"cJ*^^ ^ooiLOk *^a^ iKc^ Ministério da Agricultura, Industria e Commercio p^ i m - mm GÍOLOGICI) í MIIIEHALOGICD D» BIMSIl MAPPA FLORESTAL PELO DR GONZAGA DE CAMPOS .<.^e'^^%. 'X'.yp. (la Dii-ectoria do Sei'vi<.'<> de Kf^l ati^itic^a. Ministério da Agricultura, Industria e Commercio SíiP CÍOlOGItO E MINEfULOeiCO DO BIUSIl MAPPA FLORESTAL PEIvO DR. GONZAGA DE CAMPOS CO |-r^" \ ^ ,1 CD Typ. da 3Z)ii'e i rente nceanica a(|urci(la que, d<> golpho de Guiné, na costa occidental da Africa, vem a i umo de Oeste enfrentar a bocca do Amazonas, é ainda itm transportador de ventos saturados de humidade que com o rumo de oeste pene- tram valle acima, preparados para a condensação, como outra fonte de chuvas. A própria área coberta de extensas mattas, em um solo quente e húmido. é uma grande fonte de evaporação; produz, portanto, vapor de agua sufficiente — 12 — para quasi saturar a atmosphera, ao mesmo passo que a evaporação importa em um resfriamento capaz de condensar os vapores de que se acham carregados os ventos quentes que lhe chegam. Aqui o effeito assume a posição da causa: a matta é causa das precipitações que servem para a sua própria ahmentação e crescimento. De outro lado a extensa e ampla depressão mostra uma declividade minima, offerecendo as melhores condições para a deposição dos sedimentos, constituindo as ricas alluviões que vão fazendo o terraplenamento daquelle vasto pantanal. A bacia é tão ampla que, com o oscillar do sol, as precipitações ora accodem aos affluentes do norte, ora aos meridionaes ; de sorte que as aguas do rio prin- cipal mantêem-se em relativo equilíbrio; e as várzeas e a espessa camada do solo vegetal são sempre abastecidas com o? novos supprimentos das alluviões arrastadas pelas correntes subsidiarias. Eis, portanto, preenchidas as condições mais favoráveis á vida das plantas: um solo rico cercado de grande humidade e calor. E ainda a addicionar uma causa geológica : antiguidade e desenvolvimento ininterrupto da vida tropical. Quanto á extensão dessa área, é realmente enorme. Se contarmos da Ponta dos Mangues- Verdes, no Maranhão, que ainda de facto lhe pertence, até as cabeceiras do Javary, teremos, somente dentro do Brasil, extensão superior a 31° de longitude. E ainda avança para fora de nossas fronteiras, dominando nos valles do Ucayali e do Huallaga e mais para o norte nos do Napo, do Içá, do Uaupés. Como largura póde-se dizer que se estende desde o valle do Uaupés, ou mesmo do alto Orenoco, até os affluentes do alto Madeira e saltando o divisor entre os affluentes orientaes do Madeira, descendo pelos do alto Paraguay, pelo menos até cerca do parallelo de t6°. Representaria uma área totalisada superior a 3.000.000 de kilometros quadrados. Dentro dessa enorme área, diz o grande scientista Dr. J. Huber, natural- mente as diversas condições de solo e clima poderiam differenciar muito os typos de mattas. Uma circumstancia tende, entretanto, para confundil-os : é o aplainado da grande baixada onde predominam as condições de poderosas alluviões. Assim distingue elle : as mattas das aílnviões niaritiiiias ou niangaes; as mattas das alluviões flnviaes (ou das várzeas) e as mattas de ferra firme. Na região costeira e na parte inferior dos rios, cnde actua o fluxo da maré, é a vegetação especial dos mangues que, aliás, tem aqui pouca importância relativa, pela área limitada da sua occupação. Muito mais importante é a malta das alluviões fluviacs, (juc se estende ao longo de todo o Amazonas alé os seus uHinius ariiucnles. Ahi a rií|ucza das alluviões depositadas pelo riu produz a matta da maiur exuberância. No estuário, onde as enchentes pluviaes &ào quasi insensíveis, u estuar da maré, reduzindo a velocidade da corrente, provoca todos os dias abundante sedimentação, e a vegetação ostenta todo o esplendor. Da fóz do Xingu até a do Trombetas (baixo Amazonas), a vegetação empobrece, torna-se de porte mais tacanho e muito menos variada em espécies, — 13 — E' por ali que se accumulam as extensas áreas de campos e de campinas que bordam o rio Amazonas na parte occidental do Estado do Pará. Frecjuentemente as mattas se limitam ás pestanas do rio, isto é, ás faixas um tanto mais elevadas que separam o leito propriamente dito das planícies alluviaes constituídas muitas vezes por depressões onde a agua da enchente se conserva cm lagoas -circumdadas de campos. l\stc processo geral de alluvião c aterramento explica a formação dessas pestanas com as respectivas mattas. Nas cheias a agua torrencial do veio do rio está carregada de sedimentos de diversas dimensões e composição. Quando a corrente transborda para encher as planícies lateraes, ha grande quebra de velocidade e desde logo os sedimentos mais grossos, e em sua maior porção, caem ao longo ■ das margens formando as pestanas mais elevadas e de solo mais rico, ao passo que a pequena porção dos sedimentos mais fnios é que se vae depositar nas depressões onde apenas vingam os campos. Já pela estreiteza da área e pela egualdade de condições se pôde esperar pequeno numero de espécies; assim quasi não ha o desenvolvimento da vegetação inferior ou suh-inatta, o que permitte transitar mais livremente naquelle typo de vegetação. Outra causa concorre para essa inferioridade na vegetação do baixo Ama- zonas : o clima é muito mais secco do que no estuário e no alto Amazonas. As observações accusam em Óbidos e em outros pontos da região, menos de metade das chuvas de Belém, ou do alto Amazonas, na segunda metade do anno, que é a época da secca ; a humidade relativa também é muito inferior. E demais, a grande expansão da bacia, em área descoberta, deixa que os ventos de leste e principalmente os de nordeste, relativamente mais seccos, maltratem essas mesmas mattas de beira rio. Na parte comprehendida entre o Xingu e o Tapajós a acção do nordeste produz as maretas que muito contribuem para minar as barrancas e desarraigar arvores e mesmo trechos da matta. Do Trombetas para a fóz do Jamundá, a vegetação vae se opulentando, ao mesmo passo que os campos se internam, fugindo á beira do rio. Mas é sobretudo a partir da região alcançada pelos abundantes sedimentos do rio Madeira, que as mattas da várzea tomam os seus caracteres mais bem definidos^ e a máxima pujança, desapparecendo quasi em absoluto os campos. () Dr. Huber (63), de quem vimos resumindo, descreve de modo magistral o constante morrer e viver dessa vegetação, em obediência ás leis physicas que governam o traçado do curso das grandes correntes sobre planícies constituídas de alluviões recentes. No oscillar da corrente, as mattas constituídas sobre as ribas mais elevadas vão sendo destruídas pelo ataque mais violento da corrente mais veloz na concavidade das curvas ; emquanto para baixo, e na margem opposta, os sedimentos se accumulam sobre as praias formando terraços de detritos onde a nova vegetação se vae desenvolvendo até que, por sua vez, á montante da praia se estabeleçam as condições de curva concava, com maior velocidade da corrente e comecem os ataques á nova formação. Descreveremos de outro modo o phenomeno importante que a competência tcchnica do Dr. ]1u1)(.t caracterisa admiravelmente, mas que o nosso palHdo — 14 — resumo não esclareceu de modo satisfactorio ; e tentaremos com auxilio da representação graphica. Quando vnn grande rio corre em um valle muito largo ou em uma planície, a fraca declividade lhe não permitte vencer a resistência do material do leito para, aprofundando-o, conseguir a nalnral regularisação da declividade; então começa a constituir meandros alongando o seu curso. ^ Qualquer deflexão no curso, provocada por uma desegualdadc de resistência, torna-se logo a causa dessas sinuosidades, em que a corrente divagante obedece como que a uma oscillação pendular. Na fig. I, vê-se como a corrente do pego, com a sua maior velocidade, querendo, pela inércia, proseguir em linha recta, encontra em A uma superfície de maior resistência, onde se desvia obedecendo a lei physica da egualdade entre os ângulos de incidência e reflexão. Assim vae de A para B e para C, atacando mais violentamente ora uma, ora outra margem. A linha pontilhada representa o caminho mais profundo da corrente mais veloz. Na fig. 2, as curvas se accentuam : a corrosão pela corrente mais poderosa vae comendo as margens nos pontos A, B, E e C, emquanto a porção menos veloz, da agua remansada, vae depositando os sedimentos, quer de arêa, quer de lama, nos pontos D, F e G, onde se formam as praias de arêa e os bancos de vasa. Assim o phenomeno se pôde resumir, dizendo que as partes concavas das curvas são atacadas e vão recuando, emquanto as partes convexas vão crescendo e avançando pelas alluviões depositadas. Em estádio mais adeantado, a peninsula H (fíg. 3) vae se alongando e estreitando em um pedúnculo. Em 4, o pedúnculo é cortado pela corrente principal e, como o declive é muito mais forte, a velocidade accrescida ataca os sedimentos em profundidade, formando a ilha I. Estabelecido o canal rectilíneo mais veloz, a sedimentação na agua remansada da grande volta torna-se mais abundante em J e K, e acaba por destacar o — 15 — lago Iv (fig, 5), que ao depois somente nas enchentes forma nm lago on um canal de conimunicação. Iv a origem das ipiicras, iiciccncras, (Ticté velho, cm S. Paulo) sacados (no rio Purús). Só então pôde o rio escavar o leito, mediante o accrescimo de declive e de velocidade. Este estado de equilíbrio quasi perfeito, ao longo de quasi toda a extensão dos rios, constitue para elles o periodo de maturidade . Estas condições têem siido observadas não somente no próprio Amazonas como também nos seus affluentes mais de oeste, como no Purús, Juruá, Javary, no Ucayali e mesmo no Maranon. A seringueira, a arvore mais importante dessas mattas, aquèlla que tem constituído a principal fonte de riqueza da região, emquanto que é mui frequente nas ilhas e nos affluentes do estuário, quasi desapparece nas várzeas do baixo Amazonas, e ao longo do Solimões e do Maranon. E' principalmente no curso médio e superior dos affluentes meridionaes que ella apparece abundantemente nas mattas de várzea. No caso em que as curvas são mais amplas, os estirões mais compridos mostram maior estabilidade no curso do rio; as mattas da várzea tiveram tempo de evoluir e formar um typo de matta de várzea mais alta, muito mais approxi- mado dos caracteres das mattas de terra firme. Entre os typos communs de matta de várzea, de cerca de 30 metros de altura média, apparecem as arvores gigantescas de 40 e mais metros de altura. A seringueira, bem que não seja muito frequente, attingeo maior desenvolvimento como individuo. Outro característico é a occupação de todo espaço por diversos andares de vegetação, e ainda pelo desenvolvimento dos cipós, no que se appro- xima também das mattas da terra firme. Emquanto as mattas de várzea baixa são relativamente pobres de pal- meiras, podendo ser tomada para característica a palmeira jauary, as mattas das várzeas altas são muito ricas de palmeiras, e pôde ser tomada como caracterís- tica a palmeira urucury, que os exploradores da borracha consideram compa- nheira constante da seringueira. As mattas de terra firme constituem um estádio ainda mais adiantado de desenvolvimento. Não soffrem as destruições pelas enchentes, nem as renovações do solo pelas alluviões que favorecem a invasão de novas espécies sociaes. Já se achavam desde épocas remotas constituídas em associações, de sorte que a lucta pela existência — a concurrencia — ,é muito mais porfiada, as adaptações são mais variadas ; dahi maior accumulação sobre a mesma área, muito maior variedade de espécies e muito mais variedade de madeiras preciosas. As arvores características dessas mattas são a castanheira e o caucho. A altura média das copadas anda por 30 metros, mas de espaço em espaço surgem os gigantes de 50 metros, e de mais. Entre estes figuram principalmente as castanheiras, as sapucaias, os jutahys, os páos-d'arco, os pequiás, as massaran^ dubas, os mirins, os cedros, as andirobas. Numerosíssimas são as espécies de madeiras preciosas da zona equatorial. — 16 — O sábio Dr. Huber (69) sob o titulo de madeiras paraenses enumera mais de 400 espécies. Entretanto, como mais exccllentes pela applicação industrial, cita as seguintes: muira^jinima, iníiirapiranga, tatá juba, casca preciosa, itaúba amar cila, itaúba preta, pão de rosa, louro vermelho, louro branco, louro preto, e mais 15 espécies de louros, (|ue correspondem ás raiirlhis do l'>rasil médio e meridional ; acapú, pão-sanlo, píiu-ró.vo, copaliyba, jntahy, acapuraiia, ipcs, jácarandá-paraensc, cabeça de ncyru, inniracoatiára, cuiiiúrú, inacacaúba, imituty da terra firme, andirá-uchy, sucupira, itaubarana, umiry, páo-amarello, maru- paúba, cedro branco, cedro vermelho, cedro do Amazonas, andiroba, quariíba, cupiúba, umary, páo de jangada, pequiá-êtê, pequiá-rana, bacury, jacaréuba, anany, Sebastião d' Arruda, sapucaya, matamatá, jaraná, tauary, mangue verme- lho; massaranduba, maparajúba, guajarás; frei-Jorge, ciriúba, tarumã, páo-d'arco amareUo, páo-d'arco roxo, parapará, páo mulato, genipapo e outras. O Dr. Huber descreve as mattas do Pará oriental, comprehendidas entre o Tocantins, o rio Pará, o Oceano e o Gurupy, como das mais vigorosas e ricas em madeiras de lei. Também observa que ha mais pujança nas mattas mais pró- ximas da costa atlântica "e nas dos planaltos interpostos aos affiuentes do alto Amazonas, do que nas que se encontram nos do seu curso médio. ■ Outra razão da diversidade de essências nas mattas de terra firme, são as erosões que ás vezes cavam profundamente nos planaltos, produzindo grutas cjue constituem outros tantos habitats dififerentes. Todavia não é sempre fácil distin- guir as mattas de terra firme. Nos espigões interpostos ao Purús e ao Juruá, apesar de que a vegetação differe muito da das várzeas, parece antes que o solo é também de alluviÕes muito mais antigas, actualmente fora do alcance das inundações. Quanto ao crescimento, as arvores de várzea têem-n'o em geral muito mais rápido do que as de terra firme. No PIorto Botânico de Belém uma sumaumeira mede 22 metros de altura e um metro de diâmetro, e tem apenas 13 annos. As mattas da várzea podem refazer-se em cerca de 20 annos. A vegetação de terra firme é de crescimento mais lento; entretanto certas espécies, como os jutahys e piquiás, os cedros, desenvolvem-se quasi tão depressa como as arvores da várzea. No geral as castanheiras, as sapucaias, e principal- mente as madeiras de lei, custam mais a desenvolver-se. B) — As florestas da encosta atlântica Desde a altura do cabo de S. Roque, na latitude de 5°,5 Sul, começa a faixa de mattas costeiras. Porém é principalmente a Sul da barra do rio São Francisco, na latitude de io°,5, que ella toma importância, e ofiferece perfeita continuidade até o Estado do Rio Grande do Sul, na latitude de 30°. Ao longo dessa extensão levanta-se de perto do mar uma encosta mais ou menos alcantilada que dá accesso ao planalto interior. A altura da borda do pla- nalto é muito variável. Na média se pôde considerar de 600 a i.ooo metros. l{m trechos attinge 1.500; e, mais raramente, ha alguns pontos culminantes que se approximam de 3.000 metros. — 17 — E' essa muralha que serve de principal condensador dos ventos geraes de S E, que \ém carregadissimos de vapores arrastados da superfície do Atlântico. E' a zona de maiores precipitações no Brasil. As condições de calor e humidade são, portanto, das mais vantajosas para a vegetação que assim eguala em pujança ás mattas de terra firme da zona equatorial. Como estas, apresenta em geral o caracteristico da máxima variedade nas espécies. Dous elementos, porém, contri- buem ainda para augmentar essa variedade : 1° — Esta faixa muito extensa, correndo por mais de 2']'' gráos de latitude, atravessa regiões caracterisadas por temperaturas médias bastante differentes, nas quaes essa condição preponderante, tem que traduzir-se forçosamente por (lififerenciações na vegetação. Assim, no Recife, a temperatura média, ainda elevada, é de 26"; ao passo que vae descendo gradativamente até o Rio Grande do Sul. Na Bahia é ainda de cerca de 26°. No Rio é de 23°. Em Santos a média annual é já de 22°. E em Pelotas apenas de 17°. 2° — O relevo do solo muito mais accidentado. Grande parte do planalto faz a sua drenagem por essa faixa costeira, de sorte que nella se encontram fundos rasgos e depressões por onde escoam as maiores correntes, tendo produzido largas entradas de relativo aplainamento ; outras linhas de drenagem menos volumosas, apenas fazem sulcos pouco exca- vados onde as aguas descem em successivas cachoeiras ; outros sulcos ainda menos aprofundados representam finalmente as grutas e affluentes secundários. Todas essas formas diversas de depressões, muito differenciadas nas condições da altitude, da constituição do solo, da sua permeabilidade, representam outros tantos difi:erentes habitats para novas formações vegetativas. De um modo geral se pôde logo estabelecer uma differença sensível no porte das arvores, devida á influencia de relevo do solo em relação á luz. Nas mattas de terra firme do Amazonas, o solo aplainado obriga á luta encarniçada pela luz : as arvores ganham em altura sem encorpar muito. Nas mattas da encosta da Serra do Mar, a distribuição por degráos poupa aos vegetaes esse esforço no sentido da vertical, permittindo a cada individuo engrossar muito mais o seu tronco, projectar os galhos desde altura muito menor, e, por conse- guinte, constituir maiores copadas. Assim, cada individuo pôde ter muito maior numero de galhos com abundantíssima folhagem, resultando para essas mattas de encosta, quando olhadas á distancia, a coloração de um verde mais intenso e carregado, e um aspecto muito mais cerrado, dando a idéa de maior impenetrabilidade. A largura média dessa faixa não excederá de 200 kilometros, attingindo em pontos 300 até 350 kilometros. Em geral a niatta avança para o interior até a borda do planalto ; mas nas zonas em que as correntes mais volumosas rasgaram fundo as encostas da serra, como nos casos do Rio Doce, S. Alatheus, Alucury, e mesmo do Jequitinhonha, a matta penetra valle acima, alargando-se muito. No caso do Rio Doce, por exemplo, consegue atravessar a Serra do Alar e projectar-se tanto para o interior, que o seu limite passa a ser constituído pela borda do segundo planalto, o da Serra do Espinhaço. M. F. 3. — 18 — Mais para sul, principalmente nos Estados de Santa Catharina, Paraná e parte sul de S. Paulo, póde-se admittir a continuidade da matta até o sulco profundo do rio Paraná. Com elTcito essa continuidade é algumas vezes estabele- cida ao longo dos affiuentes da margem esquerda deste rio, os quacs, tendo suas cabeceiras não longe da costa, cerca da borda do planalto, e ainda dentro da matta costeira, percorrem em toda a sua extensão os referidos Estados. A principal causa da pujança da vegetação da zona considerada é a abun- dância das precipitações. E mesmo quando não se registrem grandes quantidades de chuvas cabidas, reina sempre abundante humidade pela condensação dos vapores de que os ventos do niar vém saturados. Estes, i^oprando em geral normalmente á costa, sobem a ganhar o planalto e, resfriados pela altitude, vão gradualmente condensando o vapor dagua, em forma de névoas e cerração pelas encostas. Em tcdo caso a quantidade de chuvas, por algumas médias annuaes até agora estabeledldas, vae de i.ioo millimetros no Rio de Janeiro, 1.300 em Nova Friburgo, 2.100 na Bahia, 2.000 em Ouro Preto, até 3.500 em Alto da Serra e 3.600 em Cubatão de Santos (S. Paulo). E' esse realmente o principal factor da exuberante vegetação, a que aliás todas as outras condições extraordinariamente favorecem. O solo é bastante rico. No geral, oriundo da decomposição de rochas graníticas e gneissicas, é bem provido de alcalis. Frequentemente aquellas rochas estão cortadas de outras básicas : dioritas, noritas e diabases, que refinam a capacidade da terra, por maior proporção de alcalis, e ainda pelos oxydos de ferro e pelos phosphatos que .contêem Já vimos quanto as condições de encosta favorecem pela luz. Egualmcnte favorecem para distribuição das sementes, que podem vir descendo até a costa ; e assim haverá ensejo para cada espécie de experimentar quaes os melhores habitats para o seu desenvolvimento. E esta nos parece uma das mais fortes razões para a immensidade de espécies vegetaes que cohabitam na zona. Pois bem, ainda assim ha grande differenciação nas formações quer princi- palmente pelas latitudes crescentes, quer pela equivalente diversidade de altitudes e ainda pelas mais restrictas condições locaes. Assim, a partir das latitudes mais baixas, onde os caracteres da matta ainda se assemelham bastante aos das mattas de terra firme do Amazonas, se vão elles gradativamente dififerenciando até para o extremo sul. Muitos dos representantes da flora do Amazonas têem uma extensão consi- derável ou mesmo occupam toda a extensão da faixa da costa atlântica. As proj)rias palmeiras, as mais caracteristicas das várzeas e planaltos da região equatorial, ofi^erecem muitos representantes na Serra do Mar. O assahy do Pará desce até a latitude de 25°. O palmito occupa toda a extensão, apesar da guerra de extermínio que encontra no emprego como género de alimentação. O tucum ou tucumã, o inajá ou anajá, a mucajá, miicajiiha ou coco de catarrho, a uaricana, a jatá ou plririma, têem grande desenvolvimento. Outras palmeiras constituem typos difí^erentes, como a utilíssima piassava, que pouco se estende para o sul da Bahia, os patys, os gerivás, as hrcjaiivas, cato- léSf airís, os giirirís ou licurís, estes últimos n:a'ls peculiares á formação costeira. — 19 — Entre as arvores de grande porte c, principalmente das que fornecem madeiras valiosas, lembremos os cedros e as cangcranas, grande numero de gcncrcs e espécies de cancUas, os jatobás e os jutahys, os angicos, os louros, que se estendem por toda a zona até as mais altas latitudes no Brasil. Muitos outros typos equatoriaes avançam para o sul, mas não com a mesma gcncralisação : as sopucayas, as sucupiras, os angelins, as copahybos avançam até o Estado do Paraná. Outro? têem muito menor extensão: as massarandubas, os genipapos, o pão de rosa ou Sebastião de Arruda, os bactirys c os bacoparys, os ipcs ou páos-d'arco, os piquts ou piquiás, os rôxinlws, páos-ruxo ou guarabú, o páo de jangada, ou se limitam em extensão ou em numero. E', na realidade, esta a zona mais rica em madeiras preciosas do Brasil. Assim muitos dos typos equatoriaes não somente refinam de qualidade como também se multiplicam em espécies. Os jacarandás mostram muito maior desen- volvimento e variam não somente em espécies como em géneros e abundam principalmente entre 12 e 22°: o jacarandá-prcto, ou cabiúna, jacarandá-rosa, jacarandá-roxo, jacarandá de espinho, jacarandá-tan, jacarandá-violeta, jaca- randá-niocó, jacarandá-banana, etc. Do gruj)o das m.adeiras brancas que contam o páo pombo no norte, apparece o Gonçalo Alves e outras madeiras de lei com elle relacionadas. As canellas tomam grande desenvolvimento em innumeras variedades, algumas do máximo valor, como sejam: canella preta, canella parda, canella amarcUa, canella sassafraz, canella-capitão, tapinhoan, cancUa-batalha, a preciosa einbuia e muitas outras. As goiabeiras e araçás, em geral de pequeno porte, avançando para o sul, desenvolvem-se fornecendo madeiras valiosas : variedades de araçás, gua- rayiivas, etc. Os louros também melhoram em qualidades de madeiras : louro branco, louro aniarcUo, frei-Jorgc. Outros typos apparecem, caracterisando francamente a zona: por cima das altas copas das mattas da encosta e dos planaltos, elevam-se, ás vezes, ao dobro da altura, offerecendo somente nos topos as galhadas que lembram as dos veados, os jequitibás, arvores gigantescas que attingem a 50 metros de altura c três até cinco metros de diâmetro. Ha brancos e rosas. As perobas representam egualmente arvores agigantadas, approximando-se dos jequitibás pelo volume, excedendo-cs no grande valor de suas madeiras. A peroba-rosa, a peroba-revessa, a pcroba-aniarella e o guatambú, cada uma com suas qualidades especiaes, encon- tram o melhor preço nas construcçÕes e na marcenaria. Outros typos característicos acompanham, embora relativamente de menores dimensões, porém, todas de mais subido valor como madeiras de lei : a aroeira do matto, o piquiá-marfim, o vinhatico, o olco-vermelho ou bálsamo, a bicuíba, os araribás, o potumujú. gibatan, cutucanlien, grapiapunha, guapeva, folha larga, mocitahyba, caixeta, páo-ferro, páo-Brasil, uricurana, sobrasil, olandin, iajuba^. grossaliy azeite, buranhcn, arapoca, etc. '— 20 — E mais para sul, desde S. Paulo até o Rio Grande do Sul, os guarantans, passarcúvas, cahreiívas, uvátingas, faveiros, urindiúvas, uvámirins, etc. Pinheiros. — Aqui se apresenta uma notável differenciação, a occurrencia dos pinheiros no sul do Brasil. As mattas de coníferas e de arvores de folhas caducas têeni seu maior desenvolvimento no hemispherio norte; ficam na zona temperada em uma larga faixa que limita com a zona árctica. Nas altas latitudes, as coníferas parecem representar o typo de resistência aos climas frigidos, microthcrmos que não mais permittem a vegetação arborescente. Ali, nas regiõe> boreaes, as arvores de folhas largas, mas caducas, cccupam as planícies e os sopés das montanhas ; as plantas de folhas aciculares, os