e só resta dispor o en- xerto pouco a pouco para sahir ao ar li- vre, devendo conservar-se á sombra até que desenvolva os primeiros renovos. Enxerto de fenda — Mr. Soulange Bo- din, horticultor de Fromont, prés Ris, França, executou em grande escala na Camellia o enxerto de fenda. Faz-se a operação pela mesma f ')rma que se faz a das Pereiras ao ar livre. Corta-se o cavallo 4 millimetros aci- ma d'uma folha acompanhada d'um bom olho, que servirá para attrahir a seiva, fende-se o cavallo a dous terços da sua espessura e introduz-se o garfo, que de- ve ser cortado em forma de lamina de canivete, mais grosso do lado de fora e delgado do lado de dentro, terminando em ponta aguda; liga-se com fio de lã, e cobre-se a chaga do cavallo com un- gui-Jito resinoso, havendo a cautela de o não chegar ao lado da fenda, porque po- dia obstar á soldadura. Este enxerto é submettido á estufa como o de jílacage, os vasos devem ficar enterrados na casca mas em posição ver- tical. Dentro de seis semanas está per- feitamente soldado e tem a vantagem de poder empregar-se um garfo de um olho apenas. Eu tenho a satisfação de ser o primei- ro que ensaiei em Portugal estes dous systemas de enxertos, e com vantagem tal que cheguei a reunir cinco mil exem- plares dentro de dous annos. Estes dous meios são inquestionavel- mente os mais vantajosos para aquelles que dispõem d'uma estufa nas condições precisas e que pretendem tirar vanta- gem das suas reproducções. Como porém nem todos téom esses meios, descreverei outros dous systemas de propagar a Ca- mellia ao ar livre. Enxerto ao ar livre do barão Tschuody JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 111 — O barão Tschuodj, distincto ama- dor de arboricultura em França, deixou entre 03 seu? numerosos escriptos inédi- tos sobre arboricultura o seguinte modo de enxertar ao ar livre qualquer arvore ou arbusto : Corta-se o cavallo na proximidade do ponto em que se pretende fazer o en- xerto, reservando um pequeno ramo com o destino d'attratLÍr a seiva ; todos os ou- tros ramos devem ser supprimidos. Faz- se no cavallo uma entalha vertical^ como no enxerto por ajyproximação, 6 ou 8 centímetros abaixo do corte. Escolhe-se um ramo vigoroso da arvore que se pre- tende reproduzir, separando-o da mãe com uma haste de 20 a 30 centímetros de comprimento ; faz-se n'elle uma enta- lha vertical idêntica á do cavallo, ajus- ta-se, liga-se, cobre-se com unguento re- sinoso e mergulha-se em um vaso com agua, como se vê na gravura 23, a parte inferior da haste. A agua deve ser re- novada frequentes vezes. O garfo tira da agua os fluidos aquo- sos que lhe são necessários para entreter a sua vegetação, até que soldado ao ca- vallo possa viver á sua custa. Logo que o enxerto esteja soldado de- vem supprimir-se os ramos do cavallo, cortando-os por duas ou três vezes, e na primavera seguinte corta-se rente ao en- -^iSáí^wí^ Fig. 23 — Enxerto ao ar livre — systema barão Tschuody xerto a parte superior do mesmo ca- vallo. Este systema applicavel a todas as ar- vores é egualmente applicavel á Camel- lia. O meu particular amigo e distincto amador o ex."'° snr. António Augusto Cabral de Sousa Pires, digno juiz de di- reito de Villa Nova de Famalicão, ha três annos que pratica este enxerto, le- vando garfos das melhores variedades da minha collecção, e diz-me que tem conseguido pegarem-lhe na razão de 80 por cento. D'aqui já se vê que o syste- ma é vantajoso. Fig. 24 — Enxerto de Camellia ao ar livre — systema Cornélis Enxerto ao ar livre de Cornélis — Mr. Cornélis, hábil jardineiro do visconde Vigier em Nici, França, descobriu ou- tro meio fácil de enxertar a Camellia ao ar livre, operando da seguinte forma: No meado de fevereiro decepa o ca- vallo acima d'um pequeno ramo, que serve de attractivo á seiva, enxerta de fenda com um ou dous garfos pelo mo- do usado geralmente, liga, cobre com unguento resinoso, encaixa depois o en- xerto em um vidro de bocca larga, como indica a gravura 24; e para o segurar e evitar a introducção do ar envolve o 112 JOENAL DE HORTICULTURA PRATICA ramo enxertado em um pouco de musgo humedecido e prende tudo com uma gui- ta; para interceptar os raios directos do sol cobre o vidro com uma follia de pa- pel branco. Por este meio Mr. Cornélis tem con- sesTuido transformar Camellias velhas de variedades antigas, fazendo-as produzir bellissimas flores das novidades mais ra- ras. Eis aqui téem os amadores todos os systemas empregados até agora para re- produzir tão formoso arbusto; ou com todos ou cada um d'elle3 poderão formar riquíssimas coUecções. Camillo Aureliano. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A NOVA MOLÉSTIA DAS VINHAS ' Voltando agora a fallar dos trabalhos feitos pela commissão nomeada pela So- ciedade Linneana de Bordéus, não po- demos negar que sejam importantes, com- quanto não dêem a luz que todos os in- teressados aguardam com impaciência. O relator é o nosso amigo Mr. H. Tri- mouiet, bem conhecido entomologo fran- cez e d'elle recebemos recentemente a segunda e terceira memoria sobre esta questão, em que é o primeiro a reconhe- cer que a commissão não se deveria li- mitar a escrever relatórios, mas sim a fazer experiências e ensaios numerosos. Uma razão superior a tudo não permit- tiu á commissão cumprir esse artigo do programma — foi a falta de fundos. Nas conclusões que a commissão tira do que observou, encontra-se o seguinte na sua segunda memoria: «Desde que escrevemos esta memo- ria, a moléstia continua a augmentar no nosso departamento. Entre-dcux-Mers, Saint Emilionais, c Castillonais, estão quasi completamente invadidos e a mar- gem esquerda do Garonne também co- meça a mostrar-se aífcctada. Ainda não se empregou nenhum remédio que se po- désse considerar sério e efficaz.» Agora nas conclusões da terceira me- moria lê-se isto, que amargamente vamos transcrever. 1.° — Que a moléstia tom sempre au- gmentado desde que principiou (*); 2." — Que até hoje ainda não se en- (1) Em 11 de setembro do anno passado es- crcvia-nos Mr. II. Trimoiilet : «A moléstia está canhando muito terreno.» Por outro lado escre- via-nos approximadamente na mesma data Mr. L. Laliman e exprimia-scn'cstes termos: «Nào é só no Gironde que a moléstia augmcnta, mas sim quasi por toda a França.» centrou cousa alguma que a combatesse ou que sequer interceptasse a sua mar- cha ; 3." — Que a introducção de cepas ame- ricanas em grande quantidade seria a perda dos vinhedos do Bordelais. E este o triste estado em que se acham hoje os estudos da nova moléstia das vi- nhas. Continua todavia a grande discus- são sobre a pedra fundamental para os meios d'ataque — o Phijlloxera é causa ou effeito ? Ambas as theorias encontram abalisados contendedores, a ponto de pa- recer que não se defendem convicções mas sim caprichos. Os phvUoxeristas não querem ceder e os seus adversários tam- bém não, e apesar de ser da discussão que nasce a luz, receiamos que o capri- cho não a deixe penetrar tão rapidamen- te quanto poderia se todos trabalhassem de commum accordo, convergindo as suas ideias para o mesmo fim. O illustrado entomologo, Mr. Trimou- let, defende habilmente as theorias da commissão a que pertence e apresenta 03 factos que mais á evidencia provam que o insecto é ejfeito e não causa, e ain- da nas conclusões da sua terceira memo- ria nos diz a propósito de remédios : — «Os insecticidas não dei'am re-sultado al- gum em todas as partes onde foram en- saiados, o que não podia ser d'outro mo- do visto que o Plvjlloxera não é a causa da moléstia. Pela mesma razão, os adu- bos bom applicados e a boa cultura de- ram bons resultados quasi por toda a parto. » Quando primeiro estudamos a questão, acceitamos de boamente a theoria dos phylloxeristas, não só por ser talvez a (1) Vide J. H. P., vol. VI, pag. 86. JORNAL DE HORTICULTUEA PRATICA 113 mais fácil de comprehender-se, mas tam- bém porque os auxiliares que então ha- via para esse estudo todos nos pareciam evidenciar que a morte das cepas era causada unicamente pelo pequeno apte- ro. Errare humanum est! A visita aos terrenos affectados e uma observação mais detida desvaneceu-nos, porém, em pouco tempo a tlieoria que haviamos for- mulado e expendido, apesar de ainda hoje não pormos duvida em dizer que o Phylloxera em crescido numero pôde ma- tar uma cepa, como alguns insectos mi- croscópicos poderiam matar um homem desde o momento que elle se conservas- se inerte. E isto ninguém o duvidará examinando as raizes de uma Videira affectada, todas cobertas de uma camada de parasitas, que com os seus sugadoiros applicados constantemente ás raizes deve- rão acabar por exhaurir a planta, produ- zir o seu definhamento, e por fim a morte. Isto parece-nos fora de toda a duvida e só por espirito de contradição é que se poderia entrar em discussão, sendo comtudo certo que estamos longe de ima- ginar que uma meia dúzia de Phylloxe- ras fosse capaz de destruir uma cepa, a não ser que elle seja dotado d'um virus que, inoculado no vegetal, produzisse o effeito que no homem produzem as pica- duras de certos insectos. E quem nos af- firma que o insecto, em troca da seiva nutritiva que extrahe das plantas, não lhes infiltra porventura um veneno cor- rosivo que as desorganisa e mata? E caso que ainda não se averiguou, apesar dos pequenos bolbilhos ou intumescên- cias das raizes denunciarem uma altera- ção notável na vida da planta. Coincidiu a descoberta da nova mo- léstia com o apparecimento d'um insecto denominado Phylloxera. D'este paralle- lissimo, naturalmente, sem mais detido exame, se concluiu que o novo aptero era o causador do mal. Formada esta opinião, não téem muitos dos seus pri- meiros adeptos desistido de a confessar como verdadeira. O estudo dos costumes e do organis- mo do insecto parece que deveria forne- cer uma prova evidente. Os entomolo- gistas, porém, ainda não decidiram em ultima instancia. Uma experiência poderia ser definiti- va, realisada nas verdadeiras condições. Adoece por ventara uma vinha vigorosa quando se põe em contacto com os Phyl- loxerasí Sim, dizem uns; não, respon- dem outros, como Mr. Trimoulet, que affiança que uma cepa nada soíFre. Entre nós não sabemos de quem te- nha tentado experiências d'esta natu- reza. Ha ainda outra coincidência. Onde primeiramente se notou o mal foi nas proximidades das regiões onde as Videi- ras americanas eram cultivadas. No no- vo continente também existe o já hoje famigerado aptero, se por ventura é exa- ctamente o mesmo, como o pretende Mr. Planchon, que recentemente foi enviado á America para averiguar se haveria duas espécies ou uma só. A doença no- va achava explicação n'um parasita no- vo. Era elle o elemento morbifico impor- tado com as cepas americanas. Ora deu-se também entre nós o facto de que foi em vinhedos onde existiam cepas americanas que primeiramente se descobriu a moléstia. Essas vinhas per- tenciam á quinta do snr. Lopo Vaz de Sampaio. Mais uma attracção para nos arrastar na torrente dos phylloxeristas. Hoje, porém, não só os trabalhos fei- tos em França (*), mas as nossas pró- prias pesquizas nos levam á conclusão de que o Phylloxera vastatrix não foi importado para Portugal nas cepas ame- ricanas, e para podermos aventar agora isto temos as palavras da primeira victi- ma da moléstia em Portugal, o snr. Vaz de Sampaio, que nos diz : «Em 1862 mor- reram na minha quinta quarenta ou cin- coenta cepas das variedades indígenas. No seu logar foram logo plantadas ou- tras que seccaram também e só de 1863 para 1864 é qae nas minhas proprieda- des foram introduzidas as espécies ame- ricanas.» Para alguém talvez que isto ainda não (1) Faremos especial menção d'um opúsculo que está em via de publicação e de que nos man- daram as provas : «Enquête sur les cepages Americaines dans les departements vinicoles et partout ailleurs, relativement a Forigine et aux ravages exerces par le Phylloxera vastatrix», de que é relator Mr. Froidefond. 114 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA fosse sufficientemente concludente, mas sel-o-ha desde que se diga que fomos in- formados em Gouvinlias de que aquellas Videiras americanas tinham ido em ba- cellos d'um jardim do Porto annexo á residência de um negociante inglez (Har- ris). O Phjlloxtra habitando as folhas e as raizes, não havendo nos bacellos nem uma cousa nem outra, não se nos afigu- ra que elle fosse de modo algum trans- portado por este meio. E o que acontece aos vinhagos pro- priamente da Regoa, onde, como na pro- priedade do snr. Diogo de Macedo, ha cepas americanas ? Ahi não encontramos sequer o menor vestigio da presença do insecto. Arrancaram-se cepas em todos os estados, mas em nenhuma encontra- mos aquelles habitantes. A illação que hoje podemos, pois, ti- rar dos factos por nós mesmos coUigidos é : que o Phylloxera não foi importado da America para Portugal. Viria de França? É possível. Será natural de Portugal e mesmo de toda a Europa? Não dizemos que não, porque a fauna universal está muito lon- ge da perfeição, e o assumpto, pelo que respeita á historia natural, não tem sido bem estudado, principalmente no nosso paiz. Ha um ponto sobre que devemos cha- mar muito particularmente a attenção dos nossos cultivadores, que na genera- lidade suppomos não o téem observa- do, mas que nós e os nossos collegas da Delegação tivemos occasião de exa- minar quando em commissão fomos ao Douro. Em quasi todas as cepas arrancadas e estudadas, apresentava-se o caule muitas vezes sem mostrar a minima alteração nos seus tecidos, mas, chegados que fos- semos ao sitio onde um ramo mais ro- busto houvesse sido podado, encontrava- se uma cicatriz produzida pelo ci)rte e n'essa cicatriz tinha origem uma decom- posição dos tecidos que descia até á raiz cora mais ou menos intensidade, partin- do da meduUa para o corpo lenhoso. Aqui está por exemplo uma das rápi- das analyses que fizemos n'um exemplar arrancado em Valle da Ermida: Cepa emmangericada, segundo a desi- gnação dos agricultores d'aquellas loca- lidades. Ramos (máximo) 0'^,25, com manchas de oidium. Folhas muito pequenas. Fructificação, nulla. A extremidade (indo de cima para baixo) do caule achava-se em bom es- tado ; Cortado a O", 22 mais abaixo, encon- trava-se sem a menor alteração nos teci- dos ; Maií abaixo 0"\10, no sitio em que se tinha amputado um ramo, apresentavam- se alguns pontos pretos no alburno e no cerne ; Examinando O'", 05 mais abaixo, no sitio em que tinha sido podado outro ra- mo importante, encontrava-se a medulla em principio de decomposição; o cerne e o alburno com grande mancha preta, formando quasi um circul"o em volta do canal medullar; Por todo o tecido lenhoso encontra- vam-se uns pequenos pontos pretos. A casca estava toda em bom estado. Passando a examinar a raiz, encon- tramol-a no mesmo estado em que se achava a parte do caule ultimamente descripta. A casca comtudo achava-se despega- da, esphacelando-se em alguns sities ao menor toque com os dedos e mostrando pela parte interna manchas brancas, que com a simples applicação da lente pare- ciam saes. A Commissão Central de Lis- boa, á qual foram remettidas algumas cepa^, de certo que já determinou o que era. A primeira vista lembramo-nos se seria alguma Cri/ptogavnca. As radiculas, da cepa que temos vin- do descrevendo, eram abundantes, mas estavam quasi mortas. D'este passageiro estudo a que proce- demos por mais d'uma vez e era mui dif- ferentcs localidades, encontrando por ve- zes os caracteres muito mais accentua- dos, concluimos que a decomposição tinha marchado, na maioria dos casos, de ci- ma para baixo e d'estes factos deprehen- dcmos que a operação da poda exigia a máxima attenção da parte dos cultiva- dores e que o corte d'um ramo robusto, indo alterar o estado e marcha normal JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 115 do vegetal, deveria evitar-se todas as ve- zes, e quando por uma circumstancia qualquer não se podésse evitar, fazer então o corte com ferro bem afiado para perturbar o menos os canaes e applicar logo em seguida o unguento de S. Fiacre ou outro que a experiência tenha acon- selhado. E comtudo curioso que o lavra- dor prático, quando poda o ramo de qualquer arvore, cubra instinctivamente com terra humedecida a carne viva que fica e que não faça o me^mo á Videira! A terra de pouca utilidade pode ser, por- que serve apenas de protecção momen- tânea, mas demonstra que o lavrador não desconhece completamente que aquella amputação precisa de ser resguardada do contacto do ar, como se a operação tivesse sido feita na perna ou no braço de um homem. No Douro tractam as Videiras como se estivessem isentas das leis que regu- lam tudo quanto tem vida. Fazem um corte e querem que a natureza se encar- regue de cicatrizar a ferida. A máxima «trabalha e Deus te ajudará» é de certo verdadeira, mas é preciso que o homem não entregue tudo nas mãos da Provi- dencia, deixando de observar attenta- mente a natureza. Um dos unguentos mais communs na horticultura para tapar as feridas pro- duzidas pelo corte é o que consta da for- mula que em seguida apresentamos : Pez negro 28 partes Pez de Borgonha 28 » Cera amarella 16 » Sebo 14 » Cinza peneirada 14 » Total 100 » Ha também o unguento denominado «Weigmann», que é auctorisado pela ex- periência de longos annos. Compoe-se simplesmente de carvão reduzido a pó muito fino e misturado com alcatrão. Ap- plica-se n'uma pequena camada cobrin- do esta depois com terra bem sêcca. Este unguento protege perfeitamente a ferida e impede a podridão por causa da creo- sota'que existe no alcatrão^ que é um an- tiseptico poderoso. O unguento «Cadet» é egualmente aconselhado para cicatrisar as chagas das arvores. Prepara-se do seguinte modo, Toma-se : Areia siliciosa 1 parte Cal extincta 1 » Gesso cozido ou crú 2 » Cinzas de madeira 2 » Pó de carvão 1 » Húmus ou terriço 2 » Terra argillosa 3 » Excremento de cavallo 1 » Excremento de vacca 3 » Palha miúda 4 » — » Total 20 » Reduzem-se a pó todos os corpos sóli- dos, juntam-se e depois peneiram-se. Os excrementos de cavallo e vacca dissol- vem-se em ourina e junta-se-lhes a terra peneirada e a palha miúda. Mistura-se bem com espátula de pau e dá-se á mas- sa uma consistência molle, devendo ha- ver o cuidado de ter-se este unguento ao abrigo do ar para que não seque. Antes de applicar este unguento corta-se á planta toda a madeira velha, limpam-se, e lavam-se as feridas com agua de estru- me á qual se addiciona uma pequena quantidade da composição. Feito isto ap- plica-se com uma brocha o mencionado composto. Qualquer d'estes preparados está no caso de poder servir para o effeito que aconselhamos, comtudo o primeiro tal- vez seja o que melhores resultados pro- duza. E pois urgente, urgentíssimo diremos, cortar o abuso da poda de ramos já des- envolvidos sem applicar logo em seguida o unguento. Estas ulceras, curadas im- mediatamente, não téem consequências graves, ao passo que deixando-as expos- tas á acção do ar acabam por produzir caria mais cedo ou mais tarde, tornando- se inevitável a morte da planta. E tão somente questão de tempo. Quando dizemos no periodo acima que as ulceras curadas immediatamente não téem consequências graves, quer-nos pa- recer que não nos exprimimos bem, por- que de gravidade julgamos nós todas as 116 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA amputações, olhadas pelo lado physiolo- gico. Mas como a poda é necessária pa- ra obrigar o vegetal a dar uma íructiíi- caçào mais abundante do que daria sem cila, devemos empregar os citados un- guentos que minoram os resultados per- niciosos dos ctjrtes. Muitas vezes temos admirado o vigor, a robustez e a rusticidade que devem ter as Videiras para poderem resistir ás no- vas mutilações que lhes fazem todos os annos. (Contimla). Oliveira Júnior. GHROIÍIGA HORTIGOLA-AGRICOLA Em S. Miguel vae-se tractar seria- mente da cultura do Chá, e como já dis- semos ha tempos prevemos que estas ex- periências darão o melhor resultado. O snr. Ernesto do Canto, cavalheiro de muita illustração e dedicadíssimo pe- ias questões agricolas, tem-se empenha- do em que esta ideia não fique simples- mente em projecto e segundo a. sua pro- posta tomaram-se as seguintes delibera- ções, n'uma das ultimas sessões da So- ciedade de Agricultura Michaelense: 1.° — Que se pôde desde já contar com ÕOO^OOO reis ofterecidos pelo governo, 325;5>000 votados pela Junta Geral do Districto como donativo á Sociedade no anno corrente, e mais 325.íi000 reis que a Junta Geral na sua próxima sessão por certo se não recusará a votar, o que dá uma verba segura de 1:1Õ0:>000 reis; 2.° — Que também se pôde addiccionar a esta quantia o que se entender neces- sário para prefazer a somma que as des- pezas urgentes exigirem, visto que tan- to na assembleia geral de 30 de novem- bro de 1873 como na de 26 d'outubro ultimo os sócios presentes se compromeí- teram a quotisarem-se para este fim; 3.° — Que se proceda desde já a con- tractar na China um, ou quando muito dois trabalhadores habilitados para a cul- tura e manipulação do Chá; 4." — Que se fixe a despeza resultan- te d'e3se contracto n'um máximo de 300 libras esterlinas para ordenados, utensílios, sementes e mais verbas de despeza occorrentes; 5.° — Que se inste para que a vinda d'e33e operário tenha logar na próxima primavera e em navio do Estado; mas no caso de não se obter a sua passagem gratuita por este meio, que cila seja por preço tal que não exceda o valor total das 300 libras votadas para despezas. 6." — Que no caso de não se poder fe- char o contracto a tempo de estarem aqui na próxima primavera o individuo ou individues engajados, e demorando- se portanto a sua vinda, se peça que sejam remettidos 200 a 300 litros de semente de Chá de primeira qualidade, e isto com a máxima brevidade possível. Pelo que acaba de ler-se, vê-se que ha verdadeiro empenho em realisar-se tão louvável pensamento, como é o da cultura do Chá na Europa. Os nossos parabéns aos iniciadores de tão meritória missão. — Por intermédio do snr. Eduardo Katzenstein, cônsul da Allemanha n'esta cidade, foi-nos enviado o programma pa- ra uma Exposição Internacional de Hor- ticultura que se deve roalisar em Coló- nia em 1875, promovida pela Sociedade Hortícola denominada «Flora», sob a protecção de Sua Magestade a Impera- triz da Allemanha, rainha da Prússia e de Sua Alteza Real o Príncipe herdeiro do Império da Allemanha e do reino da Prússia. Para esta grande festa hortícola fa- zem-se grandes preparativos, e espera-se que seja uma das mais brilhantes. Segundo o programma a exposição comprehenderá : I — Jardinagem. II — Productos hortícolas. III — Architectura de jardins. IV — Ornamento de jardins. V — Utensílios de jardinagem. VI — CoUecções hortícolas. VII — Fructos, flores e plantas arti- ficiaes. VIII — Litteratura hortícola. O dia da abertura da exposição foi fixado para 2Õ de agosto e o encerra- mento para 2ò de setembro. Deve ser uma festa brilhante. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 117 — Na junta geral do districto houve debate bastante acalorado acerca da ver- ba de 4:0006000 reis annuaes, que pe- dia a Sociedade agricola para o Cítabele- cimento de uma quinta regional modelo. Esta quantia serviria de garantia e amortisação a um empréstimo levantado para realisar aquelle intento. A commissão de fazenda da junta ge- ral do districto achou excessiva a verba e propoz a de 1:600,;:$Í000 reis, que sup- poz sufficiente. O snr. Germano Vieira de Meirelles combateu o parecer da commissão, que foi a final approvado. Nós estamos do lado do snr. Meirel- les, todavia se o cofre do districto se não julga habilitado para maiores sacrifícios — que lhe havemos de fazer? Com similhante verba é impossível manter-se uma quinta regional, que pos- sa servir de modelo. No emtanto, se hou- ver perseverança e boa direcção por par- te da Sociedade agricola é de crer que em não remoto futuro e depois de averi- guada experiência, a junta geral recon- sidere e alargando os cordões á bolsa re- conheça emfim que não é com esmolas que se levanta a nossa agricultura. — Algumas pessoas têm-nos escripto a pedir para serem inscriptas no nume- ro dos assignantes do «Manual de Ar- boricultura», de que é auctor o snr. Ale- xandre de Sousa Figueiredo e que está em via de publicação. Cumpre-nos declarar que nada temos com esta publicação e que os interressa- do3 dever-se-hão dirigir ao editor Ernes- to Chardron, a quem fizemos entrega de varias quantias que nos foram enviadas para pagamento de assignaturas d'e4a obra. — A exposição realisada este anno em Gand, pela Real Sociedade d'Agricultu- ra e de Botânica, foi de pequena impor- tância. Um Pandanus Van Geerti de IMr. Aug. Van Geert, uma Zamia Roezli de Mr. Linden, um Imantophyllum obtido de semente por Mr. De Saegher, uma Bcrtolonia Marchandi, receberam meda- lhas de prata e uma Cyathea da Nova Zelândia exposta por Mr. Jean Verschaf- felt foi premiada com a medalha de cobre. — O snr. José do Canto, um dos mais abastados e intelligentes proprietários da ilha de S. Miguel, escrevia ultimamente a um nosso amigo os períodos que em seguida inserimos: Parece-mc haver já noticiado que em 26 de outubro passado um furacão que passou em dia- gonal atravez do meu jardim, me destruiu as plantas com que mais me desvanecia; logo em G do novembro um cyclone destruiu -me nas fur- nas uns 17 hectares de matta, em que não es- capou uma só arvore, afora outros estragos par- ciaes no resto da propriedade. Para reparar os estragos soffridos, e conti- nuar com as cousas correntes, tem-me sido ne- cessário desenvolver extraordinária actividade, e ainda assim não tenho podido satisfazer a to- dos os meus deveres. Com effeito dirijo eu próprio plantações em grande ponto, em três ditferentcs localidades c a grande distancia da minha habitação em Pon- ta Delgada ; dirijo também a cultura de três lavouras, das quaes uma é assaz extensa, e de que dependem gados de bois e de ovelhas. Es- tou construindo uma granja e reconstruindo o meu jardim. Oxalá que o snr. José do Canto veja recompensados os seus trabalhos e que não venha um novo furacão destruir a sua obra. A ilha de S. Miguel é hoje afamada pelos seus jardins e plantações, e o snr. José do Canto é um dos mais notáveis, senão o mais notável cultiva- dor não só das ilhas mas do continente portuguez. — Ò snr. D. J. de Nautet Monteiro faz-nos a seguinte pergunta á qual é de crer que possam responder os que se de- dicam particularmente á cultura das Or- chideas: «Onde se pôde obter em Portu- gal turfa fibrosa própria para as Orchi- ãeash) — Está no prelo e consta-nos que se- rá posto á venda brevemente um pre- cioso livro devido á penna de um dos homens mais eminentes, em oenologia, do nosso paiz: o snr. visconde de Villa Maior. A sua obra tem por titulo «Manual de Viticultura Pratica», e formará ura volume de mais de 500 paginas em 8.°, illustrado de muitas gravuras. Agouramos um bom acolhimento a si- milhante publicação. O nome do auctor que a firma é conhecido de sobra para que careça de encómios, e portanto só desejamos que a nova obra appareça quanto antes. 118 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA — Sua Magestade El-Rei o senhor D. Luiz I honrou, ha dias, com a sua vi- sita o estabelecimento horticola do snr. Luiz de Mello Breyner, em Lisboa. — N'ura artigo que temos em nosso poder — Estudo sobre o género Citrus — e que publicaremos brevemente, encon- trará o nosso amigo, o snr. Jules Meil, as informações que particularmente noá pediu. — Os amadores de rosas téem agora boa occasiao de fazer a sua escolha. No estabelecimento do proprietário d'este jornal vimos ha dias uma magnifica col- lecção de Roseiras, quasi todas em flor. Parcce-nos que podemos afoutaraente afiançar que é a coUecçrio mais rica da península e convidamos os apaixonados a visitarem-n'a, na certeza de que não darão por mal empregado o tempo que n'isso gastarem. Entrada franca todos os dias, excepto sanctificados. — A propósito do que escrevemos n'um dos números passados sobre a cultura das Quinas ao ar livre no nosso paiz, diz-nos o que se segue o snr. dr. Júlio Augusto Henriques : Einquanto á cultura das Chichonas ao ar li- vre já tem sido experimentada por vezes. Dei, ha annos, algumas plantas para o Algarve. Mor- reram. Aqui passaram este anno todo o inverno dous i^és ao ar livre. Um perdeu as folhas, mas está a principiar a rebentar : o outro conservou as folhas. Esta experiência faz com que n'este anno se tente um pouco mais e tenciono man- dar algumas para o Algarve. Já vê que a sua lembrança nào vae para os papeis velhos c que já por cá se tinha feito al- guma cousa. Estimamol-o deveras e desejaremos que as experiências se repitam, porque os fa- ctos referidos pelo nosso colhiborador dei- xam presumir que, nas zonas mais beni- gnas do nosso paiz, se possa aclimar tão útil planta c quer-nos parecer que o fa- cto isolado que o snr. Júlio Henriques nos apresenta do Algarve nada prova. E posrfivel que as plantas chegassem alli em mau estado, que fossem plantadas em condiçncs pouco convenientes ou que se d6s.«e outra irregularidade qualquer que lhes causasse a morte. NSo podemos deixar de elogiar o snr. dr. Júlio Augusto Henriques pelo inte- resse que liga a estas cousas, que, apesar de parecerem de pouca importância, dão origem a conclusões valiosíssimas. Esti- maremos, pois, que continuem estas ex- periências, não olvidando a espécie offi,- cinalis que Mr. Morren recommenda co- mo uma das mais rústicas. — Dos snrs. Charles Huber & C.'" de Hyères recebemos os preços correntes de algumas das especialidades do estabeleci- mento d'aquelles horticultores. Os snrs. Huber & C.'e chamam muito particularmente a attcnção dos amado- res para a sua cxcellente coUecção de Cannas. E de justiça dizer-se que este estabelecimento tem feito uma especiali- dade d'este género de plantas tão úteis para a ornamentação dos jardins e que não poupa despezas para ser o primeiro a lançar no mercado qualquer novidade que appareça. N'e3te catalogo encontra- mos nós as seguintes variedades de Can- nas : Dr. Livingstone, Gustave Dippe, Gloire de Provence, Victoria. O preço de cada rhizoma d'estas va- riedades é de 10 francos. No mesmo catalogo encontramos al- guns Eryngium, que pela sua rusticidade se tornam muito recommendaveis. — Segundo uma carta que nos dirigiu Mr. J. Linden, de Gand, deixou de es- tar a direcção d'este estabelecimento a cargo de Mr. P. Gloner e tomou conta d'ella Mr. Lucien Linden, filho de Mr. J. Linden. — Sua Magestade El-Rei o senhor D. Fernando ofFereceu á camará munici- pal do Lisboa seis Palmeiras para os jardins públicos. — Era elegante formato e nitidamen- te impresso, recebemos o primeiro nu- mero d'um periódico mensal de littera- tura, que vô a luz da publicidade em Braga sob a direcção dos nossos conhe- cidos escriptores João Penha c Alfredo de Campos, ambos poetas distinctos e cheios d'aquelle fogo sagrado e próprio d'uns vinte e tantos annos. A «Repulílica das Lettras» (assim se intitula este jornal) presagiamos uma longa existência, porque reúne todas as condições essenciacs píira ser uma publi- cação interessante e curiosa. Fazemos votos para que os amadores JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 119 das bellas-lettras dispensem a acceita- ção que simiihante publicação merece — e toda será pouca — e agradecemos cor- dialmente aos illustrados collegas a de- ferência que tiveram para comnoscO; oíie- recendo-nos o seu jornal. Dignem-se acceitar os protestos do nosso sincero agradecimento. — A Sociedade Linneana de Nantheuil recebeu a seguinte carta, em que se in- dica um novo remédio para combater o mal da vinha. Diz assim : Segundo o que lera ein diversas obras e pe- riódicos do Meio dia, estava persuadido até ago- ra, como muitas pessoas, de que o Phylloxera era a causa da moléstia da vinha. Tendo tido occasião estes dias de me occupar mais de per- to do assumpto, averiguei que a doença prece- dia o apparecimeuto do insecto, occasionando, depois de certa fermentação, quando nào seja o nascimento de Cryptogamicas e insectos, pelo menos a sua propagação consideravelmente au- gmentada. Nâo é pois unicamente o insecto que se deve combater ; é sobretudo essa espécie de fermentação que o attrahe ou produz ; é, n'uma palavra, essa doença que ataca a vinha como o cholera ataca a espécie humana. E por isso que eu sustento que antes de tu- do se deve principiar pelo saneamento do ar, do terreno, das raizes e da cepa da vinha. Este principio dá-me toda a confiança na ef- ficacia do remédio, que jiroponho á vossa expe- riência, mas para que haja resultado é preciso ser applicado n'uma certa extensão de vinha. Diversos desinfectantes foram já empregados com mais ou menos successo,mas o desinfectan- te por excellencia, o desinfectante recommen- dado nas epidemias pelos sábios mais distin- ctos, Labarraque, Guyton, de Morveau, Le- franc, etc, etc, e até agora posto de parte, é emíim o hypochlorito de cal. O chloro, pondo-se em liberdade, decompue uma multidão de substancias, apoderando-se do hydrogenio e deixando reagir o oxygenio no es- tado nascente : é assim que elle transforma a natureza do ar viciado pelas matérias pútridas e destroe o bolor e os insectos. Assim, em caso de peste ou de doença epidemica, recommenda- se que se deite chloreto de cal em pó nas casas e estabelecimentos públicos. Se nào é emprega- do para exterminar os insectos e até os ratos, nos nossos quartos, é por causa do seu cheiro desagradável e persistente, mas que no tempo da epidemia se supporta bem por necessidade. Lave-se por experiência a superfície do terreno e da raiz fermentada com agua chlorurada e vêr-se-ha logo dcsapparecer os insectos e os cogumelos. O chloro assim empregado não po- derá fazer mal á vegetação, ainda mesmo que chegasse a dissolver alguns tecidos fibrosos. Segundo Mr. Payen, o residuo do chloreto de cal pôde ser empregado vantajosamente mis- turado na proporção de 2 a 3 p. c. com estru- mes sêccos. Eu próprio colhi excellentes resul- tados, misturando-o com detritos de lã (trapos velhos) e com estrume animal (residuo de colla animal). Modo d'empregar a agua chlorurada : 1.» Como meio curativo — Nas vinhas maia ou menos atacadas, mais susceptíveis de cura, é preciso : 1.° Descobrir as raizes das vinhas e sacudir-ihes a terra. Molha-se depois u'um bal- de uma vassoura de trapos de lã, lava-se com esta agua as raizes e a cepa a principiar de cima : 2.» Collocar-se-ha depois uma porção d'es- tes trapos — 400 a 500 grammas — aos quaes se terá juntado um pouco de chloro em pó, em vol- ta da cepa e regar- se-ha levemente com agua chlorurada. Recalcando a vinha, lançar-se-ha a terra mais sêcca por baixo. Emíim, depois d'es- ta operação é preciso ainda fazer correr agua chlorurada ao longo do tronco. Se a vinha esti- ver estacada far-se-ha a mesma operação ás es- tacas, dando-lhes um movimento que operará um vácuo, que se enche com o liquido e que se tapará depois. 2.° Como meio preventivo — Quando as vi- nhas não estiverem ainda atacadas, bastará, pa- ra as preservar, introduzir agua chlorurada no pé da vinha e da estaca, como acima fica dito, renovando a operação de dous em dous niezes. Será necessário coUocar á superfície do solo, de distancia em distancia, jíorçues de chloro, mas es- tas operações devem terminar em maio, no mo- mento da floração, para recomeçarem em outu- bro, depois das vindimas. Estas medidas, tomadas a tempo e feitas com precaução, darão bom resultado. Sendo ge- ralmente empregadas, a doença não tardará a dcsapparecer completamente. Terminando, devo observar que qualquer estrume pôde ser empregado convenientemente ; se designo comtudo os trapos de lã, é porque os considero como o estrume mais duradouro, e não tirando ás vinhas o gosto. A prática e a experiência poderão talvez modifícar e melhorar este processo, auctorisan- do-vos a fazer o uso que julgardes conveniente e por conseguinte a publical-o. Nantheuil (Dordogne) J. Lacoste. — Acaba de nos ser enviado o catalo- go n.° 93 para 1875 do estabelecimento horticola de Mr. J. Linden. Eíte catalogo que é remettido gratui- tamente ás pessoas que o solicitarem, comprehende somente plantas de estufa e algumas introducçoes recentes quer do ar livre quer de estufa. Este catalogo é acompanhado de al- gumas gravuras e é digno de ser com- pulsado. — Agradecemos a MM. Vilmorin An- drieux & 0.'^ a remessa do seu Catalo- go geral de sementes, bolbos e moran- gos. Para sementes é esta uma das prinçi- paes casas de Pariz, 120 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA — Recebemos e agradecemos o pro- gramma da Exposição Rcfrional da Clal- liza, promovida pela Socicdad Económi- ca de Amigos dcl pais de Santiago, e que deve ter logar no dia 20 a 30 de julho próximo. Esta exposição compreliende : produ- cto3 naturaes e agrícolas, industria fa- bril, bellas-artes, etc. — Na Suissa ha uma lei que determi- na que todas as pessoas que se casem plantem seis arvores immediatamente de- pois da ceremonia matrimonial c por ca- da filho que resultar do enlace se plan- tarão duas arvores, podendo ser dispos- tas nos terrenos do estado ou nas vias publicas, no caso de n'isso não haver in- conveniente. Isto é uma espécie de tributo que r-e paga ao estado e um pouco menos pesa- do que as licenças que Roma nos conce- de para os casamentos entre primos. O imposto suisso sobre o matrimonio paga- se sempre com prazer e até se nos quer afigurar que tem o quer que seja de poé- tico. As arvores que vamos dispor n'um terreno inculto, n'um terreno que nada produzia^ representa a vida solteira. A arvore, passado algum tempo, floresce e fructifica : ahi está o matrimonio — o ter- reno estéril tornado fecundo. Quantos de boa mente no nosso paiz não desejariam pagar o mesmo tributo ou na- turalisarem-se suissos? E depois estas plantações são uma es- pécie de monumento que erigimos pa- ra commemorar um dos actos da vida de que mais depende a nossa futura exis- tência, a nossa felicidade até ao dia em que exhalarmos o derradeiro suspiro. Os grandes acontecimentos encarrega- 86 a historia de os levar á posteridade, mas os de familia, tem esta de os assigna- lar, de os gravar d'algum modo no seu li- vro intimo para que o esquecimento os não apague da memoria dos descendentes. A pátria eleva custosos monumentos aos seus filhos que souberam conquistar a gloria, mas, se a pátria dispõe de meios para essas grandiosas obras artísticas que fazem a aduiiração de nacionaes e es- trangeiros, o simples particular não o pódc fazer. Temos então as arvores para assignulur uma data, um feito ou um acontecimento larario. Quem olhará, por exemplo, para o frondoso Ulmus Campes- trís da antiga Cordoaria sem dizer tris- temente de si pai'a si: -cDe quantas de- capitações não foste tu espectador ! e es- tás incólume!» Que de filhos não terão vindo deposi- tar aos teus pés as lagrimas de um co- ração opprcsso que vê ainda na memoria a imagem de um pae extremoso ou de um marido querido ! Então não será a arvore o monumen- to que mais nos scnsibilisa e que mais duração tem? E que prazer indelével não sentimos quando podemos exclamar diante d'uma arvore, como o poeta Leyre : Je Tai plante, je Tai vu naitre ! E depois os nossos filhos poderão di- zer «eu vi nascer esta arvore», assim como os soldados de Napoleão diziam «eu fiz toda a campanha de Itália». Temos os Baobabs do Cabo Verde e as Wellingtonias da Califórnia que nos recordam ainda os primeiros séculos da creação. Os Cedros do Líbano, que datam dos tempos bíblicos, fazem-nos lembrar o Cântico dos cânticos e os amores de Sa- lomão. As Oliveiras, debaixo das quaes descan- çára Jesus Christo, ainda vivem, se se li- gar fé á tradição, e sobre as suas raizes se ajoelhou um dia o grande poeta fran- cez, Lamartine. São muitas as arvores que existem es- palhadas pelo mundo representando o pa- pel de verdadeiros monumentos e é certo que o tempo, o grande modificador do todas as cousas, as torna de dia para dia, de anno para anno, de século para sé- culo, mais frondosas, mais bellas e como que tão respeitáveis que a mão do homem não ousaria derrubal-as. Se o auctor d'estas linhas deixar um dia de ser celibatário, desde já se obriga a dispor, in continenti, no seu jardim, seis arvores que mais tarde possam recordar á sua progénie, se a tiver, um dos successos mais notáveis da vida da familia, e d'este modo ficará pago voluntariamente ao paiz um tributo que na Suissa 6 obri- gatório. Oliveira Júnior. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 121 BIBLIOGRAPHIA-LES PROMEMDES DE PARIS Bois de Boulogne et de Vincennes, Pares, Squares, Boulevards PAR MR. ALPHAND OBRA ILLUSTRADA DE CHROMO-LITHOGRAPHIAS E GRAVURAS EM AÇO E MADEIRA Desenhos de MM. Rochereau, Davioud, Darboise, Fath, Delattre, etc. É este um livro monumental, único no seu género e que é para a horticul- tura o que são para a pintura e para a estatuária as collecções gravadas dos grandes museus da Europa. Depois de ter concebido os planos e dirigido a exe- cução dos passeios da cidade de Pariz, Mr. Alphand, o eminente engenheiro, quiz perpetuar a sua obra pela descripção cla- ra, nitida, exacta, completamente posi- tiva e scientifica, dos novos processos e dos pormenores infinitos á custa dos quaes pôde e soube executal-a. Estes dous volumes in-folio, illustra- dos de innumeraveis planos e gravuras em madeira, de chromo-lithographias es- plendidas, compõem um immenso repor- tório de factos e noticias, que nunca ti- nham sido reunidos. Os engenheiros, os architectos, os fabricantes dos diversos ramos da horticultura (estufas, bancos, bordaduras, peças d'agua, grutas, gra- des, etc), os horticultores práticos, os amadores e sobretudo as administrações publicas das cidades amantes do luxo e do bem-estar, encontrarão n'elle não só as noções technicas e as theorias minu- den ciadas da arte dos jardins, mas tam- bém a tarifa e orçamento de todos os tra- balhos que transformaram os arredores e o interior de Pariz. A theoria e a práti- ca seguem a par o mesmo caminho. Nun- ca a sciencia da edilidade foi tractada d'esta maneira, nunca tão de perto ata- cada para dar todas as indicações que contém e só o que ella contém. Não pro- cureis o pittoresco n'e3te texto tecido de factos e de algarismos ; só o achareis nas magnificas estampas que o commentam e o illustram pagina a pagina. Ha um Vol. VI.— 1875 artista em Mr. Alphand, um paisagista em acção, que, com arvores e aguas ver- dadeiras, creou quadros vivos, mas este artista perde-se no seu livro por detraz do administrador e do prático. Outros cantarão ou descreverão, como poetas, os bosques e os jardins parisienses ; o seu fim é demonstrar as vias e os meios que os crearam. Antes de entrar n'essa vasta e severa exposição, que não comportava nenhuma digressão, onde não se podia consagrar cousa nenhuma á recreação, Mr. Al- phand, sem sahir do seu quadro, escre- veu todavia uma introducção, que o es- clarece e o ornamenta. E uma monographia completa dos jar- dins desde o Egypto dos Pharaós até á França e á Inglaterra do decimo nono século. Creio que o assumpto nunca foi tractado com tanta minuciosidade e com tanta competência. Todos os typos de jardins conhecidos revivem n'este douto e curioso estudo, e até aquelles, cujos vestígios extinguiu o tempo, estão alli restituídos, segundo os textos e os monu- mentos com uma viva verosimilhança. A primeira vista que se descobre no horisonte do mundo é a de um jardim maravilhoso. Todas as religiões dão prin- cipio ao homem n'um Éden e muitas lhe dão o termo da existência nos Campos Elysios. A Imagem de um jardim cheio de fructos, de aguas vivas e de som- bras, desenha-se em todos os sonhos de felicidade futura e de felicidade primiti- va, e este sonho tem-no o homem tenta- do realisar, pelo trabalho e pela arte, em todas as epochas da historia. A imaginação apenas pôde entrever, N.» 7— Julho 122 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA atravez das vagas indicações de Heródo- to, o aspecto e a construcção dos jardins de Babylonia suspensos no entablamen- to de altos terraço.^, sobrepostos como as escadarias d'um amphitheatro e susten- tados por grandes pilares ocos cheios de terra, bastante profundos para que as maiores arvores podessem lançar raizes. Podera-so já, todavia, pelas pinturas dos hypogeus, reconstituir os jardins do Egy- pto, rectangulares como os seus edifícios, com os grandes arcos de folhagem, as ave- nidas de Palmeiras e Sycomoros, os pa- teos plantados de Figueiras, Oliveiras e Romanzeiras e grandes pescinas, alimen- tadas pelo Nilo, onde vogavam os barcos entre as largas folhas do Lotus. Os primeiros jardins gregos appare- cem-nos na «Odysseia». Homero descre- ve dous ; um real, outro divino. Em pri- meiro logar o jardim, ou, para melhor dizer, o parque de Calypso, de contor- no tão delicado e puro na sua luxu- riante vegetação semi-selvàgem. «Uma viridente floresta cercava a gruta; o Amieiro, o Choupo e o Cypreste odorifero, onde, abrindo as azas, faziam amorosa- mente seu ninho as corujas, os gaviões e as palradoras gralhas, que se assustam sem- pre das ondas. E uma vinha nova, cujos cachos amadureciam, cercava a gruta, e quatro correntes de agua limpida, umas vezes próximas, outras aqui e além, le- varam a verdura aos prados formados de Violetas e Aipo. Um immortal que se ap- proximasse, fícaria admirado e enlevado no seu coração.» Depois éo pomar d'Alci- nos, pintado com magnificente abundân- cia:— «Além do pateo, junto das portas, havia um grande jardim de quatro geiras, defendido de todos os lados por uma se- be. N'elle cresciam grandes arvores flori- das, algumas das quaes produziam a pê- ra e a romã, outras as bellas laranjas, 08 doces figos e as verdes azeitonas. Nun- ca deixou de haver d'estes fructos, que duravam todo o inverno e todo o verão, e o sopro do Zephyro fazia crescer uns o amadurecer outros ; a pêra succedia á pêra, a maçã amadurecia em seguida á maçã, o cacho depois do cacho e o fi- go depois do figo. Aqui, nos pâmpanos fructiferos, scccava a uva com os ardo- res de Helios n'um logar descoberto ; acolá era colhida e pisada. E entre os cachos, uns perdiam as flores emquanto que outros amadureciam. E havia duas fontes, uma das quaes percorria todo o jardim, emquanto que a outra espadana- va no limiar do grande palácio. E taes eram os esplendidos presentes dos deu- ses na casa de Alcinos.» Não se encontram outros quadros com- pletos nos poetas e escriptores da Grécia histórica. O génio attico também não pinta; indica apenas com uma linha fi- na e pura. Verdade é que esta linha é a linha da belleza. Reunindo estes disse- minados vestigios, é fácil todavia imagi- nar o jardim hellenico, sujeito ás leis da ordem e do numero, delicadamente emol- durado pela architectura das galerias e das columnatas, ornado de estatuas e bancos de mármore, miscellanea harmo- niosa da natureza e da arte. Em horticultura, como na estatuária e na poesia, os romanos não passaram de imitar os gregos, mas mais exagerada e pesadamente. Eram tantas as arvores como os mármores nos jardins de Lucul- lo, Pompeu, Nero e n'essa villa d' Adria- no, onde estavam reproduzidas todas as maravilhas do mundo. Foram elles que imaginaram as vegetações aparadas e es- culpturadas, que reapparecem no deci- mo sétimo século. Plinio, o moço, descre- vendo a sua villa do Laurentino, enu- mera com orgulho os Buxos talhados em cylindros e em pyramides, em gryphos e deuses Termes, algumas vezes apara- dos em lettras, formando o nome do pro- prietário ou do jardineiro. Na edade média, o jardim é severo, claustral, nú como a epocha ; as magras ruas seguem, nas residências feudaes, os ângulos dos fossos e a geometria dos bas- tiões. Apenas, do longe a longe, é per- mittido o luxo d'uma pequena torre abri- gada pelas altas muralhas. A Renascen- ça restaura magnificamente o jardim an- tigo, introduzindo-lhe graças novas e elegâncias rejuvenescidas. A Itália cria villas de uma belleza comparável á de seus monumentos e pinturas. O jardim liga-se á residência por linhas d'união d'uma architectura cadenciada, que se vac perdendo c esbatendo na paisagem. Terraços, escadarias e rampas desenham JOENAL DE HORTICULTURA PRATICA 123 as desegualdades do terreno e formam outros tantos pedestaes magestosos, d'on- de o senhor pôde contemplar o seu do- mínio debaixo de todos os aspectos. A medida que avançam, as suas linhas de pedra attenuam-se e modificam-se, para se confundir emfim, por uma grada- ção insensirel, nas massas de vegetação pittoresca. Mas o ideal persiste sempre no seio da realidade natural; as alêas dos Platanus alongam-se em pórticos, as fontes mythologicas saccodem, á sombra dos bosques, as suas toalhas luminosas. Cada grande arvore abriga uma estatua, que parece ter nascido, como uma drya- de antiga, do seu tronco nodoso. A arte cerca por toda a parte a natureza sem a aprisionar, como a rima emoldura o poema, como o caixilho emoldura a tela. Apparece Le Nôtre no decimo sétimo século e o jardim, de quadro animado e variado que era na sua grandiosa unida- de, converte-se n'uma solemne estampa geométrica. O solo nivela-se sem que seja permittida a menor desegualdade ; os ter- raços e as galerias perdem os seus movi- mentos naturaes; as alêas estendem-se em linha recta, entre duas filas d'arvo- res aparadas, recortadas, alinhadas, que alguém imaginaria ser os fidalgos do reino vegetal. A fouce e o prumo re- gularisam tudo n'este palácio de folha- gem ; os Castanheiros formam salas ; as i^a?*as gabinetes ; as plantas, como no jar- dim de Plinio, transformam-se em mo- numentos e moveis. Fazem-se pyramides com Teixos, candelabros com a Murta, taboleiros de xadrez com o Buxo, esphe- ras com a Laranjeira. A agua jorra ape- nas em foguetes ou girandolas, vomita- da pelos dragões ou soprada pelos ca- vallos de Neptuno. O systema era falso, mas o artista tinha génio. Corneille e Racine crearam obras primas, apesar das regras absurdas, que lhes impunha a poética do seu tempo. Da mesma ma- neira, Le Nôtre, com os rectângulos, os quadrados e os parallelos monótonos, compôz monumentos de verdura de in- comparável nobreza. A inflexivel syme- tria do jardim das Tulherias, dos par- ques de Versailles, Meudon e Saint-Cloud, conformava-se com a da corte, que se desenrolava em procissões compassadas. A própria vegetação devia curvar-se á etiqueta perante Luiz XIV. Pelos fins do decimo oitavo século um vento que sopra de Inglaterra varre es- tes jardins rectilineos e transfonna-os, destruindo-os. O machado corta as ave- nidas, derruba os bosques e arrasa as se- bes. Fica assente que o jardim só deve ser um resumo da natureza com todas as suas irregularidades e caprichos, que deve copial-a feição por feição, deixando de a aparar ou de a embellecer. A linha recta foi exclui da dos novos jardins; as alêas serpentearam como atalhos de flo- resta ; as arvores, postas em liberdade, perderam o medo de ser chamadas á or- dem pelo crescente do podador. As gru- tas de mármore foram suts;tituidas por antros de rochedos naturaes agrupados e justapostos ao acaso. Mas o falso gosto do tempo apoderou-se rapidamente d'es- ta horticultura pittoresca. O sentimenta- lismo veio metter-se de permeio. Era no tempo, em que as almas se abriam ás esperanças vagas, aos devaneios pas- toris, ás utopias de criança. Havia no ar uma espécie de humidade lacrimosa, que molhava tudo. A natureza, descoberta re- centemente por Jean-Jacques, perturba- va os corações e os sentidos á maneira d' uma visão. Fez-se nos jardins uma es- pécie de Éden artificial, ornado de ca- banas fictícias, d'ermídas pseudo-gothi- cas, de mausoléos vasios. Inscripções e sentenças ridículas bordavam estes or- namentos infantis ; pregavam ao passean- te uma moral parva ou um sentimento romanesco ; exhortavam-no a scismar á margem d'um regato, a enthusiasmar-se em frente da cascata, a lacrimejar sobre as ruínas de gesso pintado ou sobre os destroços fingidos d'uma cabana incen- diada. Os jardins de Le Nôtre tinham a emphase e a pompa correcta das tra- gedias clássicas sujeitas á regra das três unidades ; os jardins inglezes, exagera- dos pela moda franceza, cahiram depres- sa no domínio da garatuja. Do abuso do estylo passou-se rapidamente ao trivial e ao ameninado. Nos últimos tempos realisou-se um grande progresso e a horticultura en- controu as verdadeiras leis que devem presidir ás suas creações. Hoje o jardi- 124 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA neiro paisagista já não tyrannisa a na- tureza. Os novos jardins conservam exacta- mente um meio termo entre a unidade symetrica e a desegualdade pittoresca. A ordem comLina-se com uma certa li- berdade e a naturalidade com que são lançadas as curvas tem a j]^randeza dos planos antigos. Sabe-se animar os terre- nos sem desfigurar o caracter do sitio ou do logar por desmoronamentos arbi- trários. Levou-sc á perfeição o agrupa- mento das ai'vores, a intervenção das aguas formando lagos ou cahindo em cascata, a diversidade das plantas, a dis- posição das flores nos canteiros ou em açafates. Actualmente o jardim não tem s000 reis. — Es- tes vinhos entram na sub-região do Dou- ro Superior. 3." Vinhos de Villa Flor — Vinhos de pasto saborosos, tónicos e agradáveis. A maior parte são brancos, que em velhos são preciosos. Téera fama n'este grupo os vinhos de Freixid, do 'Naho e de Roios. O preço da pipa regula por 30;>000 reis. 4.° Vinhos de Moncorvo — Vinhos quasi pelo typo dos precedentes, sendo entre elles de maior nomeada os vinhos da Hoi'ta, da Vide e do Castedo. O seu pre- ço varia de 28?)000 a 36;>000 reis. 5." Vinhos de Mirandella — Os vinhos de Avidagos, de Frechas e de Abreiro, gosam de boa fama e o seu preço de 43f>000 reis a pipa, de algum modo a justifica. 6.° Vinhos de Carrazeda de Anciães — Alguns d'estes vinhos entram já no dis- tricto aristocrático da sub-região do Dou- ro Superior, sendo muito fallados os do Castanheiro do Norte, os de Fiolhal, Ri- ba Longa e Linhares. O preço da pipa d'estes 6 do 54/5>000 reis. 7." Vinhos de Bragança, de Vinhaes, de Freixo d' Espada á Cinta, de Miran- da, de Mogadouro e Vimioso, constituem um grupo entre os quaes apparecem al- guns typos distinctos, como são os da Bemposta, àQ Freixo, àoPacal, etc, mas cujo fundo passa por ser de somenos qua- lidade, em relação aos precedentes. O preço dos vinhos d'estes concelhos vae entretanto de 26?>000 a 36;)000 reis. No districto de Villa Real 8.° Vinhos de Murça — Estes vinhos apparentam-se com os bons vinhos do Alto Douro. O preço da pipa de 636 li- tros anda todavia por 22;>500 reis. É distincto, entre todos, o vinho de Reben- tão. 9." Vinhos de Villa Pouca de Aguiar e de Chaves — Ha n'este grupo os vinhos da Ribeira d' Oura que gosam de bom nome como vinhos de pasto, mediana- mente encorpados e alcoólicos ; mas de pouca duração. O preço d'estes vinhos chega a 27í,SOOO reis. 10." Vinhos de Vai Passos — Appro- ximam-se dos precedentes, sendo nomea- dos os de Fornos e Possacos. O preço da pipa é de 14?>000 reis. IV Entre a região vinícola de Traz-os- Montes e a da Beira, existe a região vi- nicola do Douro, comparativamente pe- quena em extensão, mas a de maior ri- queza e importância pela preciosidade da maior parte de seus vinhos, conheci- dos dentro e fora do paiz com o nome de vinhos do Porto. Escalonada sobre as alcantiladas ribas do Douro, desde a Bar- ca d' Alva, na raia, até á povoação de Barqueiros, junto á confluência do rio do Teixeira, com mais ou menos largue- za para o interior das duas provindas, seguindo ahi geralmente as encostas dos affluentes do Douro, o Corgo, o Pinhão, o Tua, o Thedo, o Távora e o Torto, é esta região dividida em duas sub-regiões, a do Alto Douro, e a do Douro Superior. A primeira medindo 30:480 hectares, que constituo o antigo e privilegiado distri- cto vinhateiro do Douro, segue desde Barqueiros até ao ponto do Cachão da Valleira. A segunda continua sobre JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 131 maiores alturas desde este ponto até á raia. O Alto Douro tem por centro princi- pal a Regoa, d'onde se julga que come- çou a espraiar-se a cultura dos vinhos do Douro. — As numerosas vinhatarias que se desenrolam por sobre as ondulações d'esta sub-região, as sumptuosas edifica- ções que a opulentam, e a densidade da sua população, attestam de sobra a sua primogenitura. Assente quasi todo sobre rochas de schistos silurianos, apenas salteados de al- gumas nódoas de granitos, o Alto Douro deve á qualidade especial d'estes terre- nos, á excellente orientação da maior parte dos seus vinhedos, e ainda á pro- ximidade do Douro e -seus affluentes, o grande segredo da belleza e primor de seus vinhos. E notável como o terreno de schisto se presta melhor que o de granito ao nasci- mento dos vinhos superiores. Desde o Cachão da Valleira para les- te as formações graniticas alternam a curtas distancias com os schistos, e é a bem dizer sobre estes que o Douro Su- perior consegue obter vinhos de quali- dade egual aos melhores do Alto-Douro. Entretanto aquella sub-região é ain- da um paiz selvagem, pouco povoado e quasi todo a fazer. A julgar pelas pro- priedades do Silho, do Vesúvio, da Cal- deira, Arnoselo, Vargellas, Cachão e de outras mais que alli existem, é para crer que ella chegue um dia a ser uma re- gião vinícola riquíssima. Como a região vinícola do Douro não ha nenhuma no paiz, em que a cultura da vinha e o fabrico dos vinhos sejam mais difficeis e caros. Começam as difficuldades pela arma- ção da vinha, á qual em penhascos e fraguedos é preciso arranjar o solo ve- getal em forma de degraus, terraços ou sucalcos contidos por muros ou geos de pedra. As vinhas assim dispostas figu- ram grandes escadarias, trepando pelas encostas as mais alcantiladas. — Póde-se idear á vista d'isto como serão trabalho- sos todos 03 demais serviços da vinha até se recolher a uva aos lagares, e ainda o do transporte dos vinhos para os depó- sitos do Porto e da Regoa. É sobre estes terraços que se abrem, conforme a sua largura, maior ou menor numero de valleiras, nas quaes se enter- ram os pequenos bacellos devidamente unhados. — Calcula-se que o preço má- ximo da postura de um milheiro de ba- cello, em salários e alimentos orça de 80/}i000 a 100/5000 reis ; e o minimo an- da por 41?$Í000 reis. De sorte que um hectare de bacellada que nas regiões do centro do reino custa termo médio reis 150)5(000, levando o hectare 10 milhei- ros, nas ladeiras do Douro, levando ape- nas 4:000 a 5:000 bacellos importa em 450 a 500^000 reis. As vinhas são podadas geralmente pouco depois das vindimas. Na poda dei- xa-se uma ou duas varas com um ou dous talões. Segue-se immediatamente a excava, ou o encaldeirar das cepas. Em janeiro, ou fevereiro, faz-se a primeira cava a montes; e conjuncta- mente a enijpa das cepas, que consiste em amarrar a vara ou varas do fru- cto sobre dous paus, um enterrado jun- to á origem da vara, e que se chama jpau de espera ; o outro enterrado junto á ponta da vara, e a que se chama pau do fim. Se a vara é muito longa mettem- se mais um ou dous paus de forrar en- tre os outros. A redra ou segunda cava pratica-se em maio para arrazar a terra e limpal-a das hervas. A vindima faz-se de 15 de setembro até aos primeiros dias de outubro. Os mostos marcam diversas percenta- gens de assucar conforme as condições das vinhas e as castas das cepas. O ter- mo médio da riqueza saccharina é de 25, a máxima de 35, e a minima de 20, e nos pontos mais altos de 18 "/,,. Não ha região vinhateira em que se- jam mais numerosas as castas de uvas. Póde-se dizer que no Douro se encon- tram todas as castas que se vêem distri- buídas pelas outras regiões vinícolas do paiz. Para não fazermos aqui a longa lista d'ellas, apenas indicaremos algumas das melhores, que são: rabo de ovelha, bastardo, gouveio, mourisco, malvasia, alvarelhão, donzellinho, touriga, diversas tintas, etc. A pisa e fermentação do vinho são 132 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA feitas em lagares de pedra, sem desen- gace e com bastante sova da lagarada. Logo que o vinko dá prova, sangra- 80 para os toneis. Espreme-se a balsa, e o vinho de espremedura se ajunta com o de sangria. Em cada tonel se deita ao envasilhar um almude de aguardente de prova por cada 30 almudes de vinho. Passada a se- gunda fermentação, trasfega-se o vinho para pipas, levando n'essa occasião mais meio almude de aguardente; e assim é conduzido pelo Douro para os depósitos da Regoa e do Porto, em fevereiro e março. Os vinhos do Douro, cujos mos- tos contéem mais de 25 ^/q de assucar, nunca desdobram todo o assucar na pri- meira fermentação, ficando-lhes sempre de 4 a 10 "/o- É principalmente para suffocar de to- do esta fermentação, que o próprio ál- cool suspendeu, ou pelo menos afFrou- xou, que se lhe fazem as duas primeiras aguardentaçues, ao envasilhar nos toneis e ao encascar nas pipas. O assucar re- manescente e as outras partes solidas em que são riquíssimos os vinhos do Douro fundem e abraçam perfeitamente a aguar- dente de lota, que a pouco tardar fica tão identificada ou digerida, como se fosse a nativa. Os vinhos do Douro passam nos de- pósitos mais ou menos tempo, conforme o grau de afinamento a que se querem puxar, e segundo os dotes que trouxe- ram da origem. N'este periodo de educação são ainda por vezes aguardentados, e estes refres- cos juntos aos dous primeiros temperos elevam a sua força alcoólica até 24" do alcoometro centesimal, em que ha pelo menos 6 ^/^ de álcool puro addicionado. E principalmente estasuccessiva aguar- den tacão ainda mais que o tempo, que des- casca tão notavelmente estes vinhos, os desacidifica, lhes esbate e muda a cOr, os amacia, os enche de aromas ethercos e lhes faz adquirir o gosto final balsâmi- co, quinado, unctuoso o avelludado, que tanto se aprecia nos vinhos velhos d'es- ta região, e que são por isso inimitáveis. Ha diversas gerarchias nos vinhos do Douro, — desde os vinhos frouxos e dé- beis das grandes alturas, só próprios pa- ra alambicar, até aos mais finos e gene- rosos. — Em grosso podem-se qualificar commercialmente em seis grandes famí- lias, a saber : — 1.° Vinhos Jinissimos ou os grandes vinhos — 2.° Vinhos finos — 5." Vinhos de meza — 4.° Vinhos de car- regação — 5." Vinhos de ramo — ^.^ Vi- nhos de caldeira. — Nas duas primeiras famílias comprehendem-se também os vi- nhos especiaes formados de uma única es- pecialidade de uva distincta, ou por al- gum processo particular, como são : os moscatéis; os hastardinhos ; os espumo- sos ; os malvasias ; os mouriscos ; os al- varelhoes, etc. A nomenclatura dos vinhos finíssimos e finos é quanto pode ser variada e capri- chosa. A novidade selecta, — a qualidade dos vidonhos, — a especialidade da marca, — a idade do vinho, e os sainetes espe- ciaes servem de base ás denominações, grande parte das quaes não são fantás- ticas, mas traduzem notas diversas d'es- tes vinhos, que os provadores mestres chegam a discernir e até a adivinhar. O vinho do Douro é o mais caracte- rístico e ao mesmo tempo o mais varia- do. Cada uma das famílias comprehen- de muitos typos, e cada typo diversas marcas. Como esta distincção se estabelece no meio de uma grande uniformidade na cultura, nas castas, nos fabricos, na educa- ção dos vinhos, e ainda por cima com as lotas e misturas de vinhos, oriundos de outras regiões do paiz, é o que pareceria inconcebível, se não fosse sabido com que exuberância e relevo de dotes sahe cada vinho do Douro da localidade que o ge- rou.— Este cunho, este poder de indi- vidualidade que attesta a nobreza de to- das as creações, é o que sobretudo dis- tingue o Douro como região vinhateira preeminente. — Parece que os génios que na sua lucta liomerica revolveram e que- braram aquella região, communicam ca- da um ao vinhedo que sustentam o seu caracter e individualidade, como para certificar uns aos outros que elles se de- ram trogoas, mas que não desistiram da batalha. Por isso, recorrendo aos dados do snr. visconde de Villa Maior para apontar al- guns dos typos mais preciosos de vinhos JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 133 do Douro, temos a certeza que deixá- mos em silencio muitos outros typos tão estimados, os quaes só um estudo bem detido e especialisado nos poderia fazer conhecer. Classificaremos por tanto, provisoria- mente, os vinhos genuínos do Douro nos seguintes grupos : 1." — Vinhos de Alijó — Os mais abundantes da região, e os que passam por mais generosos, quasi todos tintos. Apontam-se como typos de maior es- timação : o da Quinta Amarella na fre- guezia de Casal de Loivos ; o do Roíi- cão na freguezia de Villarinho ; o da Ro- maneira na freguezia de Cotas, e mais ou menos os das quintas estabelecidas desde o rio Pinhão até ao Tua. — Os preços por pipa de 636 litros é de reis 15^000 a 30^000. 2.° — Vinhos de Mezão Frio — São in- feriores aos precedentes por estarem já próximos do Baixo Douro. Téem por isso menor exportação. Os melhores são os da freguezia de Cidadelhe. — Regulam 03 preços de 15f5íOOO a 20;$Í000 reis. 3.° — Vinhos da Regoa — Quasi tão abundantes como os de Alijó, não são comtudo tão geralmente superiores. São muito distinctos comtudo os de Covelli- nhas, Poiares, Pezo da Regoa, Godim e Fontellas. Os vinhos de consummo interno valem 12)$000 reis e os de exportação 20)$000 a 30?5!000 reis. 4.° — Vinhos de Sabrosa — Téem mui- ta fama n'este grupo, como vinhos tin- tos, os de Chuvinhas, Covas e das quin- tas que estão á borda do Douro e de seus affluentes. Para vinhos brancos in- dicam-se as quintas de Provezende, Cel- leirós, Villarinho de S. Romão e Sabro- sa. — Os preços variam de 20/)í000 a 26;$!000 reis. ò.° — Vinhos de Santa Martha de Pe- naguião — São principalmente notáveis n'este grupo os vinhos da Cumieira, de Bertello, de Sever, de S. Miguel, de Lo- brigos e os de Alvaqões do Corgo. — O preço vae de 20^000 a 40/^000 reis. 6." — Vinhos de VillaReal — São fal- lados os vinhos da demarcação de Aba- ixa, da Ermida, de Folhadella e da No- gueira. — Os preços vão de 16;$1000 a 30/51000 reis. Em geral os vinhos do Baixo Corgo são menos generosos que os de Cima Corgo. Reputam-se melhores os vinhos de Ri- ba Douro, que os das alturas. Diz-se até como brazão das boas quintas, que ou- vem bater a espadella dos barcos que na- vegam no rio Douro. Também os vinhos creados na margem direita do Douro passam por serem me- lhores que os da margem esquerda. Que pena faz que ao menos esta rai- nha da nossa vinicultura não esteja mais completamente estudada. Lisboa. J. I. Ferreira Lapa. ESTUDO SOBRE O GÉNERO CITRUS As Aurantiaceas, tão bem estudadas por Corrêa da Serra («Observations sur la Famille des Orangers et les Limites qui Ia circonscrivent» — «Annales du Mu- séum», t. VI, 1805), são compostas segun- do Bentham e Hooker («Genera Plan- tarum») de 13 géneros, sendo entre elles o género Citrus, de que nos vamos occu- par aqui, o mais antigo e o mais bem co- nhecido. Emquanto ao numero das espécies e á sua distribuição geographica, ha grande diversidade d'opiniões e, sob este ponto de vista, é difficil chegar-se a um accor- do. Os estudos feitos em Herbario não são muitas vezes o bastante para se che- gar a conclusões satisfactorias, e então é necessário recorrer-se aos individues em cultura, e a cultura, principalmente quando se tracta de arvores como as Laranjeiras e suas congéneres, muda por tal forma o caracter d'uma espécie que se torna difficil conhecel-a e deixar de commetter erros, e é d'este modo quo muitos botânicos da Europa téem consi- derado o Limoeiro azedo e o Liynoeiro doce uma única espécie, e a I^aranjtira aze- dai a. L^aranjeira doce com duas espécies, o que está longe de ser lógico. O fallecido dr. Lindley escrevia o se- guinte a este propósito : «Os botânicos que se téem dedicado 134 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA mais á investigação de assumptos con- cernentes íl botânica indiana, chegaram a concluir que as Laranjeiras azeda e doce, o Limoeiro, a LJmeira, etc, téem todas origem de uma única espécie bo- tânica, isto é, o Citrus medica, indigena das montanhas das índias orientaes, on- de ainda é encontrado no estado espon- tâneo.» («Journal of the Horticultural Society», 9, 171.) Bentham e Hamilton são de opinião «que estas quatro espécies são todas va- riedades do Citrus medica no seu estado natural, mas que o Citrus Decuniana (Shaddock) é uma espécie distincta». Gallesio, pelo contrário, cita exacta- mente as quatro acima mencionadas, co- mo quatro espécies que constituem o gé- nero Citrus. Risso foi o primeiro que fez menção de cinco espécies e no «Prodromus» de De Candolle adoptou-se esta classificação. Alguns annos depois, porém, Risso ci- tava já dez espécies de Citrus e na sua grande obra que publicou sobre as La- ranjeiras em 1818, conjunctamente com a coUaboração de Poiteau, a palavra es- pécie é completamente banida e só se encontram raças e typos. O professor Oliver, a quem se deve uma publicação importante, que viu a luz ainda não ha muito, sobre toda a fa- milia das Aurantiaceas, tractando do gé- nero Citrus exprime-se approximadamen- te n'estes termos: «Depois de ter feito debalde esfor- ços para determinar as espécies de Ci- trus, afigurou-se-me mais prudente não tocar n'isso : quero dizer, conserval-as taes quaes se achavam nas obras moder- nas. E muito diflficil formar-se uma ideia satisfactoria e approximada sobre o nu- mero de espécies d'este género tão variá- vel e cultivado em tamanha escala, pa- ra se fazer comparações. Segundo os fa- ctos assignalados por Risso, Loureiro, Wight, Arnott, Miquel o outros botâni- cos e mesmo segundo as minhas próprias observações nos exemplares conservados em Herbario ou nos individues em cul- tura, sou levado a crer que approxima- damente três espécies constituem o gé- nero Citrus. D («Linnean Society — Bo- tany», V Supplemcnt.) Roemer, nas suas «Synopses Monogra- phicíe», cita entre trinta a quarenta es- pécies de Citrus, o que decerto é bas- tante exagerado. Se puzermos todavia de lado todas as chamadas espécies e varie- dades cultivadas parccc-me também mui- to provável que este género seja mais ri- co de espécies do que se julga geral- mente. Duas espécies australienses foram, por exemplo, descriptas nos últimos annos : o Citrus australis Planchon (Limonia australis A. Cunn. Native OrangeJ e Citrus australasica F. Muell., que se dis- tinguem perfeitamente das outras pelos seus peciolos, que são curtos e desprovi- dos d'azas. Não é menos certo todavia que apenas dous botânicos foram da mes- ma opinião sobre o numero de espécies d'este género. Tocam-se portanto os ex- tremos: se uns põem de parte muitas espécies boas, os outros pelo contrário adoptam muitas artificialmente. E fora de toda a duvida que a maior parte das espécies é oriunda das ín- dias orientaes, e Royle considera a affi- nidade dos nomes que estas arvores téem nos diíferentes idiomas da Ásia, como prova da sua origem indiatica. A Za- ranjeira, por exemplo, chama-se na lín- gua sanscrita Nagarunga, d'onde os hin- dustanis fizeram o nome Narungee, os árabes Narunj e os italianos Naranzi. Das índias e do Tibet foram-se estas ar- vores espalhando (em primeiro logar pe- la conquista dos árabes) á Ásia menor, á Africa septentrional, aos Açores, ás Baleares e á Europa meridional, onde constituem actualmente, para assim di- zer, uma parte da Flora mediterrânea. Depois de bem aclimadas, é cada vez mais difficil, como geralmente acontece com quasi todas as nossas plantas de cultura, retroceder com todas estas for- mas creadas pela cultura á sua pátria primitiva, ou, para me exprimir mais claramente, reconhecer em todas estas variedades, muitas vezes tão fora do commum, a espécie ou as espécies ty- pos. Abrindo o dr. Royle na sua classifica- ção («Matéria Medica»), procurarei apre- sentar aos meus leitores as diíferentes espécies c variedades de Citrus, taes co- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 135 mo tive occasião de as conhecer, quer por muitas obras, quer pelos individues cultivados em Portugal. I) Citrus Bigaradia Duham., Citrus vulgaris Risso, Citrus aurantium var. B. vulgaris, Citrus aurantium^ var indicum Galiesio, Laranjeira azeda, Bigaradier, Sev ille- Orange, Pomeranze . Galiesio mostra que esta espécie se tinha espalhado depois dos romanos na direcção do golfo pérsico, provavelmen- te em resultado das expedições dos ára- bes á índia. Este povo transportou o Bigaradier para a Arábia pelos fins do século IX da era christa. Os cruzados viram o Bigaradier na Palestina e cul- tivava-se na Sicilia no anno 1002. São estes os caracteres que melhor ou peor distinguem esta espécie da se- guinte : A arvore tem um porte muito direi- to e fica quasi sempre de pequena altu- ra. Os peciolos das folhas são bastante alados e a flor distingue-se por um aro- ma muito mais forte e suave. O fructo é d'uma cor sensivelmente mais averme- lhada e as glândulas oleaginosas na sub- stancia da casca estão contidas na su- perficie, emquanto que são mais salien- tes e d'uma forma convexa no II) Citrus aurantium Risso (Citrus au- rantium var. B. dulcis Galiesio, Uoran- ger vrai, China ou Sweet Orange, Ajpfel- sine. Laranjeira doce. Segundo Royle, esta espécie acha-se espontaneamente nas florestas de Silhet e nas ladeiras das montanhas de Nil- gherries. («111. Himal.», p. 129.) Foi provavelmente introduzida na Eu- ropa depois da edade média. Nas índias os fructos d'esta espécie amadurecem nos mezes d'inverno e esta circumstancia pô- de explicar talvez a razão porque estas arvores se espalharam muito mais para o norte que outras espécies de Citrus. Alphonse De Candolle, inclina-se, sob o ponto de vista botânico, a não ver na Laranjeira doce e na Laranjeira azeda duas espécies, mas sim duas raças. («Geo- graphie Botanique».) Mas se o Bigaradier, a espécie I, é a primitiva espécie, como se crê geralmen- te, parece-nos que não está bem demons- trado que já houvesse algum botânico que encontrasse esta espécie no estado selvagem, como De Candolle affirma, na Ásia meridional, ao passo que Royle pre- tende ter achado a Laranjeira verdadei- ra, a nossa espécie II, espontaneamen- te nas florestas de Silhet e nas ladeiras dos montes de Nilgherries. (Royle, «II- lustr. Himalayan plants», p. 129.) Pro- curando conciliar estas duas opiniões, que tanto se afastam uma da outra, po- der-se-hia talvez suppôr que o Bigara- dier ou Laranjeira azeda no estado es- pontâneo se transformou pouco e pouco na Laranjeira verdadeira ou doce. E eífectivamente A. De Candolle parece fazer d'esta supposição quasi uma cer- teza, quando diz que «a Laranja doce era uma modificação do Bigaradier nas- cida na China ou na Cochinchina, n'uma epocha muito remota sem duvida, mas histórica e não anterior ao homem. («Geo- graphie Botanique», 2, pag. 8, 70.) Posto que seja fácil para um olho exer- citado distinguir a laranja azeda da la- ranja doce, e vice-versa, é todavia diffi- cil dizer em que pontos se deve procu- rar a diff crença entre as duas. Se para Galiesio a única diíferença está na do- çura da polpa, muitos outros botânicos attribuem este principio assucarado á longa cultura e a muitos outros proces- sos de enxertia, e achamos uma razão de mais para que o Citrus Bigaradia seja a verdadeira espécie no facto que as sementes d'e8ta nunca produzem ar- vores de fructos doces, emquanto que o Citrus aurantium, a nossa Laranjeira do- ce, degenera muitas vezes, sob condições desfavoráveis de solo e clima, em La- ranjeira azeda, ou, por outro modo, re- genera-se na espécie typo — Citrus Bi- garadia. O argumento, já passado um pouco de moda, não ha duvida, de que só uma boa espécie typo ficaria constan- te por sementes, provaria pois n'este caso que é assim. Mr. Decaisne, o célebre monographo das Pereiras, é levado cada vez mais a acreditar que todas as nossas Pereiras téem a sua origem no Pyrus communis. Examinando o gosto e a forma dos fru- ctos, a forma e a contextura das folhas e até a vegetação mais ou menos vigorosa da arvore, parece-nos que as Pereiras 136 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA differem muito mais entre si do que a Laranjeira azeda e & L. doce. Darwin («The Variations of Animais and Planta under domestication») tenta provar que o Pecegueiro provém da Amendoeira e o Pecegueiro de fructo li- so (alperce) do Pecegueiro de fructo avel- ludado (pecego). Cita muitos exemplo.^, em que uma c a mesma arvore produzi- ram fructos que foram d'umas vezes pe- cegos, d'outras damascos, d'outra3 amên- doas. O mesmo fructo apresentava mui- tas vezes caracteres de duas d'estas es- pécies de fructos. Os mesmos phenomenos vemos nós repetirem-se na familia das Aurantia- ceas. A este respeito fallaremos mais tarde. O professor Charles Koch, que publicou também um trabalho sobre a historia e classificação das Laranjeiras, é egual- mente da opinião que a laranja doce provém sem duvida da cultura da laran- ja azeda, mas em verdade ella acha-se 8Ó quando concluo do seguinte modo : «E mais que provável que a laranja doce fosse somente observada pelos por- tuguezes na China depois da descoberta do caminho marítimo para as índias orientaes e trazida por elles á Europa, não havendo pelo menos nenhum indi- cio antes d'esta epocha que nos faça Buppôr a sua presença.» A. De Candolle pensa que os portu- guezes apenas importaram da China me- lhores variedades da laranja doce e Gal- lesio pretende que os portuguezes não foram os primeiros a trazer a Laranjei- ra doce da índia, onde chegaram em 1498, nem da China, onde aportaram em 1518 fOalL, pag. 300). Além d'isso, grande numero d'escriptore3 do princi- pio do século XVI faliam da Laranjeira doce como fructo já cultivado na Itália e em Ilespanha. Em todo o caso tem sido bem discu- tido se a Laranjeira azeda o a Laran- jeira doce são duas espécies ou uma só e a maioria dos botânicos pronunciaram- se a fíivor da unidade, isto é, pelo Ci- trus Bigaradia. Accresce todavia outra diíSculdade, que é preciso provar por argumentos que sejam completamente concludentes, que a Ásia é a pátria exclusiva d'e3ta espécie. O dr. Fraas («Flora Clássica», pag. 86), cita a Africa septentrional como pátria do Citrus Bigaradia, e é para la- mentar que não apresente provas da sua opinião um tanto singular. Algumas citações do vários escripto- res portuguezes vêem aqui muito a pro- pósito, porque contéem, no que concerne á Africa occidental, algumas duvidas bem fundamentadas sobre a pátria ex- clusivamente asiática do Citrus Bigara- dia. Não queremos faliar aqui da pre- sença d'esta espécie em estado espontâ- neo em Tombutu, porque nos parece que com razão recusa Gallesio, como argu- mento da origem africana da Laranjei- ra azeda, tel-a visto Leão Africano n'e3- ta cidade, pois que sendo ella de ori- gem árabe, e frequentada por caravanas mauritanas, é summamente plausível ad- raittir que estes povos levassem a La- ranjeira áquella, até agora, quasi mys- teriosa cidade. Vemos porém que se acha a Laranjeira em legares da Africa occi- dental, que nem consta terem sido fre- quentados pelos povos de origem arábi- ca, nem nos parece plausivel acreditar que os portuguezes alli fossem plantar a Laranjeira : e até nos parece que an- tigos escriptores portuguezes a tiveram por indígena n'este3 legares ; ouçamos pois estes escriptores. Seja o primeiro André Alvares de Al- mada. Diz elle no seu «Tractado dos Rios de Guiné do Cabo Verde», capitu- lo XV: «O rio Totó tem em si muitas Za- ranjeiras.D E logo no mesmo paragrapho : «O rio de Tongleen, o rio de Buti- bum, e o rio das Allianças, todo3 sâo mui frescos, de muitas arvores, e de muitos palmares, e muitas Laranjeiras.» Adiante, no mesmo capitulo: «Defronte de Cabo Ledo, que é a pon- ta da Serra Leão, estão duas ilhas a que chamam as Bravas, as quaes téem mui- tas aguas. Laranjeiras, Cidreiras, Li- moeiros, Cannas de assucar, etc.» O mesmo auctor, no capitulo XXIX, escrevendo da SeiTa Leão, diz : «Esta serra é tão abundante de tudo JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 137 que nada lhe falta : abastada de muitos mantimentos, muito fresca de ribeiras d'agua, Laranjeiras, Cidreiras, Limoei- ros, etc.» Almada escrevia por 1580, em idade madura ; era natural de Cabo Verde, e havia pessoalmente percorrido a costa de Guiné. O padre Fernão Guerreiro transcre- veu nas suas «Relações» uma carta que Bartholomeu André escreveu a Sua Ma- jestade sobre as cousas de Serra Leão, em 20 de fevereiro de 1606, em que se lê o seguinte : «Das arvores de espinho de toda a sorte não fallo, porque estão os mattos cheios d'ellas, entende-se que a terra é disposta para dar vinhas e tudo o mais que n'ella se phmtar.» O padre Baithazar Telles na «Chro- nica da Companhia», tendo primeiro fal- lado das ilhas de Cabo Verde, onde diz que se acham n'ellaã Laranjeiras, por modo que bem deixa perceber que sabia terem sido alli introduzidas pelos portu- guezes, passa a fallar da região da Ser- ra Leão, onde se exprime d'esta ma- neira : «Dão-se n'ella muitas arvores de ex- cellentes fructas, ha grandes Palmeiras, das quaes fazem vinho e azeite : tem uvas ao seu modo, e muita quantidade de arvores de espinho, etc». E logo no paragrapho immediato, fallando do que se encontra n'esLa região, diz o seguin- te : «Ha muitos rios mui grandes e mui caudalosos, que vêem desaguar ao mar, entre bosques frescos de formosas La- ranjeiras e mais arvores de fructo.» O mesmo padre Telles em outro lo- gar da citada obra diz que o Congo é «confinante com outro grande reino, cha- mado Loango, de muita frescura de La- ranjeiras e fructas de espinho como as nossas». Em 1783 informava o tenente coro- nel Luiz Cândido Pinheiro Furtado ao governo de Angola, que os negros de Cabinda tinham Laranjeiras azedas. Estas citações, ás quaes poderia jun- tar mais algumas, téem uma certa im- portância em favor da Africa Occiden- tal como uma segunda pátria da Laran- jeira azeda-— o que ainda está por ve- rificar — e dão-nos por assim dizer a certeza de que a introducção d'esta es- pécie n'aquella parte da Africa não foi feita pelos portuguezes. Ponhamos porém ponto final a estas reflexões sobre se a Laranjeira azeda e Laranjeira doce constituem uma ou duas espécies e se são exclusivamente oriun- das da Ásia ou também da Africa. To- mando o que observa Loudon: «uma va- riedade tem muitas vezes tanta impor- tância como uma espécie, quando acon- tece não ter mais», como ponto d'apoio, tractaremos de examinar mais de perto as formas, raças, ou variedades principaes das nossas Laranjeiras cultivadas. Lisboa — Eschola Polytechnica. (Continua) . Edmond Goeze. CHROIICA HORTICOLO-AGRICOLA No penúltimo numero inserimos al- guns períodos extrahidos de uma carta que nos dirigiu o nosso collaborador, o dr. Basilio Constantino d' Almeida Sam- paio, de Murça, com referencia á emi- gração. Em seguida accrescentamos so- bre o mesmo assumpto, mais algumas pa- lavras devidas também á penna do mes- mo cavalheiro : O Deus nohis hxrc otia fe(dt pôde di- zel-o o peg-ureiro silvestre d'uma sociedade in- cipiente, porém nào o a^íricultor d'um povo que assiste aos prodi^ios da industria moderna, e que vae entrando em civilisação. A emiííração dos mancebos para o Brazil e talvez ainda mais a guerra civil pi-omovjda pe- los obstinados sectários do despotismo em Hes- panha, que nos estorva por causa dos recruta- mentos militares ahi feitos, de importarmos os robustos filhos de Galliza, que em annos ante- riores vinham em bandos prestar seus serviços no paiz vinhateiro, são causas de escassez de braços. A emigração dos gallegos compensava bem a emigração dos mancebos portuguezes para o Brazil ; e será um grande mal para o paiz vi- nhateiro do Douro, que a corrente da emigração dos gallegos diminua \ porque então os salários serão cainssimos, e os braços deficientes. Depois do oidium e do Phylloxera venha tam- bém este outro flagello — a falta de braços. Se continuar em escala ascendente a emigração para o Brazil, e não vierem trabalhadores da Galliza para substituir os nossos emigrantes, o viticultor ha-de sofírer terríveis embaraços para 138 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA a cultura-, porque aqui não podem empregar-se machinas, como na producçào cerealífera. Os salários sobem e o preço das subsistên- cias diminue: a escassez de braços produz a alta dos salários, e a falta de mercados de con- summo produz a baixa do preço dos géneros. O atrrieultor no paiz vinhateiro lucta com estes dons embaraços económicos, que siio tal- vez as prinoipaes causas do pouco adiantamen- to da agrioultura. A nossa população rural, que é de 76 p. c, proporção inferior á que se dá em todos os pai- zes da Europa, excepto na Rússia, não tem no paiz para os seus produetos senão dous gran- des mercados de consmnmo — Lisboa e Porto. Com escassez de operários, sem grande com- mercio externo, que nos dê abundantes merca- dos de consunnno, que não podemos ter no inte- rior, não se pôde desenvolver a agricultura, es- pecialmente a viticola-, e com estas condi- ções continuaremos a ter no nosso paiz 4 a 5 milhòes de liectares de terrenos incultos, sem podermos aproveitar os benefícios da nossa li- beral legislação civil, e o derramamento de ca- pitães moveis, que appareoem por todo o paiz. A questão da emigração é hoje das mais im- portantes para o nosso paiz ; e pena foi que na idtima sessão do nosso parlamento não fosse discutida largamente. Os clamores sobre a falta de braços sãoge- raes no paiz vinhateiro; e por isso n'esta suc- cinta comnuinicação agricola registamos este facto para mais uma vez se cliamar a attenção dos experimentados e das intelligencias robus- tas, que possam contribuir para se atalhar um mal tão grave. Para nós a emigração teve sempre a mesma causa — as condições económicas do paiz. Nunca podemos crer que se emigras- se simplesmente por distracção, mas sim para procurar em regiões peregrinas aquillo que no paiz não ha. Outro tanto acontece na França e na Inglaterra, de onde todos os annos sahem milhares de braços robustos. A Inglaterra porém prospera e houve o vapor que veio sub- stituir a força humana, e d'ahi o augmen- to da emigração porque necessariamente occasionou a baixa dos salários. As cente- nas de mulheres que viviam pela agulha viram-se reduzidas á miséria porque o ma- chinismo deu um grande passo na senda do progresso. Officinas onde se emprega- vam milhares de costureiras ficaram re- duzidas á decima parte de obreiras, por- que a machina substituiu vantajosamen- te os seus delicados dedos. O que fazer no meio d'e8tas conjecturas? — emigrar, por- que, apegar dos machinismos se aperfei- çoarem, as necessidades quotidianas con- tinuavam sendo as mesmas. Michelet pre- tende que a machina de costura foi o ve- hiculo da detamente com 300 ou 400 reis diários. E fácil e muito fá- cil reíponder-se que quem não estiver em circumstancías de casar que não se case, mas isto, que como principio é immoralis- simo, tem ainda uma consequência imme- diata, fune^tisúma — o abatimento d'uma nação. Aconselhar o celibato é pro-stituir um paiz; é querer a sua decadência e o seu aniquilamento moral e material. Em Lisboa acha-se nomeada uma com- missão comporta de homens intelligentes que deve estudar esta questão de tama- nha importância, e oxalá que se encon- trem 03 meios de se oppôr um dique á emigração sem se ir de encontro aos prin- cípios liberaes que nos regem. — O jornal da Sociedade Central de Horticultura de Fi'ança dá interessan- tes noticia? sobre as modificações que pôde soífrer o colorido das flores natu- raes. Quando se expõem as flores de cor violeta ao fumo desenvolvido por um ci- garro acceso, vêem-se estas flores mudar de cor e tornarem-se d'um verde tanto mais vivo quanto era carregada a sua cor primitiva. É o que acontece, por exem- plo, com as flores do Thlaspi violeta ou Iberis wmbellata e da Hesperis viatroiia- lis. Esta mudança de cor é devida ao ammoniaco do tabaco. Partindo d'esta observação, o professor italiano L. Gabba fez uma serie de experiências, com o fim de reconhecer as alterações que o ammoniaco determina no colorido das difí'erentes flores. Serviu-se simplesmente para este fim d'ura prato em que deitou uma porção da solução de ammoniaco conhecida vulgarmente com o nome de alcali volátil. CoUocou sobre eíte prato um funil in- vertido, no tubo do qual dispoz as flo- res que quiz submcíter á experiência. Operando d'e?te modo, viu, sob a acção do ammoniaco, as flores azues, violetas e purpurinas tornarem-se d'um bello ver- de; as florei vermelhas carmim (Cravos) tornarem-se pretas; as brancas, amarel- las, etc. As mudança ? de cor mais singulares que se lhe oíFereceram foram as que pro- duziram as flores que reúnem muitas cores diíferentes, e cujas linhas verme- lhas se tornaram verdes, e as brancas, amarellas, etc. Um outro exemplo muito notável foi o que forneceram as Fuchsias de flore? brancas e vermelhas, que, pela acção do? vapore? ammoniacae?, se torna- ram amarellas, azue? e verdes. Depois da? flore? soífrerem e?ta altera- ção de cor, se se mergulharem logo em agua pura, conservam o seu novo colorido durante muitas horas ; depois do que, vol- tam pouco a pouco á sua côr primitiva. Uma outra observação muito interes- sante, devida a Mr. Gabba, é que as flo- res dos Asters, que são naturalmente ino- doras, adquirem ura cheiro aromático, agradável, sob a influencia do ammo- niaco. As flore? d'e?tas mesmas plantas, cuja côr natural é a violeta, tornam-se ver- melhas quando se molham com acido azotico diluido era agua. Por outro lado, estas mesmas flores, fechadas era uma 140 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA caixa de madeira onde fiquem expostas aos vapores do aeidu ciiloravdrico, tor- nam-se, em seis hora-;, d'uin bello verme- lho carmim que consei-vam, quando se coUoquem n'um loirar sêcco e á sombra, depois de as ter seccado ao ar e na ob- scuridade. — A Federação das Sociedades de Horticultura da Bélgica resolveu offere- cer a Mr. A. De Candolle uma medalha, em nome da horticultura belga, quando estiver coucluido o «Prodronius». Folgamos immenso em assim vêr ga- lardoado o mérito e o trabalho de mui- tos aunos. I — Recebemos o catalogo de Mr. Alé- gatièrc, horticultor em Lyon, que se de- dica muito especialmente á cultura dos Pelargoniums. Este catalogo contém numerosas no- vidades. Em seguida damos o endereço d'este especialista: Mr. Alégatière — Chemin de St.-Friest, à Montplaisir, Lvon. — Apressamo-nos em dar publicidade á seguinte carta que acabamos de rece- ber: Snr. Oliveira Júnior — Teiido-ine constado que alíruom tem propalado que estou fazendo esforços para tomar conta da jardinagrem pu- blica d'esta cidade, Ioíto que fiualise o contra- cto com o snr. António Gomes da Silva, actual director dos jardins do Porto, peço a V. que em meu nome declare que isso é conqjletameute des- tituído de fundamento. Até lioje, contra o interesse do municipio e mesmo contra as rcírras estabelecidas para to- dos os ramos de serviço pul)lico, aex.'"" camará municipal do Porto tem adjuilicado a jardina- gem a quem bem llie appetece. Concursos para isto é cousa que nào ha : os empenhos é o bastante para, por exemplo, d'um simples carpinteiro ou trum marítimo qualquer fazer um jardineiro, como se ser horticultor fosse tão fácil como comer f|ueijo e pào. Ora, eu (|ue nào gosto de jogo de enibusca- das, nào quero que ;u|uelles que téem menos co- nhecimento da minha pessoa se persuadam que é verdade eu andar por detraz das trincheiras a fazer fogo ao inimigo. Eu iiào sou guerrilha; eu quero o jot/o franco do "(ícneral á força», e por isso declaro muito positivamente que nun- ca me emponhei para ser director dos jardins públicos (jue realmente sào a vergonha da ci- dade. Consta-me que os irracionaes cortes darvo- res que se tcem feito ultimamente pela cidade e que o meu amigo tem noticiado no «.Jornal de Horticultura Pratica- téem sido impostos á for- ça ao director dos jardins. Eu duvido da veracidade do que se diz, mas a ser assim seria eu o primeiro a exclamar : com similhantes mordomos nào se pôde ser juiz ! Ser carrasco do arvoredo ! Estar sujeito a determi- nações cjue sahem d'um supremo tribunal, para isso é que nào estou resolvido . . . nem ninguém me chama. 20 — junho Seu amigo, 187Õ Jost: Mauques Loureiro. Só hoje é que soubemos que a camará não costumava pôr a concurso a jardina- gem publica, do me>mo modo que faz com todos os outros ramos do serviço pu- blico. Parece-uos que isto é simplesmente uma arbitrariedade. Não nos importa que fulano ou sicrano seja o director dos jar- dins públicos, mas o que desejamos é que elles estejam á altura da cidade do Por- to, e que se proceda com legalidade. O C(')rte dos arvoredos, temol-o dito e repetimol-o, é a vergonha das vergonhas. A quem cabe a responsabilidade? Nós queremos attribuil-a ao jardinei- ro, mas outras pessoas attribuem-na ao vereador encarregado do respectivo pe- louro. Averigue-se, porque não se destroe por exemplo uma avenida de formosas Tílias n'um jardim publico, sem softrer as con- sequências de similhante acto de selva- geria. A César o que é.de César e a Deus o que é de Deus. Informe-nos quem poder e, se é certo, como cremos, o que diz o snr. Marques Loureiro, damos-lhe os parabéns por nun- ca se ter proposto a dirigir os jardins. Ou bera que se é director d'esse ramo de ser- viço municipal, ou bem que se é mera- mente um instrumento que executa as ordens que baixam do snr. camarista. Ou uma cousa ou outra — ou cova ou dente. Nós que decerto não fazemos nenhu- ma proposta para dirigir os jardins, ain- da assim exigimos em nome da honra e da justiça que a ex."''^ camará í-M-a, um concurso, antes de adjudicar novamen- te este serviço. Arbitrariedades é que não podemos nem devemos consentir, porque não es- tamos em Fafe ! Pede-se o que ó de justiça. A justiça não incommoda ninguém. Duarte de Oliveira Júnior. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 141 FUCHSIA GORYMBIFLORA As Fuchsias, oriundas da America, são um dos grandes ornamentos dos jardins da Europa, que possuem hoje grande nu- mero de espécies e variedades. A Fuchsia é um arbusto de porte ele- gante e recommendavel pela belleza e duração das flores, diversidade de forma e de colorido, sendo de fácil cultura. A reproducção deve ser feita na prima- vera com os novos rebentões herbáceos, collocando-os debaixo de uma vidraça ou abrigo. Em poucos dias estão com raiz, promptos para serem transplantados pa- ra pequenos vasos, podendo, depois de fortes, collocar-se em maciços. As Fuchsias soíFrem muito com os Fig. 26 — Fuchsia corymbiflora — Desenhada no Horto Loureiro grandes calores, portanto é necessário collocal-as a meia sombra para que a florescência dure mais tempo e fiquem as plantas saudáveis. Um grupo de Fuchsias bem disposto, onde se combinem as co- res com pericia e delicadeza, é de um effeito surprehendente. Para que estejam pomposas, devem estar em terra leve e bem estrumada. As regas querem-se amiu- dadas durante o verão, mas no inverno deve haver pouca humidade. Para se te- rem boas plantas todos os annos, deve- Vol. VI.— 1875 se deixar um exemplar de cada varie- dade para mãe em vaso, e collocal-o de- baixo d'um abrigo que tenha sol. As plantas mães darão novas reproducções, porque de regra ordinária as que se dei- xam na terra, se não morrem, ficam ra- chiticas por causa dos grandes frios. Geralmente as Fuchsias são de peque- no porte, mas ha entre ellas algumas es- pécies que se tornam grandes arbustos, como são : Fuchsia aròorescens, corym- Jlora,fulgens,etQ, Estas devem-se collocar N.