pinheiros, resistem ao frio mais intenso espalhando-se pelas encostas e pelas cristas das montanhas. Esta seria uma limitação no sentido dos meridianos, provocada pelas condições climá- ticas das latitudes crescentes ; seria um effeito do frio ao approximar das regiões dos tiindras, onde começam as zonas vegetativas polares. Nas zonas temperadas, e mais próximo das regiões tropicaes apparecem os pinheiraes como intermediários entre as regiões de climas marítimos e de chuvas distribuídas por todo o anno, onde vingam as mattas de folhas persistentes, e as regiões áridas ou semi-aridas que soffrem todas as graduações da seccura. Assim acontece na parte occidental da America do Norte, nas encostas da Serra Nevada e das Montanhas Rochosas e do mesmo modo nas encostas de sudoeste do con- tinente Australiano, em Cuba, na Abyssinia, etc. No Brasil, em parte, as araucárias representam este ultimo papel. Nos Estados de Minas e S. Paulo, onde o seu desenvolvimento é muito menor, encon- tram-se nos pontos mais elevados pelas bordas do planalto e nos divisores mais altos servindo como de transição das mattas para os campos que se estendem para o interior. Mais para o sul, do Paraná ao Rio Grande, a faixa dos pinheiros alarga e expande-se em vastas áreas, constituindo grande riqueza florestal, mas sem comtudo constituir mattas puras, como nas regiões septentrionaes do globo ; antes vivem em perfeita sociedade cora muitos outros typos de arvores de grande porte, pertencentes a diversas famílias, dos quaes alguns fornecem as madeiras mais valiosas. O professor Lindman (87), estudando as mattas de araucária no Rio Grande do Sul, considera-as como verdadeiras mattas mixtas, onde apenas os pinheiros predominam pelo numero e principalmente pelas dimensões. Os pinheiros levan- tam as suas copas a 20 ou 30 metros, de sorte que a matta virgem passa a constituir como uma suh-niatta. Entre as arvores maiores e de madeiras valiosas, cita : cedros, angicos, ipés, araçás, camhoatás, guahirobas e outras. No Paraná os pinheiraes encerram grandes quantidades de emhuias, tapi- nhoans e muitas outras espécies de canellas, e também de araçás, guayuviras, guaraiuvas e outras arvores de grande porte. O mesmo facto nota-se no sul de S. Paulo, no districto de Apiahy, onde as araucárias são mais abundantes. Assim os pinheiraes entram justificadamente na convenção das mattas. Comquanto não forme um typo exclusivo de vegetação, a occurrencia do pinheiro 110 sul do Brasil é notável por sua extensão em latitude e por sua — 21 — distribuição que mostra claramente como as altitudes servem de compensação ás latitudes. Com effeito, começam elles na latitude de 20° no Estado de Minas Geraes e avançam até para sul de 30°. Em Minas apenas se apresentam em manchas de pequeno desenvolvimento nas cristas e nas chapadas da Serra da Mantiqueira, sempre em altitudes superiores a i.ico metros. Nas raias de Minas com São Paulo, só se encontram ainda pelos divisores mais elevados. Dentro do Estado de S. Paulo já se contentam com as cotas maiores de 800 metros. Mais para sul, com o crescer das latitudes, vae diminuindo a exigência das altitudes. Nc^ Paraná e em Santa Catharina, onde elles tomam o máximo desenvolvimento, já podem descer até á cota de 600 metros e abaixo e no Rio Grande do Sul á de 500 ou talvez de 400 metros. Na mesma zona dos pinheiros apparece a Jicrva-niate, que representa a segunda fonte de riqueza da nossa industria extractiva vegetal. O mate acom- panha os pinhacs, alargando-se ainda para fora dos limites destes e penetrando na zona dos faxinacs e dos campos, principalmente para oeste e para norte. Emquanto o limite occidental dos pinheiros poderia ser traçado por uma linha próxima do parallelo de 2(f,^ no Rio Grande do Sul, a seguir pela fronteira do Brasil, envolvendo o rio da Paz no Iguassú, o rio Jonghiò no Piquiry, as cabeceiras do Corumbatahy, Therezina no rio Ivahy, o rio das Antas no Tibagy, Thomazina no Cinzas, continuando pela Serra de Paranapiacaba em S. Paulo, e pela Mantiqueira em Minas, os hervaes avançam mais para oeste : saltam a depressão do Paraná, desenvolvem-se no sul de Matto Grosso e na republica do Paraguay; em Minas apparecem muito mais para norte e noroeste, chegando a penetrar em Goyaz, bem que ali a occurrencia seja muito mais rareada e de muito menor importância. C) — As mattas pluviaes do interior A área inteira do Brasil, tomada no seu conjuncto, tem de ser considerada como de clima megathermo. Acabamos de descrever succintamente as duas divisões essencialmente megathermas: a região equatorial e das mattas da encosta atlântica. Seus característicos communs são : ausência de períodos de secca e, em geral, mais de dous metros de chuvas annuaes, a primeira com suas temperaturas médias de 26 a 28" e a segunda abrangendo uma escala mais ampla de tempera- turas m.édias, mas que pouco descem abaixo de 20°. Comprehendida entre essas duas regiões fica uma vasta faixa, mais de um terço da área do paiz, cem a orientação geral de sudoeste para nordeste, onde as circumstancias de clima são outras. E' ainda no geral uma zona megatherma, porém, cem chuvas reduzidas quer ra m.édia annual, quer principalmente na distribuição pelo curso do anno : predominam as chuvas de estações, ás vezes concentradas em r.m prazo curto, de modo que as seccas prolongadas dão a certas zonas 0 caracter dos climas xerophilos. Em toda a vasta faixa ha manchas dessa — 22 — natureza, mas a zona em que as condições de xerophilismo se accentnam fica no extremo nordeste do Brasil, onde o continente sul-americano avança muito sobre o Atlântico, formando como que um hombro massiço. Devido ás variações no relevo, a toda a diversidade de accidentes topogra- phicos, as condições do clima continental do interior do paiz offerccem muitas graduações. Com as scccas mais fortes e prolongadas a vegetação de alto porte vae desapparecendo, ao passo qv.e as hcrvas vão predominando. Com as precipitações pouco abundantes, cu mal distribuidas, cu por um solo incapaz de conservar a humidade, as florestas diminuem de viço, os indivíduos tornam-se muito mais fracos e esparsos, formam-se os cerradõcs, as catandiivas, os faxinaes ; reta- Iham-se, disseminam-se em capões; e, peioradas as condições, vão até o ponto de ficarem apenas arvcretas rachiticas espalhadas nos campos cerrados, ou mesmo desapparecerem de todo, dando logar aos campos limpos. Esta região central do paiz é antes caracterisada pelos campos cerrados; é o typo de vegetação mais abundante ; seriam as savanas tropicaes dos europeus. Entretanto os grandes accidentes de relevo, como as serras, as cordilheiras, as encostas dos planaltos elevados que, como degráos, muitas vezes para o interior do paiz se sobrepõem ao planalto da borda atlântica, são outros tantos factores de condensação produzindo florestas de grande pujança, ás vezes por áreas muito extensas, mas que na realidade constituem apenas manchas locaes sem a conti- nuidade das duas grandes formações primeiro apontadas : são essas que denominamos mattas pluriaes do inferior. Não faremos aqui a enumeração siquer das principaes florestas desse typo. Muito menos tentaremos estudos climatológicos regionaes que determinem e caractcrisem a existência de cada uma delias : fallecem-nos de todo competência e dados para o fazer na grande maioria dos casos. Apontaremos apenas algumas das que têem maior importância pela extensão. Em Minas : as mattas da chamada Serra das Vertentes, que revestem o curso superior do Paraopeba e dos rios Pará, Boa Vista e Itapecirica. As que se estendem ao longo das serras, e divisores elevados nas cercanias das extremas com S. Paulo, revestindo as cabeceiras e as secções mais altas de quasi todos os affluentes da margem esquerda do Rio Grande. As encostas orientaes das serras da Canastra e da Matta da Corda, que se orientam approximadamente a NNE, revestindo as cabeceiras do S. Francisco e o curso de alguns dos seus afí^uentes occidentaes acima do Paracatú. Na encosta leste da parte que lhe cabe no extenso divisor, ou, melhor dito Chapadão das Divisões que forma todo o limite leste do Estado de Goyaz, com o rumo approximado de norte, aproveitam, cm Minas, as cabeceiras e as secções superiores dos aff^uentes mais occidentaes do Paracatú, sendo que o rio Preto é mais favorecido em todo o seu curso, e também as cabeceiras altas do Urucuia. Em Goya:: : o ultimo divisor prolongado a norte, com as denominações de Serra do Duro, e depois Chapadão de Tabatinga, Chapadão da ]\Iangabeira, ofiferece, era de um, ora de outro lado, mas principalmente nas escarpas de céste, zonas de condensação cobertas de mattas. Nas vertentes mais orientaes — 2Z — do Paranan, do rio da Palma, do Maneei Alves da Natividade, do rio do Somno, ccnstilv.cm-se largas mar.chas de boas mattas. E, mesmo mais para céste, em ccntrafcrtcs paralklcs ao sopé do chapadão, pela cccurrencia das rochas eruptivas da terra roxa, a pujança das mattas refina, ás vezes, em faixas orientadas a norte. O dÍ7Í?ôr entre o Paraná e o Tocantins-Araguaya, orientado a NE, offerece nas duas encostas es mesmos resultados de uma condensação mais abundante: na face S E as mattas das cabeceiras do Descoberto, do Areias e dos affluentes mais septentrionaes do Corumbá ; na face N O, as das cabeceiras do Maranhão, do Rio das Almas ; e, mais para S O, as das vertentes do Rio A^^ermelho, do Rio Claro, Cayapósinho, Bonito e Cayapó Grande. Em Matto-Grosso : o prolongamento do mesmo divisor que vimos descre- vendo, bem que cem menor elevação e mais achapadado, avança até as raias da republica do Paraguay ; e por elle occorrem algumas manchas de mattas pelas cabeceiras dos affiuentes septentrionaes do Botas e pelas de outros affluentes cccidentacs do Rio Pardo, e pelas cabeceiras do Anhanduhy e do Vaccaria apparecem faixas de matto na encosta sul do divisor; para norte occupam as vertentes do Taquary e do Coxim, bem como as do Tabôco e do Aquidauana pelas encostas e esporões abruptos das chamadas serras do Amambahy, do Aquidauana e de Maracajú. Mais para norte, as mattas occupam uma faixa quasi continua circumdando a grande depressão eu pantanal do Paraguay. No Estado de Matto Grosso, o pantanal occupa uma área de cerca de 120.000 kilometros quadrados; mas consi- derada a sua área total, incluída a que fica para fora das nossas fronteiras, o Gran-Chaco, representa uma superfície maior de meio milhão de kilometros quadrados que todos os annos fica inundada durante cerca de seis mezes. Sobre a superfície plana de tão grande reservatório encontram seguramente os raios solares e os ventos material sufficiente para evaporar e levar á condensação de encontro ás encostas m.ais cu menos accidentadas que por leste e norte circumdam a vasta depressão, e conduzem aos planaltos que lhe fícam sobranceiros de 500 a 600 metros. A léstc c nordeste do Pantanal, Icvantam-sc os paredões denominados Serra de S. Jeronymo, Serra da Chapada, de Brotas, do Tombador, etc, que não são mais do que as escarpas do grande planalto, eu ara.vá, posto entre os valles do Paraguay e o do Araguaya. A norte fica o outro planalto, também de escarpas elevadas, que faz o divisor entre es affluentes do Amazonas e os do Paraguay : é a Serra des Parecis, do Tapirapuan, do Diamantino, Serra Azul, etc. Esses chapadces elevados são apenas cobertos de uma fraca vegetação: covpos cu cavipos cerrados. Em muitos pontos apresentam largas manchas de rochas de grcz, ou de arcacs descobertos. Tacs condições facilitam o exagero das temperaturas extremadas não fomente entre o verão e o inverno, como também entre o dia e a noite ; c assim se criam alternativamente centros de alta e baixa pressão que era predominam r;a formação dos ventos rcgicnaes, ora apenas modificam a direcção e intensidade dos ventos geraes. -~ 24 — O Pantanal actua como um pequeno mar mediterrâneo em relação ás encostas e elevações do seu litoral. E assim dá também legar a grandes variações no typo da vegetação. A nós se nos afigura que ali se vão limitar e confundir os typos mais salientes da vegetação brasileira. Em todo caso pelas encostas corre, com maior ou menor desenvolvimento e continuidade, uma zona de mattas, distribuída pelas cabeceiras do Taquary, pelas vertentes e cursos superiores de todos os principaes affluentes do São Lourenço e pela encosta oriental do vallc do rio Cuyábá. Na encosta do divisor dos Parecis, é a grande matta que vae pelas vertentes do Paraguay, no Sant'Anna, no rio dos Bugres, no Bracinho, no Rio Branco, no Sipotuba, no Cabaçal, no Jaurú, a emendar em continuação pelos afifluentes -orientaes do Guaporé descendo a terminar nas campinas e brejaes da margem deste rio. E esta mancha de floresta não é mais do que o prolongamento da formação equatorial, da Hylca, a morrer no Pantanal. Ella avança, em perfeita continuidade e com todo o desenvolvimento e pujança, entre o Guaporé e o Gyparaná, cobrindo toda a área do alto divisor que vae defrontar a barra do Beni, e desce então pelo Madeira e pelo Amazonas. Nesse ponto, pela fronteira do Brasil, essa elevação notável faz como um hombro de algimi modo symetrico ao que na costa avança pelo mar perto do cabo de S. Roque. Si o apontamos é apenas pela disparidade impressionante : na costa em vez da matta é a região semi-arida de clima xerophilo ; no sertão em divisor elevado é a matta vigorosa. Tanto assim que aquella região era presupposta e figurada coberta de campos; somente agora os valiosos trabalhos de Rondon vém accusar as riquezas lá existentes e a continuidade das mattas amazonicas descendo ao Pantanal de Matto Grosso, pelo menos até o parallelo de i6°. Que esta grande faixa de matta está ligada á formação amazonica, refere- nos o notável botânico Spcncer Moor (loi), que a estudou em afíluentes do Paraguay, e na Barra dos Bugres (Santa Cruz), cerca do parallelo de i6°. Nos seus estudos encontrou ali as seguintes porcentagens para a? floras que toma como typos : 0 0 Tropical americana de diíTusão 37 Commum ás duas provincias (norte e sul) 28 Brasil septentrional-Guyana 19 " Sul 13 e conclue : flora mixta em que predominam os typos do norte. Deve ser incluída nos limites da Brasil septentrional-Gtiyana. Assim, pois, a ultima faixa que descrevemos a norte do pantanal, botanica- mente deve fazer parte da floresta equatorial. Nella encontra variada e rica messe a industria extractiva: além das madeiras finas e de construcção muito valiosas, ha seringaes e uma planta medicinal de alto preço — a poaia. Em 6". Paulo: caminhando a rumo de céste, galgada a borda do planalto onde terminam as mattas ruaritimas propriamente ditas, a vegetação muda e é somente após uma faixa de cerca de 150 kilometros de largura, de campos e — 25 — cerrados, que se levanta o paredão do segundo planalto a declinar para o rio Paraná; nessa encosta, de 200 a 300 metros de elevação, denominada Serra de Botucatú, de S. Pedro, de Brotas, do Rio Claro, de Araraquara, de Jaboticabal, costitue-se um segundo condensador de precipitações, dando origem a uma nova formação de floresta. Os ventos geraes (alisios) de SE, saturados dos vapores do oceano, vém animados de forte velocidade ; encontrando o obstáculo dos attritos na Serra do Mar, têem necessidade de maior secção para a sua vazão ; a secção só se pôde desenvolver em altura ; o vento sobe, expande-se, resf ria-se e os vapores se condensam : é a origem das mattas da encosta atlântica. Aspirados pelos centros de depressão dos campos aquecidos, onde a evaporação é muito mais forte, descem e, tomando maicr velocidade na superfície relativamente lisa dos campos, vão repetir o mesmo phenomeno da Serra do Mar nos paredões do planalto de Botucatú, bem que em menor escala, produzindo precipitações muito menos abundantes, e portanto uma vegetação um tanto mais secca. E o mesmo pheno- meno se estende ás encostas do planalto que descem aos valles fundos das correntes principaes que sulcam o Estado nos rumos de NNO, NO e O, desde o Rio Grande, Sapucahy-mirim, Pardo, Tietê até o Paranapanema. Avançando mais para céste, outro paredão de menor vulto se levanta de cerca de 100 metros, depois de uma faixa de 80 kilometros de largura média, também no geral occupada por campos e campos cerrados. São as serras do Mirante, dos Agudos, Bauru, Dourados, Ribeirãosinho, Monte-Alto e, já fora do Estado, os paredões do sul do Triangulo Mineiro. Ali os mesmos phenomenos de condensação se repetem, porém ainda muito mais apoucados. E a faixa de mattas muito mais seccas espraia-se em admirável continuidade até o sulco do Rio Paraná para oeste e até perto do do Paranapanema para sul. No Paraná e Santa Catharina: condições análogas se reproduzem. Por sobre o planalto da encosta da Serra do Mar, vém primeiro o degráo da Serrinha em continuação da Serra de Paranapiacaba e, mais para céste, o segvmdo degráo da Serra da Esperança: são outros tantos condensadores dos últimos efFeitos dos alisios de sudeste ; e, depois do ultimo degráo, a vegetação florestal estende-se cem poucos intervallos e modalidades até a depressão do rio Paraná. No Rio Grande do Sul a faixa de florestas da encosta marítima estreita-se e inflecte-se para céste: o degráo, em vez de parallelo á costa, é agora dirigido léste-céste, constituído pela escarpa do planalto que olha para sul; é uma vasta área de mattas vigorosas que revestem as vertentes septentrionaes do rio Jacuhy e as do Ibicuhy, e avançam com interrupções até o rio Uruguay. Propositalmente reunimos aqui as mattas pluviaes do interior dos quatro Estados mais meridionaes do Brasil, justamente aquelles onde as mattas avançam com grande desenvolvimento para o interior em uma faixa de 600 kilometros de largura a contar da costa. E' essa uma zona de transição: as isothermas vão cahindo para baixo de 20°; a latitude já se vae approximando do limite sul dos alisios para entrar no dominio das calmas e dos ventos geraes de oeste que deveriam trazer antes a seccura e o frio dos Andes ; as chuvas deveriam, portanto, diminuir e se ir tornando gradativamente chuvas hibernaes. Taes condições dão iSI-F.4. — 26 — antes a esperar a vcgetac;ão dos climas mesotlionnos, entremeadas com a dos climas xcrophuos. Aliás todos esses factos são mais ou menos accusados pelos escassos conhecimentos adquiridos sobre os elementos climatológicos daquella vasta região. Não deixa, portanto, de causar extranhcza a occurrencia de grandes florestas, accusando abundante irrigação, bem que localmente, aqui c ali, se manifestem as consequências do xerophilismo. As principaes causas desse feliz predicado devem ser buscadas já fora dos limites do Brasil : i^ — Uma condição geral : a pequena massa continental da ponta adelgaçada da America do Sul, em meio do immenso oceano moderador do exagero dos climas. 2* — A depressão vasta, ampla e aberta que das planícies da Patagonia se estende pelos pampas da Argentina e pelo Gran-Chaco e pantanaes do rio Paraguay, e ainda pelo rio Paraná acima formando a costa occidental dos quatro Estados meridicnaes do Brasil e a sua respectiva posição no sopé oriental do gigantesco paredão dos Andes. Estas grandes planícies de mui fracos accidentes e quasi despidas de vegetação, offerecem caminho franco á passagem dos ventos que com maior intensidade podem actuar sobre o clima dos referidos Estados, bem como sobre o da republica do Paraguay e o da parte sudoeste de Matto Grosso, principal- mente daquella que se debruça para o pantanal. Em meio, e para oeste dessa região baixa e aplainada, íica, entre os parallelos de 26° e 32°, á meia distancia entre o curso do Paraná e a costa do Pacifico, uma curva fechada que representaria o equador thermico de 30° no rigor do verão (Janeiro). E' esse um grande centro de baixa pressão capaz de produzir verdadeiros ventos de monsão. No estio auxilia e vivifica os ventos geraes marítimos, fazcndo-os portadores de maior quantidade de agua para a superfície dos quatro Estados. Ao mesmo tempo, com o seu poderoso gradiente, provoca os ventos de NE c principalmente os de NO. Estes últimos que passam por scbre os planaltos interiores muito aquecidos, são quentes e de grande capacidade de absorpção ; como essa é a época mais chuvosa no Brasil central, vem sempre mais ou m.enos carregados de vapor; encontrando os ventos marítimos de SE e de S, com temperatura muito inferior, condensam o vapor em abundantes precipitações. No inverno, emquanto que a grande área de alta pressão do Atlântico sul expande-se para céste e vem occupar bôa parte do território brasileiro princi- palmente para sul do trópico, produzindo ventos de NE, N e NO, as grandes planícies do sul e os pampas, muito mais resfriados, estabelecem um gradiente para os ventos de sul que vão encontrar os de N e NO, produzindo nelles a precipitação dos vapores pelo seu resfriamento. Estas condensações podem dar em resultado chuvas cu apenas orvalho e nas chapadas mais altas contribuir para as geadas cv^ niesmo para a qréda da neve. Outras vezes o vento sul impetuoso vem trazendo as tempestades, tanto mais attenuadas, quanto mais . avançam para o norte. Ou ainda se apresentam os ventos frios e constantes de — 27 ~ céste (mhmanos), qne somente se tornam mais sensíveis nas regiões mais meridionaes do Brasil. Se ajuntarmos ainda uma circumstancia do relevo do solo: a depressão do sulco do rio Paraná, com a ccrrelallva pequena altitude (de loo a 300 metros) das terras que o avizinham, que muito contribue para restituir á região tempe- rada as qualidades trcpicaes, teremos a explicação da occurrencia tão desenvol- vida das mattas no Brasil-sul, e mesmo no território do Paraguay ; a ponto que nos três Estados de S. Paulo, Paraná e Santa Catharina prevalecem de muito sobre as formações campestres. Até aqui viemos considerando tão somente as influencias climáticas. Com as variações rcgionaes e locaes destas, constituem-se muitos e diversos typos de vegetação especial, que recebem do povo, na sua linguagem expressiva, denomi- nações caracteristicas. Apontaremos adeante algumas dessas. Entretanto outras circumstancias das qualidades e composição do solo rela- tivas á natureza e composição das rochas vém, ora favorecendo, ora contrariando as condições climáticas, estabelecer novas differenciaçÕes representadas em outras tantas sociedades, communhões, ás vezes até mesmo jamilias ou simples espécies vegetaes. E, si a todas essas impulsões pcdessemos juntar as origens geológicas dos diversos grupos, as suas migrações, as inclinações ancestraes, as adaptações ao meio, e as transformações soffridas até o estado actual, teriamos o estudo completo de todas as variedades florestaes do paiz, pois que é justamente nas mat- tas pluviaes do interior que ellas se apresentam mais numerosas e multiplicadas. A faixa de mattas da encosta do segundo planalto em S. Paulo, nos divisores principaes, onde o primeiro planalto não tem sido muito escavado pelas aguas volumosas, é no geral estreita e limitada ; porém, nas grandes depressões ella se diííunde e alarga pelos valles das maiores correntes e dos seus tributários e toma tal desenvolvimento que, ás vezes, por elles se alastra em continuidade, quer subindo a encontrar as penetrações da. matta marítima, quer descendo a misturar-se com as florestas que se originam nos pendentes de terceiro planalto. Foi ahi que se avolumou assombrosamente a cultura do café : as mattas desappa- receram e as indicações do mappa não correspondem á actualidade. S. José do Rio Pardo, Ribeirão Preto, Santa Rita do Passa-Ouatro, S. Carlos do Pinhal, Ribeirão Bonito, Dourado, Bocaina, Jahú, Dous Córregos, S. Manoel, Botucatú, Avaré, Pirajú e Fartura, marcam os grandes centros dessa zona, que continua a ser o thesouro de S. Paulo. Os pontos, bem raros, onde pelos altos dos espigões, ou em alguma encosta mais aprumada, escaparam amostras da antiga vegetação. as perobas e os jeqiiitibás collossaes, agora muito rareados no meio dos cafezaes, attestam a pujança daquellas mattas desapparecidas. No geral pouco podiam invejar ás mattas da encosta atlântica. São realmente um pouco menos ricas de humidade : as madeiras de construcção apresentam muito mencr numero de espécies, porém as que se apresentam refinam em qualidades. As arvores são no geral mais altas e mais direitas, principalmente onde o solo é mais aplainado. • Os cipós e as palmeiras são menos abundantes do que na encosta marítima, .e — 28 — bem assim as arvores e arbustos da sub-matta. São essas algumas das condições generalisadas, mas que offerecem muitas modificações. Com effeito, a constituição geológica ali vale por muito. São camadas quasi horizontaes de um grez argilo-silicoso, alternando com Icnçóes de augito- porphirytos, e permeiadas de outras rochas da mesma composição chimica destas ultimas. E' a alteração atmospherica dessas rochas eruptivas que produz a terra roxa, o melhor íihi descoberto para o café. Pela maior resistência das rochas eruptivas, ficam os divisores mais altos e os espigões secundários geralmente constituídos por ellas ou pelas terras de sua decomposição; no grez e nas fracturas talham de preferencia as correntes os seus cursos; e os productos das duas rochas misturados no carreto vão para as baixadas dos rios maiores, onde constituem ainda um solo vegetal de primeira ordem. Assim, como era de esperar, nas plagas de terra roxa em geral a matta é muito mais vigorosa; emquanto nos detritos do grez é muito mais fraca, e frequentemente medram os campos. Nem por isso daqui se deve deduzir uma preferencia das vantagens chimicas do solo sobre as condições phj^sicas e climáticas. Em muitas localidades, principalmente quando as aguas ou os ventos tenham arrastado os detritos, adelgaçando muito a camada de terra que cobre a rocha, se encontram vastas extensões de campos de terra roxa. Principalmente por causa das altitudes, que os tornam mais immunes das geadas, foram os cafezaes plantar-se de preferencia nas encostas e espigões, subsistindo hoje quasi que somente as poucas mattas mais perto das correntes. As madeiras de construcção e marcenaria mais abundantes são : a peroba, o jequitibá, a cahreiiva, os jacarandás e ipês, e algumas canellas. São também muito frequentes os angicos, tamboril, jatobás, amendoim, copahybas, canna- fistuJa, aroeiras, orindiúva, gibatan, araruva, bicuiba, cedros, cangerana, sagna- ragy, massaranduba, peito de pomba, guajissára, grwnichaba, guamixirn, cambuhy, coatigiiá, guarantan, carvalho, capixinguy, avatinga, vassatonga, caixeta e muitas outras. Por essa lista resumida vê-se logo não somente que por ali não apparecem. muitas madeiras valiosas da matta da costa atlântica, como também que a grande maioria das enumeradas são antes próprias de terrenos mais seccos, sendo que algumas se desenvolvem mesmo habitualmente nas regiões campestres. Cerradão — O terceiro planalto do Estado de S. Paulo, que regula por uma altitude no geral inferior a 600 metros na borda, declinando para céste até a de 200 a 300 metros na margem do rio Paraná, é constituído por outra formação geológica e assim apresenta novas condições e novos typos na formação vegetativa. A rocha é um grez de cimento calcareo, contendo concreções e massas de um calcareo mais ou menos argiloso. Essas massas ora pouco avultam, e são irregularmente distribuídas, de modo que a desagregação do grez produz um solo, frouxo, de terra branca arcenta; outras vezes o cimento argilo-calcareo predomina, a rocha é mais resistente : a sua decomposição dá um solo menos — 29 — permeável e mais rico, geralmente colorido por um pouco de oxydo de ferro que o calcareo contenha. E', pois, esse o solo que forma as chapadas e os divisores mais elevados. Assim ha todos os motivos de esperar per ali mattas ainda mais seccas do que no segundo planalto : menores precipitações, ausência da rocha eruptiva que dá o solo muito rico e a consistência arenosa permeável dos detritos do grez calcareo. E a natureza da rocha parece ali bem a determinante distribuidora da vegetação. Nas chapadas, nos divisores e nos espigões mais largos e mansos, a vegetação é vigorosa; são verdadeiras mattas, bem que menos pujantes do que as da zona marítima e as ultimas apontadas. Nas encostas, nas depressões, nos valles secundários, a vegetação é sempre mais fraca, vém dos cerradões, passam a cerrados, e nas baixadas são campos mais ou menos limpos. Ha nisso uma inversão das regras geraes e o facto toma importância pela grande extensão da área em que é observado. E' uma larga faixa que abrange os divisores entre os rics Pardo e Turvo do Rio Grande, entre o Turvo e o Tietê, comprehende as baixas do Aguapehy e do Peixe e os cursos altos dos affluentes do Paranapanema até encontrar as vigorosas mattas do valle deste rio. Seu limite oriental seria uma curva muito sinuosa a começar de perto de Barretos, envolvendo todos os afPiuentes do Turvo, a passar por Monte Alto e Ribeirãosinho, approximando-se de Mattão, envolvendo os cursos médios dos rios Itaquerê, S. Lourenço e o Ribeirão dos Porcos, atravessando o Tietê na Barra do Rio Três Pontes, envolvendo o rio Batalha e as suas cabeceiras e inflectindo-se então para oeste, a seguir pelas encostas meridionaes da chapada que divide as aguas do rio do Peixe e do Santo Anastácio das do Paranapanema. Para céste somente termina nas proximidades do rio Paraná, onde a fertilidade das alluviÕes provoca o vigor das mattas ou, mais commummente, uma faixa de inundações periódicas mantém uma vegetação campestre e rachitica. A proporção das chuvas é por ali sempre maior no planalto do que nas baixadas dos rios. Entretanto, parece que a inversão no distribuir o poder vegetativo deve antes ser attribuida ás diííerentes condições de permeabilidade do solo. Nos altos espigões aplainados a camada impermeável retém a humidade e cria as mattas ; nas encostas degradadas pelas erosões, a humidade encontra mais fácil escoamento e a areia do grez depositada forma um solo mais pobre para os cerradões; nas baixadas mais extensas ficou somente a areia capaz de alimentar os campos e cerrados, emquanto que o material argilo-calcareo suspenso e dissolvido nas enxurradas se foi depositar muito mais longe nas alluviÕes dos grandes rios. E estes factos parecem apontar uma deducção geral muito importante : emquanto as condições climáticas são muito favoráveis, as qualidades do solo pouco mostram a influencia; peiorados os elementos da humidade e clima, começam a prevalecer as qualidades do solo. O cerradão é matta mais rala e fraca ; os indivíduos têm porte menos elevado, que em geral não excede de 12 a 15 metros; no desenvolvimento dos indivíduos, como na limitação das espécies, accusa uma bòa dose de adaptação aos climas xerophilos. O que os caracterisa especialmente é a inclusão de — 30 — manchas e fitas dos verdadeiros cerrados com todos os caracteres da formação campestre. Entretanto, é ás vezes bem difficil de traçar o limite entre a matta e o cerradão, qr.e muitas vezes constitua uma transição gradual e insensivel. Assim, a succinta lista das madeiras e typos vegetaes mais aproveitáveis inclue tambcm as que habitam nas mattas dos divisores. Sãoelles: leiteiros, faveiros, sucupira, alecrim, angico, barbatimão, copahyba, jatobá, jatahy, tamboril, bico de pato, cancUas de varias espécies, guarayuva, goiabeira do matto, jabotica- heiras, giiarantan, guarita, piqiiiá, peito de pomba, açoita-cavallo, genipapo, pi)idahybas, ipcs, caixeta, paineiras, jaracatiás e outros. Como caracteristico mais acccntuado de xerophilismo, occorre na zona, principalmente nas encostas que vertem para a margem direita do baixo Tietê e nas que formam o valle do rio S. José ou dos Dourados, em alternação com os cerrados, um typo de vegetação especial que ali denominam quissassa, e que lambem apparece algumas vezes no meio do cerradão. A quissassa é um cerrado sujo, embastido de uma vegetação de pequeno porte, de lenho duro e galhos retorcidos, sem folhas, tramado de plantas e cipós espinhentos. E' bem semelhante aos taboleiros e carrascos das chapadas seccas do interior do Brasil; lembra as caatingas das zonas do nordeste que padecem das seccas periódicas. Entretanto, a zona é recortada de cursos de agua pequenos mas perennes. Nas baixadas são brejos extensos cobertos de capituva e eapim-fle.va, alinhando-se pelas encostas moitas e renques de coqueiros de macahuba. Catanduvas — Principalmente na passagem das mattas da encosta atlântica para as zonas camipestres do planalto apparecem as catanduvas, mattas ralas, compostas geralmente de arvores esguias e de ramos tortuosos, com pequena camada de hiimns e algumas vezes com tapete de capins ou de gramas rasteiras. A denominação tanto se applica á vegetação como á terra que no geral é secca e arenosa. O caracteristico geral é que, uma vez derribada e queimada a catanduva, não somente as culturas são pouco productivas, como também o matto que vem depois é muito fraco, principalmente constituído de plantas espinhentas, taqnaris e certas crisciumas, e que, por uma segunda roçada e queima, passam expontaneamente ao dominio das gramíneas e mesmo da vegetação campestre. Os cipós enrediços que vão ás copas das arvores buscar luz na matta virgem, não existem nas catanduvas, ou então ficam pelos claros em meio das arvores, porém já com o porte de arbustos. No geral as madeiras são menos resistentes e approximam-se do typo quebradiço da mór parte das arvoretas dos campos cerrados. Entre ellas abundam os angicos, o jacaré, a copahyba; apparecem também algumas madeiras de lei e de construcção, em geral, porém, pouco desenvolvidas : sucupiras, faveiros, canellas, jacarandás, guaraiúvas, etc. Este typo de vegetação que se assemelha um tanto aos cerradões, não tem, entretanto, a mesma importância pelo desenvolvimento areal, pois que se apre- senta cm manchas e tiras no geral de pequenas dimensões. Faxinai — E' uma denominação que começa a achar emprego somente a contar do extremo sul de S. Paulo e dahi pelos outros Estados mais meri- — 31 — dionaes. Póde-se dizer que são as catanduvas do sul. Entretanto, destacam-se pela predominância nas grandes altitudes, obedecendo assim antes ás regras da occurrencia dos pinhciracs, que realmente acompanham. Nas florestas de pinheiros, quer pelas orlas, quer constituindo a sub-matta, fica uma associação rarefeita de vcgctaes de porte reduzido, de lo a 12 metros de altura máxima, em geral de troncos direitos e de ramos tortuosos. A vegetação inferior é, como nos pinheiraes, pela mór parte de sub-arbustos e de gramíneas. O faxinai cstende-se frequentemente para fora dos pinhaes a emendar com a vegetação campestre . O característico dos faxinaes é que depois da derribada e queima vem a vegetação campestre. E' principalmente no meio dos faxinaes que se encontram as arvores do matte ; e pela queima dos faxinaes os hervaes desenvolvem-se consideravelmente. As arvores dcs faxinaes apresentam em geral o caracter de mais quebradiças; e ainda nisso acompanham os pinheiros. Ou seja pela vege- tação mais rareada, ou pela própria consistência das madeiras, o certo é que durante es vendavaes de sul é muito perigoso penetrar nos faxinaes, onde os pinheiros se encontram mais esparsos. Entretanto, dentro dos faxinaes occorrem madeiras preciosas : as emhuias são frequentes, como muitas outras espécies de cancUas, gítarayúvas e mesmo cedros. Os faxinaes apparecem no sul de S. Paulo, desenvolvem-se muito no Paraná, não somente pela borda do planalto próxima á encosta atlântica, como em grandes manchas nas encostas que vertem para o alto Iguassú e ainda transbordam para céste e nordeste dcs limites occidentaes que apontamos para a zona dos pinhaes. Em Santa Catharina occupam principalmente as grandes altitudes, para cima de i.ooo metros. No Rio Grande do Sul constituem manchas no planalto, e apparecem na larga faixa matteada da encosta do planalto, nas escarpas e picos onde o grez é mais desnudado. Na parte sul, mais aplainada da campanha do Rio Grande, os faxinaes se apresentam pelas coxilhas ccmo transição para as mattas arbustivas e capões que ficam nas depressões da extensa região campestre. D) — As mattas ciliares Desde que a chuva média annual se torne escassa c a temporada secca se apresente muito prolongada, a matta se limita á faixa que acompanha os rios e seus aftluentes. Subindo para as encostas, a vegetação enfraquece e é no geral, de eerrados ou de campos, emquanto nos planaltos predominam os camyos-cerrados, mais raramente os campos limpos. E' este conjunto de vegetação que cobre a maior parte da área do Brasil Central. Em approximação grosseira podemos dizer uma grande faixa orientada de SO a NE, tendo para eixo uma linha tirada do pantanal de Aíatto Grosso ao Cabo de S . Roque, com a extensão de 20 a 25° e uma largura média de 10 a 15°. No meio dessa vasta área ficam as estreitas fitas que também entram na convenção das mattas. — ^2 ~ De um modo geral se pôde dizer que a largura das faixas de mattas beira-rio é proporcional ao volume de agua das correntes. Assim, essa largura é muito variável, desde dezenas de kilomctros até somente dezenas de metros. Naturalmente a maior quantidade de agua e humidade embebida no solo nas planícies e encostas marginaes dos rics é um poderoso factor para conservar a vegetação. Outro motivo muito plausível é o que dá Liais (76) : as fortes neblinas e condensação dos vapores no fundo dos vallcs durante os períodos de secca : a agua mantém uma temperatura muito superior á do ar ambiente nas primeiras horas do dia; os vapores que se levantam dá camada liquida condensam-se ao contacto do ar mais frio ; e assim supprem diariamente ás necessidades das plantas. Muitas outras condições, porém, quer as da composição, quer as da textura e permeabilidade do solo, contribuem para a grande variabilidade no desenvolvimento dessas mattas de beira-rio; frequentes vezes a vegetação campestre, ou outra paludosa, avança até ás margens, e as occupa por largos trechos. Nos rios mais volumosos, quando a planicie se abre em várzeas, a fita de matto occupa geralmente a faixa de terrenos um tanto mais elevados que encaixam a corrente; por traz estendem-se os campos ou as vegetações paludosas de perys e de tabiías, também cercadas de mattas nas suas orlas mais elevadas. Falando do Amazonas, indicamos a formação das mattas nessas pestanas dos rios, dahi a denominação de mattas ciliares. Attendendo á origem, e em correspondência á denominação empregada de mattas pluviaes, poderiam ser chamadas mattas de condensação. Entre nós tem sido mais empregado o termo matta de anteparo. Os botânicos europeus adoptaram mattas em galeria. A constituição dessas florestas é muito diversificada. Um caracter geral é o que já foi apontado nas similares do Amazonas: menor variedade de espécies e a qualidade de mattas limpas, quasi sem vegetação inferior. Generalisando mais, poderíamos attribuir-lhes uma composição muito approximada á das mattas pluviaes. Comprehende-se, todavia, que sobre uma tão vasta extensão do continente, cem as condições de clima e solo tão variadas, as associações vegetativas formadas em grupos de limites tão restrictos hão de ofl^erecer na sua composição uma variedade quasi infinita. Na immediata visinhança das correntes a vegetação toma typos especiaes. Nos rios maiores são as figueiras gigantescas e as ingaranas que vém banhar na agua as pontas dos seus ramos; em outros pontos os angicos e as canellas, com espessas cortinas pendentes de cipós e de plantas enrediças, semelhando impenetráveis as mattas marginaes que, ao contrario, são sempre de mais fácil penetração. Nos rios menos volumosos é muito frequente a occurrencia dos taquarussiis e taquarys, que ás vezes formam verdadeiras abobadas sobre o leito da corrente. Com o alargar das fitas de mattas beira-rio, tomam ellas maior vigor e oííerecem já abundante material de construcção. Pelas orlas do baixo Tietê encontram-se : aroeira, faveiro, sucupira, peroba, ipês, cedros, guajissára, ol'eo vermelho e outras. — 33 — Lindman (87) descreve as mattas do Jacuhy, ora em grande largura c ricas de todos os vegetaes das florestas da encosta do planalto, ora reduzidas a uma faixa estreita com figueiras, matta-olho e salsos; em outros pontos mattas paludosas cobertas de epiphytas, ás vezes cheias de taquaraes formando arcadas para o rio. Arrojado Lisboa (89) aponta no planalto sul de Matto Grosso as seguintes madeiras valiosas : aroeira, piúva, cedro, angelim, tamboril, óleo vermelho, peroba, guatarnbú, amendoim, jatobá, jequitibá, louro preto, angico da matta, etc. Pelas margens do Paraguay, descreve Spencer Moor : (loi) "desde a fóz do Apa até Coimbra estendem-se as mattas exclusivamente formadas da palmeira carandá, ás vezes com largura considerável; sobre as margens Cássia e Mimosa, com Malvaceas, Ipoméas trepadeiras, e muito proeminente na paizagem {^Tabebida Avellancdce, Lorentz), Lcpacho dos paraguayos. E, subindo o Cuyaba, á beira do rio, a Alclioniea Castanoplia, A. Juss. (espécie de salgueiro) por toda a margem." No curso médio do S. Francisco (i): "A vegetação das margens (tanto no S. Francisco como no Araguaya) é ás vezes estorvada pelos depósitos de inundações annuaes : este alagadiço é formado no S. Francisco por espinhosas bauhinias, algumas espécies da acácia, triplaris, cistus, etc. Myrtaceas, jacarandás, e psidios, occupam as margens mais elevadas, destacando-se aqui, como no Amazonas, o tronco branco e as folhas singulares da embaúba. No alto Araguaya a vegetação das margens compõe-se, segundo Weddel, de um Croton e de um Psidium; na areia das margens, de uma Cássia, de uma synantherea de flores que cheiram a baunilha, e duas ou três gramíneas. x\s mattas no Araguaya constam de mimosas, casalpineas, grandes myrtaceas, bombaceas, bigoniaceas, itrticaceas, Cedrela brasiliensis, Shijins aroeira, páo-jangada, (Apeiba Tibourbou), etc. Entre as palmeiras notam-se principalmente o indayá (Attalea humilis, M.), e o inajá (Maximiliana, regia, M.)". Capões — Alais reduzida ainda é a extensão deste ultimo typo de mattas, verdadeiras ilhas em meio dos campos, onde a diííerença da vegetação se accentúa çla maneira mais nitida. Em geral, próximo ou nas cabeceiras dos córregos, ás vezes ao longo, formando ilhas alongadas, mais raramente occupando somente uma das encostas, accusam sempre elles uma accumulação de humidade. A vegetação dos capões, principalmente a dos de área extensa, é bem semelhante á da matta-virgem. Entre as arvores grandes apparecem madeiras valiosas : cedros, cangerana, cabreúva, guarapiapunha, canellas de diversas espécies, camboatá, angicos, guabiroba, açoita-cavallo, etc. A sub-matta apresenta a mesma constituição que nas florestas : densa e composta de arbustos e hervas de sombra. Apenas nas orlas a vegetação rarêa, passa a arbustos de ramos curtos e mais contorcidos ; as arvores menores e esparsas são antes as dos campos : pitangas, araçás, louros, capororócas, e a vegetação rasteira é frequentemente de caragoatás e ananases silvestres. M- F- 5- — 34 — De um modo geral póde-se dizer que os cipós diminuem e augmentam as epiphytas, attestando a humidade na matta mais rala. Os capões são quasi sempre atravessados por uma corrente de agua. Representam elles o ponto onde as erosões pozeram a descoberto uma camada impermeável collectora das aguas e humidades embebidas á superfície e por isso são muitas vezes brejosos e a vegetação é de matta paludosa. Um typo bellissimo de capões é o constituído pelos buritysaes que, ás vezes formam extensas florestas ciliares, mostrando então um dos raros exemplos de florestas puras. Em uma área vastissima dos planaltos do Brasil central, princi- palmente a contar do parallelo de 20° para norte, onde a estructura geológica é frequentemente de grez alternando com schistos em camadas horisontaes, quando o grez forma a capa superficial, coberta de campos e campos-cerrados, as aguas descem até a camada de schisto impermeável subjacente ao grez; nos logares onde as erosões escavaram até essa camada surge uma fonte e, si a área da rocha impermeável é muito extensa, pôde rebentar um poderoso manancial, ás vezes de centenas de litros, até de um metro cubico por segundo. E' o que se dá frequentemente nos buritysaes : depois de uma chapada extensa e secca depara-se um oásis, um bacião brejoso em meio do campo, em geral de solo argiloso preto, onde se desenvolvem as imponentes columnas das palmeiras. Ás vezes, de mistura com os buritys estão as pindahyhas, também caracterisadas pela direitura dos troncos. Frequentes são as grandes extensões de buritysaes formando renques ao longo das várzeas das correntes. A enorme área de occurrencia dos buritys pelo Brasil, desde o parallelo 20 até o Amazonas, tem de ser explicada pela abundância e fácil conservação do fructo, muito apreciado por grande numero de espécies animaes, principal- mente pelas araras. Na representação das mattas ciliares, o mappa não visou mais do que a indicação da sua existência. Não havia dados sufíicientes para a discriminação da largura nos diversos pontos das orlas de matto e mesmo seria impossível representar-lhes as dimensões, muitas vezes inferiores a algumas centenas de metros, na escala de i :500000o. Ha, portanto, exageração apparente na representação da faixa matteada, qué mostra uma largura média attingindo em pontos cinco kilometros para cada lado do rio. Entretanto, si attendermos á grande generalisação da occurrencia dessas fitas de matto ao longo dos rios e de quasi todos os seus affluentes, a ponto que do alto de um divisor é possível desenhar o mappa hydrographico de qualquer região campestre, pelo traçado dos mattos; e, si considerarmos que todos os rios traçados no mappa são abastecidos por outros afíluentes secun- dários, que por sua vez recebem outros de terceira e de quarta ordem e que todos estes não poderam ser representados no mappa; e, si observarmos que esses afíluentes são em geral tão numerosos que se não passam dez ou mesmo cinco kilometros sem encontral-os e quasi sempre com os seus mattos ciliares. — 35 — teremos que a representação condensa a área matteada no eixo do rio principal e que, para uma avaliação approximada, o resultado deve ser melhor do que a suppressão absoluta daquelle typo de vegetação. Infelizmente, porém, ha ainda outra circumstancia a apontar. A própria indicação das mattas encontra-se, em pontos, muito deslocada : ás vezes fica toda para uma margem do rio, outras vezes até delle afastada. Isto, porém, são apenas defeitos da impressão, que no geral é muito mal acabada, e, princi- palmente na applicação das cores convencionaes, offerece deslocamentos que logo saltam aos olhos. E) — Capuêrões, capuêras Grande parte das mattas indicadas não se encontram no estado primitivo ; já não são mattas-virgens, são de segundo crescimento ou capuêrões : quando estes se acham perfeitamente desenvolvidos, somente um estudo regional mais aprofundado poderá permittir a sua distincção das mattas virgens. Quando no meio da floresta caem algumas arvores formando uma clareira, a luz introduzida provoca um desenvolvimento rápido de vida nas arvores pequenas e principalmente nos cipós que se revestem de abundante folhagem, agora adaptada ás condições de forte illuminação. A vivificação é intensa ; muitas plantas conservam a inflorescencia por mais tempo; outras repetem a fructi- ficação duas, três e quatro vezes no anno. A vegetação se desenvolve com rapidez pasmosa, e a matta em pouco tempo se refaz com os seus próprios typos, cicatrizando as soluções de continuidade. Si, para fazer plantações, se derriba um trecho muito maior da matta, sem lhe lançar fogo, porém, os phenomenos se passam proximamente do mesmo modo, atrazando-se apenas o desenvolvimento da capuêra pelas limpas e capinas protectoras da plantação. E a capuêra cresce tanto mais rapidamente quanto maior fôr a área de matta-virgem circumdante. Mag, em geral, o modo de cultura entre nós tem sido até hoje a derrubada e a queima, servindo quasi que somente os residuos mineraes das mattas para estrumação das roças e dos pastos. Ao fogo repetido, em regra não escapam sinão alguns troncos subterrâneos ou raizes mais engrossadas, ou as raras sementes enterradas a maior profundidade. Assim é necessário que factores estranhos intervenham para o desenvolvi- mento da matta, aliás muito mais moroso. O vento, os pássaros, morcegos, macacos e roedores, e principalmente o gado que se admitte nas palhadas e tiguéras, incumbem-se de auxiliar a immigração de arbustos e cipós e de todas as plantas amigas da luz, que logo se desenvolvem rapidamente formando a capuêra, como também dos grandes indivíduos florestaes, e ainda de uma multíplice variedade de plantas cosmopolitas que vem complicar muito a com- posição das novas mattas. E' claro que esta complicação pela occurrencia de — 36— plantas de formação vegetativa estranha será tanto maior quanto mais tempo durarem as roças e quanto mais repetidas forem as queimadas das capuêras successivas, e ainda quanto maior fôr o transito e frequência pelos animaes portadores de sementes. Interessante é a quasi identidade no desenvolvimento imciai ud capuêra nas diversas zonas entre si muito afastadas no Brasil. As descripções de Huber no Amazonas, de Warming em Minas, de Loefgren em S. Paulo, e de Lindman no Rio Grande do Sul, deixam bem claro essa grande semelhança. Parece que a única acção selectiva nos primeiros tempos é a abundância de luz. Assim, no primeiro anno predominam as plantas herbáceas, poucos arbustos, gramineas, juncos, e principalmente os cipós e trepadeiras cobertos de basta folhagem. São o picão, a herva lanceia, as charruas, o giiaco, herva de Santa Maria, a coiívctinga, juruheha, joás, herva-moura, carquejas, vassourinhas, guaxumas, navalha de mico, capim-milhã, japecangas, cipó-escada, cipó-cruz, sanibaibinha, tayuiá, melão de S. Caetano, cayapona, etc. No segundo anno começa já a vegetação arborescente e arbu!