° 8 — Agosto 142 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA isoladas como arbustos de grande porte, porque não se prestara para maciços como as variedades pequenas. A Fuchsia conjmhiflora é uma belleza desde abril a íins d'aí^osto, e em lo<^ar abrigado chega a florescer todo o anno, posto que em menos abundância. As suas flores sào terminaes em longos caclios, d'um vermelho acarminado. Vão cahin- do as flores e vão apparecendo os fructos compridos, pendentes, a principio ver- melhos, tornando-se negros, o que pro- duz efl^eito lindíssimo. São de uma do- çura admirável e são todos devorados pe- los pássaros depois de maduros. A folha- gem é grande, imitando a folha da Ma- gnólia. Eleva-se de 3 a 4 metros, como se fora um guarda sol de flores penden- tes. Para que não seja atacada das gea- das, pôde ser collocada debaixo de outra arvore, porque se dá perfeitamente á sombra; e mesmo encostada a outra se entrelaça a ella, destacando-se brilhan- temente as suas flores pendentes do seio da folhagem extranha. Esta espécie, ain- da que antiga, é digna de se cultivar com mais attenção, tanto assim que todas as pessoas que visitam o nosso estabelecimen- to não deixam de lhe prestar attenção quando passam por alguns exemplares que possuímos. A Fuchsia corymhijlora alba de porte mais pequeno do que a espécie descripta merece também ser cultivada. Não concluiremos sem dizer que a Fu- chsia coryinbijiora&& reproduz muito bem por semente. José Marques Loureiro. AS ARVORES DA QUINA EM CABO VERDE E NA MADEIRA Recebemos da ilha de Santo Antão, na data de 26 de novembro de 1874, carta do nosso collega, o dr. F. HopíFer, com informações acerca das plantas da Quina, que para alli foram remcttidas haverá cinco para seis annos ; e acompa- nhava-a um pequeno ramo florido, colhi- do no sitio dito da Fajan de Bois, aon- de existe em cultura uma parte d'estas plantas, e aonde pela primeira vez ap- pareceram floridas no mez de outubro do próximo anno findo de 1874. Depois nos foram enviados pela secretaria d'es- tado dos negócios da marinha e ultra- mar 03 exemplares egualmente floridos que o governador da província mandou ao governo para serem examinados e de- terminada a espécie botânica a que per- tencem. O local da cultura é, no officio do governador, denominado o Pico da Antónia na Ribeira do Paul, que suppo- mos ser o mesmo que nos fora indicado pelo snr. HopfFer, porquanto da carta recebida se deprehende terem sido os ramos assim mandados também colhidos por ellc na inspecção official que para isso se lhe ordenara. De resto a respei- to das localidades no archipelago, aonde estas culturas se toem iniciado e das con- dições topographicas e climatéricas ás quaes satisfazem, ainda nos faltam infor- mações, que mais tarde contamos haver. A todos 03 ramo3 enviados ainda fal- ta a fructiflcação, que é para desejar ve- nha logo que elles a produzam ; ha ahi, porém, o que basta para reconhecer des- de já os caractere3 da espécie, auxilia- dos como para isso fomos pelas excel- lentes monographias de Weddel e How- ard, «Histoire Naturelle des Quinqui- nas», e «Illustrations of Nueva Quino- logia» de Pavon. O exemplar que tivemos do dr. Ho- pífer não trazia mais folhas do que as tíoraes, diff'erentes, como são, na forma e grandeza das outras, que guarnecem os individues da espécie, e que só pode- mos vêr nos exemplares aliás mais com- pletos, remettidos pela secretaria d'esta- do ; cora sirailhante falta o ramo primei- ro estudado nos pareceu que seria da es- pécie Cinchona Condaminea var. lanci- folia Weddell. Soccorridos porém pela observação dos últimos nenhuma duvida julgamos restar de ser antes a espécie para todos a Cinchona succirubra, que Pavon assignalára, e Howard depois, aproveitando os trabalhos inéditos do cé- lebre botânico hespanhol e todas as in- formações ulteriormente havidas, maia JORNAL DE HORTICULTUEA PRATICA 143 circumstanciadamente descreveu e figu- rou na monographia que publicou e a nós nos serviu de guia principal no as- sumpto, pag. 1-23 Est. 9. Esta determinação está em harmonia com a precedente historia das tentativas ha seis annos feitas para introduzir nas ilhas tão interessante arvoredo, porquan- to as sementes, que vieram do Jardim Bo- tânico de Kew e graças aos cuidados em- pregados no de Coimbra deram origem ás plantas remettidas para Cabo Verde e para outras partes da Africa portugue- za, procederam segundo as indicações auctorisadas que traziam, das espécies Cinchona Calisaya, Cinchona Condami- nea, e Cinchona succirubra, as mais va- liosas do género, e que por isso foram o objecto dos principaes cuidados empre- gados pelos inglezes na introducção d' es- te arvoredo na índia, aonde é hoje ex- tensamente cultivado. Entre as três es- pécies é sobretudo importante a Cincho- na succirubra, por ser a que dá Quina vermelha, a melhor e a mais rica dos principies activos que distinguem estas valiosas drogas, a casca que os hespa- nhoes fizeram primeiro conhecer com o nome de Cascarilla colorada de Huaran- da, a qual andou erradamente e por muito tempo attribuida a espécies de Cinchona bem difí'erentes e de facto mui- to menos valiosas. A Cinchona succiru- bra ainda de outro modo se tornou inte- ressante: crescendo em região da Nova Granada, na província de Quito, de alguns graus de temperatura média in- ferior á das regiões em geral das outras espécies de Cinchona, é das que se teem mostrado mais fáceis de expatriar a que os inglezes mais conseguiram espalhar pela cultura na índia e na Jamaica. Tendo sido a primeira a florir em Cabo Verde, promette também ser a que me- lhor produza no archipelago, espalhando- se ahi largamente e assegurando-lhe as- sim mais uma fonte de riqvieza. A casca de ramos tão novos como é a dos ramos floridos que vieram, não permitte ainda o reconhecer-lhe nas cellulas a matéria corante, os crjstaes aciculares, as maté- rias alcalóides, que só mais tarde alli apparecem caracterisando estas cascas ; não foi por isso submettida a d'esses ra- mos que recebemos á analyse chimica e microscópica, a que mais tarde será aliás preciso sujeitar as cascas que derivem de ramos com a edade e o desenvolvi- mento para isso indispensáveis. Depois das remessas de Cabo Verde e do estudo por ellas feito, tivemos ou- tra da ilha da Madeira, a qual devemos aos cuidados do nosso coUega e amigo, barão de Castello de Paiva, e nos fez possuir mais um ramo florido das arvo- res de Quina cultivadas n'este outro ar- chipelago. Similhante cultura tem sido alli feita com plantas que foram de Lis- boa e procederam da sementeira do jar- dim de Coimbra, ou proveio de plantas trazidas das estufas de Londres ; a ar- vore que floresceu na Madeira, também pela primeira vez no anno anterior, era das que foram de Coimbra e Lisboa. Diz a informação, que esta arvore ou a plan- tação de que faz parte existe a mais de 200 pés de elevação sobre o mar. O i'a- mo remettido também não trazia senão as folhas floraes; tudo n'elle indicava po- rém ser da Cinchona succirubra, como nos de Cabo Verde, dando-nos assim a certeza de haver a boa espécie conquis- tado mais uma região portugueza, a do archipelago da Madeira. A arvore que assim floriu, diz o nosso amigo barão de Castello de Paiva, tem 15 palmos de al- tura, sendo para notar que esta mesma altura é a indicada pelo dr. Hopff'er pa- ra as arvores que egualmente floriram em Cabo Verde, mostrando tudo quanto nos dous archipelagos caminha paralle- lamente o desenvolvimento d'este arvo- redo. Lisboa. Bernardino A. Gomes. AESCULUS HIPPOCASTANUM Esta arvore pertence á familia das Hippocastaneas Endl., segundo alguns auctores, e á das Sapindaceas Juss., se- gundo outros. A pátria do Aesculus hippocastanum ainda hoje é muito duvidosa; porém, se- gundo as indicações mais exactas que te- mos, parece fora de duvida ser a Ásia 144 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA central, isto é, a índia septentrional ou a Pérsia. A sua introducçào na Europa data de 1550; porém f^ão diversas as opi- niões acerca da maneira como se fizera. Uns querem que as sementes tivessem sido trazidas pelas caravanas para Cons- tantinopla e d'ahi passassem á Europa Occidental ; outros querem que tivesse vindo das montanhas do Thibet para In- glaterra. Oi primeiros exemplares que vieram para Pariz foram trazidos por um tal Baclielierera 1615, tendo-se plan- tado o primeiro no jardim do hotel Sou- bise, o seííundo no jardim do palácio real o o terceiro no Luxembourjcr. Na Áustria porém a sua introduccão data de cpocha mais remota; pois que a primeira d'es- tas arvores que alli se plantou, segundo se diz, foi em Vienna no anno de 1588, sendo trazida para alli pelo distincto bo- tânico Clusius ; com tudo na opinião do snr. Mathieu foi em 1575, isto é, 13 annos antes. Esta arvore foi descripta pela pri- meira vez por Mathiolus, e depois por Clusiuí', no seu «Rariorum Plantaram Historia, etc.» Segundo alguns documen- tos que temos á vista, era, ainda em 1581, considerada como uma raridade botâ- nica. O Castanheiro da índia (pois é esta a denominação que se lhe dá em Portugal *) é arvore de primeira gran- deza ; pois p(3de attingir 20 metros d'al- tura e ás vezes mais. No nosso clima porém nunca chega a adquirir as pro- porções que obtém no seu paiz natal. Entre as arvores de folhas caducas que entre nós se cultivam, é esta uma das mais bellas. A sua folhagem consti- tuida por folhas digitadas, as quaes são d'um verde-claro, e conservam uma cer- ta frescura até ao começo do outono, forma uma das sombras mais aprasiveis, c das nossas arvores d'alinharaento pou- cas são as que apresentam um aspecto tão encantador durante a sua florescên- cia como é o Aesculus hippocastanum. Começa a florescer aos 15 annos. Pe- na é que esta arvore seja ainda entre nós tão pouco empregada na arborisação das estradas e talvez que tenha influi- fl) Chama-so oin ullemào Gcmeinr línosfca/t- tanie; cm inglez Coinmon Horsc-chestnut ; em francez Marronier d'Inde. do n'isto o seu lento desenvolvimento. A madeira e os seus combustíveis são de qualidade muito inferior, e portanto arvore absolutamente imprópria para a cultura de florestas. Nas tapadas aonde houver veados, será conveniente planta- rem-se ahi algumas d'esta3 arvores, pois estes animaes gostam immenso de comer os seus fructos, assim como as folhas na occaíãão em que cahem. Esta arvore dá-se nas regiões de planície e em solos pouco accidentados ; não gosta das montanhas; requer terrenos fres- cos, ligeiros e férteis. Alguns aucto- res de tractados de matéria medica dão ao Castanheiro da índia virtudes medi- cinaes ; pois dizem que fazendo-se uma pequena incisão na casca d'esta arvore, d'ella sahe um bálsamo terebinthinaceo, viscoso e pellucido, com sabor amargo adstringente, mas agradável ao paladar, sendo estas ultimas propriedades muito análogas ás da Quina. A sua casca con- tém tanino na razão de 1,8 p. c., e o pericarpo esse ainda contém mais abun- dância d'aquella substancia e ao mesmo tempo o acido gallico. As folhas e a cas- ca produzem mais uma outra matéria tin- torial que pôde fornecer o amarello, par- do e preto. A composição chi mi ca dos fructos do Castanheiro da índia é, segundo as ana- lyses feitas pelo snr. Lapage, a seguinte : Agua -45,00 Tecido vegetal, parenchyma .... 8,50 Fécula. 17,50 Óleo doce saponificado 6,50 Glucose . . , 6,75 Gomma 2,70 Substancia particular d'um sabor um pouco adocicado 3,70 Principio amai'go (saponina) .... 1,55 Matérias proteicas (albumina e ca- seina) 3,35 Matérias inorgânicas (potassa, cal, ma- gnesia unida a um acido orgânico; cliloro, silica, acido sulphurico e phos- phorico 1,55 Perda 2,90 100,00 O snr. Jeronvmo Joaquim de Figuei- redo no seu livro intitulado «Flora Phar- maceutica e Alimentar Portugueza», a pag. 200, cita as vantagens que d'e3- ta arvore podemos tirar; e como talvez muitos dos nossos leitores não tenham JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 145 conhecimento d'aquella obra, terminare- mos por transcrever as que nos parece- ram mais interessantes : «1.'^ — As suas folhas, que são têmpo- ras em cahir, e ainda succulentas, pres- tam excellente alimento aos veados nas tapadas, era que se conservarem estes animaes ; e pela putrefacção podem ser- vir á fabricação dos estrumes. 2.* — Esta arvore ora é inteiramen- te hermaphrodita, ora polygama, e sem- pre muito abundante : ha n'ella o poUen das antheras, e consequentemente a ma- téria ceracea ; e por esta razão talvez estas flores fazem as delicias das abelhav^., e de mais alguns insectos que construem as suas habitações da mesma matéria. 3." — Os fructos, abundantíssimos em amido, ministram a muitos animaes um alimento muito nutriente, a ponto de se observar nas fêmeas em latação uma se- creção muito mais abundante de leite em consequência d'este alimento ; assim succede nas cabras, ovelhas e vaccas: para ministrar este pasto nada mais é necessário que descascar os fructos, e ter cuidado de tirar-lhe o tegumento inter- no, chamado vulgarmente camisa, par- til-os em pedaços mistural-os com feno humedecido, e offerecer a mistura aos animaes. 4.* — Os mesmos fructos prestam aos cavallos, além do mesmo alimento, um grande auxilio nas suas moléstias, quan- do estas consistem em difficuldade de res- pirar, e tosse. D'esta vantagem é dedu- zido o nome especifico d'esta arvore hip- pocastanum. 5.^ — Dão os mesmos fructos excel- lente amido, que pôde servir aos mes- mos usos que o do Trigo, Batatas, etc, podendo extrahir-se pelo methodo usado para extrahir d'estes últimos vegetaes. 6.^ — A agua da maturação d'estes fructos para a extracção do amido, ser- ve para dealbar os tecidos de canamo linho, algodão e lã. Os leitores podem ver em Murray («App. Med.», Tomo IV, pag. 62), a citação dos auctores acerca de todas es- tas utilidades : a respeito do amido pos- so referir-me á minha própria experiên- cia, tendo-o tirado do fructo d'esta ar- vore, alvíssimo, insípido, e tão puro, e mais abundante que o do Trigo.)) Coimbra — Jardim Botânico. Adolpho Frederico Moller. VINICULTURA PORTUGUEZA ^ Tocando com a região do Minho e com a região do Douro, isto é, com as duas mais oppostas naturezas dos vinhos, o verde, e o maduríssimo, succede-se, vin- do sempre do norte para o sul, a exten- sa região vinícola da Beira, que por isso apresenta o duplo caracter vinhateiro das suas duas visinhanças, umas vezes con- fundidas e como que baralhadas a curtos intervallos, outras vezes separadas em sub-regiões distinctas. — Comprehende esta região vinícola a parte meridional do districto de Vizeu, o districto da Guar- da, o districto de Coimbra, o districto de Aveiro, e o districto de Castello Branco. Quanto á orographia póde-se dizer, que sem ser de superfície tão montanho- sa como a transmontana, nem tão alcan- tilada como a do Douro, é ainda as- (1) Vide J. H. P., vol. VI, pag. 129. sim bastante torturado o seu relevo, par- ticularmente nos districtos orientaes da Guarda e Castello Branco. Nos distri- ctos occidentaes, Aveiro e Coimbra so- bretudo, a região é muito menos serra- na, oíferecendo grandes planices e exten- síssimos valles. Quanto á geologia, são variadas as con- dições e naturezas dos terrenos, desde a formação granítica em que assentam os districtos de Vizeu e Guarda, a forma- ção de schistos em que descança quasi todo o districto de Castello Branco, até aos terrenos quaternários de Aveiro, e terciários de Coimbra. É notável porém que poucas d'estas condições orographicas e geológicas assi- gnalam n'esta região a sua influencia na qualidade dos vinhos tão salientemente como se observa nas regiões preceden- tes. Encontram-se centros vinhateiros pro- 146 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA duzindo óptimos vinhos sobre granito. Apparecem centros vinhateiros em pla- Dicies de Aveiro produzindo apenas vi- nho verdo; como se produzem nas altu- ras grauiticas e «chistosas de Casteilo Bi'anco. Os climas locaes, pela intiuencia da temperatura e da humidade, descon- certam de algum modo o cunho que po- dia implantar o relevo e a natureza du solo. A cultura da vinha apresenta os dous Bystemas já conhecidos; o de vinha alta trepada sobre arvore, e o de vinha bai- xa. Este ultimo systema é, ou de vara curta, poda galheira, como se usa no Fuudào, ou é de vara alta como no Doux'0, mas a empa é que diversiíica n'algun3 pontos, sendo umas vezes de Undal, em que a vara inclina obliqua- mente para o chão enlaçada a uma ou duas estacas obliquas; outras vezes de rodrigão, isto é, ennovelada sobre um único mourão vertical ; outras vezes de corc/ão,isto é, enlaçadas as varas sobre tra- vessas horisontaes que ligam os mourões de duas cepas próximas. Estas formas de empa vèem-se no districto de Vizeu. Em Aveiro, na Bairrada, a empa ap- proxima-se das empas usadas na região vinícola da Extremadura. A vara é ge- mida e voltada em argola até vir atar com vime ao corpo da cepa. Tem nas localidades o nome de empa de chouri- ça, de argola, etc. Os três fabricos, es- cava, cava a monte, e redra ou arrenda são geralmente feitos nas vinhas baixas de toda a região. — A mettição do ba- cello varia de 20 a 40^*000 reis por mi- lheiro. As castas de uvas são na maior parte as que se encontram em Traz-os-Montes, e para não lepetirmos a sua lista apenas mencionaremos algumas de nome diffe- reate, posto que talvez uma ou outra o não sejam realmente em natureza. Al- frochairo, Pcnamac ,r, Negra moura, Bo- ca de mina. Boal de iSantarem, Fernão Pires, Borra mosca. Xará, Baga, Boal cachulo, Tinta doPf.ral, Preto Martinh", Alva lorão, Pilongo, Bemfeita, Uva de cão, Terrantuz, Amaral, Mirinho, Ci- dvKlrinha, Escabelado, Alvar, Esganacao, Baltar, Guedelho. Todas ou quasi todas estas novas castas se encontram na re- gião do Douro, — que, como já dissemos, é o solar de todas as castas de uvas por- tuguezas, que dalli tem sahido, e sahem ainda para as outras regiões vinícolas do reino. As vindimas começam geralmente pelo S. Miguel, e concluem até 10 de outubro. Aparte os mostos das uveiras, cuja graduação, como nas do Minho, varia de 12 a 18 ^ Q, os mostos das vinhas baixas pouco diversiíicam em graduação de as- .000 reis. Os vinhos da Covilhã, entre os quaes é afamado o vinho de Tortosendo. Preço 44^000 reis. Os vinhos de Castello Branco, cujo pro- totypo é o vinho da Louzã. Preço reis 40Í5ÍOOO. Os vinhos de Penaviacor, de que são representantes os vinhos da cabeça d'es- te concelho. Preço 40j^000 reis. Os vinhos de Idanha a Nova e Proença. Preço 42í^000 reis. 2.*^ Vinhos menos bons. — Os de Bel- monte, S. Vicente da Beira, Villa de Rei, Villa Velhu, de Ródão, Certa, e Oleiros. Preço médio 25;$>000 reis. Além do vinho maduro cria-se em Castello Branco, Oleiros e na Certa al- gum pouco vinho verde de enforcado, que não é de inferior qualidade. 4.* Sub-regiãn, da Guarda. — Se o centro precedente é pouco vinhateiro, o da Guarda o é muito mais, mas os seus vinhos passam quasi desconhecidos. En- tretanto os concelhos da Guarda, de Se- túbal, de Foscôa e Pinhel são tão produ- ctivos ou mais que os do Fundão e da Covilhã, e apresentam typos de estima- ção. Anda por 62:000 hectolitros o vinho colhido em 1872 n'e-ta sub-região ; em- quanto que no districto de Castello Bran- co, no mesmo anno, pouco mais passou de 148 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 20:000 hectolitros. Algum vinho ver- de se produz também aqui ; c o maduro otferece geraimeute o meio termo que se conliece pelo nome de entremaduro. Se- gundo uma nota muito curiosa que por intermédio do snr. intendente de pecuá- ria d'eáte di.5tricto me commuuicou o snr. Freire, da (juarda, os mostos das uvas brancas dão apenas de 10 a 12 por cen- to de álcool, e os -das tintas de 8 a 10. É quasi a riqueza dos mo&tos das uvei- ras do Minho de boa qualidade. O governo das vinhas segue um pou- co os usos estabelecidos no Douro. A vinificação é feita em lagares de pedra; algumas vezes em balseiros. Pa- rece que a feitoria não produz aqui bom resultado, o que não é para admirar, attendendo á imperfeita maturação das uvas. Os vinhos da Guarda são leves, sa- borosos, frescos, bons para pasto, emíim. Alguns d'elles adquirem mais vigor e madureza e são realmente excellentes vi- nhos de meza. Entre estes podem-se ci- tar 03 das freguezias de Freixeda, Al- •nxo falia e Quinta. As freguezias de maior producção são : as de Frechas, Carmiceres, Cogulla, Val- le-longo, Povoas do Concelho e d^El-rei. Os concelhos mais vinhateiros são : os de Foscôa, Pinhel, Guarda e Figueira. Os de Almeida e de Manteigas são os mais pobres em vinhos. ô.'"^ iSub-regiào, de Coimbra. Aparte a porção d'esta região que se comprehen- de na Bairrada, o resto d'esta sub-re- gião produz vinhos que se podem classi- íicar em três grupos. Vinhos de exportação^ que pouco diffe- rem dos da Bairrada. Taes são os de tíe]}Í7is, Murtede, Bolho, Cantanhede, An- ca, Portunhos. Vinhos de consummo, mais fracos, mas havendo entre elles alguns muito bons para pasto. Taes são os de Coimbra^ tíoure, Condeixa, etc. Vinhos de caldeira, que são os mais fracos de todos e que não teem geralmen- te outra applicação senão para serem convertidos em aguardente. Taes são os chamados vinhos do Bairro, os de algu- mas freguezias de Cantanhede, como são Febe, Ourenta, Tocha, etc. Os vinhos de Tábua, de Oliveira do Hosjjital, da Figueira da Foz, apresen- tam typos que são um meio termo entre os vinhos da Bairrada e do Dão ; alguns chegam a ser distinctos. As sub-regiões da Guarda, de Castel- lo Branco e de Coimbra necessitam ser melhor estudadas, e até lá, apesar do que deixamos dito, reservamos o nosso juizo. J. I. Ferreira Lapa. A NOVA MOLÉSTIA DAS BATATAS (SOLANUM TUBEROSUM) Como não bastasse o antigo mal que ha annos tem destruído os batataes e que em muitos paizcs, taes como na Allemanha, Irlanda e principalmente na Europa me- ridional, tem produzido crises alimentí- cias, acaba agora de apparecer um in- secto chamado Colorado, que felizmen- te até hoje só tem apparecido na Ame- rica do norte. E um terrível inimigo; roo as folhas e as hastes de maneira tal que dcstroc completamente a planta. Este insecto é oriundo das montanhas denominadas Rocky Mountains, que divi- dem a America do norte dos Estados da Califórnia. Vivia este insecto sobre uma espécie de Batata brava que se encontra n'e53a3 montanhas, o ahi so conservava ha muitos annos. Á medida que os colo- nos se teem approximado d'aquellas mon- tanhas e que teem plantado os seus ba- tataes, o insecto, abandonando o terreno onde outr'ora vivia, tem-n'os invadido e destruído. O seu voo estende-se a gran- des distancias. Se invade qualquer ter- reno aonde não encontra batataes, ou se aquelles que encontrou foram por elle devastados, emigra cm grandes nuvens e nem os grandes rios ou lagos da Ame- rica do norte lhe impedem a passagem, e d'esta maneira tem infestado quasi to- dos aquelles Estados. A sua multiplicação é rápida, e tão rá- pida, que um jornal d'agricultura do Es- tado d'Ohio, diz, que sendo este grande JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 149 Estado invadido em 1870 por pequenas quantidades d'este insecto em menos de três annos as nuvens eram tão grandes que destruíram todos os batataes. A des- truição te^n chegado a tal ponto que, a não se terem empregado difierentes meios para matar o insecto, os batataes teriam acabado nos Estados-Unidos. Tem-se inventado muita qualidade de apparelhos para os apanhar, mas todos sem resultado. Os meios que tem dado bons resultados são, ou apanhai-os á mão, ou matando-os com veneno. A gente que se occupa em apanhar o insecto ou lar- va (lagarta) usa luvas, porque se assim não fora em pouco tempo teria as mãos cheias de feridas, tal é o liquido peço- nhento que contém em si e que exhala um péssimo cheiro. O veneno, que tem sido empregado com vantagem, é o aci- do arsénico de cobre (verde de Pariz) em pó, mistui*ado com farinha na propor- ção de dous kilogrammas para cada acre americano ; applica-se por meio de um rallo collocado na extremidade de uma vara comprida polvilhando-se os batataes quando estes estão molhados pela chuva ou pelo orvalho. Também se pôde appli- car dissolvendo-se uma colher do acido arsénico de cobre em um balde d'agua e salpicando-se com uma vassoura os bata- taes. Estes meios teem sido os mais efiâ- cazes para a destruição do insecto ou larva. Tem-se conhecido também nos Es- tados-Unidos que a vespa é um inimigo poderoso d'este insecto, porque não só o dcritroe, como também aos ovos, e d'es- ta maneira tem a vespa prestado tão bons serviços que tem libertado do fla- geilo alguns Estados. O medo que ha de que o terrível in- secto (que até agora se tem concentrado na America) possa passar para a Euro- pa, importanclo-se junto com as Batatas ou em qualquer outras plantas da fa- mília das tíolanaceaSj e como actualmente se estava importando muita Batata da America, porque sendo esta em grande parte obtida de semente os lavradores a preferiam para vêr se acabavam com a primeira moléstia, o parlamento allemão, logo que teve conhecimento d'aquelle novo íiagello, prohibiu a entrada da Ba- tata, porque em logar de melhorar vi- ria peorar, e muito mais pelo motivo de poderem ser importados com os tubércu- los os ovos d'aquelle insecto, como acima dizemos. O Colorado pertence á família das Chrysomelas e assimilha-se muito á Chry- somela cerealis, que tão devastadora é em algumas partes da Europa nas cearas do Trigo. Lisboa. George A. Wheelhouse. ESTUDO SOBRE O GÉNERO GITRUS Aproveitemos também esta observação de Loudon como ponto de partida para espairecer a vista pelas formas, raças e até pelas principaes variedades das nossas Laranjeiras de fructo doce e azedo. Em quasi todas as espécies cultivadas do género Citrus ha uma grande predis- posição para se hyhridarem entre si, o que está bem provado pela grande quantidade de diíferentes raças, nasci- das, sem duvida, mais por simples acaso do que por influencia da arte. Gallesío tem portanto muita razão para observar «que o melhoramento de varias espécies é neu- tralísado por este contínuo e regular cru- zamento». (1) Vide J. H. P., vol. VI, pag. 133. O príncipe Maximiliano, de Wied- Neuwíed, falia da laranja brava do Bra- zil chamada laranja da terra, que não tem de modo algum a deliciosa proprie- dade de refrescar como as laranjas cultivadas, mas sim um gosto doce-enjoa- tivo. Esta é chamada por Martins Citrus aurantium efferata. E bem sabido todavia que o género Citrus e toda a família das Aurantia- ceas, excluindo o género mexicano Stau- ranthus, cuja única espécie apresenta quasi tanta affinidade com as Celastri~ neas como com as Aurantiaceas, não é d'orígem americana, e por consequência essa chamada espécie brazíleira não ó nem nada mais nem nada menos do que uma variedade que desappareceu da cul- tura e que tomou os caracteres d'uma 150 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA planta naturalisada ou mesmo espontâ- nea. Outra variedade curiosa, que tem egual- mente por pátria o Brazil, é a laranja de embigo, na qual se observa uma multipli- cação extraordinária do numero normal dos carpclos o em cujo caso uma laran- ja se forma dentro da outra. Todavia o género Citrus nào está só sujeito á mul- tiplicação extraordinária dos carpelo^, mas também á separação dos mesmos, o que produz o que se ci^ama laranja ar- via de boi (hormd oranyej e limão com dedo (jingered citron). Uma variedade muito notável, segun- do Risso, é o Citrus awantium fructu va- riabili. As folhas nos rebentos novos são ovaes e arredondadas, manchadas de ama- rello e sustentadas por peciolos com azas cordiformes. Quando cahem estas folhas, succedem-se outras mais compridas e mais estreitas. Na circumferencia teem uma margem ondulada de verde claro mistu- rado com amarello e são sustentadas por peciolos desprovidos d'azas. O fructo, em- quanto novo, tem a forma de uma pêra, é amarello, tem estrias longitudinaes e é doce, mas consoante vae amadurecendo torna-se espherico e d'um amarello-aver- mclhado, então amargo. A famosa bizzarria orange oíferece um notável exemplo de hvbridação. Os jar- dineiros, que em 1644 crearam, em Flo- rença, esta planta declararam que tinha nascido de semente e que havia sido en- xertada, mas que o garfo morrera e o cavallo desenvolvera-se e produzira a biz- zarria. Gallesio, que examinou cuidadosamen- te muitos espécimens vivos que compa- rou com a descripção dada por P. Nato, que foi o primeiro que a descreveu, diz que a arvore produz simultaneamente fo- lhas, flores e fructos, eguaes aos da La- ranjeira azeda e aos do Limoeiro de Flo- rença c que se acham unidos externa e in- ternamente ou juntos por varias manei- ras. Esta arvore póde-sc propagar por es- taca e não perde nenhum dos seus di- versos caracteres. A chamada laranja trifacial de Ale- xandria e de Smyrna parece-se na sua contextura geral com a bizzarria, mas differe d'ella por se achar a laranja doce e o limão consubstanciados n'um só fru- cto e também por a mesma arvore dar as duas qualidades separadamente. Não se sabe nada relativamente á sua ori- gem. Emquanto á bizzarria, pensam muitos auctores que é um enxerto hybrido, mas Gallesio por outro lado crê que é uma hybrida ordinária com a particularidade de produzir fructos similhantes aos pães. Isto não é para extranhar, visto que as es- pécies d'este género cruzam-se esponta- neamente amiudadas vezes (*). A hybridação em si pôde ser conside- rada como uma fusão de duas espécies em que tanto uma como a outra teem partes eguaes. N'este caso os caracteres podem misturar-se, sem desapparecer, recebendo dos dous folhas, flores e fru- ctos muito dififerentes, que se parecem umas vezes com o pae e outras com a mãe e algumas vezes com os dous ao mesmo tempo. A máxima parte dos auctores conside- ram a Laranjeira de folhas de murta (Citrus aurantium myrtifolia) como uma variedade. Ha comtudo alguns botânicos que a acceitam como boa espécie. Os seus fructos apenas contéem algumas se- mentes boas que reproduzem com a má- xima fidelidade a planta-mãe, o que em geral é considerado como prova esjjeci- Jica. Não ha a menor duvida em que é oriunda da China, onde desde as epochas mais remotas lhe ligavam muito valor por ser anã ou pelas suas formas exqui- sitas. As duas outras variedades Citrus au- rantium buxi folia e C. sal ici foi ia são ipro- vcnientes da primeira (myrtifolia) e en- contram-se algumas vezes individuos que reúnem estas duas e até três formas de folhas. Quando não seja mais, deixam ver a transição de uma para a outra. A laranja cor de sangue (Citrus au- rantium sanquinea) chamada também la- ranja de Malta, tem uma cor amarello- avcrmelhada e a polpa é^ irregularmente manchada de carmim. E um fructo de (1) Vide «The Yariation of Animais and Plant8« by Darwin — vol. 1, pag. 391. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 151 gosto delicioso, mas esta variedade não se reproduz pela semente. Pereira falia d'outra variedade, que dá fructos pequenos e sem semente como a laranja de tí. Migud, variedade que não tive a felicidade de vèr durante a minha estada n^iquella ilha, em 1866. A laranja que vulgarmente encontra- mos no commercio cnama Pereira la- ranja da China, e Gallcáio também fal- ia cl'ella sob o nome de Citrus aurantium sinense. Ha cerca de 250 annos que a Laran- jeira azeda de forma anã foi introduzida directamente da China e a designa- ção sinensis ou chinensis, dada antiga- mente a todas as Laranjeiras doces, ficou sendo exclusivo d'eista variedade pygmêa. Em todas as obras que tractam d'estas arvores fructiferas e em todos os paizes onde são cultivadas encontra-se com o nome de Citrus sinensis, conside- rada até por alguns botânicos como uma boa espécie. Pode dizer-se que passou a provérbio bem fundamentado a longevidade e a fertilidade das Laranjeiras. No convento de Santa Sabina, em Ro- ma, existe uma Laranjeira que conta nada menos de 600 annos. O Grand Bourbon é uma Laranjeira dos jardins de Versailles que tem 465 annos e que mostra ainda uma vegetação bastante vigorosa. Foi plantada na Navarra em 1410 e 89 annos depois foi oíferecida co- mo presente á corte real de França. Ora se esta arvore podésse lisongear-se de ter uma dynastia, não é menos certo que essa dynastia poderia mofar dos reinados, dos impérios e das republicas. Nos Jardins Reaes de Potsdam, na Prússia, ha algumas Laranjeiras que teem approximadamente as mesmas di- mensões e edade que a precedente e são conhecidas pelos nomes de Le grand électeur, Frédtric le Grand, etc. Segundo Risso, a Laranjeira Mandari- na não é mais do que uma variedade da Laranjeira doce — Citrus aurantium var. Mandar inum. Loureiro comtudo conside- ra-a, e com razão, uma espécie distin- cta. III) Citrus nohilis Lour., «Fl. Coch.», 460. var. A major. Mandarine Anàr . «Bot. Repert.» var. B minor. Tangerine «Bot.Reg.», tab. 211. A espécie de Tenore — Citrus delicio- sa — é simplesmente a velha espécie de Loureiro. Como espécie, o Citrus nohilis distin- gue-se perfeitamente de todas as espécies d'este género. Forma uma arvore de pe- queno porte que começa a fructiíicar desde a primeira infância. Os ramos são providos de espinhos compridos. Tem as folhas lanceoladas e são d' um verde-cla- ro muito brilhante; não são aladas nem creneiadas. As flores são d'um branco puro e pequenas. Pôde dizer-se que o fructos são pequenos se os compararmos com os da nossa Laranjeira doce (var. A, 5 pollegadas ; var. B de 2-2 */2 polle- gadas de diâmetro). Os carpelos separam-se entre si muito facilmente, a casca do fructo é extrema- mente fina e despega-se bem da polpa. Tanto o fructo como a casca teem um cheiro muito pronunciado e o gosto pô- de dizer-se que é sui generis, Eáta espécie supporta melhor os rigo- res do inverno do que a Laranjeira do- ce e reproduz o typo pela semente. Os fructos amadurecem mais cedo. Ainda não foi atacada pela moléstia de que fal- íamos no principio d'este artigo. N'uma curta noticia que Mr. Charles Naudin escreveu na «Revue Horticole» (16 março — 1870), decerto que se equi- vocou, porque a sua descripção não ?e refere a variedade A Mandarina, que ainda é bastante rara nas nossas cultu- ras, mas referia-se decerto á varie ade B Tangerina, que se tem tornado muito vulgar no meio-dia da Europa. Alguns cultivadores de Laranjeiras teem recommendado ultimamente a en- xertia da Tangi rina na Mandarina, ob- tendo-se por este processo simultanea- mente uma vegetação mais vigorosa « fi'uct03 com maiores dimensões. IV) Citrus medica Linn., Risso, Lour., «Fi. Cochin.», pag. 568; Brotero «Fl. Luáit.», II, pag. 281, Malum Mediae Virg. «Georg», Cedratier, Cederate, Ci- drtira, árabe Otrody. Pátria — Media. Primeiramente foi introduzida em V3- 152 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA rias províncias da Pérsia e foi ahi que os gregos a conheceram. (Segundo A. Ue CandoUe a descripção que d'e.sta espécie nos dá Theophrasto (H. PI. 4, 4) é muito exacta («(iéographie Botanique»). Comtudo o dr. Fraas («Flo- ra Clássica», pag. 85) observa que a des- cripção de Theophrasto se refere a outra espécie — ao Citrus Ddcumana — e pre- tende que o Citrus medica era apenas conhecido de tradição pelos gregos. A epocha em que se conheceu o Li- moeiro é mais remota do que a de qual- quer outra espécie do género Citrus. O dr. Royle encontrou-o no estado espontâ- neo nas florestas da índia do Norte («II- lust. Ilimal.», pi. 129) e d'ahi foi dentro em pouco levado para a Pérsia e mesmo para a China. Os hebreus celebravam o Limoeiro nos tempos do império romano e crê-se ge- ralmente que a arvore magnifica de que falia o Velho Testamento era o Limoei- ro. Em todo o caso os judeus ainda hoje Be servem dos ramos, das flores e dos fru- ct03 d'esta espécie nas suas festas reli- giosas. Na Itália, foi introduzida pelo III ou IV século. 0 eremita romano Ferrari na sua obra «Hespérides sive de malorum aureorum cultura et non», publicada em Roma em 1646, faz menção de três formas princi- paes do Malus citreus, a saber: ■ 1 — Os Limoeiros vulgares ; 2 — Os de fructo doce; 3 — Os de fructo palmado. Risso enumera 137 variedades d'esta espécie e divide-as em 12 sub-especies. Bem comtudo tractar de formar 2 gran- des grupos que então corresponderiam ás 2 espécies Linneannas — Citrus medi- ca e Citrus aurantium. Segundo o dr. Alefeld (aBotan. Zei- tung», 1865), tanto o Citrus medica co- mo o Citrus aurantium são apenas os dous elos das extremidades d'uma única espécie, tão intimamente ligados pelos outros elos intermediários que especifica- mente não ó possível separál-os. As flores do Citrus medica são cor de violeta avermelhada pela parte exterior e segundo Linneu teem 30 a 45 estamos. Esta espécie distingue-se pelos seus fru- ctos grandes ovoidaes, pela casca que é muito grossa e pelo pouco sumo que tem em proporção com os outros. Forma uma arvore bastante grande com ramos curtos. As folhas que são sustentadas por peciolos marginados, são estreitas e ser- radas. V) Citrus Decumana Willd., Risso; Citrus Pomjpelmos Risso ; Malus assyria Plin. 12, 3; Pompel-moes ; Shaddock ; Pompelmuse. O Citrus Paradisii d'al- guns auctores com as suas variedades A pyriformis (Barhadoes grape fruit) var. B maliformis (Forhidden fruit) pertence a esta espécie e o género Sarcodactylis Gaertn. é também, segundo Bentham e Hooker — Citrus Decumana. Bernardin de St-Pierre encontrou es- ta espécie em estado espontâneo na ilha Reunião, mas em todo o caso não parece que seja de origem indiana e é provável que seja das ilhas Sunda. Roxburgh ob- serva que o nome por que é conhecida nas índias Nimhro (bastarda) parece que dá a entender que é d'origem estran- geira. Segundo Rumphius é oriunda da Chi- na meridional, e Loureiro diz: Habitat frequenter in Cochinchina et China. Ha comtudo razões bastante fortes para se acreditar que esta planta seja producto d'uma hybridação entre o Citrus medica e o Citrus Bigaradia. Em todo o caso quer seja espécie ou variedade, a sua cul- tura espalhou-se por todo o sul da Eu- ropa. Os fructos são muito grandes e a maior parte tem uma forma arredondada e apre- sentam uma cor amarello-desmaiada. A casca ó muito grossa; a polpa esponjosa e d'um gosto adocicado mas insabido. As flores são d'um branco puro e teem maio- res dimensões do que as de qualquer ou- tra espécie. As folhas, egualmente gran- des, são pubesccntes na pagina infera e levemente ciliadas nos bordos, o que tem bastante importância para A. De Can- doUe, pois, considera-a como espécie boa. Parece fu-a de duvida que se repro- duz bem por semente. VI) Citrus Bergamia Risso ; Bergamot- te ; Mellaroso. Talvez que seja uma va- riedade do Citrus Limetta. Forma uma arvore de pequeno porte, de folhas intei- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 153 ras e geralmente sustentadas por pecio- los alados. As flores são pequenas mas muito odoríferas. O fructo é periforme, liso, amarello desmaiado e a polpa é ri- ja, fragrante e tem um gosto sub-acido. A casca tem um cheiro activo. Não se sabe nada com exactidão sobre a origem d'esta espécie, mas não é nada rara no sul da Europa. VII) Citrus Limetta Risso ; Limettier ; Sweet Lime j Limette ; Limeira. E fora de duvida que esta espécie é composta de varias formas distinctas que Gallesio separou methodicamente e levou a diver- sas espécies como variedades ou hybri- das. E d'ella que vem a Pomme d'Adam ou Fruit defendu dos mercados de Pariz. A uma variedade do Citrus Limetta chamam-lhe também os italianos Poma d'Adamo. O Citrus acida de Roxburgb parece ser egual a esta espécie. Dá fructos do- ces e ácidos de forma oval ou arredon- dada d'um amarello desmaiado, com uma saliência e com glândulas oleosas conca- vas. Forma uma arvoresinha de folhas profundamente serradas e de flores bran- cas, que não são muito odoríferas. Se- gundo Royle, o Citrus Limetta veio das índias orientaes e cultiva-se ha muito tempo no sul da Europa. VIII) Citrus Lumia Risso. Nenhum au- ctor menciona a pátria d'esta espécie. A única indicação que se encontra é : «cul- tivada no sul da Europa». O crescimen- to da arvore e as suas folhas,, assim como a cor da casca do fructo, assimilham-se muito ás do Limoeiro e parece mais que provável que seja uma variedade do IX) Citrus Limonum Risso ; Limon ; Li- moeiro. É bem pouco rasoavel que no commercio o fructo d'e3ta espécie seja chamado limão. Este fructo está bem caracterisado por ser mucronado e pela sua forma ovoidal, a cor amarello-clara e a polpa muito aci- da. As flores são de tamanho médio e cor de vermelho-violeta. As folhas são ser- radas, mas 03 peciolos nunca são alados. Esta espécie era desconhecida dos an- tigos e dos árabes, comquanto nos escri- ptos persas sobre «Matéria Medica» se falle d'ella sob o nome de Secundo e Numhro. No século X foi para a Palestina e Egypto, sendo introduzida na Itália pe- los Cruzados. O dr. Royle encontrou-a no estado es- pontâneo nas florestas da índia do norte, O jesuita Ferrari enumera 30 formas principaes ou variedades d'esta espécie (Malus Limonium). Ferrari diz que na Calábria existem formas anãs ou pygmêas que são prove- nientes da semente de plantas cultivadas. Em diversos auctores vem indicado o Citrus medica e n'outros o Citrus Limo- num como Limoeiro. E possível que a ra- zão esteja d'ambos os lados, tomando a ultima como uma forma ou variedade da primeira. Gallesio apresenta um facto importan- te. Sementes obtidas d'um Limoeiro que estava no meio de Cidreiras deram ori- gem a uma serie graduada de variedades que se podiam coUocar entre estas duas espécies. Eis ainda algumas espécies menos co- nhecidas mas bem caracterisadas. X) Citrus javanica Blume. Segundo A. De Candolle é uma espécie boa. Aa folhas são grandes ; as flores solitárias ; o fructo pequeno e pouco acido. É cul- tivada em Java e também se encontra espontaneamente n'esta ilha. XI) Citrus jajponica Thunb. Esta es- pécie dá fructos do tamanho d'uma ce- reja e são muito doces. Parece ser dis- tincta. Nasce no Japão, onde ainda é cul- tivada, assim como na China. (Fortune, «Journal Hortic. Soe», III, pag. 239.) XII) Citrus fusca Loureiro, «Fl. Co- chinch.», pag. 571. Espécie de fructos pequenos mas muito doces. XIII) Citrus triptera Desf. ; Citrus tri- foliata Linn.; Citrus californica Hort. Arbusto tufoso com espinhos rijos e com- pridos e de folha caduca. O fructo ó espherico. Não se sabe cousa alguma so- bre a origem doesta espécie. («Revue Hor- ticole», 1869, pag. 15.) Para os amadores de plantas curiosas, o Citrus triptera será uma boa acquisi- ção, e com eífeito já é cultivada, ainda que muito pouco, em Portugal, e o anno passado fructificou no Jardim Botânico de Coimbra, visto que este estabeleci" mento oíFerece sementes d'ella, 154 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Concluirei a enumeração do género Citrus com o XIV) Citrus latipes Hook., fil. e Th. Em vista dos specimens que tive occa- fiião de observar no Herbario de Kew, par-^ce ser uma espécie muito distincta e d'um aspecto peculiar. Em conclusão devo dizer que em Por- tugal, como n'outras partes do sul da Europa, cultivam-se muito poucas va- riedades do Citrus aurantium em gran- de escala. Alguns verdadeiros amadores, porém, tomaram sobre si a tarefa de reunir todas as variedades e espécies de Citrus que lhes fosse possível obter e entre elles ha-os que possuem coUecções riquíssimas. Foi na ilha de S. Miguel que eu tive o gosto de vêr pela primei- ra vez o género Citrus representado por tantas formas e variedades interessantes (vide «Gardener's Chronicle», n." 30, 1867). Mais tarde vi em França a col- lecção de Mr. Villeneuve, coUecção que conta 70 a 80 variedades e raças de Ci- trus, todas muito distinctas. Em Lisboa (Bemfica) visitei mais d'uma vez as plan- tações de Laranjeiras do snr. Couraça, cuja morte recente lastimo, porque foi uma grande perda para a horticultura portugueza, e a coUecção do snr. Conde da Torre. Aos amadores que quizerem enrique- cer as suas coUecçòes de Laranjeiras re- commendo o catalogo publicado por Mr. Rivicre, director do Jardim de Aclimação da Ai-gelia. Antes de levantar mão do assumpto devo dizer ainda algumas palavras so- bre o que reza a fabula a respeito dos pomos d'ouro do Jardim das Hespérides, conquistados por Hercules. Estes pomos eram quasi sempre consi- derados Laranjeiras (Citrus Bigaradia), e chamava-se muitas vezes ás Aurantia- ceas — Hespirideas. Mais tarde, porém, tractou-se de provar que estes pomos de ouro não eram Laranjeiras, mas sim fru- ctos do Marmeleiro. O célebre baixo-relevo do Jardim da familia dos Medicis, em Roma, que re- presentava Hercules sentado n'uma pe- dra e encostado a uma arvore, não deixa a menor duvida de que esta arvore não era uma Laranjeira, mas sim um Marmeleiro. Lisboa — Eschola Polytechnica. Edmond Goeze. BIBLIOGRAPHIA- EPIDEMIA ACTUAL DEL OLIVO Acabamos de ler um interessante tra- ctado sobre a epidemia que destroe as nossas Oliveiras, escripto em hespanhol por D. Mariano Zacarias Cazurro, «Epi- demia actual dei Olivo — Estúdios, obser- vaciones y experimentos, que constituven un tratado completo de la misma, com dibujos sacados dei natural y suficiente- mente amplificados para mejor inteli- gência dei texto». Madrid, imprenta dei cl.nparcial». 1868 — 8.» de 128 pagi- nas, e duas estampas, por D. M. Z. C. Este opúsculo é dividido em cinco par- tes : Introducção, Parte entomologica. Parte nosografica. Parte curativa. Na primeira parte desenvolve o auctor uma excellente introducção his^torica da cultura e moléstia das Oliveiras ; na se- gunda e terceira apresenta-nos a causa da doença, devida ao Coccus Olece (co- chonilha da Oliveira), insecto heraopte- ro da familia dos Coccideos. Dá-nos a sua historia natural e descreve-nos com muita proficuidade os phenomenos que se succedem na arvore depois de atacada. As outras duas partes dedicadas ao tractamento da moléstia são ainda dividi- das em duas secções, na primeira das quaes são examinadas com grande atten- ção todas as experiências e remédios destinados a combater este mal, deixan- do a segunda para a exposição e funda- mento de um processo devido ao auctor da obra. É um livro e=:cripto sem pretensões académicas, em que o auctor nos revela os seus grandes conhecimentos sobre a matéria, e o aturado estudo prático a que durante muito tempo se entregou. Todos sabem a grande importância que os olivaes teera na nossa agricultura e o importante papel que o azeite representa no nosso comraercio de exportação ; mas também o que não é menos verdade é que de dia para dia se vêem definhar e morrer estas preciosas arvores. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 155 É pois, no intuito de sermos úteis aos nossos leitores, e fazermos um serviço ao paiz, que aconselhamos a leitura d'este útil livrinho. A Bibliotheca do Porto, cuja collecção de obras agri colas e hortícolas se vae en- riquecendo progressivamente, possue já ha muito esta publicação. A. J. DE Oliveira e Silva. GHRONICA HORTIGOLO-AGRICOLA Se por um lado sentimos que a camará municipal tenha os seus jardins públicos quasi completamente descurados, folga- mos por outro em registrar que a inicia- tiva particular faz alguma cousa em be- neficio da cidade sob o ponto de vista da jardinagem. É uma boa lição que deveria aprovei- tar a alguém. Ao cabo da rua de S. Bento, do lado do sul, existe ha muitos annos um pe- queno recinto vedado por uma grade de ferro, o que não impede que seja publico, visto que pertence á cidade. Esse lar- Fig. 27 — Arcos de ferro para jardins ^^^^^í^\\k^\:.:l^ ^ j^:-;:. Fig. 28 — Arcos de ferro para passeios públicos gosinho, conhecido pelo nome de Bate- ria da Victoria, por ter existido alli ef- fectivamente uma bateria no tempo do cerco, fica situado n'uma das partes mais elevadas da cidade e ofí'erece um magni- fico e extenso panorama, circumstancia que leva alli todo o extrangeiro que vi- sita o Porto. E que este sitio não só of- ferece á vista um bello horisonte, mas traz á memoria recordações históricas das luctas da liberdade. Ha- de haver quinze ou dezoito annos que alli se plantaram algumas arvores que foram crescendo muito á sua von- tade e proporcionando pouco a pouco uma sombra appetitosa para os dias de calma. Haver sombra no Porto, onde as arvores teem na exm.