^..vci, a. i^no- vação é ainda mais viva para os cipós ; vingam muito as embaúbas, as taquaras e os taquaris : começam os cambarás, as cássias, os angicos, os jacarés, etc. Ao depois vém as numerosas espécies de jacatirão, capororócas, as enibiras; e a capuêra passa ao capuêrão, onde as madeiras preciosas somente esperam o conveniente crescimento para serem exploradas com vantagem : cabreúvas, jaca- randás, cabiúna, cedros, canjerana, camboatá, canella de varias espécies, guarapiapunha, tarumã, açoita-cavallo; e, conforme a fertilidade do solo e o vigor das mattas vizinhas, dentro de 20 a 30 annos, vém todas as essências cercadas dos caracteristicos da matta-virgeni. F) — Pastos E' justamente neste grupo que os traços da matta tém desapparecido quasi de todo; e muitas vezes ha certa difficuldade em lhe estabeelcer os caracteres diííerenciaes . Muitas vezes a matta é derrubada e queimada especialmente para plantar capim para a criação. Outras vezes as espécies mais vigorosas dos capins e outras plantas alastram sub-espontaneamente e dominam vastas áreas onde a matta foi devastada. Em outros logares, culturas annuaes muito repetidas, ou lavouras perennes muito prolongadas, tém esgotado as terras, facilitando o avassalamento pelas gramineas ou por outras espécies vegetaes. Por esse modo o capim-gordura, com suas numerosas varieaacies, cobre hoje enormes extensões nos Estados de Minas Geraes, Goyaz, Matto Grosso e S. Paulo; os capins Jaraguá e provisório, em Goyaz, Matto Grosso e noroeste de S. Paulo. O sapé. exerce a mesma funcção quasi por toda parte no Bra-sil. ôl No Estado do Rio de Janeiro a lavoura intensiva do café, nas encostas de forte declividade, facilitando o arrastamento do húmus, deu logar á desnudação parcial do solo, de modo que as áreas dos cafesaes velhos abandonados estão actualmente cobertas de pastagens de capim gordura ou mais frequentemente pela vegetação robusta e dominadora do sapé. A samambaia é outra vegetação possante que toma conta de grandes trechos das maítas devastadas e perseguidas pelos incêndios, principalmente nas zonas em que o solo se resente de um certo gráo de seccura. E' uma praga que tem larga distribuição pela mór parte do Brasil. Campos A côr amarello-clara representa a vegetação campestre. A palavTa cninpo, no seu sentido mais amplo, significa para nós todo o terreno qne não tem matta. Assim comprehenderia também as áreas em que a matta tem sido destruida. O mappa, entretanto, para applicar a côr convencional exige outra condição : que o terreno nunca tenha sido revestido de matta. A grande variedade de climas, de solos e de outras circumstancias tem determinado um grande numero de typos de vegetação campestre, imprimindo a cada um delles uma physionomia especial. Procuraremos apontar alguns dos principaes que foram incluidos na convenção de campos. a) — As campinas Este grupo comprehende as áreas em que predomina a vegetação de gramíneas e plantas herbáceas, sem comtudo mostrar na maioria das espécies os caracteres de adaptação ao xerophilismo. A mór parte são campos de várzea ou inundação ; distribuem-se pelas baixadas ao longo dos rios mais volumosos e acham-se incluidos como manchas de menor ou maior extensão nas áreas das grandes divisões dos grupos A, B, C e D das florestas da primeira convenção. Aluitas vezes constituem estreitas faixas por detraz das mattas ciliares. Quando maiores, são cercados de matto na peripheria. Nas enchentes, no geral, ficam cobertas de agua, com pequenas elevações (tesos), para onde foge o gado. Então, frequentemente, nelles entram as plantas aquáticas que vém descendo arrastadas pelas grandes correntes: agua-pés, mururés e damas do lago. Nas vasantes a mór parte desta vegetação fenece ; e então vingam os capins, quer bravos, quer de pasto, os juncos, as aningas. Os exemplares mais desenvolvidos e typicos desses campos de inundação encontram-se ao longo do curso do Amazonas até a sua foz na ilha de Marajó, nas proximidades das costas do Pará e do Maranhão. São caracterisados no geral pelo pequeno numero de espécies vegetaes, em contraposição com a flora variadíssima dos campos seccos dos planaltos do Brasil. Co_mo principaes desse typo apparecem no mappa : as campinas entre o Jutahy e o Juruá, entre o Coary e o Purús, entre o Ituxy e o Madeira, as que — 40 — ficam a leste do baixo Rio Negro, as da barra do Jamundá, as da bocca do Trombetas e as que ficam entre os cursos inferiores do Trombetas e do Jatapú, as da barra e curso inferior do Tapajós e as do Uatumã, do Paru, do Jary e as da bocca e baixo curso do Xingu, as do Araguary, e as que se estendem pela costa da Guyana brasileira até o Cabo Orange; as vastas campinas da ilha de Marajó, as da foz e parte baixa do Tocantins e algumas de menores dimensões nos pequenos rios que vão ao mar na costa paraense. No Maranhão as campinas do Pericuman, do rio Aura e do baixo Pindaré, as comprehendidas entre o baixo Mearim e o baixo Itapicurú e as que se estendem entre o rio Monim e o rio Parnahyba. Considerando as mattas de várzea do Amazonas, vimos como estas se differenciavam no curso baixo do rio, como as alluviões mais volumosas e ricas formavam as pestanas dos rios e igarapés com suas mattas ciliares, indo apenas os sedimentos mais finos de arêa e argila contribuir para o aterramento vagaroso das depressões lateraes onde se desenvolvem as campinas. Vimos ainda como, com o divagar das grandes correntes, se formam os grandes lagos lateraes. E, si considerarmos que esses mesmos phenomenos se repetem em larga escala para todos os affiuentes, principalmente perto das embocaduras, onde vão contribuindo para elevar o nivel da grande depressão pantanosa, teremos mais ou menos explicada a origem das campinas, cuja vegetação especial também, segundo os botânicos, está de accôrdo com esses factos. As campinas occupam as grandes depressões lateraes, antigos leitos, que os rios estão aterrando ou têem aterrado. Si as áreas do leito abandonado são estreitas, os germens da floresta se propagam, e se desenvolvem as mattas alagadiças. Si a faixa destacada pelo novo curso é muito grande, a matta só se pôde desenvolver em torno e a grande área de insolação e de inundação repetidas só permitte a vegetação da campina. O pofessor J- Huber (76) assim explica essa formação especial. Estudando os campos dos pequenos rios da costa do Pará a leste do Amazonas, nota nos do alto Coatipurú, (i) que em muitos pontos ainda avançam elles em continuidade até a margem do rio; em outros pontos, porém, já se formou a pestana coberta principalmente de juquiry, embaúbas, faveiras, trapiá, munguba, mamorana, juriibeba. No tempo das chuvas as campinas inundadas estão cobertas de plantas aquáticas. Na secca, o capim de marreca é o mais abundante e quasi o único, á excepção do harha de bode (Eragrostis reptans) (2). A pobreza dessas campinas em espécies vegetaes deve ser attribuida ás repetidas queimas e frequentação pelos animaes, de modo que apenas resistem as que se reproduzem pelas raizes vigorosas e as que com espinhos se defendem dos herbivoros. Testemunhas oculares affirmam que antigamente esses campos eram ricos de capins altos, abundando o arros-bravo (Orisa sativa) e o andrequicâ (Leersia hexandra) . (1) Esses campos de dimensões relativamente pequenas, em meio da região das mattas não figuram no mappa. (2) Temos sempre empregado os nomes vuleares dos vegetaes. Aqui copiamos machinal- mente alguns nomes botânicos, quando a nomenclatura vulgar é essencialmente local e confusa. — 41 — No baixo Coatipurú os campos tém conservado melhor as associações vegetativas naturaes; ha capins ahos de um metro e outras monocotylodoneas. Encontram-se ah grandes plagas cobertas de junco, caria, aruuiã-rana (Thalia geniculata), espadana (Typha domingcnsis). No referido trabalho (76), que estamos resumindo, os Drs. K. von Kraatz- Koschlau e Jacques Huber chegam a interessantissim.as conclusões dos seus estudos em relação a esses campos que vimos enumerando ao longo e no estuário do Amazonas. Esses campos, cuja formação data da época terciária, e ainda hoje continuam a subsistir e a desenvolver-se, occupando os logares abandonados pelos antigos leitos da drenagem, correspondem ás savanas do curso inferior das cojrentes da Guyana ; os pampas, da bocca do Rio da Prata, têem a mesma origem, e os llanos, de Venezuela, drenados pelo Orinoco e seus affluentes, devem caber no mesmo grupo. Também os canipos-ccrrados, campos altos, campos do planalto do Brasil Central podem ser admittidos como campinas das várzeas e das embocaduras dos rios provindo das mattas pela seccura crescente do solo, e gradual empobrecimento das florestas (i). Mas estes sãO' de edade geológica mais antiga. E assim se explica a relativa pobreza em espécies vegetaes dos campos de rios que recrutam as suas espécies nos remanescentes da vegetação já reduzida das margens, emquanto que os campos do planalto têem sua flora variadíssima, como resultante das transformações da riquíssima e complexa constituição das florestas, durante um periodo muito mais longo. Warming, na sua Flora da Lagôa-Santa, (130) admitte uma dift"erença essencial entre os pampas do Sul e os llanos do Norte de um lado, e os campos do Brasil Central do outro. Os primeiros, muito mais planos, despidos de arvores, têem uma vegetação graminacea também muito mais pobre ; parecem agora accusar um certo enriquecimento ; cita Sachs e Sievers observando que os llanos de hoje mostram mais arvores e até, em pontos, tendência para mattas, emquanto que eram despidos no tempo de Humboldt. ''Estou mais inclinado a admittir que o solo dos llanos, que num periodo geologicamente pouco remoto certamente era fundo do mar, ainda está em formação natural e progressiva, e que incessantemente se enriquecerá com arvores, até ser alcançada uma certa densidade como nas savanas da Guyana e nos campos brasileiros." Comparando as descripções de Schomburgk das savanas guyanenses, Warming encontra a maior semelhança com os campos do Brasil Central. "Designo as savanas da Guyana e os campos do Brazil como duas espécies, floristicamente de certo difl^erentes, mas de uma e mesma formação vegetativa — a formação das savanas . " Estudando a flora da ilha de Marajó, o Dr. Huber (64) encontra um typo um tanto differente na vegetação, uma influencia notável da flora das Guyanas. (1) Em abono, citam Warming — (9// the vegetatiou 0/ Tropical America-Botanical Ga2eííe—lS99. M. F. 6. — 42 — Emqnanto nas Guyanas as floras do littoral e dos campos interiores se destacam accentuadamente, na ilha de Marajó apparece uma formação intermediaria entre essas duas, mostrando infiltração dos elementos campestres provindos das Guyanas. São também campinas inundáveis, admittindo vegetação aquática nas cheias. Na secca, essa vegetação limita-se ás baixas, que ainda conservam alguma agua. Nos tesos, ondulações mais altas que não soffrem a inundação, bem como á mar- gem dos rios e igarapés, a vegetação concentra muito maior numero de arbustos e de arvores. Nos campos cita, entre muitos outros : Arroz-hravo (Panicum?), Capim de marreca (Paspalum conjugatum. Berg.), Paspalum pusillum Vent., Junco-hravo (Cyperus nodosos, Willd.), Capim de rosa (Cyperus surinamensis. Rottb.), muitas espécies dos géneros Cyperus, Eleocharis, Rhynchospora e Scirpus, Arapary (Vouapa acacisefolia. Benth.), Murucy (Birsonima crassifolia. Kunth.), alguns Paepalanthus, çliversas espécies de Jussioea, algumas Schulteria, Carqueja (Hydrolea spinosa. L.), Gerardia hispidula. Mart.), algumas Herpestis, Perpetua do campo (Borreria scabiosoides. Cham. e Schlecht.), Limnosipanea spruceana. Hook.), çtc. Nas baixas : Partasana (Typha domingensis. Pers.), Arroz (Oriza sativa. L.), Can~ narana (Panicum amplexicaule. Rudge.), Panicum appressum. Lam., Capim da Colónia (Panicum numidianum. Lam.), Capim de Angola, que também chamam Cannarana, (Panicum spectabile. Nees.), C aunar ana (Paspalum repens. Berg.), Piris, Juncos e outras cyperaceas dos géneros Eleocharis e Scirpus, Aninga (Montrichardia arborescens. Schott.), Mururé (Pistia stratiotes. L.), Eichornia natans. Beauv.), Arumã-rana (Thalia geniculata. L.), Juquery-manso (Neptunia oleracea. Lour.), etc. Nos tesos e beiras de rios : Grama (Dactylostenium aegiptiacum. Willd.), Capim membéca (Andro- pogon virginicus. I,.), Eragrostis Wahlii. Nees.), Taboca (Guadua angustifolia. Kunth.), Capim da terra (Panicum), Paspalum paniculatmn. L., Arroz do campo (Trachypogon polymorphus). Capim manso (Poepalanthus Lamarckii Kunth.), Heliconia psittacorum. L., Imbaúba (Cecropia leucocoma. Miq.), Apui Curupifá (Urostigma), Ariticú (Anona palustris. L.), Cupúda miúda (Couepia bracteosa. Benth.) Uchi-rana (Couepia), Ingá de fogo, Juquery (Mimosa aspe- rata. L.), Manduby (Cássia diphyla. L.), Mata-pasto (Cássia marginata. L.), Jutahy-rana (Crudia Parivoa. D. C), Mor cegueira* (Anáiva inermis H. B. K.), varias Centrosema, Canária (Crotalaria Maypurensis. H. B. K.), Mucnnan (Dioclea lanocarpa Mart.), Aturiá (Drepanocarpus lunatus. Mey.), Anil (índi- go fera anil L.), Pitomba (Simaba Guyanensis. Aubl.), Breo branco (Protium heptaphyllum, Aubl), varias espécies de Muricy, Cajuçára (Stigmaphyllum), Ortiga (Jatropha urens. LO, Curupitá (Sapium biglandulosum. Aub.). Timbó (Paullinia pinnata. L.), Algodão bravo (Hibiscus furcellatus. Desr.), varias espé- cies de Sida, Sumaúma (Ceiba pentandra. L.), Mungúba (Bombax munguba. — 43 — Mar.), Mamorana (Pachira aquática. Aubl.), Geniparana (Gustavia augusta. L,.), Laranja do matto (Cassipourea guyanensis. Aubl.), Tatá juba do campo (Cas- sipourea), Folha dourada (Aulomyrcia cuprea. Berg.), diversas espécies de Eugenia, Cuia-rana (Terminalia tanibouca. Smith.), Murta (Mouriria guya- nensis. Aubl.) e outras melastomaceas. Macaco-cipó (Marsdenia), Batatão (Ipomoea pentaphylla. Jacq.) e outras Ipoméas, Paraparâ (Cordia umbraculi- fera. D. C), Tarumã e diversas outras Vitex, Solvia de Marajó e diversas sepecies de Hyptis, Purui, varias espécies de Alibertia; Papa terra, varias espécies de Basanacantha. No Maranhão os campos da região dos lagos comprehendida entre os rios Turyassú e Pindaré, denominados campos de S. Bento, de Pinheiro, de Cajapió, de Vianna, são campinas da mesma natureza e formação vegetativa. Inundam na época das chuvas, ficando apenas descobertos alguns tesos com sua vegetação arbustiva e arborescente fraca, mas com o chão revestido de gramíneas e de hervas que fazem o recurso para o gado nesse tempo. Nos campos são principal- mente capins, juncos e tabúas, com a vegetação muito proximamente a mesma descripta para as campinas do valle do Amazonas. Os campos de Anajatuba, perto da foz do rio Mearim, são também campos inundáveis, onde um lençol d'agua de dois a três metros de profundidade permitte navegar por grandes extensões. Na secca, a argila depositada forma espessa camada que, pela retracção, apresenta grandes fendas entrecrusadas, destacando parallelepipedos que constituem a torroada. Onde com a argila sedimentou-se grande proporção de húmus, desenvolve-se rapidamente a vegetação, principal- mente de gramíneas tenras (capim mimoso), que constituem excellentes pastagens. Ao longo de todos os grandes rios, quer na zona de terras mais baixas que se approximam da costa, quer no planalto, desde que os seus cursos se estendam em planícies, abríndo-se em grandes várzeas, reproduzem-se taes condições de sedimentação e formam-se as campinas. O rio Doce, depois de entrar no Espirito Santo, para baixo de Porto do Souza, principalmente entre a barra do rio Pancas e Linhares, percorre uma zona aplainada, onde ainda subsistem numerosos lagos e lagoas, toda coberta de campinas dessa natureza. O mesmo acontece, no baixo Parahyba, desde S. Fideli^ até para baixo de Campos. Outra região característica, porém já no planalto, é a depressão quasi nivel- lada, posta entre as duas muralhas da Mantiqueira e da Serra do ]\Iar. Ahi, na mesma calha mas com direcções oppostas, correm os valles do alto Parahyba e do sito Tiété por sobre a extensa várzea cujo terrapleno começou na era terciária e o trabalho de aplainamento vem prolongado até hoje. Os lagos onde se deposi- taram as argilas, os calcareos, os schistos betuminosos e as arêas do tempo terciário, estão hoje cobertos de campinas. No Parahyba começam estas em Bocaina e chegam até Jacarehy na volta brusca em que o rio toma orientação opposta á que trazia. No Tiété vão desde Mogy das Cruzes até a zona das cachoeiras que principia junto á villa de Parnahyba. Em alguns logares a várzea inunda com a expansão das enchentes ; ahi se encontra então a vegetação caracte- — 44 — ristica das plantas aquáticas, dos juncos, das tabúas. No geral são os campos cobertos de vegetação herbácea e de sub-arbustos. Nos tesos e nas pestanas do rio é a vegetação arborescente de typo especial, ora formando capões no meio do campo, ora as mattas ciliares. E' nas depressões dessas várzeas que ultimamente se tem feito com a maior vantagem a cultura systematica e em larga escala do arroz. Em geral o solo mais ou menos húmido está coberto de um tapete de gramineas e de vegetação herbácea. As gramineas, além das verdadeiras granias deitadas, consistem principalmente de diversos typos dos géneros Paspalum, Panicum e Andropogon; nas margens das estradas e nas lombas é muito frequente o capim barba de bode (Aristida) . Martins cita, entre as hervas, arbustos e sub-arbustos das campinas do Parahyba : Compostas: Wedelias, Vernonias (assa-peixe), Bidens (picão). Ambrósia artemisiae-folia, e outras ; Melastomaceas : Rhexias, e algumas herbáceas ; Eu- phorbiaceas : Cnemidostachys, Tragias, Crotons (Velame); Rubiaceas : diversas espécies de Declieuxia, e muitas outras ; Papilionaceas : Sweetias, Clitorias, etc. : Mimosaceas (sensitivas); Malpighiaceas : muitas espécies de Banisteria, Gaudi- chaiidia, e outras; Asclepiadaceas : Oxypetalum; Apocynaceas; Verbenaccas; Umbelliferas; Ochnaceas; Araliceas e de muitas outras familias. E refere, entre as arvores esparsas nas campinas, ou reunidas em capões, ou nas margens do rio : Melastomaceas; Myrtaceas (psidium) ; Vochysiaceas : Vochysias, Qualea, Salvertia; Anonaceas ; Malpighiaceas ; Ternstroemiaceas : Laplacea (páo de S. José), e outras; Anacardiaceas : Schinus (aroeira); Myrsinaceas; Mimo- saceas ; Cesalpinaceas, e muitas outras. Desta curta relação, vê-se que aqui já se apresentam alguns typos, como as Vochysiaceas, caracteristicos dos campos seccos (campos-cerrados) dos planaltos do Brasil Central. Dois outros rios importantes, o Araguaya-Tocantins, e o Paraguay, com grande numero de seus affluentes orientaes, têem vastas extensões dos respectivos cursos em zonas aplainadas e de pequena altitude. Nas suas margens abrem-se grandes campinas que pertencem á formação que vimos descrevendo. Nestas porém o aterramento vae mais atrazado ; durante cerca de melo anno ficam quasi totalmente debaixo d'agua: são os pantanaes, indicados no mappa por uma convenção especial ; e assim delles trataremos separadamente. b) — Campos do Sul O typo de vegetação campestre mais desenvolvido é o dos campos-cerrados, com suas variedades. Em todos os planaltos da vasta região central do Brasil tropical estende-se em largas áreas essa formação vegetativa em que predominam antes os arbustos e as arvores anãs. A' medida que se avança para sul passando — 45 — da região tropical para a sub-tropical, soffrem os campos uma grande diííerença : o numero de plantas lenhosas diminue, e mesmo os indivíduos tornam-se de mui pequeno porte ; ao mesmo passo desenvolvem-se as gramíneas tornando-se predo- minantes, não pelo numero de espécies, que é muito mais reduzido, porém pelo numero de indivíduos, e também pela altura destes. A contar da parte sul e sudoeste de S. Paulo começa esta transformação que vae crescendo para sul até apresentar-se typica na campanha do Rio Grande do Sul. Lindman (79) estudou profundamente a flora do Rio Grande do Sul, levou sua penetrante observação pela Argentina, principalmente pelas províncias de Corrientes e Entre-Rios, pelo sul do Paraguay e pelo Gran-Chaco. Das suas descripções tomamos os seguintes apontamentos succintos. A transformação da região campestre do typo tropical para o typo temperado é caracterisada pela grande reducção do numero de espécies. Lindman cita o género Aristida reduzido á quarta parte, e o género Paspalum á quinta parte do numero das espécies existentes nos campos tropicaes. Em compensação o numero de indViduos e o seu desenvolvimento crescem muito. Ha diversas associações floristicamente distinctas dentro dessa formação meridional. Porém a mais importante, e que pôde ser tomada como typo, é a dos campos paleaceos, caracterisada pela abundância de gramineas plurnosas e de compostas, com elementos que se distinguem por grande sociabilidade, formando grupos puros, como nunca se os encontra nos campos tropicaes. As gramineas são altas e rigidas e distribuídas em grandes soqueiras de andropogonaceas. São os campos de palha (espécies grandes de Paspalum), e de macega (espécies de Brianthus). O resto da vegetação herbácea e de sub-arbustos mostra o typo das vassouras; são plantas ramosas de folhas muito pequenas ou sem folhas guarÚ!:i.as, carquejas, qitinas do campo, (Sida, Baccharis, Discaria). Lindman distingue outro typo de campo, o suh-arhustivo, accusando uma vegetação muito mais pobre. As grammeas, hervas e sub-arbustos são todas de typo muito pequeno, em geral de colmos e caules deitados, formando em tapete auro de caules e folhas adherentes ao chão ; dahi levantam-se caules e colmos erectos, mas que raramente attingem a altura de 30 cm. As gramineas principaes são: Andropogons, Aristida, Brisa, Eragrostis e Paspalum; occorrem frequentes Juncaceas e Cyperaceas. Entre as hervas e sub-arbustos sobresaem as Amaran- thaceas. Compostas, Rubiaceas, Melastomaceas minúsculas, e outras. Os órgãos subterrâneos são relativamente muito desenvolvidos, constituindo tubérculos e troncos duros, que lembram de algum modo os xilopodios dos campos-cerrados Também o solo onde vingam esses campos é de uma argila dura e secca, abundante em pedregulho, em pontos de um barro areento muito endurecido. Os campos sub-arbustivos desenvolvem-se de preferencia nas encostas e nos altos mais seccos das lombadas ; os paleaceos nas baixadas comprehendidas entre as lombas, e principalmente em todas as extensões mais aplainadas e protegidas do vento, onde as sementes dos capins plumosos se conservam e disseminam, E, como a campanha do Rio Grande é mais aplainada para a parte de sul e de sudoeste, é justamente para ahi que dominam os campos paleaceos, que — 46 — constituem o verdadeiro typo predominante naquellas regiões. Principalmente na parte mais meridional do Estado, na zona comprehendida entre os rios Jaguarão e Piratinim, encontra Lindman a maior semelhança com os pampas da Argentina, semelhança esta egualmente accusada em todos os campos paleaceos. Os ventos mais intensos no Rio Grande são os que vém do sul e de sudeste. Por esse caminho teriam vindo os germens da vegetação dos pampas até as planícies mais baixas do Rio Grande. Assim, os campos do Sul ficam limitados em sua edade á das formações diluviaes pampeanas. Si não são tão novos como as campinas ainda hoje em construção continuada, não podem por modo algum aspirar á edade madura dos campos-cerrados do planalto. Campos da Vaccaria — Arrojado Lisboa (8i) descreve os campos do planalto sul de Matto Grosso que ali constituem uma grande área de excellentes pasta- gens, os campos da Vaccaria, onde a criação do gado prospera com as maiores vantagens desde muitos annos. Começam elles em faixa estreita no meio dos cerrados que revestem os altos divisores entre o rio Paraná e o Paraguay, cerca de Campo-Grande. Desenvolvem-se para sul ganhando em expansão pelas encostas dos valles, á medida que o terreno se vae tornando mais baixo e aplainado ; ficando então somente nesgas de cerrado nos estreitos espigões mais elevados. De espaço a espaço, encontram-se nos espigões pouco accentuados manchas de campos em parque, os campos arbóreos, que lembram muito o typo do faxinai nos Estados do Sul : sobre um chão revestido de gramíneas levantam-se arvores de bom porte e grandes copas — capitão, para-tudo, barbatimão, etc. Os campos da Vaccaria são formados de gramíneas deitadas ou ascendentes, hervas e sub-arbustos, com todos os caracteres dos campos sub-arbustivos que Lindman estudou na campanha do Rio Grande do Sul. Os verdadeiros campos paleaceos têem aqui menor importância; só se encontram actualmente nos logares mais altos abandonados pelo gado. Entretanto devia ter sido esse o typo primitivo do campo. Com a frequentação pelo gado, e as repetidas queimas, visando estabe- lecer melhores pastagens, os campos paleaceos se foram transformando em campos sub-arbustivos de gramíneas mais tenras. Tem havido ali uma certa acção do homem no aperfeiçoamento das pastagens. Os criadores da região consideram o capim fle.ra e a macega como tendo sido a primitiva coberta desses campos, depois completamente destruida e substituída principalmente pelo capim branco felpudo, e mais tarde pelo mimoso, que nas terras fortes, e nas proximidades das habitações, ou nos logares mais protegidos, dá logar ás gramas. Também no Rio Grande do Sul os campos paleaceos trabalhados e trafegados pela criação passam aos sub-arbustivos de forragens mais macias. Na região da Vaccaria a gramínea predominante e a mais resistente é o capim branco felpudo (variedade de Andropogon) ; vem depois o capim mimoso (Panicum capillaceum. Lam.) muito mais valioso, porém menos resistente ás seccas e ás queimas. — 47 — A estructura geológica da extensa região é de grez triassicos em alternação com traps que fornecem, em pontos, grandes manchas de terra-rôxa ; mas os campos da Vaccaria desenvolvem-se principalmente sobre um solo alluvionar resultante da mistura dos detritos dos grez e da rocha eruptiva. Assim pois esses campos devem ser incluídos no grupo dos campos do Sul. Representam ainda os traços de influencia da vegetação dos pampas. Seria o extremo mais avançado para norte (cerca do parallelo de 21°) até onde a influencia da vegetação sub-tropical se faz sentir invadindo os domínios de maior aridez das formações tropicaes mais antigas dos campos cerrados. E as circum- stancias mais favoráveis para isso são : o clima temperado da região ; as chuvas