* camará munici- pal inimigos figadaes, já não é pouco. E um verdadeiro luxo... Mas o dono da casa que fica annexa a este pequeno square é que não pensa assim, e persuadido de que o povo ca- rece de algumas flores que lhe deleitem os olhos e que embalsamem a atmosphera com aromas delicados, mandou delinear um jardim, que hoje está coberto de co- rolas multicores. Os nossos parabéns ao snr. Alexandre Soares Pinto de Andrade, que, aformo- seando a frente da sua casa, proporcio- nou simultaneamente um bom serviço á humanidade. Agora apenas uma observação a pro- pósito da obra. O jardim está bem delineado, diremos até que a pessoa que o delineou possuia o melhor gosto e até um certo talento, porque é sempre diíRcil fazer trabalhos d'e3te3, quando é preciso respeitar arvo- res já existentes no local. Aqui dava-se esse caso e as arvores foram, segundo suppomos, todas poupadas. Da disposição das plantas já não po- demos dizer outro tanto e quasi que af- firmariamos que quem riscou o jardim 156 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA não foi a mesma pessoa que o execu- tou. Ha alli um pêle-mêle de arbustos que se confundem uns com os outros; não ha diversidade do colorido; não ha agru- pamentos e não vemos também aquelles maciços que os jardins irregulares (1), como este, exigem. Mas o principal está feito; a pedra fundamental está collo- cada e o resto virá com o tempo, por- que quem mandou fazer este trabalho tem por certo muita vontade de tornar aquelle recinto em pittoresco hijou. Deixaríamos de ser imparcial se não disséssemos que não nos agradou também a grade de madeira que resguarda as diversas figuras do jardim. Sobretudo a cor não pode desharmonisar mais. — Amarella! — Deus nos acuda! Nada. Ha aquelles elegantes arcos de ferro fundido que custam pouco e que (1) Ainda não nos foi dado comprehender a razão porque lá fora e mesmo entre nós se chama esta espécie de jardins — á ingleza. Para nós lia duas espécies de jardins muito distinctas: regulares e irregulares ou paisagis- tas se assim os quizcrem designar. Os jardins do século XVII, creados por Le Nostre, eram submettidos á régua e ao com- passo e tornavam-se portanto em obra pura- mente arcliitectonica. Os extremos tocam-se ! Veio depois a reacção e a alma do poeta não se sentia bem no meio d'aqucllas linhas rectas tiradas a cordel e onde tudo ora symetrico como a sala de visitas de qualquer dos nossos burguezes. A própria Ma- dame de Sévigné um dia, depois de ter respi- rado livremente o ar balsâmico d'uma matta- einha, exclamou cheia de pezar: Se esta monta- nha estivesse em Versailles, já os violadores da arte teriam sacrificado a tua pobre natureza ! Foi então que um artista, um verdadeiro artista — poeta, pintor e musico — delineou o pri- meiro jardim irregular, em que copiava a na- tureza tanto quanto comportavam os limites da possibilidade. Chamava-se Dufresny e era bis- neto de Henrique IV. Estes jardins foram executados nas proprie- dades dos abbadcs Pajot e Mignaux e d'este modo nasceram os jardins irregulares. Então para que chamar-lhcs inglezes? Muitos cscriptores querem assignalar a pa- ternidade d'estes jardins a Williain Kcnt, as- serção que nos parece ficar desthronada pro- vando-se que Kent nasceu 36 annos depois de Dufresny. O que nos podem dizer é que este género de jardins tem sido muito vulgarisado ultima- mente ern Inglaterra, mas isso não auctorisa a que se lhes chamo inglezes. O Beu a seu dono. são muito elegantes, como se pode ver pela gravura 28 que extractamos da obra de Alphand «Les Promenades de Paris». Estes arcos são pintados com uma cor verde a imitar ramos delgados de Cas- tanheiro e fazem-se de difFerentes gros- suras, consoante o local a que são desti- nados. Para os sitios pouco frequentados podem ser finos, como se vê no desenho superior, mas para os passeios públicos ou para os jardins muito concorridos é indispensável que sejam mais fortes. Fazemos votos sinceros para que 03 melhoramentos da Bateria da Victoria continuem em escala progressiva e afian- çamos que o snr. Alexandre Soares Pinto de Andrade prestará um valioso serviço á cidade. Pela nossa parte folgamos muito e muito em poder registrar nas nossas columnas factos que denotam que a horticultura se vae desenvolvendo e que já ha quem se lembre de aformo- sear os recintos que a jardinagem ca- marária deixa em completo abandono. Citaríamos ao acaso o largo das Virtu- des, largo do Duque de Beja, largo de Camões, Fontainhas, Carlos Alberto, Camões, etc, etc. Não que o abandono e o desleixo são uma economia... — O nosso collega o snr. Guilherme Read Cabral recebeu uma carta de Mr, Le Hardy de Beaulieu, de Augusta, na Geórgia (Estados-Unidos d' America), em que se occupa das cepeiras consideradas rebeldes ao ataque do Phylloxera vas- tatrix. Parece-nos que deve ser lida com in- teresso, e portanto inserimol-a em se- guida : A terrível crise, que a viticultura atraves- sa, soffri-a eu n'uma escala restricta. De ha dez para doze annos o rendimento na Geórgia aclia-se reduzido a pouca cousa. A vinha não morre: não ha Phylloxera, porém está atacada de doenças fungoidos que até aqui não temos podido combater. Preferimos adoptar uma copeira que cresce espontanoa- mcMite nos nossos climas, cepoií-a que nunca se viu atacada do nenhuma doença, de nenhum in- secto, e que cada anuo dá uma vindima de uma abundância prodigiosa. A innoouidade d'esta vinha é provavel- mente devida a uma natureza totalmente dis- tincta da das outras cepas. A sua madeira é dura, quasi desprovida de meduUa, e a casca , é fina e adherente; só as cepas velhas se des- JORNAL DE HOETICULTUKA PRATICA 157 pojarn da sua casca externa. Esta vinha per- tence ao grupo Eotundifolia, que comporta al- gumas variedades de frnctos brancos e colori- dos. E apenas conhecido na Europa; a sua his- toria é ainda muito incompleta na America, porque o seu habitat é precisamente a região em que o algodão absorve todo o interesse, toda a attenção dos agricultores. Da missão do snr. Planehon, das investi- gações do snr. Max Cornu, parece resultar que a maior parte das cepeiras americanas, que se introduziram no Meio-Dia para substituir as que o Phylloxera destruiu, serão tarde ou cedo egualmente atacadas por este flagello. Se assim deve acontecer, não seria urgente evitar aos viticultores uma perda de tempo e de dinheiro irreparável, aconselhando-lhes que recorram á única cepeira que, segundo a opi- nião de todos os homens competentes, seja de natureza para resistir aos diversos flagellos da vinha ? Sem duvida que esta cepeira não será isenta de defeitos; exigirá profunda modifica- ção na cultura e fabrico; mas emfim haverá vi- nho; havel-o-ha em abundância, e, durante a tenra edade da vinha, os campos produzirão ce- reaes e forragens. — Chegou-nos ha dias um livro que acabamos de percorrer e que tracta de um assumpto que realmente precisava de ser tractado seriamente e por penna imparcial e sabedora dos factos. Não vae decorrido muito tempo que o telegrapho communicava aos diversos jornaes do paiz os insultos de que esta- vam sendo alvo os portuguezes residen- tes no Pará, objecto de que então toda a imprensa do paiz se occupou, pedindo ao governo para providenciar e fazer respeitar n'aquellas paragens o pavilhão das quinas que, segundo se afiançava, os paraenses intentavam enxovalhar em pleno dia. Suscitaram-se todavia algumas duvi- das sobre a veracidade dos factos relata- dos e portanto foi muito bem vinda uma publicação devida a um cavalheiro que residiu no Pará durante três annos e que por conseguinte teve occasião de es- tudar e prescutar todos os factos escan- dalosos que diariamente alli se repe- tiam. O livro a que alludimos é subordinado ao titulo «Questões do Pará» e é seu au- ctor o snr. D. A. Gomes Percheiro. O snr. Percheiro, tomando o seu escal- pello, anatomisa minuciosamente os prós e os contras que alli vão encontrar aquel- les que vêem no Brazil um novo El do- rado, e se ligarmos credito, como deve- mos, ás suas palavras é certo que não se lhes antolha um futuro muito risonho. Uma grande parte dos trabalhadores succumbem logo ao abordar áquelles por- tos insalubres em que predominam quasi constantemente as febres, o cholera e ou- tras moléstias que desapiedadamente des- vastam a humanidade, e os que por ven- tura logram a felicidade de escapar ás garras da morte, depois de muitos an- nos de privações que nunca soífreriam na sua terra, conseguem reunir no can- tinho do bahú uns 400 ou 500;$Í000 reis, que o tractamento das moléstias adquiri- das no Brazil lhes absorve, quando, ex- haustos de forças e na decrepitude da vida, regressam á sua terra natal. « Oh ! como é miserável a vida do ar- tista e do trabalhador portuguez no Bra- zil ! » , exclama o snr. Gomes Percheiro, e accrescenta : « Os portuguezes que de futuro emigrarem para o Brazil, com o fim de se dedicarem ao commercio, per- derão infallivelmente o seu precioso tempo...», o que o auctor demonstra com razões bastante acceitaveis, sendo uma das principaes o definhamento que de dia para dia vae tendo alli a agricul- tura, em consequência da falta do braço escravo que as leis libertaram. O livro do snr. Gomes Percheiro pre- cisa de ser estudado ,• uma simples lei- tura não é o bastante, e o nosso governo prestaria bom serviço mandando pela sua parte também estudar o assumpto no campo da prática. As estatísticas da mor- talidade e a descripção minuciosa das privações que soffrem os nossos irmãos que vão era busca de fortuna, seriam tal- vez o verdadeiro dique a oppôr-se á emigração. O clero também poderia cooperar para isso, porque a sua missão não é só a de resar padre-nossos e ave-marias. Nós julgamos necessário que se evite quanto possível a emigração, mas por meios licites e sem menosprezar a li- berdade do paiz. Não queremos que se apregoe a mentira; queremos que se diga a verdade e que se colham algaris- mos exactos que fallem com toda a sua eloquência. Dito isto, cumpre-nos agradecer ao 158 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA snr. Gomes Percheiro o delicado offere- cimento que no3 fez da sua obra, a que toda a imprensa tem dispensado o mais lisongeiro acolhimento, e con^^ratulamol-o porque é a mais valiosa recompensa a que um escriptor peide aspirar. — Temos por varias vezes proclamado Gand como a cidade das flores, e os do- cumentos que dá todos os dias ao mundo inteiro provam que não aventamos uma utopia. As innumeraveis publicações que alli vêem á luz demonstram que na cidade de Flora ha homens que lhe dedicam o fogo sagrado a que a deusa tem jús. iSe entre nós o numero dos amadores é ainda limitado, na Bélgica, pelo con- trário, não ha quem não goste de flores e d'ahi resulta a necessidade de publi- cações especiaes de todos os preços, a fim de que possam chegar tanto ás mãos do ricasso como ás do menos endinheirado. Ha portanto jornaes mais ou menos mó- dicos e outros que constituem no fim do anno um volume de luxo. A esta ultima cathegoria pertence a «Revue de lllorticulture Belge», cuja recepção gostosamente accusamos. Esta revista allia todavia á excellen- cia da parte material e á respeitabilidade dos seus distinctos collaboradores, a ba- rateza, e pi)de dizer-se que os seus funda- dores fazem um verdadeiro toiír de force offerecendo aos assignantes um volume tão elegante pela módica quantia de 10 francos. CoUaboram n'este jornal as princi- paes pennas da especialidade e no logar respectivo inserimos o annuncio. Os no- mes dos collaboradores são a melhor re- commendação que podemos fazer da «Re- vue de rilorticulture Belge», accrescen- tando comtudo que contém numerosas gravuras nitidamente executadas e que cada n.° vem acompanhado d'uma chro- molithographia executada pelo notável desenhador de flores, Mr. Pannemaeker, de Gand. — Mr. Cordier, recentemente fallecido c que se occupava bastante da cultura de diíFerentes espécies de Eucalyptus, na Argélia, deixou uns apontamentos curio- sos sobre o desenvolvimento de algumas espécies durante o primeiro anno. Vamos mencional-as pela ordem des- cendente : Eucalyptus glohulus 2"^, 90 — colossea 2'",80 — goniocalyx 2'", 70 — longifolia 2'",õO — rostrata 2"^, 20 — trachyphloia 2"\00 — viminalis 2^,00 — spectahilis 2™,00 Vê-se, pois, que nenhuma das espé- cies excede em rapidez de crescimento o Eucalyptus globulus. — Recebemos o catalogo n.^ 72 do es- tabelecimento hortícola de Mr. Auguste Van Geert, de Gand. Apresenta um bom numero de novidades. Agradecemos a remessa. — Dizem os jornaes americanos que a borboleta da Couve (Pieris rapce) ap- parecêra em tal quantidade que ameaça destruir completamente a colheita das Couves. — O Jardim Botânico de Coimbra en- riqueceu este anno a coUecção de Vi- deiras, que já possuia, com perto de 100 variedades do paiz e estrangeiras. Entre estas ultimas algumas são oriundas da America, Grécia, Chypre, Crimea, Rho- des, Smyrna, França, Allemanha, etc. Este anno as Videiras da Madeira são as que apresentam outra vez melhor aspecto em todo o sentido. As Videiras de S. João já tinham no dia 22 de ju- nho cachos maduros. — Na Allemanha existiam até ao fim de dezembro de 1874, 338 fabricas de assu- car de Beterraba : a producção do assucar no anno de 1874 foi de 3,õ25,4õ9,5õO kilos ou cerca de 235,030,636 arrobas. — Ha bastante tempo que está em nosso poder a carta que em seguida in- serimos. Pedimos desculpa da demora que hou- ve em publical-a. Eil-a : Amigo e snr. Oliveira Júnior. Tendo ha poucos dias visitado a quinta do snr. António Augusto Alves Guimarães, sita no logar chamado da Ponte da Pedra, freguezia de Leça de Balio, fiquei surprchendido ao ver os trabalhos alli executados, e nào posso esquivar- mc a communicar-lhe, ainda que ligeiramente, as minhas improssues, para serem mencionadas no jornal que o meu amigo tào distinctameute JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 159 redige, o que por certo estimará, attendendo ao interesse e gosto que sempre tem mostrado pelo desenvolvimento dos trabalhos agrícolas e hor- tícolas. Vi alli fazer mergulhias de Videiras de um modo tão difterente do que ainda ha poucos annos se usava geralmente, que não posso dei- xar de julgar tal trabalho digno de especial menção. Consiste elle em abrir covas com mais de um metro de profundidade e um e meio de largo. Depois das FiVZes mergulhadas, lança-se- Ihes uma pouca de terra em cima e sobre esta uma outra de carolo do milho e depois uma camada de matto virgem, cobrindo-se tudo com terra até ficar a cova arrasada. Este processo é na verdade o que melhor resultado dá para o bom desenvolvimento da Vide; e tanto assim que na referida quinta vi mergulhias de uin e dons annos com tal desenvolvimento que faz admirar. Todas as Vi- deiras apresentam um aspecto vigoroso, devido isto sem duvida á maneira da plantação indi- cada. Com prazer também direi que não se nota alli desenvolvimento da moléstia nas Videiras, pois que apenas em um ou outro ponto apparece o oidium, mas em muito pequena quantidade, e tanto que tendo provado o vinho verde das co- lheitas de 1872 e 1874 achei-o de um sabor agradável, de transparência inexcedivel e sem o menor indicio de ter soffrido applicação do en- xofre, pelo que merece a qualificação de excel- leute e de primeira qualidade. Na verdade esta qualificação não é exagerada, attendendo ao minucioso cuidado que ha no seu fabrico. Por occasião das vindimas está junto ao la- gar um empregado exclusivamente incumbido de tirar dos gigos os cachos um por um e esco- lher os bagos tocados ou que estejam affecta- dos para que srj entre na feitura do vinho a uva que estiver em perfeito estado de maduração e sem,signaes de doença. E este o resultado que se tira não só da boa plantação, mas depois do cuidado empregado no fabrico do vinho, por meio da escolha da uva. Eeceba o snr. António Guimarães os meus parabéns e merecidos louvores pela dedicada attenção que tem dispensado aos trabalhos da sua linda propriedade da Ponte da Pedra, tor- nando-a assim digna de ser visitada e admi- rada, e por ultimo permitta que lhe envie um aperto de mão pelo excellente tractamento que tem prodigalisado aos sumptuosos Cupressus ylauca, cujas dimensões na base excedem a 4«',20. Porto. José Marques Loureiro. Não podemos deixar de juntar os nos- sos cumprimentos aos do nosso amigo Loureiro. O «Jornal de Horticultura Pratica» faltaria ao seu dever, se se es- quecesse de registrar com o merecido louvor os esforços d'aquelles, que se de- dicam tão proíieuamente ao adiantamen- to das artes agrícolas. — No dia 19 de setembro próximo tem logar em Gand o congresso e a grande Exposição Internacional de Pomologia. — Escreve-nos o snr. Adolpho Frede- rico Moller dizendo-nos que obtivera ha três annos de sementeira uma variedade da Sequoia sempervirens perfeitamente caracterisada. Mede hoje 2 palmos e meio d'altura. — No dia 16 de setembro próximo deve ter logar, no Chili, a abertura d'uma exposição hortícola. — No domingo de Pentecostes foi o Jardim Botânico de Kew visitado por 21:536 pessoas, na segunda-feira por 60:619 e na terça-feira por 25:070. E certo que grande numero de pes- soas foram alli meramente por desenfado, mas temos a certeza de que a maior parte foi levada a Kew por amor a es- sas queridas filhas do sol a que chama- mos plantas. — O magestoso Cupressus macrocarjpa do Jardim Botânico de Coimbra flores- ceu este anno pela primeira vez. — De Cadix recebemos do nosso col- laborador o snr. Francisco Ghersi a no- ticia, que passamos a inserir: Entre as numerosas espécies de plantas me* dicinaes indígenas do nosso solo uma das mais notáveis é o Senecio foliosns, chamado vulgar- mente entre nós Suzon real. Pertence á família das Compostas e tem pi-opriedades tónicas e ads- tringentes, mas a principal virtude d'esta planta é a cura rápida e prompta que opera na terrí- vel enfermidade que se soffre frequentemente e que é conhecida com o nome de hemorrhoides ou varizes. Costumam-na empregar os médicos d'esta cidade. Applica-se em cataplasmas e em fomentaçues, assim como as folhas frescas pi- sadas. A sua cultura é facílima. Dá- se perfeita- mente em qualquer paragem que seja um pouco húmida e desenvolve-se por sementeira e por separação dos pés, nos mezes de outubro e novembro. É planta de raiz vivaz e cultiva-se no Jardim Botânico d'esta cidade. — O snr. Frederico Moller recom- menda muito para os jardins a iStipa gigantea. N'uma carta que temos pre- sente diz-nos aquelle snr. que esta planta é altamente ornamental. — MM. Déhérain e Moissan obtive- ram das experiências feitas, sobre a ab- sorpção do oxygenio e emissão d'acido carbónico pelas folhas' conservadas em logar escuro, os seguintes resultados, que julgamos interessar aos nossDS leitores. 160 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 1.° A quantidade d'acido carbónico emittido pelas folhas na obscuridade au- gmenta com a temperatura. 2." As folhas emittem uma quantida- de d'acido carbónico comparável á que é fornecida pelos animaes de sangue frio. 3.° Na obscuridade, as folhas absor- vem mais oxygenio do que emittem acido carbónico. 4.° Se as folhas estão n'uma atmos- phera privada de oxygenio, continuam a emittir acido carbónico. 5.° A combustão interna das folhas, accusada pela absorpção d'oxygenio e emissão d'acido carbónico, seria a ori- gem d'uma parte do calor necessário á elaboração dos principies immediatos no- vos. Esta proposição implica uma hypo- these sobre a utilidade physiologica da combustão interna que se produz nas folhas. — Mr. Ed. Morren foi nomeado ca- valleiro da ordem de Leopoldo. Felicitamos o sábio redactor da «Bel- gique Horticole». — A propósito do desenvolvimento que tem tido a cultura da Quina na índia recebeu o «Jornal de Therapeutica» do dr. Edward Nicholson, medico addido ao serviço do exercito britannico na índia, algumas noticias cheias de interesse e importância. Estas noticias mostram que a cultura da preciosa casca prosegue de- baixo da direcção do governo colonial inglez, e que tem tido uma marcha rá- pida e progressiva. Unicamente na presidência de Madras, o inventario das Quinas, em 31 de ju- lho de 1873, produziu o seguinte, segun- do o dr. Nicholson: Cinchona Succiruhra. . 1215963 pés — Calisaya var. Frutex var. Vera .... 54881 » — Officinalis var. Conda- minea 1183159 » — — var. Bonplan- diana 87509 » — — var. Crispa . 4355 » — — var. lanceo- lata 9625 » — Lancifolia. . . . 279 » —Nitida 2786 » Cinchona Indenominada . 8500 pés — Micrantha . 46730 » — Peruviana . 3389 » — Pitayensis . 25412 » — Espécies diversas 425 » — Angustifolia 6214 » Total 2649228 As espécies que dão mais quinino, taes como a Cinchona succiruhra, Calisaya e Condaminea, entram em grande maioria na plantação. O dr. Nicholson observa que admit' tindo que as plantações do Norte da ín- dia possam produzir tanto como as do sul, e tomando em conta as plantações par- ticulares, poder-se-ha avaliar em 100 mil kilogrammas a colheita actualmente for- necida por todas estas novas plantações. — Começamos a receber a «Revista dei Instituto Agricola Catalan de San Isidro», publicação que já conta bastan- tes annos d'existencia e que gosa dos melhores créditos. Agradecemos e tomamos a liberdade de remetter o nosso jornal em troca. — Fechamos esta Chronica nas Caldas de Vizella, na poética Vizella, onde vie- mos passar alguns dias da estação cal- mosa. Já o anno passado escrevemos algu- mas palavras sobre a falta de arborisa- ção que ha na estrada, onde aliás as ar- vores prosperariam. E um desleixo que não podemos perdoar á camará de Gui- marães, porque temos a certeza de que para este trabalho apenas seria preciso desembolsar alguns magros tostões que não arruinariam o município vimara- nense. A natureza aqui tem tudo quanto é bello, mas a mão rude do homem é que parece empenhar-se em tirar-lhe a for- mosura e os encantos. Algumas arvores formosíssimas que aqui contemplamos o anno passado próximo á ponte, viemos encontral-as decepadas ! A destruição, porem, não ha-de ficar aqui, porque a raça dos vândalos não está extincta ! Que lhes faça bom proveito e que os homens de tino lhes agradeçam ! Caldas de Vizella — julho — 1875. Duarte de Oliveira, Júnior. JORNAL DE HORTICULTUEA PRATICA 161 O PO E AS PLANTAS DE SALA o pó é o grande desespero dos culti- vadores das plantas de portas a dentro. Não ha meios de evital-o : é tão fino, tão penetrante, que apparece em toda a parte sem se saber como, quasi mysterio- samente. Conservam-se as janellas cerra- das, as portas fechadas, mas elle lá está — olhae para as folhas das plantas que não deixareis de vêr os seus vestígios e mais tarde os seus nocivos efifeitos. Até n'isso parece que o reino vegetal está ligado aos costumes do homem. Nós evitamos o pó porque é prejudicial aos nossos pulmões ; ás plantas também o é e muito. Que admira, se ellas também respi- ram como nós ! Ouvimos repetidas queixas dos culti- vadores de plantas de sala que vêem pe- recer as suas filhas dilectas, sem saber Fig. 29 — Hydropulvis OS motivos. Não vão mais longe ; aqui está uma das causas que influe sobre- maneira na saúde dos vegetaes. Entre- tanto, inspeccionando-se as plantas do máximo numero dos amadores, encon- trál-as-hemos cobertas de pó e sem o menor indicio de se haver empregado um meio qualquer para removel-o. A operação, digamos a verdade, é tra- balhosa, fastidiosa, e exige um certo cui- dado e delicadeza pouco vulgar nos ho- mens. Meus senhores ! A César o que é de César e a Deus o que é de Deus ! Nós para isso não temos geito nenhum, somos mesmo uns desageitados e portanto con- fiemos este trabalho aos finos, flexíveis e delicadíssimos dedinhos rosados das senhoras, porque ellas e só ellas téem aptidão e como que um certo carinho maternal que sabem dispensar a todos os seres. Na palma da mão esquerda colloca-se a folha e depois com a mão direita pas- Vol. VI.— 1875 sa-se muito ao de leve com uma esponja fina embebida em agua. Faz-se isso duas ou três vezes por semana e os resultados manifestar- se-hão dentro de mui breve prazo. Agora já o leitor terá dito de si para si: «Sim, isto é fácil, mas em certas plantas é impraticável, porque, por mais cuidado que haja, será impossível deixar de estragal-as.» Contávamos com essa observação, mas as invenções de apparelhos hortícolas téem ido tão longe, que não precisare- mos de empregar a varinha magica, nem de invocar o poder de Satanaz para re- movermos essas pequenas difficuldades. As seringas com o ralo de orificios miudinhos dão excellente resultado e em poucos minutos póde-se distribuir a 30 ou 40 plantas a fresquidão que tanto lhes apraz. É preciso todavia que haja muito cuidado em que a temperatura da agua não seja inferior ao ambiente do logar onde vicejam. N." 9 — Setembro 162 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA Além do pó, a própria atmosphera sêcca do3 quartos bSo é o verdadeiro meio de que precisMn os vegetaes para prosperar. Nós que sabemos, por exem- plo, que determinadas espécies de Fetos vivem á margem do umbroso e serpen- tcador ribeirinho, não podemos exigir que a sua organisação se transforme para poder resistir aos nossos caprichos, es- quecendo-nos de que precisam de uma certa humidade nas frondes e um am- biente fresco. Collocamol-os em condi- ções heterogéneas : damos-lhes uma at- mosphera sêcca e á noute accendemos os candelabros do gaz para augmentar ainda a temperatura e reduzil-a ás condições mais impróprias da vida vegetal. Uma recente invenção de Mr. A. Ga- che fils (engenheiro civil, 34, rue Vi- vienne — Paris) foi uma valiosa acqui- sição para o arsenal horticola. O pequeno apparelho de Mr. Gache, que o jury da Exposição de Spa de 1874 laureou, é d'uma forma elegante e ao mesmo tempo muito commodo para es- palhar a agua muito fino, como se fosse chuva que cahisse muito de mansinho e podendo-se dirigir para onde se quizer, sem receio de molhar os moveis e estra- gar os estofos, como acontece quando se aspergem as folhas com a seringa. A figura 29 representa um dos taes ap- parelhos que o seu inventor denominou «Hydropulvis». Pela estampa vê-se a sua simplicidade, e a sua própria forma dá a conhecer a maneira de operar. O nome do insti-umento, formado de duas pala- vras (Hydro agua — pulvis pó) é dema- siadamente exquisito e está em completa desharmonia com a simplicidade do novo regador. Que importa, porém, a extrava- gância do nome? Os cultivadores devem comprehender a necessidade que as plantas téem de hu- midade nas folhas para que seja preciso insistir mais sobre o assumpto. Removido d'e3te modo um dos motivos da morte de grande numero das plantas das nossas salas, esperamos que as damas, que menos felizes com o cultivo dos vege- taes 03 tem banido dos seus aposentos, vol- tem a adquiril-os. E temos fé que sim, não só porque o pedimos com tão bom modo, mas também porque é bem sabido que On revient toujours A ses premiers amours. Minhas senhoras, as plantas querem o frescor como nós queremos a esperança. Consolemol-as, pois, que pouco custa. Duarte de Oliveira, Júnior. ALGUNS ESCLARECIMENTOS SOBRE A PLANTAÇÃO Tendo ha dous annos vendido a um nosso freguez alguns centos de arvores fructiferas, como Laranjeiras, Maciei- ras, Pereiras, etc, e querendo este plan- tar mais, queixou-se que o não fazia porque as que tinha comprado nada se haviam desenvolvido, o que era natural- mente devido á sua má raiz. Ora, como tivéssemos a certeza de que as plantas foram nas condições necessá- rias, dissemos-lhe que, ou as arvores foram mal plantadas, ou o logar não era próprio. Respondeu-nos affirmando o contrário. N'e3ta occasião pediu-nos se nós o acompanhávamos um dia para vermos o terreno e se a sua propriedade estava em boas condições. Annuimos ao seu convite, postoque a distancia a percorrer fosse de três léguas. Quando vimos a planta- ção, ficamos surprehendidos pela sua má apparencia. As Laranjeiras, por exemplo, estavam amarei las e as folhas caíam. O local era bom e a terra tinha boa appa- rencia ; suppuzemos portanto, que o mal provinha da má plantação. Pedimos a um seu caseiro para que nos trouxesse uma enchada para cavar um pouco de terreno, o que se fez, e á profundidade de um palmo o solo estava duro como uma pe- dra. Fez-se isto em differentcs legares e pouco mais ou menos se dava a mesma cousa. Tractamos de arrancar uma La- ranjeira e uma Pereira e estavam as raizes como dentro de vasos, pois que se formara por assim dizer uma parede pela pequena cova que tinham. Era esta a razão porque as arvores não vegetavam. O solo era muito duro, e não se abriram covas fundas e largas: era terreno apenas la- vrado para semear Milho e infelizmente JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 163 muitas vezes não o lavram na profundi- dade de um palmo. Mostrando a causa da má vegetação ao nosso freguez, respondeu-nos que es- tava convencido do que lhe dizíamos, porque algumas das mesmas fructeiras plantadas na mesma occasião em outro sitio da quinta estavam muito boas, por- que foram plantadas em um logar em que tinham deitado muita terra por causa de um muro que alli tinha sido levan- tado. Ficou sabendo qual era a causa da má vegetação e tractou de mandar arrancar todas as arvores para de novo serem plan- tadas. A principal condição para uma boa plantação é fazerem-se as covas com mais de meio metro de profundidade e outro tanto ou mais de largo, tornando a en- trar a terra para que fique movediça e a plantação feita á superfície ; e se n'es- tas covas se misturar alguns estrumes ó de grande vantagem para as primeiras raizes se tornarem fortes e vigorarem a planta. Quando se faz um pomar novo e o terreno não tem outras arvores, a pri- meira cousa a fazer é cavar o terreno na profundidade de mais de meio metro, e d'esta maneira ficará bom para uns pou- cos d'annos, e em curto tempo se forma um bom pomar. Preparado assim o terreno, já as co- vas não precisam ser tão fundas nem tão largas. José Marques Loureiro. o IMBONDEIRO-ADANSONIA DIGITATA Nas regiões mais ardentes do conti- nente africano existe uma planta que é o mais volumoso de todos os vegetaes co- nhecidos. As suas dimensões parecem in- críveis. É uma arvore, cujo tronco se não eleva muito alto, mas que attinge ás vezes 120 pés de circumferencía. Na parte superior é coroado de ramos de oi- tenta pés de comprimento, parte dos quaes pendem para o chão, obedecendo ao próprio peso, e parte estendem-se ho- risontalmente cobrindo uma grande por- ção de terreno. Da axilla de duas ou três folhas inferiores d'e3tes ramos pende uma flor solitária, branca e de quasi um palmo de largura. A estas flores succe- dem-se volumosas capsulas, lenhosas, ovaes, revestidas exteriormente de uma felpa esverdeada, e que chegam a medir meio metro na sua maior dimensão. As rai- zes são tão grossas como os troncos, mas estendem-se a maior distancia do que el- les. Observou um naturalista que n'um Inibondeiro, que poderia ter cerca de 1000 a 1200 annos de edade, e que media apenas a circumferencía de setenta e sete pés, as raizes tinham o comprimento de quarenta metros. A raiz principal é um enorme fuso que perfura o terreno verti- calmente, e que chega a grande profun- didade. As raizes lateraes sulcam o ter- reno ondulantes e similhando serpentes gigantescas. Para se fazer idéa d'este co- losso vegetal imagine-se uma grande moi- ta de setenta ou oitenta pés de altura e de cento e cincoenta pés de diâmetro. O meu amigo João Eduardo Ribeiro teve occasião, mais de uma vez, de comtem- plar esta arvore em todo o seu desenvol- vimento. No anno de 1856 fazia elle via- gem das ilhas de Bazaruto, que ficam entre Sofála e Inhambane, para Inhaca, terras próximas de Lourenço Marques. Ao meu amigo, que se dirigia em em- baixada ao potentado de Manicussa, fal- tou-lhe a agua, e mandando-a procu- rar por alguns pretos, que armados de bordões sondavam todos os orificios e fen- das das arvores, que encontravam, achou- se um Imbondeiro que guardava no tron- co grande porção d'aquelle liquido, como se podia ver por um buraco praticado na casca d'aquelle vegetal. Apressou-se toda a comitiva a saciar a sede e a en- cher as cabaças para o resto da viagem, e comquanto bebessem 315 pessoas, no- tou-se com assombro, que a superficie do liquido não tinha feito diíferença sensí- vel. Mas não é somente pelas extraordiná- rias dimensões que o Imbondeiro se torna notável. O desenvolvimento d'esta arvore muito rápido nos primeiros annos, dimi- nuo depois consideravelmente, e a sua 164 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA duração espanta. Adanson achou algu- mas d'e3tas arvores cujo tronco não che- gara ainda a mais de O pés de diaíuetro e que tinham gravadas na casca inscri- pções do 15. "^ e do 13." século. O mesmo botânico observou Imhondeiros de 6:000 annos, segundo o que elle pretende. O próprio líuiuboldt affirma que o Imhon- deiro é o monumento orgânico mais an- tigo do nosso planeta. A madeira d'esta arvore é macia, branca e leve. Na Abyssi- nia, as abelhas silvestres costumara perfu- ral-a e depor n'ella o mel, que n'aquellas regiões é considerado como o melhor. Das cinzas do fructo do Imòondeiro, fructo que os pretos deixara de propósito apo- drecer, extrahera ura excellente sabão, fazendo ferver aquellas cinzas com óleo de palma. Estas arvores são sujeitas a uma es- pécie de caria, que as apodrece, e que lhes faz grandes cavidades. Os pretos tor- nam maiores aquellas perfurações, trans- forraando-as em espécies de camarás onde suspendem os cadáveres d'aquelles a quem recusam as honras da sepultura, fechan- do a entrada com uma tábua. Estes cor- pos sSo geralmente de poetas e músicos, que assistem na corte dos reis negros, e cuja superioridade de talentos os faz res- peitar, eraquanto vivos, mas que, por serem tidos como feiticeiros e demónios, são olhados com terror depois de mortos. Julgam 03 pretos além d'isso que, se en- terrassem ou subraergissera nas aguas aquelles corpos, attrahiriara assim a mal- dição do seu paiz, e é esta a rasão por- que 03 escondem n'aquellas arvores. O fructo do Imòondeiro^ chamado mu- lamba na província de Moçambique, e hocci n'outro3 pontos de Africa, contém, em 10 ou 14 compartimentos, numero- sas sementes envoltas n'uma polpa bran- ca, a qual depois de secca se converte era pequenos grânulos brilhantes, de ura sabor acido ligeiraraente assucarado. Vau- quelin, analysando esta substancia, achou ser composta de uma gorama similhante á do Senegal ; d'uraa raateria saccharina susceptível de fcrraentação, mas incrys- talisavel; de fécula araylacca; d'um aci- do, que parece ser o acido malico; e fi- nalmente d'uma matéria fibrosa. Os in- dígenas costumara cortar as capsulas de modo a deixarem-lhes uma pega, e ser- vera-se d'ellas para baldes. O Imbondeiro, como pertencente á fa- mília das Mcdvaceas, participa do ca- racter mucilaginoso e das virtudes emo- lientes particulares áquella familia, so- bretudo nas folhas e na casca. As folhas, seccas á sombra e pulverisadas, consti- tuem o lalo que os naturaes misturam nos alimentos com o fim talvez de prevenir a inflararaação das vias digestivas, doença tão commum n'aquellas regiões. Fervidas era agua, as folhas produzera uma tisana diurética que mitiga o ardor do sangue. A casca é filamentosa e fabrica-se d'el- la óptimo papel, e de qualidade tão su- perior que parece pergarainho. Filaraen- tos e papel estão patentes no rauseu co- lonial, estabeleciraento devido á diligen- cia do snr. António Júlio Pinto de Ma- galhães, cavalheiro que cora aquella insti- tuição prestou um grande serviço ao paiz, mostrando-lhe as riquezas coloniaes. Cons- ta-me que ha uma casa commercial que exporta pelo Zaire para Londres a casca do Imòondeiro, que é alli paga a treze ou quatorze libras por tonelada. O tronco do Imòondeiro é algumas ve- zes aproveitado pelos pretos para cister- nas. Estes depósitos de agua da chuva são geralmente escondidos no matto, e constituem uraa parte das heranças de farailia. Por meio de uma incisão extra- he-se do tronco d'esta arvore um liquido que exposto ao ar toraa consistência e parece participar das propriedades da goraraa elástica. Cresce esta arvore nos terrenos are- nosos e húmidos era diversos pontos de Africa, onde tarabera é conhecida pelos nomes de Arvore de pão de Macaco e Baoòab. Dizem alguns que este ultimo nome tira a sua origem de duas vozes africanas de etymologia egypciaca: òô — arvore, e uaò — sagrada. Transplantado para a Araerica, o Im- òondeiro, deu-se alli perfeitamente. Theo- baldo de Chanvallon cncontrou-o na Mar- tinica, e outros viajantes observaram-no na ilha de S. Domingos. O célebre Bernardo de Jussieu consa- grou esta arvore sob o nome de Adan- sonia ao illustre botânico Adanson, o pri- meiro que deu uma descripção completa JOENAL DE HORTICULTUEA PEATICA 165 d'e3te colosso do reino vegetal. Este nome admittido pelo grande naturalista sueco Carlos de Linneu, que em atten- ção ao feitio das foltias do Imbondeiro llie ajuntou o de digitata, não o foi por aquel- le ao qual esta denominação era homena- gem. Adanson não quiz derrogar do prin- cipio que tinha estabelecido de consei^var ás plantas o nome por que eram conhe- cidas nos seus paizes nataes. Seria para estimar que este exemplo tivesse maior numero de imitadores. O Imbondeiro é uma arvore preciosa, que faz parte d'essas riquezas coloniaes que tão pouco aproveitadas téem sido. Ha muito quem veja nas colónias um objecto de luxo, uma recordação apenas das glorias que passaram. É preciso, po- rém, que se olhe para ellas de modo mais positivo. Se Portugal pela exiguidade de território, que occupa na Europa, mal pôde competir com as nações de segunda ordem, pude, como nação marítima, tor- nar-se prospero e opulento, aproveitando os thesouros que as suas colónias lhe of- ferecem. Civilisar e desenvolver o com- mercio, a agricultura e industria d'aquel- las vastissimas regiões é o único meio, que resta a Portugal, para erguer-se do estado de abatimento a que o levaram os que tão mal o administraram. Lisboa. João de Mendonça. BIBLIOGRAPHIA LA VIGNE DANS LE BORDELAIS PAR AUG. PETIT-LAFFITTE Temos sobre a nossa meza de estudo este livro do snr. Petit-Laffitte, e per- mitta-se-nos escrever duas palavras so- bre elle. Em um paiz essencialmente agrícola, e principalmente cultivador da vinha, como Portugal, obras como esta são sem- pre aqui bem vindas, e merecem duplo apreço ; porque tudo quanto se observar, estudar e escrever sobre a vinha, não pôde ser indiíferente a um povo, que tira d'esta planta a sua subsistência, a sua riqueza e bem-e^tar. O snr. Laffitte dividiu o seu trabalho em 4 livros. O primeiro tem por epi- graphe — a plantação da vinha, e a es- colha da sua collocação. O segundo li- vro occupa-se dos trabalhos annuaes e regulares a empregar na vinha. No ter- ceiro tracta das diversas circumstancias que podem prejudicar a vinha durante o curso de sua vegetação. Como epilo- go fecha o auctor esta sua obra no quar- to livro cora o estudo sobre a vinha no ultimo período de sua vegetação an- nual. E um trabalho methodico este em que o auctor seguiu o caminho ensinado pela natureza no desenvolvimento, florescên- cia da planta, e maduração do fructo na Videira, lançando com mão copiosa em tão importantes assumptos as reflexões, e os preceitos da agronomia, e os ensi- namentos da experiência, e os profundos conhecimentos do illustre professor em botânica, physiologia vegetal, em chi- mica applicada á agricultura, em ceno- logia, em ampelographia bordeleza, e outi'as sciencias, e sempre escrevendo d'uma forma attrahente, em estylo claro e ameno, que convida á leitura sem fa- diga, e ensina a verdade com deleite. O snr. Laffitte não se perde só nas altas regiões da theoria, em que tantos espíritos elevados pairam, com completo desprezo pela prática, e com o absolu- tismo d'um principio desconhecedor de muitos dados fornecidos pela experiên- cia, que produz tristes desillusões nos incautos, que o praticaram com sacrifí- cio ás vezes de interesses ponderosos; e por isso conhecedor da necessidade de unir a theoria á prática, faz esta con- sideração: «qu'on cesse donc de se que- reller sur ce qu'on nomme, trop sou- vent sans y attacher un sens bien prè- cis, la pratique et la théorie; car les hommes que Ton range dans l'une ou Tautre de ces deux catégories, sous peine d'avoir perdu la raison, d'être arrivés au point de méconnaitre leurs intérêts les plus réels, n'ont d'autre but que de sa- tisfaire aux lois de la nature ; que d'ob- tenir tout ce qui peut résulter de bien 166 JORNAL DE HORTICULTUKA PRATICA de cette satisfaction quand elle est logi- que et opportune.» Decerto que em agricultura ha perigo até eiu exagerar os melhores principioá ; e por isso o auctor em muitos casos dá ao uso e tradições locaes o que uào pôde ser preceituado absolutamente; porque uada ha tão moroso como o aperfeiçoa- mento da agricultura, e com especiali- dade na cultura da vinha, cm que ainda hoje os viticultores se servem dos pre- ceitos, práticas e instrumentos quasi idên- ticos aos usados no tempo de Virgílio e Columella. A poda, empa, cava, mergulhia e en- xertia são antiquíssimas e já menciona- das por Virgílio, Pliuio, Catão, etc. Os antigos, bons observadores, eram excellentes agricultores, e apesar da sua ignorância das sciencias naturaes, que crearam a agronomia, levaram os conhe- cimentos da agricultura á maior perfei- ção, segundo notou Cuvier. A observação fazia executar práticas, e prestar concurso racional e proveitoso ás leis que ignoravam, e com que se con- formavam obedecendo; porque, como diz Bacon, não se pôde mandar a natureza, senão obedecendo-lhe. Ligar a theoria e experiência, de modo que se reconheça e preste apoio ás leis da existência particular da Videira, é o ideal do viticultor. Depois da influencia decisiva do clima e do solo nada ha tão profícuo como a cultura dirigida pela arte e pela scien- cia, que, se não pôde transformar a na- tureza, em muito a ajuda; da mesma forma que a medicina aproveita as for- ças naturaes do homem para lhe curar as moléstias, ou as dirige para a conser- vação da saúdo por meio da hygiene. Todas as opei-ações da cultura da vi- nha empregadas no Bordelais estão mi- nuciosamente descriptas, e indicado o tempo próprio d'ellas, com a physiologia vegetal particular da Videira, abundan- do sempre em noções históricas, que al- ternam o estylo na aridez do assumpto. E para lastimar que não sejam mais populares no nosso paiz tão accidentado, o tão adequado para a viticultura — Bac- chas aniat aAles. As leituras d'estes as- sumptoá quo interessam mais directa- mente á vida da nação, e são incompa- ravelmente de maior utilidade do que tantos romances de máo gosto, que con- tinuamente importamos de Pariz, e que não poucas vezos deterioram o bom senso, fatigam a imaginação ou a exacerbam, incitando só a lazeres, que nem sempre favorecem a moralidade, e nem servem de estimulo a alguma acção útil ou ge- nerosa. N'este século de tanto adiantamento, que se deve ás sciencias naturaes, e cu- jos benefícios estamos a cada momento fruindo no campo, na fabrica, nas via- gens, no gabinete, na terra, no mar, na aldeia, na cidade, as leituras sobre estaa sciencias dão-nos a noção do verdadeiro, e nos fazem elevar o sentimento na con- templação da harmonia das leis, e da magnificência e variedade com que o au- ctor das cousas dotou a natureza, e nos laços e anneis com que todos os sêrea creados se prendem uns aos outros ! Apesar de muito minucioso, o snr. Laf- fítte não podia enumerar todos os factos, todas as hypotheses, operações e serviços, que em determinadas occasiões se téem a empregar na plantação e cultura da vinha ; porque ha tanta desegualdade na ordem physica e moral, e sempre tanto luxo de variedade, que raro se podem applicar principies absolutos sem modi- fícações mais ou menos justas e rasoaveis. No emtanto as questões mais debatidas, os problemas mais árduos, ahi são clara- mente expostos, e encarados de frente, e alguns resolvidos, especialmente os que respeitam no livro segundo á operação mais essencial da cultura — a poda — e também sobre a applicação dos estrumes á vinha. Na agricultura, occupaçao sobremodo séria e indispensável á vida da humani- dade no nosso estado de civilisação, nada se pôde deixar ao acaso ; porque os meios que se empregam, e o fím que é a co- lheita dos fructos, estão sempre subordi- nados a leis naturaes, a que cumpre obe- decer, e nada deixar ao arbitrário: e por isso aqui as fadigas são incessantes, e a vigilância deve ser permanente, para se poder triumphar na lucta com a na- tureza. O poder do homem na cultura ó grande, podo inspirar-lhe mesmo um le- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 167 gitimo orgulho ; porém ha outro poder im- menso, incomparavelmente maior — que é o que dá vida ao vegetal, o desenvolve, o faz fructificar e percorrer os períodos da sua existência annual. Estes poderes estão raras vezes em accordo; porque a natureza tem quasi sempre outro fim que o homem; e d'ahi se deriva a lacta que se trava por meio da cultura. A natureza com toda a solicitude de mãe tende a conservar e reproduzir o que existe, para o que emprega os meios mais engenhosos: o homem na cultura tem só por fim essencial conservar e re- produzir o que lhe aproveita, tendo em mira só a maior colheita do fructo, e a melhor qualidade possível. A natureza na vinha quer o grão — as sementes; e o homem o fructo á custa da semente, a que não liga alguma im- portância. D'esta antithese, d'e3ta con- tradicção de fins, se deriva a necessidade dos meios empregados pelo homem na cultura para domesticar a planta de modo que corresponda melhor ao fim que elle tem em vista. As vinhas, como todas as plantas cul- tivadas, podem ter moléstias; talvez, que nem sempre as causas metereologicas, mas também os cuidados da cultura pos- sam influir no estado mórbido das plan- tas. Porque não influirão a monotonia da cultura, a grande reunião de indivíduos, e a poda, que é a intervenção mais di- recta e atrevida do homem na economia da planta, com o fim de lhe utilisar a seiva em favor do fructo? Estes desvios da natureza não poderão independente- mente de outras causas produzir molés- tias? O nosso auctor não responde cabal- mente a estas questões, apresentando n'um circulo felizmente restricto algumas moléstias de vinhas, acompanhando a descripção com os remédios que a scien- cia e a prática tem inventado. Nas mo- léstias menciona o excesso de vigor — que 03 antigos chamavam — luxuria vi- tis — a falta de vigor — a icterícia — a ferrugem ou invasão d'um tortulho pa- rasita chamado Uredo rubigo, que cobre suas folhas — e o Oidium tuckeri, desgra- çadamente tão popular também em Por- tugal. Occupa-se também largamente dos accidentes, que podem surprehender a vinha por causas muito mais fortuitas, e phenomenos de que podem resultar lastimosas consequências, como são os nevoeiros — as geadas — os meteoros — 03 ventos excessivos — as saraivadas — a sêcca extraordinária — as chuvas in- tempestivas e longas — o sol nimiamente ardente. Ha poucas plantas cultivadas tão sensíveis á acção das circumstancias exteriores e á variação dos phenomenos metereologicos, que influem sobre a quan- tidade e qualidade do vinho, como a Vi- deira ; e por isso em um trabalho tão es- pecialista sobre a vinha, não podia o snr. Lafíitte omittir tão importantes phe- nomenos, embora a acção do homem para 03 combater seja pouco efficaz. Passa depois em resenha com os seus caracteres botânicos as famílias das plan- tas selvagens e outras que prejudicam a vinha, contra que tem de luctar, e que sem o cuidado do homem, não se pode- ria desenvolver; porque a natureza na sua variedade não permitte que uma só espécie se desenvolva, e tem cuidados, e previdência no crescimento e multipli- cação de todos 03 seres animaes e vege- taes. E como todo o livro interessantíssimo este capitulo sobre a Flora bordeleza, bem como os que se lhe seguem sobre os damnos causados á vinha