regulares e bem distribuídas durante o anno, donde uma abundante rede hydro- graphíca de cursos perennes e de regimen pouco variável ; e a constituição do solo enriquecido pelos productos da decomposição do trap. Por todas essas condições, aquella região se apresenta de grande riqueza na actualidade para a criação, e de um futuro ainda mais auspicioso para a explo- ração agrícola de uma série de producções, entre as quaes a do trigo se acha indicada como das mais promettedoras. Campos geraes — Esta denominação tem sido applicada a diversos typos de campos, estendendo-se aos campos limpos e mais elevados, de Minas Geraes como aos da Bahia e de quasi todo o interior do Brasil. Aqui nos referimos tão somente aos campos sub-arbustivos que ficam para sul do trópico. Vimos que desde o sul de S. Paulo começa a modificação no typo dos campos : diminuição em numero e tamanho das plantas lenhosas e augmento em numero de indivíduos das gramíneas, com uma tendência geral para a formação de associações mais puras, tendência que aliás se manifesta em toda a vegetação. Com o decrescimento das plantas lenhosas, vingam cada vez mais os campos paleaceos e os sub-arbustivos. E' principalmente no Paraná que esta formação ostenta grande desenvolvimento. Uma faixa extensa, que occupa o primeiro planalto do Estado, limitada a leste pela serra do Paranapiacaba e pelos altos da Serra do Mar, e a oeste pelas elevações da Serra das Furnas e pelas encostas da Serra da Esperança, vem desde as divisas de S. Paulo, até encontrar com as mattas do rio Iguassú. Os planaltos dessa região, com a altitude de 700 a i.ooo metros, com o seu clima famoso pela benignidade, receberam especial- mente o nome de campos geraes. Infelizmente não temos ao alcance nenhum trabalho especial dos botânicos modernos e somos obrigados a recorrer ás observações valiosas do notável Saint- Hilaire. São as gramíneas que formam o conjuncto dessas pastagens naturaes. As outras plantas variam naturalmente entre diversas localidades. Sobresaem, entre- tanto, Vernonias, Mimosas, uma Convolvulacea, a Composta vulgarmente chamada Charrua, uma \'erbenacea, uma Cássia e uma Labiada, um Bryngium e outra Composta. O numero de espécies nos campos geraes é antes bem limitado. Ha algumas que não se encontram na zona tropical. Por cima da Serra das Furnas (Fazenda de Caxambu), ha campos-cerrados como em Minas e Goyaz ; entre as — 48 — hervas e sub-arbustos desses cerrados ha muitos que são comniuns aos da zona tropical. Póde-se dizer que a flora dos campos-geraes tem algumas relações com as da campanha do Rio Grande do Sul, porém as tem mais intimas com a dos campos mais para norte. Descrevendo a viagem por S. Paulo, até Sorocaba encontra campos-cerrados. Dahi para sul, até os limites de S. Paulo, no Rio Grande do Sul, Uruguay e Buenos-Aires, são somente campos herbáceos. Comparando as floras de Goyaz e do sul de S. Paulo, encontra nesta muito mais Papillionaceas. Em S. Paulo predominam : Compostas e Papilliona- ceas ; em Goyaz : Compostas, Myrtaceas, Labiadas, Acanthaceas e Melastomaceas. Em todo o caso, esses campos geraes estendem-se para sul através de Santa Catharina, até o planalto que constitúe a metade septentrional do Rio Grande do Sul. Para esta ultima região temos os estudos de Lindman (79), a que sempre recorremos. Os campos do planalto são muito mais accidentados do que os da campanha ; mas as condições climáticas são proximamente as mesmas, talvez um tanto mais chuvoso o planalto. A zona mais chuvosa é a faixa escarpada léste-oeste que descarrega volumosas aguas nos rios Jacuhy e Ibicuhy e é toda coberta de mattas. Na Barra do Rio Grande a média de nove annos accusa 911 m.m. de preci- tação, sendo que as chuvas de inverno foram sempre muito mais fortes que as de verão. As observações em Pelotas indicam uma grande irregularidade : de 691 a 1.330 m.m. Em Cachoeira, em 1890, 1.047 iti-m-, em 1891, 1.463 m.m.; e, além disso, grande irregularidade na distribuição pelos mezes do anno. Em 1887, observou-se: , m.m. Barra do Rio Grande 886 ' Pelotas 691 Bagé. '. 756 Cruz- Alta 2 . 02 1 Cruz-Alta fica em cima da Serra, já no meio do planalto, na altitude de 468 metros. Nesse anno predominaram as chuvas da primavera e do verão. Taes irregularidades, diz Lindman, originam-se provavelmente da situação do Rio Grande entre uma região ao norte, com chuvas estivaes predominantes e outra ao sul (Uruguay- Argentina) com chuvas hibernaes. Dentro da região campestre as chuvas continuadas já apparecem ás vezes em Maio, provocando grandes en- chentes nos rios e inundando grandes extensões das planícies. A diííerença de altitudes é bastante considerável entre a campanha e o planalto. Na campanha a cota de 400 metros apparece como raridade, apenas em algumas das elevações a sul e a sudeste; póde-se dizer que todo o território fica — 49 — abaixo de 200 metros. No planalto, principalmente na metade oriental, as altitudes vão de 500 a i.ooo metros; para oeste vae elle descaindo muito até a costa do rio Uruguay. "Entretanto essa diííerença de altitudes não basta para produzir disseme- Ihança entre as respectivas vegetações, pelo menos em relação aos campos cuja vegetação por sua natureza é própria para supportar as mudanças atmosphericas, vento, luz, secca, geada, etc, dentro de limites muito latos. A grande diííerença que possa existir entre o planalto e a campanha provém da situação de cada um em relação ás regiões circumvisinhas, tão profundamente differenciadas. A cam- panha tem por traz de si as grandes planícies dos pampas e o planalto tem todo o planalto brasileiro com sua superfície accidentada e grandes mattas que, como uma rede com grandes malhas, se estendem sobre elle por entre consideráveis extensões de campos. Deste território o planalto do Rio Grande é uma continuação directa, manchado como é com grandes agglomerações de mattas virgens (parte de arvores de folhas, parte de Araucária), que na campanha são representadas apenas por capões. Mas as formações campestres combinam com as da planície, tanto pelo seu caracter e physionomia como pela essência de espécies communs". No planalto rio-grandense encontram-se, como na baixa, os campos paleaceos. A ;//a<: í^gra (Erianthus) e a carqueija (Baccharis genistelloides. Pers.), em touceiras e moitas densas e altas, constituem então os elementos mais conspícuos. Os Andro- pogons e as Compostas (Eupatoriums, Vernonias, Asters), diz Lindman, são por tal forma preponderantes que, se todas as outras hervas e sub-arbustos fossem eli- minados, as planícies conservariam ainda a sua physionomia e natureza. Perto de Cruz- Alta (em março) os campos estavam cobertos por grupos de Compostas em flor, ostentando diversas cores, como roxo, róseo, branco, amarello, etc. Taes grupos eram formados de carqueijas (Baccharis), Pterocaulons, macella (Achyro- cline), Stevia, charruas (Eupatorium). Algumas espécies dos dois últimos géneros (charruas e cambarás) dão a côr geral a campos inteiros com os seus capítulos vermelhos, roxos e brancos. Algumas espalhavam á grande distancia perfumes de camomilla, de baunilha, do zimbro, etc. Algumas macegas enchem os campos com uma vegetação cerrada, de um metro a metro e meio de altura, quasi impe- netrável. Outras gramíneas, palhas brancas e santa-fé (Paspalums e Panicums) formam também grupos compactos, enchendo as baixadas e logares húmidos, ou mesmo os brejos. Maior disseminação têem os campos sub-arbustivos com a sua grande varie- dade na vegetação. Em certos logares ha verdadeiras mattas minúsculas de car- queijas e vassouras (Baccharis) ; outras de myrtaceas, abundando a guabiroba do campo (Campomanesia cyanea. Berg.) ; outras de alecrim (Baccharis dracun- culifolia. D. C), que á borda das mattas é um arbusto de dois a três metros de altura, mas ali no campo não excede de meio até um metro. Mesmo nesse typo dos campos sub-arbustivos ainda apparecem as touceiras de macega, entremeadas com as moitas de vassouras, que caracterisam os campos paleaceos. Assim parece que os campos paleaceos primitivos do sul passam gradativa- mente aos campos geraes (sub-arbustivos), não somente sob a acção do homem' M. F. 7 — 50 — com suas queimas e com o trafego do gado, mas também e principalmente, á medida que se caminha para norte, onde o numero e variedade de espécies vão se enriquecendo sob a intluencia das causas que determinaram os cainpos-cerrados, e até chegar ao predomínio absoluto destes. c) — Campos=cerrados No interior do Brasil uma grande área interposta á região de florestas da zona equatorial, e á das mattas da encosta atlântica, é de terrenos cobertos de vegetação fraca e rasteira apresentando aqui e ali mancha de vegetação arbores- cente. Esse typo característico dos planaltos interiores de clima medianamente secco, offerece muito mais desenvolvimento do que as outras differentes forma- ções vegetativas que acjui enumeramos nas vegetações campestres. Occorre por grandes extensões em quasi todas as chapadas e planaltos interpostos ás princi- paes correntes do interior do Brasil. As chapadas do Maranhão, entre os valles do Tocantins e do Parnahyba; os taboleiros da bacia do Parnahyba, no Piauhy ; os chapadÕes que se estendem do S. Francisco, no oeste da Bahia, até o Tocantins e o Paraná, no leste de Goyaz; todo o planalto de Minas, incluindo a bacia do S. Francisco e a do Rio Grande, até vertentes do Rio Doce para leste . e as do Paranahyba para oeste; todo o sul de Goyaz, comprehendendo as vertentes do Araguaya, do Maranhão, e as do Paranahyba; todo o planalto de Matto-Grosso, com os seus divisores primá- rios e secundários, quer separem aguas do Paraná e do alto Araguaya das que vão ao Paraguay, (juer façam o grande divortium entre os afliuentes septentrio- naes do Paraguay e os meridionaes do Amazonas, quer avancem para norte fazendo as divisórias d'agua entre estes últimos, são regiões todas caracterisadas por esse typo de vegetação. E ainda avança elle, bem que com menor desenvolvi- mento, pelos quatro Estados meridionaes, occupando áreas consideráveis nas chapadas interpostas ás linhas de drenagem que vão aos rios Paraná e Uruguay, dentro de S. Paulo, Paraná e vSanta Catharina e no Rio Grande do Sul, na metade septentrional do Estado, até onde o terreno desce em escarpa para a campanha. Sobre uma área tão extensa é de presumir que as variações de clima e solo tenham imprimido ao typo geral da vegetação uma grande variedade, quer na associação, quer na predominância das espécies. Entretanto, á proporção que se vão fazendo estudos mais completos das floras regionaes para a respectiva com- paração, parece antes que a difí^erenciação não é tão grande,, havendo a predo- minância de certos géneros e mesmo de espécies características. Em todo caso duas circumstancias predominantes são de geral observação : a seccura relativa do ar e do solo, accusada ])OV caracteres de xerophilismo muito generalisados, e a edade avançada dessas formações, attestada no grande numero de espécies que todas tiveram de softVer adaptações prolongadas. Bem poucos são ainda os dados climatológicos sobre a vasta região. Consi- derando a parte da área descripta comprehendida entre 5° e 30° de latitude, — 51 — poderíamos ter uma média de chuva annual de 1.200 m.m. Não é, portanto, uma zona secca. Mas o período das chuvas é bem destacado do tempo secco, (jue assim vae, conforme as locahdades, de quatro até oito mezes. A estação secca prolongada, e, principalmente a contextura physica do solo, no geral bastante permeável, constítue os príncipaes factores a imprimir os caracteres da vegetação especial dos nossos campos-cerrados. K, se .ajuntarmos a maior intensi- dade da evaporação, provocada pela irradiação em superfície descoberta, augmen- tada pela acção dos ventos muito mais velozes ; e ainda as queimas annuaes que mais reseccam e endurecem a camada superfí-cial da terra, teremos a explicação do cunho rechitico e enfezado da vestimenta campestre. O Dr. E. Warming, que fez o estudo, seguramente o mais completo, de uma flora regional campestre na Lagòa-Santa, em Minas, inclue os campos-cerrados do Brasil entre as Savanas tropicaes e aponta-lhes em resumo os seguintes caracteres : salvo poucas excepções, todas as plantas são perennes. As annuaes perecem na lucta com as plantas perennes de conformação mais alta e mais densa, devendo contribuir muito as c|ucimas dos campos cjue destroem as sementes e plantas em germinação. Plantas bulbosas, tuberosas e as verdadeiras succulentas são muito raras nos campos. E a razão é que o gráo de seccura e de calor dos campos não é tão grande que obrigue as plantas a um longo período de repouso, para o qual tenham necessidade de armazenar a agua. E' justamente essa a dístincção entre os campos brasileiros e os steppes e desertos verdadeiros. Os capins, que fazem a massa principal de vegetação, são cespítosos; porém, em geral não são estolhosos. As folhas são em geral estreitas, duras, ásperas, pilosas, algumas vezes incrustadas de cera e algumas são tunicadas. As hervas perennes, bem como muitos dos arbustos e sub-arbustos mostram um typo especial de desenvolvimento ; produzem debaixo do solo corpos lenhosos irregulares (xylopodia), que apparenteraente consistem em caule e raiz, mas são principalmente da natureza do caule, dos quaes se erguem rebentos numerdsos, em geral sem galhos, ou com poucos. ^ O desenvolvimento cespitoso é também muito commum entre as espécies lenhosas : um só arbusto pôde estender-se sobre a área de muitos metros quadra- dos. A Andira laurifolia, pôde, segundo Warming, occupar uma área até de 10 metros de diâmetro. O Anacardium hmnile (caju do campo), que apenas mostra á superfície um verticillo de três ou quatro folhas de 0,20 a 0,30 de altura, der- rama-se ás vezes por grandes áreas, simulando mdividuos destacados, mas que inferiormente estão todos ligados por órgãos subterrâneos, caules ou raizes, de grande desenvolvimento; Liais (80) cita o caso de cavar á profundidade de seis metros para extrair um desses troncos. Em todo o caso, o grande desenvolvimento dos órgãos subterrâneos da vegetação campestre é um facto característico. Nos cortes das estradas, feitos através dos cerrados, é muito commum vêr, até á profundidade de dous, a três metros, um verdadeiro rosário de grandes tubérculos de raizes lignificad^is. — 52 — Loefgren (75) cita em S. Paulo a Aroeirinha rasteira (Schinus Weinman- niocfolius. Engl.), que raramente attinge a um metro acima do chão e cujas raizes descem até cinco e seis metros. As arvores são sempre de porte baixo. Mesmo nos campos de vegetação arbórea mais densa, ellas não excedem em altura á comnuiiii das arvores fructife- ras dos pomares. São sempre de troncos e galhos tortuosos. Este caracter provém evidentemente da falta da humidade indispensável para o desenvolvimento dos brotos novos, causa que é muitas vezes aggravada pelo facto de que os brotos se desenvolvem antes das chuvas. As queimas são também de grande influencia, carbonisando os raminhos e obrigando a novas orientações o desenvolvimento dos brotos novos. A casca é geralmente espessa e rachada, e está muitas vezes tisnada pelo fogo. Em todo caso a espessura da cortiça deve estar em relação directa com a secca, não somente a inherente á natureza campestre, mas também com a inten- sificação pelas queimadas. As folhas das plantas dicotyledoneas mostram alto gráo de xerophilismo na dureza. São tão duras que chocalham com o vento. A Salvertia (bananeira do campo), muitas outras Vochysiaceas, Rubiaceas e Bombaceas fazem esse ruido. Outras vezes as folhas são flexíveis, mas tomam outros meios de defesa : são tomentosas em ambas as faces. No geral são muito pilosas e, quando glabras, cobertas de cera ou de lacca. Typos pinoides e ericoides quasi não existem. Entretanto, ha muitas espécies com folhas finas. Por sua natureza as gramíneas e as cyperaceas, que constituem a maior porcentagem, são já de folhas estreitas. Muitas Compostas (Vernonia, Brickelia, etc), Rubiaceas e Asclepiadaceas, têem frequentemente folhas finas. E' mesmo esse um caracter contradistinctivo entre as espécies da mesma familia, segundo habitam a matta ou o campo. Do género Manihot (maniçobas) as espécies rigidula e triphylla são campestres, as de folha larga são florestaes. Óleos ethereos são frequentes numa série inteira de plantas : Verbenaceas, Labiadas e Myrtaceas. Lichens, musgos e algas faltam completamente no chão dos campos cerrados ; e são muito raros nas pedras e nos troncos das arvores. Também os cipós e as epiphytas, tão abundantes nas mattas, desappareceram completamente das arvores dos campos cerrados. A physionamia desses campos é sujeita á grande variedade não somente quanto á altura da vegetação, como também quanto á maior ou menor proporção das gramíneas e plantas herbáceas perennes para as arvores e arbustos. Ha ás vezes grandes manchas de campo limpo em que as arvores e arbustos não apparecem; outras em que as arvores, intercaladas numa vegetação de 50 centímetros até um metro de altura, são tão juntas que parecem constituir uma espécie de floresta, mas ensolada, ou com pouca sombra, e permittindo a um cavalleiro correr em todas as direcções : são os canipos-cerrados, ou simplesmente cerrados. As diíferenças provém ás vezes da composição originaria do solo, mais frequentemente, porém, do seu relevo. Nas encostas dos morros onde as erosões — 53 — carregaram grande quantidade do material fino do solo, deixando maior pro- porção de pedregulho e detritos rochosos, desenvolvem-se os campos limpos : não ha arvores nem mesmo arbustos ; predominam as gramineas a as plantas herbáceas em moitas e touceiras esparsas, deixando ver entre si manchas de solo desnudado. Também a altura da coberta vegetativa raramente excede de 40 a 50 cm. Nos terrenos mais planos, isto é, nas baixas e nos altos das chapadas, a camada do solo mais espessa cria maior densidade em arvores e arbustos; e ainda a vegetação que tapeta todo o chão, bem que proximamente a mesma do campo-limpo, encorpa, escondendo o solo e se levanta ás vezes até a altura de um metro a um metro e meio. Ha verdadeiramente pequenas differenças floristicas entre a vegetação rasteira do campo limpo e a do cerrado. ■ Certas Orchidaceas e Melastomaceas preferem os primeiros. Emretanto, não deixam de constituir a mesma e continua unidade. Warming estudou o typo caracteristico dos cerrados na Lagôa-Santa. Seguindo para sul, até Barbacena, encontrou maior somma de campos limpos, com vegetação mais baixa e rala, e com menor numero de arvores. Acredita que a vegetação mais aberta provém da maior altitude e maior seccura: as condições do terreno são um pouco mais alpinas. Lund, caminhando para norte, até Curvello, observou cerrados cada vez mais altos e bonitos. Os cerrados da Lagoa- , Santa cobrem um solo de argila vermelha resultante da desaggregação de schistos argilosos, de que alguns são calciferos. Loefgren, em S. Paulo, também encontra fortes dififerenças na composição floristica dos campos e cerrados conforme a natureza geológica do solo e a respectiva altitude. Moore, estudando os campos da chapada a leste e nordeste de Cuyabá, onde o terreno é de grez devoniano, de estratificação quasi horizontal, encontra as mesmas condições dependentes da topographia. Na chapada é um bom typo de cerrado ; nas encostas de grez vermelho predominam antes os campos limpos ; no fundo dos valles ha bons mattos ao longo das correntes que, muitas vezes, em Agosto, estão seccas. Mais para norte em Matto Grosso, no divisor entre o Paraguay e o Ama- zonas, pelas cabeceiras do Cuyabá, pelas do rio das Mortes do Araguaya, pelas do Arinos e pelas do Xingu, as expedições dos von den Steinen fazem a mesma descripção. Sobre um chão de grez em estratos horizontaes, estendem-se os chapadÕes cobertos de cerrados ; nas encostas são campos limpos, deixando ver por espaços o solo ou a própria rocha ; no fundo dos valles são as mattas ciliares com maior ou menor largura e pujança. Assim apresentam-se as condições topographicas com grande predominância na distribuição dos vegetaes. Parece que a condição essencial para a existência do cerrado é haver uma forte espessura de um solo mais ou menos permeável, onde as plantas possam desenvolver o seu longo apparelhamento subterrâneo para captação da agua e da humidade de que se embebe a camada em toda essa profundidade ; o lençol de agua desce muito, e a planta é obrigada a ir buscar — 54 — bem fundo a humidade qne a evaporação lhe toma rapidamente na camada superficial. E' preciso que a agua se embeba lentamente durante o temjío das chuvas, e que a espessa camada sirva de depositário avarento para o supprimento da nutrição. Si a camada terrosa é muito ]iouco espessa, immediatamente sobreposta á rocha, o supprimento apenas pôde bastar á vegetação fraca das gramíneas e plantas herbáceas : formam-se os campos limpos. No caso em que exista uma camada impermeável a uma profundidade conveniente para accumulação da agua, os cerrados serão mais viçosos, podem mesmo passar a cerradões. E' notável que apesar da enorme área occupada pelos campos-cerrados nos planaltos do Brasil central, na qual occorrem grandes variedades de clima, de formas topographicas e da composição do solo, offereça esta formação vegetativa um alto gráo de uniformidade não somente nos seus caracteres geraes, como até mesmo na composição floristica. As antigas e valiosas observações de Martins, passando por S. Paulo, Minas e Bahia, as de Saint-Hilaire por Minas, Goyaz, S. Paulo e Paraná, e os mais recentes e completos estudos de Warming, em Minas, de Loefgren, em S. Paulo, de Moore, em Matto Grasso, coincidem de modo admirável quando descrevem a physionomia ea vida desses ' campos, e até mesmo quando descem á enumeração dos grupos e espécies vegetaes nelles mais predominantes. O Dr. E. Warming (134) diz: "Extensões vastas dos Estados interiores do Brasil, principalmente Minas Gerae's, S. Paulo e Goyaz (a região oreadica de Martins,) são campos idênticos aos de Eagôa-Santa, com o mesmo aspecto que estes e muito concordantes também nas condições floristicas. St. Hilaire, por exemplo, diz "Les plantes ligneuses éparses au milieu des hcrbes appartiennent aux mêmes espéces á Goyaz et á Minas". O diário de Lund, e as suas collecções de S. Paulo, Goyaz e Minas, e as de Loefgren, de S. Paulo, têem-me mostrado egualmente as grandes analogias floristicas sobre essas extensões, ao passo que varias espécies, que não eíxistem em Lagôa-Santa, naturalmente apparecem e representam papel saliente em outros logares". A relação mais completa e perfeita desses campos fez Warming na "Flora da Lagôa-Santa", que Loefgren poz ao nosso alcance traduzindo para o portuguez. Dahi temos extractado e estamos respigando estas notas, lamentando deveras não poder alcançal-as sinão superficialmente. Nos campos-cerrados Warming estuda minuciosamente os três andares da vegetação; o inferior das hervas e sub-arbustos, o médio dos arbustos, e o superior das arvores. No primeiro avultam pelo numero de indivíduos as gramíneas. São em geral capins baixos e em pequenas moitas: Andropogon, Paspalum, Panicum; mas também ha mesmo, entre esses typos mais elevados (macegas), como os sorghos e o capim flecha; outros de grande desenvolvimento em área, como Anstida — 55 — (barba de bode), que pela grande resistência vegeta nos terrenos mais seccos e duros e, pela grande facilidade de disseminação, levado pelos ventos por dilatadas zonas. Entre as Cyperaceas, que não têem de modo algum analogia nem no numero de indivíduos nem no de espécies, cita os géneros Scirpus e Rhynchospora. A segunda familia, em importância pelo numero de indivíduos e pelo de espécies, é a das Compostas. Salientam-se principalmente : Vernonia (assa- peixes), Bupatorium, (cambará, charnias). Baccharis, (carqueijas, alecrim, herva-santa, vassoura), Isostigma (cravos do campo), Eremanthus, Wedelia, Aspilia, etc. Immediatamente depois vêem as Leguminosas : Lupinus, Camptosema (tiiiibós), Eriosema, Clitoria (espcUna falsa, feijão bravo), Phaseolus (feijão), as Convolvulaceas, grande numero de espécies de Ipomoea (batatas, bôa-noite, salsas, velames), e de Bvolvulus (Hera). As Labiadas, com grande numero de indivíduos, quasi todos de espécies do género Hyptis (M arroio. Alfazema brava, Poaia do campo), e algumas espécies de Salvia. Acompanham-n'as as \'^erbenaceas : Lippia (Cidrilha, Chá de pedestre), Stachytarpheta (gervão), e Casselia. Buphorbiaceas (Velames, Pé de perdiz, Maniçobas), com espécies pequenas, poucos indivíduos, e pouco salientes. As Orchidaceas tomam muito maior importância : Cyrtopodium, Bpistephium, Habenaria e SpirantJies. Também muito salientes pelas flores as Apocynaceas: Dipladenia (Jalapa vermelha) , Macrosiphonia (Jalapa branca, Velame), Rhodoca- ly.v; as Asclepiadaceas são muito representadas (painas do campo, cipó-sapo, etc.) Das Gencianaceas ha poucas: Dcjanira (Copo d' agita, centáurea, genciana). Das Scrophulariaceas ha duas mais salientes: Bstherhasya splendida (Imbiri), e Bscobedia scabrifolia. São muito numerosas as Amaranthaceas : Gomphrena (Paratndo, Infallivel, Perpetuas, Macella). As Acanthaceas: Dipteracanthns, Ruellia, Calophanes. Das Melastomaceas, sobresahem Caiiibessedesia, Tibouchina (Flor de quaresma-), e Pterole/iis. As Iridaceas, tão impressionantes pelas suas bellas flores, são em geral pouco numerosas: Lansbergia (Maricá, Rhuibarbo do