pelos animaes. Aqui começa pelos insectos e os meios inventados de os destruir : descreve os que são conhecidos como damninhos á vinha na fauna entomologica do Gironde. O terrível Phylloxera não é objecto de estudo especial, e nem se aventa a ques- tão se elle é causa ou ejfeito da decom- posição e morte da vinha. Não admira esta omissão ; porque o livro foi publi- cado em 1868, e os grandes estragos nas vinhas são posteriores. Descreve em seguida os damnos cau- sados nas vinhas pelos molluscos, pelos pássaros, pelos reptis e pelos quadrúpe- des, e por fim os damnos causados pela visinhança de certas industrias. Abre o snr. Lafíitte o 4." livro como epilogo com preciosos ensinamentos so- bre as vindimas, preparação do vinho, e ahi se nos depara um mappa de todas as colheitas no Bordelais desde 1801 a 168 jornalTde horticultura pratica 18G6, com a designação annual da quan- tidade e qualidade do vinho: e eonclue o snr. Laffitte o seu livro com um qua- dro summario e recapitularão do desen- volvimento annual da Videira, soba in- fluencia da cultura e dos meteoros; e exalta a terra e qualidade dos vinhos do Bordelais, escrevendo o que com muita juátiya se podo applicar ao nosso Douro, que produz vinhos superiores aos que a antiguidade creou, e que d'um terreno de rochas e schisto se fez um monopó- lio principal da riqueza da nossa pátria. Nação pequena, precisa Portugal de se tornar cada vez mais laborioso, e de fa- zer conhecidos no extrangeiro os seus productos ; porque o nosso bem-estar as- sim o exige. O melhoramento da agricultura de- pende do conhecimento do solo, e das boas práticas agrícolas, para o que muito podem contribuir livros, como este do snr. Laffitte. Este livro não é só proveitoso aos vi- ticultores francezes, mas também aos portuguezes ; porque as leis da natureza são universaes, e os princípios da seien- cia absolutos. Que o livro do snr. Laffitte seja de muita utilidade pela sua leitura; mas também que sirva d'incentivo para al- guns dos talentos, que entre nós não ra- reiam, emprehenderem um estudo com- pleto sobre as nossas vinhas, especial- mente no Douro, é o^voto que fazemos. E forçoso confessal-o : por emquanto não temos em nenhuma das nossas regiões vinícolas — Douro — Madeira — Bair- rada— uma obra tão completa sobre a vinha, como esta do illustre professor. Murça. Basílio C. de Almeida Sampaio. A VINICULTURA PORTUGUEZA ^ VI Somos chegados agora a uma região vinícola que relativamente ás outras do paiz se pôde ter pela de mais recente formação. Região em que as plantações de novas vinhas vão de anno para anno augmentando, e a que oíferece mais vasto terreno para uma enormíssima viticul- tura. E o Alemtejo, onde mais que em outra província está o futuro agrícola do paiz. — Em três sub-regiões correspon- dentes aos três districtos de Portalegre, Évora e Beja se pôde dividir a região vinícola alemtejana. Na primeira, cujo principal centro vi- nícola Elvas representa, é aonde a pro- ducção é menor, e os vinhos, apesar de algumas excepções felizes, de menos su- perior qualidade. O terreno derivado, ora dos granitos ora dos schistos silurianos, é bastante mon- tanhoso e serrano para o lado do norte, nos concelhos de Portalegre, Castello de Vide, Crato, etc, onde por partes se vêem algumas uveiras, ultimo prolongamento para o sul do vinho verde do Minho. Para o lado do sul, em Elvas e Campo Maior, as terras mais baixas e planas, quasi to- (1) Vide J. H. P., vol. VI, pag. 145. das provenientes do schisto, offerecem-se mais caroaveis á cultura da vinha e da Oliveira. A sub-região do médio Alemtejo, cujos centros mais vinhateiros são Évora e Re- dondo, é mais productiva em vinhos e estes melhores que os da sub-região pre- cedente. O granito é substituído pela syenite em alguns pontos, e os schistos oftereoem injecções de calcareo. Isto faz que os terrenos sejam mais possantes, e dotados do elemento calcareo que esca- ceia na sub-região precedente, e cuja presença tanto coopera para a boa qua- lidade dos vinhos. Na terceira sub-região ou a do sul do Alemtejo os terrenos melhoram ainda mais; calcareos e rochas feldspathicas dão ao terreno de granito ou de schisto uma composição mais complexa e rica em elementos úteis. Por isso todas as producções são aqui mais abundantes, sem exceptuar a do vinho que é mais do triplo do da primeira sub-região, e quasi o dobro do que se produz na sub-região do centro. O grande centro vinícola, de esta parte sul do Alemtejo ó constituído por Cuba, Vidigueira, Beja e Serpa. O governo das vinhas tem alguma cou- sa de peculiar na região alemtejana. — JORNAL DE HORTICULTUEA PEATICA 169 A poda ou é redonda ou successiva. A primeira faz-se em uma única vez; a se- gunda faz-se em três vezes, sendo a pri- meira o corte das raizes superfieiaes e podres assim como dos ladrões, na occa- sião em que se encaldeiram as cepas, o que succede um mez depois das vindimas. Esta primeira poda chama-se dar ao podão. A segunda poda, que se chama esj^ol- drar as cepas, veriiica-se por todo o mez de dezembro, e tem por fim aliiviar a vide das varas buzias ou de entre nós compridos, não se deixando para fructo no futuro anno senão as varas de olhos rasteiros e de fusis curtos. A terceira poda, que se chama acertar apoda, consiste em cortar as varas para fructo no comprimento em que devem ficar. — Geralmente deixam-se quatro varas na cabeça da cepa, duas de cada lado, uma cortada a dous olhos é a es- pera, ou. pollegar, a outra de 6 a 8 olhos é a vara para fructo. A empa ou armação das cepas é de três espécies. Ou as duas varas de cada cepa atam puxadas ao alto sobre três tu- tores ensarilhados. E a empa a três. Ou atam apenas sobre dous tutores. E a empa de caminho. Ou atam sobre um único tu- tor ; mas então os tutores de cada grupo de 4 cepas unem nos toj)es superiores á maneira de pyramide. E a empa de al- geroz. Fazem-se geralmente as três cavas ás vinhas. — Encaldeirar, em novembro; calçar ou cava de montijo, em março; e arrazar^ em abril. — As castas de uvas mais communs no Alemtejo são: a alva^ aragoneza, fraguzão, agudenho, boal, for- mosa, tamarez, tinta gallega, franceza, e do Padre António, trincadeira, roupeiro, perriim, sembagulho, moscatel, negra mol- le, tinta, caída, arintho, Fernão Pires, castellãOj castelloa, alicante, dedo de da- ona, olho de lebre, diagalves, manteudo, terranteZj tinta albanesa, bago grosso, mal- vasia. As vindimas começam geralmente no dia 20 a 24 de setembro. Os mostos são em alguns pontos de grande doçura, che- gando a marcar 30 % de assucar. Na sub-região do norte são geralmente fra- cos, havendo-03 ahi que não accusam mais de 18 e 19 % de assucar. O termo médio geral da força saccharina dos mos- tos é de 22 7o. A vinificação alemtejana afasta-se in- teiramente dos processos usuaes conheci- dos nas outras regiões vinicolas do reino. Em grande numero de officinas não ha lagares nem prensas. — No maior nu- mero ha as prensas de cincho, mas o la- gar é o pavimento lageado de uma casa, onde ha uma ou mais desengaçadeiras em que a uva é toda desengaçada. O bagu- lho é pisado no pavimento, o molho corre para uma tina ou cisterna aberta no meio da casa e d'ahi é levantado em canecas para ser vertido em talhas de barro pes- gadas pela banda de dentro, que se acham escalonadas ao longo das paredes da casa. — Reparte-se depois pelas talhas, meio cheias de mosto, a balsa pizada. A fermentação n'estes recipientes é muito demorada. As balsas azedam n'elle8 muitas vezes. Os vinhos sangram-se no fim de 3 ou 4 semanas, e são alojados em outras talhas providas de tapadoiras. — Em algumas partes usam deitar uma ca- mada de azeite sobre o vinho para me- lhor o garantir do contacto do ar. Faz-se grande distillação das balsas no Alemtejo e com esta aguardente, nem sempre de bom gosto, adubam os vinhos. Ha por varias partes do Alemtejo of- ficinas vinarias em que se usa de vasi- lhame de madeira, e em que se fabrica o vinho de feitoria, ou de meia feitoria em lagar de pedra segundo o systema seguido no Douro. — Mas a prática ge- ralmente seguida com mais ou menos cuidado é a que acima descrevemos. Parece incrível que no meio de tantos desacertos da arte, os vinhos do Alem- tejo sejam geralmente bons, e alguns d'elles até primorosos. O que seriam en- tão se os processos fossem mais racionaes e aceiados? Os vinhos do Alemtejo são quasi todos consummidos nas localidades da sua producção, obstando á sua ex- portação, de uma parte a falta que tem tido de communicações, e da outra a falta de vasilhame de madeira. Comtudo n'estes últimos tempos tem apparecido em Lisboa vinhos de Borba, de Elvas, de Évora, de Cuba, e de Portalegre quo téem sido recebidos com applauso. 170 JOKNAL DE HORTICULTURA PRATICA O3 yinlios da 1.* sub-regilío são ge- ralmente delgados, — frescos, pouco al- coólicos mas saborosos. — Citam-se em Castello de Vide os vinhos do Prado e 03 da Ribeira de Niza. Em Portalegre mencionam-se os vinhos da Ladeira^ os das Assomadas, e os de outros poucos productores. Preços de 1^^200 a 1?^800 reis o almude. Os vinhos de Elvas feitos com as uvas que vão de Campo Maior, de Extremoz, de Villa Boim e até de Badajoz, são mais encorpados e alcoólicos; alguns che- gam a ser muito delicados. Os vinhos de Borba toem um sainete que os faz appe- tecidos. Preço do almude lrS300 reis. Na 2.* sub-região do Alemtejo são no- táveis: Os vinhos de Redondo e os de Évora; entre estes gosa de certa fama o vinho do Enxarrama, vinho bastante en- corpado e travoso, e foram cantados por Elpino Nonacriense os de Pêra Manca. Preço por decai itro 400 reis. Na 3.* sub-região os vinhos de Caba, de Villa de Frades, e da Vidigueira, são talvez o melhor e o mais segurç typo de vinho de pasto d'esta região. É este o maior centro da producção vinícola do Alemtejo. São também fallados os vinhos de Beja, de Ferreira e de Serpa. Do centro e sobretudo do sul do Alem- tejo exporta-se bastante vinho para Se- túbal ao preço de 25 a 30^000 a pipa. Lisboa. J. I. Ferreira Lapa. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A NOVA MOLÉSTIA DAS VINHAS ' É mister conslderar-se que a Videira é de uma natureza trepadeira que at- tinge em poucos annos 15 ou 20 metros d'altura, e que as gavinhas de que é pro- vida servem tamsómente para a auxiliar a trepar e a segurar-se aos ramos das arvores visinhas, e quem percorresse o Minho, o nosso jardim de Portugal, te- ria tido occasião de contemplar as bellis- simas grinaldas c festões que as Vidtiras fazem de ambos os lados das estradas, chegando muitas vezes os ramos a unir- se entre si e a formar um céo de ver- dura, por entre a qual reluzem os ne- gros e dourados cachos d'uvas. Devemos observar que quando o Oi- dium se manifestou primeiramente n'esta província, havia j;l muitos annos que elle flagcllava os vinhedos do Douro. Outro tanto succede agora com a nova moléstia. No Douro morrem centenares de individues, ao passo que no Minho ainda não se nota a menor alteração na vegetação das vinhas. O que significa isto? Será o Minho uma região privilegiada? Seria o Douro anathematisado ? As exigências da cultura obrigaram a dar ás Videiras as proporções d'um pe- queno arbusto ou por outra tornal-as (1) Vide J. H. P. vol. VI, pag. 112. anãs, como os chins e os japonezes fazem no seu paiz a muitas plantas, e n'isso são clles eminentes. Ora impedindo que as plantas tomem o desenvolvimento que lhes é peculiar e até necessário para a sua existência, resulta que perdem o vi- gor e portanto grande parte da sua vi- talidade. Em tempos normaes notou-se sempre uma certa fraqueza n'algumas das plan- tas que constituíam os vinhedos, e o re- médio era mergulhal-as ou plantar ou- tras em seu logar. Mas quantas vezes não estavam já essas novas plantas in- fezadas, corrompidas e incapazes de vida longa? Era na maior parte o caso e d'ahi as consequências que hoje todos nóa sof- f remos. Passemos aos remédios. Desde que foi votado em França o premio de 300:000 francos (54 contos) para o descobridor de um meio efficaz para o curativo das vinhas doentes, téem apparecido para assim dizer tantos re- médios quantos são os astros, continuan- do-se porém a considerar a submersão ou inundação como o que dá melhor resul- tado. Effectivamente contam-se casos de fazer pasmar. Vinhedos que estavam fracos, e seria- mente ameaçados pela morte, recuperam JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 171 as suas forças depois de serem submer- gidos. Em França ainda se poderá fa- zer isso em certos departamentos, mas em Portugal, ainda que quizessemos imi- tar os nossos visinhos de além dos Pyri- neus, os terrenos não se prestariam. O nosso amigo, o snr. Ferreira Lapa, diz n'uma das suas interessantes revis- tas agrícolas, que mensalmente publica no «Commercio do Porto», que na Itá- lia tem-se tirado grande proveito do em- prego da terra extrahida de Solf atara de Pouzzolo, junto de Nápoles. Esta terra tem sido ensaiada em França, e Mr. Chanssoux obteve o prodigioso resultado de salvar todas as cepas doentes a que se applicou, morrendo todas as outras da mesma vinha a que não fizera egual tra- ctamento. O tractamento reduziu-se a deitar, no outono, na caldeira de cada cepa, 500 grammas de terra de Solfatara. Pelos modos a terra de Solfatara é uma espécie de adubo e talvez que pro- vada a sua efficacia não seja difficil a sua importação. O commercio vae bus- car á Sicilia o enxofre, ao Peru o guano e poderá muito bem importar egualmente de Solfatara a sua terra. Mr. Blanchard preconisa a applicação d'areia em volta das plantas, porque, se- gundo tem observado, o Phylloxera não se pôde mover nem tampouco respirar, morrendo assim pela asphixia. Mr. Es- pitalier vem também em apoio do que aventa Mr. Blanchard, dizendo que tem obtido um resultado de 70 por cento. Mr. Dumas, chimico mui distincto, que tem estudado esta questão, inven- tou recentemente um apparelho destinado a applicar o sulfureto de carvão ás raí- zes da Videira para matar o insecto sem prejudicar a planta. Também se deve ao mesmo senhor um novo composto que, ao mesmo tempo que é um magnifico adubo, é também um insecticida. En- cerra sulfo-carbonato de potassa ou de soda, que forma um sal amarellado, hy- grometrico, decompondo-se lentamente sob a acção d'um acido, em hjdrogenio sulfurado ou em sulfureto de carvão. N'um relatório que apresentou á Aca- demia das sciencias de Pariz, Mr. Du- maa discute todos os meios que téem sido propostos para combater a nova molés- tia das vinhas e apenas acceita três : — a submersão, a areia e com especialidade o sulfo-carbonato de potassa. Um jornal francez que temos presente diz-nos que Mr. L. Barrai tem feito al- gumas experiências e colhido resultados satisfactorios com a applicação das com- posições que em seguida apresentamos. ÍSulpliureto de mercúrio. ... 1 parte Flor d'enxofre 9 » Sulphato de cal 10 » Total 20 » iSulphureto d'antimonia em N o 2 ] P*^ 2 » ^^- "^ \Flôr d'enxofre 8 - I Sulphato de cal 10 » Total 20 » VSulphureto d'antimoma em N o 3 ] pó 2 . ^^- "^ ]Aloes 2 . / iSulphato de cal 8 » • — ■ a Total 12 • Estas três composições devem ser ap- plicadas em pó por toda a superficie do solo e principalmente sobre a cepa por meio d'um folie, e na proporção de 250 grammas por cada cepa, operando-se duas vezes, sendo a primeira nos fins de outubro e a segunda no mez de abril. Mr. Barrai calcula que a despeza, in- cluindo o trabalho da applicação, não exceda de 10 a 12 centésimos por cepa. Ora tendo um hectare de vinha 4:000 cepas, subiria essa despeza de 7f5í200 a 9;$>000 reis. Estes são os principaes remédios que se tem subministrado ás vinhas; mas qual d'elles o efíicaz? qual se poderá aconselhar afoutamente ? Só o tempo noa poderá responder. E que téem feito os nossos viticulto- res, que de dia para dia vão vendo di- minuir o numero das suas cepas? Que nós saibamos pouco ou nada se tem feito entre nós. O snr. barão da Roeda, proprietário da magnifica quinta do mesmo nome, é que tem ensaiado vários medicamentos, mas é doloroso que nos diga o seguinte; «Tenho experimentado muitos e vários 172 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA remédios que me foram recommendados em França, mas infelizmente até ao pre- sente sem resultado algum » (1). Entre outras substancias tem o snr. barão da Roòda feito uso das seguintes : caparoza, arsénico, sulphato de ammo- niaco, azotato de soda e insecticida Pey- rat. O snr, Francisco Pinto, na sua vinha dos Cardinliães, mandou escavar em 1870 algumas cepas que se mostraram definhadas deitando-lhe depois cinza de vide. No anno seguinte as cepas mos- traram-se vigorosas e fructificaram re- gularmente. O snr. José de Sousa Cordeiro, na sua vinha da Soiveira (Celleirós), applicou a fuligem a algumas Videiras e disse-nos que com este tractamento as havia res- taurado. Também fez applicação de cinza com fuligem o distincto agricultor de Berthelo, o snr. Henrique Avelino Cor- rêa, e colheu egualmente bons resultados. Quando visitamos a sua quinta em agosto de 1872, disse-nos o snr. Corrêa que tinha lançado */2 kilo de cinza na caldeira das cepas que se mostravam af- fectadas, nos fins de junho, e então apre- sentavam-se com a iVuctificação normal e com o mesmo aspecto das outras vinhas não affectadas. O snr. Bernardo Francisco da Costa também experimentou a cinza de vide com bom resultado. Duas Videiras atacadas, uma nova, outra velha, foram pelo snr. Bernardo da Costa amputadas até onde se pude deixar mais no são, ficando a cepa nova só em raiz, e a antiga com as differen- tes partes não affectadas, levando-se o corte tão longe quanto era possível sem comprometter essas partes. Depois, mandou cavar cuidadosamente até deixar descobertas as radiculas sem as damnificar, deitar-lhes algumas pása- das de cinza de vide, regál-as immedia- tamente e cobrir com a terra. Com este tractamento, rebentaram em abril ambas as cepas: a antiga tem ca- chos bem conformados e da raiz nasce- ram-lhe rebentos vigorosos; a nova po- rém rebentou mais frouxamente e com poucas esperanças de que fosse avante. Mandou então o snr. Costa abrir mais larga caldeira, buscar-lhe melhor as raí- zes, cortar as que lhe pareceram doen- tes, incinzeirar de novo, regar e cobrir com a terra. Depois d'esta operação rebentaram com muito vigor. O snr. Francisco da Costa tem repe- tido as experiências e diz haver colhido excelleute resultado. O snr. A. Vieira Pimenta, informa-nos de que tem visto algumas Videiras tracta- das com o insecticida Peyrat mostrando sensíveis melhoras. Na sua propriedade tractou o snr. Pimenta alguns grupos que apresentam melhor aspecto do que os que ficaram por medicar, mas este senhor diz-nos e muito judiciosamente: «Será exclusivamente o resultado do in- secticida, ou concorreria também a rega e a escava?...» O que se tem notado, e é fora de toda a duvida, é que as Fi- deiras doentes, sendo escavadas, melho- ram sensivelmente e, se não é um re- médio radical, convém comtudo alta- mente que se lhes faça esta operação. A experiência tem mostrado que ella é útil mesmo para as Videiras morosas na rebentação. Mal se lhes faz a escava, lançam pâmpanos e parecem ganhar nova vida. (Continua.) Oliveira Júnior. PODA E LIMPEZA DAS OLIVEIRAS Causa lastima o estado de abandono e desprezo em que geralmente se vêem entre nós estas preciosas arvores. Todas cobertas de densa e apertada folhagem, carregadas de lenha inútil, que S(') serve para roubar seiva e debilitar a arvore, (1) Carta do snr. barào da Roeda, de 19 d'ag03to de 1874. comidas de musgos e lichens diversos, alimentando inutilmente uma infinidade do ladroes, apresentando quasi sempre uma moita de rebentões na base do tron- co, vivem verdadeiramente no estado selvagem; o único trabalho que se lhes applica é o bárbaro varcjamento de que são victimas na occasião da colheita. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 173 Como raríssima excepção, já um ou outro proprietário se tem lembrado de po- dar e limpar as suas Oliveiras, e mesmo mandar-lhes lavrar e adubar o solo, mas estes são apontados como visionários 5 ou- tros, tendo ouvido fallar nos bons resul- tados produzidos por estes serviços, téem tractado de os executar, mas infelizmente de um modo inconveniente, por mãos inhabeis, que melhor fariam se deixas- sem as desgraçadas arvores em paz. Temos visto limpar e desbastar Oli- veiras como quem desbasta pinheiros, cor- tando-se-lhes as melhores arrancas para se lhes deixar uma pequena copa muito alta, sacrificando-se-lhes os ramos mais férteis, que são sempre os mais tortuo- sos, em beneficio dos mais estéreis que são os mais direitos e que apresentam mais viço na apparencia. O tractamento racional da Oliveira não é, comtudo, uma arte tão sublime e difficil que não esteja ao alcance de qual- quer humilde jornaleiro analphabeto, logo que se lhe dêem algumas explicações muito singelas e de fácil comprehensão, mesmo para qualquer encephalo por muito bronco que seja. Em primeiro logar convém alliviar a arvore de todas as producções inúteis, que só servem para atrophial-a, e rou- bar-lhe alimento e luz. Para isto come- ça-se por cortar rigorosamente todos os rebentões que nascem na base do tronco, todas as producções adventícias que ap- parecem sobre o tronco e ramos grossos, todos os lançamentos e novidios que apre- sentam cara de ladrões; distinguem-se estes perfeitamente por se apresentarem sempre muito direitos, lisos e aprumados, de cor clara e lustrosa, e sempre muito viçosos e bem medrados. Se a arvore é muito esgrouviada, con- vém decotal-a, amputando-lhe alguns ra- mos mais altos, de modo a favorecerem-se os ramos mais baixos, procurando-se quanto possível obter uma copa arredon- dada, symetrica, e não muito alta. Se a arvore tem a folhagem muito es- pessa e compacta, convém desbastal-a, cortando-se-lhe na occasião da colheita da azeitona muitos ramos, dos que se apresentarem mais carregados de fructo. Em todo o caso é indispensável e essen- cial que o ar e a luz possam penetrar á farta e á larga em todo o interior da ar- vore. Talvez pareça absurdo que se sacrifi- quem os ramos mais carregados de fru- cto; mas, se nos lembrarmos do modo por que a Oliveira fructifica reconhece- remos a utilidade d'esta prática. Os fructos da Oliveira são produzidos somente pelos raminhos nascidos no anno anterior, isto é, que na epocha da fructi- ficação téem dous annos d'idade ; estes pro- duzem outros raminhos, que do mesmo modo fructificam no segundo anno, mas o ramo que uma vez deu fructo, nunca mais o torna a dar. D'aqui se infere na- turalmente, que os ramos que se apre- sentam desprovidos de fructo são os que hão-de fornecer a colheita do anno se- guinte. Se sacrificarmos depois da co- lheita os que se achavam carregados, nada perderemos da colheita futura, e succederá que os novos raminhos que nascem n'esse anno, que hão-de produ- zir a colheita do anno subsequente de- vem vir muito mais fortes e por conse- quência mais aptos a garantir-nos uma fructificação abundante. Parece-nos pois, que por estas razões se justifica plena- mente a prática que aconselhamos. Quando os troncos e ramos se apre- sentam cobertos de musgos e apparecem indicies de ferrugem convém raspal-os e caial-os com uma calda grossa composta do modo seguinte: Agua 6 litros Cal 1 kilo Flor d'enxofre 200gramma3 Caparosa verde 15 grammas Se o tractamento que indicamos for adoptado, raríssimas vezes aquelles ini- migos se apresentarão, pois basta a livre circulação do ar e da luz, e a boa saúde da arvore para os afugentar. Todos 03 tractados d'arboricultura, e to- dos os arboricultores theoricos verberam com severidade a prática, que dizem sel- vagem, do varej amento da azeitona; di- zendo que por este processo se debilita muito a arvore, e se compromettem gra- vemente as colheitas futuras. Com o respeito que devemos aos nos- 174 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA SOS mestres, não podemos deixar de fa- zer sobre este ponto algumas reflexões que a observação dos factos nos tem sug- gerido. Em conformidade com o que os livros aconselham, e os nossos mestres nos en- sinaram, praticamos o aconselhamos a apanha da azeitona á mão; e com grande surpreza temos verificado, que esta prá- tica tão dispendiosa nenhuma vantagem tem produzido; muitas Oliveiras que es- tavam exactamente nas mesmas condi- ções e foram varejadas téem dado pelo menos igual producção ! Este facto tera-nos obrigado a estudar mais detidamente esta questão. Parece-nos que o varej amento não traz 03 graves inconvenientes que se lhe at- tribuem, e se em verdade tem alguns, el- les são bem compensados por um bene- ficio importante. Quando se vareja, são principalmente os ramos carregados de fructo 03 que mais soffrem, a maior parte são destruidos; é sabido que estes que fructificaram bem uma vez, pouco ou nada produzem no anno seguinte, não é pois muito grande a perda que sofí'remos com a sua suppressão; ao passo que os outros ramos que não fructificaram e por isso foram menos castigados, ficam muito mais desassombrados, a seiva que aquel- les consumiriam reverte toda em seu fa- vor, a arvore fica mais desaffrontada, assim dá mais e melhor fructo. Comtudo est modus in rehus, o varejo desapiedado é sempre um mal, porque destroe indis- tinctamente tanto 03 ramos que fructifi- caram como 03 que hão-de fructificar. Na nossa humilde opinião a melhor prática seria aquella que conseguisse sup- primir a maior parte dos ramos carrega- dos de fructo e respeitar os que tem de fructificar no futuro; pôde conseguir-se isto varejando com discernimento. N'este sentido já em algumas localidades do nosso paiz se adopta uma prática, que muito ganharíamos em imitar: consiste em se fazer o varejo com pequenas va- ras, subindo-se ás Oliveiras e batendo-as com a vara de dentro para fora, somente nos ramos que apresentam fructo. O complemento do tractamento da Oli- veira é uma boa lavoura ou cava á terra ; todos nós conhecemos o grande beneficio que esta prática faz ás Figueiras; pois é certo que a Oliveira não o agradece me- nos. Faro. A. DE Souza Figueiredo. STAPELIA GRANDIFLORA Se ha plantas ditas gordas, que mere- çam a attenção dos amadores, são sem duvida as Stapelias. Poucos vegetaes reúnem uma tão grande variedade de for- mas e colorido como estes, verdadeira- mente exquisitos, admiráveis e bellos em toda a accepção da palavra. Umas dão flores d'um escuro sombrio, triste, e exhaiam um cheiro fétido; ou- tras apresentam-nas vermelhas, vivíssi- mas e brilhantes ; estas são brancas ama- rclladas; aquellas amarellas vivas; est'ou- tras cor de vinho, estriadas, manchadas, salpicadas, sujas, emfim um conjuncto de todas as cores, desde as mais vivas e simples até ás mais escuras e complicadas. Estas plantas são todas oriundas do Cabo da Boa E-iperança, comtudo a Ame- rica tem fornecido algumas muito notá- veis; são baixas, ramificadas, de hastes e ramos tetragonos ou pentágonos. As flores desabrocham na base ou ao longo dos ramos, são axillares, villosas, pequenas, medianas, bastante grandes, variando no tamanho, forma e colorido. A espécie talvez a mais bella, cujo nome serve de epigraphe a este artigo, toma o desenvolvimento de 15 a 20 cen- tímetros de diâmetro e é inteiramente coberta de pêllos muito compridos e es- curos. A haste attinge, ainda n'esta es- pécie, a altura de 30 a 40 centímetros, é quadrangular, denteada e de cor verde- escura sombria. Não obstante o cheiro nauseabundo que lançam as suas flores, não deve ser excluída dos jardins, onde em uma ban- cada, a par de outras congéneres ou em collccção, a sua forma caprichosa e bizar- ra despertará a attenção e curiosidade do observador. Aconselhamos portanto não só a cul- JORNAL DE HOETICULTURA PRATICA 175 tura d'esta espécie, mas também de mui- tas outras do mesmo género ; as collec- ções, por muito insignificantes que sejam os objectos colleccionados, téem sempre um valor inapreciável, e no nosso paiz, onde não são vulgares, esse valor duplica. Em seguida damos uma pequena lista de Stapelias, que julgamos mais notá- veis : — Stajpelia hirsuta, s^ectahilis, refle- xa, asterias, divaricata, moschata, revolu- ta, cactiformis jmarmorata, reclinata, etc. Aos amadores que desejem possuir al- gumas plantas gordas, recommendamoa a collecção do snr. A. Gomes da Silva, jardineiro do Palácio de Crystal. Vulgar- mente chamam á Stajpelia grandiflora, Cacto sapo. A. J. DE Oliveira e Silva. HABROTHAINUS ELEGANS Não é d'uma planta nova que vamos fallar, mas sim d'uma que ha muitos an- nos possuimos e que hoje recommendamos para logares abrigados pela sua longa flo- rescência. Os ramos são pendentes e flexiveis, ^'OiUtAlOUJ-' Fig. 30 — Habrothamnus elegans — Desenhado no Horto-Loureiro com grandes cimeiras de flores penden- tes, tubulosas, d'uma cor de rosa viva, passando a purpura, que fazem uma vista Burprehendente, principalmente quando tem 50 ou 100 flores, prestando-se mui- to para compor as floreiras, jarras, etc, etc. Ha mais variedades, e todas são muito floriferas. Não requerem cuidados ea sua reproducção é fácil, tanto pelo meio d'es- taca herbácea ou então em janeiro antes da sua rebentação. Esta encantadora planta presta-se bem para encostar aos muros ou a qualquer arvore; porém, como é mais surprehen- dente, é eollocada isoladamente e segura por um tutor para, formando um guar- da-sol, se gozarem as suas numerosíssimas flores. José Marques Loureiro. CHRONIGA HORTICOLO-AGRIGOLA Já se distribuíram a primeira e segun- da cadernetas do «Manual de Arboricul- tura», de que é auctor o snr. Alexandre de Souza Figueiredo, professor de agri- cultura e agrónomo do districto de Faro. Mais de espaço fallaremoa d'esta obra, 176 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA cujo offerecimento agradecemos ao edi- tor. — Participaram-nos da Bélgica o fal- lecimento do Mr. Edmond de Ghellinck de Walle, presidente da Real Sociedade d'Agricultura e de Botânica de Gand. Não conheciamos pessoalmente este cavalheiro, mas o seu nome c-nos fami- liar, porque ha muitos annos que anda intimamente ligado á horticultura. Tinha nascido em 1820 e todos que conviviam com elle pranteiam hoje a sua morte. — A taça Cárter, de que falíamos ha tempos (pag. 79), foi conferida a Mr. R. Gilbert, notável cultivador de hortali- ças. Como dissemos, esta taça valia 50 li- bras esterlinas. — O snr. Brito Aranha, cavalheiro vantajosamente conhecido na republica das lettras, acaba de dar a lume um li- vro que tem por titulo «Esboços e Re- cordações » . Este livro, escripto em estilo singelo e despretencioso, é dividido em 19 capitu- les, todos elles interessantes e instructi- vos. Paginas como estas téem um duplo fim: entrctcem a imaginação ao mesmo tempo que alimentam o espirito. E uma das qualidades que caracterisa o escriptor lisbonense. Para que melhor se possa apreciar este volume damos em seguida a lista dos as- sumptos de que tracta cada um dos ca- pitules : A independência de Portugal e a instrucção publica — O dia 24 de ju- lho de 1833 — Rebello da Silva — A vil- la e o castello da Louzã — Na GoUegã — Paulo Veronez e a inquisição — No Cartaxo — O almirante Celestino Soares — O snr. Silvestre Ribeiro e a sua His- toria dos estabelecimentos scientificos e litterarios de Portugal — Santos e Silva — Gravura de madeira — Três quintas — Braz Martins — O instituto de Fran- ça— Manoel Joaquim AíFonso — Frades- BO da Silveira — O gabinete portuguez de leitura no Rio de Janeiro — Carva- lho histórico — O patrão Joaquim Lo- pes. Agradecemos o offerecimento que o talentoso auctor nos fez d'um exemplar da sua obra que lemos com prazer. — Chicago vae ser dotada brevemente com um Jardim Botânico, que compre- henderá: uma eschola geral de botânica, um arboretum, um jardim florista, um museu botânico, um herbario e uma bi- bliotheca. Este estabelecimento scientifico será modelado pelo de Kew e os trabalhos estão confiados ao professor H. H. Bab- cock. — A direcção da Sociedade de Aclima- ção de Pariz deseja comprar todas as espécies e variedades de Aruntiaceas conhecidas (Citrus, Límonia, Triphasia, etc), para serem plantadas no seu Jar- dim de Aclimação de Hyères (Var.) Todas as communi caçoes sobre o as- sumpto deverão ser dirigidas: à Mr. le directeur du Jardin d'Acclimatation du Bois de Boulogne (Paris). — Sobre a destruição do Phylloxera vastatrix lemos o seguinte n'um jornal francez : Passaram já os bellos dias d'esse terrível insecto. A seiencia acaba de sair victoriosa da sua lucta com este adversário. A vinha tem final- mente o tào desejado remédio, e deve-se elle ao snr. Dumas. Ha dous ou três dias dizia-se que, na rece- pção do duque de Audiffret-Pasquier, o illustre sábio havia declarado ao marechal de Mac-Ma- hon, que haviam sido coroados de bom resul- tado os estudos a que se havia dedicado desde algum tempo acerca d'esta questão. O marechal, tendo repetido o que o snr. Du- mas acabava de lhe dizer, este sendo logo muito procurado, respondeu com a melhor vontade a todas as perguntas que lhe dirigiram acerca d'este interessante assumpto. Eu teria faltado a todos os meus deveres se, sabendo estes factos, não tivesse logo pro- curado o snr. Dumas. O célebre chimico é o mais bondoso e mais amável dos mortaes, e é seguramente uma grande fortuna o encontrar mn pretexto para lhe pedir um momento de au- diência. Eis, pois, o resumo do que elle teve a bondade de mo dizer, com algumas correcções todavia, porque o snr. Dumas é demasiadamente mo- desto, c foi somente pela leitura dos documen- tos ofHciaes que eu pude saber que a elle per- tence toda a honra da descoberta. Os remédios descobertos até 1874 tinham o inconveniente de destruir a vinha ao mesmo tempo. Na sua memoria, lida no dia 8 de junho na academia, o snr. Dumas expôz que poderia em- prcgar-se sem perigo pai'a a vinlia o sulfo-car- bonato de potassa. (Se a preparação d'esta substancia nâo fosae JOENAL DE HORTICULTURA PRATICA 177 uma operação de laboratório, poderia facilmente fazej'-se d'ella uma industria : bastaria fabricar uma mistura em certa dose de carvào, de enxo- fre e de potassa. Em sessões successivas da academia das sciencias, o snr. Dumas pediu energicamente que a auctoridade adoptasse a favor da vinha medidas análogas ás que emprega contra a epi- zootia. Declarou elle que era preciso ordenar o arranque das cepas doentes, a sua destruição e a infecção do solo por meio de productos cbi- micos. A commissão do Pliylloxera, de que o snr. Dumas é presidente, e cujos membros são os snrs. Milne-Edwards, Duehartre, Blanchard, Pasteur, Thénard e Bouley, tractou de fazer executar, nos paizes em que o flagello produz estragos, experiências em grande escala. Foram enviados delegados a diíFerentes pontos. As companhias dos caminhos de ferro de Lyão, de Orleãs, do Meio-dia e de Charentes fornece- ram-lhes os meios de fazer muito economica- mente as suas viagens. O snr. Dumas mandou fabricar em diversas manufacturas 3:000 kilo- grammas de sulfo-carbonatos alcalinos, que fo- ram empregados por estes missionários da sciencia. Sào hoje conhecidos os resultados d'estes trabalhos. A vinha não soffre cousa al- guma, antes aproveita com o contacto d'esses saes sólidos ou dissolvidos, mas qualquer ani- mal collocado na sua visinhança não poderá deixar de perecer. Foi em Cognac, nas proximidades de Avi- gnon, em Génova e Montpellier, que o snr. Du- mas mandou fazer estas experiências em ponto grande. Os sulfo-carbonatos alcalinos são deitados sobre o solo. As chuvas favorecem a sua pene- tração, dissolvendo-os ; e, logo que as raizes phylloxeradas são tocadas pela dissolução, des- apparece todo o vestígio do flagello. O preço d'estes saes é ainda bastante ele- vado, mas a sua grande fabricação deve produ- zir uma diminuição sensível ; e ainda assim não devem elles ser empregados senão em quanti- dade diminuta. Em um paiz em que o Phylloxera acaba de fazer a sua primeira appariçâo, bastarão 100 francos pouco mais ou menos de sulfo-carbo- nato, para applicar a algumas centenas de ce- pas e ás suas proximidades; a mão de obra é absolutamente insignificante. Quando se tracte de renovar uma plantação de vinhas em região atacada do Phylloxera, será absolutamente necessário fazer pelo menos duas applicações de sulfo-carbonato por anno, uma na primavera, outra no outono •, mas a fraca ex- tensão das raizes durante os três primeiros an- nos torna tão fraca a quantidade de sulfo-car- bonato necessária para as tocar todas, que a despeza chegaria apenas a 50 ou 60 francos por hectare para o primeiro anno, e elevar-se-ia, quando muito, ao dobro pai'a o segundo, e ao triplo para o terceiro, dando uma média de 100 a 120 francos por hectare até ao íomento em que a vinha começa a produzir. Para as vinhas velhas, geralmente atacadas e collocadas em um paiz infectado, é preciso combinar o emprego do estrume e do sulfo-car- bonato. Bastarão 150 francos por hectare. Far- se-ha uma cova ao pé de cada cepa, e colloear- se-ha ahi uma pequena quantidade de sulfo- carbonato, que se cobrirá de estrume, quando o solo o tiver absorvido. Tal é no seu conjuncto e nas suas applica- ções a descoberta que salva as nossas vinhas do maior perigo que as tem ameaçado. Ha dous annos que o snr. Dumas faz experimentar este processo tão simples, tão económico, tão prático, do qual hoje não é já permittido duvidar. O governo tem agora um grande dever a cumjírir. E preciso impedir o transporte das ce- pas atacadas. Quando se examinam as cartas levantadas por Mr. Duelaux, pasma-se de ver a maneira como o flagello se espalhou. Em 1855 não existia senão um ponto sobre a carta, era a planície de Pujau, perto de Roque- maur entre Avignon e Carpentras. Em 1866 o ponto torna-se uma mancha ro- deada de outros pequenos pontos. Em 1867 os districtos de Avignon, de Oran- ge e de Aries, achavam-sejá cobertos d'elles. Depois a mancha engrandece, envolve os de- partamentos inteiros. Hoje estende-se de Va- lença a Toulon, e de Dragoinan a Montepellier. Vê -se que é preciso não perder tempo, porque o mal propaga-se também a outras regiões da França. O snr. Dumas acaba de prestar ao paiz um serviço immenso, mas, torno a repetir, é pre- ciso completar a sua obra. Não seria difficil provar que, se o estado tomasse mesmo a seu cargo a despeza do sulfo-carbonato, faria elle um bom negocio. Mas uma enérgica propagan- da precedida de um bom decreto pode bastar a convencer os vinicultores, e parece-nos que não será necessário fallar n'isto muitas vezes para determinar o governo a providenciar. Esta noticia é rubricada por Mr. Al- frecl Aunay, viticultor, que lia muito se occupa da nova moléstia das vinhas. — Por mais d'uma vez nos occupamos n'este jornal d'uma medida sobremodo absurda que a camará pôz em vigor logo em seguida á sabida do snr. visconde de Villar Allen d'aquella corporação. Não foi, porém, para lisongear este ca- valheiro que aqui inscrevemos o seu nome, mas porque é bem patente que o bom desempenho de qualquer dos serviços que estão a cargo da municipalidade depende principalmente, senão quasi exclusiva- mente, dos conhecimentos especiaes que tem o vereador respectivo. Se não fossem pois os conhecimentos do ex-camarista visconde de Villar Allen e a sua muito boa vontade, não veria hoje o Porto a an- tiga Cordoaria transformada em espaçoso e bem delineado jardim. 178 JOKNAL DE HORTICULTURA PRATICA O snr. visconde entendeu que aquelle jardim devia de ser publico na verda- deira accepção da palavra, mas 03 seus successores — que a não t^er para lhe díir 03 íV)ro3 de ari.-tot-rata, não sabemos para quê — pensaram diíierentemente e deram ínL^trucções aos guardas para só franquea- rem aquelle recinto ás botas de polimento ou de duraque. Quer dizer que o legisla- dor media as pessoas pelos pés. Isto é repugnante n'uma cidade em que vemos tremular o pavilhão da liber- dade, e já tem dado motivo a alguns con- flietos. A «Actualidade» escrevia ultimamente as seguintes linhas: Convinha tornar bein publico e notório qual o systema de calçado com que é licito ou illi- cito entrar nos passeios públicos. É uni pedido que fazemos á exc."'" camará, em nome de quem indo, ha pouco tempo, a entrar no passeio da Cordoaria, acompanliado d'umaama que levava uma criancinha, e ia, seto. Prccisa- se de um edital em que se designe o cal- çado com que o desprotegido da fortuna e sem meios alli píde ir repou ;ar alguns instantes depois de ter Analisado o seu trabalho. Recommendamos no entretanto á exm.* camará que na redacção do referido edi- tal tenha em vista que o pobre é o que mais carece dos passeios públicos. Os abastados como v. exc* téem os seus pa- lácios e os parques, e aquelle, a maior parte das vezes, nem sequer tem uma colcha para se cobrir nas noutes de as- pérrimo dezembro. No estrangeiro construem-se squares de propósito junto dos grandes estabele- cimentos fabris para recreio dos operá- rios, que nem envergonham as arvores nem as pessoas que se sentam debaixo d'el- las a gosar-lhes a sombra. Estará por ventura a camará munici- pal tão possuída de leituras bíblicas, que queira fazer dos passeios públicos parai- zo dos Adòcs peccadores? N'esse caso, para haver conformidade, deve substi- tuir o junco do zelador ou o sabre do municipal pela espada fulminante do ar- chanjo. Na Suissa e na Bélgica os jardins es- tão coníiados á vigilância do povo. Não ha necessidade de guarda pretoriana áa portas. Não poderia acontecer o mesmo entre nós '? Não seria o povo digno d'e3sa confiança? No caso negativo lastimamos o facto, tanto pela camai-a, como pelo povo. — Do snr. João Félix Pereira rece- bemos um volumesinho que tem por ti- tulo «Livro de leitura para as escholas ruraes». E-te livro contem 148 pequenos arti- gos que tractam principalmente de agri- cultura. Parece-nos que preenche bem o pro- pósito do auctor, a quem agradecemos o offereçimento que nos fez. — A Expo-ição de Barcelona concor- reram 48 expositores e o numero de plantas subia a 2:2õ6 exemplares. A «Revista Hortícola» diz que a festa fora brilhante a todos 03 respeitos. Estimamos. — Lômos em «El Agricultor Andaluz» que o Phylloxera vastatrix se havia ma- nifestado na Galliza. — Subordinado á epigraphe «Arbori- sação» vemos no «Tribuno Popular» de Coimbra a seguinte noticia: Gastam as camarás quantias importantes todos os aunos em arborisaçào na cidade. Causa porém dó o abandono a que as arvores sào en- trofíues, denunciando injustificável desleixo. As arvores plantadas na Couraça de Lisboa estào n'este caso. Nào tcMn caldeiras para serem regadas, e vivem a custo, apertadas entre pedras e cerca- das de herva, symbolo do desmazelo municipal. Como porém costuma dizer-sc — De minimis non curat pretor. Quem só pensa em obras grandes e em ar- ranjar votos, níío p(')de olhar pelas insignificân- cias da administração. Como isto, vae o resto. Coimbra tem-nos dftdo sobcíjas provas de que a arbori-^ação lhe tem sempre mere- cido a maior attenção, e, se não conhecê- ramos a imparcialidade e independência do «Tribuno Popular», talvez que não acreditássemos no que se acaba de lêr. Chamamos portanto a attenção do ca- valheiro que tem a seu cargo o respectivo pelouro para esta queixa, que considera- mos de todo o ponto justa. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 179 Com um bocadinho de boa vontade ficará tudo remediado. — Depois de se ter vencido um certo numero de difficuldades, apre>entou-se o snr. António Augusto de Aguiar, no .sa- lão do theatro de D. Maria, para tractar publicamente de assumptos vinícolas e sobretudo da exposição de vinhos que se realisou o anno passado em Londres. O snr. Aguiar historiou o modo por que fora incumbido pelo governo de re- presentar o nosso paiz na exposição e enumerou em seguida uma serie de con- trariedades em que se viu envolvido e que podiam dar causa a que fossemos alli menos bem repre.-entados. Segundo um jornal da capital, o pre- lector occupou-se do mau acolhimento que tivera em Londres por parte da com- mis. ão da exposição, e de como até cer- to ponto, supplantado por um pessoal que se arrogara attribuiçòes que não ti- nha, fora tido como simples negociante de vinhos, levado alli unicamente por seu interesse. Isto parece-nos sobremodo ori- ginal e esperamos com anciedade a pu- blicação do relatório para melhor saber- mos quem foram os intrusos, e custa-nos realmente a crer que a commis^ão da ex- posição faltasse á consideração de que o snr. Aguiar se torna credor pelos seus elevados dotes intellectuae=!. Tudo quanto chega ao nosso conheci- mento é vago e por isso não podemos formular opinião sobre o que se passou em Londres durante a exposição com o nosso representante official. O snr. Aguiar na sua conferencia fal- lou largamente das deficiências no fabri- co dos nossos vinhos, e do modo por que pôde vir a ser possivel introduzil-os no mercado de Londres, e n'outros empórios importantes ; chamou a attenção dos vi- nhateiros para as indicações que apre- sentava, certo de que lhes fazia n'isso um importante serviço; concluiu enume- rando as qualidades mais ou menos apre- ciáveis dos vinhos do Algarve, sua esca- la alcoólica, seu fabrico, etc; e termi- nou a conferencia determinando os diíTe- rentes capitules em que as seguintes se devem dividir. O auditório deu provas de que lhe ti- nha sido grato ouvir a palavra do eru- dito chimico portuguez e nós folgaría- mos em vel-o continuar a sua missão scientifica, alargando ate á região viní- cola do Douro as suas conferencias. Afigura-se-no3 que os hospitaleiros agri- cultores do Douro, receberiam com ju- bilo a visita do snr. António Augusto de Aguiar, cônscios de que essa visita lhes seria nimiamente proveitosa. — O artigo que inserimos n'este nu- mero com o titulo «Poda e limpeza das Oliveiras» é extrahido do «Jornal dos Agricultores do Algarve». — Com o nome de «Floral» annuncia a agencia central dos agricultores de França um comporto chimico de grande força concentrado em pó e próprio para adubar as plantas ornamentaes, d'estufa e todas as outras. Recebemos um impresso com as ins- trucçoes sobre o modo de fazer a appli- cação d' este adubo, de que ha quatro for- mulas diíferentes, cada qual destinada a seu género de vegetaes. Eis os preços do «Floral» n.°^ 1 e 2: Kilogramma que dá 20:000 regas custa 5 fr. 7ò c; meio kilogramma que dá 10:000 regas 3 fr.; 250 grammas que dá 5:000 regas 1 fr. 75 c; 125 grammas que dá 2:500 regas 1 fr. O «Floral» n.°^ 3 e 4 custa : Kilogram- ma que dá 40:000 regas 10 fr.; meio kilogramma que dá 20:000 regas 5 fr. 75 c; 250 grammas que dá 10:000 re- gas 3 fr.; 125 grammas que dá 5:000 re- gas 1 fr. 75. As caixas são acompanhadas por um opúsculo em que se dão todas as instruc- çòes. Os pedidos deverão ser feitos a MM. Alfred Dudouy & C.