campo), Sisyrinchinm, Alophia. As Umbelliferas, com grandes rosetas que tapetam o chão, e pedúnculo até de um metro, com as inflorescencias, têem um género muito abundante: Bringium (Liiigiia de tucano, caragoatá falso). Menores dimensões tem ainda a única Eriocaulacea cam]>estre: Poepalaiifhus Clausseniaiius. As Bromeliaceas com duas espécies: Ananassa (.liiauaz do matto), e Bromelia bracteata (Caragoatá). Polygalaceas, plantas minúsculas com flores, em cachos, roxas ou brancas : Monina, Polygala (Poava). As Rubiaceas DccUcuxia (Cruzeiro, Sete-sangrias), Borrerias (Poaya do campo, Rubim). Uma pequena Rhamuacea. Duas Oxalidaccas, (Azedinha do — 56 — Pavonia (Carrrapicho) . Uma Aristolochia (Cipó mil-homens). Uma Comme- linacea. Algumas Gesneraceas (Batata do campo). Duas Passifloriaceas (Ma- racujá). Uma única espécie de samambaia é o Adiantum, aliás bastante raro. No andar médio dos arbustos predominam Myrtaceas, Malpighiaceas e Melastomaceas . Os arbustos das Myrtaceas são baixinhos, de meio até um metro, muitas vezes em touceiras e de flores cândidas: Campomanesia (Guabirobas) , Eugenia (do typo das U vaias, Cambuis, etc), Myrcia (Cambuis), Psidium (Araçás). Malpighiaceas, ás vezes em touceiras, outras vezes em brotos finos, arcados, lembrando os cipós das mattas : Byrsonima (Muricy), Heteropteris (Praguá), Têtrapteris, Mascagnia. Melastomaceas : as Miconias são mais altas, até dous metros, e muito ramificadas; as Microlicias, menores no porte e nas folhas, com flores maiores e bellas, côr de rosa ou brancas: Lavoisiera, Microlepis, Miconia (Olhos de porco), Trembleya, Microlicia, Tibouchina, (Flor de Quaresma). Compostas: Vernonia (Assa-peixe), Symphyopappus, Bupatorium (Cam- bará), Baccharis (Alecrim) , Moquinia. Como mais salientes vêem depois as Lithraceas : Diplusodon. As Terns- troemiaceas : Kielmeyera (próxima das camélias), com flores grandes, brancas ou vermelhas, e odoriferas. As Papillionaceas : Harpalyce, Andira e Crotalaria (Guiso de cascavel). As Bixaceas: Cochlospermum (Rhuibarbo do campo), com bellas flores; Casearia (Lingua de teiú) . Apocynaceas : Plumeria (Tiborna), com flores bellas e cheirosas, Tabernaemontana (Leiteira), Laseguea. Anonaceas (ariticuns) . Anacardiaceas : é muito abundante o caju do campo. Passando agora ás figuras mais conspícuas dos campos-cerrados, têem o primeiro logar as Vochysiaceas : Qualea (Páo terra). Vochysia, com suas grandes flores amarellas de ouro, Salvertia convalariodora (Bananeira do campo), com grandes flores e cheirosas. ♦ Vêem depois as Leguminosas, com as três sub-familias ricamente represen- tadas : entre as Papillonaceas : Bozvdichia znrgilioides (Sucupira) com grandes flores roxas ; a Coesalpinea : Sclerolobium aureum, de flores amarellas muito chei- rosas; e a Mimosa Stryphnodendron Barbatimão, talvez a arvore mais caracter- ística dessa formação, e de grande valor pelo seu emprego na industria do cortume. Mais esparsas, mas também conspícuas e typicas, são: Solanum lycocarpum. (Fructa de lobo), Kielmeyera coriacea. Duas Bignoniaceas : Tecoma (Ipcs), que em Agosto estão sem folhas mas com grandes cachos de flores amarellas; as espécies de Bombas (Paineiras), com poucos galhos, e que na secca em vez de folhas, estão cobertas de flores albas e odoriferas; a Anona crassifolia (Ariticum cabeça de negro) ; a Araliacea Didymopana.v macrocarpum (Mandio- quinha), a arvore mais bella do cerrado; a Myrtacea Eugenia dysenterica (Cagaiteira), abundantíssima, de fructos comestíveis, que o gado aproveita no — 57 — começo das chuvas; a Caryocar Brasiliense (Piquí) com flores grandes, e cujo fructo drupaceo tem uma polpa que envolve a semente, e cosida serve de alimen- tação; a Loganiacea Strychnos psetido-qnina; Compostas: Vanillosmopsis (Candeias) e Vernonia; uma Labiada arborescente Hyptis cana; algumas Malpighiaceas e Nyctaginaceas . Da maior importanica é a Apocynacea Hancornia speciosa (Mangaheira), de cujo látex se faz excellente borracha, e que contribue com um pequeno contingente, de 600 a 800.000 kilos, annualmente; também os fructos são comestíveis e deliciosos. Warming estuda depois as consequências immediatas das queimas dos campos. Mostra como ellas acederam a primavera, vendo-se novos brotos e folhas e flores surgirem do solo negro ; o que attribue á potassa das cinzas dissolvida no orvalho das noites. Estuda a flora dos campos queimados, e a influencia das queimas sobre a forma das arvores. E conclue que é impossivel affirmar que as queimas tenham desenvolvido espécies novas. Em geral cada espécie campestre tem um representante próximo na floresta. Póde-se admittir que as sementes da floresta germinem no campo e soffram modificações pelas condições especiaes do meio, até se transformar em espécies novas, e isso independentemente das queimas. As queimas dos campos devem contribuir muito para o enfezamento e rachitismo das arvores; podem mesmo, eliminando os troncos, e perseguindo os brotos, reduzir as arvores a arbustos ; mas nem por isso podem transformal-as em espécies novas. Parece antes que a diflFerenciação das espécies deve ser attribuida ás condições de humidade, luz e solo, pouco favoráveis dos campos. Das listas que organisou, somma para os campos cerca de 700 espécies, e para as mattas, 1.400. Das 149 familias pelas quaes se distribuem as espécies. 120 são silvestres, e somente yy campestres. Dessas todas, 39 familias habitam exclusivamente as mattas, e muitas outras têem nas mattas um numero muito maior de espécies. Aos campos somente duas familias pertencem exclusivamente, e ainda assim cada uma com um.a só espécie : a Rhisobolacea com Caryocar Brasiliense, e a Olacacea com Agonandra Brasiliense. A nós, sem a minima autoridade, parece que estes factos estão indicando que as mattas deveriam ter precedido os campos. Também nos parece que ainda o Caryocar Brasiliense é o mesmo typo, que vae crescendo de porte á medida que se caminha para o norte, ao menos no Estado de Minas até o valle do médio Jequitinhonha ; depois são as arvores gigantescas nas florestas equatoriaes. Entretanto, a prudência do sábio sobresahe em Warming, quando diz : "Deve-se, pois, considerar a flora silvestre como a mais antiga e a campestre como a mais nova, e resultando daquella ? Não creio que tal deducção seja bem fundada, mas por emquanto de certo nada de positivo se pôde afíirmar." M F. 8 — 58 — Entretanto, a prudência do sábio sobresahe em Warming, quando diz: "Deve-se, pois, considerar a flora silvestre como a mais antiga e a campestre como a mais nova, e resultando daquella? Não creio que tal deducção seja bem fundada, mas por emquanto de certo nada de positivo se pôde affirmar." d) — Campos alpinos O seu caracteristico é a grande altitude. Em geral occupam pequena extensão. São campos limpos e de vegetação rala, baixa e pouco variada : o solo quasi sempre de pouca espessura, pedregulhento ou mesmo rochoso. O typo desses campos encontra-se bem accentuado em Minas. Em uma faixa que começa cerca de paralello de 21° e se prolonga até o parallelo 10° comprehendida proximamente pelos dous meridianos de 1° do Rio de Janeiro, dentro do Estado de Minas, e entre os meridianos orientaes de 1° e 3° no Estado da Bahia, espalham-se as manchas desses campos nos planaltos e nas cristas dos massiços da Serra do Espinhaço. E' justamente ao longo dessas cristas que se encontram em alinhamento as montanhas elevadas do Brasil. As cristas e elevações mais resistentes são todas formadas de quartzitos, e as chapadas altas pela mór parte estão cobertas dos detrictos dessa rocha. Para um e pa.ra outro lado, mas principalmente para oeste, apparecem chapadas e elevações de schistos e calcareos ; e também para um lado e para outro, mas principalmente para leste, ficam planaltos e elevações de menor altura de gneis e de outras rochas cristallinas sobre que descançam os sedimentos apontados. O solo fica portanto na sua maior ]3arte, de constituição arenosa e permeável. Mas a diversidade das rochas ha de forçosamente constituir solos diíTerentes. Entretanto é sobre essa grande área assim diversificada que se espalham com uma uniformidade notável de vegetação, os campos de Minas e os çjeraes da Bahia. Bem que não haja estudos minuciosos sobre toda essa área, o que consta das numerosas narrativas dos viajantes que a têem percorrido é um caracter sensivelmente homogéneo na coberta dos campos. Para os campos cerrados estão todos de accôrdo em que a causa preponde- rante é a relativa seccura do chão e do ar. Mas aqui não ha como invocar a mesma origem. Nessas montanhas e planaltos os vapores se condensam com relativa abundância, si não em chuvas copiosas, ao menos em neblina e nevoeiros das nuvens que todos os dias se accumulam sobre aquellas serras. Queluz, com uma média annual de 1.460 m.m. de chuva, Congo-Socco com 2.940 m.m.. Morro Velho (Villa Nova de Lima) com 1.640, Ouro Preto com 1.800 m.m., bastam para provar a affirmação. E nem precisa: por cima de todas essas serras e planaltos ha nascentes e volumosas correntes a])parecendo muitas vezes extensos brejos e atoleiros onde a humidade é constante. Não é, portanto, a falta de humidade que faz a vegetação especial. Certamente, mais para norte, na parte central da Bahia, as chuvas escasseiam e a humidade é mais fraca ; porém, como a vegetação é a mesma, mais se prova que a causa deve ser outra. A diversidade dos solos também faz pôr de lado este elemento como menos preponderante. Então somente resta appellar para a altitude: Warming (138) — 59 — diz: ''Na serra da Piedade, todas as tardes depois do occaso, vinham as densas neblinas de leste, permanecendo sobre as montanhas durante a noite, para, pouco a pouco, começarem a retirar-se algumas horas depois do nascer do sol, deixando a vegetação completamente orvalhada". Porém mais adiante, fallando da natureza xerophila da vegetação campestre, diz : '' Na serra da Piedade, e outros picos de montanha, taes arvores baixas contorcidas apparecem ; mas ahi devem ser causas o frio durante a noite, e a secca durante o dia." Álvaro da Silveira, que muito tem estudado a flora das serras de Minas, diz (123) : ''Onde vegetam Vellosias e Barhacenias a altitude é geralmente superior a i.ooo metros; onde apparecem as Utricularias e Genliseas a altitude approxima-se ou excede de 1.200 metros; Lavoisiera e Chaetostoma, assim como as Fuchmas, são quasi sempre encontradas em altitudes superiores a 1.200 metros. O Lycopodium ruhrum tem sido encontrado até agora em altitudes de cerca de 1.700 metros". As antigas descripções de Martins, como as posteriores de Warming, como as mais recentes de Álvaro da Silveira concordam perfeitamente na enumeração dos typos predominantes na flora da Serra da Piedade. Aproveitando princi- palmente as indicações da "Flora e Serras Mineiras", citaremos as seguintes familias e géneros como os mais salientes nesses campos. Naturalmente a vestimenta geral e mais espalhada é a das Gramineas, representadas mais abundantemente pelos géneros Paspalum e Panicum; com ellas estão diversos géneros de Cyperaceas. Mas as plantas que dão o cunho alpino, são: as Vellosiaceas com os géneros Vellosia e Barhacenia: Vellosia compacta de Martins {Canella d' ema), que é a figura mais conspicua, attingindo ás vezes grandes dimensões, até 20 a 30 c. m, de diâmetro, e até três e quatro metros de altura, contendo entre as camadas do tronco e dos galhos uma resina que a torna excellente combustível : é a planta dos quartzitos por excellencia; a Vellosia gramínea (Pohl), a Barhacenia ^excapa (Mart.), e a Barhacenia flava vivem commodamente sobre as rochas nuas ou quasi nuas, e, sendo de menores dimensões, offerecem os brotos novos aos animaes, que os apreciam ; as Compostas : Mikania, BaccJiaris, Vernonia, Arnica, montana, Haplostephium passerinum (Arnica) ; as Briocatiladeas: Paepalanthus, Briocaidons, Leiotlirix, Syngonanthus ; as Melastomaceas, princi- palmente as de typo pequeno e a modo de urzes: Microlicias, Carfibesscdrsia, Lavoisiera, Tibonchina, Tremhleya; as Amaryllidaceas : Alstroemeria; as Labiadas ; as Malpighiaceas : Byrsonimas (Mnricy, fruta de perdiz) ; as Gencia- naceas : Lisianthus (Genciana); as Amaranthaceas : Gomphrena officinalis (Pa- ratudo) ; as Cíesalpinaceas, com grande numero de espécies de Casda; as Papillionaceas : Siv-eetia, Clitoria; as Mimosaceas: diversas espécies de Acácias e Sensitivas; as Convolvulaceas : Ipomeas, Bvolvulus ; as Rubiaceas : Borreria, Declieuxia; as Asclepiadaceas : Ditassa, Oxypetahim, Hemipogon, Astephanus; as Gesneraceas : Gesnera, Hypocyrta; as Scrophulariaceas : Angelonia; as Bigno- niaceas ; muitas espécies nos géneros das Myrtaceas ; Ericaceas : Gay- Lussacia; muitas Xiridaceas ; as Bromelaceas, não somente sobre as arvores á margem dos córregos como sobre as pedras; do mesmo modo grande — 60 — (Cabeça de frade) ; no grupo dos fetos, as Cyatheaceas : Cyathea, Alsophila; Polypodiaceas : Pteris, Polypodium, Bícclumm, Gymnogramina, Aspleiiiuiii; Schizoeaceas: Anciniia; Hymenophyllaceas ; uma Guttifcra: Clusia, as Lycopodiaceas também muito abundantes, com Lycopodium e Selaginella; Utriculariaceas ; Droseraceas ; Lichens e Musgos . Naturalmente esta enumeração comprehende muitos grupos que nem sempre estão congregados. As condições de solo e clima, juntas á altitude preponderante, hão de constituir associações que se localisam. Assim é que na Serra do Cipó encontra Silveira uma grande predominância «das Eriocaulaceas, que ali contam hoje 8i espécies, sendo que 34 espécies novas foram por elle classificadas. Pelas relações de Martins, vê-se que quanto, mais para norte mais amiúdam as Cactaceas, não somente como indivíduos mas também nas espécies de formas variadas. Entretanto, a persistência das Vellosias, das Amaryllidaceas, e das Orchidaceas do chão é constante, avançando por toda a faixa que indicamos Nem a formação dos campos alpinos se limita á faixa descripta. Em Minas, para oeste, na Serra da Canastra, nos altos campos que fazem a divisa de aguas do S . Francisco com o Rio Grande, é ella vastamente represen- tada. O solo é também em grande parte de quartzitos; e a formação avança para sudoeste, retalhada pelas aguas do Rio Grande, até penetrar em S. Paulo. Ali dá-se um facto interessante : na depressão e nas proximidades do Rio Grande, em uma altitude que vae de 600 a 800 metros, desde que o chão é de quartzitos, apresenta-se a flora alpina das Vellosias. Em Goyaz tem ella também um grande desenvolvimento. Depois da enorme área dos campos-cerrados que occupam quasi toda a bacia do rio Paranahyba, ao approximar das chapadas divisoras entre esta e a do Tocantins, de Bomfim a Pyrenopolis, ha verdadeira transição dos campos cerrados para os campos alpinos. O Dr. Ernesto Ulc (136) cita ainda alguns typos daquella flora misturados com canella d'ema e seus associados, que vão predominando á medida que se ganha o divisor. E é esse facto ainda uma demonstração da fraca influencia da constituição do solo sobre este typo de vegetação. De Bomfim a Pyrenopolis são principalmente os schistos micaceos mais antigos dando um solo argiloso. Na serra dos Pyrenêos no alto do divisor, em altitudes de i.ooo a 1.300 m. a rocha é o quartzito : ahi preponderam os campos alpinos typicos. Mais para leste até a altura de Formosa, em meio dos campos cerrados estão os campos alpinos occupando as maiores altitudes. De Formosa para norte a formação geológica é outra — gréz e schistos argilosos — de época mais recente (paleosoicos). E' o extenso chapadão dos Veadeiros, por quasi dois gráos de comprimento, com altitudes comprehendidas entre i . 000 e i . 300 metros . Os campos alpinos prevalecem em enorme área. A vegetação descripta por Ule é exactamente a mesma das serras e chapadas altas de Minas Geraes, com a sua tendência característica accentuada para formar grupos de plantas sociaes. Caatingas A côr alaranjada representa caatingas. E' um typo de vegetação especial do nordeste do Brasil, e que melhor se caracterisa na parte septentrional da bacia do rio S. Francisco que fica para norte do parallelo de lO". Nessa área extensa têem as precipitações athmosphericas o seu minimo em quantidade, e o máximo em irregularidade. E' justamente dessa irregularidade que dimana a vegetação especial. Martins, que estudou essa vegetação, define a caatinga como ''uma floresta de arvores mais baixas, com o chão menos juncado de arbustos, e que durante a secca perde as folhas de quasi todos os indivíduos. Algumas arvores, entretanto, conservam os fructos que amadurecem durante a secca. Ainda assim, sustentam as arvores muitas parasitas epiphytas. Fica esta vegetação em tal modo dependente da humidade que, emquanto não chove, as arvores não criam folhas. Algumas têem uma organisação especial para poder resistir ás grandes seccas", O Dr. E. Warming também caracterisa as caatingas pela queda das folhas, "de que a mór parte das arvores se despem como protecção contra as seccas prolongadas". Parece que a vegetação das caatingas participa dos dous typos que occupam os extremos da série que vimos enumerando. Nas florestas tropicaes, em um solo mais ou menos encharcado, com a atmosphera saturada de humidade, as raizes são pouco desenvolvidas, formam uma verdadeira rede á superfície ; os troncos são direitos e muito alongados a buscar a luz por cima do recinto sombrio ; as folhas têem larga superfície e mui pequena espessura. E' a adaptação á humidade, subsistindo a luta pela luz. Nos campos-cerrados, em solo e atmosphera seccos, as adaptações são outras : as raizes penetram fundo, tomam grande desenvolvimento em volume, formando tubérculos, para accumulação da humidade, a vida como que se torna subterrânea ; o apparelho vegetativo aéreo procura resistir á transpiração excessiva, já dimi- nuindo as superfícies exteriores e os espaços intercellulares, já por desenvolvi- mento exaggerado do sclerenchyma, adquirindo folhas coriaceas, ou então cobrindo-se de pellos ou feltros. Outra orientação da defeza contra as seccas, quando mais exagerada, consiste na transformação do parenchyma em um tecido ávido d'agua. Como resultado, nos cerrados se desenvolvem as plantas seccas de tecidos coriaceos ; e, durante prasos mais ou menos curtos, dá-se a queda das folhas. — 62 — As caatingas participam das duas séries de adaptações : têcni que viver unia parte do anno em clima húmido, outra parte, em geral a mais longa, em clima secco. As arvores não têem os caules e galhos tão tortuosos nem cascas acorti- çadas como nos cerrados ; são antes mais direitas e de casca lisa, como nas mattas. Para diminuir a transpiração as folhas reduzem a sua superfície, subdividem-se, tornam-se foliolos minúsculos, e tomam o recurso extremo de cahir, (|ue é a caracteristica mais generalizada de toda a vegetação. Nessas circumstancias ha um excesso de luz, a que as plantas procuram fugir, desenvolvendo ramos desde perto do chão, o que lhes dá a todas a apparencia de arbustos, com galhos entrelaçados; e, quando muito juntas, o entrelaçamento das varas torna a caatinga quasi impenetrável. O outro modo de defeza contra as seccas, a formação das plantas gordas, é muitíssimo frequente nas caatingas, bem como a das espinhentas. Assim a caatinga é matta verde durante a estação das chuvas. Na secca é um tramado de troncos e de varas entrelaçados, alguns cheios de espinhos, sobre o qual se levantam algumas copas de arvores mais altas, e os feixes das columnas dos cactos (cardeiros). No chão é tudo murcho e secco; apenas vingam algumas Bromeliaceas (macambiras) . Dentre as raras arvores que conservam as folhas, sobresáe o Joáseiro (Zizyphus joaseiro, Mart.) e as Imhuranas, com as suas copas densas e bem enfolhadas, mas que também se despem nas seccas rigorosas. Mas, com as primeiras chuvas, a folhagem desabrocha e em um, dous ou três dias tudo reverdece ; as sementes enterradas no chão germinam ; e, de companhia com os brotos adormecidos das raizes e caules subterrâneos, levantam-se como por encanto as plantinhas formando um tapete continuo e verde. O Dr. Alberto Loefgren, que prosegue nos estudos da vegetação do nordeste brasileiro, e com a sua alta competência em breve nos dará a definição daquellas floras particularíssimas, faz a seguinte enumeração dos príncipaes elementos da flora typica permanente das caatingas do Ceará (82). Entre as Mímosaceas: duas Juremas, Espinheiro, Unha de gato, Sabiá; Cesalpinaceas : CaatingiCeiro, Jucá Canna-fistula e Mororós; das Burseraceas, a Imburana; das Apocyneas, o Pereiro; das Erythroxylaceas, o Rompe-gibão; das Bígnoníaceas o Páo d' arco; das Ramnaceas o Joa::eiro; das Rosáceas a Oiticica; das numerosas Euphorbíaceas os Marmeleiros; das Cactaceas o Xiquixique, o Mandacaru, o Cardeiro, a Palminha e a Coroa de frade; das das Bromeliaceas, duas Macambiras; das Portulacaceas, a Beldroega pequena, muito commum. Passando em revista as espécies que colheu, Loefgren encontra predo- minantes as Leguminosas, as Gramíneas e as Euphorbiaceas. As Compostas, que nos campos e nos cerrados representavam um papel tão conspícuo, têem as sementes varridas pelo vento e mais difficílmente conseguem fixar-se ao solo. Quanto ás Gramíneas, representam papel muito saliente no meio da vegetação baixa das caatingas. Durante as chuvas desenvolvem-se largamente, principal- — 63 — mente o panacho e o capim mimoso, constituindo excellentes pastagens com exclusivismo dos outros vegetaes herbáceos, por espaço de muitas léguas. Dos seus estudos conclua que a flora das caatingas não passa da mesma flora das mattas das encostas das serras, modificada e transformada. A vegetação vigorosa das serras foi pouco a pouco transferida para os terrenos de formação mais recente que hoje cobrem as extensas planicies mais deprimidas, ou sertões do Ceará. Submettida ás duras provações das actuaes condições climatéricas teve de soífrer adaptações successivas nos seus differentes typos; muitos destes ti- veram de succumbir na luta, restando um numero bem restricto das espécies mais resistentes que agora constituem esta associação especial, conservando ainda entretanto os caracteres que deixam reconhecer a primitiva formação- dryadica. Larga distribuição tem esta formação vegetativa pela área do Brasil. Prin- cipalmente na parte de nordeste, toma ella grande vulto entre os 3 e os 15° de lati- tude sul e desce mesmo em cintas e manchas de menor área dentro do Estado de Minas até cerca do parallelo 18". Mais para oeste occorre ainda, bem que com caracteres um tanto difi^erenciados, na parte alta das bacias dos affluentes meri- dionaes do Amazonas, desde o Tocantins até o Tapajoz, ou até cerca do meridiano de 15° a oeste do Rio de Janeiro. Pela própria natureza da vegetação, modificada por elementos climáticos muito variáveis na sua intensidade e duração, é de prever grande variedade nos agrupamentos locaes de cada zona. Infelizmente não temos elementos positivos, como o que acabamos de resumir para o Ceará, para caracterizar esses diversos typos da mesma interessante formação. Na Bahia, pelas referencias de viagem de Martins (9), e pelas mais recentes de Ule (30), podemos notar desde logo uma certa distincção, nas curtas listas que ainda mais resumiremos. Parecem também predominantes as Leguminosas. Entre as Csesalpinaceas, cita Martins: Coesalpinia glandulosa, C. microphylla {Páo de rato); C. porcina {Catinga de porco) ; C. acinaciformis {Carrancuda) ; C. férrea (Páo ferro, Jucá) ; das Papillionaceas Brythrina muhingú (Muhingú); numerosas Euphorbiaceas ; Ule cita diversas espécies de Manihot, entre ellas uma que dá borracha; diversas espécies de Jatropha {Mandioca brava), cujas folhas são munidas de pellos urentes;*uma euphorbia cactiforme — Buphorhia phosphorica. Mart. {Cunannn). sem folhas, com caule e ramos angulosos e articulados, formando densas moitas, uma Jatropha arbórea; a /. pJiyllacanta. Mull. Arg., que ás vezes forma com arbustos de Croton grandes manchas da vegetação exclusiva. Martins cita como caracteristicas as Bombaceas ( Paineiras, Barrigudas), Chorisia ventricosa, Pourretia tuberculata; entre as iVnacardiaceas : Jmbú (Spon- áias tuberculata), arvores baixas, de copa arredondada até o chão, 'dando fructos ácidos e saborosos, e tendo nas raizes tubérculos que fornecem agua para mitigar a sede nas grandes seccas; das Burseraceas a Lmburana (Bursera leptophloeos. Mart.) ; das Rhamnaceas o Joaseiro (Zisyplius joaseiro. Mart.) arvore mais alta e copada, que dá sombra mesmo durante a secca; entre as Capparidaceas o Icó {Capparis Icó. Mart.) ; de Anonaceas {Anona obtusifolia. — 64 — Mart.) ; muitas Cactaceas; espécies cohimnarcs de Cereus — C. tetragonum, C. hexagonum, C. heptagonum, C. serpentinus, C. candelabrus, Opuntia tomentosus, O. brasiliensis. Mart. Ule diz: "O chão apresenta-se coberto por muitas hervas, entre ellas muitas Bromeliaceas em grandes touceiras : Ilolicnhergia catingae. Ule, Bromelia sp. Gravisia exudans, Mez e Ncoglaziovia variegata. Mez. Desta e de outras apro- veitam-se as fibras para cordas e tecidos. Talvez possam, ser cultivadas como plantas textis." Ule encontra também na caatinga a Maniçoha de Jequié (Manihot dichotoma. Ule.) Ule diz que a caatinga na Bahia não se eleva a mais de 800 metros. Em altitude maior passa aos carrascos. "Muitos dos elementos das caatingas appa- recem nos carrascos, embora estes sejam constituidos por plantas sempre verdes, formando densas moitas emmaranhadas, e pareçam formar um meio termo de transição para os campos cerrados." Ha pois uma diííerença notável entre esta e a vegetação correspondente no Ceará. Emquanto aqui a caatinga passa ao campo-cerrado, no Ceará, onde não existe este ultimo typo de vegetação, a transição se faz para a matta, e de modo tão gradual, que é mais um documento para a affirmação de Loefgren de que a caatinga provem da matta. Caminhando para sul, no território sul-bahiano e no norte-mineiro, ainda se nota um facto semelhante. A passagem das mattas da encosta atlântica para as caatingas faz-se de um modo gradual com um typo intermediário a que denominam especialmente mattas acaatingadas . Isto acontece na parte alta dos valles dos rios que vão directamente ao Atlântico, como o Rio de Contas, o Pardo, o Jequiti- nhonha (73, 121 e 124). São mattas mais ralas e de pouca altura, nas quaes quasi todos os indivíduos se despem das folhas durante a secca. Também no valle do Rio das Velhas, a norte do parallelo de Curvello apparece este ultimo typo, passando a verdadeiras caatingas, de preferencia sobre os solos de calcareo. O caracter íloristico da caatinga é accentuado pela predominância constante das Leguminosas; vém depois as Burseraceas, Apocynaceas, Anacardiaceas, etc. Mas aqui, com o maior desenvolvimento das arvores, apparece uma circum- stancia de valor económico : ha abundância relativa de madeiras de lei, e algumas, como as Aroeiras, os Ipês, os Jacarandás do Sertão, têem as qualidades de resistência e durabilidade muito mais refinadas do que os typos correspondentes na floresta. Assim encontram-se numerosas madeiras de construcção e marcenaria . Entre as Papillionaceas : Machaerium (Jacarandá tan. etc), Andira (Ange- lim), Bowdichia {Sucupira) ; das Csesalpinaceas : Caesalpinia {Páo ferro ou Jucá), Hymenaeas, (Jatobás, Jutahis); das Mimosaceas: Piptadenia (Angico, Jacaré), Pithecolobium (Sobreiro), Plathymenia (Vinhaticos), Bnterolobiiim (Ximbó Monjolo); entre as Burseraceas, vários typos de Imburana (Bursera) ; — 65 — (las Apocynaccas Aspldospcnna {Pereiro); das Anacardiaccas : Astroniiim (Gonçalo Alves), Scliiiiiis (Aroeira do Sertão); das Bignoniaceas : Tecomas (Ipês); das Rntaccas: Xaiitho.vyhnn {Catinga de porco)) c muitas outras. Mais para céstc, o typo da vegetação se modifica; c, em meio de uma lechnologia mal definida, apparccem nas dcscripções mais ou menos predominantes CS caracteres das mattas scccas e rachiticas das caatingas. Muitas vezes são aggremiações qr.asi exclusivas de uma taquara miúda misturada com plantas cspinhcntas. Na zona percorrida pela Comniissão das Linhas Tclcgraphicas de Matto Grosso, por entre os afP.uentes que formam o Jurucna apparece um typo do vegetação assimilável á caatinga. E' o charravascal, que o Coronel Rondon (ii8) assim descreve: ''um espesso trançado de varas finas, taquarinha e gravata, mais fechado que as caatingas, de que differe também pela vegetação ; semelhante aos espinhaes da Argentina e acs caparraes do Texas". Mais para céste, no chapadão dos Tareeis, ainda apparece essa vegetação limitando plagas de campos com a matta intérmina que se prolonga até o sulco do Madeira. Bem na extrema do Brasil com a Bolivia, informa-nos o distincto botânico Dr. Júlio Cezar Diogo que a chapada da Serra do Ricardo Franco é toda coberta dessa vegetação de taquarinha. Emquanto as encostas são revestidas de matta exuberante, o alto do massiço é formado daquella vegetação impenetrável num solo pedregoso e quasi sem terra vegetal. Este typo de vegetação parece antes representar já uma influencia das regiões occidentaes, onde eile se desenvolve cm grande extensão pelas encostas orientaes dos Andes. Carrascos. — E' outro typo de vegetação bastante ccmmum em Minas-norte e na Bahia. Nas chapadas que se estendem pelos divisores entre as aguas maiores, e em alguns dos planaltos menos elevados dos massiços da Serra do Espinhaço, dcsenvolve-se largamente esta formação. E' uma coberta de arbustos e arvoretas de ramos tortuosos, ensarilhados e tramados, alguns espinhentos, e enredados de cipós que também o são ; ás vezes é tão densa que se torna quasi impenetrável. A altura varia de um a um e meio metros ; attingindo raramente dois ; de sorte que o recurso para atravessal-a é a cavallo e vestido de couro. As arvores mais altas são muito raras. Martins (95) descreve esta vegetação na chapada estreita e longa que divide o rio Arassuahy do Jequitinhonha, desde Rio Manso a!é Minas Novas "Arvores baixas de galhos retorcidos e folhas largas levantam-se em meio de uma densa coberta de vegetação arbustiva de composição bastante variada. Aqui e ali é essa coberta arbustiva interrompida por manchas de campo limpo sccco, ou de rocha inteiramente descoberta. Esse conjuncto chamam ali cerrado: quando mais baixo c sem arvores, denominam carrasco. Nem todas as plantas dessa formação perdem as folhas r.a sccca". — E cita, como mais salientes: os géneros Sida, Ochna, Mimosa, Acácia, Qtialca, Coccoloba, Kichneyera, Laiinis, Nycte- rosition, Arrazoa, Barnadesia, Albertina, Anona, Banisteria, Malpighia, Aspido- sperma ; c as palmeiras acanles: Astrocaryum campestre, Diplothcuuum campestre e Cocos flexuosa. M. F. 9 --- 66 -^ í\\'i'i'Yè-se que, além das Leguminosas apparccem aqui as Vocliysiáòcas; '■à's ■'GWttlfcras, tão caracteristicas dos campos cerrados. E' que, realmente, áfr hl •manchas de cerrados no meio dos carrascos extensos, que também chamam de Habolciros alhidindo á feição do terreno ^ Mais para céste, depois das cristas de quartzito que fazem a divisória entre 'O'' Jequitinhonha e o S. Francisco, nas serras de Itacambira c de Congonhas, 'hás assentadas c encostas pedregosas que vertem para o Jequitah\' e para o río Verde Grande, os carrascos são mais typicos. Infehzmente não podemos citar '^nenhuma autoridade; mas recorda-nos de que a vegetação émais baixa, abundante "ém Leguminosas, Alyrtaceas muito rijas e contorcidas, Euphorbiaceas,^ LiHaceas *(Smylaceas) trepadeiras e espinhentas, eo chão com grandes moitas áç. Xiqiié- 'xique, e algumas Cabeça de frade, .%:-; ^'Descendo mais para céáte, esses carrascos passain ás caatingas dos valles do Jequitahy e do rio Verde Grande. ■ - Assim parece que a vegetação dos carrascos deve antes ser relacionada com a das caatingas do que com a dos campos-ccrrados, cuja constituição é sempre hmiito bem caracterizada. ■ i' .:■■. ' . , " ' ■■■ ' ■ - ..'i c : 'íia especialmente das albo-tomentosas. Poucas porém são as palmeiras e somente algumas Geonomas, vulgarmente chamadas Guaricangas e poucas Astrocaryum ou Brcjaúba se mostram, desapparecendo quasi nas immensas moitas dos grandes Carauatás, Ananassa sativa c Aechmca comosai com suas rubras infloresccncias e folhas rígidas e aculeadas. No meio destas apparecem grandes touceiras de Sunibarc, Cyrtopodium Andcrsonii com suas ílores de um amarcUo fusco, junto com as lindas Lanshcrgias e outras Iridaceas, — 7U — dcstacam-sc maravilhosamente das alvas lichcns Cladonia c dos bellos musíros que ahi encobrem o chão e attestam a natureza essencialmente xerophila desta formaÇíão particularíssima constituindo tanil)cni rnia diiíerença especifica do>= .cerrados do planalto. Outra diffcreni^a capital se manifesta na abundância dos bellissimos Saiiiaiiibaiiissús, ás vezes, carregados com a bella Orchidéa, Zygopc- taíiim maxillavc. O Nhundú característico acha-se por detraz das dunas das praias c parece .ás vezes substituir ao mangue cujo domínio venceu. Para nó? o Nhundú nada mais é do que um esforço da matta virgem para éc apoderar do terreno conquistado ao mar, o que effeclivamente tem alcançado, porém, com perda completa de seu caracter de matta virgem, pois teve que adaptar-se ás condições novas, tão diversas das da serra de onde se origina'' Líndman, no Rio Grande do Sul (86) enumera: á borda ímmediata do mat ás vezes formando pastagens extensas, e que são aproveitadas pelo gado, a Gramínea Spartiiia glabra, Mijhl. Mais para dentro continua a vegetação halophila sobre as arêas : Scsiwiuvi, Cotula, Altcnianthcra achyranta. Ainda mais para o interior encontra campos mais ccmparaVeis com os prados da região temperada européa. O chão forrado de uma vegetação de Graminaceas densas e succulentas, mesmo no tempo da secca, de Cvperaceas, da Umbellifera — Eryngium, de Scrophulariaceas pequenas e verdes; por cima rdesse , tapete , levantam-se, colmos mais elevados de Paspalum, de Juncos, de Hryngiíi7ii, de Compostas — Baccharis e Bupatorium, e de um Equisetum de doí"s metros de alto. Nos logares aplainados cobertos com ténue camada de agua -sempre corrente, que se pôde comparar aos apicuns do Norte, apparècem Xíri- daceas, Eríocaulaceas, e Musgos, alguns do género Sphagmun. Em alguns pontos apresenta-se um terreno limoso e de brejos, resultado das inundações periódicas. Ahi a vegetação é muito rasteira e composta princi- palmente de Cyperaceas, de Umbelliferas, Alisiua, Polygala, Droscra e mesmo _de. algumas plantas especiaes dos banhados . Mas a parte onde se desenvolve a vegetação typica da zona costeira é p. constituída pelas grandes dunas e pelas baixadas comprehendidas entre ellas. Ahi predominam as Graminaceas : Elionurns, Andropogon, Briza e Impcrata; vêem depois as Cyperaceas: Cypenis, Elcocharis, Scirpus; Papílionaceas : Indigofçra (Anil), Phascolus, Ccntroscma; Borragínaceas : Cordia; e algumas Compostas; todas porém plantas de mui pequeno porte e rachiticas, muitas rasteiras como as Ipornoeas. Entre as dunas formam-se corredores de solo aplainado, defendidos dos ventos, com sombra e mais humidade, onde até arvores conseguem vingar. Moraceas : ficiis (Figueira); Anacardiaceas : Lithraca {Aroeira) ; Euphcr- biaceas : Exeoecaria (Leiteira); Myrtaceas de varias espécies, que todas trazem ,0 cunho de dura lucta pela existência. Para completar o quadro da vegetaçã(3 .das restingas, diz Lindman, é necessário ajuntar um grupo de plantas xerophilas que ali se apresentam grandes e fortes: as Cactaceas: Cereus e Opuntia: as Bromeliacea? : .Bromc/m e ^na;mj., , ., — 71 — Hartt (62) encontra na zona costeira do Espirito Santo planicies com poucas Graminaceas, muitas Myrtaceas : Bngcnia {Pitangueira) e muitas Cactaceas e Bromeliaceas. Faltam-nos indicações autorizadas para o Rio de Janeiro. Deve havel-as de Glaziou e de Saldanha da Gama. De memoria, nas praias do Ypanema, Leblon, Gávea e outras appareccm as Myrtaceas : Pitangas e A raças; Anacardiaceas {Cajus) ; Cactaceas, Bromeliaceas, Vellosiaceas e Amaryllidaceas. Aqui, porém, seriamos tentados de pensar na possível disseminação de alguns dos typos que existem nas cristas e encostas rochosas das montanhas elevadas como Gávea, Corcovado, etc. Mas a icléa cáe de todo diante das autoridades que vimos-citando. Pantanal o pontilhado azul sobre fundo branco representa — o pantanal — as áreas mais consideráveis em via de aterramcnto, submettidas annualmente a fortes inundações . A zona mais importante e caracteristica está em Matto Grosso, como parte de uma entidade muito maior — o Grão-Chaco — . E' uma vasta depressão cuja altitude varia de loo até 200 metros. Para leste é limitada por um paredão escarpado onde se levanta o chapadão central brasileiro que segue quasi continuo até a encosta que deita para o Atlântico; a norte cercam-n'a ladeiras mais ou menos Íngremes que dão accesso ao planalto divisor das aguas do Amazonas. Para céste são as planícies intérminas que chegam até o sopé da Cordilheira, e para sul a extensão dessas mesmas baixadas inundáveis que passam impercepti- velmente para os pampas da Argentina . As encostas de norte e leste são retalhadas por inúmeras correntes, e constituídas, no geral, de rochas pouco resistentes. O enorme receptáculo das poderosas alluviões deveria ser aterrado em prazo relativamente curto, como ao norte aconteceu com o pantanal do^ Amazonas. Ao clima differente deve-se o alongamento desse prazo. As chuvas do Amazonas regulam por muito mais do dobro das do pantanal de Matto Grosso, onde ellas são antes escassas. Basta considerar que no Amazonas, e nos seus affluentes, a agua toma com as enchentes alturas colossaes : no Rio Negro em Manáos até 16 metros, no Purús egual é a differença e na bocca do Acre chega a passar de 20 metros ; emquanto que no Paraguay, nas maiores enchentes não chega a sete metros acima do nivel da estiagem, regulando a oscillação média de quatro a cinco metros. Assim o que caracterisa aquella zona é antes um clima de chuvas escassas. E, demais, á proporção que se caminha para céste, as precipitações diminuem na grande baixada. Assim acontece entre Cuyabá e S. Luiz de Cáceres; entre Cuyabá e Corumbá. Cuyabá, 1.425 m.m. ; Assumpção, 1.415; Corrientes, 1.250. E dahi para sul ainda mais se accentúa a seccura crescente para oeste; a ponto que, entre os parallelos de 20 a 40° sul, a contar do meridiano de 15° occidental do Rio de Janeiro, para cada kilometro que se avança para céste, até os altos da Cordilheira, diminuem de 1,5 millimetros as precipitações. M. F. 10 — 74 -^ São portanto de clima sccco as áreas que annualniente ficam submersas durante cerca de seis mczes, como também as pequenas elevações esparsas formando como ilhas cobertas de vegetação em meio daquclle mar de agua doce, e que constituem o recurso dos animaes durante a inundação. A quar.tidade de chuva cabida não é pequena, mas a alternativa do tempo secco para o chuvoso é muito accentuada e caracterisa o clima. De Outubro a Março chove abundamente, mas durante outros seis mezes as precipitações são insignificantes, muitos córregos seccam, e a vegetação soffre em consequência. . E' alguma coisa semelhante ao que.se passa no extremo nordeste. A differença essencial provem da configuração"" dó solo :' emquanto na região do nordeste a característica é a forte declividade das calhas e planos de escoamento, produzindo o mais franco regimen torrencial, aqui, nas planícies do pantanal, é o escoamento em i^lanos de nível, constituindo reservatórios do equilíbrio mais perfeito. A pequena -velocidade com que se movem as aguas tributarias é açcusada nas subidas e descidas da agua na calha principal. As chuvas começam em Outubro, o Paraguay começa a encher em Janeiro; a secca principia em Abril, o raragiú-.y vaza de Maio a Novembro. Assim . se explica o regimen regular do baixo ''Paraná: flanqueado no seu eixo pelos immensos reservatórios do Chaco e dos ^ixintáíiacs, tem uma descarga pouco variável; os máximos raramente chegam 'áo quádrtiJDlodos rriinimos; e as aguas trazem muito pouco sedimento, que fica c|uasi''tôcío'"depositadd' nas vastas depressões dos pantanaes : a arêa nos cursos '|)èrn'i'aiienfès, á argilla' nas vazantes e nas várzeas. ,. . '^ v-^getçiç.ão deve pois manifestar os caracteres da adaptação á grande hiiijiicladee.^ii -seccura; deve ser, na expressão de Schimper, de plantas tropa- j)hytas;. dev^ assemelhar-se ás caatingas do nordeste, que Loefgren considera çpmo, taes,. .A differença está no prazo da seccura, ali muito mais longo do que ^aqui» E^m ^odo caso é esse o caracter predominante. Mas as'circumstancias particulares daquella depressão e a sua posição -especial no continente sul-americano, fazem surgir ali uma grande multiplicidade •^dé formações vegetativas; e o Pantanal se nos afigura como o logar onde todos Jbs typos da vegetação do continenete vêem fundir-se, apiiarecendo na vasta área amostras de cada um delles e, em certos pontos, verdadeira mistura. Já vimos, tratando das mattas, como^ as florestas equatoriaes descem a sul até a bacia do alto Paraguay. Também as mattas pluviaes apparecem pelas encostas da orla do pantanal e riiesmo em algumas elevações em meio delle. A vegetação na sua grande maioria é de campes; mas estes mesmos são muito diversificados. .Nas vazantes e depressões, que conservam agua e humidade nas iseccas, são campinas. Km alguns tesos e lombadas mais altas são os campos ao_ sul. ]>l os degráos e pelas orlas mais elevadas são os campos-ccrrados Nos tesos è mesmo nás margens dos rios ha mattas seccas e espinhentas como as .caatingas do nordeste. Em alguns logares, mesmo á margem do rio, apparece uma vegetação espinhenta e de cactaceas como as mattinhas seccas das encostas orientaes dos Andes. — 75 — Couto de Magalhães (91), e cm outras de suas valiosas óbfas, "deçcreve o pantanal de um modo impressionante e que deixa idéas perfeitamente claras dâ interessante região. Provando bem o seu admirável talento observador, diz: '■ "Quem viaja essa linda e curiosa região dos pantanaes, não em vapôn, porque este, indo pelo meio do rio, não permitte a observação de detalhe, mas t:- ■j í ■ ir V! i<í :>)i>-4-iA j; .'..íi-JJ CJ ,-. ■/ iJii O. ÁREA DAS MATTAS O quadro junto ao mappa indica as áreas dos Estados e as das rriàttas ecarhpds respectivos. A área da matta é justamente a da côr verde no mappa,' e refere-se á vegetaçãa da floresta primitiva, não da actual. A's áreas das zonas de caatinga'^, a do pantanal e a da vegetação costeira fcram incluidas na dos campos.-''- Reproduzmios aqui o quadro: ESTADOS ÁREAS kilom. quadr- MATTAS kilom. quadr. Campos e outras formações kilom. qnadr- Porcentagem das áreas de mattas sobr^ a^ tota^y / n Território do Acre Amazonas — Pará Maranhão. .'. . Piauhy Ceará : Rio Grande do Norte Parahyba Pernambuco Alagoas Sergipe '. Bahia Espirito Santo- Rio de Janeiro S. Paulo Paraná Santa Catharina Rio Grande do Sul Minas Geraes Goyaz Matto Grosso TOT.4L DO Brasil 192.000 1.S32.800 1.220.000 340.360 231. igo 157. fóo 56.290 52.250 95.260 30.500 21.840 587.500 ■ 39-120 44-350 250 . 000 180.340 . 110.620 2S3.410 607.940 640.580 1.554.300 8.528.000 192.000 1.683.427 921-954 145-368 62.419 67-951 14-314 19.087 32-521 8-525 8.970 215-436 29-942 35-981 .161.750 160.350 86. 789 89-132 278.619 179.362 Éfj6 . 799 5.000.696 0.000 149-373 ■•298.046 194-992 168.761 89. 709 41.976" 33-163 62.739 21-975. 12.870 372.064 •9.178 8.360 88.259 19.990 23-531 194-278 329.321 461 .218 947-501 ' . I ff!. ■..! .fí^ip-i 3.^27:^04 " 100,00 42,ii^' '* >2f,bb.ín . 43-.ro- ' / 35,43 'ii > í 3$-,-53' Jí 34.14 27.95 41,07 *- 36,67 " ■ -^ ; V i ■> 76,54 «r,i3 64,70 .• 83,37,. ■ , • > 78,67 31-45, 45,83. 28,00 39-04 5^63 — 80 — Não temos a mínima preterição quanto á exactidão da área de cada Estado ; buscávamos tão somente a avaliação approximada da sua vestimenta. Nem a fraca approximação da topographia, nem a indecisão dos limites se coadunariam com os processos do planimctro, muito menos com as correcções ás deformações da projecção. Fizemos por meio da balança. Recortamos em papel homogéneo Estados e mattas que foram pczados numa balança ao meio decimo de milligrammo ; e, aceitando a área total da Carta-Archivo, deduzimos os respectivos valores. A approximação seria de cerca de 100 kilometros quadrados para cada pezada, correspondente á árei de quatro millimetros quadrados no desenho. Como verificação, sat'sfe^-nos um dos resultados: a área de S. Paulo, seguramente a mais bem levantada, deu 250.000 kilometros quadrados; é exactamente a que ulcimai-ienie íol calculada pela Commissão Geographica do Estado. Anivc;-.unoir:c fallava-se cm mais de 300.000. E' provavelmente uma coincidcnoia. ev^e accòrdo dos numejos. A' primeira vista impressiona o elevado quociente da área total da floresta. Nas avaliações até agora feitas fica ella em geral abaixo de 50 "l" da área total. Também quasi sempre se referem ás mattas realmente existentes; e essa dififerença não pôde ser pequena. O Território do Acre, o Amazonas, o Pará, com seus elevados coefficientes de vegetação florestal, póde-se dizer, estão quasi intactos ; até bem pouco tempo era a zona em que a matta servia de espantalho á civilização. Mesmo assim, no Pará a região comprehendida entre o rio Guamá e a costa acha-se muito devastada. Em todos os Estados do nordeste bem pouco se ha conservado das mattas primitivas. Foi por ali a primeira exploração das mattas costeiras desde os tempos coloniaes. E' do curso do Parnahyba ao do S. Francisco, somente as capuêras attestam hoje o vigor das mattas que foram. A exportação de madeiras valiosas, quer para construcções civis, quer para navaes, era muito grande; por mais recommendações e disposições de leis que a metrópole fizesse, a devastação foi rápida; e, em seguida os processos da lavoura pelo fogo completaram a obra. O mesmo aconteceu mais tarde ao longo de toda a costa; mas somente na parte mais aplainada até onde os rios se deixavam frequentar, resistindo as encostas alcantiladas das serras, e a parte encachoeirada dcs rios, por onde aliás se espalhavam ainda as tribus dos selvicolas. Minas, que desde cedo recebeu as visitas e hospedagens dos tiradores de ouro, ficou em breve muito reduzida nas suas riquezas florestaes, que aliás não eram sinão as dos valles e de algumas encostas de serras, pois que a lavra do ouro e dos diamantes mais intensa foi nas regiões dos campos. Subsistiam sempre, como até hoje em parte ainda restam, as mattas da encosta atlântica: as do Rio Doce, S. Matheus, Alucury e do baixo Jequitinhonha, cnde o indio e as sezões eram temidos e apenas permittiam as incursões pelas orlas de céste ; então se contavam por milhares os alqueires derribados para a plantação de milho e engorda de porcos. — 81 — De volta de snas visitas, o paulista empregara cm casa o mesmo methodo da derribada e queima para a criação do producto semovente; até que, procurando ?pegar-se ao solo, descobriu a lavoura do café e a desenvolveu ao ponto da superproducção. O café exigia a mais fina flor das matías ; e assim poder-se-iam medir por gráos quadrados as que ardiam para fazer praça á nova plantação. Seguramente 50 °|° das primitivas florestas de S. Paulo estão hoje occupadas por culturas diversas, grande parte em capuêras. Desse modo actualmente o coefficiente das florestas deve estar abaixado á cerca de um terço de sua área. E' esta uma das razões per que o coefficiente de 58, 63 °\° para o total das maítas vae parecer muito alto. Com eíícito antigamente, julgando pela parte central do Estado, sem conhecer a parte de céste, attribuia-se á área florestal primitiva o valor de um quarto ou quando muito um terço da área total. Mais tarde nós mesmo scffremos grande decepção quando os suppostos campos do extremo céste se apresentaram ccmo extensa e continua mattaria até o rio Paraná e até o rio Paranapancma. E assim o coeficiente de S. Paulo foi levantado de 30 a 64,7 "l". Do mesmo modo em ]\Iatto Grosso: toda a enorme área comprehendida entre os valles do Giparaná e do Guaporé era tida como a grande extensão dos Campos dos P areeis. Agora os inestimáveis estudos de Rondon vêm revelar f|ue toda aquella região é de mattas iguaes ás do Amazonas. E assim o calculo do coefficiente de cerca de 20°!° para Alatto Grosso teve de ser refeito e levan- tado para 39 °|°. O Paraná e Santa Catharina com os seus altíssimos coefficientes de 83 e 79 °|° de mattas representam poderoso contingente para esse accrescimo geral. E' bem provável que uma parte da zona do extremo noroeste do Paraná, entre o Tibagy e o Ivahy, figurada no mappa como floresta, venha a ser reconhecida conter campos cerrados, porque agora faliam insistentemente da existência por ali de mangabeira e maniçoba. Levantanientos dos Rios Piquiry e Ivahy, e reconhecimentos de estradas de ferro nos valles desses rios, no do Corumbatahy, e nos territórios interpostos, todas accusam vegetação florestal cotinua. Assim, esses Estados têem conservado quasi intacta a sua riqueza : a exportação de madeiras era feita em escala moderada. De alguns annos porém começou a descida de madeiras cm profusão das margens do rio Paraná ; e mais recentemente enormes derribadas estão sendo feitas para exportação na mais larga escala no valle do Iguassú. No Rio Grande do Sul, uma grande parte das mattas da encosta do planalto tem sido devastada; mas, ao que parece, tem sido mais ou menos curialmente aproveitada no desenvolvimento da lavoura. Talvez se possa afíirmar também que as florestas do Rio Grande estão reduzidas á metade. ]\Iesmo em ]\Iatto Grosso, onde a população é muito rareada, ha clamores contra a devastação. Um zeloso governador, o Coronel Pedro Celestino Corrêa da Costa, em representação ao Congresso mostrava a urgência de providencias, A. XI — 82 — e citava o facto de ser já necessário ir buscar muito Ionize madeiras para as constrncçÕes da Capital. Por essas considerações, pode-se pois julgar que as mattas existentes não attingirão talvez hoje a porcentagem de 40 "j" da área total. E o peior é que esses estragos na mór parte dos cases se accumulam em certas áreas que já soffrem duramente. Mas a representação como se acha no mappa dá antes a idéa de uma riqueza e de um bem estar que não temos. Reportamo-nos ao que ficou dito sob o titulo "Ao que se destina". O principal objecto é offerecer o esboço do conjuncto sobre que possa o Serviço Florestal escolher as melhores áreas para a reserva, determinar as florestas protectoras e instituir os campos de demonstração e ensino da silvicultura. Nem poderá haver maior fonte de benefícios para o paiz. Nunca seria de mais exaltar aqui as vantagens desses serviços. Outros mais abalizados já o têem feito e continuam na brilhante e benemérita campanha. Citaremos apenas a summa dos quocientes de alguns paizes, com o duplo fim : 1°, de mostrar os esforços empregados para a creação de áreas florestaes; 2°, para mostrar as dificuldades em obter dados precisos, porquanto os que vamos apresentar são bastante discordantes. Schlich, no seu admirável trabalho (121), dá, em 1906 os seguintes algarismos : ■pATyfTQ Porcentagem das maltas irAl/.tiiò sobre a área total Servia 48 % Rússia da Europa 42 Suécia. 