^'' — Agence centrale des Agriculteurs de France — Paris, 38, rue Notre-Dame-des-Victoires, place de la Bourse. — Foram esplendidas as ornamentações floraes feitas no palácio de Guildhall por occasião do banquete e festas municipaes celebradas pelo lord mayor da grande ca- pital d'Inglaterra. O fornecedor foi Mr. J. Will de South Kensington, e entre uma folhagem luxuriante destacavam-se as mais bellas e raras plantas dispostas gra- ciosamente, de modo a produzir um bri- lhantíssimo eífeito. Sobresahiam entre esta ornamentação 180 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA umas grutas de gelo, onde a luz batia produzindo 03 mais bel los e fantásti- cos reflexos. Pt')de-se imaginar o contras- te do gelo e da verdura e que deslum- bramento níio dariam, á luz fascinadora do gaz, estas ornamentações tão cheias de originalidade e frescura. — O Jardim Botânico de Coimbra re- cebeu um presente de Palmeiras, Orcki- deas e outras plantas do Brazil. Recebeu também, vindas de Java, se- mentes d'alguma3 espécies de Cinckonas e d'outra3 plantas. — Eis o resultado das analyses feitas em Java á casca de diíFerentes espécies de Quinas. A C. officinalis Linn. fC. Condaminea Ilumb. et. Bonpl.) produz: quinino 3 — 5 p. c. ; Cinchonidina 1 — 2 p. c. A C. Succirubra Pav. produz: qui- nino 1 p. c. Cinchonidina 4 p. c. Cin- chonina 1 — 5 p. c. A C. calisaya Wedd. var. microcarpa (C. calisaya LedgerianaJ produz : quinino 6 — 7 p. c. — O snr. José Martinho de Lucena, ura dos maiores amadores de flores em Lisboa, oíFereceu ro Jardim Botânico de Coimbra uma bella coUecção de Begónias e Caladiums, quasi todas de sementeira feita por aquelíe cavalheiro. — Em Manchester está-se tractando de construir um espaçoso jardim. Cada vez se reconhece mais a neces- sidade que ha de ter jardins no centro das cidades, onde o rico e o proletário possam ter algumas horas de recreio e tranquillidade. — O incansável horticultor portuense, o snr. José Marques Loureiro, enviou-nos ha dias alguns exemplares do supple- raento ao seu catalogo n.'' 11 (1875-76). Contem numerosas novidades e algumas d'ella3 com o duplo merecimento de serem nacionaes, como por exemplo uma serie de seÍ3 Caladiunis obtidos pelo snr. Ja- cob Weiss, director dos jardins do snr. duque de Palraella e a que deu os se- guintes nomes: Conselheiro Cannllo Au- relinno, Duque de Palmella, Duqueza de Palmella, dr. Edmond Goeze, Jacob Weiss, Jornal de Horticultura Pratica e Oliveira Júnior. Pela nossa parte agra- decemos a distincção. As collecçoes de arvores fructiferas foram este anno consideravelmente au- gmentadas e 03 preços são menores do que os indicados nos catálogos anteriores. O publico lucra com esta reducção dos preços e o snr. Marques Loureiro tam- bém tem tudo a ganhar, porque é natu- ral que as vendas tenham grande incre- mento. Não é sem razão que o nosso povo diz — vender barato, para vender muito. — O «Rochester Express» publica um sensato artigo de Mr. Ellwanger, em que considera a plantação de arvores nas ruaa das cidades tão necessária para a sua belleza como as obras architectonicas, e faz menção da Columbia como uma das cidades onde se tem feito as plantações mais judiciosamente, tanto na America como na Europa. Algumas das ruas são guarnecidas de Carvalhos de grandes di- mensões. Nas ruas estreitas costumam preferir as arvores pyramidaes. Bom seria que estes exemplos encon- trassem por cá imitadores. — Em Itália tem-se manifestado ulti- mamente uma moléstia que victima gran- de numero de Videiras, a qual, segundo refere o «Economista d'Italia», consis- te n'umas certas excrecencias e galhas, á similhança de tumores, que se desen- volvem no caule da planta e que tomam taes proporções que acabam por matal-a. Os entomologos italianos, que se téem occupado da questão, julgam dever attri- buir a moléstia á presença d'um insecto muito differente do Phylloxera vastatrix e que parece ser o Orchestes alni, con- siderado até hoje inoffensivo para a vi- nha. — Os Agriões, que tão pouco valor téem entre nós, e que tão barato se vendem em toda a parte, renderam n'um anno cm Pariz, segundo um calculo feito por Mr. Vizetellv, a fabulosa somma de 160:000 libras esterlinas! — S(3 agora soubemos que tinha falle- cido no dia 23 de julho Mr. André Lc- roy. Escasseia-nos porém hoje o espaço para lhe prestarmos as homenagens a que todo3 os homens de saber como esta téem jus. S. João da Foz. Duarte de Oliveira Júnior. JOBNAL DE HORTICULTURA PRATICA 1^1 DEVEM-SE PODAR AS ARVORES TRAIÍSPLAWTADAS? Sobre a que^itão importantiíssima que ha muitos annos se ventila de dever-.- difficuldade. Bem ou mal ar- rancada, a arvore, depois de novamen- te plantada, deve fazer o que em lin- guagem hortícola se chama jptgar. Fig. 31. Desbaste da copa das Não é nosso intento entrar nos por- menores relativos aos cuidados favorá- veis para pegar; restringir-nos-hemos á importante questão de saber se se deve ou não podar a arvore no anno da plantação. Como regra geral, admittiremos que a arvore não deve ficar sujeita á poda no primeiro anno, quando soíFre algu- ma cousa ao ser transplantada. Sem exagero, pôde dizer-se que, á ex- cepção doi Pecegueiros, que não é bom se- rem transplantados depois do seu tercei- ro anno de desenvolvimento, todas as ar- vores de 3 a 4 anno 3 soffi-em geralmente bastante alteração para não poderem ser podadas, quando se acabam de trans- plantar. Quanto menor fôr o vigor das arvores, tanta maior reserva haverá em podar, de modo que se deixarão em to- da a sua liberdade as Pereiras enxerta- das em Marmeleiro, a partir do seu se- Vol. VI.— 1875 Fig. 32. Fig. ò3. arvores transplantadas gundo anno d'edade. Quanto mais des- envolvidos forem os individuo^, mais prudência haverá no manejar da po- dôa, como por exemplo nas palmas ou leques de 3 ou 4 ordens, nas pyrami- des fortes e nas arvores de haste ele- vada que tenham um a três annos de copa. Se recommendamos com toda a con- vicção que inspira a experiência, o não fazer corte ordinário do prolongamento e dos ramos novos nos casos citados mais acima, gritamos com todas as nossas for- ças contra o uso bárbaro de desbastar a copa das arvores transplantadas, como se vê das fig. 31, 32 e 33, quando já téem edade e se acham plantadas ha algum tempo, sob o falso pretexto de estabele- cer um grau d'egualdade relativa entre as raizes e as partes aéreas. Notemos que não é cousa fácil conven- cer 03 equilibristas d' esta ordem dogran- N.o 10 — Outubro 182 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA de absurdo das suas operações. Quando, á força de raciocínio, suppomos que os havemos reduzido ao silencio, respondem ainda qne uma c:rande arvore ti^ansplan- tada oíferece muito campo ao vento, quando se lhe não faz taboa raza de to- dos os ramos até á sexta g-eração. Quan- to mais cortadas tem as raize^, tanto me- nos a arvore e>taríl sep^ura; é assim que pensa o hortelão e d'ahi o suppôr que alí!;un8 golpes de podôa na copa reme- deiam o inconveniente da perda das raí- zes. É portanto fácil conceber que deve haver um meio menos racional de con- eervar a arvore do que convertel-a em recemnascida e comprometter assim o eeu futuro nove vezes em dez. Não somos todavia inteiramente exclusivos no nosso modo de ver. Quando a copa é demasia- damente ramosa, approvamos o c )rte dos ramos supérfluos, mas ainda de modo que se não toque nas outras ramificações. Sahiremos agora ao encontro d'uma observação, que é muitas vezes o refu- gio dos que não admittem nem sabem refutar: essa observação consiste na se- guinte phrase «é cousa que depende do terreno». EfFectivamente o terreno tem aqui tam- bém o seu papel. Assim n'um que seja pouco próprio para o crescimento da ar- vox"e transplantada, a poda abaulada é condemnavel sem que haja do seu lado clrcumstancia nenhuma attenuante, ao pa^so que n'um terreno extremamente favoravl acontece obter-se um resultado passageiro operando as grandes amputa- ções. E»te resultado parcial não destr/jc comtudo as nossas asserções e é em todo o caso com processo vicioso. Vê-se pois que só as más consequências da applica- ção é que estão subordinadas ao terreno. Submettemos esta reflexão ao espirito dos arboricultores, que dão cabo de to- das as questões e arredam todas as dif- ficuldades com o lacónico — «isso de- pende do terreno». Desejamos do intimo do peito que dêem bom resultado as no- vas creaçues de pomares ; por isso não dei- xaremos, ao pôr ponto, de concentrar toda a questão relativamente a este as- sumpto. Quando plantardes arvores novas de haste elevada, ainda que não tenham de copa senão de 1 a 3 annos, não lhe fa- çaes soíFrer nenhuma poda, porque se tiverdes em vista estabelecer immedia- tamonte novas ramificações para formar copa, raras vezes se obterá resultado. É deixar para o anno. Se a copa não foi feita no viveiro segundo as regras da arte e desejaes rccomeçal-a, sacrificando tudo o que está formado — ainda d'esta vez reservae-vos para o anno seguinte ao da plantação. Sacrifiquemos um anno e não teremos perdido o tempo.» Este escrlpto devido á i Ilustrada pen- na do distincto arboricultor e professor da eschola de horticultura da Universi- dade de Gand, Mr. Fréd. Burvenich, torna-se digno de se lêr meditadamente. As controvérsias que tem havido so- bre o objecto de que se tracta são nu- merosas, mas a opinião de Mr. Burve- nich não deve ser desprezada, porque a julgamos em harmonia com os resultados que nos dá a experiência. Longos annos de prática e de lucu- bruções alguma cousa fecunda devera produzir, e Mr. Burvenich está sem du- vida n'e3se caso. No campo e na eschola tem dado pro- vas de sobejo. Oliveira Júnior. ALGUMAS COISIDERAÇÕES SOBRE A NOVA MOLÉSTIA DAS VINHAS' Voltando ao insecticida Pevrat, que o seu descobridor mandou para Portugal a fim de ser ensaiado, seria um remédio milagroso se se desse fé ao que se lê no jornal parisiense «La vie des Ghamps». Diz elle: (1) Vide J. H. P., vol. VI, pag. 170. L" — Que Mr. Pellicot, presidente da *^ociedade Agrícola de Toulon, recom- menda o insectivoro Peyrat como adubo e insecticida simultaneamente, do qual já usou, assim como Mr. Clair Jaubert, de Brignoles, com os melhores resulta- dos para as vinhas atacadas do Phyllo- JORNAL DE HORTICULTUBA PRATICA 183 xera, observando comtudo que a cura das vinhas é muito fácil quando o mal é recente. 2." — Que Mr. Pellicot, occupando-se novamente d'e>te assumpto n'uma carta publicada pela «Sentinella du Midi», accrescenta que uma viagem que fez re- centemente a Brignoles o habilitou a af- firmar mais particularmente o valor do insectivoro Peyrat, e que a e-te respeito se exprime n'estes termos: «O insectivo- ro foi eíficaz nas vinhas de Mr. Clair Jaubert e de Madame Colfon, as quae- recentemente tinham sido atacadas pelo Phylli)xera vastatrix. Em toda a parte onde a invasão do mal era recente o re- sultado foi completo.» 3." — Que o próprio IMr. Jaubert, pre- sidente da camará consultiva de Brigno- les, dirigindo-se a Mr. Peyrat lhe asse- verara que, tendo empregado o seu inse- ctivoro, o mal não progredira, que a vi- nha adquirira uma vegetação muito no- tável, sobretudo nas plantas que se acha- vam n'um estado desesperado, tomando mais do dobro do desenvolvimento que tinham, o que indica a ausência do inse- cto, etc; e que os mesmos resultados ob- teve e eguaes declarações faz Mr. Ber- trand, presidente da Sociedade Agrícola de Aix-en-Provence, o qual em uma das suas cartas se exprime assim : «Eu con- sidero também a composição Peyrat como um remédio preservativo; empreguei-o durante todo o anno, misturado com en- xofre, para combater simultaneamente o oidium. A minha propriedade está ape- nas a 5 kilometros de Aix; estou á dis- posição de todas as pessoas que quizerem vir assegurar-se dos felizes resultados que tenho obtido.» 4.° — Que téem ido delegados de va- rias localidades a Aix, a Toulon e a Bri- gnoles, e depois d'isto téem mandado ir de Pariz a quantidade precisa de insecti- voro, «Adubo Peyrat», para todas as vi- nhas. 5." — Que certas localidades, que por muito pobres não podiam fazer as des- pezas d'aquella viagem, se dirigiram a Mr. Peyrat, e e^te generosamente pagou a viagem aos seus delegados, não que- rendo que o seu remédio fosse applicado ao acaso e sem confiança fundada em fa- ctos authenticos ; e que as companhias dos caminhos de ferro concederam a Mr. Peyrat uma reducçao de 5U por cento no preço dos transportes do seu insecti- voro. Se houvesse a certeza de que estas ex- periências foram feitas conscienciosamen- te, era caso para se gritar com o grande Archimedes : Eureka! Eureka!! Eure- ka!!! mas vemos por ahi tanto charla- tanismo e tantos especuladores, que se valera de quantos meios ha para logra- rem o publico, que é preciso estar hoje de sobreaviso para não se ser enganado. Isto de modo algum se refere ao inse- cticida Peyrat, nem mesmo se poderia referir, porque não o conhecemos. O que ■abemos d'este preparado é tamsómente o que d'elle disf^e, n'uma carta, já ha bastante tempo, Mr. Ga-tonBazille, mem- bro da Commissão ministerial para o es- tudo da mole ^tia das vinhas e antigo pre- sidente da Sociedade de Agricultura do Herault. Eis as suas próprias palavras: (1) «Nous avons reçu beaucoup de let- tres de prétendues guérisons, mais il y en a bien peu de sérieuses.» Ha exactamente três annos que Mr. Gaston Bazille escrevia as três linhas que se acabam de lêr; pôde todavia muito bem acontecer que posteriores experiên- cias viessem provar a efficacia do referi- do preparado. Mr. Laliman, membro das Sociedades de Agricultura do Herault e da Giron- de, que tem estado sempre na brecha desde que se manifestaram os primeiros signaes da moléstia, e-crevia a propo-ito do insecticida de Peyrat, no seu interes- sante «Etude sur les divers Phylloxera et leurs médications», trabalho premia- do pela Sociedade de Agricultura da Gi- ronde, com a medalha de ouro: «Un Mr. Peyrat, rue Lafavette, n.° 3, á Paris, dans un article inséré dans le «Courrier de la Gironde», sous la date de 21 septem- bre 1871, énonce qu'il a proposé en vain au Président de la Société d'Agriculture de Bordeaux, et à titre gratuit, quelques mille kilos d'insectivore ; qu'avec son pro- cedo, la guérison de chaque souche ne coutera que 3 cêntimos. II annonce être envoyé à Montpellier pour arrêter le (1) Montpellier, 8 de outubro de 1871. 184 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA fléau; mais il se garde au=ísi d'indiquer les endroits on il a opere, ce qui rend diíBciie le controle de sei affirmations. «Cet inventeur oublie que des millierà de médecias ont cru, comme lui, à Tia- failUbilité de lenrs remedes, dont il^ sont au3si embarrasse í à cette heure que Lao- cooa de ses reptile^.» As palavras de Mr. Laliman são uma espécie de prevenção, que cada um to- mará conforme julgar conveniente para 03 seus interesses, mas ainda temos á mão uma carta que em 1 1 de setembro do corrente anno nos dirigiu Mr. H. Triraoulet e na qual encontramos a se- guinte passagem: «11 ne faut pas com- pter du tout sur Tinsectivore Peyrat. Tous les essais ont été nuls et três nuls.y> Haverá quem deduza das liahas que acabamos de escrever que queremos pros- crever, da extensa lista de remédios, o do snr. Peyrat. Quem o pensasse eiiga- nar-se-hia, porquanto o nosso fim é tam- sómente apresentar conscienciosamente as considerações que o assumpto nos sug- gere, e oxalá que Mr. Peyrat tivesse jus ao premio dos 300:000 francos, porque além do beneficio que resultaria d'isso para os viticultores, veria o seu nome levado á po-teridade. O seu nome seria então mais do que o de Parmentier — não introduzia na economia publica um novo vegetal, mas salvava todos os vinhedos, e dava folgrazã alegria aos que como Bac- cho são aíFeiçoados ao parreiral. . . Deixemos agora Mr. Pevrat e passe- mos a transcrever alguns periodos d'uma carta que temos presente do snr. Vieira Pimenta, a quem por mais d'uma vez nos temos referido no decorrer d'e^te pas- sageiro escripto. Eis os periodos a que alludimo- : «De 1854 a 1859, oito milheiros de vinha não produziram mais do que um a seis almudes de vinho ! «Em 1860 foi enxertada das melhores plantas, e de reconhecida producção. Cos- tumo marcar a phnna das Videiras quan- do carreíradas de fructo e de reconhecida producção, porque assim ha a certeza não 8Ó da boa qualidade, mas ainda de que a cepa mãe não é anneira nem sujeita a desavinho. «Em 1861 e 1862 a producção foi abun- dante, já por a enxertia não desmentir a linhagem, já por a escava funda ter beneficiado as camadas exhaustas. «Decresceu depois successi vãmente, e em 1869 da óptima enxertia só existia a memoria do passado ... o desavinho era geral, fosse qual fosse o tempo da alim- pação. «Que fazer? Para engeiar seria neces- sário arrancar uma vallada entre duas, e o sub-solo durissimo tornaria o melho- ramento de tal forma caro, que não era para esperar que os resultados compen- sassem o trabalho. Tomei o seguinte ex- pediente: Parte da vinha foi engeiada e a parte mais próxima da ca^a foi bene- ficiada com terra argillosa, applicada como marnagem, e com terra negra extrabida dos parques dos difFerentes animaes do- mésticos, e com adubos, formando terriço fértil, e sem fermentação alguma. A par- te engeiada melhorou, mas não compen- sava a de:peza feita. «Este anno já alguns grupos de VideU ras apresentam os primeiros symptomas da nova mole-^tia. «A parte marnada e adubada tem dado já colheitas abundantíssimas, não de-avi- nha, e não tem um único indicio do Phylloxera. Producção mais de dupla do que na vinha engeiada. Segunda expe- riência, no mesmo sentido mas em me- nor escala, está dando os mesmos resul- tado^. «N'outra vinha junto á casa (hoje a mais afFeotada do Phyllox< rn) e já doente ha três annos, mandei lançar alguma cinza em caldeira ou poço, e depois também alguma por o meio das valladas, como quem distribue fruano ou adubo chimico. E te anno, as Videiras que assim foram tractadas, e que eram as mais doentes, estão magnificas, não dcavinharam e parecem um oásis no deserto; tanto as outras estão com a folhagem amarella e a producção é pobre.» D'isto infere-se que o solo não está nas. condições próprias de poder alimentar o vegetal e que lho falta algum doa elemen- tos necessários á vida. Effecti vãmente o agricultor do Douro nunca estruma as suas vinhas, a não ser em certas localidades mais afastadas da margem do rio, onde semeiam trigo e piau- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 185 tam batatas, etc. Em certos pontos vão usando a sementeira do tremoço que de- pois empregam como adubo verde, mas que está longe de satisfazer ás exigências do solo. Para que a terra nos possa dar boas colheitas é essencialmente preciso que na sua composição entrem as quatro sub- stancias de que o adubo completo se com- põe: matéria azotada, pho^píiato de cal, potassa e cal. Todas ellas são indispensáveis aos ve- getaes como o ar aos animaes, e na maior parte das regiões vinícolas do Douro quasi que ha completa au-encia d'ete elemento. E portanto para nós ponto de fé que, enire os medicamentos que se de- verão ensaiar, estio em primeiro logar 03 adubo; artitíciaes em que predomine a cal, opinião que nos é confirmada pjr Mr. Trimoulet, que ainda ha poucos dias nos dizia. «Até ao presente só os adubos téem feito algumas curas, e mais fariam Be fos.>em judiciosamente empregados.» Era decerto exigir muito da nature- za, o querer que o solo alimentasse por um numero de séculos indefinido os ve- getaes que o homem lhe confia. Não, isso não pôde ser, e é preciso que o agricultor fique convencido de uma vez para sempre de que os seus vinhedos precisam de ser adubado? conveniente- mente para podcem produzir e viver, tanto quanto um rio precisa de ter agua para ser navegável. O dr. Juies Guvot, um do? mais notá- veis oenolgo- do século XIX, escrevia ain- da não ha muitos annoi: «Ha terrenos ricos de natureza e com os elementos ne- ce-isarioí para que a vinha poisa vegetar bem durante muitos annos sem o auxilio de nenhum adubo, principalmente quan- do as plantas não estão muito próximas umas das outras. «Mas e^ses terrenos privilegiados são raros e além d'isso cobrem-n'os hoje de tão grande quantidade de cepas e exige- se-lhes tanta producção, que geralmente as vinhas precisam de augmento de ali- mento de tempos a tompos. E-te alimen- to comprehende como nas outras cultu- ras o tractar a terra, os compostos e os adubos pVopriamente ditos.» Era desnecessário recorrermos a esta auctoridade para se saber isso, porque o agricultor tem obrigação de conhecer a cadeia interminável que liga todos os se- res. A vida não é senão uma continua me- tamorphose, no que ella tem de mate- rial, bem entendido. É preciso que o ani- mal restitua ao vegetal o que lhe tirou para sua subí^i -tencia e sem esta troca mutua não haveria as necessárias condi- ções de vida. Mais acima já nós dissemos que os adu- bos artificiaes, em que predominasse a cal entre os outros elementos, eram os que deveriam convir aos vinhedos do Douro. O snr. Ferreira Lapa, lente do Insti- tuto geral de agricultura, e cuja opinião re peitamos como todos devem re peitar, recouimenda para combater ou attenuar a doença das vinhas a appiicação a cada cepa do seguinte comporto: Grammaa. Sulphui-eto de cálcio 50 bupcrfospliaío de cal 20 Sulpliato de aminonia 50 Cinzas de vides ou de mattos. lOO Areia ou terra queimada . . . 10,000 A maneira de applicar este composto consistiria em fazer-se uma caldeira fun- da a cada cepa e n'eila se deitaria a mis- tura bem feita nos princípios do outo- no. O snr. Ferreira Lapa calcula que este adubo fica por 2 reis cada cepa, e por- tanto cada hectare que tivesse 8:000 ce- pas faria 16^000 reis de de peza. Os terrenos precisam de uma fubstan- cia alcalina que possa neutralisar os áci- dos formados pela elaboração do organis- mo das plantas, e por varias razoes a cal desempenha muito bem este papel. Em primeiro logar no seu estado na- tural é pouco solúvel na agua; em se- guida attrahe a agua e o acido carbónico do ar e conden-a-o^, desenvolvendo ao mesmo tempo bastante calor. O carbo- nato, que vae formando lentamente quan- do se expõe ao ar, é insolúvel e desen- volve uma leve corrente eléctrica muito favorável á vegetação. Depois, quando um acido mais enérgico vem expulsar pouco a pouco o acido carbónico absor- 186 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA vido, este continua a permanecer á su- periicie do solo por caua do seu pezo e.-pecitico e é decomposto pelas folhad que delie hq alimentam. iSeudo poi-i mai-i que certo que 03 ter- reuoj aíiecLado.-> do Douro ttem falta de cal (ly, uào lieitamo.s em prescrever a sua applicacào, uào dó como eiemeato nu- tritivo, maj ainda como subátancia pró- pria para impedir os maus eíFeitoá dos acido?. Quando ?eja appiicada a terrenos que tenham detrito^ ve^etae-;, convirá empre- gal-a viva ou cáustica, na razão de 100 a 120 hectolitros por hectare, mas sendo queimada será bastante empregal-a na quantidade de GO a bU hectolitros por hectare. O emprego da cal já é muito anti- go, e l^liiiio, que falia d'elle, diz que no seu tempo se u ava tanto para as vinhas como para as arvores fructife- ras. Os resultados obtidos com o emprego das cinzas, de que mais atraz dêmos con- ta, vêem confirmar e robustecer a opi- nião que temos de que a cal deve con- correr efficazmente para a boa saúde das Viaeiras. As cinzas vegetaes contéem, entre ou- tros elementos mineraes, a cal em maior ou menor escala, segundo os terrenos em que as plantas foram creadas. Também contêem outros princípios que constituem excelleute adubo. Acaba-nos de chegar ás mãos um li- vro interessantíssimo devido á auctorisa- da penna do snr. António Batalha Reis, uu) dos primeiros oenologos portuguezes. O snr. Batalha Reis foi em 1872 á ex- posição de Lyon, commissionado pelo nos- so governo, e o livro a que ago]-a nos re- feri mo -s é fructo do seu intelligeute tra- balho e que o auctor intitulou : «A vinha e o vinho em 1872». Fallando nas porções de e=*trume que no Herault empregam por cada cepa se- gundo a natureza do adubo, dá-nos a se- (1) Nas terras enviadas á Commissão Cen- tral de Lisboa piíla D('leíía(,'ào que percorreu o paiz vinhateiro do Douro, e que iorain analysa- das sob a direcção do snr. Ferreira Lapa, acliou- se falta geral de eal, sendo a média em estado de carbonato : 0j,0i5 por 100 gram. de terra. guinte tabeliã, que poderá aproveitar aos nossos viticultores. Estrume de cavallariça 5,k Estrume de curral 3, Engaço 8, Trapos de là 0,500 Bagaço de plantas oleogiuosas. 0,õUO «Entre este^, diz o snr. Batalha Reis, dão alli preferencia ao estrume de cur- ral, aos trapos e ao bagaço de plantas oleogino-as. O e-trume de curral augmenta muito a producção e vigorisa a cepa. Para obterem este estrume, crearam no meio-dia de França uma industria, que realisa magníficos interesses por meio de uma rotação habilmente combinada. O systema é este: compram o engaço e distíllam-no, engordam com elie os car- neiros, que lhes fornecem adubos para as vinhas e carne que tem bom preço, quer seja con.-ummida na localidade, quer vendida para f ')ra do departamento. Os trapos contribuem por dous modoa para o grangeio da vinha; fornecem-lho azote e potassa, e dividem o terreno. São um soberbo correctivo para ter- ras argillo-ías e compactas. O bagaço é muito empregado nas vi- nhas cançadas, sobretudo se o terreno ó pouco rico de potassa.» Um adubo que lá f.')ra se usa ha muito tempo com bom reultado, é o formado com os resíduos das uvas, terra e cal. O visconde de Vergnette-Lamotte pre- conisa o guano (1) para os terrenos ar- gillo-siliciosos. Observa porém que o gua- no deverá ser applicado quando o tempo ameace chuva, porque, não chovendo, 03 seus eíFeitos .são completamente nullos. Deverá ser applicado na proporção de 30 a 45 grammas por cepa. Agora que nos temos vindo occupando de adubos applicado-i á vinha não deve- mos oceultar que existe geralmente en- tre os viticultores a ideia de que os adu- bos prejudicam as qualidades do vinho. Não entraremos n'essa di-^cu^r-ão, por- que hoje a qualidade do producto ê para uós uma cou a secundaria e deve-o ser também para os proprietários. Quando (1) "Le Livre de la Ferme et des Maiaoni ae Campague.» JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 187 chega aos nossos ouvidos o horroroso gri- to de sauve qui peut, não ha tempo para pensar noj meioi a empregar para a fuga ; apenas, se o ha, é para a rea- lizar seja como fôr. O que nós queremos agora é rfalvar a vinha, cu 4e o que custar. Aos práticos assim como aos homens da scieacia tem a experiência demons- trado que para todos o-i fructos sumaren- tos ou de polpa a^sucarada é co adição essencial o desenvolvimento normal e completo da vegetação e que a pobreza do solo produz vsempi'e fructo^ ácidos e sem aroma. O failecido dr. Guyot diz, pois, que a primeira condição para se obter bom sumo d'uva e segurar á vinha uma vegetação normal e completa con- siste no emprego do adubo era proporções judiciosamente adaptadas. É este o meio mais seguro e económico. O mesmo auctor lembra, para pou- par trabalho que tem como consequên- cia augmento de despeza, que, em lo- gar de se estrumarem as vinhas todos 03 annos, se faç^i de três era tre^, calculan- do-se então approximadamente três meios kilogramuias para cada cepa dos terre- nos fortes, tre? kilogrammas para os me- díocres e seis para os fraco*, o que sora- mado representa 15:000 kilog., 30:000 kilog. e 6i):000 kilog. de estrume para cada hectare de terreno de três em tre* annos. Kâo cabemos exactamente a quantidade de estrume que gasta- rá um hectare em que se cultivem cereaes, mas afigura-se-nos que será superior ás cifras que deixamos escrí- ptas. f Continua. J Oliveira Júnior. SOLANDRA GRANDIFLORA A Solandra grandijiora é também co- nhecida pelo nome de Datara sarmen- tosa, porque as suas flores são similhan- tes ás da Datara ou Brugmansia. Este magnifico arbusto das Antilhas é pouco conhecido entre nós, porém sel-o- ha agora, porque é digno de occupar um logar nos pequenos e grandes jardins, pela belleza das suas grandes flores em forma de trombeta. O tubo da flor é de Fig. 34 — Solandra grandiflora — Horto Loureiro um amarello pallido, e o limbo branco, franjado e listrado com raios avermelha- dos. São de um lindo eífelto entre as dua^ grandes folhas oblongas, pubescentes, de um verde claro. Attinge a altura de 5 a 6 metros, po- rém entre nós apenas chega a 2 '",50. Dá-se perfeitamente em todoá oâ terrenos, mas para florescer melhor deve ser plan- tado em logar que não tenha sombra. Reproduz-se por melo d'estaca com alguns cuidados, e multo bem por meio de ai porque. A Solandra grandiflora é de folha ca- duca. José Marques Loureiro. 188 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA A VINICULTURA PORTUGUEZA VII Penetraremos agora na região vinícola em que os viuhoá de pasto se nos otfe- recem debaixo de maior uuuiero de ty- pos e todo-i eileá pelo geral bem caracte- risados e de excedentes qualidades. É a rej ào da Esirema lura, em que a climatologia e a geologia \ariam mui- to mais que nas outras regioe>, otfere- cendo por isso ás vinhas uma grande di- versidade de condições iocaes. - Em re- la(j'ào aos climas topograpliicos podem-se repartir as vinhas em 4 grupos : — Viuha> ao correr da coota uceauica; vinhas da> serra?; vinhas de coilinas, e vinhas dos valles e planícies. O primeiro grupo fornece gerahnente vinhoi delgados, fracos, aiguus porém de nmita di.-.tincyâo. Taes .-ao os viuho- de CuUares, de Miifra, da Ericeira, de Peaic-ie, da^ Caldas da Rainha e de al- gUAs outro; pontos do di.^trictode Leiria. O segundo grupo produz vinho? dei gados mas tino<, epirituoos. Taes são os de Tkoinnr, da >>erra, e os dos conce- Ihoí serranos de Leiria. O terceiro grupo é o que produz a maior parte dos bons viniios d'esta re- gião. O quarto grupo fornece também bons vinho -i, mas um grande numero d'elle.-> são ba>tòe-) e carregados de mais. — Taes são os vinhos do Campo, na bacia do Te- jo, e alpuns de Árrula. Relativamente ao terreno geoloiílco, póde-.-e dizer que ha bons e infeiiore- vinhos em todos o^ terrenos. Comtudo é noí terrenos alluviaes em que o vinho parece propender mais para o typo bas- tão e vulgar, sendo os terrenos secundá- rios, terciário í, e alguns quaternario-i, que avisinham a margem direita do Te jo, os que apresentam maior numero de typos de vinho fino. — O Carcavellos, Termo, Bucellas, Camarate, Cadafaes, Torreano, Cartaxo, Thomar, e Torres Novas hão uma demonstração do que le- vamos dito. Em três sub-regioes correspondentes (1; J. H. P., vol. VI, pug. 168. aos três districtos administrativos se po- de dividir a região vinícola da Estrema- dura : a de Leiria, a de Santarém e a de Lisboa. 1.* tíuò-região de Leiria. — E das três sub-regioes da E .^tiemadura a menos pro- ductiva em vinhos, sendo e.?tes pelo geral fracos, e a maioria só própria para alam- bicar. Compreaendendo qua-i 3õ0;U00 hectare ;, nâo tem e^ta tuo-região mais de 70:0 'O em cuitura, entrando n'e'te3 uns 10:000 hectares cobertos por vinhas adultas, o que nâo é pouco em relação á área agricultada, mas insigniíicaiite ein relação á área total. — Uma grande parte d e?ta sub-re^ião é formada pelos terrenos secundários lias.-ico', jurássicos e cretáceos, — a outra parte por arena- tas quaternárias. A feição gerai do solo é fraqueiro e por partes ba tante eão geralmente pouco sacciíarlnos ainda nos annos mais favoráveis á maturação; o< que chegam a ter 21 "o de assucar ji se reputam bons e d'esses se faz vinaos para copo, alguns dos quaes são muito saborosos e poderiam ser exportados. Mas póde-se dizer que ^/a da totalidade dos vinhos se destinam a caldeira, rendendo 1 por 6 de aguardente de 77 conte -imos, o que quer dizer que tae-i vinhos não téem mais de 13 "o de alcohol, provindo portanto de mostos que contéem apenas 19 "/o de as- sacar. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 189 A vinificação faz-se em toneis, tendo as uvas sido pizadas nos lagares de pe- dra ou de madeira, onde se acha armado o engenho de vara ou de parafuso e gaio la. — Muitos fabricam o vinho de bica aberta para fugirem ao exces ^o do travo, mas então os vinho? fracos de alcohol fi- cam molies e se alteram facilmente. Cultivam-se quasi todas as castas de uvas conhecidas nas duas outras sub-re- giões da E >treuiadura, mas as mais com- muns são: Trinca I tira, vioreto, xerez, ttrrantez, tinfa franceza, caí la, tintu- reiro, D. Branca, alinafego, boal, Fenião Pires, castiço, caatellão, preto martinho, carrasi^uenho, rabo de ovdha, arintho, etc. Segundo as informações que me facul- tou o snr. AíFonso Augu>to i^erdigão, in- tendente de pecuária do districto de Lei- ria, p')de-se dividir e^ta . ub-região vini- cula em tre* circum cripçòe-!. 1.* Circumscripção, do ^ul, compre- hendeado o< coacel los de P.niche, Óbi- dos e Caldas da Rainha, é que meao^ vinhos cultiva e cuj js vinhos se reputam mais fraco;; havendo todaviíi entre eile- alguns dignos de nota. Preço do almude 7õO reis. 2.* Circum-cripçãn, do centro, com- preiendendo oí concelhos de Alcobaça, Leiria, Batalha e Porto de Moz, é mais productiva, mas os seuí vinhos melhores que os precedentes e comprehendendo bastantes typos que .-^e podem reputar bons vinhos de pasto; não é ainda a que offerece mais geral qualificação de bon- dade. Preço do almude 850 reis. 3.'^ Circumscripção, do norte ; n'e;ta se incluem o-i concelhos serranos de Pe- drógão, Figueiró, Pederneira e Pombal; pouco productivos, a não ser o primeiro, mas cujos vinhos são mais alcoholicos, pa- lhetes, mais substanciosos, e de maior conservação. — Algun ^ d'este3 vinhos téem o formato dos vinhos de Thomar da ser- ra. Preço do almude 1-5000 reis. 2.* Sub-regiã'>j de Santarém. — As for- mações geológicas d'esta sub-regiao são bastante variadas, desde os schistos que correm do Zêzere até ás visinhanças de Thomar, em que se produzem os vinhos da serra d'este concelho; desde os qua- ternários, umas vezes areniferos, outras vezes calcareos, em que assentam os vi- nhedos do Cartaxo, de Santarém e de Torres Novas ; desde os terrenos cretá- ceos e jurássicos 4e Alhandra e de Villa Franca que pertencem ao districto de Lis- boa, até aos terrenos alluviaes do Tejo, em que se acham os vinhedos da Cha- musca, Almeirim, Benavente, etc. A vinha, aparte pequenas diíFerenças, é plantada e conduzida em todos os pon- tos quasi pelo me mo systema. Plantação do bacello á manta com fo- clio para o unhamento de bacello; ás ve- zes e^te é enterrado direito. Poda deixando uma vara, ou duas va- ras de 6 a 8 olhos e um ou dous polle- gares. Níis vinhas do campo e várzeas usam geralmente da poda galheira, deixando á cepa cinco ou seis galhos, ou nembos com dous ou três olhos em cada um. As empas são muitas e de diversos nome-!. Umaí vezes a vara de poda é cur- vada em circulo e amarrada a si me ma e á cepa. E a empa de argola. — Outras vezeí a vara fica simplesmente enlaçada sobre si, e sobre a cepa. É a empa de ro liiha, ou de envidilha. EiU muitos casos a empa é omouroada ou sustentada por um ou mais tutores, e d'e3te género ha diversas espécies, como são, a empa em palmatória, e de rabo de leão quando o mourão se enterra direito junto á cepa e sobre elle volta a vara em circulo, vindo prender ao mourão e á cepa. A empa levada, quando a vara se er- gue sobre o tutor verticalmente. A empa de lança, e de rabo de coelho, quando o tutor vertical é escorado por outro tutor obliquo e sobre ambos se vol- ta a vara n'uma direcção de 45.° até a ponta picar na terra. As castas de uvas mais conhecidas n'este districto sào : Castellão francez. Tintureiro, Preto martinho, Bastardo grosso e miúdo. Cas- tiço, Alinafeqo, Leiria, Molar grosso, Boal cachudo, Escabellado, Rabo de ovelha, Boal branco, Molim^ Dedo de Alicante, Malvasia, Tamarrz, Perrexil, Trincadei- ra, D. Branca, Alvo da Serra, Formosa, Moscatel, Olho de lebre, Alvaraço, Moli- nha^ Arintho, Fernão Pires, LabruscOf 190 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA João Noivo^ Assario, Diagalves, Sem no- me, Promissão, Camarate, Tinta com- nním, dn pé curto, do Peral, gorda Zebrainho, Mortágua^ Pexão, Preto da rosa, 2^'egrinho, Burra mosca, Oirrega besta, Xri'Z, Terrantez, Talia, Costiaha, Saibro branco. A uva não amadurece completamente senão em fins de setembro ; as vindima-* começam muitas vezes no meado d'e5te mez e até antes. Oá nioito-? aceu^ara geralmente uma riqueza saccjiariua que vae de 20 a 23 "o. Não é muito usado o desengace da uva. A pi>a faz-se em lagares de pedra ou de madeira e a fermentação do 3 mo.>to> é feita ahi mesmo ou em baldeiros. 0^ vinhos brancos fazem-se pelo processo de bica abt-rta, isto é, fermentam os mostos sem curtimenta com o bagulho. Os vinhos de melhor nota são: 1.° No concelho de Torres Nova^, que é um dos mais productivos do districto, 03 vinhos tintos da Zlbreira, da Matta, das Lapas, Ferreira, e dos valles do Al- monda e Alvorào. Os seu< preços regu- lam para os de melhor qualidade i2d500 a 45:j000 reis; — os mais inferiores de Olaia e de Alcrouchel regulam por 12-5i5' 'O reis a pipa. Os vinhos brancos mais fal- lados são: os de Br000 reis. 3." No concelho de Santarém ha duas classes de vinhos, os dos bairros, e do^ campos. Estes últimos servem quasi to- dos para caldeira. Os melhores vinhos dos bairros são os de Car leaes, Siiccorio e Monqarria^ na freguezia da Várzea. Os de Achete, Po- voa, Azoia de, baixo, e Azoia de cima. Romeira e Alcanhões. Os seus preços re- gulam de 16000 a 2:>000 reis o almude; e os dos vinhos do campo entre 300 e 600 reis. Os vinhos dos bairro'», não tão bons, existem em Valle de Fiqueira, S. Vicen- te do Paul, Pernes^ Mulhuu, Amiães, Alvãa, Casever, Vaqueiros e Valle dé Santarém. Oí vinhos do campo existem em San- tarém, Pombalinho, Azinhaga e Lhamus- ca. 4." No concelho de Thomar ha três ty- po? diversos de vinho. 1." Oj vinhos da Serra, cujos vinhagos são estabelecidos em sucalco', como os do Douro; os de Olalha e da Jance-ra são vinhos palhe- tes, delgados, aberto^, saborosos, alcoho- lico?, aromáticos, e madurou O preço d'e te? vinhos é de 30Ò000 rei<. — 2. Os vinhos de Santa Maria dos OLvaes, fabri- cadoi de feitoria, maii encorpado*, tra- vosos, muito retintos, com pouco aroma e alcoholicos, naturalmente lembram um pouco os do Cartaxo. O seu preço é de 25 a 27;>000 reis. — 3." Os vinhos menos bons de Pai/alvo, S. Silvestre, S. Mi- gw.l, Asseiceira, Alv!ob'^.ira, Gtsaes e Sabacheira, que lembram os vinhos do campo de Santarém, cujo preço é de 12 a 15;í»000 reis a pipa. Os vinhos dos outros concelhos são ge- ralmente pouco conhecidos, a não ser os de Abrantes, entre os quaes tem uma certa nomeada o de Mação, como vinho licoroso. Sabemos porém que ha em Almei- rim,, Chamusca, Eenaventi', Rio Maior, Ourem e Coruche alguns vinhateiros que fabricam óptimos vinhos de pasto, mas que geralmente não passam para fora das localidades. 3.'"' Sub-região, de Lisboa — O distri- cto de Lisboa não é dos mais vinhatei- ros do paiz, mas em compensação é tal- vez o que apresenta maior numero de variedades em vinhos, quasi todas de primeira qualidade. A cultura da vinha é executada com pequenas difFerenças segundo o py4ema seguido nas duas sub-regiões preceden- tes. Em alguns centros os vinhos são obra- doí de feitoria inteira como no Douro; mas no maior numero são fibricados de meia feitoria, passando-se a maior parte lia fermentação em balseiros de madeira e até nos toneis. As castas de uvas são quasi as mes- mas que as das sub-regiòes precedentes. E itretanto, ha algumas que apparecem com nomes novos, e que talvez não sejam JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 191 senão outras castas já conhecidas, modi- ficadas um pouco pela differença da cul- tura e do cliuia. D'e^te género são: o ramisco^ uva que fornia a ba e dos vinhos de CoUare? ; — a baUoeira, muito commum em dmara- te e Viila Franca; — bonveJro, ou mor- teira, muito abundante em Setúbal, em geral nos vinhatarias da margem do sui do Tejo; espculeiro, negra molle, morta- gua, farnento, enfarinhado, folha cU Ji- ga^Ãra, gallego dourado, esgana, muito commuas em todos os centros vinícola- da margem direita do Tejo. 1." O centro vinhateiro mais produ- ctivo d'e>ta sub-região é o de Torres Ve- dras.— Ha três principaes typos de vi- nhos n'e4e concelho : o typo Jino, que chega a ser generoso, creado geralmente em coUinas ; o typo mais ou menos bas- tão, produzido nos varsidos, e o typo li- geiro e fraco, tirado dos terrenos areno- sos e seccos. — O primeiro typo é o que se conhece em alguns mercados estran- geiros. Os vinhos de maior nomeada no com- mercio são : os de Torres, do Tarcifal, do CalvA, Rana, Ribaldrira, Dois Por- tos, Caxaria, Corvwes, Ordasqueira, Ma- ta Cães e Enxaras. Preço por decalitro 730 reis. 2.° Alemquer, é outro centro muito productivo e no qual se acham vinhos muito distinctos. Entre estes apontare mos 03 da Ribeira de Maria Ajfonso, alguns dos quaes em velhos são primo- rosos : — os vinhos de Palaios, da Coru- geira, da Murceana, de Alemqxier, Al- degavinha, Olhalvo e Carnofa, egualam, se não excedem, os vinhos de Torres Ve- dras. 3.° Vdla Franca, não é centro muito productivo, mas os seus vinhos de Cada- faes tem ju000 a lí»200 reis. 11." Carcavellos, pequeno centro, cu- jos vinhos eram considerados logo abaixo dos do Douro, e que torna hoje a recon- quistar sua antiga fama depois dos desas- tres que experimentou com o oidium. Eram tidos em grande conceito n'este grupo os vinhos de Oeiras^ do Livramen- to, de Paredes e de Galliza, além do de Carcavellos propriamente dito. 12." CoUares, é um centro vinícola excepcional. Dir-se-ia um retalho do Mi- nho incrustado na região do vinho ma- duro. É efFectivamente o vinho de Col- lares intermédio ao vinho verde e ao ma- duro, possuindo d'aquelle a frescura, a agulha, a viveza e o aroma tartrico, e d'este a suavidade e grato paladar. As adegas do Murcifal, de Almoqa- geme e do Penedo passam por terem 03 melhores vinhos de CoUares. As vinhas que produzem o melhor typo são as que estão plantadas sobre leito de argilla, para chegar ao qual é muitas ve- zcí preciso na plantação do bacello le- vantar uma camada de areia de 2 a 3 metros e mais de espessura. Do lado esquerdo do Tejo ha a citar: 13.° Setúbal, célebre sobretudo peloa 192 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA moscatéis de AzeHão; os vinho? de Pal- rrifUa e 03 do Calhar iz gozam de boa fama. 14." Lavr'id'n, centro de renome an- tigo, peloá licorosoi bastardinhos do Bar- reiro, e peloj vinhos tintos do Samouco, Baboro.iis.>imos. 15." Stixal, cujos vinhos tintos, um pouco mais carrascoes, apresentam alguns de bom uso para pasto. 16.° Almada, liaalmente, em que o typo de vinho de pasto adquire uma de- licadeza de paladar que o tornava n'ou- tro tempo muito procui-ado. Lisboa. J. I. Ferreira Lapa. CONFERENCIAS VINÍCOLAS Em seguida publicamos algumas indi- cações geraes da p limeira prelecção feita pelo sur. António Augu to dAguiar, acerca da vinicultura portuíueza. São extractadas do no.