35 Hungria 35 Áustria 33 AUemanha 26 Noruega 25 Turquia ( Com a Bulgária, a Bósnia e a Herze- govina ) 22 Rumania 22 Itália 22 Suissa 19 França 1 ó Grécia 16 Bélgica 17 Hollanda 7 Hespanha 6 Portugal 5 Dinamarca 4 Grã-Bretanha e Irlanda 4 Total da Europa 30 — 83 Em Jean Bruhncs, La Géographie Humaine, 1910, encontrou-se a seguinte lista : Porcentagens de áreas de mattas sobre as áreas totaes de differentes paizes P-MZES Porcentagens, segundo Porcentagens, se?unJo . Mé!ard, (1900) Decoppet, (1910) Finlândia 60 % » vSuecia 40 47,6 % Canadá 38 » Rússia 32 37 Austria-Hungria 30 30 Estados-Unidos 25 » Allcmanha 23,3 25,9 Noruega , . 21 21 Suissa 20 21,9 França 17,7 18,2 Bélgica 17,2 17,7 Runiania 14 » P A T 7 F <^ Porcentagens, segundo Porcentagens, segundo x.T.i^x,o Decopret, (1910) Mélard, (1900) Itália 14 14,6 Grécia 13 » Hespanha 13 16,9 Paizes- Baixos 7,5 » Dinamarca 6,2 » Grã-Bretanha 4 » Por nm calculo summario para as áreas devastadas, o Brasil deverá ficar actualmente numa porcentagem ainda superior á da Suécia. FONTES DE INFORMAÇÕES PARA O MA PP A Indicaremos as fontes de informações por Estados. Sob o titulo "Bibliographia" faremos nma relação da mór parte das obras e documentos consultados ; trabalhos esses postos por ordem alphabetica do nome dos autores, c que vão marcados por números que os representam. E como nos mesmos trabalhos encontram-se informações que serviram a diversos Estados, cital-os-emos apenas pelos respectivos números. Território do Acre. — Os traçados dos rios principaes como do Purús, do Jaiuá, representani o resultado dos levantamentos cuidadosos que vêem desde o tempo de Chandless, continuados pelas Commissões Internacionaes, que tão bem se desempenharam desses trabalhos; mas no tocante ás direcções e extensões dos affiuentes são reconhecidamente falhos ; a ponto que, tomando mesmo cartas em maior escala nos foi impossível applicar a linha do tratado de Petrópolis; e pareceu-nos preferível conservar as divisas approximadamente pelo divisor, até a nascente do Aquiry, não se tratando aqui sinão da natureza da vegetação. Aquella área é toda coberta de florestas. Algumas referencias mencionavam mudança de vegetação para as cabeceiras do Purús e do Juruá, e mesmo existência de campinas no Alto-Acre. Consultando os trabalhos escri^Díos, e principalmente por informações de quem lá esteve, chega-se á conclusão de que, subindo para os divisores do Ucayale, e do Madre de Dios a vegetação é realmente mais secca, diminue de porte, mas conserva os caracteres da matta. O mesmo para o Alto Acre. Quanto aos campes da Bôa Esperança para céste do rio Acre, são pastos abertos em meio da matta. Para elucidação sobre o regimen dos rios e qualidades das florestas muito nos auxiliaram os trabalhos numerosos que citamos na bibliographia : desde os picneiros Labre {yy), com as informações de IManocl Urbano, os excellente: trabalhos de Euclydcs Cunha (^4 c 45), Bcllarmino de ]\Iendonça (99), Thau- maturgo de Azevedo (8), Bucno de Andrada (6), Cândido Marianno (94), c muitos outros. — 86 — Amaaonas e Pará. — Como principaes fontes para locação dos campos serviram-nos os trabalhos de Coudreau (de 28 a 40) e Lc Cointe (156), além dos estudos c dcscripções de ITartt (62 e 64), de Dcrby (47, 48 e 49), de Lacerda c Almeida (78), Alexandre Haag (60), e de outros. Sobre a natureza da vegetação bascamo-nos inteiramente nas inestimáveis monographias do Dr. Huber (68, 69 e 70) ([uc conslituem tamanhoi cabedal que não está longe do registro completo das nossas riquezas ílorestaes naquelle valle. Foram também de grande auxilio os trabalhes de Barbosa Rodrigues (12 e 13) e os do grande engenheiro Silva Coutinho (41): Maranhão. — Como topographia e levantamento de rios ha os excellentes trabalhos do engenheiro Guilherme Dodt, da Repartição dos Telegraphos, c os mais recentes de Pimenta da Cunha. Quanto á vegetação, principalmente na parte média do Estado, a represen- tação é toda de Arrojado Lisboa, que ali fez pesquizas do maicr valor. No trajecto de Therezina á Capital, seguimos também as notas de Martins (95), e algumas dos estudos da estrada de ferro. Mais para sul, são as descripçccs de Wells (145), além das antigas notas do Dr. César Augusto Marques c de Cândido Mendes de Almeida. Pouca coisa de própria recordação, e muitas informações vcrbaes auxiliaram na representação daquelle . Estado pouco conhecido. ' Piauhy. — Além dos levantamentos e estudos no rio Parnahyba, do operoso engenheiro Benjamin Franklin de Albuquerque Lima, indicações de vegetação do distincto topographo e excellente observador Guilherme Lane. A mór parte da delimitação dos typos vegetaes é de Arrojado Lisboa e também de Manoel Lisboa, que ha pouco tempo percorreu bôa parte do Estado. Ha muitas indicações de Martins (95), de Gardner (57), de Ule (137), e também do Dr. Para- naguá (109) . Ceará, Rio Grande do Norte e Parahyba. — A topographia é a da carta publicada em 1910 pelo Serviço Geológico e Inspectoria das Seccas (169). A vegetação representada no Ceará é a reducção do Mappa botânico feito por Alberto Loefgren, e publicado pela Inspectoria das Seccas em 1910 (158). No Rio Grande do Norte e Parahyba devemos também a mór parte da distribuição da vegetação ás notas do Dr. Alberto Loefgren, como aos trabalhos e informações dos engenheiros Crandall e Williams. Na Parahyba recorremos também ás notas de Jofihly (74), á relação das mattas de Soares Pinto (114). ^ Pernambuco. — Ainda temos que agradecer bôa somma das notas da vegetação ao Dr. Alberto Loefgren; como também aos Drs. Williams e Crandall devemos muitas indicações. No trabalho do engenheiro Pereira Simões (130) encontramos bons elementos para a distribuição geral das qualidades do solo. Também fornece alguns dados de minúcia a collecção de viagens do engenheiro Dombre (50). O Diccionario topographico (66) forneceu-nos alguns apontamentos. — 87 — Alagoas e Sergipe. — Além de boas informações colhidas nos estudos e documentos sobre a viação ferroa dos Estados, encontramos muitas indicações valiosas nos trabalhos da Commissão de propaganda de ininiigração c colonização nos Estados do Norte. Os relatórios apresentados ao Presidente daquella Commissão em 1893 (15) encerram dados que bem attestam a reconhecida capacidade e distincção do engenheiro Manoel Rodrigues Baptista. Outra bôa fonte de informações é a ''Relação das Mattas das Alagoas em 1809", citada por vcn Ihering {/2) , Bahia. — Desde a viagem de Martins (95), e os diversos estudos sobre a navegação do S . Francisco, e sobre a sua ligação pelos caminhos de ferro com os pontos principaes da costa, os conhecimentos do solo da Bahia avolumaram. O S. Francisco era o Mississipi do Brasil: para ali convergiam todos os esforços, todos os estudos. Os magnificcs trabalhos de Halfeld, de Liais, de Milnor Roberts, de Derby, Theodoro Sampaio, e muitos outros definem a bacia do grande rio, e bôa parte do Estado. A contar de certo tempo, reconhecido que não era o Mi.-;sissipi, e sim o Nilo, novos estudos têem ido em busca dos meios de melhorar as condições naturaes desfavoráveis. E os documentos avultam com os trabalhos de Branner, de Williams, de Crandall e tantos outros, ao passo que as estradas de ferro afastando-se no valle para leste, e buscando a região mais próxima á costa, dão logar a novos projectos e estudos, que são outras tantas valiosas fontes de informações. A parte norte do Estado e do valle do S. Francisco foi principalmente traçada por Williams e Crandall, que já haviam construido a sua Carta pluvio- metrica da região semi-arida (173). A norte do S. Francisco aproveitamos as indicações de Guilherme Lane, c algumas de Ule (137). Para noroeste, onde faz fronteira com o Piauhy, são notas de Martins (95), de Jorge Gardner (57), de Paranaguá (109). Mais a céste onde reparte com o Goyaz central, são as indicações de Wells (145), e depois os dados seguros de Gardner que acom- panhamos pela divisa entre Goyaz e Bahia, e entre Bahia e Minas até o rio S. Francisco. Na parte sul da Bahia são os preciosos documentos topographicos e económicos, que aliás se estendem ao Estado inteiro, do eminente geographo engenheiro Theodoro Sampaio (121). Mais para leste, approximando á zona da costa, aproveitamos as notas mais minuciosas de Schncor (124) as de Chrockatt de Sá, de José Jorge da Silva, de Messias Lopes, e de outros enge- nheiros que têem estudado os novos traços da viação Bahiano-Mineira. Espirito Sauio c Rio de Janeiro. — Afora diversos trabalhos mais antigos sobre a topographia e a vegetação do Espirito Santo, nas diversas tentativas e na fundação de núcleos de colonisação, as viagens de von Tschudi, Martins e as notas de Hartt {6^,), muitos são es documentes que esclarecem sobre a vegetação destes pequenos e ricos Estados, aliás somente differenciada na zona baixa costeira e um pouco nas altas montanhas das divisas com Minas Geraes. Uma das melhores fontes foi para nós o trabalho do notável engenheiro Hermillo Alves (5), onde se encontram excellentes dados sobre os terrenos. — 88 — Também o ''Ensaio sobre a bistoria e estatística da Provincia do Espirito Santo", de José MarcelHno Pereira de Vasconcellí.s, de 1858" encerra Imuito bons apontamentos . As viagens de Martins, von Tscbudi, Saint-IIilaire, Gardner, Liais, e outros contêem abundantes e valiosos apontamentos sobre os terrenos c vegetação dos dois Estados. JNIas as notas de que mais nos utiHsamos são as de Ilartt (6;^), o melbor definidor desses elementos com o seu talento descriptivo da maicr precisão nas suas observações profundas, S. Paulo. — Incontestavelmente é de todos os Estados do Brasil aquelle cuja representação topograpbica é mais bem feita. Per isso mesmo foi indispensável procurar mais minuciosamente os elementos da distribuição florestal. O Dr. Horace Williams tem uma edição do seu exeellente mappa repre- sentando as áreas da lavoura do café. A Commissão Gcograpbica do Estado tem também um mappa de cultura do café. Ambos foram aproveitados. Em raríssimos pontos o cultivo do café tem perdurado em zona de campo. Aquellas áreas são representadas no mappa como mattas. A mesma Commissão tem outro mappa com as culturas e mattas actuaes. Nesse as mlnudencias não são consideradas; além disso as culturas são confun- didas com os campos; de sorte que para o destino do mappa não foi tão útil. Tivemos pois de recorrer ás notas tomadas ao longo das estradas de ferro, dos rios levantados, de muitos reconbecimentos para estradas de ferro, c de outros caminhamcntos através do território do Estado. Todas essas notas foram lançadas na carta de 1:1.000.000, da qual foi então feita a reducção. E assim para as zonas do centro, sul, léste e norte, as delimitações são minuciosas e de suficiente approximação . Muito rXíS aproveitaram os trabalhos de Loefgren (81 e 82)., o mellior conhecedor da botânica de S. Paulo. A elle individualmente devemos ò obsequio de haver traçado em diversos pontos os limites da vegetação. Aos valiosos conhecimentos e á benevolência de PIorace Williams egualmente somes devedores de um grande contingente principalmente na parte de léste e de sudeste pelas divisas, e mesmo já dentro, do Estado de Minas. Na maior parte do valle do Paranapanema são as notas de Theodoro Sampaio e de Paula Oliveira (167). Para o extremo oeste, na parte até bem pouco tempo inteiramente desconhe- cida, nos valles do rio Aguapehy e do Rio do Peixe são^ as notas do distincto engenheiro Gentil Moura e do notável botânico Gustavo Edvvall, da Commissão de S. Paulo (103 e 51). Paraná c Santa Catharina. — Desde longos annos os esforços poderosos dos antigos mestres-modelo, os irmãos Rebouças, Beaurepaire Rohan, os irmãos Keller, se haviam exercitado naquellas regiões de uberdade em busca das melhores vias de communicaçao com o Brasil central ; depois o traçado das linhas telegraphicas foi outro campo de actividade de Capanema, de Odebrecht, de Weiss ; dos quaes todos resultaram bôa somma de conhecimentos topogra- phicos, e da constituição e vestimenta do solo. — 89 — Mais tarde o Professor Derby definia a estructura geológica e os caracteres mais salientes da topographia da região. No estudo de reconliecimento para o traçado da S. Paulo-Rio Grande, o engenheiro Manuel Baptista dá também muitos esclarecimentos sobre a natureza da vegetação nos dous Estados. Mas são principalmente de duas fontes as discriminações minuciosas para vegetação do Estado do Paraná. O nosso distincto collega engenheiro Eusébio de Oliveira, com a cooperação de Francisco de Paula Boa-Nova, tem feito o levantamento topographico de grande parte do Estado, e organisou um mappa que brevemente deverá ser publicado. Dessas notas forneceu-nos grande cópia sobre a vegetação. Ao distincto engenheiro Senador Cândido de Abreu, o esforçado paladino dos progressos do Paraná, devemos a mór parte das limitações que elle mesmo teve a bondade de traçar sobre o seu mappa do Estado, cpie até hoje constitua a melhor representação publicada. No Estado de Santa Catharina, Eusébio de Oliveira tem tambcm levan- i-í.ontos e estudos gcoiogico.; sobre a mór parte da áica. Forncceu-nos abi.-id.mtes dados sobre a vegetação. O operoso engenheiro Senador Hercilio Luz, conhecedor profundo de todo seu Estado, teve a gentileza de indicar sobre uma carta de sua lavra ou de sua grande contribuição, os limites das differentes zonas vegetaes como figuram no mappa junto. Rio Grande do Sul. — E' também um dos Estados que possuem melhor carta. Começando com o levantamento de uma carta itinerária, para ali têem convergido os esforços da administração, de modo cjue hoje o território do Estado está coberto por uma bem traçada rede de triangulação. Addicionando aos innumeros caminhamentos feitos pelos disLinctos engenheiros militares que executaram a triangulação, os riumerosos estudos e traçados de estradas de ferro, terá o Estado um mappa perfeito, que já sufficientemente correctos são os últimos organisados pelo Coronel J. Jacques. De longa data ali se fazem estudos da topographia e da vegetação, princi- palmente na zona escolhida para desenvolvimento das colónias allemãs. Cs dois Estados mais meridionacs têem sido visitados e contam a ventura de ter tido suas riquezas naturaes estudadas por grandes summidades entre os naturalistas. Saint-Hilaire, Sellow, Bonpland, Avé-Lallemant, Waldemar Schultz, Max Beschoren, H. Von Ihering (o sábio zoologista que agora dirige o Museo de São Paulo), A. Hettner, Fritz Múller, Schimper, Schenck, A. Moller, e mais recente- mente o professor Lindman. Infelizmente, a poucas das autoridades acima citadas podemos acompanhar nos seus utilíssimos estudos. Afora algumas leituras de Saint-PIilaire, e de Ihering, foi-nos principal guia o livro de Lindman (87), que aliás é um estudo perfeito, acompanhado de mappas da vegetação. - 90 — Na delimitação minuciosa das áreas dos campos servio-nos de grande auxilio um mappa bem feito, que estava sem nome, mas que desconfiamos ser o de ]\Iax Beschoren. Ainda nos aproveitamos muito das indicações do mappa da guerra (164), pelo tenente Francisco Rath e coronel Dento Porto. Também nos foi de grande utilidade o "Diário dos Trabalhos da Demarcação dos Limites dos Domínios de Portugal e Ilespanha na America Meridional", que vem transcripto na Collecção de noticias para a historia e geographia das Nações Ultramarinas (27). Minas Ccracs. — Chegamos á região que pelas riquezas naturaes, a par de um clima benigno, tornou-se desde logo o centro de attracção dos mais notáveis scientistas. Saint-Hilaire, Martius e Eschwege representam Investigadores do maior vulto entre os que perlustraram as terras mineiras. Os dois últimos, compre- hendendo a necessidade da representação cartographica, ofiferecem mappas da região percorrida que constituiriam mesmo hoje excellentes trabalhos de carto- grapliia. De todos esses aproveitamos notas que figuram no mappa. Numerosos são os viajantes scientistas que têeni percorrido o Estado de Minas. Liais percorreu o valle do Rio das Velhas e o do alto S. Francisco, e faz muitas observações sobre a vegetação. Burton também inclue muitas notas sobre a vegetação. Hartt nas suas valiosas notas geológicas intercala sempre as de vegetação. Infelizmente só se referem aos valles do Mucury, do Jequitinhonha e do Aras- suahy. Foram do maior auxilio. Outra fonte de informações encontramos em muitos reconhecimentos e estudos de estradas de ferro. O livro de Wells (154), que é um bom repositório de dados para o nosso intuito, é o resultado dos estudos do prolongamento da Pedro II pelo valle do Paraopeba e pelo do S. Francisco a transpor o divisor do Tocantins e descer per este ultimo rio. Na parte de nordeste, na vertente esquerda do S. Francisco, são as descri- pçÕes de Gardner, de Martius, as de Eschwege, desenvolvidas pelas notas de Paula Oliveira (108), de António Olyntho (115), e de Alipio Gama (56), e comple- tadas com algumas indicações de Theodoro Sampaio (121), e informações do Dr. Mello Franco (55) ; ainda mais para sul nessa região recorremos ás notas dos estudos dos prolongamentos e ramaes da estrada de ferro Oeste de Minas. Ainda no valle do S. Francisco ha informações de Lane e de Williams. Mais para céste, no triangulo mineiro, temos os differ entes caminhos seguidos pela Commissão do Planalto (43) ; os estudos da Uberaba a Coxim pelo distincto engenheiro F. A. de Paula Souza, e algumas observações individuaes. Na região de sudeste, onde divide com S. Paulo e até o Rio Grande, são indicações de Horace Williams. Na parte sul são os trabalhos minuciosos da Commissão Geographica de Minas. . . — 91 — Na parte central, ha notas tomadas por nós mesmo, e por nossos compa- i.liciros de trabalho engenheiros Eenedicto dos Santos e Cicero de Campos. E, ao longo da Serra do Espinhaço temos observações até pouco ao norte de Grão-Mogol, emquanto a céste do Rio das Velhas chegam ellas somente até Pi rapo ra. A nordeste e leste, além das descripçÕes de Hartt, temos as notas minuciosas de Schnoor (124), como as outras da viação bahiano-mineira dentro do território de Minas. Goyaz. — Pela sua posição central pareceria mais susceptível de escapar á observação dos scientistas. Entretanto, ou porque nos jorimeiros tempos fosse ali a vida mais intensa com as suas minerações do que o é actualmente, ou porque a attracção do desconhecido lhes fosse o movei, o certo é que os natura- listas também frequentavam Goyaz. Weddell e Castelnau (22) atravessaram Goyaz de norte a sul c de leste a céste. Desceram o Araguaya, subiram o Tocantins, de cujas cabeceiras foram de novo para oeste a atravessar o A.ragLiary e entrar em Matto Grosso. Parece-nos que a representação do Araguaya nos mappas actuaes é ainda a da planta levantada por Castelnau. Pelo menos nunca conseguimos ver nem a planta do Major Lago, nem a do engenheiro Sá Vallée. Em todo caso as referencias que se encontram no extenso trabalho são muito aproveitáveis. Outra fonte de informações sobre a vegetação desde a Capital de Goyaz e pelo Araguaya abaixo é do nosso sertanista Couto de Magalhães (92), que também aproveitamos. Na parte de leste mais próxima ás divisas com a Bahia e com Minas, cingimo-nos ás notas de Gardner (57) ; mais para norte e pelas vertentes leste do Tocantins tomamos os dados de Wells (145), No curso do baixo Tocan- tins e Araguaya, principalmente para a locação dos campos, seguimos Coudreau (145). Entre o rio Paranahyba e o parallelo de 15° ha os trabalhos da Commissão do Planalto ; os dados da vegetação, além dos inscriptos nas plantas parciaes, véu! de Glaziou (58) e de Ule (136). De Uberaba ao Registro do Araguaya, aproveitamos um minucioso levan- tamento da linha telegraphica feita pelo Capitão Félix Flcury de Amorim tenente Eduardo Sócrates, alferes Bcnedicto Gama, inspector Theodoro Klein, e outros. Da Cachoeira Dourada (rio Paranahyba) até o divisor Araguaya-Paraná, nos limites de Matto-Grosso, são os estudos da estrada de ferro de Uberaba a Coxim. Desta ultima directriz para sul colligimos informações em Oscar Leal (80). Matto Grosso. — Como em Goyaz, não era de esperar por ali a grande cópia de documentos que todavia se encontram. Parece mesmo que nos tempos coloniaes houve mais ardor em adquirir os conhecimentos topographicos. As condições de fronteira muito contribuíram para isso, como ulteriormente têm ainda contribuído. A divisa occidental de Matto Grosso, a contar do paral- lelo de 10° até o de 24° sul, é também a fronteira do Brasil, e tem imposto as — 92 — mais cuidadas determinações de posição. Foi esta a origem dos numerosos e mui perfeitos dados geographicos do Dr. Lacerda e Almeida de 1781 a 1787 (78), os trabalhos de Ricardo Franco (126 e 127); da Commissão de limites com o Paraguay em 1874 e com a Bolívia em 1878, que se acham condensados no cxcellcnte livro de João Severiano (54). Além disso Matto Grosso teve a fortuna de contar por muitos annos como propugnador dos seus melhoramentos o Barão de Melgaço (97 e 157) geographo notável, que aos resultados do seu continuo lidar, soube reunir os esforços de muitos exploradores brasileiros distinctos como Falcão das Neves, Peixoto de Azevedo, Oliveira Pimentel, e de tantos outros. Nem devemos esquecer as valiosas explorações do Dr. Couto de Magalhães (91 e 92) com Sá Vallée no Araguaya, das de Corrêa de Miranda com Gonçalo Tocantins, no Tapajós, c de muitos outros. Desde o começo do século 19° sobreleva a intensidade na avidez pelo conhe- cimento da America do Sul. Matto Grosso, como a parte mais central, foi sempre considerado campo virgem e attrahente para excursões de muitos viajantes e de commissões scientificas do estrangeiro, que têem ido fornecendo abundantes dados para a geographia e jDara a historia natural. Em 1825 Ricdel e Langsdorff atravessaram o rio Paraná e entraram em Matto Grosso pelo caminho de Lacerda e Almeida: Rio Pardo, Camapuan, Coxim, Taquary, Paraguay, S. Lourenço e rio Cuyabá, até Cuyabá ; Langsdorfif seguiu pelo Arinos e Tapajós, emquanto Ricdel continuou a viagem de Lacerda e Almeida: Villa-Maria, Matto Grosso, rio Guaporé, e pelo Aladeira e Amazonas. Em 1849 o príncipe Adalberto da Prússia, com o Conde de Oriolo e o Conde de Bismark desceram o Xingu até o parallelo de 4°. Em 1840 Weddell e Castelnau entraram em Matto Grosso pelo Registro do Araguaya e cruzaram a parte central de Matto Grosso em diversas direcções entrando depois pela Bolivia ; Helmreichcn em 1847. P^gc, em 1854, percorreo o rio Paraguay, fazendo numerosas e accuradas determinações de posição geographica. Chandless em 1865, determinando coordenadas e fazendo a planta do rio Tapajós. Von den Steinen em 1883, e de novo com Vogel em 1887, levantando a planta do Xingu. São outras tantas fontes de noticias geogi'aphicas physicas e económicas. Depois entre 1873 e 1880, Pimenta Bueno, estudando traçados de estrada de ferro para os levar a Cuyabá, (no), cclligiu tão numerosos dados que bastaram para confeccionar o seu mappa (163) . Já em 1876 Gomes Calaça estudara a estrada de ferro ' de Cuyabá a Lagoinha . Modernamente os imperterritos esforços de Rondou, nos estudos e constru- cções das Linhas Telegraphicas de Matto Grosso, que em bôa hora se vão esten- dendo pelo extremo noroeste do Estado, têem accumulado elementos para con- fecção de um excellente mappa daquella vasta região brasileira. Da mór parte desses trabalhos aproveitamos notas para a locação dos diííerentes typos de vegetação. — 93 — Do extremo noroeste devemos a um esboço obsequiosamente fornecido pelo escriptorio technico dos trabalhos da Commissão Rondcn. No Paranatinga e Tapajós são as notas de Peixoto de Azevedo e as de Chandless, citadas por Alelgaço (97), e snpplcmentadas com os apontamentos de Condreau (32) . No Xingu e cabeceiras dos rios das Mortes, quer o do Cuyabá quer o do Araguaya, seguimos os apontamentos dos von den Steinen, e de Vogel. Para o curso do Rio das Mortes as notas que se encontram em Leverger (97), e em Couto de Magalhães (92) . No chapadão entre o Pantanal c o Araguaya, aproveitamos as notas da Linha Tclegraphica, como as de Vogel, as de Couto Magalhães (91), e as de Moutinho (104). Mais para sul, cerca dos limites com Goyaz, a descer no valle do Paranahyba, um levantamento do Í^Iajor Lassancc Cunha, transcripto em Pimenta Bueno (no) ; e ainda algumas notas do estudo da Uberaba a Coxim. Pela orla do Pantanal as notas de Rondon e de Taunay (133). Mais para sul, no divisor Paraguay-Paraná, algumas indicações de Lacerda e Almeida (78) ; e principalmente os mais recentes estudos da Estrada de Ferro Noroeste, condensados no excellcnte trabalho de Arrojado Lisboa (89) . Nas ultimas vertentes de sul para o rio Paraná, colhemos nos levantamentos de Sá e Faria, como também nos estudos de Lloyd e Palm para o Caminho de ferro D. Izabcl. Nas discriminações dos diversos typos vegetativos muito nos soccorremos dos trabalhos de Lindman (87 e 88), dos de Lisboa e ainda mais especialmente dos de Spencer Moor (loi). BIBLIOGRAPHIA i) Abreu (J. Capistrano e Valle Cabral) — Wappocus — A Gcographia Physica do 75/-I75// refundida. — Rio de Janeiro, 1884. 2) Agassiz (IvOuis) — Conversações scientijicas . — Rio de Janeiro, 1866. 3) Agassiz (Professor and Mrs. ) — A. 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