^so estimável coUega da capital, o «Diário de Noticias»: «O erudito oenologo, depois de expor a importância do as-unipto de que se trá- cia va e a obrigação em que estava de tor- nar públicos os re-Uitadoó da í>ua mist^ão, em Londres, fez vêr quanto eram prefe- ríveis ao< relatórios as coafei-encias, e prometteu dizer com desassombro certas verdade-i sobre o etado da industria e commcrcio vinícola no paiz, e nas rela- ções d"e te rom os mercador estrangeiro-, acrescentando que especialmente apro- veitaria a lição colaida na sua digres-ão a Londre^!, como commissario portuguez, na expo ição de Albert Hall. Historiou a origem d'essa expo interesses, e as suas relutancias em pres- tarem as suas amostras; bem como a ne- cessidade em que o governo se viu de comprar e organisar as collecções, sem excluir a? rolhas e caixotes! Classificados os vinhos em três quali- dades, e preparados o melhor que foi possível na precipitação com que esse trabalho foi realisado, partiu para Lon- dres. As cou-as haviam sido feitas por modo tão tuniultuario que elle mesmo, commissario do governo, chegara á gran- de ci^lade sem a menor apresentação of- ficial, de sorte que ao fim de alguns dias ainda era alli considerado pelos commis- sarios inglezes como um simples nego- ciante de vinhos, e como tal olhado com certo desdém por elles e pelos mais ne- gociantes da especialidade. Tendo, po- rém, reclamado contra eta posição in- definida, e feita a conveniente apresen- tação ao general Scott, conseguiu, com o dedicado e franco auxilio d'e-te, ser con- siderado na sua legitima qualidade. Notou a pouca importância da expo- sição, a impropriedade do local, que era nos subterrâneos de uma antiga ca a de concertos, com pouca luz e inconveniente temperatura, e, relativamente, o mau e acanhado espaço destinado á secção por- tugueza. A exposição de Albert Hall era tão abandonada do concurso publico, que," sendo Londres uma cidade de 4 milhòes de habitantes, em seis mez<'s apenas fo- ram ás caves 21:000 pessoas, ou seja 140 cada dia. Indicou as causas d'e>ta indiíferença, prova da decadência das expo-ições, e a principal era o caracter exclusivamente mercantil que se lhes dera, fazendo-se d'ellas bazares em que os géneros eram vendidos em competência com os das ca- sas de commercio; d'aqui a guerra cruel que 03 commerciantes lhes moviam, guerra que com os elementos de dinheiro e influencia de que elles em Londres dispõem assoberbava a própria imprensa, e a movia, a seu sabor, indo ella por sua vez influir na opinião, e indispor o pu- blico; a exposição de vinhos teve contra si o mese terrível mal, apesar dos es- tudos de Dumas, dos debates da acade- mia franccza, dos mil meios propostos, e applicados official e particularmente, tudo está minado do Phjlloxera, que os francezes dizem existir entre nós, era data superior á sua incursão em França. O PhjUoxe.ra conserva-se n'ura e>tado latente durante um certo periodo, depois vae voando e andando, ala-tra-se, domina e mata a cepa toda. Em Montpellier ha proprietários que de 100:000 francos de renda estão hoje reduzidos por elle a 4:000 ! Na sua viagem scientifica não podia deixar de estudar este ponto; viu os es- tragos, assistiu ás experiências, estudou CS processos e conheceu o poder e o^ pe- rigos do terrivel inimigo das vinham. Tractará, pois, de três pontos: os vinhos, as vinhas e o Phylloxera. Entra no estudo da exposição. A cave que lhe foi destinada apresentava uma temperatura de 58 graus antes de se abrir, e attingia depois de os vi^itante^ entrarem 70 a 80, thermometro Fahren- heit. Tornava depois a descer. E estas mu- danças successivas de temperatura actua- vam desfavoravelmente nos vinhos ex- postos n'aquella masmorra. A primeira provincia que apresentou foi a do Algarve, juntamente com a do Alemtejo, que lhe parece poderem estar alliadas. Os provadores acharam esse vi- nho de soífrivel preparação. Analysa as condições em que são pro- duzidos 03 vinhos do Algarve. Em pre- sença da carta geológica vê que o solo da região mais fértil está em óptimas condições; o abrigado e húmido, e pro- duz com abundância; as uvas são ex- cellentes. Tem 31 castas de uvas bran- cas c 26 tintas. Motra que a p(kla e a vinificação n'cpecies próprias de cada comarca vinhateira, e os resul- tados eguaes e positivos; d'ahi os vinhos com duração e futuro. No Algarve usa-se ao acaso a poda curta ou comprida, quando esta parte dos trabalhos viníco- las não é indiíFerente, pois á poda curta corresponde a melhor qualidade, e á comprida a maior quantidade. Com tão arbitrários elementos é diflficil produzir vinhos das mesmas qualidades. Detendo-se no exame do modo por que se faz a vinificação, condemna a ideia de que o assucar é favorável, e de que o alcohol enri |uece os vinhos; encarece-os. Os defeitos habituaes dos nossos proces- sos sobem de ponto no Algarve com a alcoholisação feita cora a aguardente de figo aromatizada de herva doce; e pela falta de caves próprias a fermentação dos vinhos não se completa. Todavia, es- tes vinhos agradaram em Londres, que, apegar de sustentar os rigore^ da escala aícoholica, gosta de vinhos alcoholisados, e tomou como aroma e sabor próprio do vinho o que era resultado do adubo. É preciso modificar o fabrico. Fallará op- portunamente d'este ponto. Faz algumas considerações com res- peito á chamada riqueza aícoholica. Os expositores ei'am 21. Apresentaram 27 amostras, em que era para sentir a au- sência de vinhos brancos; 12 dessas amostras poderam con^iderar-se boas, 9 soffriveis e 6 más ; tinham-se perdido na viagem, como acontece aos piL)tos inex- perientes; algumas iam morrer ao hos- pital, depois de terem acabado de per- der as qualidades vitaes na exposição, espécie de enfermaria internacional, onde muitos enfermavam porque já levavam em si o eflfeito das más camas, do pés- simo ar e pouca limpeza. Temos boas uvas, mas não sabemos fazer vinhos de meza nem de pasto. Não se deviam apre- sentar os vinhos sem determinar o alcohol de cada amostra. Fizeram-se 26 dosea- mentos. Mais de 18 e-tavam acima da e>cala de 26 siks. Eram todos aguarden- tados. Cá diz-se que é o alcohol natural, mas isto não c assim; só pôde dizer-se aos profanos. Os peritos inglezes susten- JOBNAL DE HORTICULTURA PRATICA 195 tam, fundados em estudos scientifàco=<, que 03 vinhos não podem exceder a 16 graus de alcohol próprio. Os doseamentos que se téem feito no paiz dão á uva do Algarve a riqueza saccharina de 24 a 30, o que corresponde a 14,55 de alcohol ou 25,36 siks. A maio- ria dos vinhos do Algarve, sendo bem fabricados, não excedem a escala alcoho- lica, este negro dragão que nos tem per- seguido: se a excedem é porque os aguai'- dentam. Excepcionalmente elle terá 32 a 33 7o ^® assucar, que se desdobra pela fermentação em 16 graus centesi- maes de alcohol. A sciencia demonstra a impossibilidade de existirem vinhos de 16 a 18 de alcohol absoluto. Nas prelecções immediatas exporá os preceitos que devem seguir-se no fabri- co, e o modo como os vinhos devem ir a Londres; dirá o que é a escala alcoholica, para que se peça só o que for rasoavel, pois essa escala foi calculada em relação aos vinhos mais fortes da França, os de Borgonha, e sem intuitos proteccionis- tas ou restrictivos; o ponto restrictivo foi determinado scientificamente.» Nos seguintes números publicaremos o resumo das outras conferencias. Oliveira Júnior. O MELHOR PÃO Julgando muito bem fundadas debaixo do ponto de vista scientifico as observa- ções publicadas n'este jornal pelo snr. George A. Wheelhouse (pag. 102), desde o momento que as analyseí chimicas, principalmente as de Mr. Millon, mos- traram que o farelo de trigo contém, além do amido, dextrina, assucar, glúten, ma- térias gordas e saes (princípios, todos assimiláveis no nosso organismo) para cima de 73 ^o, resolvi fazer uma expe- riência para saber praticamente as qua- lidades do pão manipulado segundo o processo dosnr. Wheelhou-e. Fiz-lhe ape- nas uma pequeníssima modificação que, se não me parece de todo o ponto neces- sária, é pelo menos conveniente. Tomei alguns arráteis de farinha pura e a quantidade correspondente em farelo ; peneirou-se, e o que ficou separado, que seria approximadaraente a quinta parte do peso d'aquella, mandei moel-o de modo que ficasse reduzido a pó grosso ou meio fino. Misturei-o depois com farinha pe- neirada e em seguida mandei amassar tudo junto e cozer conforme é costume, juntando-lhe o fermento e o sal corres- pondente. Como bem se pôde suppôr, o pão sahiu um tanto escuro, comtudo mais aromático e gostoso do que o fabricado com a flor de farinha e que dá um pão mais branco e geralmente mais estimado pelos consum- midoreí. Todas as pessoas da minha fa- mília, bem como as estranhas a quem o dei a provar, gostaram muito d'esta espé- cie de pão. Devo comtudo advertir que a padeira não comprehendeu bem a experiência a que eu de ejava proceder e por isso sem minha ordem peneirou novamente a fa- rinha antes de amassal-a, separando cousa de um terço da parte mais fina que ha- via. Este pão parece cora eíFeito que sa- tisfaz mais o appctite do que o branco o tem a vantagem de conservar-se mais tempo fresco. Segundo a minha opinião, para se fa- bricar este pão, seria muito conveniente seccal-o n'uma e-tufa que tivesse a tem- peratura de 50 a 60 graus, até que perdes.se cou^a de um sexto ou um oita- vo por cento de agua. Comquanto tenha naturalmente mais da 13 por °/oi sem contar a que pôde adquirir por via da atmosphera, offerece certa elasticidade que torna difficil a sua pulverisação, que comtudo se consegue por qualquer dos muitos meios conhecidos. Santiago. EsTEBAN Quet. CHRONICA HORTICOLO- agrícola A jardinagem nas cidades é um re- creio, um embeilesamento e uma neces- sidade. Uma cidade sem jardina e sem arvoredos perde todo o attractivo. Poí 196 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA muito grandiosa que seja, por muitos mo- numentos que a enriqueçam, deve ser monótona, peada, árida sobretudo. Já a mais remota antiguidade comprebendia este principio, e os jardins de Babylonia ficaram para sempre memoráveis. O agglomeramento da população mo- difica essencialmente as condições hy- gienicas. Os jardins, os arvoredos, os passeios como que restabeleiem o equi- líbrio. Sào não s(j de-tinadus a refrear os sentido^, mas a exercer uma grande influencia sobre a salubridade publica. E por isso que em Londre-», em Fariz, em Vienna, em Berlin, em todos os gran- des centros, os engenheiro-! horticolas desenvolvem os seus bello^ planos e pre- sidem á execução d'e-:plendidas obras, que fazem a admiração dos vidtante-i. Li-boa, tão favorecida da natureza, tão pittore camente situada, inundada de sol e de luz, banhada por um grande rio, sobranceira a uma grande bacia, podia ser uma das mais bellas cidade- do mundo, se entre nós houvesse mais gosto e mais enthusiasmo, se se compre- hendesse quanto é preciso collocar os grandes centros em circumstancias ade- quadas para a conservação e desenvol- vimento da sua população. A situação geagrap'iica da capital faz com que lhe sejam familiares muitos in- dividues da flora dos trópicos e é com admi- ração que 03 estrangeiros vêem alli des- envolver-se exuberantemente ao ar li- vre Palmeiras, Bananeiras e outras plan- tas. Todavia, tantas circumstancias favo- ráveis não técm sido aproveitadas, e Lis- boa ainda e-000 reis de commissão em Lisboa. Mas que se entende por tempero e preparo? O vinho não estava tempera- do e preparado? Não : é preciso aguar- dentar e deitar geropiga. Portugal tem um mercado e uma pro- ducção restricta ; mas devemos lembrar- nos de que os nossos irmãos do Brazil já começam a apreciar os vinhos fra- cos, pois já se dá o facto de se vender para lá uma caixa de vinho de CoUares por 10;§000 reis e uma de vinho do Por- to por 9;>000 reis, e que se nós fizer- mos vinhos fracos chegar-se-ha a au- gmentar alli o consummo. E tão restricto é, disse, o mercado e a producção, que, se o producto por qual- quer circumstancia duplica ou triplica, ficamos todos a chorar. Emquanto ao mercado, se chegar ao Tejo uma esquadra ingleza, é isso bas- tante para que os ovos e as gallinhas estejam caríssimos, e o mesmo aconte- ce ao vinho. Passou a fallar dos typos de vinhos e disse que só no Algarve havia os vinhos chamados de Olhão, de Moncarapacho e da Fuzeta. Que tanto estes como os de- mais tvpos dos nossos vinhos se téem es- tabelecido de um modo extravagante ou pelo gosto ou pela analyse. Como chimico queria provar que a chimica é insufficiente n'esta matéria. Pelo gosto disse que também não era fácil estabelecer uma classificação, por- 216 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA quanto o ^osto não tem memoria, e co- mo prova leu um trcclio de um artigo publicado no a Livre de la Ferme» de Joi- gneaux. Como em Portuf^al se usa e mesmo abusa da confrontação dos nossos typos com os fraucczes, achando-se sempre um dos no-sos para assimilhar a outro fran- cez, concluiu que ou o gosto cm Portu- gal adquirira memoria, ou nós o temos muito estragado. Para demonstrar não poder a cliimica tomar-se como base de uma classifica- ção, apresentou o exemplo de que ana- lysando-se dous vinhos de origem muito diversa p(')de-se encontrar n'elles a mes- ma força alcoholica, corante, salina, etc, o chamando-se o próprio moço do labo- ratório para que provasse os vinhos, apesar de a chimica dizer que elles ti- nham a mesma composição, o criado dizia que eram inteiramente differen- tes. Isto explica-se pelo phenomeno, que em chimica se chama isomeria, que con- siste em dous corpos da mesma nature- za ou da mesma composição apresenta- rem propriedades diversas, como vemos no carvão e no diamante, que sendo um o outro formados de carbono, comtudo ninguém os confundirá ; pois no vinho Buccede o mesmo, ha o vinho carvão e o vinho diamante. O nosso commercio não poderá alar- gar-se emquanto não produzirmos vi- nhos uniformes, distribuídos em regiões pelo paiz : o Algarve o talvez o Alem- tejo poderiam apresentar um só typo, que se denominaria «vinho do Sul». Não poderemos dizer que temos vi- nhos puros, emquanto succeder o que quasi sempre se dá com elles. Manda um amigo a outro um bar- ril do mais escolhido dos seus vinhos; a chegada do barril a casa é um acon- tecimento ; toda a família se mette á faina : lavam-sc garrafas, preparam-se rolhas, engarrafa-se caidadosamente o vinho e guarda-se na fras queira para dia solemne em que haja perua e lam- preia de ovos; chega o dia da festa, apparecem na meza as garrafas reser- vadas. O dono da casa faz o elogio pré- vio do vinho da esmerada lavra do seu amigo ; todos se levantam de copo em punho para brindar ; quando a mão vae a levar o copo á bocca, pára como que instinctivamente, e no rosto de to- dos mostra-se um signal de desagra- do; o vinho estava vinagre. O dono da casa desfaz -se em desculpas^ um imprudente diz que o vinho azedara porque estava mal rolhado, a familia contém-se ; um outro, querendo arro- gar-se ares de sábio, censura as rolhas que são más, porque mandamos a me- lhor cortiça para Inglaterra; o doutor, que sempre é convidado para estas fes- tas, faz um discurso sobre a hygiene; por fim para desfazer a má impressão todos se riem, menos o dono da casa que fica sério, ou quando muito solta um riso amarei lo. A dona da casa manda o vinho para a vinagreira ; mas fatalidade ! elle vae estragar o vinagre, e passados quinze dias ou mais, lá vem salada para a me- sa temperada com vinagre doco. CHRONIGA HORTICOLO-AGRIGOLA Esto anno floresceu no Jardim Bo- tânico do Coimbra a Fourcroya rigida Haw. (Ar/ave rigida Mill.), oriunda do México, Vera Cruz. — Segundo uma obra intitulada «Es- tatística de França comparada com a dos diversos paizes da Europa», publicada recentemente pelo snr. Maurício Block, a producção do trigo tem augmentado desde o principio do século, e mostra-se que a producção actual é do 7,30 grãos por 1, ao passo quo nos primeiros 15 an- nos do século presente a producção era de 5 e meio por 1. A producção das di- versas nações é a seguinte : A França varia entre 80 a 120 mi- lhões de hectolitros. Estados-Unidos . 97.720:000 hectolitros Rússia 80.000:000 » llcspanha 66.000:000 » Austria-IIungria 39.500:000 » Inglaterra . .\ . . 37.573:000 » Itália 35.400:000 » Prússia 28.287:125 » JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 217 — Mr. Durand, pharmaceutico em Blois, França, acaba de publicar um descobrimento que fez para a conserva- ção dos ovos, de modo que, segundo elle affirma, podem estar frescos durante um anno. O processo é simples. Mette-se em um recipiente de barro uma dissolução de silicato de potassa, addicionada de agua e que pese de 25 a 30 graus no pesa-acidos concentrado. Como a disso- lução tende a concentrar-se pela evapo- ração, ha que accrescentar-lhe de quan- do em quando uma porção de agua. Poem-se os ovos frescos n'esta dissolu- ção e deixam-se alli alguns instantes. Tiram-se em seguida um por um e col- locam-se em uma meza para secca- rem. Succede algumas vezes que o liquido viscoso do silicato corre para a parte in- ferior do ovo e forma uma gota que o pega á meza, de tal modo que não se pô- de tirar sem o quebrar. Para evitar isto basta collocar os ovos sobre folhas de papel, que se rasgam logo ao tirar aquelles. A dessecação do silicato não demanda mais de 24 horas. Os ovos preparados na véspera podem já ser ar- mazenados no dia seguinte. Os ovos pre- parados d' este modo conservam-se per- feitamente, segundo Mr. Durand. O silicato de potassa fecha completa- mente todos os poros da casca do ovo, e evita que o ar penetre no interior; além d'isso, o silicato tem qualidades anti-fermentaveis pronunciadas. Segun- do Mr. Durand, os ovos preparados as- sim conservam-se armazenados duran- te um anno, tão frescos como no primei- ro dia. — O «New- York Tribune», de que é redactor um notável cultivador de ar- vores fructiferas, dá as seguintes regras para quem quizer cultival-as proveito- samente para o commercio. 1.* — Não empregar plantas anãs; 2.^ — Nunca plantar arvores que te- nham mais de dous annos, preferindo, sendo possível, as de um anno, mas vi- gorosas ; 3.* — Não plantar menos de 50 exem- plares de cada variedade ; 4.^ — Resumir a lista das variedades cultivadas para o commercio a seis ou ainda a menos. — O reverendo George Meares Drou- ght, n'uma carta que dirigiu ao «Times», datada de Irlanda, assignalava um facto muito curioso. Ao passo que todas as casas dos seus visinhos eram povoadas por grande nu- mero de moscas, a sua era privilegiada e raras vezes se lá via um d'estes entes alados, verdadeiros importunos da hu- manidade. Na sua qualidade de presbytero po- der-se-hia imaginar que as moscas o res- peitavam, que lhe tributavam a venera- ção que merecem os ministros de Christo. Mas não! O reverendo George tinha á janella uma caixa com Geraniums e Calceola- rias. Aconteceu, porém, que por uma circumstancia qualquer teve de retirar da janella as plantas ; e que havia de succeder ? No dia seguinte a sua sala de jantar era a morada de centenares de indivíduos — da Musca domestica, bem entendido — que não o deixavam soce- gar. D'aqui se conclue que as Calceólarias e os Geraniums, se não desempenham o papel de mata-moscas, desempenham ou- tro não menos apreciável : o de afugen- ta moscas. Não garantimos a infallibilidade do remédio, mas é de crer que outras ob- servações venham corroborar a sua effi- cacia ou desmentil-a. — Em Inglaterra ha frequentemente processos por parte dos agricultores con- tra os vendedores de sementes, que nem sempre são tão escrupulosos como im- portava que o fossem com as ordens que se lhes commette. O «Gardener's Record» refere que um importante cultivador de hortaliças para o mercado havia recebido indemnisação de uma firma muito acreditada de Du- blin, em consequência de ter pedido se- mente de Couve jlõr têmpora de Londres, recebendo em seu logar outra colhida na Hollanda, do que resultaram graves pre- juízos ao appellante. Estas fraudes, que tão frequentes são no mundo hortícola, deveriam ser puni- das como na verdade o merecem. 218 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA — Fomos a som.ana passada honrados com a visita d'um cavalheiro inglez, no- tável na sciencia, que veio a Portugal em busca d'algumas plantas bolbosas, especialidade a que dedica principal- mente a sua attenção. Este cavalheiro deve ser conhecido de muitos dos nossos leitores, porque o seu nome firma frequentes vezes artigos na «Gardcners Chronicle» eno «Garden)),e aqui o apresentamos — Mr. George Maw. Como dissemos mais acima, Mr. Maw interessa-se particularmente pelas plan- tas bolbosas, e está procedendo a um es- tudo muito interessante do género Cro- cxis. Nós felicitamo-nos por ter tido occa- siSo de travar conhecimento pessoal com um cavalheiro tão illustrado, com cujas relações temos muito a aproveitar, e de- sejáramos que a sua estada entre nós não tivesse sido tão precipitada, para melhor poder apreciar as riquezas da nossa Flora. — Este anno plantaram-se 178:000 arvores nas avenidas e boulevards da grande capital da França. Muitas d'ellas foram substituir as que tinham morrido durante o inverno. Se n'isso não ha indiscrição, ousare- mos perguntar que cifra attingiram as que em egual tempo se plantaram no Porto? — As Begónias tuberculosas, que são muito mais rústicas que as outras, tive- ram entre nós a vida da Rosa, que des- abrocha ao romper da aurora para se desfolhar á chegada do occaso. Nos catálogos do snr. Marques Lou- reiro vimos ha dous annos enumeradas algumas variedades, que desappareceram das suas culturas. Morreriam, ou não as julgaria o horticultor portuense dignas de figurar nas suas coUecçSes? Opta- mos pelo primeiro alvitre e n'essa hy- potheso aconselhal-o-hiamos a que fizes- se novos ensaios, convencidos de que os resultados não viriam tolher as nossas esperanças. Em agosto podiam ser vistas as se- guintes variedades em plena florescên- cia ao ar livre, nas rochas artificiaes dos jardins de Kew, em Inglaterra, paiz muito mais frio do que o nosso : Begó- nia Sedenij B. Vesuvitis, B. Chelsoni, B. dr. Masters, B. Cornélia e B, En- sign. Em vista do resultado obtido em In- glaterra desejáramos que algumas d'es- tas plantas viessem ornar os nossos jar- dins. — Logo que possamos dispor d'espa- ço transcreveremos para as nossas co- lumnas um interessante artigo publica- do no «Jornal do Porto» pelo snr. An- tónio Girão, sobre a influencia das ar- vores na formação das chuvas. Desde já solicitamos a devida vénia ao estimável coUega. — O introductor do Eucalyptus glohu' lus, na Europa, Mr. Ramel, dirigiu ul- timamente, de Hussein dey (Argélia), uma carta ao snr. Ed. André, da qual passamos a transcrever alguns períodos : O Eucalyptus colossm, ou Karry da Austrá- lia Occidental, é uma arvore de primeira gran- deza (400 pés), com um caule proporcionado. E uma bella arvore de folhagem esplendida e muito própria para avenidas. No seu paiz cresce nos terrenos frescos, mas os indivíduos plantados ou semeados em terre- no secco no Jardim Botânico de Melbourne não téem vivido peor. Aqui acontece outro tanto. É muito admirado e realmente merece-o. Depois de me ter sido dada esta erpecie sob o nome de E. colossea, Mueller chamou-lhe na «Flora Australiensis« E. diversicolor ; todavia conservo-lhe o nome primitivo, porque tem mais analogia com as suas dimensões. Os inglezcs gostam muito d'este paiz por cau- sa da amenidade dos seus invernos, c alguns ha que estào edificando villas esplendidas. O meu terreno, que tem oito hectares, pres- ta-se muito para se fazer um parque para os convalescentes passarem o inverno. Aconselhando em 1859 Mr. Alphonse Karr, que cu conhecia simplesmente como romancis- ta e como amador de plantas, a semear o Eu- calyptus glohuhts, e outras espécies que lhe man- dava, dizia-lhe que um dia se viria a reconhe- cer que as arvores produzidas por aquellas se- mentes prestariam maiores serviços aos doen- tes de peito cm primeiro e mesmo em segundo grau, do que todas as faculdades de medicina reunidas. Ora, escrevendo na mesma carta esta pro- phccia, que se acha em parte realisada, occor- rc-me agora á memoria: Que valiosas sommas nào se poderiam ganhar só por este facto?! A plantação que fiz em 1873 tem já. as pro- porções d'um bosqucsinho, e na próxima esta- ção poder-se-hão abrir as ruas para formar um parque — o bosque de Boulogne em minia- tura. Todos os proprietários, tanto grandes como pequenos, fazem agora as suas próprias sémen- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 219 teiras, e entre elles figura á frente de todos Mr. Cordier, d'El Alia, que foi o primeiro que se entregou a esta cultura. Amador distincto, viu logo a importância que tinha a introducção da planta a que nos referi- mos. As suas observações são justas, os seus al- garismos exactos, e é elle que possue os melhores individuos nas numerosas plantações que tem realisado nas suas propriedades. Depois de Mr. Cordier segue- se-lhe Mr. Trot- tier, que se dedicou do coração á propaganda do E. globiilus. Mr. Arlès Dufour, um dos nossos maiores proprietários, também faz todos os annos gran- des plantações d'esta arvore. A sociedade do Barrage dei Habra, plantou durante os dous últimos annos 100:000 Eitca- li/phis, nas condições menos favoráveis possí- veis, e ainda assim salvaram-se 50 a 70 por cento, que téem excellente aspecto. — «Les Roclies» é o titulo de um li- vro que nos foi oíFerecido e de que é au- ctor Mr. Edouard Janettaz. E um guia prático destinado para o uso dos engenheiros, geólogos, minera- logistas e agrónomos. Forma um volume de 285 paginas e contém 39 vinhetas illustrativas do texto. O auctor descreve com proficiência os elementos que constituem as diversas ro- chas e apresenta um systema simples para se poderem determinar. Editado por Mr. J. Rothschild, é des- necessário dizer-se que é uma edição ele- gante. — Recebemos o «Relatório apresenta- do á junta geral do districto de Faro na sessão ordinária de 1875» pelo conselhei- ro governador civil José de Beires. Este volumoso livro, estampado niti- damente na imprensa académica de Coim- bra, é cheio de curiosos apontamentos so- bre os diversos ramos de administração publica n'aquelle districto. E um traba- lho que honra o snr. José de Beires, não só pelo desenvolvimento como pelo bem elaborado das matérias. Se todos 03 districtos apresentassem semilhantes relatórios, poder-se-hia d'es- te modo formar todos os annos uma ideia muito approximada do estado da administração do paiz. No livro de que vimos fallando acham- se incluidos os relatórios do agrónomo (Alexandre de Sousa Figueiredo) e do intendente de pecuária (Domingues Ro- drigues Annes Baganha). Tanto um co- mo outro cavalheiro denotam intelligen- te assiduidade e grande desejo de co- operar para o desenvolvimento agrícola do Algarve. — Na Austrália tem-se manifestado um novo flagello que destroe a colheita das laranjas. E uma borboleta a que a sciencia dá o nome de Ophideres Fulo- nia, que com o auxilio da sua trompa perfura os fructos e absorve-lhes todo o sueco. Pouco tempo depois cahem. — «Breves apuntes sobre el cultivo en nuestra localidad de las Begónias, Coleus, Camellias, Caladium y plantas crasas», é o titulo de um opúsculo que nos foi offerecido pelo nosso collabora- dor, em Cadiz, o snr. Francisco Ghersi. A horticultura hespanhola, que come- ça a desenvolver-se, prestou o snr. Gher- si um bom serviço com a sua publica- ção. — Vae-se constituir em Londres um novo club destinado principalmente pa- ra a reunião das pessoas que se occupam de horticultura. Installar-se-ha n'uma casa próxima de Charing Cross, onde se encontrará todo o conforto e as commo- didades próprias d 'uma assembleia d'es- te género. Este club receberá como designação o nome «Loudon», célebre botânico in- glez, antigo redactor do «Gardeners' Magazine», e auctor de vários trabalhos importantes, taes como «Encyclopedy of trees» e «Arboretum and Fruticetum». Entre os fundadores do «Loudon», en- contramos o rev. S. R. Hole, dr. Hogg, dr. Masters, Harry Y. Veitch, M. W. A. Lindsay, James Culbush, Ed. Lee, Ch. Turner, Th. Laxton e outros ho- mens notáveis na horticultura. Ora em Portugal, onde já ha uma certa quantidade de pessoas que se oc- cupam d'estas cousas, não se ha-de fun- dar uma sociedade idêntica?.. — Na sessão de 2 d'abril, da Socie- dade d'Acclimação, Mr. Vasin chamou a attenção da sociedade para um processo de cultura da Tetragonia expansa (Espi- nafre da Nova Zelândia), que, segundo a sua opinião, produz os mais excellentes resultados. A Tetragonia, que pôde ser comparada aos melhores Espinafres, diz elle, tem a grande vantagem de principiar a pro- 220 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA duzir, sob o clima de Pariz, desde 10 de junho em diante, e a colheita conti- nua ininterrompidamcnte ató ao princi- pio das neves, sem que a planta espigue. É pois para admirar que a Tetrago- ília não seja mais frequente nas hortas. É sabido que o Espinafre apenas sabi- do da terra, no verão, espiga, e apesar das repetidas sementeiras a sua cultura é sempre difficil nos sitios muito quen- .tes. É pelo contrário, durante os gran- des calores, que os ramos da Tetragonia crescem com grande rapidez e emittem folhas em mais abundância. O grave inconveniente que muitos lhe téem encontrado, é as sementes ger- minarem mal e com desegualdade. Muir tas pessoas que compraram sementes de Tetragonia, persuadiram-se que foram enganadas na sua qualidade, e renun- ciaram a esta cultura, que Mr. Varin considera como uma das mais vantajo- sas. Para obviar a este inconveniente in- dica o meio a que tem recorrido, e que deu sempre os melhores resultados. Quando as sementes estão maduras, estratifica-as em areia e semeia-as em fevereiro, n'uma semeadeira, que collo- ca sob as vidraças d'um abrigo. D'este modo quasi todas as sementes germinam e são plantadas no seu logar logo que não haja neves a temer. Um outro processo ainda mais sim- ples : consiste em confiar á terra as se- mentes n'uma semeadeira, cheia metade de terriço e outra metade de areia ; es- ta semeadeira colloca-se assim n'uma es- tufa temperada, dando-lhe de tempos a tempos uma leve rega. Quando chega o mez de março todas as sementes germinam, quasi sem faltar uma. A Tetragonia expansa, de que já fal- íamos n'este jornal, é uma excellente planta horticola, e seria muito para de- sejar que ella se espalhasse e desenvol- vesse mais, attendendo não só ás suas cxcellentes qualidades anti-escorbuticas, mas também ao tempo em que produz, que geralmente não ó muito abundante cm legumes. — Agradecemos a remessa do catalo- go especial de bolbos, e varias plantas annuaes do Horto Portuense. — A Real Sociedade de Horticultura de Bruxellas annuncia que organisará n'aquella capital, com o auxilio do go- verno, uma grande exposição Interna- cional. A sociedade faz um appello a todos os horticultores para esta festa flo- ral, e promptifica-se a correr com to- das as despezas de transporte pelos ca- minhos de ferro belgas. A exposição está annunciada para fins do próximo abril. — Recebemos de Hespanha o prospe- cto para a reimpressão do «Tratado de Farmácia Operatória», do snr. dr. D. Raimundo Fors. Esta obra viu a luz da publicidade em 1841, e a segunda edição não preen- cheria decerto o seu fim se não fosse revista e augmentada consideravelmente com todas as descobertas que a sciencia tem feito no decorrer dos últimos annos. Incumbiu-se d'e3se trabalho o snr. D. Federico Prats Gran, de Barcelona, e brevemente será distribuido o primeiro fasciculo. Falharemos opportunamente. A obra formará dous volumes de 2:000 paginas, com figuras intercaladas no tex- to. Impressão em caracteres novos, e em papel superior. — O «Bulletin d'Arboriculture», de dezembro do anno passado, vem acom- panhado de uma bella estampa repre- sentando a pêra Clapp's favourite, que, segundo Mr. F. Burvenich e as pessoas que a provaram, é um fructo de primei- ra qualidade. Esta pêra é de tamanho mais que me- diano, oval-pyriforme e no género da Bon chrétien William. Amadurece, na Bélgica, dos fins de agosto a princípios de setembro. — Um dia Jorge II, d'Inglaterra, chamou os seus jardineiros de Kew e Richmond e ordenou-lhes que, durante o verão, franqueassem os jardins ao pu- blico. Os jardineiros, porque não queriam ter trabalho, objectaram ao monarcha que o povo não poupava as flores. Ah ! ó isso, exclamou Jorge. E certo então que o meu povo gosta de flores? Pois bem, n'esse caso, plantem mais. Foz do Douro. Duarte de Oliveira, Júnior. JOBNAL DE HORTICULTURA PRATICA 221 PÊRA DUQUEZA DE AIÍGOULEME Ahi fica estampada, para memoria dos presentes e vindouros, a formosa pêra Duqueza de Angoulême. Não cuidem porém que ainda assim ella se mostre ahi em todo o seu esplen- dor; isto, como vulgarmente se diz, é a amostra do jpanno. Temos visto alguns exemplares com um terço mais de grandeza, e, pelo cre- dito que ligamos ao fallecido Mr. An- Fig. 37 — Pêra duqueza de Angoulême. dré Leroy, devemos crer que muitas ve- zes esta gravura representará apenas metade do seu volume. E todos 03 outros predicados, que a caracterisam, concorrerão para a collo- car entre os fructos de primeira ordem na cathegoria dos que são destinados ás nossas sobremesas? Respondo que sim cathegoricamente. Não pôde deixar de ser considerada co- Vol. VI. — 1875. cmo deliciosa uma pêra, cuja polpa, bran- a de neve, é fina, aquosa, isenta de pedras e que se derrete na bocca, com sueco abundantíssimo, muito assucara- do, vinoso e com um aroma exquisito. A sua forma ó ovóide, ligeiramente cylindrica e muito ameigada, ou ovóide regular, mas muito ventruda na base. A casca é espessa, rugosa, amarella es- verdeada, ponteada e marbrada de par- N." 12 — Dezembro. 222 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA do, manchada de vorde escuro, e algu- mas, mas raras vezes, tinta de rosa des- maiada na parte exposta ao sol. Deven- do accrescentar-se a todos estes predica- dos o de uma fertilidade prodigiosa. Nao será desagradável aos amadores o conhecerem a historia d'e3te bello fru- cto e por isso aqui lh'a damos, resumin- do-a dos longos detalhes com que a des- creve o fallecido Mr. André Leroy no seu «Diccionario de Pomologia». Não se sabe ao certo a epocha do seu nascimento; o pé primitivo appareceu por acaso no jardim fructifero da quin- ta dos Eparonnais, dependente da com- muna de Querré, junto de Champigné, pertencente ao conde Germain, da flo- resta d'Armaillé, e morreu em 1863 com a apparencia de uma edade secu- lar. Foi em 1809 que Anne-Pierre Au- dusson, horticultor em Angers (falleci- do em 3 de fevereiro de 1845) a desco- briu no local indicado, e surprendido da belleza e volume de seus fructos, obteve alguns garfos para a multiplicar c e :palhar, e assim o fez debaixo do no- me de Pêra des EiJaronnais, denomina- ção que conservou até 1820. Mas n'este anno aquelle horticultor offereceu á du- queza d'Angoulême um açafate d'e3ta3 magnificas peras com a supplica de ser auctorisado a propagar esta variedade com o nome d'aquella augusta princeza. O deferimento foi concebido nos seguin- tes termos : Pariz 16 de outubro de 1820. Ao snr. Auãusson, pae. Senhor, sua alteza real a snr." duqueza de Anjíoulême recebeu o açafate de peras que lho enviastes. E com prazer vos anuuncio que esta princeza vos concede a auctorisaçào pedida de dar a esta espécie de pêra o nome de duqueza de Augoulême. Tenho a honra, etc. (Assignado) Th. Charlet. P. S. Acerescentarei que a princeza achou excellentes as vossas peras. Com taes informações quem deixará de cultivar no seu jardim fructifero es- ta magnifica variedade? Procurem-n'a em casa do proprietário d'este jornal, o snr. J. Marques Lourei- ro, que não costuma vender gato poi' le- bre, e tem muito bons exemplares. Camillo Auueliano. A VIIICULTURA PORTUGUEZA ' VIII Chegamos á ultima região vinicola do continente do reino, a do Algarve, que é a menos productiva em vinhos, e tal- vez uma das mais atrasadas na boa arte da vinificação. E comtudo, depois da re- gião do Douro, não vejo nenhum canto do paiz que, como este, podésse produzir vinhos mais finos e generosos além de muita variedade em vinhos medianos de pasto. Com effeito, pela sua posição geo- graphica, pelo abrigo da alta cordilhei- ra que a defendo pelo lado do norte, pela sua exposição sul, e pela proximi- dade do Oceano, é o Algarve uma re- gião temperada, quente, propicia á boa maturação da uva e á naturalisação das castas preciosas que exigem maior grau de caloração no fructo. Como 80 deduz do relatório do snr. (1) Vide J. II. ?., vol. VI, pag. 188. governador civil, respectivo ao anno de 1873, ha no Algarve uma região de schistos que coroam a serra, e que re- produzem 03 da região alcantilada do Douro. Ha uma região de granito syenitico imitante ao da região do Dão, do Fun- dão, do alto Mondego, de Évora, Re- dondo, etc. N'esta região se acham os vinhos de Monchique e de Algezur. Ha outra região de terrenos secundá- rios e terciários, argillo-calcareos como 03 da Bairrada, e do Cartaxo, e areno- sos como 03 do Lavradio. No3 primei- ros estão os vinhos de Tavira, nos se- gundos 03 de Faro c Lagos. Variedades de terrenos como os que n'outras regiões produzem vinhos superiores não faltam pois ao Algarve, e sobretudo isto um melhor clima para o vinho fino. Com estes dons naturaes, desde que esta pro- JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 223 vincia queira deveras ser vinliateira, sel-o-ha, e será das primeiras do reino. No que vou dizer sobre vinhas e vi- nhos do Algarve, será extrahido do muito noticioso e escellente relatório da sociedade agrícola d'esta provinda, secção Vinhas e Oliveiras, elaborado pelo snr. Gerardo Augusto Pery. Cultivam-se no Algarve as mesmas castas de uvas da Extremadura e do Alemtejo. Sobe a 31 o numero das castas brancas e a 26 o das castas pre- tas. Entre as primeiras apparecem al- guns nomes novos, como são : a tene- deira, ahninhaca, alvilha, hugarrem, he- ha, godilho pérola, sete espigas, valle de Barreiros e leira. Entre as segundas ap- parecem também alguns nomes desco- nhecidos nas outras regiões, como são : hocalrão, caroucha, languedor, citima e hreal. Mais uma vez faremos sentir a neces- sidade de assentar na classificação e sy- nonymia das nossas castas de uvas. E preciso fundar uma vinha-escóla em que se plantem todas as castas de uvas do paiz que tenham um nome vulgar dif- ferente. Estudal-as depois para se saber se com effeito são variedades ou castas differentes, ou se muitas d'ellas serão a mesma casta com diversa designação conforme as regiões em que se cultivam. A plantação faz-se á manta ou a co- vacho. O custo da plantação vae de reis 15;5000 a 18?>000 por milheiro. Praticam-se as operações : da escava ou alumia, logo depois da vindima; a cava a monte em março, e a redra em abril. A poda que se faz em dezembro até fevereiro é ou rasa, similhante á galhei- ra, ou de vara comprida, a qual se em- pa em rodrigão. Esta ultima poda é usada nas cepas vigorosas. — Estrumam as vinhas com a seba, que corresponde ao rapilho do Minho, plantas marinhas tiradas da praia. Também usam do es- trume de estabulo, e de algum guano. — A vindima faz-se em setembro. O grangeio de uma vinha calcula-se em 2?$!000 a 3?5;000 reis por milheiro ; o qual rende de 200 a 300 litros de vi- nho, e nos terrenos fortes chega a pro- duzir uma pipa de 480 litros. A vinificação no Algarve segue um pouco o systema do Alemtejo. Desenga- ça-se toda a uva e piza-se mal. Mas não se usa das talhas geralmente. A fermen- tação, ou é feita no lagar ou em balsei- ros ; ás vezes é feita nos toneis com mos- tos de bica aberta. Ao trasfegar o vi- nho recebe 2 a 3 canadas de aguardente por pipa de 25 almudes. D'estes defeitos de fabrico resulta que os vinhos sahem geralmente maduros de mais, amollecidos e de difficil conservação. — Os que em- pregam maior adubação alcoholica lo- gram fazer vinhos, que com o tempo vêem á condição de generosos e alguns tenho provado que achei muito bons. Os concelhos, em que a cultura da vi- nha está mais desenvolvida, são : Tavi- ra, Olhão, Lagoa, Vi lia Nova de Por- timão, Faro, Castro Marim, Villa Real de Santo António, e Albufeira. Em Loulé, Algezur, Monchique, e Lagos, o oidium destruiu a maior parte das vinhas, que vão agora sendo pouco a pouco restabelecidas. Os vinhos de maior nomeada são : os da Fuzeta, no concelho de Tavira ; os de Quelfes, Pechão e Moncarapacho, no concelho de Olhão ; os de Lagoa, e os de Portimão. A producção do vinho em 1872 foi de 256:575 litros, pertencendo a maior parte aos concelhos de Tavira, Lagoa e Olhão. A exportação de vinhos do Algarve para outras terras do reino foi em 1872 de 59:559 litros, no valor de 3:G62r^80 reis. O porto de maior ex- portação é Portimão. Para concluir este rápido bosquejo da vinicultura portugueza só me falta apre- sentar o pouco que pude colligir da vi- nicultura da Madeira. Não são muitas as castas de uvas cul- tivadas n'esta ilha, pois que as mais afamadas não passam de verdelho, prin- cipal vidonho, tinta, malvasia, boal, ser- cial e moscatel. Mas o clima e o solo es- peciaes da Madeira levantam estas uvas ao mais fino grau de perfeição. A plantação e grangeio das vinhas nada tem de particular além do que se pratica no continente. A vindima tem logar em fins de setembro e principies de outubro. Os mostos são geralmente a sua graduação varia desde 23 ricos 224 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA a 35 por cento de assucar. Escolhem a uva para o vinho de 1.* qualidade com extremo cuidado. O fabrico é de feito- ria inteira, ou de meia feitoria, conforme o estado da uva. Todos os vinhos da Ma- deira levam por vezes adubaçiío alcoho- lica que se pôde calcular era uma ad- dição de 4 a 7 por 100. A estufagem é muito usada, e a ella devem em grande parte os vinhos da Madeira envelhece- rem cedo e apresentarem o aroma e o toque final que os distingue de todos os outros vinhos portuguezes. Os melhores vinhos da Madeira são produzidos a meia encosta do sul da ilha. Citam-se os vinhos da Torre, Sarai- va, Quinta do Leme, Preces e da Ter- ra Chã, como sendo dos mais precio- sos. Em geral téem grande fama os vinhos da Camará dos Lobos, do Paul, do Jar- dim e Fajan dos Padres. Os preços re- gulam de 6;>000 a 8^000 reis o al- mude. Nos Açores fabricam-se vinhos, al- guns dos quaes téem boa fama. As ilhas do Pico, Faial, S. Jorge e Graciosa pro- duzem 03 melhores vinhos sobre os bis- coitos, ou lavas esponjosas, em que se abrem covas e se deposita terra tirada d'outro3 pontos. As lavas levantadas são armadas em muros que defendem as vi- nhas do Ímpeto dos ventos. A ilha do Pico é a mais productiva, e do Faial é que se faz quasi toda a exportação. Concluimos esta rápida revista, que não teve outro fim senão fazer entrever a nossa grande riqueza em typos de vi- nhos e mostrar a necessidade de se es- tudarem, para se apresentarem bem e chegarem ao valor remunerativo que podem dar aos seus productores. J. I. Ferreira Lapa. APHIS PÉRSICA O Aphis ])ersic(B é um dos mais tcr- riveis inimigos dos Pecegueiros, e a sua prodigiosa multiplicação torna-o um ver- dadeiro flagello. Tem-se ensaiado vários processos para a sua destruição, como fumigações de tabaco, de cal, de carvão, de alcatrão, etc. ; porém estes meios téem sido até hoje completamente infructife- ros ; o pequeno animal, zombando de tu- do, continua impassível a sua missão des- truidora. O snr. Jamiesson indica um raethodo, que nos parece fácil e seguro, para a destruição d'c.ste insecto. Ouçamos o que este senhor diz a respeito do seu pro- cesso : o Primeiro que tudo, principia-se por lavar com um regador a arvore e suas folhas. Feito isto pcrcorrem-se os braços e ramos com uma bexiga, á qual deve estar adaptado um tubo terminando por uma cabeça chata, cheia de orifícios co- mo o ralo d'ura regador, havendo no re- ferido tubo uma chave ou torneira para graduar a sahida do gaz hydrogenio de que a bexiga deve ser cheia; esse gaz póde-se obter de qualquer candieiro de illunii nação das ruas ou das lojas. Por Cíita fiirma, á medida que se vae per- correndo com este apparelho os ramos da arvore, vae-se graduando a sahida do gaz. O carbonato de hydrogenio mata ins- tantaneamente os pulgões sem damnifi- carem nada a arvore.» Objectarão decerto os habitantes do campo, que este processo será muito bom unicamente para as cidades ou villas onde haja gaz de illuminação. E ainda Mr. Jamiesson que lhes vae responder d'um modo que nos parece muito satis- factorio : «Nas aldeias ou villas onde não hou- ver gaz, toma-se uma bilha de barro en- vernisado, na bocca da qual se adapta bem uma rolha de cortiça atravessada por um tubo de cachimbo. Feito isto deita-se na bilha uma pouca de limalha de ferro e alguns copos d'agua ; quando nos quizermos servir do apparelho, le- vamol-o para junto da arvore, e addi- cionamos á agua um pouco de acido sul- phurico, immediatamente ao que se ar- rolha bem a vasilha. A agua decompõe-se, a bilha aquece, e íí medida que o hydrogenio vae sahin- do pcrcorre-sc a vasilha pelos ramos da arvore. Oa pulgões morrem logo asphi- JOENAL DE HORTICULTURA PRATICA 225 xiados. O gaz não prejudica a planta fazendo-se a operação de dia, mas sendo feita de noute pode ella soíFrer.» Parece-nos que ninguém deixará de empregar este methodo para destruir o flagello d' uma arvore tão preciosa como é o Pecegueiro. A sua preparação e ap- plicação é extremamente fácil e não of- ferece os inconvenientes de muitos ou- tros methodos, como por exemplo, o do emprego de assucar e arsénico, que mui- tos auctores recommendam, e que nós regeitamos pelos accidentes a que ficam expostas as crianças e animaes que fo- rem ao jardim. Além d'isso, na occasião da maduração dos fructos este processo seria duplamente perigoso, pois que esta substancia toxica cahindo nos pecegos adhere facilmente a elles pelo cotão de que estão cobertos. Finalmente damos a preferencia por todos os motivos ao processo Jamiesson e convidamos os leitores a applical-o ao prolífico Aphis persicce. A. J. DE Oliveira e Silva. GONFEREIÍCIAS VINÍCOLAS ' III Na sua terceira conferencia vinícola o snr. António Augusto d' Aguiar co- meçou por dizer que o Alemtejo ha vin- te annos ainda estava sujeito ao prolo- quio : — aterra de mau pão e peor vi- nho.» Mas ha outro proloquio : — «mais vale quem Deus ajuda do que quem muito madruga», e sob a sua influencia aquel- la região começou a ser considerada co- mo vinhateira depois que o oidium, ten- do invadido primeiro o Douro e depois avançado até ao limite sul da Extrema- dura, veio parar ante os calores do Alem- tejo. O Alemtejo tem uma superficie mui- to maior que o Algarve, uma população menos densa : julga-se á primeira vista que o Alemtejo produz menos vinho do que o Algarve, porém a estatística de- monstra que aquella província produz três vezes mais do que esta. Estão muito disseminadas pela gran- de área do Alemtejo as plantações da vinha; por isso parecem menos, mas são realmente já bastante extensas e podem tornar-se muito mais, porque ahi ha mui- tos terrenos próprios para vinha, que, se- guindo-se os melhores processos oenolo- gicos, podem produzir os vinhos de pas- to mais excel lentes para se collocarem ao-^lado dos melhores do Algarve, como se provou por algumas das 64 amostras que do Alemtejo foram á exposição, das (1) Vide J. H. P., vol. VI, pag. 212. quaes 25 foram em Lisboa classificadas de boas, 23 de soíFriveis e 16 de más. O numero das sofíriveis e boas ainda diminuiu consideravelmente nas casas da exposição para demonstração de que, quanto mais mal fabricado é o vinho, mais sujeito está a perder-se em presen- ça das alternativas de temperatura. O Alemtejo apresentou um numero menor de vinhos abaixo da escala alco- holica relativamente ao Algarve, quan- do deveria ser o contrário, por isso que as uvas do Alemtejo são menos saccha- rinas que as da outra província. No Algarve a força saccharina das uvas chega a elevar-se a 30°; no Alem- tejo, seguudo os ensaios do snr. Lapa, apenas sobe a 22-, e desce mesmo a 18°, podendo a média considerar-se 20. Con- siderada a força média, pôde obter-se um vinho inferior a 26° Siks ; com a máxi- ma eleva-se um pouco mais ; attendendo- se porém ás perdas no fabrico e pela evaporação, certamente o vinho, tendo só o alcohoí derivado do assucar da pró- pria uva, desceria abaixo de 26°. No Alemtejo nota-se, como em todas as outras regiões do paiz, que a força alcoholica dos vinhos é muito superior á que genuinamente deve ter : um vinho chega a ter 25° centesimaes, isto é, gra- duação alcoholica mais elevada que o co- gnac, ou a necessária para exceder duas vezes a escala alcoholica, e pagar como tal em Inglaterra. Esta mesma consideração havia já fei- 226 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA to O snr. Lapa no seu excellente rela- tório, que todos deverão lêr, dizendo que o alcohol natural de grande parte dos vinhos de Cuba deveria ter 11 a 17", o que está abaixo da força minima dos vinhos que d'ahi foram á exposição. O Alcmtcjo pôde dividir-se em três zonas vinicolas, correspondentes aos três districtos, isto é: alto Alemtejo, dis- trieto de Portalegre; médio Alemtejo, Évora; baixo Alemtejo, districto de Beja. A primeira zona tem vinhos por ve- zes bons, muitos porém de inferior qua- lidade ; a segunda, e principalmente Bor- ba, bons vinhos ou antes óptimas uvas; a terceira possue as melhores uvas e os melhores vinhos, e de mais futuro. Tractou da constituição geológica, di- zendo, que ella no Alemtejo não é varia- da, como na Extremadura, podendo di- zer-se, que alli predominam os schistos e granitos, sendo que no baixo Alemtejo e mesmo médio, estas rochas são modi- ficadas mais convenientemente para a vinha, principalmente pelas diorites e calcareos. No alto Alemtejo apparecem ainda as mesmas rochas, mas a accidentação do terreno faz que a vinha ahi chegue a subir ás arvores, tornando-se o vinho verde como no norte do paiz. Na parte média e baixa do Alemtejo podem ap- plicar-se aos vinhos todos os processos mais aperfeiçoados. A vinha alli é cultivada como no res- to do paiz. O grangeio é caro por causa da falta de braços. Usam-se duas podas, que não descreve porque não está fazen- do um curso do viticultura, a poda re- donda e a successiva, e esta executa-se em três operações. Depois d'e3ta faz-se a cava por três vezes nas mesmas epo- chas que no Algarve. A vindima realisa-se depois de 20 de agosto. Sabendo-se que as castas são 31, pô- de fazer-se ideia do adiantamento da cultura; a nomenclatura é caprichosa. Não se fazem ensaios para reconhecer o grau de maturação ; os vinhos n'un3 an- no3 sahem melhores, n'outro3 peores, porém nada se estuda para evitar estes inconvenientes ; o lavrador é como a le- bre que não torce caminho para não vir cahir sob a espingarda do caçador. O periodo da vindima é fatal : as uvas recolhem-se em cestos e são transporta- das ás casas onde se ha-de fazer a vi- nificação. Esta parte do trabalho agrí- cola apresenta maravilhas as mais notá- veis e pôde tomar-se, no género cómico, como um conto das «Mil e uma noites». Dous são os typos geraes de fabrico que se usam no Alemtejo : o primeiro é o fabrico nas talhas ; o segundo nos la- gares, de meia feitoria ou feitoria com- pleta. Alguns vinhos pois se apresentaram na exposição, fabricados segundo o ul- timo typo. Os vinhos do primeiro typo são guar- dados em talhas. O uso das talhas diz-se que vem do tempo dos romanos, que mais dados ás cousas da guerra do que ás da industria, tendo necessidade de crearem uma be- bida, estabeleceram este processo selva- gem, que, apesar de passarem bastantes séculos, ainda existe no Alemtejo. N'este typo de fabrico não ha lagares, que são substituidos por uma lage escon- sa, da qual o liquido escorre para uma tina que não tem nome especial emquan- to se fabrica o vinho, mas toma o nome de ladrão, logo que serve a recolher o vinho de alguma talha que rebenta pelo tempo adiante; é este porém um ladrão que não foge e restituo o roubo sem se lhe instaurar o processo. Não ha prensas em geral, e alguma que ha é a de cincho. As talhas, diga- se a verdade, attestam que os alemteja- nos téem algum amor das bellas artes, que manifestam na imitação da nature- za : as talhas téem formas caprichosas e imitativas da natureza; umas parecem um peão, outras um nabo, outras um rábano, muitas mesmo imitam uma ce- noura. Estas não são as formas mais conve- nientes. As talhas são permeáveis contra o que deve ser e tornam-se impermeáveis por meio de um artificio, que consiste em um reboco de pez que dão do seguinte mo- do: Feita a talha, vem um grande tacho JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 227 com a quantidade necessária de pez der- retido que se lhe lança dentro. Rola-se a talha até que o pez comece a so- lidificar, e, chegando a este ponto, um homem armado de um pau com uma bo- la de cortiça começa a espalhar o pez, conforme pode, para que fique melhor distribuido. Dá-se uma razão, «altamente philoso- phica», da preferencia das talhas sobre as vasilhas de madeira : «as talhas, por serem permeáveis, são mais frescas e assim substituem as cavas subterrâneas» . Mas a explicação verdadeira e?tá na difficuldade de communicações que tem havido e na falta de madeiras próprias no Altemtejo. A uva chegando ao lagar é ripada para se lhe tirar o engaço : do lado op- posto áquelle em que está o homem ri- pando, estão outros pisando os bagos que mal esmagados vão com o liquido na tira : bagos e liquido são levados pa- ra as talhas. Varias são as razões que aqui ha pa- ra se desengaçar ; mas as principaes são : o pequeno diâmetro da abertura das talhas, onde se faz a fermentação que mal comportaria o volume do en- gaço e porque sendo a fermentação com o bago muito demorada, se o engaço tivesse ido conjunctamente, passado um mez em logar de vinho havia um liqui- do que só poderia vender-se para as fa- bricas de cortume. Os bagos indo mal pisados, percebe- se que a fermentação não pode ser ho- mogénea. A trasfega só se faz quando tem cahido o chapéu que a massa forma em cima pela acção do acido carbónico. Ora, passado um mez, e mais que é ne- cessário para que a balsa caiha, esta de- ve ter grande parte acetificada e mes- mo sujeita a outras fermentações mais perniciosas. A trasfega faz-se para vasilhas de egual natureza ; mas no fundo da talha fica a massa que é necessária aprovei- tar: lá vae para uma caldeira, que, pa- ra se saber que é imperfeita, bastará di- zer-se, que lhe chamam portugueza e que provavelmente já lhes veio do tem- po dos romanos. Como o lavrador não tem conheci- mento das diversas temperaturas a que entram em ebulição os diíForentes cor- pos, distilla todos os óleos empyreuma- ticos conjunctamente com o alcohol que precisaria depois ser purificado por um chimico dos mais hábeis. A este alcohol não se dá outro qual- quer destino; é immediatamente lança- do ao vinho, que, se tem tido a complei- ção bastante robusta para resistir ás ou- tras barbaridades por que o téem feito passar, a esta é que não resiste. Se 03 do Algarve téem o seu figo que lhes dá o alcohol, que temperado com a herva doce lhes vae estragar os seus vi- nhos; os do Alemtejo téem o seu alco- hol^ de balsas esturradas. E tal o amor que o alemtejano tem ao pez, que chega a addicional-o ao vi- nho na hypothese de que o pez das ta- lhas envelhece, e eífectivamente elle vae envelhecendo com o trabalho de ir es- tragando o vinho que se lança nas ta- lhas. O Alemtejo tem seus imitadores em Hespanha, e a esperteza dos francezes chega a tal ponto, que imitam os vinhos de Málaga, usando de um artificio para darem pez aos vinhos que querem ex- portar com o nome d'aquella região. Todos sabem que emquanto o mosto está em fermentação tumultuosa, é ne- cessário, sendo bastante saccharino, que esteja em contacto com o ar, ou antes com o oxygenio ; e que, acabado este pe- riodo da fermentação, convém que as vasilhas sejam hermeticamente fecha- das; pois as talhas do Alemtejo foram feitas para tirar ao mosto o contacto do ar, e para exporem a este o vinho de- pois de feito. Para fechar a bocca immensa das ta- lhas só poderia inventar-se, como tam- po, uma sobreira. Imaginaram-se para maior resguardo duas tampas, uma solida, consistindo em uma tosca roda de madeira, outra li- quida, que é uma camada de azeite de 2 a 3 centímetros. O Alemtejo só tem Valhadolid que o imite n'esta segunda tampa, e o Cáuca- so, onde o azeite é substituído pelo óleo de naphta, muito similhante ao petróleo, e é tal o gosto por este flavor n'aquella 228 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA região, que mal se venderá o vinho que o nào tiver. Qualquer azeite dos mais finos seria capaz de estragar o vinho, ainda que fosse o melhor de Itália ou o azeite Her- culano ou Vaz Preto, que os paladares estragados rejeitam, como parecendo óleo de amondoa>s, quanto mais o azeite defeituoso portuguez. Fallando da aguardentaçcão, que o pre- lector, como fazem os maestros nas suas partituras, toma como thema obrigado do seu discurso, dirá que o alemtejano augmenta de \ 2 a força alcoholica dos seus vinhos sem necessidade. Como despresam o tanino do engaço, vão buscar-lhe succedaneo ás cousas mais extravagantes. Em Extremoz, onde o vinho é me- nos alcoholico, lança-se-lhe um punha- do de pimenta moída ou inteira por ta- lha; se a pimenta não produz ainda o queime desejado, emprega-se uma boa dúzia de pimentas que fazem estalar a bocca; e se ainda não julgam bastante empregam 14 ou lõ malaguetas bem arrevezadas. O systema da pimenta é também usa- do nos nossos armazéns do vinhos cm Lisboa, quando pela addição da agua se quer de uma pipa de vinho fazer duas. Quanto aos instrumentos do fabrico, Borba, que passa por ser a região que produz os melhores vinhos do Alemte- jo, tem, como tropheu da sua lagara- gem, a talha, a ripadeira e o tamanco. Não ha lagares ; o vinho faz -se na rua, no quarto da cama, no telhado, atraz de uma porta mesmo. O vinicul- tor do Aleratejo assimilha-se no fabrico do vinho aos cegos de feira que tocam n'uma guitarra sem cordas. O vinho do Alemtejo está longe de se poder apresentar nos mercados es- trangeiros. O seu preço regula pelo do Algarve, entre 50 e 100 reis o litro. Para se vôr quanto a aguardentação eleva o preço do vinho, bastará dizer que o vinho alemtejano, que marcava 25" alcoholicoa, tinha o preço elevadís- simo de 700 reis por litro. Quanto ao grangcio, não se compre- hcnde como sendo os salários elevados e o terreno pela maior parte plano, se não adoptou ainda a charrua para sub- stituir as cavas, como acontece lá fora. Clama-se contra este systema antes de o experimentar, pois é preciso que se experimente antes de o condemnar. Os vinhos devem fazer-se seccos, pa- lhetes e abaixo da escala alcoholica. Isto não se conseguirá com os esfor- ços de um só vinicultor. O Alemtejo carece de uma sociedade que venha com o espirito de fazer uma verdadeira re- volução contra o systema actual. Esta terá primeiro de escolher o lo- cal, para onde terá de exportar; terá de construir armazéns e adegas subter- râneas onde conservará o vinho pelo menos anno e meio. Tem de escolher pessoal idóneo e ex- pulsar o labrego das vinhas, que, se fosse conhecido de Darwin, dar-lhe-ia maior força para nos approximar do nos- so humilde ascendente. Terá de mandar vir gente de fora ou de enviar ao estrangeiro homens de tra- balho que venham de lá instruídos, co- mo já propôz o nosso cônsul o snr. ba- rão de Roussado. O primeiro methodo levantará contra si o grito costumado de falta de patrio- tismo. Os homens que vierem téem que luctar contra a rivalidade dos que cá estão, ou transigirão com elles, e es- tes, tornando-se dominadores, dirão que aquelles nada vieram dizer de novo. O segundo tem o inconveniente do que quando se manda alguém que vá humilde, vem de casaca; se vae de ca- saca, vem engravatado e de collariuhos direitos. Parece-lhe que se deve imitar o pro- cesso seguido em França para o fabrico de queijo de Gruyére, que se faz, ten- do-se mandado vir operários da Suissa para ensinarem os francczes. Se assim se não fizer, não teremos vi- nhos que vão luctar com os das outras nações. Com respeito ao empregar-se o labre- go das vinhas, o lavrador portuguez as- similha-se ás mães robustas que dão 03 filhos a crear a amas que lhes vão dar sangue ruim. A sociedade que se constitua deverá JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 229 ainda crear outras industrias ao lado da vinicola, quaes são as da preparação dos tártaros e da acetificação das balsas pa- ra o verdete. A associação tem de attender também ao consummo do vinho, pois não pôde esperar que o almocreve vá ás suas ade- gas buscar o vinho preparado segundo os processos aperfeiçoados. Nota porém o prelector a grande des- animação que encontra, quando falia da organisação de empreza tão importante. Todos lhe dirigem perguntas, mas so- mente sobre se os nossos vinhos agrada- ram em Inglaterra. Conta uma conversa que ouviu entre vários individues no Rocio. Um é de opinião «que fomos os primeiros, como sempre somos em tudo. A Beira despi- cou-se; a Extremadura mandou excel- lentes vinhos. Aquelle vinho de Torres, que excellente ! Então bebido pela bor- racha ! . . « Nós não temos pintores nem escul- ptores, nem sábios, mas temos a paz e a cepa.» Mas poderia dizer-se a cepa torta, disse o snr. Aguiar. Outro diz : «Não gostam dos nossos vinhos? Não vamos nós comprar-lhes tudo ? Pois com- prem-nos as cepas e as uvas e fabriquem elles 03 vinhos a seu gosto.» E o que naturalmente ha-de aconte- cer com os vinhos de pasto, como já se dá com os vinhos do Douro e da Ma- deira ; os inglezes hão-de vir, hão-de trabalhar, hão-de triumphar, levantar- se-ha então a inveja, e quando elles le- varem os nossos vinhos e o dinheiro, cla- mar-se-ha por que se expulsem os in- glezes, como já se expulsaram os ju- deus. Será então o combate da rola com a águia, que estando já desfallecida, mal poderá vêr que lhe roubam os filhos. ALGUIS SOLAIUMS RECOMENDÁVEIS A familia das Solanaceas, se presta valiosos serviços ao reino animal, sob o ponto de vista alimenticio e medicinal, não é menos verdade também que con- corre poderosamente para a ornamenta- ção dos jardins, e é n'este sentido que vamos indicar três plantas, cuja acqui- sição julgamos dever recommendar. Fig. 38 — Solauum pseudo-eapgicum nanum. Eil-as : Solanum laciniatum — Grande espé- cie desprovida de espinhos : ramos suc- colentos. Folhas pinnatifidas com ló- bulos lineares-lanceolados e o terminal alongado. As flores são azues, grandes, 230 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA com cinco divisões ; bagas subglobulosas, deprimidas e amarelladas. É uma bella planta de ornamento e muito notável pela sua vegetação luxu- riante. Solanum roòustum — Bella espécie es- pinho-ía, elevando-se a dous metros. Os ramos, revestidos de um pôllosinho es- branquiçado, são alados, assim como os peciolos. As folhas são grandes e avel- ludadas. Inflorescencia scorpioidal; as flores são pequenas e de um branco amarellado. É uma planta muito ornamental e re- commendavel pela sua rusticidade. Solanum pseudo-cajysícum nanum — Arbusto pequeno, de folhagem persisten- te. Produz uns fructos similhantes a ce- rejas, que se conservam todo o anno e que passam gradualmente da cor verde ao vermelho escarlate. Esta variedade, lançada ainda ha mui- to pouco tempo no commercio, torna-se sobremodo recommendavel, pela forma que toma e de que a fig. 38 dá perfeita ideia. Arbustos como este são impagáveis. Este Solanum. vem descripto no cata- logo de MM. Vilmorin Andrieux & C.*^, e asseveram que c durante o inverno um excellente adorno para salas. Cada pa- cote de semente custa a módica quan- tia de 1 fr. 50 c. A nossa horticultura pôde tirar mui- to recurso d'este género de plantas e portanto é preciso exploral-o, cumprin- do isso de preferencia aos horticultores de profissão. Oliveira Júnior. DEVER-SE-HA SUPPRIMIR OS ESTOLÕES AOS MORANGUEIROS? Esta questão tem sido ventilada tan- tas vezes que não será ocioso dar a pa- lavra a Mr. Ferdinand Gloede, céle- bre cultivador de morangos. Eis o que elle escreveu sobre o asr-umpto no «Jour- nal de la Sociétc Impériale»; de Pariz : «Devo communicar aos amadores d'este fructo delicioso o resultado das minhas experiências de quatorze annos, e creio que estes resultados não deixa- rão subsistir duvida alguma a este res- peito. Segundo a minha opinião, seria tão absurdo deixar os estolues n'um Moran- gueiro que se cultiva para dar fructo cora abundância, como deixar os ladrões n'uma arvore fructifera. Affirmo, portanto, que 6 essencial sup- primir rigorosamente os estolões á medi- da que elles se desenvolvem, se se qui- zer obter de cada variedade a máxima quantidade de fructos. Em apoio d'esta asserção citarei um único exemplo, entre muitos outros. Em Chãlons-sur-Marne, o dr. Nicai- se, um dos mais hábeis e solicites ama- dores da cultura dos Morangueiros, man- da tirar os estolões durante todo o an- no. E que morangos e fructificação não obtém ! Conheço poucas propriedades onde se possa gosar um lance de vista tão es- plendido, na estação dos morangos, como alli. Na mesma cidade ha outros ama- dores, egualmente hábeis, mas não es- tando dispostos a trabalhar como Mr. Nicaise, confiam este serviço aos cuida- dos de um jardineiro qualquer. O dr. Nicaise conserva os Moranguei- ros só três annos, cm cujo termo deixa desenvolver os estolões para substituir 03 pés velhos.» Oliveira Júnior. JARDINS NOTÁVEIS DE PORTUGAL LUMIAR Poucas milhas distante de Lisboa, pa- ra o interior, está situada a povoação do Lumiar, que passaria talvez desperce- bida aos habitantes da capital se não JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 231 fosse o palácio do duque de Palmella com os seus bellos jardins, o que a sal- va do esquecimento e lhe dá uma reputa- ção, que já se estende além das frontei- ras portuguezas. Ha uns quarenta an- nos que o avô da actual duqueza lançou os fundamentos d'esta adorável viven- da. N'aquelle tempo os jardins em Por- tugal estavam na sua infância, e não é para admirar que dentro em pouco o do Lumiar occupasse o logar de honra, e que passo a passo se tornasse o modelo do bom gosto na escolha e arranjo das plantas exóticas. O exemplo foi segui- do e não tardou que se creassem por di- versas partes excellentes jardins debai- xo de todas as condições necessárias. O Lumiar, todavia, conservou-se sempre no seu plano superior, e se algum dia se escrever, desde os seus lineamentos, a historia dos progressos da horticultura portugueza, esperamos que não ficará no olvido, nem a influencia d'aquelles jardins no passado, nem as suas admi- ráveis condições no presente. Não ha duvida que para este resul- tado se deve immenso ao gosto que os actuaes duques téem pelas cousas hor- tícolas, mas é um acto de justiça da mi- nha parte não esquecer o louvor que merece o snr. Jacob Weiss, que duran- te mais de trinta annos tem sido o jar- dineiro em chefe, e em todo esse perío- do mostrou sempre grande zelo e pro- fundos conhecimentos, o que tudo tem concorrido para o florescimento em que as cousas presentemente se acham. Não se passa nenhum anno em que elle não introduza alguma planta nova ou rara, ou deixe de fazer alguns melhoramentos importantes no Lumiar e nos outros jar- dins ducaes. Não me é possível deixar de o considerar como o primeiro entre os jardineiros portuguezes. O fallecido dr. Welwitsch esteve por algum tempo ao serviço do primeiro du- que antes de partir para a Africa, e foi com o maior interesse que eu, vendo n'outro dia um herbario de plantas cul- tivadas no Lumiar, notei o resultado da sua estada n'estes jardins, e por este herbario não só formei uma boa ideia da riqueza da flora exótica n'aquelle perío- do, mas pude comparar o estado dos jar- dins no passado e no presente. Outr'ora cultivavam-se aqui muitos arbustos e ar- vores de pequeno porte do Cabo e da Austrália, mas as variedades mais deli- cadas, especialmente as pertencentes ás Leguminosas, Ericaceas e Proteaceas des- appareceram, por causa da nociva in- fluencia das aguas calcareas. O logar d'ellas foi occupado por outras plantas mais pomposas e não menos interessan- tes. Passando em revista a rica e luxu- riante vegetação do Lumiar, principiarei pela collecção sem rival das Palmeiras. Posso afiançar que estas não téem ri- val, quer se considere o numero das es- pécies, quer a belleza dos specimens. A maior parte d'ellas foram plantadas em 18Õ6, e bastaram apenas 19 annos pa- ra as tornar, de pequenas que eram, em robustos exemplares, o que pro- va que muitas Palmeiras, ainda as que são dos paizes mais quentes, quando bem tractadas, adoptam voluntariamen- te Portugal como sua segunda pátria. O exemplar da Juhoia spectabilis no Lu- miar é, em altura, inferior ao das Ne- cessidades. O tronco tem apenas trinta pés d'alto, e a circumferencia mede na base 14 e ^/g pés. A altura do tronco do Chamcerojps Ghieshreghtii é quasi de tre- ze pés, e a circumferencia na base 3 pés e 3 pollegadas. A do Chamcerops excelsa é entre 20 e 21 pés, tendo a cir- cumferencia na base 3 pés e 9 pollega- das approximadamente. Este individuo produz todos os annos grande numero de sementes férteis e podemol-o consi- derar como o antecessor de centenares de exemplares em variados estados de crescimento, que adornam actualmente muitos jardins portuguezes, tanto pú- blicos como particulares. As Palmeiras téem tendência, mesmo sendo cultiva- das, para variar. Isto parece certo de- pois d'uma demorada observação d'es- ta planta e da sua progénie, porque muitos exemplares, provenientes d'ella, diíFerem no habito, no vigor do cresci- mento e até na textura mais ou menos compacta das folhas. O saber se o Cha- mcBrops excelsa e o C. Fortunei são real- mente duas boas espécies, ou se a ulti- ma se deve considerar uma variedade distincta da primeira, é isto talvez mais 232 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA um assumpto de imaginação, de que uma questão scientifica. Quando, porém, SC acham collocadas lado a lado como n'estes jardins, e sendo quasi eguaes em vigor, é verdadeiramente difficil af- firmar onde c que está a differença que existe entro ellas. O tronco da Livistona sinensis (Co- rypha) mede 13 pés d'alto e tem de cir- cumferencia na base 4 pés. Com as suas folhas largas e bellas cobre uma super- fície de quasi 45 pés de circumferencia. Os exemplares da Livistona australis (Corypha) abundam no Lumiar, mas sendo plantados muito depois das outras Palmeiras, ainda não podem apresentar idênticas dimensões. A Phoenix leonensis Lodd. (P. spinosa) é uma graciosissima espécie, posto que de moroso desenvolvi- mento, approximando-se alguma cousa no habitat com a PJmnix reclinata. O tron- co mede 13 pés de alto : as folhas mais erectas accrescentam-lhe mais 9 pés e 6 pollegadas. A Copernicia sp. Bahia é uma espécie que attinge pequena altu- ra ; compacta e de singular belleza ; for- ma um grande tufo e augmenta de an- no para anno. A lihapis sp. é muito distincta da Rhapis jlabelliformis, que, tanto aqui como nas Necessidades, não vae muito bem. Pelo contrário, outra es- pécie sem nome, talvez a lihapis áspera, está perfeitamente á vontade n'estes jar- dins e pôde ser indubitavelmente consi- derada como uma das mais notáveis Pal- meiras anãs. As espécies acima mencionadas for- mam um grande grupo, e estão planta- das com tal arte, que se podem admi- rar no seu conjuncto, ou contemplar em particular a belleza de cada uma. Em todo o caso, o visitante ficará conhe- cendo a difficuldade de encontrar em outra parte tão esplendida collecção co- mo esta. Magníficos exemplares do Chamairops tomentosa, Seaforthia elegans e Sahal umhraculifera, crescem em outras par- tes do Lumiar, não fallando do Chamm- rops humilis e do Phociiix dactylifera, que são aqui tão communs, que não me- recem especial menção. Ultimamente chegaram do Rio de Ja- neiro alguns exemplares fortes da Oreo- doxa regia, mas duvido que se dêem bem n'este clima, ainda que se escolham logares abrigados, como os que ha n'este jardim. Depois das Palmeiras são as Dracce- nas que chamam a nossa attenção. Ha poucos mezes que uma magnifica Dra- caana indivisa, de 14 pés e 6 pollegadas de altura, se apresentou em plena flo- rescência e carregada ao mesmo tempo de bagas vermelhas. Ainda que seja mais para o norte, esta planta deve-se dar perfeitamente, e esperamos que ve- nha a ter um logar em todos os nossos jardins. Admira-se no Lumiar um dos mais velhos, senão o mais forte exemplar da Dracana Draco, espécie das ilhas das Ca- nárias. O tronco mede na base quasi 13 pés de circumferencia. A altura de to- da a planta é de 40 pés approximada- mente, e com os seus seis principaes ra- mos cobre uma superfície de mais de 45 pés. Um raio destruiu a forma regu- lar da copa e derrubou dous ramos dos principaes, e para a preservar de mais damnos, arranjaram- se uns grossos va- rões de ferro, onde vêem descançar os mais fortes ramos. Faz bom effeito es- ta espécie de cúpula com as suas linhas curvadas e ramifícadas, principalmente n'um dia de grande calor, quando a sua sombra está convidando o visitante a sentar-se debaixo d'ella. Outras Draccenas e Cordylines , como a Draccena australis rubra, a Cordyline Canna;folia, C. fragrans (espécie da No- va Zelândia), C. brasiliensisj e assim também a Dracama heliconioí folia, es- tão espalhadas por diversas partes, on- de a belleza da folhagem ou a elegân- cia do porte as tornaram necessárias para produzir contrastes. A Strelitzia augusta, com um tronco de 22 pés de altura, com as suas enormes folhas, e com as suas curiosas flores, c um bom exem- plar d''uma gigantesca Monocotyledonea. Está cercada por quatro ou cinco espécies d'cssas interessantes plantas do Cabo, a saber: Strelitzia regina. As Bonapar- teas juncea, etc, são plantas ainda raras e muito apreciadas nos nossos jardins. Lembra-me da bella collecção que exis- te na estufa das plantas gordas, cm JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 233 Kew, mas para se admirarem em toda a sua belleza e valor, é preciso vel-as no Lumiar, onde crescem ao ar livre como se estivessem no seu próprio paiz. A Bonapartea longifolia está perfeita, acompanhada da B. gracilis, com duas grandes cabeças. A Bonapartea juncea está com flor ; o seu caule mede quasi 6 pés e meio. As sementes promettem amadurecer, o que seria um facto ver- dadeiramente interessante. Por ultimo, mas não longe, apparece a Bonai^artea glauca, que é representada por muitos e fortes exemplares, dignos de se lhes ligar a maior consideração. Outra plan- ta rara da mesma familia é a Pincene- ctitia tuherculata, de que o Lumiar pos- sue um representante, com um tronco que mede na base quasi 5 pés de cir- cumferencia e para mais de 3 pés de altura. Acaba de florescer ; o caule ele- va-se 4 pés approximadamente. As Agaves e os Aloés estão aqui mui- to bem representados, mas reservar-me- hei fallar d'elles, no seguinte artigo, quando descrever os jardins de Cas- caes. Lançando uma vista pela tribu das Coníferas, nota-se que o Pinheiro Nor- folk, Araucária excelsa, se tornou uma arvore predilecta n'este paiz, onde foi introduzida ha 35 annos. É no Lumiar onde existem os mais antigos e fortes in- divíduos. Em 1841 foram plantados dous exemplares novos e em pouco tempo at- tingiram enormes dimensões. Um tem 78 pés ; o outro tem mais de 80 pés de al- tura. Ha cerca de 10 annos que deram as primeiras pinhas, mas somente des- de 1873 é que produziram boas semen- tes. Estou esperançado em que a sua fertilidade augmentará de anno para anno, e então as duas Araucárias do Lumiar serão a origem d'uma numero- síssima progénie. Das duas, a maior tem 40 pollegadas de diâmetro no tron- co, e cobre com os ramos mais baixos que descem até ao solo uma área de 45 pés. A Araucária hrasiliensis encontra- se aqui em abundância ; o mais notá- vel exemplar tem a altura de 58 pés. Algumas espécies próximas, principal- mente a A. imhricata o a il. Bidioillii, téem um desenvolvimento muito mais moroso e apresentam até uma fraca ap- parencia — outra prova de que as plan- tas do mesmo género e muitas vezes do mesmo paiz requerem differentes con- dições de clima e solo para se tornarem vigorosas e bellas. A Araucária JRulei não se dá muito melhor que as duas an- tecedentemente mencionadas, mas em compensação encontram-se bellos speci- mens da Araucária Cookii e da A. Cun- ninghamii. O género Taxodium é representado por um esplendido exemplar do Taxo- dium sempervirens, com 80 pés de altu- ra e com uma circumferencia, na base, de 9 pés. O famoso Pinheiro da Cali- fórnia, Wellingtonia gigantea, parece- me que não se dá bem no território por- tuguez. Já se ventilou uma questão n'um jornal de horticultura portugueza (1) a respeito do seu desenvolvimento, mas o que eu posso afiançar é que os exem- plares que tenho visto, tanto no norte como no sul do paiz, são, a muitos res- peitos, inferiores áquelles que eu tive muitas vezes occasião de admirar em diíFerentes localidades da Inglaterra e até da Allemanha. Não obstante, ha uma d'estas plantas no Lumiar, que for- ma uma bella arvore e promette um bri- lhante futuro. O sul da Europa oífere- ce-nos no hispânico AMes Pinsapo uma das melhores e mais adequadas Conífe- ras para este paiz e devo confessar que os bons exemplares d'esta arvore podem competir com muitas das suas congéne- res exóticas. Não faltam no Lumiar bel- los exemplares d'estes Aòies, Uma cou- sa curiosa é que tendo diligenciado ob- ter semente directamente de Hespanha nunca me foi possível obtel-a ; comtudo tive a felicidade de colher a quantidade sufficiente no Lumiar para repartir com alguns amigos meus de Inglaterra e da Allemanha. Algumas Dammaras e Podocarpus, e em primeiro logar a Dammara robusta da Austrália e o Podocarpus elongatus do Cabo da Boa Esperança completam a imperfeita lista das melhores e mais notáveis Coníferas do Lumiar. Quan- (1) Jornal de Horticultura Pratica. 234 JORNAL DE HORTICULTUKA PRATICA do, mais para o diante, compilar para uso d'este paiz uma obra sobre a rica flo- ra exótica de Portugal, enumerarei en- tão mais circumstanciadamente as raras c bcllas plantas que se encontram n'es- tes jardins. Não deixarei todavia de apresentar agora mais alguns admirá- veis exemplos da luxuriante vegetação do Lumiar. O Quercus insignis, do Mé- xico, é representado por uma arvore, a qual é realmente magnificente, quer se considere a sua grandeza, quer a geral appareucia. A Acácia heteroiihylla^ da Austrália, com um tronco de quasi 9õ pés de altura, não pôde passar des- percebida, especialmente quando osten- ta os seus milhões de flores amai-el- las, o que em verdade produz um eíFei- to maravilhoso. Exemplares do Jaca- randá mimosccfolia florescem e dão se- mente : são tão gi'aciosos na sua folha- gem e nas suas grandes flores d'um azul violeta, que fazemos votos para que es- ta espécie seja mais geralmente cultiva- da. O Fagus asplenifolia é provavel- mente bem conhecido nos jardins ingle- zes ; para mim foi a mais encantadora novidade e achei-o digno de sor collo- cado entre as mais bellas plantas de fo- lhagem ornamental. Antes das minhas ultimas visitas ao Lumiar nunca pensei que a Franciscea latifolia me appare- cesse florescendo tão perfeitamente de- baixo do clima de Lisboa. Este facto, porém, que se dá também com as Ca- mellias, Rhododendrons, Azáleas e Oar- denias, deve em grande parte ser attri- buido ao excellente abrigo e sombra das altas e copadas arvores de espécie mais coramum, como o JEsculus Hippocasta- num, Fagus sj/lvatica, F. purpúrea, Ul- vxu» latifolia, Sterculia j^latanifolia, Grevillea robusta e muitas espécies de Casuarina. Trepadeiras do toda a casta cobrem os muros o as gradarias : entre ellas a Bougainvillea brasiliensis, merecendo es- pecial menção uma variedade obtida aqui de semente o justamente denomi- nada Bougainvillea Palmella. Esta magnifica quinta ducal não era a principio tão extensa ; actualmente compòc-sc do quati-o pequenas quintas, que medem talvez ao todo 125 acres. Terraços com bcllas vistas, cheios de ta- boleiros de flores, alternam-se aqui com doces valles e pittorescas ladeiras. En- cantadoras grutas e lagos, onde se es- paneja a Bamhusa gracilis e a B. nigra, dão realce ao composto geral, desenha- do com muita pericia. As estufas não estão muito em rela- ção com as plantas que vegetam ao ar livre. No emtanto, não posso deixal-as em silencio, porque me offerecem ense- jo de fallar dos cxcellentes resultados que Mr. Wciss alcançou pelo cruzamen- to das Begónias e Caladiums. As Begó- nias abundam aqui e ha muitas varie- dades no Lumiar que poderiam compe- tir com as Begónias hjhridas, da Bél- gica, Inglaterra e Allemanha. Pelo que respeita aos Caladiums tem obtido até agora os mais satisfactorios resultados e muitas das suas melhores plantas são actualmente cultivadas em outros pai- zes, posto que não exactamente debaixo de nomes portuguezes. O anno passado fiquei muito encantado com a vista de doze cxcellentes Caladiums hybridos, não só distinctos pela sua cor como pe- la f )rma peculiar das folhas. Mr. Weiss teve a bondade de me informar que eram o resultado do cruzamento e hy- bridação entre o Caladium Chantini (macho) e uma espécie brazileira de Alo- casia (planta fêmea). Eram tão bellos que persuadi o jardineiro a que me dei- xasse arranjar um comprador em Ingla- terra, onde taes novidades são sempre altamente apreciáveis. Consentindo u'is- to, escrevi a Mr. William Buli, de Chel- soa, mandando-lhc por essa occasião uma folha do cada variedade, cuidadosa- mente secca. Este cavalheiro, n'uma de- licada resposta, pedia-me para observar que as minhas suppostas hybridaçoes entre os dous géneros de Aroideas, a saber o Caladium e a Alocasia, não eram efí'ectivamente senão o resultado da hy- bridação de dous verdadeiros Caladiums; que a alludida planta fêmea não era uma Alocasia, e que esta substituição se de- via a um engano do professor Koch, que injustamente designou por Alocasia argyroneura, o que com propriedade se devia chamar Caladium Schroderii. Es- tou muito longe de querer pôr em du- JORNAL DE HORTICULTUEA PRATICA 235 vida uma auctoridade como a de Mr. Buli e estou-lhe muitíssimo agradecido pelas suas informações ; no emtanto pe- ço perdão para dizer que ainda não es- tou convencido que a Alocasia argyro- neura, assim impropriamente chamada pelo professor Koch, seja idêntica á Alo- casia hrazileira do Lumiar. O futuro mostrará quem tem razão. Por agora con- tento-me em dizer que estas excellentes plantas, interessantíssimas debaixo do ponto de vista botânico, se se confirmar a minha supposição de que houve um cruzamento hybrido entre dous géneros, passnram a ser propriedade dos snrs. Veitch, de Chelsea, e deixo a estes ca- valheiros mais competentes do que eu o proclamar as bellezas da sua nova ac- quisição portugueza. Lisboa — Eschola Polytechnica. Edmond Goeze. ACER CAMPESTRE FOL. MAGULATIS Temos muitas variedades d'este Acer, e conhecemos outras que não possuímos ; porém esta é a mais bella pelas suas grandes folhas todas variegadas de bran- co sobre verde claro, qualidade que sem- pre conserva, emquanto que outras a Fig. 39 — Acei- campestre foi. maculatis — Desenhado no Horto Lourek-o. perdem. E uma arvore que se eleva do ' terrenos, ainda que pobres. Esta varie- 10 a 12 metros, tornando-se muito co- dade, assim como outras, são enxerta- pada. E de rápido desenvolvimento. To- das de borbulha no Acer campestre, e dos 03 Acer perdem as folhas no inver- devem-no ser em junho. ^ no. Dão-se perfeitamente em todos os JosÉ Marques Loureiro, 236 joknál de horticultura pratica CHRONIGA HORTICOLO-AGRIGOLA Não se pôde negar que ha em Portu- gal homens de grande saber e talento, maa cuja vida intollectual desce com elles á sepultura, porque não perpetua- ram pelo livro a fama de seus conheci- mentos. São raras entre nós as obras scientiíicas, o que não quer dizer que a sciencia não tenha os seus especiaes e dedicados cultores. A nossa posição geo- graphica, evitando o contacto intimo com 03 povos de mais desenvolvida ci- vilisação, como a França e a Allema- nha, contribue para que a atmosphera scientifica em Portugal se conserve sem- pre em baixa temperatura, e é com má- goa que vemos, ao folhear qualquer tra- balho scientifico estrangeiro, rarissimas vezes citado nome de auctor nacional. O nosso coUaborador, o snr. visconde de Villa Maior, é um d'esses talentos que faz notável excepção e que procura de dia para dia distinguir cada vez mais o seu nome em novas producções. A hon- rosa posição a que subiu não o enervou, não lhe tirou o amor ao trabalho, nem lhe quebrou a robustez da intelligencia : uma e outra cousa são sobejamente de- monstradas e reconhecidas. Estas ligeiras mas satisfactorias con- siderações nos suggeriu o seu novo li- vro intitulado «Manual de viticultura pratica», que vem para assim dizer com- pletar o seu «Tractado de vinificação». È um grosso volume de 552 paginas, elegantemente impresso na imprensa da universidade. Pareceu-nos solidamente cscripto, e com uma exposição clara adequada a todas as intelligencias, de modo que tanto possa ser compulsado pelo homem do gabinete como pelo ho- mem do campo. Seria ocioso, n'e3ta rápida noticia, o enumerar as variadas matérias de que se occupa este livro. Todas as opera- ções da vinha alli vem descriptas e ana- lysadas com grande critério. O snr. vis- conde de Villa Maior conhece vantajo- samente a litteratura vinicola estrangei- ra e não esqueceu de citar e apreciar 03 poucos tractados escriptos por portu- guezcs sobre o assumpto. Do ha muitos annos que o snr. viscon- de de Villa Maior se entrega á osnologia, o 03 seus estudos ampelographicos sobre o Douro habilitaram-no perfeitamente a escrever uma obra como esta de que vi- mos tractando. Felicitando o auctor, felicitamos o paiz pelo progresso que notamos na lit- teratura hortícola, symptoma que de- nuncia claramente a vontade de rege- nerar entre nós a agricultura. Ao tempo em que recebemos este livro está um chimico distincto, o snr. Aguiar, expondo ao publico de Lisboa, em admiráveis conferencias, que os jor- naes reproduzem e que todos lêem, as suas ideias acerca da viticultura portu- gueza. Esperamos que todos estes esfor- ços não ficarão inúteis nem os exem- plos sem imitadores. N'um paiz, onde a industria vinicola é o principal alimento do commercio, seria vergonha que a ro- tina predominasse completamente e a sciencia, avara dos seus conhecimentos, se conservasse silenciosa. — Mr. Joseph Schwartz, cultivador especialista de Roseiras, enviou-nos o catalogo das variedades que tem á ven- da no seu estabelecimento, em Lyon. Se- rá desnecessário dizer-se, que, sendo um especialista, deve possuir todas as varie- dades mais escolhidas, algumas das quaes foram por elle obtidas de semente e são lançadas este anno no mercado pela pri- meira vez. Citaremos as seguintes que estão n'e3se caso : Duchesse de Valiam- h'osa, Oastave Revilliod, Oscar Lamar- che e Madeleine Chomer. Custa a collecção das quatro varieda- des 95 francos. Mr. Joseph Schwartz tem obtido em differentes exposiçõe3 48 medalhas. — O nosso coUaborador, Mr. Delche- valerie, director dos jardins de S. M., o Khcdiva do Egypto, acaba de rece- ber d'este soberano a nomeação de offi- cial da ordem ottomana da Medjidieh, em attenção aos valiosíssimos serviços que aquelle cavalheiro tem prestado á horticultura egypciaca. — A Mangifera indica, fructificou es- to anno na estufa do Jardim Botânico do Coimbra. JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 237 — Um jornal americano conta mara- vilhas do Eucalyptus marginata, que pe- la qualidade da sua madeira promette tomar um logar importante nas flores- tas da Europa, onde o clima o permitta. Diz o correspondente : O Eucalyptus marginata^ da Austrália Oc- cidental, gosa de uma reputação universal, em consequência da sua madeira ser de muita du- ra, e para provar isso bastará dizer que vi ti- rar uma estaca de ponte, que depois de servir 25 annos estava em tão bom estado como no dia em que se enterrou. Tenho notado que os museus coloniaes da Austrália fazem sempre coUoear os specimens d'esta madeira, de modo que se vejam bem e acompauham-nos com documentos que provam com toda a evidencia que este Eucalyptus re- siste ao ataque de vários insectos que costu- mam destruir asmadeiras. O Eucalyptus marginata constitue um dos principaes artigos de exportação da Austrália Occidental. As outras colónias apreciam-no mui- to para as construcções, para as obras maríti- mas, etc, e na índia tem-se observado que as travessas dos caminhos de ferro, que eram des- truídas pelos insectos, deixaram de o ser des- de que se emprega a madeira do E. marginata. Esta madeira tem a côr carregada, e ,o quer que seja de parecido com o pau rosa. E dura, pesada e serve para tudo. Os carpinteiros é que não , gostam d'ella por ser muito dura, e dizem : — «E impossível que fosse feita para ser posta em obra ! » Já temos recommendado esta espécie por varias vezes, e o extracto que se acaba de lêr vem confirmar o que ha- vemos dito. Agora que estamos na epocha propi- cia para as plantações d'esta arvore, não vem fora de propósito recommen- dal-a novamente aos nossos silviculto- res. — Não téem sido poucas as vezes que temos observado arvores adultas apre- sentarem um aspecto que denota falta de saúde, e quando passamos a analy- sar a causa da doença descobrimos que é simplesmente devida a ter-se deitado terra no sitio em que estava plantada, ficando por conseguinte a uma profun- didade superior á que tinha primitiva- mente e a que racionalmente devia es- tar. Ainda não ha muito que se nos apresentou esse caso n'umas Amoreiras, na outra banda. O proprietário teve de fazer uma remoção de terra que mandou deitar n'outro sitio, conseguindo assim nivelar todo o terreno. As arvores que estavam na parte mais baixa manifes- taram pouco tempo depois todos os sym- ptomas d'um mal-estar : as folhas ama- relleceram, cahiam com a mais branda aragem, e a vegetação era rachitica. Ao fim de dous annos eram quasi todas vi- ctimas, e as que lograram escapar n'a- quella occasião, ou fosse porque as ca- vidades dos troncos permittissem o con- tacto do ar, ou por outro motivo qual- quer, o caso é que se lhes tirou a ter- ra á volta e que estão hoje restabeleci- das. Relatamos este facto, que deve servir d'aviso aos snrs. agricultores. As plan- tas precisam tanto de ar como nós. Ti- rar-lh'o é abafal-as ; é assassinal-as pela asphixia. — O Crinum asiaticum, que é uma interessante Amaryllideacea, floresceu este anno ao ar livre no Porto, facto de que não havia noticia nos annaes da horticultura portuense. O snr. Marques Loureiro, que o cul- tivava até aqui em estufa fria, teve de mudar alguns exemplares para o jar- dim, para dar logar a outras plantas que requeriam abrigo. A consequên- cia foi obter que os Crinwns lhe des- sem uma florescência prolongada como nunca tinha acontecido quando estavam na estufa. Ao simples acaso tem-se pois a agra- decer uma tão importante descoberta para os amadores das plantas bolbo- sas. — Emquanto que a Europa Occiden- tal se applica com vantagem a substi- tuir o assucar de Beterrabas ao de can- na, um criminoso, preso na casa de cor- recção de Vienna dAusíria, acaba de descobrir um processo para íazer assu- car de feno. Sabe-se que existe mais ou monos assucar em todos os vegetaes ; mas este homem assegura que a matéria saccha- rina existe em grande abundância no feno, e que se pode extrahir um arrá- tel de assucar de seis d'esta planta, por meio do processo de que elle é inventor. Parece que o governo austríaco não con- sidera este projecto como uma chimcra, e que está disposto a favorecer esta des- coberta. 238 JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA — Nas propriedades a cargo da direc- ção das obras do Mondego, fizeram-se, no anno económico de 1874 a 1875, as se- guintes plantações definitivas nas mat- tas do Mondego (Choupal, Valle de Ca- Camalliões, etc.) : nas Acer (diversas espécies e varie- dades) 193 Acácia (idem) 158 Ailanthus glandidosa 229 Ceitis 146 Citrus aurantium 78 Eucabjptus (diversas espécies e variedades) 328 Fraxinus (idem) 57 Araucária imhricata 1 Cupressus (diversas espécies).. 23 Cedrus (idem) . 4 Cryptomeria japonica 1 Hakea saligna 4 JxLiiiperus 1 Juglans (diversas espécies e va- riedades) 17 1 Melia (idem) 184 Morus (idem) 364 Pinihs (idem) 124 Pittosporum (idem) 31 Platanus (idem) 225 Populus (idem) 23.397 Robinia (idem) 278 Salix (idem) 252.948 Wellingtonia gigantea 2 Tamarix gallica 37.000 Resumo Arvores de raiz 2.602 Ditas de estaca 23.397 Salgueiros e Tamargueiras . . . 289.948 Molhos de fachina 24.773 Plantações feitas nos viveiros Acer (2 espécies) 851 Acácias (16 esp.) 3.394 Ailanthus glandulosa 270 Catalpa ST/ringcefolia 258 Cedrus atlântica 44 Ceitis australis 220 Citrus aurantium 130 Cnjptomeria japonica 61 Cunninghamia sinensis 16 Cu2)ressus (5 esp.) 712 Eucahjptus (17 esp.) 5.4 i8 Fraxinus (2 esp.) 18 Oleditschía triacanthos. Grevillea robusta Juglans (2 esp.) Libocedrus decurrens... Morus alba 312 309 558 36 317 Platanus (2 esp.) 1.537 Popidus (4 esp.) 612 Pinus (17 esp.) 1.100 Prunus lusitanica 100 Robinia p. a. crispa-nova . ... 2 Salisburia adiantifolia 31 Taxodium distichum 20 Thuja orientalis 230 16.586 Em 30 de junho de 1875 ficaram exis- tindo nos viveiros, para venda e para plantação das mattas : Espécies florestaes 241 Numero de exemplares .... 41.207 Valores, conforme os catálo- gos da direcção .... Reis 4:036?$Í740 Sementeiras feitas no Choupal Acer (22 espécies), Aesculus (3 esp.), ^Zmis (9 esp.), Amelanchier (2 esp.), Be- tula (12 esp.), Bignonia cataljya, Brous- sonetia yapyrifera, Carpinus (2 esp.), Cai-ya (8 esp.). Ceitis (7 ef;p.), Cereis (2 esp.), Cratcegus oxyacantha, Cytinus laburniim, Fraxinus (15 esp.), Gledits- chia (11 esp.), Juglans nigra, Lirioden- dron (5 esp.), Madura aurantiaca, Me- lia (3 esp.), My rica faia, Pauloicnia im- perialis, Platanus (5 esp.), Populus bal- samifera, Robinia (6 esp.), Salix (2 esp.), Sambucus nigra, Sophora japonica, Sor- bus aucuparia, StercuUa platanifolia, Tilia (3 esp.), iJlmus (2 esp.), Ulex eu- ropeus. Valle de Canas Abies (3 esp.). Araucária (2 esp.). Acácia (37 esp.), Adenostemon fascicula- tum, Arbutus (8 esp.), Banksia (2 esp.), Brachychiton popideum, Cássia (2 esp.), Ceanothus americanus, Cedrela Toona, Castanea americana, CujJressus (47 esp.), Cryptomeria (3 esp.), Cedrus (3 esp.). Coi-nus sericea, Casuarina (8 esp.), Cal- litris (5 esp.), Chamacyparis sphoiroi- dea, Colutea arborescens, Cephalotaxus Fortunei, Damara orientalis, Diospyros JORNAL DE HORTICULTURA PRATICA 239 (9 esp.), Frendia (6 esp.), Fitz-Roya, Fagrce imj^erialisy Glyptostrohus, Ha- kea (21 esp.), Juniferus (47 esp.), La- rix (4 esp.), Lihocedrus (2 esp.), Phyl- lirea latífoUim, Pinus (49 esp.), Quer- cus (13 esp.), Sequoia sempervirens, Sa- xe-Gothea conspícua, Taxodium disti- chum, Taxus Massoni pyramidalis, Thuja (4 esp.), Widdringtonia cupressoides. Em consequência do tempo ou da má qualidade das sementes deixaram de nascer muitas, e outras morreram. A receita (realisada) das mattas do Mondego foi : Do Choupal 2:9875$775 Dos Camalhões 737?5Í170 Dos viveiros 613;fjíõ70 Das motas dos rios e valles 488;5Í400 Total 4?776^õl5 Além d'isto empregaram-se nas obras, ou foram fornecidas gratuitamente a es- tabelecimentos públicos, arvores e pro- ductos no valor de 1:939,;$ 107 reis. O rendimento do Choupal pôde ser classificado da seguinte forma: De madeira para construcção e lenhas 1:865^675 De venda de herva, canas e salgueiros 87j$i910 De renda de terras para cul- tura l:002;5;50õ De venda d'arvores dos vi- veiros 93/^900 De diversas proveniências.. 12;í$í680 3:062;í.'670 De productos empregados nas obras ou fornecidos gratui- tamente 389f$íi70 Total do rendimento do Chou- pal 3:451,^840 Da mesma forma : Total do rendimento de Val- le de Canas 653!Í!670 Dito dos Camalhões 942?$í880 Dito das margens do rio e valles 1:649;ÍÍ138 O cofre do Mondego recebeu, durante o anno, além das quantias mencionadas : De multas por transgressões , do decreto de 26 de de- zembro de 1867 449f$í830 Da importância de obras pa- ra beneficio da agricultu- ra, feitas por conta dos res- pectivos proprietários.. . . 1:762!$!475 — Quando estávamos em Londres, e isto ha bons seis ou sete annos, come- çava-se a arranjar um caminho á mar- gem do Tamisa, que surprehendia na- cionaes e estrangeiros, taes eram as di- mensões que tinha. Hoje lemos no «Gar- den» que esta rua virá a ser o melhor boulevard da Europa, logo que as arvo- res tenham tomado mais algum desen- volvimento. Os de Pariz não serão na- da ao lado d'este. E nós aqui o que fazemos n'este sen- tido? Temos tido uma camará municipal, verdadeira Troppman do arvoredo ! Valha-nos santa Engracia... — Lemos no «Engineer» que o snr. Lostal, empreiteiro de caminhos de fer- ro, de Ferminy, communicou á socieda- de de industria mineral de S^ Etienne, França, os resultados da sua observa- ção sobre os effeitos da cal na preser- vação da madeira e o seu methodo de a applicar. Empilha as pranchas em um tanque, e cobre-as com uma camada de cal viva, que é gradualmente regada com agua. A madeira própria para as minas pre- cisa de uma semana para se impregnar completamente 5 outras madeiras preci- sam de mais ou menos tempo, confor- me a sua espessura. A madeira adquire grande consistên- cia e dureza e nunca apodrece. Tem já sido preparada madeira para muitas mi- nas por este processo, de modo que bre- vemente haverá d'elle larga experiên- cia. Madeira de Faia tem sido assim preparada para cabos de martellos e outras ferramentas, e ficou tão dura co- mo Carvalho, sem perder a elasticidade. Já ha muito era sabido que a madeira se conservava bem na cal ou na arga- massa, mas ainda se não tinha tentado um processo systematico para a preser- var por este meio. — Pela maioria dos nossos agriculto- 240 JOHNAL DE HORTICULTURA PRATICA ros 6 tido como certo que a toupeira é um animal prejudicial aos campos. Ha ainda nHio muito tempo ouviamos dizer a um proprietário das proximida- des da cidade que nào declarava guer- ra a esto maminiíero, mas que um seu visinho nSo podia vôr 03 seus rastos sem que tractasso de dar cabo de quan- tiis toupeiras encontrasse. Dispunha de todas as armas bellicosas para o com- bate, o daqui resultava que tinha as suas terras cheias do bichos que causa- vam grande prejuízo ás colheitas, ao passo que ello — o protector das tou- peiras — estava livre d'aquelle llafícllo. Emquanto a nós a toupeira, se é útil, também p<'>de ser prejudicial sendo mui- to abundante, e o que resta portanto sa- ber-so é para que lado peza a balança. O sábio GeoíFroy Saint-IIilaire asse- vera, e numerosas experiências confir- mam a sua asserção, que a toupeira antes quereria morrer á fome do que comer qualquer substancia vegetal, o que prova que é essencialmente carni- vora. Mr. Selys-Longchamps diz no «Livre de la Ferme» que, logo que se matassem as toupeiras, as raizes ficavam sujeitas a serem destruídas por vários coleopte- ro3 phytophagos. Apesar d'isso é de opinião que se matem nos terrenos em que se semeiam plantas annuacs, mas diz também que reconhece a utilidade d'ellas quando sejam pouco numerosas. llr. Koltz diz que na AUemanha, durante doze ou quinze annos, resulta- ram da destruição das toupeiras prejuí- zos consideráveis nos prados. Mr. de la Blanchère pretende que os cultivadores tirariam grande vantagem o nilo prejuízo protegendo as toupeiras, porque tem como certo que ollas des- troem muitos insectos que são mais pre- judiciaes do que cilas próprias. Mr. Pouchet, uma auetoridade scien- tifica, assevera que a toupeira, depois de ter destruído todos os insectos, bem de- pressa desapparece do campo em que estava, para ir para outro em que en- contre alimento. Citemos ainda a opinião de Mr. A. Dumas, agricultor eminentemente prá- tico. As suas observações tóom-lhc mos- trado que a toupeira ó incapaz de tocar n'uma folha de salada e não estraga as raizes : desarranja-as algumas vezes, é verdade, mas não lhes faz mal. Mr. Dumas dá-lhc vontade de rir quando por ventura ouve alguns agri- cultores queixarem-se dos prejuízos que lhes causam estes mamraiferos, e con- clue por dizer que é um preconceito co- mo muitos outros que existem na agri- cultura. Imaginam os homens do campo que téem toda a experiência e que só ellcs ó que podem decidir d'estes prejuízos, d'estas antigualhas da agricultura. Ricm- se das observações dos entendidos, dos homens de sciencia, porque ignoram que mais vale vôr uma vez e bem do quo muitas e mal. O homem, por menos in- telligente, procura saber a causa de qualquer phenomeno, mas a sua igno- rância leva-o a satisfazer-se com expli- cações, que nada confirmam e que, mais tarde, uma critica mais apurada lança por terra. É assim que durante séculos se téem visto explicados erroneamente muitos phenomenos, que hoje nos pare- cem d'uma evidencia fútil. Quem sabe se acontecerá o nesmo com as toupeiras? Na nossa lavo' ra pe- sa sobre ellas um anathema terrível. Se as pobresinhas estão innocentes, oxalá que a experiência faça o lavrador me- nos cruel. — Commemoramos hoje o VI anni- versario do Jornal de Horticultura Pratica. Congratulamo-nos e congratulamos aquelles que téem cooperado directa ou indirectamente para a sua existência, e, como não ha festa sem banquete, con- vidamos os nossos amigos a que en- cham as suas taças e a que brindem n'este dia pela prosperidade d'este jor- nal. O Chronista pede desculpa aos seus leitores se por acaso não desempenhou cabalmente o seu encargo, e solicita d'elles paciência para o continuarem a soífrer. Já agora, parece que não quer aban- donar o campo. Porto, 30 de novembro de 1875. Duarte de Oliveira, Júnior. 3 5185 00263 2 Jifí— -■'t v\^